A Actividade Mecenática da Nação Portuguesa em Antuérpia na Segunda Metade do Século XVI

June 3, 2017 | Autor: Florbela Veiga Frade | Categoria: Portuguese History, History of Antwerp, 16th Century Antwerp
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A ACTIVIDADE EM A N T U É R P I A

MECENÁTICA

DA

NA

METADE

SEGUNDA

NAÇÃO DO

PORTUGUESA SÉCULO

XVI

F l o r b e l a C. V e i g a F r a d e

TIPOS DE MECENATO PRATICADOS PELA COMUNIDADE MERCANTIL PORTUGUESA DE ANTUÉRPIA

urante o século xvi em Antuérpia podem-se destrinçar vários tipos de mecenato que es­

D

tão estreitamente ligados quer à esfera privada com o à esfera pública1, caso se trate dum

patrocínio levado a cabo por um indivíduo, por um grupo mais ou menos alargado de pessoas ou ainda por uma comunidade mercantil de determinado país. No que se refere à comunida­ de oriunda de Portugal conhecida por Nação Portuguesa ou Natie van Portugal, o mecenato era praticado a nível individual e de grupo. O patrocínio das artes do conhecimento estava patente na vida privada de cada um dos in­ divíduos tal com o em suas casas de acordo com o seu gosto e prazer, mas também decorria da actividade mercantil da esmagadora maioria dos componentes da representação portugue­ sa naquela cidade flamenga. O mecenato praticado é plurifacetado na medida em que se apoiam pintores, escultores, arquitectos, gravadores, ourives, lapidadores, impressores, escritores ou outros artistas, mas também incide sobre actividades ligadas ao coleccionismo de obras de arte, de livros ou ob­ jectos ligados a várias áreas do saber, com o por exemplo elementos químicos ou instrumen­ tos náuticos. O apoio a estudantes em universidades do norte da Europa com bolsas do rei português, ou não, e ainda as obras pias e de caridade revelam facetas mecenáticas que se es­ tendem à ciência e à religião. Quando se fala do mecenato de portugueses em Antuérpia no tempo longo que é o século xvi, podem ainda destrinçar-se tendências estreitamente ligadas à origem social dos membros da comunidade que o praticavam. Até ao abandono da feitoria régia de Antuérpia em 1549 o mecenato é claramente de cariz aristocrático e principesco, uma vez que é praticado por ho­ mens de confiança régia que ocupavam os altos cargos da feitoria, geralmente com títulos no­ bres, e que agem em nome do rei de Portugal. Inserem-se neste contexto as actividades de Rui

1

Sobre este assunto a autora desta comunicação está

a redigir a dissertação de doutoramento subordinada ao tema As Relações Económicas e Sociais das Comunida­ des Sefarditas. O Trato e a Família, onde se tratam estes assuntos com maior profundidade. Defendem-se, em grande medida, os conceitos de esfera pública e privada da Época Moderna desenvolvidos por H. A r e n d t , A Condi­

Fernandes de Almada e Damião de Góis. A arte é um meio de exprimir símbolos que se po-

ção Humana, Lisboa, 2001.

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dem associar à soberania e à grandeza dum rei. Neste caso, o mecenato pode ter semelhanças com a actividade de Alexandre que coleccionou antiguidades; ou de Ptolomeu que criou a bi­ blioteca de Alexandria assim com o o museion, espécie de universidade onde os eruditos estu­ davam à conta do soberano. Rui Fernandes de Almada, feitor do rei português e seu agente, enviou várias obras de arte para Portugal tal com o ficou registado numa missiva de Novembro de 1521. Algumas dessas obras tinham sido feitas por Dürer2, embora nada indique que estas obras sejam exclusiva­ mente deste pintor ou que esta não seja uma actividade esporádica do representante máximo da Feitoria de Portugal em Antuérpia. No entanto, e paralelamente, vários mercadores desenvolvem um patrocínio que se coa­ duna também com as suas actividades comerciais. Neste caso, o mercador, quer seja indivi­ dualmente, em nome da sua casa comercial, ou da comunidade mercantil, actua de acordo com a sua origem social e com a sua formação científica e religiosa eminentemente sefardita3. Inclui-se neste caso a família Mendes Benveniste que apoiou o estudo de hebraico e, mais tar­ de, os mercadores que fomentaram a produção de obras naquela língua bem com o pinturas e esculturas cujos temas são as histórias e episódios narrados no Pentateuco, e consequentemente na Tora e na Bíblia. Para além disso, o gosto pela difusão da história do povo judaico foi um dos temas recorrentes. Na segunda metade do século xvi acentua-se o carácter mercantil do mecenato, todavia não perde o cariz principesco e aristocrático quando praticado em nome da Nação Portugue­ sa. Os mercadores estão ligados ao rei e às áreas de exploração económica da Coroa Portu­ guesa, por conseguinte, o mecenato também tem um objectivo ligado à propaganda do poder régio e do seu império. O mecenato individual -principalmente da elite mercantil constituída em grande parte por sefarditas- é em grande parte determinado pelas aspirações sociais dos seus membros que, em alguns casos, revelam estratégias de ascensão à/na nobreza portuguesa e à/na flamenga. Neste sentido, as suas preferências e gostos adquirem características até aí apanágio de nobres e das altas esferas eclesiásticas, reflectindo, desse modo, o percurso social desses mercadores. O carácter mercantil e aristocrata fundem-se e resultam numa nova forma de ver a arte clara­ mente influenciada pela actividade comercial. Os mercadores tinham o conhecimento econó­ mico, mas também o do mercado internacional, distinguindo o que teria maior aceitação por parte das sociedades e dos consumidores. Deste modo, o gosto dos mercadores difunde-se e reflecte-se na vida da restante sociedade que passa a comprar obras (mesmo sendo gente de baixa extracção social) reflectindo esses gos­ tos. Esta é uma realidade eminentemente flamenga no século xvi, e que se acentua no século xvii, com consequências a nível internacional acompanhando a gradual ascensão dos mercadores. O cariz mercantil ou burguês do mecenato da segunda metade do século xvi, leva o mer­ cador/mecenas a exercer uma crítica que contribui para a maior ou menor difusão dum artista ao patrociná-lo em detrimento de outros. Isso terá, consequentemente, repercussões na pro­ 2

M.R. T h e m u d o B ara t a , R ui Fernandes de Almada,

Lisboa, 1971, pp. 14 e 231-233, doc. XXVIII.

dução artística, no valor das obras e na hierarquização dos artistas. Em m odo de conclusão, tanto o mecenato aristocrata com o o burguês andaram sempre

3

O conceito de sefardita está desenvolvido na disser­

tação de doutoramento da autora desta comunicação

lado a lado no que se refere à comunidade mercantil e à Nação Portuguesa de Antuérpia. Con­

(em fase de redacção).

tudo, durante as décadas de oitenta e noventa, o patrocínio levado a cabo por mercadores,

4

P. B o u r d ie u , O Poder Simbólico, 4a ed., Lisboa, 2001;

idem, «Reprodução Cultural e Reprodução Social», em A E conom ia das Trocas Sim bólicas, São Paulo, 1987,

5 4

quer a nível individual quer da comunidade mercantil, traduz-se na difusão de um poder sim­ bólico, tal com o Bourdieu4 e Norbert Elias5 teorizam, ligado ao poder económico e ao conhe­

pp. 295-336.

cimento com reflexos na sua religiosidade. Este poder não está necessariamente ligado à

5

maior ou menor proximidade do poder político.

N. Elias, Teoria Simbólica, Oeiras, 1994.

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O poder que emana do simbólico torna-se efectivo quando tem reflexos na vida e com por­ tamentos das pessoas que são classificadas e hierarquizadas de acordo com as possibilidades que um indivíduo ou grupo possui em termos económicos e de conhecimento6, assim com o da proximidade ao poder político. Por conseguinte, não será de estranhar que algo com o a cor, tecidos, jóias, objectos, flores, lugares em cortejos e procissões, colecções de arte, biblio­ tecas sejam também eles símbolos distintivos da ordem social a que se pertence e demonstra­ tivos de poder simbólico que os seus detentores beneficiam. De qualquer forma, o mecenato é o meio pelo qual se pretende afirmar o poder que se possui e isso reflecte-se na ostentação e demonstrações simbólicas de poder nas suas variadas manifestações. No caso da Nação Portuguesa é sobretudo o poder político que está em causa, mas no que se refere aos membros da elite mercantil é o poder económico que se pretende realçar ou purificar de acordo com Yves Durand7 uma vez que transforma o dinheiro em meio de prestígio, consideração e sucesso. Em termos gerais, e seguindo a definição de Peter Burke8, a comunidade mercantil portu­ guesa de Antuérpia durante século xvi pratica pelo menos três tipos de mecenato: - Sistema em que um homem rico dá alojamento a um artista ou escritor em sua casa, ou fora dela, por um período mais ou menos longo de tempo, oferece-lhe presentes e espera em troca que ele preencha as suas necessidades artísticas e literárias; - A relação pessoal e temporária entre o patrono e o artista ou o escritor que dura enquan­ to a obra se encontra em fase de elaboração, seja ela uma pintura, obra literária ou outra; - Sistema de mercado em que o artista produz uma obra e tenta vendê-la directamente ao público ou através dum comerciante. A Nação Portuguesa, com o representante do rei e do reino de Portugal, pratica um m ece­ nato caracterizado pelo sistema de encomendas, mas também o de ofertas ao artista durante um certo período de tempo com vista a receber dele obras suas. Foi isso que sucedeu com os feitores da Nação Portuguesa aquando da visita de Dürer a Antuérpia. Nessa altura Rui Fernan­ des de Almada9, João Brandão e Francisco Pessoa ofereceram-lhe presentes e convidaram Dü­ rer para a Casa da Feitoria em Kipdorp. Dürer foi convidado dezanove vezes para jantar, sucedendo-se as visitas e outros banquetes10. Rui Fernandes ia várias vezes à hospedaria de Jobst Plankfelt levando-lhe produtos de Calecute, loiças, panos e sedas, açúcar candi, especiarias e

6

P. B o u r d ie u , Sociologia, São Paulo, 1983, p. 25.

7

Y. D u r a n d , Finance et Mécenat. Les Fermiers Géné-

raux au xviie Siècle, Paris, 1976, p. 235. 8

P. B

u rke,

The Italian Renaissance. Culture and So-

ciety in Italy, 2a ed., Cambridge, 2000, p. 89. Burke define a existência de cinco tipos de mecenato ou sistemas de

drogas, tintas do Oriente, animais exóticos (dois papagaios), jóias que Dürer enviava para Nu-

patrocínio, para além dos indicados.

remberga dirigidos a Hans Imhoff, o Velho, a cargo de Jacob e Endres Hessler11. Em troca os

9

feitores e outros senhores receberam mais duma centena de obras que incluíam pinturas, es­

M.R. T h e m u d o B a rata , «U m Português na Alemanha

no Tempo de Dürer: Rui Fernandes de Almada», Revista da Faculdade de Letras, III s., n° 15, p. 86. Rui Fernandes

culturas, desenhos, gravuras em cobre e em madeira12, todavia não se pode excluir que esses serviços fossem pagos de outro modo, nomeadamente em numerário ou outras formas de pa­ gamento. Segundo Maurício Lopes deduz-se que o apoio a outros artistas se fazia de m odo se­

de Almada também chegou a convidar para sua casa o artista alemão. 10

J. d e V a s c o n c e llo s , Albrecht Dürer e a sua Influência

na Península, Coimbra, 1929, pp. 39-40.

melhante, numa altura em que Antuérpia era considerada a Florença do Norte13. Também neste aspecto as esferas privada e pública se confundem, uma vez que Dürer ofe­

11

T h e m u d o B a rata ,

op. cit. (nota 2), p. 15.

receu a Rui Fernandes de Almada o retrato que pintou dele e o quadro a óleo de S. Jerónimo

12

D e Va scon cellos,

op. cit. (nota 10), pp. 43-46.

13

J.M . Lopes , Les Portugais à Anvers au xvie Siècle, A n­

que está no Museu Nacional de Arte Antiga14. Mas, no espólio da família Fernandes de Almada existiam um outro S. Jerónimo que não foi mencionado no Diário de Dürer, uma Sagrada Fa­

tuérpia, 1895, p. 17.

mília de 1509 que depois de ter passado por Munique se encontra no Museu de Roterdão e

14

ainda uma Ida para o Calvário que se encontra em Inglaterra15. Desconhece-se o destino das

Rui Fernandes de Almada encontra-se no Kupferstichka-

outras obras. O mecenato praticado a nível individual pelos mercadores e pela elite mercantil assume as

T h e m u d o B arata ,

op. cit. (nota 2), p. 15. O quadro de

binet, tal com o o «retrato dum homem novo» identifica­ do por Strasen-Gandara com o sendo o daquele portu­ guês.

três formas acima descritas e ainda a do sistema de academias16 ou corporações reguladas pe­

15

Ibidem, p. 16.

las autoridades da cidade, designadas por guildas em Antuérpia. Na guilda de S. Lucas podem

16

B urke,

op. cit. (nota 8), p. 89.

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encontrar-se artistas e patronos ou dignitários e companheiros, principalmente em finais da se­ gunda metade do século xvi e inícios do século xvii. A família Duarte17 é exemplo disso pois fa­ zia parte duma das câmaras de retórica de Antuérpia ligadas directamente à guilda de S. Lu­ cas, chamada De Violieren ou La Violette, que tinha um banquete anual e um concurso de retórica. Algumas das suas contribuições literárias foram coplas satíricas contra o domínio de Filipe II e ainda obras dramáticas que os seus membros representavam18. Durante a Idade Moderna, e tal com o Hannah Arendt19 teoriza, as esferas pública e privada estão sobrepostas o que tem repercussões no comportamento das pessoas. Assim sendo, as actividades dum qualquer elemento da Nação Portuguesa, enquanto agente do rei ou repre­ sentante da comunidade, confundem-se muitas vezes com as que possui individualmente ou desempenha com o chefe duma determinada família. Os Ximenes, Rodrigues de Évora, Veiga e Teixeira de Sampaio, para além de serem os prin­ cipais mecenas que actuam em nome da Nação Portuguesa, são também eles próprios mece­ nas. Pelo inventário de bens de Isabel da Veiga, esposa de Manuel Ximenes, conta-se um glo­ bo terrestre, um mapa mundi, uma grande carta de África, vários livros sobre instrumentos navais, astrolábios, um báculo, uns binóculos compostos por três partes e outros instrumen­ tos. A isto acrescenta-se uma câmara de alquimia com destilaria. Para além disso, Christoffel Plantijn, impressor de Antuérpia, designa os Ximenes com o seus benfeitores20. A sua impor­ tância económica era tal que possuíam várias propriedades apalaçadas na rua e praça Meir, zonas das mais conceituadas da cidade. No entanto já se nota uma certa proximidade ao po­ der político que se manifesta pela relação privilegiada de Simão Rodrigues de Évora com a in­ fanta Isabel e com o príncipe cardeal Fernando de Áustria. A família Duarte, para além de participar nas academias de retórica, financiar músicos, possuir bibliotecas e várias obras de arte, caracteriza-se ainda por apoiar a produção de obras de joalharia com a incrustação de várias pedras preciosas designadamente diamantes e péro­ las21. Isto para apenas citar os casos mais conhecidos. Tanto o mecenato comunitário com o o individual têm muito em comum. O apoio a artis­ tas; o coleccionismo; o mecenato religioso e as obras pias; as academias literárias, de pintura e desenho; o auxílio a estudantes; o fomento das ciências e do conhecimento fazem parte das actividades de ambas as vertentes mecenáticas. Tanto a Nação Portuguesa com o os seus membros da elite mercantil sefardita estimulam e investem na criação artística, demonstrando a cultura e inteligência de quem o pratica, pretendendo simultaneamente demonstrar que a sua fortuna era bem empregue22 em causas comuns e/ou individuais. O fomento do conhecimento e a sua difusão através do incentivo à publicação foi também 17

J.

da

S ilva Fig u e ir e d o , Os Peninsulares nas «G uil-

um dos objectivos das elites sefarditas. Muitos dos seus membros dividiam-se entre a dedica­ ção aos negócios e o estudo em leis, medicina e outras disciplinas. Como consumidores e pro­

das» de Flandres, Lisboa, 1941, pp. 162-169.

dutores de obras contribuíram para o desenvolvimento das oficinas de impressão e incentiva­

18

lbidem, p. 142.

19

A rendt , op. cit. (n o ta 1), p. 48.

20

J. D enucé , Afrika in de xvi de Eeuw en de Handel

ram a criação de outras, ao mesmo tempo que revelam a sua participação na produção e difusão de sistemas simbólicos segundo o referido conceito de Bourdieu. van Antwerpen, A ntuérp ia, 1937, p. 57, e A . M arques

de

A lmeida , Capitais e Capitalistas no Comércio da Especia­

O esforço de desenvolvimento do conhecimento era partilhado pelas mulheres da elite mercantil de Antuérpia uma vez que várias sabiam ler e escrever, apesar das percentagens de

ria, Lisboa, 1993, p. 71.

iliteracia serem altas dum m odo geral23. Algumas destas senhoras que se refugiam em Ames21

Stadtarchiv Antwerpen (SA), Notariaat. Gilles van

terdão sabiam assinar em hebraico o que indicia uma aprendizagem, clandestina ou não, des­

der Bossche, N 3568, fl. 110-110v.

ta língua ainda em solo da cidade do Escalda. 22

D urand , op. cit. (n o ta 7), p. 235.

23

D. Swetschinski, The Portuguese Jewish Merchants

O mecenato, a caridade e as obras pias dos mercadores da elite mercantil não se distin­ guiam das praticadas por outras elites e aristocracias europeias. Todavia, em alguns casos, tra­

o f the Seventeenth-Century Amsterdam, vol. 2, Ann Arbor

duziam-se numa especificidade relacionada com as suas convicções religiosas. Por conseguin-

(Michigan), 1987, p. 128.

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te, a caridade e as obras pias incluíam o financiamento de capelas, de casas mortuárias, túmu­ los, objectos e alfaias religiosas assim com o dos paramentos necessários aos rituais católicos. Ao mesmo tempo apoiava-se a saída de cristãos-novos da Península e providenciava-se o seu amparo ao longo da diáspora, de que é exemplo o patrocínio de Diogo Mendes na primeira metade do século xvi. No mecenato também se inclui a caridade e o financiamento de obras em igrejas. Estas actividades eram encaradas com o uma obrigação religiosa e enquadram-se na mentalidade sefardita. Ou seja, todos têm obrigação de auxiliar os seus correligionários em necessidade e manter a aliança com Deus mesmo que para isso se tivesse de pagar as alfaias necessárias aos cerimoniais católicos. O futuro dos órfãos enquadra-se neste quadro de obras pias de auxílio aos mais necessita­ dos, surgindo para o efeito as chamadas Companhias de Dotar. Em Antuérpia foi criada pela família Rodrigues de Évora uma fundação cujo modelo foi provavelmente o da comunidade judaica de Amesterdão24, esta por sua vez baseia-se na da comunidade sefardita italiana. Concluindo, a elite sefardita de Antuérpia rege-se por valores semelhantes aos de outras elites europeias, partilhando inclusivamente áreas de interesse com as aristocracias. Todavia, possuem uma especificidade que se prende com a sua origem social, geográfica, cultural e ainda com as suas convicções religiosas. O poder dos sefarditas advém da sua capacidade económica enquanto comunidade que lhes permite o acesso a bens materiais e culturais a que somente alguns grupos de topo tinham acesso. Usufruíram dessa possibilidade e utilizaram-na não só para seu próprio proveito e benefício, mas de toda a sociedade. Os membros da elite mercantil constituída pelos empresá­ rios25 ou mercadores-banqueiros26 comportavam-se com o muitos aristocratas podendo inclu­ sivamente ostentar o seu poder e prestígio social através da opulência das suas casas apalaça­ das, servidores que em muito se assemelhavam a pequenas cortes, roupas e jóias raras. Simultaneamente fomentavam as artes e o conhecimento apoiando artistas, escritores, pensa­ dores e estudantes através do seu patrocínio e mecenato, tal com o o rei português e o seu fei­ tor o haviam feito27. Os empresários, que circulavam nos vários centros de poder político, esta­ vam próximos desse poder, mas isso nem sempre lhes garantia protecção por parte de quem o detinha. Esta relação pode ser classificada com o simbiótica.

O APOIO ÀS ARTES PELA NAÇÃO PORTUGUESA DE ANTUÉRPIA PATENTE NAS ENTRADAS PRINCIPESCAS

As entradas principescas que tiveram lugar ao longo da História materializam a aliança entre o poder simbólico e o poder político. A hierarquia social e outras formas de poder com o o eco­ nómico e cultural manifestam-se nessas entradas através da ostentação preconizada por todo

24

Ibidem , p. 348. Esta companhia foi estudada por

M . B o d ia n ,

The Santa Companhia de D otar Orfans e

Donzelas Pobres in Amsterdam, 1615-1639, Jerusalém, 1988; o regulamento foi publicado por I.S. R é v a h , «L e Premier Reglement imprimé de la Santa Companhia de

um ambiente festivo, localização dessas festas, designadamente os locais ocupados por cada uma das representações, e principalmente através do cortejo propriamente dito. A simbologia

Dotar Orfans e Donzelas Pobres (Amsterdam, 16151616)», Boletim Internacional de Bibliografia Luso-Brasileira, vol. 4, 4 (Out.-Dez. 1963), pp. 650-691.

e espaço ocupado determinam a proximidade ou não desse poder político quer esteja em mãos de reis, príncipes ou governadores. Nas entradas está patente a marcação do espaço que não é meramente geográfico, mas

25

No conceito de A . M a r q u e s

espaço régio. O cortejo, que constitui toda a sustentação desse espaço idealizado e simbóli­ co, anuncia e precede o rei ou detentor do poder político que ocupa um lugar perfeitamente demarcado pelas mais altas individualidades e pelo pálio. Este, pela sua simbólica, define o centro ocupado obviam ente pela identidade m áxim a a que se quer manifestar subor­

A lm e id a ,

«O Zangão e

mação das Elites Financeiras na Europa (Séculos xv a x v ii ) » ,

que reflecte toda a carga simbólica da hierarquia social patente na proximidade ou não do

de

o Mel. Uma Metáfora sobre a Diáspora Sefardita e a For­ Oceanos, 29 (Jan-Mar. 1997), p. 29, que por sua

vez segue Schumpeter. 26

Na definição de F. M a u r o , Marchands et Mar-

chands-Banquiers Portugais au xviiième Siècle, Coimbra, 1961, pp. 19-20. 27

Lo p e s ,

op. cit. (nota 13), p. 23, e J.A. G o r is , Études

sur les colonies marchandes (portugais, espagnols, ita-

dinação.

liens) à Anvers, Lovaina, 1925, p. 223.

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Tal com o na etiqueta da vida de Corte, nos levantamentos do monarca e do rei em majes­ tade também os cortejos têm uma simbólica em que cada indivíduo ou grupo possui um comportamento específico de acordo com a posição social que ocupa. Cada um passa por um processo de aquisição das regras comportamentais que o identificavam e classificavam face aos outros. A sua posição no cortejo é em grande medida resultante da escala de valores que o aproximavam ou não à hierarquia previamente definida em termos comportamentais, sociais e consequentemente também no que diz respeito à proximidade em relação ao deten­ tor do poder político. Na Flandres a Joyeuse Entrée ou Blijde Inkomst designam a primeira entrada cerimonial dum governador numa qualquer das cidades principais do seu país. As ruas eram decoradas e a população acolhia com júbilo o seu governador. Tal com o na sociedade cada grupo ocupava um determinado espaço previamente estabelecido tanto nas ruas com o no cortejo propria­ mente dito. Cada um pretendia participar, ou fazer-se representar, ostentando objectos luxuosos e ra­ ros, roupas de tecidos e cores específicos -coisas que se podem considerar símbolos do seu poder. A distinção media-se pela capacidade aquisitiva, conhecimento e gosto erudito. Quanto maior fosse a exuberância, mais elevada se podia considerar a sua posição na sociedade e, consequentemente, nos festejos das entradas principescas tendiam a ocupar posições de des­ taque. Por conseguinte, a capacidade de apresentar um arco triunfal profusamente decorado e rico em metáforas (em que a mitologia, história e conhecimentos novos se mesclam) mostra­ va a posição de quem o financiava e corresponderia ao grau de conhecimentos atingidos por esses mecenas.

Entrada de Filipe II (1549)

Filipe II, herdeiro de Carlos V, fez a sua entrada triunfal em Antuérpia com o governador dos Países Baixos em Setembro de 1549. Todas as nações estrangeiras em Antuérpia erigiram arcos de triunfo, nomeadamente os florentinos, alemães, espanhóis, genoveses, ingleses e portugue­ ses. Estes últimos, tal com o os primeiros, levantaram algumas questões quanto ao lugar que cada uma das nações ocuparia no cortejo cerimonial28. Os florentinos não queriam ficar atrás dos genoveses, o mesmo sucedendo aos portugueses em relação aos ingleses29. Na sequência desta discórdia mandou-se retirar do cortejo as nações portuguesa e florentina30, excluindo-as, portanto, dum dos actos mais importantes de reconhecimento por parte do poder e desclassificando-as, na prática, do corpo hierárquico das diversas nações reconheci­ das ao poder político vigente na Flandres e no Império dos Habsburgos. A reacção dos portugueses não se fez esperar. Vinte portugueses resolveram apresentar-se em frente do palácio montados em belos cavalos31, cada um com seu gentil homem e dois la­ 28

L opes , op. cit. (n o ta 13), p p . 12-13.

caios, todos ricamente vestidos de seda e veludo estando ornados com ouro, diamantes, rubis 29

J.C. C alvete

de

E strella , E l Felicissim o Viaie d ’el

Muy Alto e Poderoso Pri ncipe Don Phelippe, A ntuérpia,

e outras pedras preciosas32. A sumptuosidade e ostentação da riqueza manifestada foi de tal

1552, fl. 255.

ordem que provocou admiração e tornou-se digna de ser registada para a posteridade pelos

30

Lopes , op. cit. (n o ta 13), p. 13.

cronistas.

31

C. G rapheus , Spectaculorum in Susceptione Philippi,

A ntuérpia, 1550 (folhas n ã o n u m e rad as), e C alvete trella,

32

de

Es­

op. cit. (n o ta 29), fl. 255v.

Esta atitude é significativa pois revela a importância dada ao cortejo e ao lugar ocupado por cada uma das representações. Simultaneamente, e na impossibilidade de participar, os portugueses acharam ser seu dever apresentar-se junto do palácio e demonstrar a sua presen­

C. G rapheus, L e Triomphe d'Anvers Faict en la Su-

ça de forma exuberante. Reconhecem e submetem-se à soberania de Carlos V e príncipe Fili­

section du Prince Philips, Prince d 'E spaigne 1550, apud

pe, mas a sua discordância e posição é marcada.

Lopes, op. cit. (n o ta 13), pp . 13-14.

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Pouco se sabe da identidade destes portugueses e do arco triunfal por si patrocinado, uma vez que o que ficou para a História foram os desenvolvimentos relativos à exclusão decretada por Carlos V. No entanto, e segundo Grapheus, o referido arco situava-se na rua Coriarum ela­ borado na totalidade ou em parceria com outras nações designadamente a alemã, italiana, es­ panhola e inglesa33 também representadas naquela via pública. Tendo em conta as entradas anteriores, e principalmente as posteriores, pode-se conjectu­ rar que Grapheus muito provavelmente mereceu dum patrocínio por parte da Nação Portu­ guesa para que contasse na sua obra a atitude de (in)subordinação e (des)contentamento. O mesmo não se poderá dizer relativamente a outro autor que acompanhou o príncipe Filipe e tinha a seu cargo a descrição da sua jornada, Juan Calvete de Estrella (que servia os interesses de Carlos V e príncipe Filipe), explicando em parte a discrepância relativa ao número de pes­ soas da Nação Portuguesa dado por cada um deles. Juan Calvete de Estrela minimizou a importância dos mercadores portugueses ao dar ênfase aos vinte principais e chamando lacaios aos seus acompanhantes, apesar de os descrever com espadas e de serem em igual número34. Mais tarde, J. Goris tomou os vinte mercadores com o a totalidade da representação35, quando totalizavam pelo menos quarenta. Na falta de outra docu­ mentação que corrobore ou não esta suspeita fica-se pelo registo desta perplexidade. O arco foi muito provavelmente financiado na totalidade pela Nação Portuguesa, através da bolsa resultante da taxação das mercadorias transaccionadas e da qual os mercadores par­ ticipavam na razão da sua actividade mercantil.

Entrada de Alexandre Farnese, duque de Parma (1585)

No início da década de setenta do século xvi a Nação Portuguesa contava com uma comunida­ de mercantil com menos de cem membros entre os quais vários sefarditas36. Depois da oco­ rrência de vários conflitos nomeadamente a Fúria Espanhola de 1575 e outros cercos e desor­ dens, a tendência dos portugueses que se encontravam em Antuérpia foi para uma migração para Colónia37 e outras cidades europeias. Apesar de tudo, na década de oitenta, a comunidade mercantil rondaria mais de setenta mercadores. Destes apenas trinta e quatro foram chamados a contribuir para as despesas in­ erentes à entrada do duque de Parma em Antuérpia, o que representa cerca de metade dessa comunidade, sendo escolhidos os de maior e mais estável capacidade financeira, ou pelo m e­ nos os mais fiáveis. Analisando os dados da Feitoria Portuguesa de Antuérpia38, verifica-se que dez contribuintes Desenho do arco triunfal, en Joanne Bochio,

financiam mais de 60 por cento da despesa que no total perfaz 291.640 réis. Entre esses dez maiores contribuintes estavam oito sefarditas que constituíam a elite mercantil da Nação Portu­ guesa de Antuérpia nomeadamente: Luís Fernandes, que financiou 9 por cento das despesas,

Descriptio P ub licae Gratulationis (Antuérpia, 1595), pp. 75 e 78.

33

G r a p h e u s , op.

cit. (nota 31).

34

C alvete d e E st re lla ,

Joshua Habilho; Filipe Jorge (despendeu também 9 por cento das despesas), cônsul várias ve­

35

G o r is ,

zes; Simão Soeiro (7 por cento), cônsul duas vezes, relacionado por casamento à família Nunes;

36

Sobre os conceitos de comunidade mercantil e na­

cônsul da Feitoria por vários anos, ligado por matrimónio à família Veiga e ainda familiar do im­ portante mercador de Amesterdão Duarte Fernandes, também conhecido pelo nome judaico

op. cit. (nota 29), fl. 255v.

op. cit. (nota 27), p. 54.

Dr. Álvaro Nunes (6 por cento), cônsul e médico da Nação; Luís Alvares (5 por cento), filho de Fi­

ção portuguesa de Antuérpia remete-se novamente para

lipe Jorge; Francisco Rodrigues Vila Real (4 por cento), tesoureiro da Nação; Diogo Duarte (3 por

cação.

cento), mercador que também era coleccionador de arte; Manuel Henrique (3 por cento), que

37

G o r is ,

38

Archivos Nacionais do Torre do Tom bo (A N TT),

a dissertação de doutoramento da autora desta comuni­

op. cit. (nota 27), p. 55.

foi cônsul vários anos. Todos estes sefarditas detinham interesses comerciais na Rota do Cabo e estavam estreitamente ligados ao comércio que se desenvolvia no eixo Lisboa-Antuérpia.

Casa da Feitoria de Antuérpia, Livro 5.

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5 9

As origens familiares de dois dos principais financiadores, designadamente Fernão Dias e um outro de apelido Álvares, não foram estabelecidas, mas provavelmente eram cristãosvelhos. As despesas com a entrada estavam directamente ligadas aos festejos que incluíam o fogo de artifício e a construção dum arco triunfal. O dispêndio com as actividades mecenáticas propria­ mente ditas com o o financiamento de artistas representam cerca de 11 por cento da despesa to­ tal dos festejos, designadamente 5 por cento para os pintores e 6 por cento para os músicos. O anonimato de todos os artistas mantém-se na medida em que as fontes documentais permanecem mudas quanto à sua identificação, apenas se fazendo referência à função que desempenharam.

Entrada do arquiduque Ernesto de Áustria (1594)

Das várias entradas em Antuérpia a do governador dos Países Baixos Ernesto de Áustria é a melhor documentada. A Nação Portuguesa, tal com o todas as outras nações estrangeiras e a própria cidade de Antuérpia celebraram a entrada de Ernesto com festejos que se prolonga­ ram por algum tempo. Um dos contributos da comunidade mercantil de Portugal foi a cons­ trução dum arco em madeira com várias esculturas e painéis elaboradas por vários artistas da cidade. O arco era encimado pela estátua de Neptuno segurando um globo terrestre aos pés do qual ficava o escudo com as armas de Portugal sob ele ficava a seguinte inscrição: Philippo Caroli V Caes. Avg. Filio Emmanuelis Regis. & Filia N. Lusitaniae. Algarbiorum que Regis. Mauritanico. Oethiopico. Arabico. Persico. Iberico. Atlantico. E oi Triomphatori. Gentiumque D om in a tori: Quod Ernesti Austriaci Invictiss. Principis Consilius Auspiciisque, Mare Inter Lusi­ tanos Belgasque Bello Diu Clausum Aperire ac Pacare Decreverit. N. Lusitanica P .D.D. Na mesma face podiam distinguir-se as representações da Mauritânia, Brasil, Etiópia e Índia, e dois nichos onde estavam as estátuas de Filipe II e do príncipe Filipe de Espanha39. A arquitectura do arco era clássica com baixos relevos e colunas jónicas, fazendo-se tam­ bém uso de figuras alegóricas, uma característica comum às Joyeuses Entrées flamengas40 se­ guindo também uma tradição das entradas triunfais da Antiguidade embora de cariz diferen­ ciado. Todavia, existem elementos, nomeadamente nas esculturas, que resultam das viagens de descobrimento e da expansão portuguesa, representando-se animais pouco conhecidos e um tanto ou quanto míticos ou mesmo desconhecidos para os europeus. A representação da Mauritânia inclui um leão que, embora não totalmente desconhecido na Europa, é um animal curioso e pouco vulgar; o Brasil personificado num índio sentado so­ bre um tatu gigante é definitivamente uma novidade, só possível de conhecer na Europa pelos descobrimentos portugueses; a Etiópia é representada por um negro sobre um elefante, ani­ mal que voltou a ser conhecido na Europa depois de D. Manuel ter enviado um de presente ao Papa e depois de ter sido várias vezes figurado por artistas europeus; e, finalmente, a Índia com um rinoceronte, alimária que causou espanto principalmente depois dos desenhos de Dürer serem conhecidos. As figuras representam a fauna das regiões bem com o os homens que nelas habitam submetidos ao rei de Portugal. Na frente do arco, a parte superior é dominada por Neptuno, ladeada por bandeirolas com

13)

15

39

Lopes

40

K. de J o n g e , « E n c o n t r o s P o r tu g u e s e s » , e m

op cit ( n o t a

p

as armas de Portugal e a Cruz de Cristo. Constitui o mundo dos portugueses de que o conti­ nente africano, o asiático e o Novo Mundo fazem parte, mas acentua-se o carácter de domínio

e a Flandres, L is b o a , 1992 , p . 9 0 .

6 0

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Portugal

dos mares e não da terra firme.

FRADE

A parte inferior da mesma face do arco apresenta estátuas de Filipe II e do príncipe Filipe de Espanha41, emoldurados por nichos que se inserem entre colunas jónicas. Trata-se duma alusão ao governo dos Países Baixos uma vez que o primeiro foi duque da Burgúndia e o ou­ tro governador da Flandres. A face posterior do arco é coroada por dois tritões que seguram entre si as armas de Portu­ gal e assentam sobre a inscrição: Ernesto Austri. Archiduci. Principi Virtute Fortissimo. Pietate Clementissi Bono Reip. Nato Quod. Belgium Opt. Lexibus. Sanctissimis que Institutis Reget, Lusitani Exercere42. Em cada lado da inscrição foram colocadas bandeiras que se distribuem da mesma forma que na outra face. A parte cimeira possui ainda estátuas de dois dos principais rios asiáticos: o Ganges na Índia e o Hidaspes, um dos afluentes do Indo (o actual Jhelum em Caxemira) que remete para a última grande batalha de Alexandre o Grande no século iv a.C. Mantêm-se as referências clássicas à mitologia e à história com claras alusões à grandiosidade da Antiguidade, procuran­ do fazer a ponte com a Época Moderna. Para além dos rios asiáticos, são ainda representados o rio Tejo e o rio de la Plata, o que pode ser considerado uma provocação, na medida em que as polémicas sobre o seu domínio entre portugueses e espanhóis se arrastaram. Sustentando todo o arco, entre colunas jónicas e em nichos, à semelhança do que sucedia na sua parte frontal, estavam dois reis portugueses D. João II e D. Manuel43. Curiosamente, e a acreditar em Joaquim Lopes, as figuras régias mais recentes da dinastia de Avis foram preteridas em relação aos primeiros impulsionadores dos descobrimentos e da expansão, o que pode levar a concluir por uma certa nostalgia em relação ao passado por parte da comunidade mercantil. As quatro esculturas da parte frontal que representavam a Mauritânia, o Brasil, a Etiópia e a Índia foram criadas por Maarten de Vos44. Este foi mestre arrolado na guilda de S. Lucas em 1558 e deão da mesma corporação em 1572, para além disso alguns autores referem que foi discípulo de Tintoretto em Veneza (1552-1558) tendo ainda recuperado as cores nas produ­ ções artísticas de Antuérpia. De Vos pintava geralmente motivos religiosos e mitológicos, fazia retratos e desenhava para livros e tapeçarias45, o que pode indiciar a utilização dos seus serviços de desenhador de tapeçariaa pelos mercadores portugueses de Antuérpia. Quando em 1598 se procedeu à venda das estátuas e painéis do arco dedicado ao arquiduque Ernesto para a preparação e financiamento da entrada do arquiduque Alberto e infanta Isabel, referem-se umas ramas de painéis do pintor De Vos46. Assim sendo, Maarten de Vos foi financiado e patrocinado pela Nação Portuguesa não só para a elaboração, ou pelo menos pelo desenho, das estátuas, mas também para pintar alguns painéis. Contudo, os registos de pagamento não constam da contabilidade, nem das despesas do arco triunfal arroladas e guardadas em livro nos cofres da Nação Portuguesa. As despesas listadas referem apenas os nomes de Hans Floris e Paludans. Ambos procede­ 41

Lopes, op. cit. (nota 13), p. 15.

óleo com representações de batalhas e de dois painéis com naus colocados no interior da ar­

42

Ibidem, p. 15.

cada47. Pouco se sabe da identidade destes artistas, aparentemente menores, por conseguinte

43

Ibidem.

44

D e J onge,

45

Antwerp Drawings and Prints. 16th-17th Centuries,

ram à construção do arco, estando Floris também encarregue da pintura de quatro painéis a

resta lançar algumas hipóteses de parentesco.

op. cit. (nota 40), p. 91.

Hans Floris era provavelmente familiar de Frans Floris (1516/1520-1570), mestre em 1540 depois de ter estado em Itália onde se inspirou nos artistas italianos. Os seus trabalhos caracte­

Antuérpia, 1976-1977, pp. 22 e 34.

rizavam-se pela monumentalidade e pelas figuras humanas bem representadas anato mica­ 46

ANTT, Casa da Feitoria de Antuérpia, Livro 5.

47

Ibidem.

48

Antwerp Drawings..., op. cit. (nota 45), p. 22.

mente apesar de reforçar a musculatura. Os seus contemporâneos elogiaram-no e considera­ vam que tinha sido este artista a levar a Renascença para o Norte da Europa, todavia os historiadores de arte são menos entusiastas48. Se Hans Floris for familiar de Frans Floris era-o

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61

Entrada do Arquiduque Ernesto (1594) Contribuintes Duarte Ximenes

20%

20%

■ Manuel Henriques □ Nicolau Rodrigues de Évora □ Simão Rodrigues de Évora ■ Filipe Jorge □ Diogo Rodrigues de Andrade ■ Francisco Duarte □ João Mendes ■ Luís Fernandes ■ Diogo Duarte □ Outros

Entrada do Arquiduque Ernesto

Despesas

□ pintores, escultores e carpinteiros ■ músicos e cantores □ outras

Entrada do Arquiduque Alberto e Infanta Isabel (1599) ■ Duarte Ximenes ■ Filipe Jorge □ Nicolau Rodrigues de Évora □ Simão Rodrigues de Évora ■ João Mendes Henriques □ Luís Fernandes ■ Francisco Godines □ Nicolau da Veiga ■ Diogo Duarte ■ Manuel Teixeira □ Outros

D espesas da Entrada do A rq u id u q u e A lb erto (1599)

□ pintores ■ escultores □ músicos D escritor ■ outros 2%

6 2

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4%

também de Corneille Floris de Vriendt (1516-1570) arquitecto e escultor49, tornando-o m em ­ bro duma família com tradições na pintura, escultura e arquitectura. No que se refere a Paludans, de que se desconhece o primeiro nome, passa-se exactamen­ te a mesma situação. Entre os artistas flamengos surge um Guillielmus Paludanus (1530-1579) com prováveis ligações familiares ao executor do arco triunfal patrocinado pelos portugueses. É curioso verificar que desde 1590 que os ordenados dos oficiais da Feitoria não eram pa­ gos por não haver dinheiro disponível50, o que não foi impeditivo do financiamento das festas em honra do arquiduque pois delas também dependia a afirmação da posição da Nação Por­ tuguesa em Antuérpia. A falta crónica de dinheiro determinou a venda em leilão das pinturas e tabuados do arco da entrada do arquiduque Ernesto. Desse rendimento foram pagas algumas despesas feitas com a entrada em 1599 do arquiduque Alberto e a declaração de salvaguarda das fazendas dos portugueses pelos Estados Gerais da Holanda e Zelândia51. Ou seja, as despesas feitas para garantir o apoio político por parte das autoridades dos Países Baixos eram consideradas essen­ ciais e prioritárias. Por falta de capacidade de resposta da Bolsa da Nação, que tinha com o função garantir um fundo de maneio que pudesse fazer face a festas, obras pias e apoio dos necessitados, coube aos mercadores da Nação Portuguesa o financiamento dos festejos da entrada do arqui­ duque Ernesto de Áustria, mas nem todos os seus membros participaram na finta. A 27 de Ja­ neiro de 1594 foi feita uma reunião para decidir quem deveria participar no financiamento da entrada tendo-se escolhido vinte sete mercadores52, destes apenas vinte contribuíram efectiva­ mente e dezassete foram duplamente fintados. No início da década de noventa os mercadores portugueses em Antuérpia eram setenta e sete53, constituindo o grupo de negociantes cobrados cerca dum quarto da comunidade mer­ cantil. Analisando os participantes no financiamento verifica-se que os dez principais financiadores são todos sefarditas com interesses no comércio da Rota do Cabo, alguns já com ramifica­ ções no Império espanhol das Américas, e de ascensão social nos Países Baixos. Duarte Xime­ nes é parente da família Veiga tal com o Nicolau e Simão Rodrigues de Évora; também parentes da família Veiga são Luís Fernandes e Diogo Rodrigues de Andrade; Manuel Henri­ ques que desempenhou várias funções na Nação Portuguesa, familiar de João Mendes tam­ bém com funções na mesma instituição; Filipe Jorge; e por fim Francisco e Diogo Duarte, liga­ dos por elos de parentesco, mas parte integrante e não menos importante da elite mercantil portuguesa de Antuérpia. O dinheiro resultante da finta feita pelos mercadores54 foi empregue na sua maior parte no pagamento da construção e pintura do arco que incluía também alguns painéis a óleo. Mas, também foram patrocinados alguns músicos e cantores que actuaram aquando da entrada do arquiduque e nas três noites seguintes. Para além destas despesas contabiliza-se o dinheiro gasto com bandeiras, tanto do arco como para a igreja de S. Francisco, também elas foram pintadas por artistas que o sabiam fa­ zer utilizando a prata.

49

R. G en a ille , L’A rt Flamand, Paris, 1965, p. 69.

50

ANTT, Casa da Feitoria de Antuérpia, Livro 2, fl.

110v.

Tendo em conta as outras entradas principescas, conjectura-se se Joanne Bochio, o cronis­ 51

Ibidem, fls. 110v-111.

Nação. Todavia, e tal com o sucedeu a Maarten de Vos, o pagamento provavelmente fez parte

52

ANTT, Casa da Feitoria de Antuérpia, Livro 2.

duma contabilidade que não a dos Livros da Nação.

53

SAA, Natie van Portugal, Livro 2, fl. 132-132v, e Go­

ta que relatou e incluiu no seu livro as gravuras do arco triunfal, teria sido também pago pela

De qualquer forma sabe-se que Joanne Bochio era um estudioso de latim e foi nomeado secretário municipal após ter escrito um livro sobre Alexandre Farnese. Sucederam-lhe duas

ris, op. cit. (nota 27), p. 55. 54

ANTT, Casa da Feitoria de Antuérpia, Livro 5.

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obras sobre as entradas de Ernesto e a de Alberto e Isabel sendo incluídas em ambas as gravu­ ras dos arcos triunfais feitas por Pieter van der Borcht55, mas dos quais não há qualquer notícia na documentação consultada. Os dados que se possuem reportam-se a uma parcela que representa mais de 7% das des­ pesas totais da entrada onde se aglutinam várias despesas56, entre elas conta-se a defesa dos alojamentos do arquiduque (garantida por um furriel de corte), vinte pistoletes de ouro para um dos homens que rodeavam o secretário, um presente de frutas ao secretário e ainda a ida do porteiro da Nação Portuguesa a Bruxelas. Não se especifica de quem se trata e se tudo foi enviado para Bruxelas ou tal se refere a Antuérpia.

Entrada do Arquiduque Alberto e Infanta Isabel (1599)

Poucos anos passados novos festejos se anunciaram uma vez que Ernesto de Áustria faleceu pouco depois da sua entrada em Antuérpia. O seu sucessor o arquiduque Alberto e a infanta Isabel filha de Filipe II foram primeiro recebidos em Bruxelas e só depois em Antuérpia como governadores dos Países Baixos. Em sua honra os portugueses mandaram erigir um arco do triunfo com uma inscrição que referia para os privilégios concedidos por João IV duque do Brabante, aos portugueses antes de se estabelecerem em Antuérpia: Ob insignia privilegia a Joanne IV Brabantiae - Duce Lusitanis concessa in m em oriam - Eadem natio veneratur57. Este arco foi elaborado pelos mais conceituados pintores e beneficiou ainda do trabalho, conhecimentos e arte de outros pintores menos conhecidos. Para além disso os festejos incluí­ ram ainda sessões de música com trombetas e tambores durante vários dias, sendo ainda rela­ tada a participação dos portugueses na entrada e festejos, assim com o o seu arco foi descrito e desenhado num livro cujo objectivo era perpetuar a memória da festa. Os administradores da entrada do arquiduque e infanta foram escolhidos pela Nação Por­ tuguesa, tendo a escolha recaído sobre Álvaro Nunes, Manuel Ximenes e Pedro da Veiga58, to­ dos mercadores sefarditas de Antuérpia. Álvaro Nunes foi cônsul da feitoria de Antuérpia em 1584 e estava ligado ao comércio da Rota da Índia. Era ainda possuidor de vasta biblioteca de livros de Medicina59. Manuel Ximenes foi cônsul da feitoria de Antuérpia em 1598 e tesoureiro da mesma em 1603. Foi posteriormen­ te nomeado cavaleiro em 1615. Estava ligado ao comércio com África e Oriente. Por casamen­ to, Manuel Ximenes estava ligado à família Veiga. Pedro da Veiga, por sua vez, não desempen­ Fac-símile da obra d e Joanne Bochio, D escriptio Publicae Gratulationis (Antuérpia, 1595).

hou cargos de destaque na Nação Portuguesa. Era filho do mercador lisboeta Vasco Martins da Veiga e genro de Simão Rodrigues de Évora. Dedicava-se ao comércio com o Oriente e o Bra­ sil, e quando faleceu deixou uma fortuna considerável à sua viúva. Os festejos tiveram lugar em 1599, mas desde finais de 1598 que a nação se preparou para fazer face às grandes despesas que se avizinhavam60. Em Outubro decidiu-se que, para se ter

55

H. Mielke, The Ceremonial Entry o f Ernest, Archidu-

ke o f Austria, into Antwerp, June 14, 1594, Nova Iorque, 1970, pp. XI-XIII.

acesso aos privilégios da Nação, tinha-se também de estar de contas certas com a mesma. Deste modo, os cônsules tinham de certificar-se do pagamento das fintas pelos membros da Nação e passar o respectivo comprovativo a cada um dos mercadores. Aparentemente houve

56

ANTT, Casa da Feitoria de Antuérpia, Livro 5.

57

Lopes, op. cit. (nota 13), p. 15.

58

ANTT, Casa da Feitoria de Antuérpia, Livro 2.

59

H. Pohl, Die Portugiesen in Antwerpen (1567-1648),

alguma relutância em se ser fintado para tal fim.

6 4

Foi nesta altura que se decidiu vender em leilão as pinturas, estátuas e vários componentes do arco dedicado ao arquiduque Ernesto de forma a aligeirar um pouco as obrigações dos contribuintes e, principalmente, financiar a declaração sobre as fazendas dos portugueses pe­

Wiesbaden, 1977, p. 365.

los Estados Gerais. Ou seja, pretendia-se financiar uma garantia que permitisse a devolução to­

60

tal ou parcial dos bens que tinham sido apreendidos em período de batalhas, e isso fez-se à

ANTT, Casa da Feitoria de Antuérpia, Livro 2.

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custa da venda de obras de arte financiadas pelos próprios mercadores individualmente ou em grupo. Desse modo, foram vendidos dez estátuas grandes e oito pequenas, e ainda dois pai­ néis do arco e outros que ficaram do pintor De Vos61 no valor total de cerca de 142.000 réis. A finta foi paga por vinte sete mercadores62, o que representa uma percentagem de cerca de 25% do total da comunidade mercantil. Os fintados pagaram 1.824.000 réis por duas vezes o que é a maior despesa de sempre feita por portugueses com as festas de entradas principes­ cas em Antuérpia. Entre os dez principais contribuintes encontra-se a elite mercantil portuguesa de finais do século xvi em Antuérpia, ou seja as famílias de origem judaica da Península Ibérica Ximenes, Desenho de arco triunfal, en Joanne Bochio,

Jorge, Rodrigues de Évora, Henriques, Fernandes, Godines, Veiga, Duarte e Teixeira, algumas delas já com aspirações à aristocracia flamenga e mesmo à dos reinos ibéricos. Precisamente

P om p a e Triumphalis e t S pectaculoru m (Antuérpia, 1602).

as famílias que praticavam o mecenato a nível individual uma vez que também financiavam pintores, escultores, gravadores, ourives, impressores, músicos, cantores, escritores entre mui­ tos outros. As verbas conseguidas serviram para pagar na sua maioria a madeira, construção e pintura do arco triunfal63. Sabe-se inclusivamente o nome do carpinteiro, António Craen, que lhe deu o feitio e o acrescentou. Estiveram envolvidos vários pintores, um deles Baltazar pintou o arcaboiço. Mas, para além dele, contam-se Octávio W ienen e Miguel Cunhet, que participaram na pintura artística do arco e também fizeram modelos de tracção do mesmo. Pelas informações disponíveis, não se consegue perceber se esses modelos se destinavam a fazer deslocar o arco ou as figuras de­ corativas que dele faziam parte. A pintura artística propriamente dita esteve a cargo de duas personalidades de peso no mundo da pintura: Maarten de Vos, a quem coube a maior parte dos painéis, e a Rubens, que apenas fez dois painéis. Os escultores participaram com a elaboração de quatro grifos e quatro anjos com escudos, com quatro colunas com os escudos de Portugal, dois escudos das armas de Portugal em es­ cala grande e ainda dez estátuas grandes que não se sabe o que representavam. As fontes são mudas quanto à identidade dos escultores tal com o à dos músicos. No entanto sabe-se que durante três ou quatro dias a música entoou saída de instrumentos de cordas, percussão e so­ pro. Eram quatro tambores e cinco trombetas, mas o número dos tangedores não é indicado. Tal como nas entradas principescas anteriores, tudo foi relatado em livro. Por conseguinte, os portugueses pagaram ao secretário uma saca de prata dourada para fazer os dísticos, desenhar as traças do arco e fazer também uma honrosa menção aos portugueses. Para além das despesas referidas há ainda a mencionar o fogo de artifício que também fez parte dos fes­ tejos, sendo o seu custo percentualmente acima da do que o escritor recebeu.

Concluindo, o mecenato da Nação Portuguesa de Antuérpia durante o século xvi, principal­ mente na segunda metade, resulta essencialmente do esforço de algumas famílias bem identi­ ficadas que fazem parte da elite mercantil portuguesa da cidade do Escalda em particular e da elite mercantil internacional de m odo geral. Tratam-se de mercadores-banqueiros na designa­ ção de Frédèric Mauro ou de empresários pela definição de A. Marques de Almeida. É a nata da elite mercantil com grande capacidade financeira e crédito que, grosso modo, impulsiona­ ram muito o comércio e a finança na Flandres com repercussões mundiais. 61

Ibidem, Livro 5.

gando alguns a almejar a ascensão à nobreza, conseguindo títulos nobiliárquicos por via de

62

Ibidem, Livro 2.

estratégias matrimoniais bem delineadas. Alguns ramos familiares destes comerciantes preferi­

63

Ibidem, Livro 5.

Esses mercadores encabeçavam casas comerciais de grande prestígio internacional, che­

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6 5

ram refugiar-se no final do século xvi em Amesterdão, onde se reuniram na comunidade judai­ ca daquela cidade holandesa; outros mantiveram-se em Portugal e muitos dispersaram-se pelo globo onde as suas famílias tinham interesses ou casas comerciais. As opções religiosas de cada um, impostas ou não, são variadas, todavia a sua origem é o judaísmo de cariz sefardita tal com o a sua formação e cultura. No período que medeia entre 1549 e 1599 as despesas com entradas levadas a cabo pela Nação Portuguesa são pagas na sua maioria por diversas famílias ou casas comerciais. A maior contribuinte foi a dos Rodrigues de Évora com 15 por cento, seguida da dos Ximenes com 14 por cento e da dos Jorge com 10 por cento. Sucedem-se as famílias Duarte (8 por cen­ to), Fernandes (7 por cento), Veiga (6 por cento), Mendes Henriques, Godines e Teixeira com 4% cada uma e por fim a família Henriques com 3 por cento. A o longo dos tempos verifica-se um aumento exponencial das despesas levadas a cabo pela Nação Portuguesa em Antuérpia e das referidas famílias. Tendo em conta o período estu­ dado conclui-se que uma das maiores despesas que a Nação Portuguesa tinha na Flandres era a de financiar entradas, o que resultava num esforço mecenático de grande envergadura pois quem beneficiava disso eram os artistas envolvidos, fossem pintores, escultores, gravadores, escritores ou outros. Alguns deles reconhecidos internacionalmente com o Peter Paul Rubens ou Maarten de Vos. Nos anos oitenta as despesas com as entradas triunfais registadas não iam além dos 300.000 réis, mas no fim da década de noventa chega-se a despender mais de 1.800.000 réis. Tal não se deverá exclusivamente à inflação geral do período. Este aumento das despesas da Nação Portuguesa revela o interesse em se afirmar na cidade de Antuérpia tornando-a na pla­ taforma distributiva do comércio internacional. Para além disso, manifesta ainda o esforço dos portugueses em serem aceites e reconhecidos pelas autoridades flamengas, patente não só nos vários presentes oferecidos a detentores de altos cargos na administração da cidade e da Flandres, mas em tudo o que atrás fica demonstrado.

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