A Existência de Deus e a Imortalidade da Alma como postulados da Razão Pura Prática a partir de Immanuel Kant

September 12, 2017 | Autor: Davi Galhardo | Categoria: Immanuel Kant, Filosofía, Iluminismo, Crítica Da Razão Prática, Idealismo transcendental
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A EXISTÊNCIA DE DEUS E A IMORTALIDADE DA ALMA COMO POSTULADOS DA RAZÃO PURA PRÁTICA A PARTIR DE IMMANUEL KANT Davi Galhardo Oliveira Filho

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Pôr em prática o soberano bem no mundo é no entendimento de Immanuel Kant (1986, p. 141) o objeto da vontade que se determina de acordo com a lei moral. Ora, a resignação das intenções à lei moral é por assim dizer a condição suprema do soberano bem. “Ela deve, pois, ser tão possível como o seu objecto (sic), porque

está contida no próprio mandamento de a

este fomentar” (Idem). No entanto, segundo Kant a plenitude da lei moral é a santidade, ou seja: um altíssimo grau de perfeição, que, no entanto nenhum ser racional do mundo sensível é capaz de alcançar neste mundo (dotado das categorias da Estética Transcendental. Cf. Crítica da Razão Pura). Tal progresso só é realizável num desenvolvimento que vai até o infinito (o qual necessitamos admitir enquanto objeto real da nossa vontade). O que Kant considerou até aqui como “(...)progresso infinito (...) sob o pressuposto de uma existência e de uma personalidade indefinidamente persistentes do mesmo ser racional”(Ibdem), pode-se chamar de: imortalidade da alma, logo, o exercício do soberano bem carece da pressuposição de imortalidade da alma, que deve ser entendida como indissoluvelmente ligada à lei moral, e como postulado (não demonstrável) da razão pura prática. O movimento proposto por Kant é de grande valor por que satisfaz (como demonstrado) à lacuna deixada pela interdição da razão especulativa (Cf. Crítica da Razão Pura), como também no que diz respeito à Religião. Vejamos: Na ausência de tal proposição, ou se despojaria a lei moral por completo de sua santidade, imaginando-a indulgente e adequada à nossa conveniência, ou então se exaltaria a sua missão e, ao mesmo tempo, a esperança de uma determinação inexeqüível, isto é, aguardar-se-ia a posse completa da santidade da vontade, divagando-se em sonhos místicos e teosóficos, de tão extravagantes, completamente contraditórios com o conhecimento de si mesmo; só o esforço incessante para o cumprimento pontual e completo de um mandato racional severo, não indulgente e, contudo, não real, mas sim de todo verdadeiro.

(KANT. 1986, p. 141) Para o Homem (ser racional, porém finito) só é possível um desenvolvimento até o infinito, a partir de graus inferiores até os graus superiores da perfeição moral. Assim, o 1

Graduando em Licenciatura Plena em Filosofia pela Universidade Federal do Maranhão. Bolsista do Programa Institucional de Bolsas de Iniciação à Docência – PIBID. E-mail: [email protected]

Homem (ser racional, porém finito) deve perseguir a santidade em total conformidade com a lei moral, ou seja: a perseverança no progresso moral, mesmo que para ‘lá desta vida’, e, por conseguinte nunca ‘aqui certamente’, nem em qualquer momento futuro previsível da sua existência (sensível), mas apenas na infinidade da sua duração. Com a análise até aqui realizada fica assegurada a possibilidade do primeiro elemento do soberano bem, a saber: a imortalidade. Cabe agora o mesmo movimento para um segundo elemento do soberano bem, ou seja: a felicidade. Para tanto, faz-se necessário o “(...) pressuposto da existência de Deus enquanto necessariamente inerente à possibilidade do soberano bem” (KANT. 1986, p. 143). Vejamos mais atentamente, no que implicam tais considerações na passagem que se segue: A felicidade é o estado de um ser racional no mundo, para o qual, no conjunto de sua existência, tudo ocorre segundo o desejo de sua vontade; assenta, portanto, na concordância da natureza com a finalidade total a que se propõe e, também, com o fundamento essencial de determinação da sua vontade. Pois bem: a lei moral, como lei da liberdade, ordena por meio de fundamentos de determinação, que devem ser inteiramente independentes da natureza e da coincidência da mesma com a faculdade de desejar (como motor); mas o ser agente racional no mundo não é ao mesmo tempo causa do mundo e da própria natureza. Desse modo, portanto, não há na lei moral o menor fundamento para uma conexão necessária entre a moralidade e a felicidade proporcionada à natureza de um ser pertencente, como parte, ao mundo, e, por conseguinte, por isso mesmo, esse ser não pode ser causa dessa natureza mediante a sua vontade, sendo que, no que concerne à sua felicidade, não pode, pelos seus próprios meios, produzir um acordo contínuo entre essa natureza e seus princípios práticos.

(KANT. 1986, p. 143)

Em acordo com o pensamento desenvolvido por Kant, devemos concluir que na aplicação necessária ao soberano bem, postula-se uma tal conexão: devemos procurar fomentar o soberano bem, que deve necessariamente ser possível. A partir disto devemos postular a existência da causa que contenha o principio desta conexão, ou seja: moralidade e felicidade. i. e. Deus. (...) o postulado da possibilidade do sumo bem derivado (um mundo ótimo) é ao mesmo tempo o postulado da realidade de um sumo bem originário, isto é, da existência de Deus. Constituía um dever imposto a nós mesmos fomentar o sumo bem; por isso, não só era um direito mas também uma necessidade arraigada ao dever, como exigência, pressupor a possibilidade deste supremo bem, o qual, ocorrendo apenas sob a condição da existência de Deus, congloba inseparavelmente a suposição do mesmo para com o dever, isto é, torna-se moralmente necessário admitir a existência de Deus.

(KANT. 1986, p. 144) Cabe lembrar que Kant nos adverte ainda para o fato de que tal necessidade é subjetiva (requisito) e não objetiva (dever), e deve sempre ser estendida como crença racional. Diante

dessa dedução podemos compreender porque o autor dirige longas críticas as Escolas Gregas (Epicuristas, Estoicos etc.), e afirma que estes falharam ao tentarem compreender a questão prática do soberano bem, pois dispensavam a existência de Deus. Do ponto de vista de Kant, a doutrina do Cristianismo é a única a “(...) satisfazer a mais rigorosa exigência da razão prática” (KANT. 1986, p. 147). A moral cristã suplementa a nossa carência inicial (do segundo elemento do soberano bem), pela sua representação do mundo, onde os Homens (seres racionais, porém finitos) se consagram à lei moral, a partir da noção de Reino de Deus (onde a Harmonia se consagra), que torna possível o soberano bem. A Santidade torna-se arquétipo, mas a Beatitude só torna-se atingível numa eternidade. Observamos nestas poucas linhas de que forma a lei moral nos conduz através do conceito de soberano bem, fim último da razão pura prática, até a Religião. (...) nunca se deve tratar a moral em si como doutrina da felicidade, isto é, como uma disciplina para chegar a ser participante da felicidade, porquanto ela só tem relação com a condição racional da última (conditio sine qua non), mas não com um meio de adquiri-la. Entretanto, quando ela (impondo apenas deveres e não dando regras aos desejos interessados) foi inteiramente exposta, só então, depois que despertado o desejo moral fundamentado em uma lei, de fomentar o sumo bem (conduzir a nós o reino de Deus), desejo que não poderia nascer anteriormente em qualquer alma egoísta, e depois de que, para satisfazer esse desejo, foi articulado o passo à religião, podemos denominar esta doutrina moral também doutrina da felicidade, porque a esperança desta última só desperta mediante a religião.

(KANT. 1986, p. 149)

Por fim, cabe observar que o Homem deve ser fim em si mesmo, ou seja: a Humanidade deve ser sagrada, haja visto que o Homem é o sujeito da lei moral, que se fundamenta na autonomia da sua vontade enquanto livre, e que deve procurar “harmonizar-se com aquilo a que deve submeter-se” (Idem. p. 151), e são em linhas gerais, nestes termos que se podem postular a existência de Deus e da Imortalidade da Alma na Razão Pura Prática.

REFERÊNCIAS CONSULTADAS

KANT, Immanuel. Crítica da Razão Pratica. Trad. Artur Morão. Lisboa: Edições 70, 1986.

______. Crítica da Razão Prática. Trad. Valério Rohden. São Paulo: Martins Fontes, 2008.

______. Crítica da Razão Pura. Trad. Valerio Rohden e Udo Baldur Moosburger. Coleção Os Pensadores. São Paulo: Abril Cultural, 1983.

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