A Execução das Sentenças da Corte Interamericana de Direitos Humanos no Brasil [Artigo Completo]

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DANIEL BARILE DA SILVEIRA ORGANIZADOR

1a EDIÇÃO BIRIGUI - SP 2013

CAPÍTULO VI

A EXECUÇÃO DAS SENTENÇAS DA CORTE INTERAMERICANA DE DIREITOS HUMANOS NO BRASIL

Luciano Meneguetti Pereira Advogado. Mestre em Direito Constitucional pelo Instituto Toledo de Ensino (ITE). Especialista em Direito Público com ênfase em Direito Constitucional pela Universidade Potiguar (UNP).

1 ASPECTOS INTRODUTÓRIOS

A preocupação com a questão dos direitos humanos remonta de longa data. Atualmente, falar em direitos humanos se tornou um lugar comum nas mais diversas esferas jurídicas e sociais. Seja no ambiente acadêmico ou fora dele, as questões que envolvem os direitos humanos é tema recorrente. O fato é que, indiscutivelmente, os direitos humanos constituem hoje uma construção histórica que se encontra definitivamente incorporada ao patrimônio da humanidade1 e que carece da devida proteção, seja no plano internacional ou no plano interno dos Estados. Ao longo dos tempos, uma sempre crescente preocupação com esses direitos, inerentes a todos os indivíduos, simplesmente pelo fato de serem humanos2, foi dando ensejo à elaboração de diversos instrumentos nacionais 1. A evolução dos direitos humanos é bem demonstrada por Fábio Konder Comparato que, em obra singular, realiza um estudo sistematizado sobre as grandes etapas históricas de afirmação dos direitos humanos (COMPARATO, Fábio Konder. A afirmação histórica dos direitos humanos. 7. ed. São Paulo: Saraiva, 2010). 2. Péres Luño, ao distinguir as definições de direitos humanos afirma que, por uma definição tautológica, seriam direitos humanos todos aqueles que correspondem ao homem pelo simples fato de ser homem. Ademais, ensina o referido autor que por uma definição formal, os direitos humanos seriam aqueles que pertencem (ou devem pertencer) a todos os homens, dos quais nenhum homem pode ser privado; pela definição teleológica, os direitos humanos seriam aqueles imprescindíveis para o aperfeiçoamento da pessoa humana, para o progresso social e para o desenvolvimento da civilização (PÉREZ, LUÑO, Antonio Enrique. Derechos humanos,

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e internacionais, visando à sua salvaguarda e proteção, instrumentos estes que gradativamente foram oferecendo contornos cada vez mais bem delineados no tocante à proteção dos direitos humanos. Atualmente, a tutela dos direitos humanos no plano internacional conta com um bem arquitetado conjunto de órgãos, mecanismos e instrumentos que estão estruturados em forma de sistemas internacionais de proteção, sendo duas as espécies de sistemas existentes: o sistema global e o sistema regional de proteção. O sistema global de proteção dos direitos humanos foi arquitetado e vem sendo desenvolvido e implementado pela Organização das Nações Unidas (ONU) desde o período pós-segunda guerra mundial até os dias atuais. O documento que lhe deu origem foi a Carta da ONU, de 1945, sendo desenvolvido posteriormente com a proclamação da Declaração Universal dos Direitos Humanos, no ano de 19483. Referida Declaração foi complementada ulteriormente, material e processualmente, por dois Pactos internacionais que foram concluídos em Nova Iorque, no ano de 1966, sendo o Pacto Internacional dos Direitos Civis e Políticos e o Pacto Internacional dos Direitos Econômicos, Sociais e Culturais. Esse conjunto de textos internacionais tem sido referido como Carta Internacional dos Direitos Humanos, compondo o denominado sistema global de proteção de tais direitos. O sistema regional de proteção dos direitos humanos, por sua vez, como o próprio nome sugere, está afeto a distintas regiões do globo, sendo que a sua estruturação fica a cargo de organizações continentais específicas. Atualmente, o Conselho da Europa (CE) estrutura o Sistema Europeu de Proteção dos Direitos Humanos; a Organização dos Estados Americanos (OEA), o Sistema Interamericano de Proteção dos Direitos Humanos; e a União Africana (UA) cuida do Sistema Africano de Proteção dos Direitos Humanos, sendo três, portanto, os sistemas regionais de proteção existentes, que buscam internacionalizar a tutela dos direitos humanos no plano regional4. Estado de direito y Constitucion. 6. ed. Madrid: Tecnos, 1999, p. 25). 3. A Declaração Universal dos Direitos Humanos (DUDH) é um documento marco na história dos direitos humanos. Elaborada por representantes de diferentes origens jurídicas e culturais de todas as regiões do mundo, a Declaração foi proclamada pela Assembleia Geral das Nações Unidas em Paris, em 10 de Dezembro de 1948, através da Resolução 217 A (III) da Assembleia Geral como uma norma comum a ser alcançada por todos os povos e nações. Ela estabelece, pela primeira vez, a proteção universal dos direitos humanos. Desde sua adoção, em 1948, a DUDH foi traduzida em mais de 360 idiomas – o documento mais traduzido do mundo – e inspirou as constituições de muitos Estados e democracias recentes. A DUDH, em conjunto com o Pacto Internacional dos Direitos Civis e Políticos e seus dois Protocolos Opcionais (sobre procedimento de queixa e sobre pena de morte) e com o Pacto Internacional dos Direitos Econômicos, Sociais e Culturais e seu Protocolo Opcional, formam a chamada Carta Internacional dos Direitos Humanos. Disponível em: . Acesso em 19 fev. 2013. 4. Para um estudo aprofundado e comparativo sobre os sistemas regionais de proteção dos direitos humanos, vide obra de Valerio de Oliveira Mazzuoli: Os Sistemas Regionais de Proteção dos Direitos Humanos: uma análise comparativa dos sistemas interamericano, europeu e africano. São Paulo: RT, 2011.

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A par dos sistemas de proteção já enunciados, não se pode deixar de destacar a existência de alguns documentos internacionais referentes aos direitos humanos no contexto do mundo árabe-islâmico: a Declaração Islâmica Universal dos Direitos Humanos, de 1981; a Declaração dos Direitos Humanos do Islam, também conhecida como Declaração do Cairo, de 1990; e a Carta Árabe dos Direitos Humanos, de 1994. Apesar da importante existência de tais documentos, não se pode afirmar nesse momento a existência de um sistema regional árabeislâmico de proteção dos direitos humanos. Por fim, vale ressaltar também que, no continente asiático, contrariamente ao que ocorre nos demais continentes, não existe ainda qualquer referência de documentos internacionais de proteção dos direitos humanos e nem mesmo expectativa de conclusão de uma convenção regional asiática de direitos humanos. Esses sistemas de proteção global e regionais não são estanques, mas coadjuvantes e complementares, de modo que a falta de solução para um determinado caso concreto em qualquer dos sistemas regionais não impede a vítima de violação de direitos humanos de vindicar esse mesmo direito junto à ONU5. Ao presente trabalho, interessa mais de perto o Sistema Interamericano de Proteção dos Direitos Humanos, uma vez que se visa a analisar os principais aspectos e a problemática que envolve o tema da execução das sentenças da Corte Interamericana de Direitos Humanos (órgão integrante do referido sistema) no Brasil. O sistema interamericano é composto por quatro instrumentos fundamentais: a) a Carta da Organização dos Estados Americanos ou Carta da OEA(1948)6; a Declaração Americana dos Direitos e Deveres do Homem (1948)7; a Convenção Americana sobre Direitos Humanos, conhecida como Pacto de San José da Costa Rica (1969); e o Protocolo Adicional à Convenção Americana em matéria de Direitos Econômicos, Sociais e Culturais, conhecido também como Protocolo de San Salvador (1988). Todo esse aparato normativo interamericano visa, de maneira genérica, à proteção dos direitos humanos sem qualquer discriminação, conforme prevê a alínea l, do art. 3º, da Carta da OEA ao dispor que “os Estados americanos proclamam os direitos fundamentais da pessoa humana, sem fazer distinção de raça, nacionalidade, credo ou sexo”. 5. MAZZUOLI, Valerio de Oliveira. Os Sistemas Regionais de Proteção dos Direitos Humanos..., op. cit., 2011, p. 16. 6. A Carta da OEA foi promulgada no Brasil por meio do Decreto n. 30.544, de 14 de fevereiro de 1952. 7. A Declaração Americana dos Direitos e Deveres do Homem, aprovada em 1948, quando da realização da IX Conferência Internacional Americana, realizada em Bogotá, não constitui tecnicamente um tratado (o que tem ensejado o questionamento do seu valor jurídico), no entanto, ela explicita os direitos mencionados na Carta da OEA. Historicamente, foi o primeiro acordo internacional sobre direitos humanos, uma vez que precedeu a Declaração Universal dos Direitos Humanos, que só ocorreu seis meses após a sua conclusão.

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A OEA é uma organização internacional de caráter regional, que teve como instrumento constitutivo a Carta da OEA, assinada em Bogotá, Colômbia, em 30 de abril de 1948, ocasião em que também foi celebrada a Declaração Americana dos Direitos e Deveres do Homem. Esses dois instrumentos internacionais revelam, no plano regional interamericano, a preocupação com a proteção dos direitos humanos, sendo responsáveis por deflagrar um processo gradativo de amadurecimento de mecanismos de proteção a tais direitos, que culminou com a criação de dois órgãos fundamentais dentro do sistema interamericano, que são a Comissão Interamericana de Direitos Humanos e a Corte Interamericana de Direitos Humanos. Nesse contexto, destaca-se a Convenção Americana de Direitos Humanos, também conhecida como Pacto de San José da Costa Rica, pois concluída em San José, Costa Rica, em 22 de novembro de 1969, tendo entrado em vigor no plano internacional em 18 de julho de 1978, quando atingiu o número mínimo de onze ratificações para tanto. No Brasil, a Convenção entrou em vigor em 1992, quando foi promulgada por meio do Decreto n. 678, de 06 de novembro daquele ano. Referida Convenção constitui o instrumento fundamental e de maior significado no tocante à proteção dos direitos humanos dentro do sistema interamericano8. Em caráter substancial, ela reconhece e assegura um amplo leque de direitos civis e políticos (arts. 3º a 25) e, embora não enuncie de maneira específicaquaisquer direitos sociais, culturais e econômicos, determina aos Estados a adoção de medidas legislativas, dentre outras, capazes de alcançar de maneira progressiva, a plena realização desses direitos (art. 26). Posteriormente, um protocolo adicional à Convenção foi adotado pela Assembleia Geral da OEA, no ano de 1988, conhecido como Protocolo Adicional à Convenção Americana em matéria de Direitos Econômicos, Sociais e Culturais e também como Protocolo de San Salvador (1988), concernente, como o próprio nome enuncia, aos direitos sociais, econômicos e culturais, documento que entrou em vigor no plano internacional em novembro de 1999, quando atingiu o número mínimo de onze ratificações, necessárias para a sua vigência. O Brasil ratificou o referido protocolo por meio do Decreto n. 3.321, de 30 de dezembro do mesmo ano. Para proteger e monitorar a defesa dos direitos que enuncia, a Convenção Americana de Direitos Humanos estabeleceu, em seu art. 33, um aparato protetivo consubstanciado em dois importantes órgãos: a Comissão 8. PIOVEZAN, Flávia. Direitos Humanos e o Direito Constitucional Internacional. 11. ed. São Paulo: Saraiva, 2010, p. 255.

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Interamericana de Direitos Humanos (arts. 34 a 51) e a Corte Interamericana de Direitos Humanos (arts. 52 a 69). O principal objetivo da Comissão é promover a observância e a proteção dos direitos humanos na América, examinando as comunicações feitas pelos indivíduos, grupos de indivíduos ou entidades não governamentais legalmente reconhecidas em um ou mais Estados-membros da OEA, no tocante às violações de direitos humanos consagrados na Convenção (art. 44). Dentre as competências da Comissão, destacam-se, dentre outras, a realização de atividades investigatórias relativamente aos casos que lhe são submetidos. Poderá também tentar conciliação amistosa entre os envolvidos num caso de violação de direitos humanos e, quando as circunstâncias exigir – notadamente em razão do não cumprimento espontâneo de suas recomendações (art. 50, §§ 1º a 3º) –, deve submeter o caso a apreciação da Corte. A Corte, por sua vez, é o órgão jurisdicional do sistema interamericano de direitos humanos, pertencente à Convenção Americana, apto a resolver os casos de violação de direitos humanos, levados a efeito pelos Estados-membros da Organização dos Estados Americanos que tenham ratificado a Convenção e aceitado a jurisdição obrigatória da Corte. Trata-se, portanto, de um tribunal internacional de caráter supranacional, com competência consultiva e contenciosa para analisar, julgar e condenar, conforme o caso, os Estados-membros na Convenção, por violações de direitos humanos. A sua gênese se deu no ano de 1978, quando a Convenção Americana entrou em vigor, contudo, pode-se afirmar que o seu pleno e efetivo funcionamento se deu somente no ano de 1982, quando enunciou a sua primeira opinião consultiva (solicitada pelo Peru), proferindo a sua primeira sentença somente anos mais tarde, em 1987, no caso Velásquez Rodríguez vs. Honduras. Também no tocante à competência da Corte, oportunas as considerações de ValerioMazzuoli, que esclarece: A Corte detém uma competência consultiva (relativa à interpretação das disposições da Convenção, bem como das disposições de tratados concernentes à proteção dos direitos humanos nos Estados Americanos) e uma competência contenciosa, de caráter jurisdicional, própria para o julgamento de casos concretos, quando se alega que um dos Estadospartes na Convenção Americana violou algum de seus preceitos. Contudo, a competência contenciosa da Corte Interamericana é limitada aos Estados-partes da Convenção que reconheçam expressamente a sua jurisdição. Isto significa que um Estado-parte na Convenção Americana não pode ser demandado perante a Corte se ele próprio não aceitar a sua competência contenciosa.9(grifos) 9. MAZZUOLI, Valerio de Oliveira. Os Sistemas Regionais de Proteção dos Direitos Humanos..., op. cit.,p. 32.

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Conforme se afere, somente haverá a possibilidade de um Estado-parte na Convenção Americana ser demandado perante a Corte Interamericana se esse mesmo Estado houver expressamente reconhecido a competência jurisdicional da Corte (art. 62).10 Por outro lado, uma vez que o Estado-parte tenha reconhecido tal competência, estará, então, vinculado às decisões que a Corte proferir, devendo acatá-las e tomar as providências necessárias no plano interno para o seu cabal cumprimento. Nesse sentido, conforme bem destaca Flávia Piovesan: A Corte tem jurisdição para examinar casos que envolvam a denúncia de que um Estado-parte violou direito protegido pela Convenção. Se reconhecer que efetivamente ocorreu a violação, determinará a adoção de medidas que se façam necessárias à restauração do direito então violado. A Corte pode ainda condenar o Estado a pagar uma justa compensação à vítima.11

Como se nota, sempre que a Corte entender que houve violação de direitos humanos e decidir pela condenação em razão desse fato, elapoderá adotar diversas medidas, tais como a determinação do pagamento de uma indenização idônea ao lesado para fins de recomposição (na medida do possível) do status quo, em razão dos danos sofridos; a determinação de que sejam reparadas as consequências da medida ou situação que haja configurado a violação desses direitos; a determinação de que se assegure ao prejudicado o pleno gozo de seu direito ou liberdade que restaram violados; ou ainda a determinação de que o Estado promova a investigação dos fatos causadores de violação dos direitos humanos e a consequente responsabilização dos agentes que deram causa a essas violações. Ainda nesse contexto, vale ressaltar que, de acordo com o art. 67 da Convenção Americana, as decisões da Corte são definitivas e inapeláveis12. 2 QUAL A RAZÃO DO ESTUDO DA IMPLEMENTAÇÃO DAS SENTENÇAS DA CORTE INTERAMERICANA NO BRASIL?

Conforme salientado, o reconhecimento da competência consultiva da Corte é automático, de modo que os Estados-partes da Convenção Americana, ao ratificarem o referido instrumento, já acolhem a referida competência. O 10. No tocante ao reconhecimento da competência da Corte Interamericana, Mazzuoli explica que “ao ratificarem a Convenção Americana, os Estados-partes já aceitam a competência consultiva da Corte, mas em relação à competência contenciosa, esta é facultativa e poderá ser aceita posteriormente. Este foi o meio que a Convenção Americana encontrou para fazer com que os Estados ratificassem a Convenção sem receio de serem prontamente demandados” (MAZZUOLI, Valério de Oliveira, op. cit., p. 32). 11. PIOVEZAN, Flávia. Direitos Humanos e o Direito Constitucional Internacional, op. cit., p. 271. 12. “Artigo 67 - A sentença da Corte será definitiva e inapelável. Em caso de divergência sobre o sentido ou alcance da sentença, a Corte interpretá-la-á, a pedido de qualquer das partes, desde que o pedido seja apresentado dentro de noventa dias a partir da data da notificação da sentença”.

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mesmo não ocorre com a competência contenciosa, que é facultativa e precisa de aceitação expressa pelos Estados para que a Corte possa exercer a referida competência em relação ao Estado aceitante. O Brasil reconheceu expressamente a jurisdição contenciosa da Corte Interamericana. Por meio da mensagem presidencial nº 1.070/98, de 08 de setembro de 1998, o Poder Executivo encaminhou ao Congresso Nacional o pedido de aprovação do reconhecimento da jurisdição obrigatória da Corte, que foi aprovado em 03 de dezembro do mesmo ano, por meio do Decreto Legislativo n. 89/9813. Por meio de uma nota transmitida ao Secretário Geral da OEA, o Brasil reconheceu a jurisdição contenciosa da Corte no plano internacional em 10 de dezembro daquele ano, embora curiosamente mais tarde, quase quatro anos depois, o Poder Executivo tenha editado o Decreto n. 4.463, de 8 de novembro de 2002, demonstrando a necessidade de promulgação dos tratados e outros atos internacionais pelo poder executivo, para que produzam efeitos jurídicos no plano interno, sendo esse o posicionamento do Supremo Tribunal Federal sobre o tema, muito criticado pela doutrina, uma vez que nenhuma Constituição brasileira jamais fez tal exigência14. A primeira sentença de mérito prolatada pela Corte Interamericana contra o Brasil se deu no caso Damião Ximenes Lopes, em 04 de julho de 2006, onde restou reconhecida pela Corte a violação de vários direitos humanos pelo Estado brasileiro, sendo fixadas, como consequência, diversas obrigações de reparação e indenização por danos materiais (lucro cessantes e danos emergentes) e morais15.No dia 28 de novembro daquele mesmo ano, a Corte decidiu outro caso brasileiro (Gilson Nogueira de Carvalho e outros vs. Brasil), considerado improcedente16. 13. A dicção do art. 1º do referido Decreto é a seguinte: “É aprovada a solicitação de reconhecimento da competência obrigatória da Corte Interamericana de Direitos Humanos em todos os casos relativos à interpretação ou aplicação da Convenção Americana de Direitos Humanos para fatos ocorridos a partir do reconhecimento, de acordo com o previsto no parágrafo primeiro do art. 62 daquele instrumento internacional”. 14. MAZZUOLI, Valerio de Oliveira de. Curso de Direito Internacional Público. 6. ed. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2012, p. 368-369. José Carlos de Magalhães em interessante trabalho sobre o tema faz críticas contundentes sobre o entendimento do STF no sentido de exigir a promulgação dos tratados e outros atos internacionais, por meio de decreto executivo, para que possam produzir efeitos no plano interno, uma vez que a aprovação legislativa seria suficiente para tanto. Ademais, segundo o autor, quando o país ratifica algum tratado no plano internacional, os demais Estados-partes passam a acreditar, com convicção, daquele momento em diante, que as disposições avençadas são plenamente exigíveis do Estado ratificante, o que não se verifica no caso brasileiro (MAGALHÃES, José Carlos de. O Supremo Tribunal Federal e o Direito Internacional: uma análise crítica. Porto Alegre: Livraria do Advogado, 2000, p. 70-72). André de Carvalho Ramos também se manifesta contrariamente à necessidade de promulgação do tratado internacional por decreto presidencial, aduzindo que a “publicidade da ratificação e entrada em vigor internacional deve ser apenas atestada (efeito meramente declaratório) nos registros públicos dos atos do Ministério das Relações Exteriores (Diário Oficial da União)” (RAMOS, André de Carvalho. Teoria Geral dos Direitos Humanos na Ordem Internacional. 2. ed. São Paulo: Saraiva, 2012, e-book). 15. Disponível em: . Acesso em 03 mar. 2013. 16. Disponível em: . Acesso em 03 mar. 2013.

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Desde então, outros casos envolvendo violações de direitos humanos pelo Estado brasileiro foram submetidos e julgados pela Corte, tais como o caso Escher e outros vs. Brasil; o caso Garibaldi vs. Brasil; e o caso Gomes Lund e outros vs. Brasil, conhecido como Guerrilha do Araguaia17.Vale ressaltar também que diversas medidas provisórias foram emitidas pela Corte em face do Estado brasileiro. Diante do dever de implementação das sentenças da Corte Interamericana pelo Brasil, em razão do reconhecimento de sua jurisdição obrigatória e do compromisso internacional assumido, o presente trabalho aborda, a partir deste ponto, os principais aspectos que envolvem o tema da execução de tais comandos no ordenamento jurídico brasileiro. 2.1 A HIERARQUIA NORMATIVA DAS DECISÕES DA CORTE INTERAMERICANA DE DIREITOS HUMANOS NO BRASIL

Por se tratar de um ato jurídico oriundo da esfera internacional, a implementação das decisões da Corte devem ser analisadas à luz da relação existente entre o direito internacional e o direito doméstico do Estado brasileiro, o que implica a necessidade de se averiguar precipuamente a hierarquia normativa dos tratados internacionais de direitos humanos no ordenamento jurídico brasileiro. É preciso verificar com qual status normativo os tratados internacionais de direitos humanos ingressam na ordem jurídica brasileira, sendo esse o prisma segundo o qual o direito doméstico vê o direito internacional. A Constituição brasileira de 1988 previu originariamente uma regra importante acerca do tema no § 2º do seu art. 5º, dispondo que os direitos e garantias nela expressos “não excluem outros decorrentes do regime e dos princípios por ela adotados, ou dos tratados internacionais em que a República Federativa do Brasil seja parte”. Importante inovação quanto ao tema foi trazida pela Emenda Constitucional n. 45, de 30 de dezembro de 2004, que introduziu o parágrafo 3º ao referido artigo, prevendo que “os tratados e convenções internacionais sobre direitos humanos que forem aprovados, em cada Casa do Congresso Nacional, em dois turnos, por três quintos dos votos dos respectivos membros, serão equivalentes às emendas constitucionais”. Desde a promulgação da Constituição (e até mesmo antes), o tema da incorporação dos tratados internacionais sempre foi alvo de inúmeros debates doutrinários e acirradas discussões no plano jurisprudencial das Cortes judiciais do país, notadamente no STF, uma vez que a Constituição não estatuiu com 17. Disponível em: . Acesso em 03 mar. 2013.

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clareza em nenhum de seus dispositivos, qual a posição hierárquica que os tratados comuns e aqueles referentes aos direitos humanos(onde se inclui a Convenção Americana sobre Direitos Humanos) assumem ao ingressar validamente no ordenamento jurídico brasileiro. Como consequência, o problema foi relegado à doutrina e à jurisprudência, valendo nesse ponto um estudo mais detido sobre o assunto. Antes de 1977, a jurisprudência brasileira mostrava-se firme no sentido de dar primazia ao direito internacional em detrimento do direito interno, de modo que um tratado internacional, independente de sua natureza, sempre deveria prevalecer quando em conflito com uma norma interna18.Contudo, o STF, em 1977, no julgamento do RE n. 80.004-SE19, firmou entendimento de que os tratados internacionais comuns (ou tradicionais, uma vez que não havia ainda o debate, no plano jurisprudencial, acerca dos tratados de direitos humanos) ingressavam no ordenamento jurídico brasileiro com o status de lei ordinária, o que configurou à época um retrocesso no tocante ao tema. Neste caso de tratamento paritário entre tratados comuns e lei ordinária, eventual conflito entre tratado e lei ordinária é resolvido pela aplicação do critério cronológico ou pela aplicação do critério da especialidade. Nesse sentido, a jurisprudência adotou a possibilidade do treatyoverride(revogação do tratado – expressa ou tácita – pela lei posterior incompatível) no direito brasileiro, uma vez que é possível a superação de um tratado em razão da edição de uma lei posterior20.Esse entendimento ainda predomina atualmente no STF em relação aos denominados tratados comuns21. A doutrina tradicional sempre entendeu que os tratados internacionais, independente de sua natureza, ingressavam no ordenamento brasileiro com força de lei ordinária.Isso, em razão do instrumento de promulgação do tratado, que é o decreto legislativo e que exige o quorum de maioria simplificada para sua aprovação, ou seja, o mesmo quorum da lei ordinária (uma questão de logicidade formal, portanto); outro argumento empregado para a defesa dessa posição é a possibilidade de os tratados serem passíveis de controle de constitucionalidade pelo STF (CRFB, 18. AZEVEDO, Philadelpho. Os tratados e os interesses privados em face do direito brasileiro, in Boletim da Sociedade Brasileira de Direito Internacional, vol. 1, Rio de Janeiro, 1945, p. 12-29. 19. Disponível em: . Acesso em: 14/09/2012. Esse entendimento também foi manifestado no HC nº 77.631-SC, também julgado pelo STF. 20. MAZZUOLI, Valerio de Oliveira. Curso de Direito Internacional Público, op. cit., p. 378-379. O mesmo autor afirma ser equivocado o entendimento do STF, pois o tribunal não se ateve “ao fato de que os tratados internacionais têm sua forma própria de revogação, que é a denúncia, nem mesmo de que o descumprimento interno de um compromisso assumido externamente acarreta a responsabilidade internacional do Estado, além de outras graves consequências no plano da política externa” (p. 379). 21. MERCADANTE, Araminta de Azevedo. Processualística Internacional e a Constituição de 1988. In: CASELLA, Paulo Borba (Coord.). Contratos Internacionais e o Direito Econômico no Mercosul. São Paulo: LTr, 1996, p. 487; MAZZUOLI, Valerio de Oliveira. Curso de Direito Internacional Público, op. cit.,p. 385.

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art. 102, III, “b”)22. Contudo, há entendimento por parte de alguns doutrinadores publicistas de que qualquer tratado comum que venha a ingressar no ordenamento jurídico brasileiro sempre teve e continua tendo o status de norma supralegal, isto é, estará abaixo da Constituição e acima das leis ordinárias23. No tocante aos tratados internacionais de direitos humanos, desde a edição do Decreto n. 678, de 06 de novembro de 1992, que promulgou a Convenção Americana de Direitos Humanos, o STF proferiu entendimento, explicitando que tais tratadosingressam no ordenamento jurídico pátrio com estatura infraconstitucional, isto é, com o status de lei ordinária24, posicionamento criticado por grande parte da doutrina, que entende que tais tratados, em razão do que dispôs o § 2º do art. 5º da Constituição, ingressam no ordenamento jurídico brasileiro com o status de norma constitucional.Nesse sentido, Flávia Piovesan afirma: [...] ao prescrever que ‘os direitos e garantias expressos na Constituição não excluem outros direitos decorrentes dos tratados internacionais’, a contrario sensu, a Carta de 1988 está a incluir, no catálogo de direitos constitucionalmente protegidos, os direitos enunciados nos tratados internacionais em que o Brasil seja parte. Esse processo de inclusão implica a incorporação pelo Texto Constitucional de tais direitos. Ao efetuar tal incorporação, a Carta atribui aos direitos internacionais uma natureza especial e diferenciada, qual seja, a natureza de norma constitucional25.

Um significativo avanço na jurisprudência do STF se deu pelo voto do então Ministro Sepúlveda Pertence, no julgamento do RHC n. 79.785/RJ em 29 de março de 2000, quando se entendeu ser possível considerar que os tratados de direitos humanos deveriam ingressar no ordenamento jurídico com o status de norma supralegal, estando acima da legislação ordinária, porém abaixo da Constituição. Referido ministro estabeleceu pioneiramente no Supremo a tese da supralegalidade dos tratados internacionais de direitos humanos. Outro avanço no tema da incorporação dos tratados de direitos humanos, como já se anunciou, veio com a EC n. 45/04, ao estabelecer que os tratados de direitos humanos aprovados com o mesmo quorum exigido para aprovação das emendas constitucionais passam a integrar a ordem jurídica brasileira com o mesmo status de tais emendas, sendo, portanto, normas constitucionais. 22. VARELLA, Marcelo D. Direito Internacional Público. 4. ed. São Paulo: Saraiva, 2012, e-book. 23. MAZZUOLI, Valerio de Oliveira. Curso de Direito Internacional Público, op. cit., p. 384. 24. Vide HC 72131/RJ, Rel. Min. Marco Aurélio, j. 23/11/1995, DOU de 01/08/2003; HC 73.044/SP, Rel. Min. Maurício Corrêa, j. 19/03/1996, DOU de 05/09/2003; e RE 206482/SP, Rel. Min. Maurício Corrêa, j. 27/05/1998, pub. DOU de 05/09/2003. 25. PIOVESAN, Flávia. Diretos Humanos e o Direito Constitucional Internacional, op. cit., p. 75; nesse mesmo sentido MAZZUOLI, Valerio de Oliveira. Curso de Direito Internacional Público, op. cit., p. 385-386.

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Em sessão plenária do STF, realizada em 22 de novembro de 2006, com o voto de vista no Min. Gilmar Mendes no julgamento conjunto dos RE n. 466.343-1 e 349.703 e dos HC n. 87.585 e 92.566, consagrou-se definitivamente a tese da supralegalidade dos tratados internacionais de direitos humanos, de modo que tais tratados, quando não aprovados na forma do § 3º, do art. 5º, da Constituição (situação em que serão equivalentes às emendas constitucionais), integram a ordem jurídica brasileira não mais como lei ordinária, mas como normas supralegais, estando acima de toda a legislação ordinária, porém abaixo da Constituição no tocante à sua hierarquia. Como se nota, referido julgamento foi importante no sentido de consistir em um overruling, isto é, numa mudança significativa de posicionamento do STF sobre a questão26. A possibilidade da existência de normas constitucionais que não estão insertas no corpo material da Constituição deu origem ao que se convencionou chamar de bloco de constitucionalidade, composto pelas normas constitucionais e também pelas normas previstas nos tratados internacionais de direitos humanos que agora têm status de norma constitucional. 2.2 O DEVER DE CUMPRIMENTO DAS DECISÕES

Conforme já se pôde aferir, em face do reconhecimento, pelo Brasil, da jurisdição obrigatória da Corte Interamericana de Direitos Humanos e com a evolução constitucional e jurisprudencial acerca da matéria que versa sobre os tratados internacionais de direitos humanos, trazida primeiramente pela Constituição de 1988 e posteriormente pela EC n. 45/04, bem como com a mudança de posicionamento na jurisprudência do STF, torna-se inafastável o dever de cumprimento integral das sentenças prolatadas pela Corte em face do Estado brasileiro, conforme os termos estabelecidos peloPacto de San José da Costa Rica, que agora goza, no mínimo, de status supralegale que assim dispõe 26. Deve-se ressaltar que a referida emenda constitucional não colocou fim à problemática em questão, tendo surgido na doutrina duas correntes que interpretam o § 3º, do art. 5º, da CRFB de maneira distinta. Para uma primeira corrente, a partir da emenda há duas espécies de tratados internacionais de direitos humanos: uma categoria que abrange os tratados incorporados antes da emenda e também aqueles incorporados depois dela, mas em o rito diferenciado nela previsto, os quais terão status de lei ordinária (SILVA, José Afonso da.Comentário Contextual à Constituição. 2. ed. São Paulo: Malheiros, 2005, p. 179). Para uma segunda corrente, todos os tratados de direitos humanos são, a partir da emenda, equivalentes às normas constitucionais, entendendo-se que a emenda constitucional apenas teria dotado as normas referentes a esses tratados, aprovados sob o rito por ela previsto, de natureza formalmente constitucional, mas todos os tratados seriam materialmente constitucionais (PIOVEZAN, Flávia. Reforma do Judiciário e Direitos Humanos. In: TAVARES, André Ramos; LENZA, Pedro; ALARCÓN, Pietro de JesúsLora (Org.). Reforma do Judiciário Analisada e Comentada. São Paulo: Método, 2005, p. 67-82). Após o julgamento do RE n. 466.343-1, com a adoção da teoria da supralegalidade, parte da doutrina define essa situação que acabou sendo gerada pela EC n. 45/04 como teoria do duplo estatuto dos tratados de direitos humanos, isto é, “supralegal para os que não foram aprovados pelo rito especial do artigo 5o, § 3o, quer sejam anteriores ou posteriores à Emenda Constitucional n. 45/2004 e constitucional para os aprovados de acordo com o rito especial” (RAMOS, André de Carvalho. Teoria Geral dos Direitos Humanos na Ordem Internacional, op. cit.).

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em seu art. 68.1: “os Estados-partes na Convenção comprometem-se a cumprir a decisão da Corte em todo caso em que forem partes”. Como parte integrante do direito internacional contemporâneo, um amplo catálogo de normas protetivas de direitos humanos encontra-se atualmente positivado em tratados internacionais e, de certo modo, universalizado. Por essa razão, torna-se também inconcebível que um Estado possa opor a sua soberania estatal para furtar-se ao cumprimento de seus deveres internacionais ou afirmar que a proteção desses direitos se faz tão-somente no âmbito de seu domínio reservado ou apenas na medida daquilo que o direito doméstico reconhece. Esses argumentos, que são comumente utilizados para os países se esquivarem de uma eventual verificação acerca de violações de direitos humanos por parte dos tribunais competentes, não podem prosperar frente ao crescente engajamento e aos compromissos assumidos no plano internacional, em matéria de proteção dos direitos humanos. Conforme destaca Cançado Trindade: [...] o desenvolvimento histórico da proteção internacional dos direitos humanos gradualmente superou barreiras do passado: compreendeu-se, pouco a pouco, que a proteção dos direitos básicos da pessoa humana não se esgota, como não poderia esgotar-se, na atuação do Estado, na pretensa e indemonstrável ‘competência nacional exclusiva’27.

Resta, portanto, evidente que o Brasil não pode alegar a sua soberania ou as previsões constantes do seu ordenamento jurídico interno para não proceder ao cumprimento das decisões da Corte Interamericana. Ademais, cabe ressaltar que um eventual descumprimento do disposto no referido art. 68.1 da Convenção poderá ensejar a responsabilidade internacional do Estado28, bem como dar início a uma nova demanda contra o Estado junto à Corte, vez que ele incorre em nova violação da Convenção29. Nesse contexto, torna-se importante lembrar ainda que as normas domésticas (constitucionais ou infraconstitucionais) editadas pelo Estado brasileiro não poderão afrontar as normas internacionais de proteção dos direitos humanos, incluindo aquelas previstas no Pacto de San José; caso isso ocorra, a norma interna será passível de controle de constitucionalidade de leis e outros atos normativos, por se tratar de ofensa a tratados internacionais de direitos humanos ou, como afirma parte da doutrina, a norma sofrerá o crivo do controle de convencionalidade30. 27. TRINDADE, Antônio Augusto Cançado. A proteção internacional dos direitos humanos: fundamentos e instrumentos básicos. São Paulo: Saraiva, 1991, p. 3. 28. RAMOS, André de Carvalho. Processo Internacional de Direitos Humanos. 2. ed. São Paulo: Saraiva, 2012, e-book. 29. MAZZUOLI, Valerio de Oliveira. Curso de Direito Internacional Público, op. cit., p. 914. 30. MAZZUOLI, Valerio de Oliveira. Direito dos Tratados. São Paulo: RT, 2011, p. 409-416.

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Por derradeiro, cabe mencionar ainda a existência de um segundo prisma acerca da relação entre o direito internacional e o direito interno, referente à forma como o direito internacional vê o direito doméstico. Nesse sentido, a doutrina afirma que constitui uma prática reiterada dos Estados e das Cortes Internacionais considerar a norma doméstica de um Estado como um mero fato que expressa a sua vontade, não se reconhecendo sequer o caráter jurídico de tais normas31. Sob essa ótica, o direito interno será utilizado apenas quando a norma internacional lhe fizer alguma remissão, pois “os tribunais internacionais e os árbitros somente aplicarão as normas dos sistemas jurídicos nacionais à medida que elas sejam integrantes do sistema normativo internacional”32. Sob esse enfoque, percebe-se que, para o Direito Internacional, as normas internas de um determinado Estado (leis constitucionais ou infraconstitucionais, atos administrativos e até mesmo as decisões judiciais), que expressam a sua vontade, devem ser compatíveis com os compromissos internacionais assumidos pelo Estado, não podendo ele opor as suas normas domésticas para justificar o descumprimento de uma obrigação ou decisão internacional, sob pena de responsabilização internacional33. 3 PRINCIPAIS ASPECTOS DA EXECUÇÃO DAS SENTENÇAS DA CORTE INTERAMERICANA DE DIREITOS HUMANOS NO BRASIL 3.1 A NATUREZA JURÍDICA DA DECISÃO DA CIDH E A DESNECESSIDADE DE SUA HOMOLOGAÇÃO PELO STJ

O art. 105, inciso I, alínea i da Constituição contempla um mecanismo de cooperação judicial entre os Estados: a homologação de sentença estrangeira. Estabelece referido dispositivo a necessidade de que a sentença estrangeira seja homologada pelo Superior Tribunal de Justiça para que possa produzir efeitos em território nacional e, assim, ser cumprida pelo Estado brasileiro34. Trata31. RAMOS, André de Carvalho. Teoria Geral dos Direitos Humanos na Ordem Internacional, op. cit. 32. SOARES, Guido Fernando Silva. Curso de Direito Internacional Público. Vol. 1. São Paulo: Atlas, 2002, p. 203. 33. A impossibilidade de se invocar o direito interno para o não cumprimento de compromissos internacionais foi consagrada expressamente no art. 27 da Convenção de Viena sobre o Direito dos Tratados, ratificada e promulgada pelo Brasil por meio do Decreto Legislativo n. 496/09 e do Decreto n. 7030/09. Referido artigo dispõe que “uma parte não pode invocar as disposições de seu direito interno para justificar o inadimplemento de um tratado”. Acerca da responsabilidade internacional do Estado pelo descumprimento de compromissos assumidos vide: SOARES, Guido Fernando Silva. Direito Internacional do Meio Ambiente: emergência, obrigações e responsabilidades. São Paulo: Atlas, 2001; RAMOS, André de Carvalho. Responsabilidade Internacional por Violações de Direitos Humanos. Rio de Janeiro: Renovar, 2004. 34. A homologação da sentença estrangeira, antes da entrada em vigor da EC n. 45/05 era de competência do Supremo Tribunal Federal. A disciplina jurídica desse instituto está contemplada também na LINDB (arts. 15 e 17), no CPC (arts. 483 e 484), no Regimento Interno do STF (arts. 215 a 224), na Resolução n. 9/2005 do STJ

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se, portanto, de um juízo de delibação, em que o tribunal analisa se a sentença ofende ou não a ordem pública, consistindo, portanto, num processo que confere eficácia à sentença oriunda de um órgão público competente, segundo as leis do Estado que a prolatou, para que, assim, possa produzir todos os efeitos jurídicos a ela inerentes. Diante da regra constitucional prevista, cumpre verificar qual é a natureza jurídica da sentença emanada da Corte Interamericana, a fim de saber se ela pode ou não ser equiparada a uma sentença estrangeira. Conforme explica Valério Mazzuoli, “por sentença estrangeira deve-se entender aquela proferida por um tribunal afeto à soberania de determinado Estado, e não a emanada de um tribunal internacional que tem jurisdição sobre os seus próprios Estados-partes”35. Nessa linha de entendimento, as sentenças oriundas de tribunais internacionais, que não se vinculam à soberania de nenhum Estado, são denominadas sentenças internacionais, distintas, portanto, das sentenças estrangeiras. Não se deve, então, entender a sentença estrangeira como toda aquela que não é nacional; se assim fosse, tanto uma sentença proferida por um tribunal nacional de um determinado Estado como aquela proferida por um tribunal internacional seriam enquadradas na concepção de sentença estrangeira e, portanto, careceria de homologação pelo STJ. Contudo, não é isso o que ocorre com a sentença oriunda da Corte Interamericana, que tem natureza jurídica distinta:sentença internacional, o que a difere da sentença estrangeira e, consequentemente, enseja a desnecessidade de sua homologação pelo STJ, como condição de sua eficácia em território nacional. Nesse sentido, afirma José Carlos de Magalhães: É conveniente acentuar que sentença internacional, embora possa revestirse do caráter de sentença estrangeira, por não provir de autoridade judicial nacional, com aquela nem sempre se confunde. Sentença internacional consiste no ato judicial emanado de órgão judiciário internacional de que o Estado faz parte, seja porque aceitou a sua jurisdição obrigatória, como é o caso da Corte Interamericana de Direitos Humanos, seja porque, em acordo especial, concordou em submeter a solução de determinada controvérsia a um organismo internacional (...) se aceitou, mediante declaração formal, como se verifica com a autorizada pelo Decreto Legislativo nº 89, de 1998, o País está obrigado a dar cumprimento à decisão que vier a ser proferida (...) Tal sentença, portanto, não depende de homologação pelo Supremo Tribunal Federal36[entenda-se, hoje, Superior Tribunal de Justiça]. e, no plano internacional, nos arts. 423 e ss. do Código de Bustamante de 1928, ratificado e ainda em vigor no Brasil. 35. MAZZUOLI, Valerio de Oliveira. Curso de Direito Internacional Público, op. cit., p. 911. 36. MAGALHÃES, José Carlos de. O Supremo Tribunal Federal e o direito internacional: uma análise crítica, op. cit., p. 102.

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O que se verifica, portanto, é que o instituto da homologação de sentença é reservado àquelas sentenças emanadas de um Estado estrangeiro37 e não àquelas oriundas de tribunais internacionais, sendo desnecessária, portanto, a homologação da sentença oriunda da Corte Interamericana para a produção de efeitos no Brasil38. Ademais, frise-se que o STJ não teria nem mesmo competência constitucional ou legal para a homologação da sentença emanada da Corte Interamericana, por ser ela um tribunal internacional, cujos comandos têm eficácia imediata (art. 68.1 da Convenção Americana) na ordem jurídica interna dos países que reconheceram a sua jurisdição obrigatória, como é o caso do Brasil. A. AS REGRAS ACERCA DA EXECUÇÃO DAS SENTENÇAS DA CORTE PREVISTAS NA CONVENÇÃO AMERICANA DE DIREITOS HUMANOS E SEU COTEJO COM O REGRAMENTO INTERNO BRASILEIRO

O Sistema Interamericano de Proteção dos Direitos Humanos ainda carece, atualmente, de mecanismos eficazes para a execução das sentenças proferidas pela Corte Interamericana. A Convenção Americana de Direitos Humanos prevê apenas duas regras relativas à execução das sentenças emanadas da Corte, que estão previstas no seu art. 6839. A primeira regra estabelece que a execução das sentenças da Corte dependerá da normatividade interna de cada Estado-parte da Convenção, tratando-se de uma regra tradicional quanto ao tema da execução de sentenças internacionais. Desse modo, fica a critério de cada Estado a regulação normativa doméstica necessária para conferir executoriedade aos comandos da Corte. A segunda regra prevista pela Convenção consiste na utilização da normatividade interna de cada Estado, prevista para a execução de sentenças domésticas em face do próprio Estado, para a execução da parte indenizatória das sentenças emanadas da Corte Interamericana. 37. André de Carvalho Ramos esclarece que “de acordo com a antiga jurisprudência do Supremo Tribunal Federal (até a Emenda Constitucional n. 45, tal competência era sua), a homologação de sentença estrangeira é ato de recepção de decisão emanada de outro Estado” (RAMOS, André de Carvalho. Processo Internacional de Direitos Humanos, op. cit.). De fato, o STF estabeleceu que “a homologação de sentença estrangeira, enquanto ato formal de recepção, pelo direito positivo brasileiro, de decisão emanada de Estado estrangeiro – apoia-se, dentro do sistema de controle limitado instituído pelo ordenamento jurídico nacional, em juízo meramente delibatório” (Petição Judicial, DJU de 10-10-1997, Relator Min. Celso de Mello). Com isso, o STF entendeu que a competência, hoje do STJ, é para a homologação de sentença estrangeira, oriunda de Estado estrangeiro, contexto em que não se enquadra as decisões da CIDH. 38. Esse é o posicionamento da melhor doutrina, destacando-se: RAMOS, André de Carvalho. Processo Internacional de Direitos Humanos, op. cit.; MAGALHÃES, José Carlos de. O Supremo Tribunal Federal e o direito internacional: uma análise crítica, op. cit., p. 102; MAZZUOLI, Valerio de Oliveira. Curso de Direito Internacional Público, op. cit., p. 912-913. 39. Artigo 68. 1. Os Estados-partes na Convenção comprometem-se a cumprir a decisão da Corte em todo caso em que forem partes. 2. A parte da sentença que determinar indenização compensatória poderá ser executada no país respectivo pelo processo interno vigente para a execução de sentenças contra o Estado.

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Como a decisão da Corte tem força jurídica vinculante e obrigatória para os países que aceitaram a sua jurisdição obrigatória, cabe ao Estado demandado o seu imediato cumprimento, valendo destacar que a sentença por ela prolatada valerá como título executivo, a ser executado conforme os procedimentos internos relativos à execução de sentença, previstos pelos ordenamentos jurídicos de cada Estado40. No Brasil, a sentença da Corte valerá como título executivo judicial, nos moldes previstos pelo art. 475-N, inc. VI, do Código de Processo Civil brasileiro41. Frise-se que o reconhecimento da jurisdição obrigatória da Corte Interamericana, nos termos da Convenção Americana de Direitos Humanos, introduziu no ordenamento jurídico brasileiro uma nova espécie de sentença judicial, ao lado da sentença estrangeira: a sentença internacional42. A aplicação das regras internacionais no plano interno e a sua conjugação com a normatividade brasileira merece algumas considerações. B. A EXECUÇÃO DA CONDENAÇÃO À INDENIZAÇÃO PECUNIÁRIA

Uma vez que o cumprimento das sentenças da Corte Interamericana pelo Brasil constitui uma obrigação jurídica, deve o Estado brasileiro, de modo espontâneo, proceder ao pagamento de eventuais indenizações fixadas pela Corte. Pelas regras estabelecidas pelo art. 68 da Convenção, o Brasil dispõe de duas possibilidades no momento de executar a sentença indenizatória da Corte. Pode o país executá-la espontaneamente, por meio do Poder Executivo Federal, cujo órgão encarregado de dar cumprimento a tais comandos é a Secretaria Especial de Direitos Humanos da Presidência da República43. Por outro lado, caso não haja o cumprimento espontâneo, a sentença trilhará o caminho da execução forçada, sendo observada, neste caso, a normativa interna referente à execução de sentenças contra a Fazenda Pública, prevista nos artigos 730 e 731 do Código de Processo Civil, devendo, também, ser observadas as demais disposições normativas correlatas, aplicáveis à hipótese44. 40. PIOVEZAN, Flávia. Direitos Humanos e o Direito Constitucional Internacional. 13. ed. São Paulo: Saraiva, 2012, p. 340. 41. “Art. 475-N. São títulos executivos judiciais: (...) VI – a sentença estrangeira, homologada pelo Superior Tribunal de Justiça”. Conforme já visto, as sentenças internacionais, segundo entendimento predominante, não carecem de homologação pelo STJ, por constituírem espécie nova e distinta das sentenças estrangeiras. 42. RAMOS, André de Carvalho. Processo Internacional de Direitos Humanos, op. cit. 43. Nesse caso, o cumprimento da sentença é determinado por meio da edição de um Decreto, promulgado pelo Presidente da República, que autoriza a Secretaria Especial dos Direitos Humanos a promover as gestões necessárias ao cumprimento da sentença, v.g., o Decreto n. 6.185, de 13 de agosto de 2007, que autorizou o pagamento das indenizações fixadas pela Corte no primeiro caso de condenação brasileira: o caso Damião Ximenes Lopes. Disponível em: . Acesso em 25 mar. 2013. 44. O tema da execução contra a Fazenda Pública sofreu significativo impacto com a edição da EC n. 62/09, valendo destacar nesse ponto, interessante estudo feito por Tassus Dinamarco in: Da Execução Contra a

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Ao contrário de outros países da América Latina, como Colômbia, Peru, Honduras, Venezuela e Costa Rica, o Brasil não conta ainda como uma disciplina jurídica que contemple mecanismos próprios para a execução de sentenças da Corte Interamericana, as chamadas enabling legislations45. Desse modo, resta apenas proceder a uma adaptação da execução das sentenças da Corte à execução das sentenças nacionais, tanto no que se refere às obrigações de entrega de coisa quanto no tocante às obrigações de fazer ou não fazer. No tocante às obrigações referentes às indenizações pecuniárias, que são adimplidas espontaneamente pelo Estado brasileiro, não se apresentam maiores dificuldades, pois o Brasil destina hoje uma rubrica orçamentária específica destinada a tal fim46, restando, atualmente, superado o burocrático procedimento anterior de aprovação de lei federal específica para a indenização das vítimas de violações de direitos humanos47. Por outro lado, a questão não é tão simples quando o assunto é o cumprimento forçado das sentenças da Corte Interamericana. Como o Brasil não conta com uma legislação específica para a regulamentação do tema, incidem as normas internas aplicáveis à execução das sentenças em face da Fazenda Pública, observando-se, nesse caso, o sistema de pagamentos por precatórios, estabelecido pelo art. 100 da Constituição48 e pelos artigos 730 e 731 do CPC, retromencionados. Assim, não havendo o cumprimento espontâneo da sentença por parte do Estado brasileiro, cabe à vítima ou ao Ministério Público Federal (CRFB,

45. 46.

47. 48.

Fazenda Pública: aspectos gerais de uma execução ainda controvertida. Disponível em: . Acesso em 25 mar. 2013. As enable legislations, assim como são conhecidas no plano internacional, são as legislações nacionais editadas com a finalidade de implementar as decisões de instâncias internacionais de proteção dos direitos humanos. A Lei n. 12.595, de 19 de janeiro de 2012, que estimou a receita e fixou a despesa da União para o exercício financeiro de 2012, seguindo na mesma direção de suas antecessoras, contemplou previsão de dotação específica para “pagamento de indenização a vítimas de violação das obrigações contraídas pela União por meio da adesão a tratados internacionais dos direitos humanos”, ficando o pagamento a cargo do Poder Executivo Federal, por meio da Secretaria Especial de Direitos Humanos. Disponível em: . Acesso em 25 mar. 2013. A prática anterior brasileira era no sentido da necessidade de edição de uma lei federal específica para o pagamento das vítimas de violações de direitos humanos, v.g., Lei n. 10.706, de 30 de julho de 2003. O art. 100, §§ 1º e 2º da Constituição, com a redação dada pela EC n. 62/09 assim dispõe: “Art. 100. Os pagamentos devidos pelas Fazendas Públicas Federal, Estaduais, Distrital e Municipais, em virtude de sentença judiciária, far-se-ão exclusivamente na ordem cronológica de apresentação dos precatórios e à conta dos créditos respectivos, proibida a designação de casos ou de pessoas nas dotações orçamentárias e nos créditos adicionais abertos para este fim. § 1º Os débitos de natureza alimentícia compreendem aqueles decorrentes de salários, vencimentos, proventos, pensões e suas complementações, benefícios previdenciários e indenizações por morte ou por invalidez, fundadas em responsabilidade civil, em virtude de sentença judicial transitada em julgado, e serão pagos com preferência sobre todos os demais débitos, exceto sobre aqueles referidos no § 2º deste artigo. § 2º Os débitos de natureza alimentícia cujos titulares tenham 60 (sessenta) anos de idade ou mais na data de expedição do precatório, ou sejam portadores de doença grave, definidos na forma da lei, serão pagos com preferência sobre todos os demais débitos, até o valor equivalente ao triplo do fixado em lei para os fins do disposto no § 3º deste artigo, admitido o fracionamento para essa finalidade, sendo que o restante será pago na ordem cronológica de apresentação do precatório.”

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art. 127) a deflagração da ação judicial pertinente, no âmbito da Justiça Federal, para a garantia do cumprimento da decisão da Corte (CRFB, art. 109, III). Ocorre que, nesse caso, o pagamento da indenização deverá observar o regime do precatório, que é o mecanismo estabelecido pela legislação interna brasileira, por meio do qual, em virtude de sentença judicial, o Poder Público realiza os pagamentos dos débitos devidos pelas Fazendas Públicas Federal, Estadual, Distrital ou Municipal, em ordem cronológica, conforme os precatórios lhe são submetidos49. A grande dificuldade que se apresenta neste caso é a conhecida morosidade dos pagamentos devidos pelo Estado por meio do sistema de precatórios. Nesse caso, a vítima de violação de direitos humanos, depois de percorrer um longo e demorado caminho até a obtenção de uma sentença condenatória que lhe seja favorável50, ela se vê, ainda, obrigada a aguardar por mais alguns longos anos o pagamento de sua indenização, conforme estiver fixada na execução da sentença internacional, uma vez que a fila dos precatórios costuma ser extensa e, por isso, demorados os pagamentos. A doutrina costuma apontar que essa morosidade fere o princípio da dignidade humana (CRFB, art. 1º, III), bem como o ideal da celeridade na prestação jurisdicional (CRFB, art. 5º, LXXVIII), vez que se atrasa em demasia a reparação pecuniária por violações de direitos humanos. Como medida paliativa para essa questão, sustenta André de Carvalho Ramos51 que as indenizações oriundas das sentenças da Corte deveriam ser equiparadas aos créditos alimentares, que gozam de certa preferência na ordem de pagamento dos precatórios, conforme disposição constitucional nesse sentido. Com isso, seria criada uma ordem própria para pagamento de tais indenizações, seguramente, de modo mais célere e alinhado ao espírito do Pacto de San José52. O grande problema dessa proposição é que o § 1º do art. 100 da Constituição, ao definir os débitos de natureza alimentícia, não faz qualquer menção à possibilidade de realização dessa comparação. O fato é que, atualmente, inexiste uma norma brasileira que regule o pagamento preferencial 49. Ao término do procedimento executório em face da Fazenda Pública é expedido o precatório judicial, consistente em uma “requisição dirigida pelo presidente do tribunal competente, que deverá mencionar a natureza do crédito, para que a Fazenda Pública efetue o pagamento, respeitando a ordem cronológica de chegada” (GONÇALVES, Marcus Vinicius Rios. Direito Processual Civil Esquematizado. São Paulo: Saraiva, 2011, p. 655). 50. Pois pressupõe-se que, para a obtenção de uma sentença favorável junto à CIDH, a vítima tenha percorrido todo o caminho das instâncias internas do Estado (até esgotá-las) e que também tenha passado por todo o procedimento estabelecido pela Convenção Americana de Direitos Humanos junto à Comissão e à Corte Interamericana. 51. RAMOS, André de Carvalho. Processo Internacional de Direitos Humanos, op. cit. 52. RAMOS, André de Carvalho. Direitos Humanos em Juízo: comentários aos casos contenciosos e consultivos da Corte Interamericana de Direitos Humanos. São Paulo: Max Limonad, 2001, p. 499.

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de indenização pecuniária decorrente de sentença da Corte Interamericana, embora haja um Projeto de Lei (PL n. 4.667/2004) nesse sentido, que tramita atualmente pela Câmara dos Deputados, dispondo sobre os efeitos jurídicos das decisões dos Organismos Internacionais de Proteção aos Direitos Humanos. Esse Projeto, contudo, não contempla a natureza alimentícia (que constava do projeto original) dos créditos oriundos das sentenças internacionais proferidas pela Corte Interamericana. C. A EXECUÇÃO DA CONDENAÇÃO À OUTRAS MEDIDAS PREVISTAS PELA SENTENÇA INTERNACIONAL (A PROBLEMÁTICA DAS OBRIGAÇÕES DE FAZER E NÃO FAZER)

No tocante aos comandos extrapecuniários contidos na sentença da Corte Interamericana, o Estado brasileiro é livre para escolher os meios a serem adotados para a sua completa execução, sendo certo que o conteúdo das obrigações de fazer ou não fazer poderá ser o mais amplo e diverso possível. A par das reparações pecuniárias, como exemplo de reparações extrapecuniárias fixadas em sentenças da Corte, podem-se citar: a soltura de presos, mesmo depois do trânsito em julgado (caso Tamayo vs. Peru); o livramento condicional de um preso (caso Maqueda vs. Argentina); a construção de posto médico e escolar (caso Aloeboetoe vs. Suriname); a obrigação de alterar leis internas ou alterar dispositivos legislativos já existentes (caso Suarez Rosero vs. Equador); a obrigação de investigar os fatos, julgar e, se for o caso, punir os responsáveis por violações de direitos humanos (caso Velasquez Rodriguez vs. Honduras, caso Godínez Cruz vs. Honduras, caso Ximenes Lopes vs. Brasil, caso Gomes Lund e outrosvs. Brasil); a realização de ato público de reconhecimento da responsabilidade estatal, com a presença de altas autoridades do país e das vítimas (caso Gomes Lund e outros vs. Brasil); a reabilitação das vítimas e familiares, com atendimento médico e psicológico (caso Gomes Lund e outros vs. Brasil); o desenvolvimento de programas de formação e capacitação para médicos, psiquiatras, psicólogos, enfermeiros e auxiliares de enfermagem e de pessoas vinculadas ao atendimento de saúde mental (caso Ximenes Lopes vs. Brasil); a publicação das sentenças da Corte em diários oficiais e jornais de ampla circulação nacional (caso Ximenes Lopes vs. Brasil, dentre muitos outros) etc.53 Conforme se verifica, no âmbito daquilo que tem sido denominado pela Corte como medidas de satisfação e garantias de não-repetição, reside a possibilidade de determinação de um vasto rol de medidas gerais ou específicas, 53. A sentenças da CIDH podem ser verificadas em: . Acesso em: 25 mar. 2013.

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consistentes em obrigações de fazer ou não fazer, visando a cessação da violação de direitos humanos, bem como a sua não-repetição e a satisfação dos direitos das vítimas lesadas. Em decorrência do princípio constitucional do acesso à justiça (CRFB, art. 5º, XXXV), tanto a vítima lesada como o Ministério Público poderá propor a ação executória em face da Fazenda Pública para a consecução e atingimento das obrigações de fazer ou não fazer, eventualmente impostas ao Estado brasileiro. No entanto, também aqui se apresenta o problema da falta de uma legislação doméstica brasileira, específica para satisfação das obrigações de fazer e não fazer especificadas em uma sentença da Corte. Contudo, deve-se ressaltar que ausência de uma enabling legislation brasileira não obsta a satisfação dessas espécies de comandos judiciais, devendose aplicar também, aqui, naquilo que couber, as disposições normativas relativas à tutela específica da obrigação, conforme previsto para as execuções que tenham por objeto as obrigações de fazer e não fazer (CPC, art. 461), bem como as regras atinentes à tutela específica das obrigações nas execuções que tenham por objeto a entrega de coisa (CPC, art. 461-A). No Brasil, outro problema que se levanta, notadamente quanto às obrigações de fazer impostas pela Corte, diz respeito à condenação do Estado em investigar, julgar e punir os indivíduos responsáveis por violações de direitos humanos, uma vez que tais determinações podem contrariar a normatividade interna reguladora do assunto, inclusive, bem como decisões de tribunais superiores pátrios, como aconteceu, v.g., no caso Gomes Lund e outros vs. Brasil (“Guerrilha do Araguaia”). Muitas discussões têm surgido acerca desta decisão da Corte, ocorrida em 24 de novembro de 2010, sendo inúmeros os seus reflexos na ordem jurídica brasileira, de modo que não caberia aqui neste estudo uma análise aprofundada sobre o tema. No entanto, algumas considerações são necessárias. Sucintamente, no caso em tela, o Estado brasileiro foi condenado, a par de outras medidas,a promover a investigação, o julgamento e a punição, se o caso, dos agentes estatais que cometeram violações de direitos humanos durante o regime militar ditatorial pelo qual passou o Brasil no período de 1964 a 1985. Dentre outras obrigações, estabeleceu a sentença: [...] o Estado [brasileiro] deve conduzir eficazmente a investigação penal dos fatos do presente caso, a fim de esclarecê-los, determinar as correspondentes responsabilidades penais e aplicar efetivamente as sanções e consequências que a lei disponha. Essa obrigação deve ser cumprida em um prazo razoável, considerando os critérios determinados para investigações nesse tipo de caso, inter alia:a) iniciar

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as investigações pertinentes com relação aos fatos do presente caso, levando em conta o padrão de violações de direitos humanos existente na época, a fim de que o processo e as investigações pertinentes sejam conduzidos de acordo com a complexidade desses fatos e com o contexto em que ocorreram, evitando omissões no recolhimento da prova e no seguimento de linhas lógicas de investigação;b) determinar os autores materiais e intelectuais do desaparecimento forçado das vítimas e da execução extrajudicial. Ademais, por se tratar de violações graves de direitos humanos, e considerando a natureza dos fatos e o caráter continuado ou permanente do desaparecimento forçado, o Estado não poderá aplicar a Lei de Anistia em benefício dos autores, bem como nenhuma outra disposição análoga, prescrição, irretroatividade da lei penal, coisa julgada, ne bis in idem ou qualquer excludente similar de responsabilidade para eximir-se dessa obrigação, nos termos dos parágrafos 171 a 179 desta Sentencia; e c)garantir que: i) as autoridades competentes realizem, ex officio, as investigações correspondentes, e que, para esse efeito, tenham a seu alcance e utilizem todos os recursos logísticos e científicos necessários para recolher e processar as provas e, em particular, estejam facultadas para o acesso à documentação e informação pertinentes, para investigar os fatos denunciados e conduzir, com presteza, as ações e investigações essenciais para esclarecer o que ocorreu à pessoa morta e aos desaparecidos do presente caso; ii) as pessoas que participem da investigação, entre elas, os familiares das vítimas, as testemunhas e os operadores de justiça, disponham das devidas garantias de segurança, e iii) as autoridades se abstenham de realizar atos que impliquem obstrução do andamento do processo investigativo54.(grifos)

Ocorre que o Estado brasileiro editou, em 28 de agosto de 1979, a lei federal n. 6.683, conhecida como Lei de Anistia, que em seu art. 1º consagrou o perdão político a todos aqueles que, no período compreendido entre 02 de setembro de 1961 e 15 de agosto de 1979, cometeram crimes políticos ou a eles conexos. Sendo chamado a se pronunciar a respeito de se determinar uma revisão da referida lei, o Supremo Tribunal Federal decidiu, no julgamento da Arguição de Descumprimento de Preceito Fundamental (ADPF) de n. 153, em 29 de abril de 2010, pela improcedência da ação, impedindo qualquer revisão da referida lei, mantendo-se, assim, as disposições normativas da referida lei55. Conforme se afere, há uma dissonância entre a decisão da Corte Interamericana e a decisão da Suprema Corte brasileira (esta proferida alguns meses antes daquela), de modo que a grande dificuldade reside no fato de se compatibilizar tais decisões, implementando a decisão da Corte Interamericana nesse ponto. Nesse sentido, embora o Estado brasileiro tenha oposto a decisão 54. Sentença disponível em: . Acesso em 25 mar. 2013. 55. Julgamento disponível em: . Acesso em 25 mar. 2013.

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do STF junto à Corte internacional, em sede de exceção preliminar, aduzindo que seria impossível a ela se transformar em uma instância de revisão das decisões do tribunal pátrio e, portanto, numa espécie de “quarta instância” judicial, reformadora de julgados nacionais, conforme explica André de Carvalho Ramos, assim entende a Corte: [...] a jurisdição interamericana de direitos humanos aprecia a conduta do Estado brasileiro em face da Convenção Americana de Direitos Humanos. Não há, então, nenhuma pretensão de rescindir julgados nacionais, mas sim em obrigar o Estado a respeitar os direitos humanos56.

Nesse contexto, cabe concluir que, como a Corte considerou incompatíveis com a Convenção Americana as disposições da Lei de Anistia que impedem a investigação e a imposição de sanção por graves violações de direitos humanos, tais disposições restam destituídas de efeitos jurídicos frente à decisão da Corte, não podendo, portanto, seguir representando um obstáculo para a investigação dos fatos relativos ao caso e nem mesmo para a identificação e punição dos responsáveis. Do mesmo modo, acrescentese, tampouco podem elas ter impacto igual ou semelhante a respeito de outros casos de graves violações de direitos humanos ocorridos no Brasil, conforme consagrados na Convenção Americana. Cabe, portanto, ao Estado brasileiro, proceder aos comandos emanados da sentença nesse sentido, sob pena de incorrer em nova violação da Convenção Americana, bem como de ser responsabilizado internacionalmente. Por fim, vale ressaltar ainda que a figura da federalização dos crimes contra os direitos humanos, inovação trazida pela EC n. 45/04, também pode consistir em um fator positivo frente a ausência de legislação específica para o caso das obrigações de fazer, notadamente quando se tratar de obrigações consistentes na investigação, julgamento e punição, se for o caso, de agentes causadores de violações de direitos humanos, funcionando como importante fator de “convencimento” e conscientização das autoridades estaduais acerca da necessidade da devida atenção e proteção aos direitos humanos. Referida emenda incluiu o § 5º ao art. 109 da Constituição, dispondo que: [...] nas hipóteses de grave violação de direitos humanos, o ProcuradorGeral da República, com a finalidade de assegurar o cumprimento de obrigações decorrentes de tratados internacionais de direitos humanos dos quais o Brasil seja parte, poderá suscitar, perante o Superior Tribunal de Justiça, em qualquer fase do inquérito ou processo, incidente de deslocamento de competência para a Justiça Federal. 56. RAMOS, André de Carvalho. Processo Internacional de Direitos Humanos, op. cit.

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4 CONSIDERAÇÕES FINAIS

Enquanto construção histórica que hoje integram, definitivamente, o patrimônio da humanidade, os direitos humanos têm exigido e obtido, notadamente nos últimos anos e em uma escala cada vez mais intensa, a atenção e o empenho dos países, no tocante à sua proteção e atuação no plano interno dos Estados. O trabalho demonstrou que o Brasil está plena e juridicamente inserido no ambiente global e regional de proteção dos direitos humanos, tendo assumido diversos compromissos internacionais nesse sentido, e estabelecido em seu próprio Diploma Fundamental a prevalência desses direitos como um princípio fundamental. Diante de tais engajamentos internacionais, constatou-se a necessidade de o Estado brasileiro dar cumprimento às decisões proferidas pela Corte Interamericana de Direitos Humanos, sob pena de incorrer em nova violação da Convenção Americana de Direitos Humanos, bem como ser responsabilizado internacionalmente. Das constatações havidas, verificou-se que o Brasil ainda carece de uma legislação doméstica, uma enabling legislation, apta a regular, de maneira idônea, a execução das sentenças internacionais prolatadas pela Corte em território nacional, facilitando e conferindo celeridade ao seu cumprimento. Do ponto de vista jurídico, a edição de normas específicas acerca de procedimento interno destinado a cumprimento às decisões mencionadas, poderiam atenuar ou até sanar os problemas enfrentados atualmente. Diante da ausência legislativa constatada, foram examinadas algumas medidas paliativas que podem auxiliar no adimplemento dos comandos emanados da sentença, tais como a utilização, naquilo que for compatível, das disposições normativas constantes do direito interno. Conforme se demonstrou, as decisões proferidas pela Corte Interamericana, em casos relativos ao Brasil, podem contemplar obrigações de responsabilização dos agentes públicos incompatíveis com a tradição jurídica brasileira, devendo-se concluir que a legislação doméstica, e até mesmo as decisões de tribunais pátrios, não podem constituir obstáculos à implementação da sentença prolatada pela Corte, considerando-se os compromissos jurídicos assumidos pelo Estado brasileiro no plano internacional. Por meio do presente estudo, espera-se ter demonstrado a real possibilidade de cumprimento das decisões emanadas da Corte Interamericana de Direitos Humanos no Brasil, mesmo diante da ausência de uma legislação específica

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sobre o tema e, ainda, quando haja a estipulação de distintas obrigações de fazer ou não fazer, tudo em prol da proteção do mais sublime dos direitos: o direito da pessoa humana. REFERÊNCIAS

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