A evolução da ocupação arquitectónica do quarteirão com os n.ºs 222 a 240 da avenida da Liberdade

Share Embed


Descrição do Produto

Arquivo Municipal de Lisboa

UM ACERVO PARA A HISTÓRIA

A evolução da ocupação arquitectónica do quarteirão com os n.os 222 e 240 da avenida da Liberdade Pedro Miguel Teixeira Fidalgo (IHC-FCSH/NOVA) Introdução A avenida da Liberdade apresenta-se, desde a sua inauguração em 1886, como a mais importante e prestigiante artéria da cidade de Lisboa, traduzindo-se esse estatuto no uso corrente do termo Avenida para abreviar a sua nomeação (fig. 1). Assim, falar-se em avenida da Liberdade ou em Avenida são alocuções com o mesmo significado, mas em que o recurso apenas ao termo que expressa a função, utilizado no segundo caso, traduz na sua essência a primazia e relevância deste espaço no imaginário nacional.

Figura 1 - A Avenida em 19051. 1 - Objetivo A reconstituição da evolução da ocupação arquitetónica do quarteirão com os n.os 222 a 240 da avenida da Liberdade integra-se dentro do projeto do investigação “Dos Restauradores ao Marquês - Evolução de uma paisagem” que pretende contribuir para o conhecimento da evolução urbanística, arquitetónica e morfológica da avenida da Liberdade, num estudo transversal que considera diferentes vertentes temáticas de análise, de modo a determinar as alterações porque têm passado esta referência urbanística da cidade de Lisboa, desde a sua conceção até à atualidade.

2 - Metodologia Este estudo recorre às fontes correntes de investigação, com especial incidência na análise dos processos de obras e do acervo fotográfico do Arquivo Municipal de Lisboa, e levantamentos in loco, associados e referenciados numa base de dados. 1

Litografia “Avenida da Liberdade” por SILVA, João Ribeiro Cristino – Avenida da Liberdade. [Lisboa]: A Editora, [1905].

289

A análise desta base de dados permite reconstituir o processo evolutivo deste quarteirão, estabelecendose para o efeito um conjunto de datas consideradas como relevantes, tendo em consideração a cartografia disponível e a história da cidade e do país. Os resultados da análise são transpostos graficamente em plantas, cortes e esquemas temáticos.

3 - Aproximação genérica Num primeiro momento, de modo a aprofundar o conhecimento sobre a evolução espacial da área em estudo e a estabelecer bases de trabalho, que servissem de suporte ao desenvolvimento e à apresentação do trabalho, foi feita uma sobreposição evolutiva de registos cartográficos efetuados em momentos diferentes (fig. 2).

A evolução da ocupação arquitectónica do quarteirão com os n.os 222 e 240 da avenida da Liberdade - Pedro Miguel Teixeira Fidalgo

Figura 2 - Análise evolutiva e comparativa de diferentes registos cartográficos relativos à área de implantação da Avenida. 4 - Análise focalizada O quarteirão correspondente aos n.os 222 a 240, que se apresenta como o penúltimo do lado direito, para quem sobe a Avenida, encontra-se delimitado a norte pela avenida Alexandre Herculano e a sul para rua Barata Salgueiro (figuras 3 e 4).

Figura 3 - Vista do quarteirão com os n.os 222 a 240, a partir do cruzamento da avenida da Liberdade com a avenida Alexandre Herculano, em 19056. 2

Extrato de VIEIRA DA SILVA, Augusto – Planta Topográfica de Lisboa feita em 1812. Plantas Topográficas de Lisboa. Lisboa: [s.n.], 1947.

3

Extrato de FOLQUE, Filipe (dir.) – Atlas da Carta Topográfica de Lisboa: 1856-1858. Lisboa: CML/Arquivo Municipal de Lisboa, [s.d.].

4

Extrato de VIEGAS, Inês Morais; TOJAL, Alexandre (coor.) – Levantamento da Planta de Lisboa: 1904-1911. Lisboa: DMC/Arquivo Municipal de Lisboa, 2005.

5

Extrato de PORTUGAL. Câmara Municipal de Lisboa – Planta digital da cidade de Lisboa. Lisboa: [s.n.], 2014.

6

Extrato da litografia “Avenida da Liberdade” por SILVA, João Ribeiro Cristino – op. cit.

290

Figura 4 - Planta do quarteirão com os nos. 222 a 240 da avenida da Liberdade, em 20147. A geometria deste quarteirão resulta da solução adotada pelo engenheiro Ressano Garcia na conceção do projeto de construção da Avenida e dos arruamentos envolventes. A implantação do perfil da Avenida levou, neste local utilizado então como terreno de cultivo, à execução de aterros com cerca de 3,5 metros, relativamente à cota pré-existente. Quando a Avenida foi inaugurada a área correspondente ao quarteirão encontrava-se desocupada de construções, tendo-se seguido o processo de venda e construção dos diferentes lotes em que este foi repartido.

Figura 5 - Evolução da ocupação do quarteirão, entre 1886 e 1894. Apresenta a tracejado curto as delimitações dos imóveis pré-existentes e a tracejado longo o perímetro acima do solo. Base construída a partir de PORTUGAL. Câmara Municipal de Lisboa – Planta digital da cidade de Lisboa.

7

291

A evolução da ocupação arquitectónica do quarteirão com os n.os 222 e 240 da avenida da Liberdade - Pedro Miguel Teixeira Fidalgo

A partir da análise dos processos de obra, e de um conjunto de fotografias pertencentes ao Arquivo Municipal de Lisboa, foi possível reconstituir a evolução da sua ocupação entre 1886 e 1894 (fig. 5), assim como a evolução da ocupação e dos alçados para os anos de 1910, 1940, 1974, 2000, e 2014 (figuras 6 e 7).

A evolução da ocupação arquitectónica do quarteirão com os n.os 222 e 240 da avenida da Liberdade - Pedro Miguel Teixeira Fidalgo

Figura 6 - Evolução da ocupação e dos alçados do quarteirão, entre 1910 e 2014.

Figura 7 - Comparação entre os alçados existentes em 1910 e 2014. 292

Este estudo comparou também a evolução das áreas brutas de construção de cada imóvel deste quarteirão, entre 1910 e 2014, mostrando que estas passaram, no total do seu conjunto, de 25.010m2 para 44.721m2 respetivamente, correspondendo a um aumento de 78,8% (fig. 8).

Figura 8 - Distribuição comparativa das áreas de construção dos diferentes imóveis, entre 1910 e 2014.

Figura 9 - Ocupação funcional dos diferentes imóveis em 201410.

8

Por exemplo, o nº. 222 apresenta o seu rés-do-chão ocupado com um consultório médico, integrado no grupo “escritórios”, e o piso -2 com “comércio”.

9

Nos. 222, 224, 230 e 240.

A 6 de novembro de 2014. Para os imóveis que se encontram em obras de remodelação total foi considerado o seu estado e nº. de pisos antes destas intervenções.

10

293

A evolução da ocupação arquitectónica do quarteirão com os n.os 222 e 240 da avenida da Liberdade - Pedro Miguel Teixeira Fidalgo

Originalmente, todos os imóveis foram destinados a habitação. No entanto, ao longo dos anos, muitos das frações viram o seu uso funcional alterado8 e os edificios que vieram ocupar o lugar dos imóveis demolidos9 foram priojetados para usos diferentes. De modo a avaliar a grandeza destas alterações, foi feito um levantamento à distribuição das principais utilizações, para este quarteirão (fig. 9).

A confrontação dos valores dados pelos gráficos das figuras 8 e 9, relativamente a 2014, permite estimar as áreas brutas de ocupação para as principais utilizações, sintetisadas na seguinte tabela:

Utilização

Área

% (sobre 44.721m2)



Sem ocupação

15.536 34.74



Estacionamento

8.404 18.79



Habitação

2.126 4.75



Comércio

885 1.98



Escritórios

9.787 21.88



Banca

7.983 17.85

Conclusões A análise a este quarteirão permite destacar que dos 9 imóveis existentes em 1910: • 2 foram totalmente demolidos11; • 4 foram parcialmente demolidos, subsistindo apenas os seus alçados12; • 2 encontram-se em obras de renovação total13; • Existe 1 devoluto que se encontra classificado como Imóvel de Interesse Público14; • 2 encontram-se habitados, vivendo neles cerca de 12 pessoas15.

A evolução da ocupação arquitectónica do quarteirão com os n.os 222 e 240 da avenida da Liberdade - Pedro Miguel Teixeira Fidalgo

De referir ainda que ao imóvel que substituiu o edifício que ocupou originalmente o lote com o nº 222, foi atribuído em 1988, por unanimidade, o Prémio Valmor. Em continuidade, foi possível determinar que: • A evolução da área bruta de construção deste quarteirão, entre 1910 e 2014, teve um incremento de 78,8%. • Quase 35% da área de contrução existente não tem uso definido, encontrando-se em obras reconstrução ou simplesmente devoluta. • A área de estacionamento ocupa quase 19% do espaço total construido, localizando-se quase na sua totalidade ao nivel do sub-solo16. • A área utilizada com habitação, limita-se atualmente a menos de 5% da área construida. • O setor terciário ocupa quase 40% da área de construção existente.

11

Nos. 222 e 230.

12

Nos. 224, 236 (em fase final de obra), 238 (em fase inicial de obra) e 240.

13

Nos. 236 (em fase final de obra) e 238 (em fase inicial de obra).

14

Nos. 226-228, conhecido por palacete Conceição Silva.

Contagem efetuada pelo autor em 6 de novembro de 2014. No no. 222 - Cave Direita: 1 residente; no 2º Andar Direito: 2 residentes. No nº. 234 - Cave: 1 residente; no 1º Piso: 2 residentes; no 2º Piso: 1 residente; no 3º Piso: 2 residentes; no 5º Piso: 1 residente; e no 6º Piso: 2 residentes. 15

16

As exceções referem-se às áreas das acessibilidades, necessárias à transição do nível da rua para os níveis inferiores.

294

FONTES E BIBLIOGRAFIA FONTES Arquivo Municipal de Lisboa Estudos de Conjunto da Avenida da Liberdade e Imediações - Relatório, 3ª. Repartição - Arquitectura, 28-11-1958, PT/ AMLSB/CMLSB/UROB-PU/10/439. Obra nº 6880. Obra nº 12362. Obra nº 17817. Obra nº 18896. Obra nº 23321. Obra nº 58881. Obra no 61276. Obra nº 62957.

FONTES ICONOGRÁFICAS Alberto Carlos Lima, Avenida da Liberdade, início séc. XX, PT/AMLSB/LIM/000933. Alberto Carlos Lima, Carnaval, carro alegórico à negociata dos tabacos, 1906, PT/AMLSB/LIM/001881. António Novais, Efeitos de uma granada num edifício na avenida da Liberdade, que acabou por se incendiar, [s.d. (1910)], PT/AMLSB/ANV/000840.

Artur Goulart, Avenida da Liberdade, esquina com a rua Alexandre Herculano, 1964, PT/AMLSB/AJG/I04303. Artur Inácio Bastos, Avenida da Liberdade, 1969, PT/AMLSB/AIB/S01666. Augusto Bobone, Lavadeira, c. 1906, PT/AMLSB/BOB/000087. Avenida da Liberdade, no início do século, [s.d.], PT/AMLSB/LSM/000372. Ferreira da Cunha, Natal do sinaleiro, 1930, PT/AMLSB/EFC/000975. José Chaves Cruz, Coreto, inaugurado em 15 de Agosto de 1894, risco de José Luís Monteiro, [19--], PT/AMLSB/ CRU/000359.

José Chaves Cruz, Desfile de cavalaria da Guarda Municipal, [19--], PT/AMLSB/CRU/000272.

ESTUDOS ABREU, Alexandre; CONCEIÇÃO, João Paulo (coor.) – Lisboa, Morfologias Urbanas 1850-1950. Lisboa: CML/Direcção do Projecto de Planeamento Estratégico, 1993. ALMEIDA, Pedro Vieira de – Plano Morfológico e Cérceas da Avenida da Liberdade. Arquitectura. Nº 139 (Dezembro de 1980). ARAÚJO, Norberto de – Peregrinações em Lisboa. 2ª. edição. Lisboa: Vega, 1992. FERNANDES, José Manuel – Lisboa, Arquitectura & Património. Lisboa: Livros Horizonte, 1989. FIDALGO, Pedro – Dos Restauradores ao Marquês - Evolução urbanística e morfológica de uma Avenida. Ata do 3º Congresso Anual de História Contemporânea. Coimbra: [s.n.], 2014. FOLQUE, Filipe (dir.) – Atlas da Carta Topográfica de Lisboa: 1856-1858. Lisboa: CML/Arquivo Municipal de Lisboa, [s.d.]. FRANÇA, José-Augusto – Lisboa: Urbanismo e Arquitectura. 3ª. edição. Lisboa: Livros Horizonte, 1997. MACEDO, Luís Pastor de – Lisboa de lés-a-lés. 3ª. edição. Lisboa: CML, 1981. MOITA, Irisalva (coor.) – O Livro de Lisboa. Lisboa: Ed. Livros Horizonte; Lisboa 94, 1994. PAES, Miguel Carlos Correia – Melhoramentos de Lisboa: Engrandecimento da Avenida da Liberdade, 3º. Opúsculo. Lisboa: Typographia Universal, 1886. 295

A evolução da ocupação arquitectónica do quarteirão com os n.os 222 e 240 da avenida da Liberdade - Pedro Miguel Teixeira Fidalgo

Francesco Rocchini, Avenida da Liberdade, [ant. 1895], PT/AMLSB/ROC/000036.

PAES, Miguel Carlos Correia – Melhoramentos de Lisboa: Engrandecimento da Avenida da Liberdade, 2º. Opúsculo. Lisboa: Typographia Universal, 1886. PAES, Miguel Carlos Correia – Melhoramentos de Lisboa: Engrandecimento da Avenida da Liberdade. Lisboa: Typographia Universal, 1885. PINHEIRO, Magda – Biografia de Lisboa. Lisboa: Esfera dos livros, 2011. PORTUGAL. Arquivo Municipal de Lisboa – Do Passeio à Avenida: os Originais do Arquivo Municipal de Lisboa (Catálogo). Lisboa: CML/Divisão de Arquivos, 1988. PORTUGAL. Associação dos Arquitectos Portugueses – Guia Urbanístico e Arquitectónico de Lisboa. Lisboa: [s.n.], 1987. PORTUGAL. Câmara Municipal de Lisboa – Planta digital da cidade de Lisboa. Lisboa: [s.n.], 2014. PORTUGAL. Câmara Municipal de Lisboa (ed.) – Do passeio à Avenida: os originais do Arquivo Municipal de Lisboa. Lisboa: CML, 1998. PORTUGAL. Gabinete de Estudos Olisiponenses – Atlas de Lisboa: A cidade no espaço e no tempo. Lisboa: Contexto ed., 1993. SÁ, Manuel Fernandes de; FERNANDES, Francisco Barata – O Anteplano da Avenida da Liberdade e Zona Envolvente. Jornal de Arquitectos. Nº 120 (Fevereiro de 1993). SILVA, Álvaro Ferreira da – A construção residencial em Lisboa: evolução e estrutura empresarial (1860-1930). Análise Social. Lisboa: ICSUL. Vol. XXXI Nº 136-137 (1997). SILVA, João Ribeiro Cristino – Avenida da Liberdade. [Lisboa]: A Editora, [1905]. SILVA, Raquel Henriques da – Lisboa Romântica, Urbanismo e Arquitectura: 1777-1874. Lisboa: [s.n.], 1997. Dissertação de doutoramento em História da Arte, apresentada à Universidade Nova de Lisboa. SILVA, Raquel Henriques da – O Passeio Público e a Avenida da Liberdade. In MOITA, Irisalva (coor.) - O Livro de Lisboa. Lisboa: Ed. Livros Horizonte; Lisboa 94, 1994. SILVA, Raquel Henriques da – Planear a cidade burguesa, 1777-1900. Lisboa. Conhecer, Pensar, Fazer Cidade. Catálogo. Lisboa: CML/Centro de Informação urbana de Lisboa, 2001.

A evolução da ocupação arquitectónica do quarteirão com os n.os 222 e 240 da avenida da Liberdade - Pedro Miguel Teixeira Fidalgo

SILVA, Raquel Henriques da (dir.) – Lisboa de Frederico Ressano Garcia 1874-1909. Catálogo da exposição. Lisboa: CML/Fundação Calouste Gulbenkian, 1989. VIEGAS, Inês Morais; TOJAL, Alexandre (coor.) – Levantamento da Planta de Lisboa: 1904-1911. Lisboa: DMC/Arquivo Municipal de Lisboa, 2005. VIEIRA DA SILVA, Augusto – Planta Topográfica de Lisboa feita em 1812. Plantas Topográficas de Lisboa. Lisboa: [s.n.], 1947.

296

Lihat lebih banyak...

Comentários

Copyright © 2017 DADOSPDF Inc.