18 anos da Política Nacional de Medicamentos: o que ainda falta para se garantir acesso e uso racional de Medicamentos no âmbito do Sistema Único de Saúde (SUS)?

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14 Santos et al., 2016

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18 anos da Política Nacional de Medicamentos: o que ainda falta para se garantir acesso e uso racional de Medicamentos no âmbito do Sistema Único de Saúde (SUS)? Thais Bueno Enes dos Santos1, Vivian Cerqueira de Souza Viana2, Lorena Rocha Ayres2* 1

Universidade Federal de São João Del Rei, Divinópolis, Minas Gerais, Brasil Universidade Federal do Espírito Santo, Centro de Ciências Da Saúde, Departamento de Ciências Farmacêuticas, Vitória, Espírito Santo, Brasil *Autor Correspondente: [email protected] _____________________________________________________________________________ 2

A Política Nacional de Medicamentos (PMN), aprovada em 1998, estabeleceu que para que seu propósito, de garantir a necessária segurança, eficácia e qualidade dos medicamentos, a promoção do uso racional e o acesso da população àqueles considerados essenciais, fosse alcançado, os gestores do Sistema Único de Saúde (SUS), nas três esferas de Governo, deveriam atuar em parceria e de acordo com suas oito diretrizes, a saber: adoção de relação de medicamentos essenciais; regulamentação sanitária de medicamentos; reorientação da assistência farmacêutica; promoção do uso racional de medicamentos; desenvolvimento científico e tecnológico; promoção da produção de medicamentos; e desenvolvimento e capacitação de recursos humanos1. Mas será que após 18 anos da PMN conseguimos avançar nessas diretrizes? Com relação à adoção da Relação Nacional de Medicamentos Essenciais (RENAME), o Brasil elabora listas oficiais de medicamentos desde 1964, antes mesmo da recomendação e da publicação da lista modelo de medicamentos feita pela Organização Mundial de Saúde (OMS) em 1978. A RENAME compreende a seleção e

a padronização de medicamentos indicados para atendimento de doenças ou de agravos no âmbito do SUS. A inclusão, exclusão, ou alterações de medicamentos no Sistema Único de Saúde (SUS) é feita pelo Ministério da Saúde, assessorado pela Comissão Nacional de Incorporação de Tecnologias no SUS (CONITEC)2. A RENAME está em sua 9ª edição, publicada em 2015, e é uma ferramenta que visa ampliar o acesso aos medicamentos e promover o seu uso racional2. A regulamentação sanitária de medicamentos tornou-se mais efetiva com a criação da Agência Nacional de Vigilância Sanitária (ANVISA) pela Lei Nº 9.782, de 26 de janeiro de 1999. Sua competência abrange tanto a regulação sanitária quanto a regulação econômica do mercado3. Desde a sua criação, vem trabalhando na regulamentação de registros de medicamentos, regulação de preços, combate à falsificação, redução da propaganda abusiva e enganosa dentre outros, trazendo grandes avanços3. Entretanto, a fiscalização efetiva não tem sido alcançada em sua plenitude.

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15 Santos et al., 2016 A reorientação da Assistência Farmacêutica (AF) que vem sendo implementada no SUS nos últimos anos está fundamentada principalmente: na descentralização da gestão, na promoção do uso racional de medicamentos, na otimização e na eficácia das atividades envolvidas na AF, no desenvolvimento de iniciativas que possibilitem a redução de preços de produtos, viabilizando o acesso da população, inclusive no âmbito privado4. No que diz respeito à promoção do uso racional de medicamentos, várias intervenções visando disciplinar a prescrição, a dispensação e o consumo vêm sendo realizadas4. Cabe dizer que não basta apenas prover o acesso aos medicamentos, se não houver medidas de atenção interdisciplinar ao usuário durante o uso. O acesso não deve ser entendido apenas como disponibilidade dos medicamentos. Quanto ao desenvolvimento científico e tecnológico e a promoção da produção de medicamentos, a indústria farmacêutica brasileira, formada por filiais de empresas multinacionais, empresas privadas e empresas públicas, os laboratórios farmacêuticos oficiais (LFO), dificilmente incorporam pesquisa e desenvolvimento e produção de matériasprimas, possuindo grande dependência tecnológica de países desenvolvidos4. Os LFO foram criados com o intuito de atender a demanda de medicamentos disponibilizados no SUS, entretanto, um estudo realizado com 14 LFO analisou um arsenal de 362 medicamentos produzidos pelos mesmos5. Destes, foi verificado que 26,3% dos medicamentos e 42,5% das apresentações não constavam na RENAME de 2010 e 31,5% não pertenciam a nenhum Componente da Assistência Farmacêutica do SUS5. Essa discrepância entre as demandas do Ministério da Saúde e o que é de fato desenvolvido e produzido pelos LFO deve-se em parte às pesquisas desenvolvidas serem conduzidas de forma independentemente do que o Ministério da Saúde e até mesmo a própria instituição consideram como prioridade bem como às dificuldades relativas ao processo de aquisição de matérias-primas e equipamentos6. Para que avanços sejam alcançados, é fundamental que ocorra

alinhamento entre o desenvolvimento científico e tecnológico e a produção de medicamentos pelos LFO com a seleção, prescrição e dispensação de medicamentos pelo SUS. A garantia da segurança, eficácia e qualidade dos medicamentos passou a se destacar com a Lei dos medicamentos genéricos Nº 9787 de 1999 pela sua intercambiabilidade com o medicamento de referência, assegurada por testes de equivalência farmacêutica e bioequivalência, a qual também conferiu maior acesso aos medicamentos pela população bem como redução de preços7. A extensão da exigência quanto à realização dos mesmos testes aos medicamentos similares proporcionou uma ampliação sobre o controle da qualidade dos medicamentos comercializados no Brasil. Além disso, o investimento em ações de farmacovigilância, como a criação do NOTIVISA, um sistema desenvolvido para notificação online de efeitos adversos e queixas técnicas, proporcionou a vigilância dos medicamentos após a sua comercialização a fim de verificar se os benefícios dos medicamentos são maiores que seus riscos em condições reais de uso. O Programa Farmácias Notificadoras também é uma importante ação para a promoção da saúde. Pelo programa, a farmácia, pública ou particular, deixa de ser um estabelecimento meramente comercial e agrega valor de utilidade pública. O farmacêutico, bem como todos os profissionais de saúde diante das queixas dos consumidores, deve notificar problemas relacionados a medicamentos. Dessa forma, transforma-se em um elo entre a população e o governo. O Ministério da Saúde, desde a aprovação da PNM, realizou grandes investimentos na capacitação de recursos humanos, sendo que dentre eles podemos destacar a criação do curso de Gestão da Assistência Farmacêutica. O curso teve como objetivo preparar os farmacêuticos para atuarem na gestão da assistência farmacêutica, de forma a otimizar a utilização de recursos a fim de proporcionar o alcance de melhores resultados em saúde. Além disso, cabe ressaltar que investimentos foram realizados para o estabelecimento de cursos de pós-

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16 Santos et al., 2016 graduação stricto sensu com a finalidade de formar profissionais para a pesquisa e docência preparados para formar recursos humanos competentes para atuarem no SUS e capazes de contribuir para o desenvolvimento da sociedade de acordo com o contexto social atual. Com a PNM, observam-se avanços significativos na área de AF, porém para sua plena efetivação ainda é necessário que suas diretrizes sejam norteadas pelas reais necessidades do SUS bem como, a AF ser entendida em sua complexidade de etapas, e que todas sejam voltadas para a otimização de recursos, acesso qualificado e uso racional de medicamentos.

3. Brasil. Lei nº. 9.782, de 26 de janeiro de 1999. Define o Sistema Nacional de Vigilância Sanitária, cria a Agência Nacional de Vigilância Sanitária, e dá outras providências. Diário Oficial da República Federativa do Brasil, Brasília, DF, 27 de janeiro de 1999. Disponível em: . Acesso em: 05 ago .2016. 4. Osorio-De-Castro CGS, Luiza VL, Castilho SR, Oliveira MAO, Jaramillo NJ, org. Assistência Farmacêutica: Gestão e Prática para Profissionais da Saúde. Rio de Janeiro: Editora Fiocruz; 2014. 469 p.

Referências 1. Brasil. Ministério da Saúde. Portaria n. 3916 de 30 de outubro de 1998. Dispõe sobre a Política Nacional de Medicamentos. Diário Oficial da República Federativa do Brasil. Disponível em Acesso em: 05 ago. 2016. 2. Brasil. Ministério da Saúde. Secretaria de Ciência, Tecnologia e Insumos Estratégicos. Departamento de Assistência Farmacêutica e Insumos Estratégicos. Relação Nacional de Medicamentos Essenciais: RENAME 2014 / Ministério da Saúde, Secretaria de Ciência, Tecnologia e Insumos Estratégicos. Departamento de Assistência Farmacêutica e Insumos Estratégicos. – 9. ed. rev. e atual. – Brasília: Ministério da Saúde, 2015. 230p.

5. Rodrigues M. Produção Pública de Medicamentos no Brasil: uma análise sob a ótica da Assistência Farmacêutica no Sistema Único de Saúde, 2012. Dissertação de Mestrado, São Paulo: Programa de Pós-Graduação em Ciências Farmacêuticas da Universidade de Sorocaba. 6. Couto MVL, Neves ARV, Figueiredo ER, Silveira LS, Costa LV, Barroso WB. Principais obstáculos que dificultam a inovação em instituições públicas da área farmacêutica no Brasil.Vigil. sanit. 2016;4(2):2-7. 7. BRASIL. Lei nº 9787 de 10 de fevereiro de 1999. Altera a Lei no 6.360, de 23 de setembro de 1976, que dispõe sobre a vigilância sanitária, estabelece o medicamento genérico, dispõe sobre a utilização de nomes genéricos em produtos farmacêuticos e dá outras providências. Disponível em: http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/le is/L9787.htm. Acesso em: 05 ago .2016.

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