A IDENTIDADE DO PROFESSOR DE INGLÊS PARA NEGÓCIOS: PRÁTICAS DE DISCURSO E DE ENSINO

May 23, 2017 | Autor: Elisa Mattos | Categoria: Teacher Identity, English Language Teaching (ELT), Identidades, Teaching Business English
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A IDENTIDADE DO PROFESSOR DE INGLÊS PARA NEGÓCIOS: PRÁTICAS DE DISCURSO E DE ENSINO ELISA MATTOS DE SÁ Authentic English Business Language Center e Universidade Federal de Minas Gerais Rua Paraíba, 330, sl 911 – 30130210 e Av. Antonio Carlos, 6627 – 31270901 Belo Horizonte – MG – Brasil [email protected]

Resumo. Este artigo objetiva refletir sobre a identidade do professor de inglês para negócios, suas práticas de discurso e de ensino. A identidade é aqui entendida como um processo construído na e pela linguagem, nas práticas discursivas nas quais o sujeito se engaja, estando em frequente transformação (Rajagopalan, 2004; Moita Lopes, 2003; Hall 1999). Através da análise de excertos de uma entrevista semiestruturada realizada com um professor de inglês para negócios percebe-se a emergência de marcas de sua identidade profissional, circundada por práticas de ensino desenvolvidas na/pela interação estabelecida com seus alunos, com base nas necessidades comunicativas que esses alunos lhe apresentam, gradualmente, e que vão muito além do espaço da sala de aula. Palavras-Chave. Identidade. Professor. Inglês. Negócios. Discurso. Abstract. This paper aims at reflecting upon the identity of the Business English teacher and his/her discourse and teaching practices. The identity phenomenon is seen as a continuous process constructed through and in the individual’s discourse practices (Rajagopalan, 2004; Moita Lopes, 2003; Hall 1999). Through the analysis of excerpts from a semi-structured interview conducted with a Business English teacher, we can observe features of the teacher’s professional identity, characterized by his teaching practices, the interaction with his students and his students’ communicative needs, which stretch far beyond the classroom space. Keywords. Identity. Teacher. English. Business. Discourse. 1. Introdução Este artigo é uma reflexão sobre a identidade do professor de inglês em sua atuação no meio corporativo, suas práticas de discurso e de ensino, e se refere à comunicação de mesmo nome apresentada no ENELIN 2011 – IV Encontro de Estudos da Linguagem/III Encontro Internacional de Estudos da Linguagem. Após esta introdução, na seção 2, refletirei sobre o fenômeno da identidade e a noção de sujeito que atualmente orienta estudos dessa natureza. Além disso, farei uma

1 Anais do Enelin 2011. Disponível em: www.cienciasdalinguagem.net/enelin

consideração sobre a atual concepção de identidade adotada por alguns pesquisadores da Linguística Aplicada, área que compreende minha pesquisa. Na seção 3, apresentarei as práticas de discurso e de ensino do professor de inglês para negócios. As práticas de discurso serão examinadas através de excertos de uma entrevista semiestruturada realizada com um professor de inglês para negócios, na qual marcas de sua identidade profissional podem ser observadas. Essa parte é seguida pela seção 4, que conclui este artigo.

2. Identidade e sujeito Analisar a identidade implica refletir sobre a noção de sujeito e reconhecer que nenhuma concepção de identidade – ou de sujeito – pode ser tratada de forma descontextualizada. Os trabalhos de Stuart Hall seguem essa diretriz e em Hall (1999) encontramos três diferentes concepções de identidade e sujeito, além de uma retomada de como essas categorias foram e tem sido analisadas ao longo do tempo. O primeiro sujeito mencionado por esse autor é o da época do Iluminismo, considerado centrado, unificado, dotado de razão e de consciência e ação, que emerge em meio ao colapso das estruturas medievais e possui uma consciência individual livre das instituições religiosas. A identidade desse período é vista como um núcleo interior que emergia pela primeira vez no nascimento do sujeito, desenvolvia-se com ele ao longo de sua vida, mas permanecia basicamente a mesma até a sua morte. A segunda noção de sujeito refletida por Hall (1999) é o sujeito sociológico, consciente de que se desenvolve na relação com outros sujeitos, e facilmente localizável nas grandes estruturas sociais, que eram também de fácil identificação. A sociedade, naquele momento, era bem delimitada e suas mudanças partiam de si e voltavam para si, fechando-se em um ciclo. Os papéis sociais – as posições assumidas pelo sujeito em sua atuação no mundo – também eram bem delimitados. O terceiro sujeito teorizado por Hall (1999) é o sujeito pós-moderno, concebido como sujeito “móvel”, multifacetado, por vezes incoerente, que está constantemente reexaminando suas ações, uma consequência do que o autor chama de “modernidade tardia”, caracterizada por antagonismos sociais. Segundo Hall (1999), a modernidade tardia fez com que várias posições do sujeito fossem colocadas à contestação, pois essas passaram a ser debatidas e refletidas nas esferas públicas, ou seja, foram politizadas. O indivíduo passa a falar de mais de um lugar e passa a ter vários papéis na sociedade, alguns até mesmo conflitantes, por isso é visto como incoerente e multifacetado. E ele assume e fala dessas posições porque elas foram legitimadas socialmente, com o passar do tempo e com as mudanças sociais, e são constantemente reexaminadas, repensadas e impactadas pelos eventos de um mundo globalizado. Outras características do sujeito pós-moderno são a fluidez e a mobilidade de sua identidade. Passa-se a dizer que o sujeito não é, ele está. As identidades, portanto, estão incertas e mutáveis porque são constantemente impactadas pelos eventos modernos, que, por sua vez, abalam as relações e condições sociais, descentrando-as, deslocando-as. É 2 Anais do Enelin 2011. Disponível em: www.cienciasdalinguagem.net/enelin

por isso, também, que Hall (1999) fala da identidade do sujeito pós-moderno como uma identidade fragmentada.

2.1 A identidade na Linguística Aplicada A noção de identidade atualmente defendida por vários pesquisadores da Linguística Aplicada alinha-se às reflexões de Hall (1999). Rajagopalan (2004) e Moita Lopes (2003) são alguns linguistas aplicados que tem investigado a identidade nos últimos anos e gerado reflexões significativas sobre o assunto. Para Rajagopalan (2004), por exemplo, as identidades são renegociadas através do “contato entre as pessoas, entre os povos, entre as culturas” (p.69) e estão em constante estado de transformação, sendo constantemente reconstruídas, “adaptadas e adequadas às novas circunstâncias que vão surgindo” (p.71). Já para Moita Lopes (2003), a identidade, ou “o tipo de pessoa”, pode mudar de contexto para contexto, a depender da forma como o indivíduo é reconhecido, em um determinado tempo e espaço, podendo ser “ambígua ou instável” (p.20) e é construída contextualmente, é um processo contínuo “dependente da realização discursiva em circunstâncias particulares” (2006, p.307).

3. Práticas de discurso e de ensino do professor de inglês para negócios 3.1 O ensino de inglês para negócios O inglês para negócios é o inglês utilizado em empresas, ensinado para adultos que já trabalham em um determinado setor profissional ou que estão se preparando para trabalhar em empresas (Frendo, 2005; Donna, 2000), e constitui uma modalidade de ensino de inglês, com vocabulário e usos específicos, mas não significa a criação de uma nova metodologia (Hutchinson & Waters, 1987). Em termos de metodologia, a mais adotada tem sido a abordagem comunicativa (Barton, Burkart & Server, 2010) ou uma combinação de métodos (Frendo, 2005; Donna, 2000) baseados nos princípios comunicativos de ensino de língua estrangeira. Uma característica definidora do inglês para negócios é a especificidade lexical compreendida por: a) vocabulário geral, ou a linguagem geral de negócios, b) vocabulário especializado usado em uma área de trabalho específica, e c) blocos lexicais, ou lexical chunks, ou expressões idiomáticas, verbos frasais e colocações específicas da linguagem de negócios (Barton, Burkart & Server, 2010). O inglês para negócios também é caracterizado por ser centrado em situações de trabalho e contextos reais e mais imediatos de aplicação da língua (Donna, 2000), prevê maior envolvimento entre professor e aluno (Ellis & Johnson, 1994; Donna, 2000) e possui necessidades muito bem delimitadas. Ellis & Johnson (1994) as organizam em: comunicativas (habilidades linguístico-comunicativas, linguagem usada no trabalho), 3 Anais do Enelin 2011. Disponível em: www.cienciasdalinguagem.net/enelin

pedagógicas (contexto de ensino, estilo de aprendizagem do aluno etc.) e corporativas (nível organizacional, relação aluno-empresa-professor).

3.2 O discurso do professor de inglês para negócios O professor entrevistado possui 17 anos de experiência no ensino de inglês, sendo 10 no ensino de inglês para negócios, é nativo da língua inglesa, não possui formação acadêmica e teve pouco treinamento pedagógico inicial para tornar-se professor. Suas habilidades foram adquiridas com o tempo e experiência no ensino. A entrevista semiestruturada foi desenvolvida com base nas diretrizes de Wengraf (2001), e foi guiada pelo roteiro de Bereckzky (2009) e realizada na língua materna do entrevistado. Sobre a transcrição, os negritos indicam palavras alongadas ou enfatizadas pelo professor. Ao responder se se considera um professor de inglês para negócios, o entrevistado fez referência ao tipo de aluno, visto como um profissional, e ao material usado como elementos definidores de sua identidade. Ou seja, sua identidade é construída na e pela interação com os alunos do meio corporativo e com base nas especificidades do ensino de inglês para negócios (representadas na fala do professor pelo material didático). “Yes… I teach people from companies… professionals, and all the material… that I use, that’s used here in the school is Business English material, so definitely yes.” O professor mencionou duas motivações que o levaram a lecionar inglês para negócios: uma profissional e uma pessoal, e indiretamente indicou uma demanda susbtancial por aulas de inglês profissional, citando que em geral adultos procuram essa modalidade de ensino. “I suppose as a result of the demand (...) and personally, I prefer giving classes to individuals, or small groups, to adults and not to kids, so the demand from that public, from that group is generally Business English.” “The reason why I focused on the Business teaching was because of the demand. And for me it’s more interesting than just day-to-day English. I think, I personally follow the markets, I invest, which means I have to keep up-to-date with what’s going on, and see what the tendencies are, and this helps me a lot when I’m teaching Business English.” O entrevistado reconheceu que o professor de inglês para negócios é antes de tudo um professor de inglês, ou seja, um profissional capacitado para o ensino dessa língua, mas afirma que um conhecimento das práticas do mundo empresarial é de 4 Anais do Enelin 2011. Disponível em: www.cienciasdalinguagem.net/enelin

extrema importância. A identidade do professor de inglês para negócios se faz ultrapassando os conhecimentos linguísticos e didáticos e englobando conhecimentos de mundo, especialmente do meio corporativo. “I think, first of all, the person, the Business English teacher has to be an English teacher. And, secondly, they need to have this insight into the business world.” “(…) to be a Business English teacher, a good Business English teacher, I think it’s essential that people have an insight into business, so that they can deal with people who work in that business environment, company environment and understand where they’re coming from, what they are talking about, and be able to discuss on their level, what’s going on in their area, in their company, in the market.” O professor de inglês para negócios, nas palavras do entrevistado, parece ser (ou deveria ser) um profissional de iniciativa, que busca ir além dos conteúdos previstos no material didático e tenta personalizar ao máximo o ensino da língua, tomando a iniciativa para procurar resolver os problemas e dificuldades de seus alunos. O professor deve buscar entender o mundo de seus alunos, sua realidade. “As a Business English teacher, we have to identify problems that people have, and know where to go to find good material that we can use to help people resolve those problems and read about the elements of the language they have difficulty with, do exercises related to those difficulties, I think it’s very important for people (…) to know when to leave the material, or put the material aside for a time, and concentrate on something specific, a gap that the student has in their English.” “To be a Business English teacher, the person really needs to have an interest in the area, or to have experience working the corporate world… and to have an insight in to the corporate world… to be able to talk to people on a level where they can exchange information about companies, not just being stuck with the material that’s in the books.”

4. Considerações finais Como vimos na análise do discurso do entrevistado, a identidade do professor de inglês para negócios é construída e reconstruída nas relações que esse sujeito desenvolve com seus alunos, com suas práticas de ensino e com as práticas do mundo corporativo. Essas interações – com os alunos, com a esfera empresarial – parecem contribuir para a constante reconstrução de sua identidade. Além disso, pode-se dizer que o professor de inglês para negócios é um sujeito multifacetado, que não deve se limitar à posição de professor, e que deve buscar 5 Anais do Enelin 2011. Disponível em: www.cienciasdalinguagem.net/enelin

assumir, ainda que temporariamente, outras posições, mais próximas daquelas posições assumidas por seus alunos.

Referências BARTON, Debbie; BURKART, Jennifer; SERVER, Caireen. The Business English Teacher. Peaslake: Delta Publishing, 2010. BERECKZKY, Klára. The identity of the business English teacher: A pilot study. In: LUGOSSY, R. HORVÁTH, J.; NIKOLOV, M. (Eds.), UPRT 2008: Empirical studies in English applied linguistics. Pécs: Lingua Franca Csoport, 2009. pp.83-98. Disponível em: . Acesso em: 02 jun. 2011. DONNA, Sylvie. Teach Business English. Cambridge: Cambridge University Press, 2000. ELLIS, Mark; JOHNSON, Christine. Teaching Business English. Oxford: Oxford University Press, 1994. FRENDO, Evan. How to Teach Business English. Harlow: Pearson Education Limited, 2005. HALL, Stuart. A Identidade Cultural na Pós-Modernidade. Rio de Janeiro: DP & A Editora, 1999. HUTCHINSON, Tom; WATERS, Alan. English for Specific Purposes. Cambridge: Cambridge University Press, 1987. MOITA LOPES, Luiz Paulo da. Socioconstrucionismo: discurso e identidades sociais. In: MOITA LOPES, Luiz Paulo da (Org.) Discursos de identidades: discurso como espaço de construção de gênero, sexualidade, raça, idade e profissão na escola e na família. Campinas: Mercado de Letras, 2003. pp.13-38. ________. Discursos de identidades em sala de aula de leitura de L1: a construção da diferença. In: In: SIGNORINI, Inês. (org.) Lingua(gem) e Identidade. 4ª reimpressão. Campinas: Mercado de Letras, 2006. pp. 303-330. RAJAGOPALAN, Kanavillil. Por uma linguística crítica: linguagem, identidade e a questão ética. 2a ed. São Paulo: Parábola Editorial, 2004. WENGRAF, Tom. Qualitative research interviewing: semi-structured, biographical and narrative methods. London: SAGE Publications, 2001.

6 Anais do Enelin 2011. Disponível em: www.cienciasdalinguagem.net/enelin

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