A Democracia Que Não Ousa Dizer Seu Nome

May 30, 2017 | Autor: C. Pereira da Sil... | Categoria: Brazilian Studies, Brazilian History, Democratization, Civil Society and the Public Sphere, Brazil, Deliberative Democracy, Corruption (Corruption), Political Corruption, Democracy, Participatory Democracy, Brazilian Politics, Civil Society, História do Brasil, Comparative Politics, Democratization, Authoritarian Regimes, Regime Change, Concept Analysis, Measurement, Brasil, Corruption, Impeachment, Pensamento Social Brasileiro, Sociedade civil, Democracia, Corrupción, Lula's government, gramáticas políticas no Brasil, Ciência Política brasileira, Transición de la Dictadura a la Democracia, Pensamento Político Brasileiro, Judicialização, Nova República, Instrumental use of presidential impeachments, executive and legislative relations in latin america, Paraguay 2012, Corrupção, Política Brasileira E Partidos Políticos, Entre Outros, Fernando Henrique Cardoso, Judicialization of Politics, Política no Brasil Governo Lula e Dilma, Siituacion Politica De Brasil, Fernando Collor, Deliberative Democracy, Corruption (Corruption), Political Corruption, Democracy, Participatory Democracy, Brazilian Politics, Civil Society, História do Brasil, Comparative Politics, Democratization, Authoritarian Regimes, Regime Change, Concept Analysis, Measurement, Brasil, Corruption, Impeachment, Pensamento Social Brasileiro, Sociedade civil, Democracia, Corrupción, Lula's government, gramáticas políticas no Brasil, Ciência Política brasileira, Transición de la Dictadura a la Democracia, Pensamento Político Brasileiro, Judicialização, Nova República, Instrumental use of presidential impeachments, executive and legislative relations in latin america, Paraguay 2012, Corrupção, Política Brasileira E Partidos Políticos, Entre Outros, Fernando Henrique Cardoso, Judicialization of Politics, Política no Brasil Governo Lula e Dilma, Siituacion Politica De Brasil, Fernando Collor
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A Democracia Que Não Ousa Dizer Seu Nome Carlos Frederico Pereira da Silva Gama1

Publicado em SRZD em 31 de Agosto de 2016 – http://www.sidneyrezende.com/noticia/267159

As maiores manifestações de rua no Brasil desde as Diretas Já motivaram a Presidência da República a propor pactos em 2013. A diversidade e contundência das demandas não cabiam num pacote de medidas provisórias. Exigiam articulações entre a sociedade e o sistema político que possibilitassem mudanças constitucionais. Os pactos de Dilma Rousseff incluíam a preservação dos fundamentos da economia, um plebiscito para a criação de Constituinte exclusiva para a reforma política, combate à corrupção e investimentos de longo prazo em educação, saúde e transportes. Os pactos sumiram na fumaça da governabilidade, no ritmo da campanha eleitoral de 2014. Partido que ocupava a presidência das duas casas do Congresso e a vice-presidência da República (Michel Temer), o PMDB mostrou seu desagrado com as propostas em vésperas de uma eleição presidencial. Na base do governo e na oposição, outros partidos demonstraram seu desinteresse pelas demandas e seu desconforto com a contestação das ruas, oriunda de movimentos políticos não-tradicionais. Em 2015 as ruas estavam novamente cheias. Dessa vez, pedindo o impeachment da Presidenta reeleita com 54 milhões de votos. Na campanha, Dilma prometera mais mudanças. No retorno ao Planalto, decisões que tomou no segundo governo bloquearam qualquer crença na transformação. A reforma política foi engavetada. Saúde e Educação sofreram dramáticos cortes orçamentários, bem como investimentos em infraestrutura. Dantes parte dos pactos, a responsabilidade fiscal se tornou uma justificativa para a sangria. Através de múltiplas mídias, escândalos de corrupção se tornaram uma presença constante no cotidiano do país, envolvendo ministros de estado, lideranças partidárias e os presidentes da Câmara (Eduardo Cunha) e Senado (Renan Calheiros). O ano terminou num processo de impeachment (todos os presidentes eleitos pós-1988 tiveram os seus). Os pactos de 2013 retornaram, como assombrações vingativas, ao palco do impeachment em 2016. Com a qualidade de vida a perigo, índices econômicos em queda e investimentos adiados, a pauta política e jornalística se centrou na disputa surda entre a Presidenta afastada e o Vice interino. Em números recordes, manifestantes superavam simbolicamente as Diretas. Enquanto redes sociais se tornavam canais de ódio e válvulas de escape para demandas insatisfeitas no sistema político, nas ruas a reforma política era entoada juntamente com os cânticos do impeachment. A saída de uma Presidenta eleita pelo voto direto pela segunda vez era exibida e exigida, a plenos pulmões. A Nova República caiu num profundo paroxismo. Após ciclos de inclusão de novas elites e de aumento da participação política de milhões dantes apartados do protagonismo democrático, o

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Professor de Relações Internacionais e Diretor de Assuntos Internacionais da Universidade Federal do Tocantins (UFT).

sistema político demonstrou inquietude. Diante de contestações, se fechou. Denúncias de corrupção foram aceitas em silêncio, na esperança que de o impeachment de Dilma fosse suficiente. Entre os governos Dilma e Temer, a Nova República expôs suas chagas sem chegar a um bom termo. As políticas do segundo governo Dilma – já bastante aquém de “mais mudanças” – caíram no abismo da interinidade. Uma brutal reversão de expectativas pôs a perigo as conquistas de três décadas. Consumado o segundo impeachment em 24 anos e a passagem do governo Dilma ao governo Temer, a jovem democracia brasileira ainda não tem o que dizer às demandas da atual geração. Do impeachment de Fernando Collor, conduzido por PMDB, PT e PSDB, chegamos ao impeachment de Dilma. O PMDB criou uma Constituição. O PSDB estabilizou a economia. O PT multiplicou a justiça social. Mas os três parecem incapazes de se desvencilhar da lógica incômoda do impeachment. O revanchismo eleitoral passou a ser grafitado com frequência nos muros do Alvorada. Ao veredito derradeiro das urnas, em seu trajeto a Nova República adicionou outros dois. Primeiramente, o incômodo impeachment se tornou variável política fundamental. Vitórias nas urnas, doravante, passarão pelo crivo do Parlamento contestado. Essa dinâmica não é inovadora: remonta aos idos da República Velha, cujo Senado se notabilizou por “fazedores de reis”. Em seguida, a palavra burilada das Cortes. A atuação do Supremo Tribunal Federal cresceu em envergadura política. Suas decisões rivalizam com a representatividade de urnas e ruas. Numa bizarra conjunção, a jovem democracia brasileira é louvada por sua fidelidade às minúcias do estado democrático de direito e criticada por suas contradições, resultados e dificuldade de planejamento. Uma democracia que não ousa dizer seu nome – embora este figure com destaque nas análises de observadores estrangeiros e organismos internacionais. A corrupção – estigma capaz de abreviar governos de PIBinhos, estímulo para a governabilidade e a “união nacional” entre crises, combustível nos “milagres” econômicos – permanece no horizonte e afeta a percepção política. Muitas autoridades que decidiram a deposição de Rousseff estão sob a mira dos operadores da lei. Paradoxalmente, manifestações de ódio alimentam a inércia da representação. O presidencialismo de coalizão não planejou acolher os grupos que participaram das transformações dos últimos 30 anos. Essas forças não se acomodaram e levaram o sistema a seus limites. O repúdio a eleitos nas urnas não é um sinal de amadurecimento democrático, mas dos limites da participação política na Nova República. O veto tardio do impeachment e a soberania vicária das cortes são sintomas dessa desconexão entre representados insatisfeitos e seus eleitos. A novidade das jornadas de 2013 não era a utopia. Pontos de chegada eram menos importantes que os de partida: as desconexões de um Brasil emergente, silenciadas e ignoradas. Ao repolitizar a política, manifestações manifestaram os limites da representação, tornaram mais doídas as feridas. O Brasil de 2016 é menos injusto, menos desigual, mais diverso e mais próspero que o de 1992 ou 1985. Isso parece pouco, diante das demandas dos que se sentem alijados do sistema político – ou daqueles que carregam os efeitos desse mesmo sistema no curso de suas vidas. As contradições da democracia que não ousa dizer seu nome não serão superadas com polícia. Se a política é o começo, o trajeto passa inexoravelmente pelas urnas. Por décadas, lutamos pelo direito de lidar com esses dilemas. Eles vieram com força em 2016 – e não temos rotas de fuga.

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