A memória da censura: a reconstrução do passado nas narrativas da TV Pública

July 8, 2017 | Autor: Iluska Coutinho | Categoria: Television Studies, Public TV, TV Pública, Telejornalismo
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A memória da censura: a reconstrução do passado nas narrativas da TV Pública1 COUTINHO, Iluska (pós-doutora)2 Universidade Federal de Juiz de Fora/MG Resumo: O propósito do artigo é refletir sobre a forma de reconstrução da memória do período ditatorial em uma programação especial desenvolvida pela TV Brasil, emissora pública brasileira, entre os dias 12 e 18 de maio de 2013. Na chamada Semana do Proibido, a proposta editorial foi colocar em cena em diferentes programas e formatos, narrativas sobre um período que teria sido marcado pelo silenciamento de vozes, também no jornalismo brasileiro. A partir da contribuição de autores como Michael Schudson, e da análise de material audiovisual, a proposta é avaliar como uma série de reportagens veiculada no Repórter Brasil rememora o passado, e ainda quais esquecimentos poderiam ser percebidos nas narrativas audiovisuais veiculadas no telejornal de horário nobre da emissora pública. Em termos mais gerais, no âmbito de pesquisa de longo curso sobre o jornalismo nas emissoras públicas de televisão, o texto pretende refletir sobre as presenças de elementos como pluralidade, diversidade, participação popular e autonomia em uma cobertura que pretende rememorar a censura, como estratégia para evitar sua repetição. Palavras-chave: Telejornalismo público; Narrativa; Pluralidade; Memória; Silenciamento

Introdução ou “É proibido proibir!” O golpe militar de 31 de março de 1964 alterou o regime de governo então em vigor no Brasil e a vida em sociedade em aspectos que poderíamos qualificar como amplos, gerais e irrestritos3. O acirramento da ditatura militar implantada naquele período, sobretudo com a promulgação do ato institucional número 5 (AI-5) em 13 de dezembro de 1968, converteu a censura em prática corriqueira, também no Jornalismo. Quase três décadas após a eleição do primeiro presidente civil em Colégio Eleitoral, percebe-se um desejo de narrar experiências silenciadas durante os chamados anos de chumbo. As narrativas sobre a repressão e a memória da censura emergem em diversas formas de expressão artística e midiática, entre elas na produção audiovisual de caráter público. Por isso, como trilha sonora dessa introdução, recorre-se à canção de Caetano 1 Trabalho apresentado no GT de História da Mídia Audiovisual, integrante do 10º Encontro Nacional de História da Mídia, 2015. 2 Mestre em Comunicação e Cultura (UnB), doutora em Comunicação Social (Umesp) com pósdoutorado na Universidade Nova de Lisboa com bolsa Capes. Atualmente é professora associada da Faculdade de Comunicação e do Programa de Pós Graduação em Comunicação (UFJF), atuando como coordenadora do Laboratório de Jornalismo e Narrativas Audiovisuais. Diretora Cientifica da Intercom, é bolsista produtividade do CNPq (PQ2. E-mail: [email protected] 3 A menção “ampla, geral e irrestrita” foi utilizada no processo de abertura vivenciado no Brasil a partir da década de 1980. Naquele período muitos exilados retornaram ao país, em um retorno que agora podia ser noticiado pelas emissoras de televisão.

Veloso intitulada “É proibido proibir”, como forma de salientar esse desejo de narrar um período no qual muitas vozes, estéticas e estilos teriam sido interditados. É nessa perspectiva que ganha interesse a proposta da TV Brasil, emissora de televisão pública criada em 2007, de narrar audiovisualmente o passado. Em 2013 esse resgate, de viés histórico, ocorreu por meio da “Semana do Proibido”, veiculada de 12 a 18 de maio daquele ano. A proposta do artigo é refletir sobre a construção da memória da censura em uma série de reportagens veiculadas no Repórter Brasil, edição noturna4, como parte da programação especial. Naquele período de maio de 2013 foram exibidos na TV Brasil programas e interprogramas tendo como tema a censura durante a ditadura militar no Brasil; ao todo foram 15 programas especiais, incluindo filmes, interprogramas, documentários e entrevistas. Além da abordagem do tema em vários formatos, na perspectiva da diversidade de gêneros demandada nas emissoras de televisão de serviço público, a “Semana do Proibido” também envolveu a produção de especiais em programas que compõem a grade regular de programação da TV Brasil: Conexão Roberto D´Avila, Observatório da Imprensa, Arte do Artista, 3 a 1, Sem Censura, Estúdio Móvel, Repórter Brasil, Caminhos da Reportagem e Musicograma. A forma de enunciação, de anúncio do período de rememoração da censura, por si só constitui-se em narrativa a ser avaliada, na perspectiva dos sentidos produzidos por meio de sons, imagens e edição. Disponível para consulta também na página da TV Brasil na internet, o vídeo de divulgação da Semana do Proibido recorreu a marcas e símbolos das interdições de outrora para, por meio do contraste, prometer o desvelamento, no presente, de discursos antes silenciados. Ao longo de 45 segundos as imagens mostram cenas de manifestações e, nestas de perseguições, imagens de obras artísticas, às quais eram sobrepostas ou sobre as quais se inscrevia, por meio de arte em formato de carimbos, diversas palavras chaves marcadas na locução: perseguidos, censura, proibidos. Em parte resultado de limitações de ordem técnica presentes na própria geração do material, mas também para reforçar a localização dos registros em um passado, superado, as imagens exibidas eram em preto 4

O Repórter Brasil é o telejornal da TV Brasil, veiculado em duas edições diárias. Inicialmente o programa era exibido no início da manhã e em uma edição noturna, analisadas em pesquisa realizada no âmbito do grupo de pesquisa Jornalismo, Imagem e Representação, atual Laboratório de Jornalismo e Narrativas Audiovisuais.

e branco. Como em uma transição ou ruptura visual, a cor entra em cena quando o texto narrado em off descreve a proposta de mostrar o que foi escondido, em uma referência ao lugar da TV Brasil como narradora daquela memória, antes silenciada. Houve um tempo em que vozes foram caladas. Obras censuradas. Homens e mulheres perseguidos por suas ideias. Mas esse tempo já ficou para trás. E aqui na TV brasil, o que um dia foi escondido será mostrado. Filmes, debates, entrevistas, shows, documentários e matérias especiais em nossos telejornais. Uma programação dedicada à liberdade expressão e opinião. Semana do proibido, a partir desse domingo aqui na TV Brasil. O que foi escondido será mostrado. (TV BRASIL-SEMANA DO PROIBIDO, 2015).

Algumas reflexões preliminares percebidas nesse vídeo serão evidenciadas na análise de cinco reportagens veiculadas no Repórter Brasil, recorte empírico sobre o qual sustenta-se a avaliação apresentada no âmbito desse artigo. O uso da cor, e os sentidos enunciados, quer por meio da edição de imagens, quer em sua associação com o texto, podem ser percebidos como tentativas de construir uma memória por contraste, marcando relações de alteridade com o passado, e com aqueles a quem era dado o poder de narração no regime militar. Constituída tardiamente, já no século XXI, a TV Brasil, televisão pública de alcance nacional, narra o passado buscando construir no presente o seu lugar como desveladora do real, como emissora capaz de narrar com independência e autonomia. Por meio desse tipo de material audiovisual, a emissora narra também sua busca por legitimidade, pela adesão do cidadão à sua programação. Interessa também refletir sobre a narração da memória da censura como forma de reconstrução de um passado, traumático. Para isso, a análise do material audiovisual foi realizada tendo como referência as reflexões de Michael Schudson sobre os processos de lembrança e esquecimento do caso Watergate, considerado pelo autor um evento significativo para o estudo da memória coletiva (SCHUDSON, 1997, p.51). Assim, a partir das contribuições do autor, e considerando também significativa a rememoração da censura como evento para refletir sobre a memória coletiva, no Brasil, apresenta-se em um primeiro momento uma descrição no artigo as narrativas audiovisuais veiculadas no Repórter Brasil na série que integrou a "Semana do Proibido", veiculada em maio de 2013. Em um segundo momento relaciona-se essas narrativas, suas presenças e ausências, à proposta construção, no presente, de um telejornalismo público mais plural, diverso, inclusivo.

Apesar de você: O desvelamento da censura na série de reportagens do Repórter Brasil A música de Chico Buarque tomada como título dessa seção foi inicialmente gravada em um compacto (single), em 1970, em uma clara referência ao período de restrição de liberdades, de manifestações, vivenciado durante o regime militar. O compositor acreditava que a canção seria vetada, mas os censores teriam entendido que a letra relatava a briga de um casal, e a música não sofreu cortes. A veiculação da série de reportagens no telejornal noturno da TV Brasil poderia ser assim entendida como o futuro, prometido na canção, tornado realidade: "(...)amanhã há de ser outro dia (...) como vai proibir, quando o galo insistir, em cantar(...)". A cobrança com juros, do grito contido e do samba no escuro, privilegiou na narrativa do Repórter Brasil os relatos de artistas consagrados e de profissionais da mídia nas cinco reportagens veiculadas: 1) censura na música; 2) censura aos jornais; 3) censura ao teatro; 4) censura ao cinema; 5) censura ao rádio e à televisão. Exibida entre os dias 12 e 16 de maio de 2013, a série de reportagens foi anunciada da seguinte forma pelo apresentador, em estúdio, No Repórter Brasil vamos mostrar a partir de hoje como a censura atuou em várias áreas, como cinema, imprensa e teatro. Na música os cortes forma motivados tanto por críticas de cunho moral, como pela necessidade de vetar mensagens de protesto nas canções. Com a perseguição os artistas tiveram que ser ainda mais criativos para burlar a repressão do regime. (TV BRASIL, 2013).

O início da narrativa audiovisual, em formato reportagem, era sempre iniciado com uma vinheta5 característica da "Semana do Proibido". Associadas a um áudio de sons de banda marcial (tambor e tarol), que remetia a sonoridade de desfiles e marchas militares, eram exibidas imagens de um jornal impresso sob o qual se "inseria" um carimbo na cor vermelha: censurado. No passeio pela imagem digital/ arte o foco seguinte era uma partitura de música, riscada com um "x", também na cor vermelha, marcando outro eventual silenciamento. Há uma derivação e mostra-se um aparelho de tv, tendo no caminho um rolo de filme e a imagem de uma tesoura. A tela da TV também "sai do ar" e no vídeo desta se inscreve a expressão censurado, também em vermelho. Assim, marcando os ocultamentos que teriam caracterizado o regime militar, 5

A vinheta televisiva é um pequeno vídeo que por meio de edição de áudio e vídeo constitui-se na marca de um produto audiovisual, programa ou quadro veiculado por emissora de televisão ou canal de vídeo disponível na internet.

a vinheta da série narrava a promessa de desvelamentos, em tempos agora democráticos, nos quais seria possível "ver o dia raiar, sem lhe pedir licença". A primeira reportagem da série tem como tema a censura aos cantores e compositores, e é iniciada com uma narrativa em off no qual as imagens em preto e branco de manifestações e ações de repressão militar são contrapostas a um áudio que enuncia a criatividade dos artistas. Essa teria sido a estratégia utilizada para driblar o período da ditadura, o que teria tido como resultado uma "valiosa trilha sonora". As imagens de festivais de música com Chico Buarque cantando a música "A banda", encerram esse primeiro fragmento da narrativa: "(...) pra ver a banda passar, cantando coisas de amor". Em uma entrevista/ sonora veiculada em seguida, o cantor e compositor Danilo Caymmi reforça o discurso da repórter Tais Faccioli: "Era preciso muita criatividade para disfarçar, para passar o que a gente estava querendo dizer, a opressão que a gente estava recebendo". Em uma passagem realizada no Arquivo Nacional do Rio de Janeiro, incluindo a transição ambiente externo/ interno, a repórter lembra que as músicas antes de serem gravadas precisavam passar por um órgão federal chamado Divisão de Censura de Divisões Públicas. "Desde 1996 os originais com os pareceres dos censores ficam no Arquivo Nacional de Brasília e aqui do Rio de Janeiro. O acervo carioca guarda 67 mil composições. Sete mil foram proibidas por critérios morais ou políticos". O trecho seguinte da narrativa vai exibir alguns desses originais, com destaca de trechos ou palavras que teriam motivado sua restrição ou proibição no regime militar: liberdade, homossexual, anistia, democracia no Chile. A locução destaca os casos de compositores censurados, e em seguida as ações de Roberto Menescal, então diretor de uma grande gravadora, que era chamado para depor na polícia federal quando os censores tinham críticas aos compositores. Segundo ele, Chico Buarque era o mais perseguido. Antes da veiculação da entrevista/ sonora com Menescal, ainda é possível ouvir um sobe som de Chico na música "você não gosta mim, mas sua filha gosta"6. O depoimento de Menescal confirma que o cantor e compositor era alvo preferencial dos censores: "Tudo dele era censurado, então a gente tinha que driblar. Como no caso do 6

O verso da música Jorge Maravilha, de Chico Buarque, é associado a uma possível referência ao general Ernesto Geisel, cuja filha Amália Lucy, havia se declarado fã do compositor. Essa versão contudo foi desmentida por Chico, que relatou um episódio em que deu um autógrafo que para uma filha de um agente de segurança que o deteve em uma ocasião.

Chico, que até um pseudônimo ele colocou, Julinho da Adelaide, para colocar uma música dele no disco." O episódio de gravação da música Calice, de Gilberto Gil e Chico Buarque é lembrado pela repórter e por Roberto Menescal, com inserção de imagens da letra da música que exibem o carimbo "vetado" e outras do show, que de acordo com os créditos teriam sido retiradas da internet. Apesar de ter sido vetada pelo que os censores consideraram um trocadilho com o verbo calar, a música foi cantada em um show realizado em 1973, apesar da tentativa da censura de impedir a apresentação, narradas por Menescal: " (...) foi lá embaixo e mandou cortar o som da sala. mas acho que já tinha a gravação praticamente completa." Outro compositor lembrado na narrativa da "Semana do Proibido" no Repórter Brasil, pelos problemas com a censura, foi Gonzaguinha, que estaria entre os artistas que mais tiveram músicas vetadas: "Em 1973 um censor proibiu de uma só vez, nove músicas do compositor". Uma imagem de arquivo do programa Musicograma, da TVERJ, permite acompanhar Gonzaguinha cantando "são as lutas dessa nossa vida que eu estou cantando"; ao trecho acrescenta-se na narrativa entrevista com o jornalista e crítico Sérgio Cabral. "Ele fazia o equivalente a cinco discos para gravar um. Um censor uma vez chegou perto dele e disse: "porque você não faz música igual ao Roberto Carlos, música romântica?". Aí ele falou, "faz o seguinte, eu faço música e você censura"." Por meio de imagens do show de Roberto Carlos e posteriormente de Caetano Veloso no exílio, a narrativa da repórter busca desconstruir a imagem de compositor alienado em geral atribuída ao primeiro, cujas letras "não eram tão inocentes assim. Como não era visado naquela época ele conseguiu emplacar "Debaixo dos caracóis dos seus cabelos", uma homenagem ao exilado. Sons e textos da reportagem ainda narram as dificuldades de Geraldo Vandré com a censura, o que é reforçado por Sérgio Cabral: "Ele foi muito ameaçado também. Aquele Geraldo Vandré que nós conhecíamos, ele foi assassinado pela ditadura." Já Ney Matogrosso, alvo dos censores mas por estar nú em uma capa de um disco, teria conquistado mais popularidade com a situação. De acordo com a entrevista dele inserida na narrativa, "(...) a censura mandou lacrar o disco...vendeu muito mais do que venderia se não estivesse lacrado".

O fim da ditatura, e da censura, esta com a promulgação da constituição, são abordados na última narração em off da reportagem. Marieta Severo surge na narrativa como uma entre milhões de brasileiros que "querem ver essa história passada a limpo. E desta vez sem cortes". Mas as imagens e o enquadramento que a inserem na dramaturgia do Repórter Brasil, associam à atriz o papel de ex-mulher de Chico Buarque, reforçado pela inserção do crédito durante sua entrevista. A atriz dá seu depoimento em uma manifestação na rua; há microfones da TV Brasil, TV Record e um não identificado, sem canopla. De acordo com Marieta Severo, Se você não pode omitir um pedaço de sua vida pessoal, na sua vida, você não pode omitir um pedaço da história de um país. Então é importantíssimo que tudo seja resgatado, que a gente tenha consciência de todas as coisas que aconteceram, por mais que elas sejam difíceis, dolorosas, a gente tem que saber delas. Para transmiti-las, para poder, é aquela velha história, não incorrer no mesmo erro. (REPÓRTER BRASIL, 2013)

A primeira reportagem da série é encerrada com sons e imagens de arquivo, nas quais Caetano Veloso canta "sem lenço e sem documento, nada no bolso ou nas mãos, eu quero seguir vivendo Amor....Eu vou, porque não, porque não". No retorno ao estúdio o apresentador reforça que "amanhã há de ser outro dia", como na música de Chico que serve de título a essa seção, de abordar na série de reportagens como a censura atuou para proibir mensagens críticas nos jornais. A segunda reportagem da série "Semana do Proibido" mostra a perseguição aos jornais durante a Ditadura e, construída pela equipe de reportagem da TV Brasil em São Paulo, ancora-se sobretudo nos depoimentos de jornalistas que experimentaram a restrição à liberdade em seu exercício profissional. A reportagem, que também foi veiculada no programa Repórter Rio, veiculado na emissora da TV Brasil localizada naquele estado (antiga TVE-RJ), tem Alberto Dines como primeiro entrevistado. Responsável pelo programa "Observatório da Imprensa", veiculado pela emissora de TV pública, ele é apresentado é apresentado nos créditos da reportagem como ex-editor chefe do Jornal do Brasil 1962-1973. "Todos os jornais apoiaram o regime, menos a Última Hora, que foi obrigada a capitular. A imprensa toda participou desse conluio. Se um jornal tivesse quebrado esse conluio mudaria, mas faltou coragem para algum deles.". Durante o depoimento do jornalista foram exibidas imagens de edições dos jornais O" Estado de S.Paulo" e "O Globo", com as manchetes "Democratas dominam

toda a nação" e "Empossado Mazzilli na presidência", respectivamente. Mino Carta acrescenta em seguida: "Em primeiro lugar havia um estranho telefonema cuja origem era totalmente desconhecida, por meio do qual uma voz, estranha também, dizia o que podia e o que não podia ser noticiado.". O editor chefe da revista Carta Capital é identificado nos créditos da reportagem como ex-editor chefe da revista Veja, no período entre 1968 e1976. Aos dois depoimentos, de jornalistas que são referência no Brasil, soma-se uma locução que narra em off as limitações possíveis já de acordo com a lei de imprensa, de 1967, e o acirramento da censura um ano depois, com a decretação do AI-5. Imagens de arquivo com o selo da TV Cultura (emissora pública vinculada ao governo do Estado de SP), em preto e branco, mostravam o congresso nacional fechado, os militares no Palácio do Planalto e imagens de recortes de jornais. Jornalistas e historiadores narram suas memórias da censura, os procedimentos dos censores, e algumas pequenas vitórias, brechas possíveis em tempos de silenciamento: Fizemos uma série de, eu chamaria uma série de traquinagens. Era previsão do tempo, tempos sombrios, nuvens negras...todo o jornal, o jornal inteiro estava cheio de eu diria, mais que insinuações, evidências de que agente estava dando um recado para o leitor de que estávamos sob censura. (ALBERTO DINES in REPÓRTER BRASIL, 2013).

Por meio do depoimento do historiador Luis Antonio Dias e de imagens de edições antigas, a reportagem narra a virada de posição do jornal "O Estado de São Paulo", mas crítico em relação aos rumos do governo a partir de 1969. A repórter menciona o uso dos poemas de Camões como forma dos jornalistas do jornal marcarem a supressão de notícias, pela ação dos censores. A ruptura do "contrato de leitura" seria uma forma do leitor comunicar ao seu público que estava sob censura. Mino Carta relata em outro depoimento a existência de maior controle, rigor, quando a censura passou a ser feita por civis: "(...)esses, talvez até por insegurança, eram infinitamente mais chatos, e queriar ver tudo, absolutamente tudo". Em uma banca de revista a repórter Vanessa Casalino narra a distinção entre as páginas da grande imprensa, controladas pela censura ou por interesses econômicos, e aquelas da imprensa alternativa, entre as quais se destacavam os periódicos "O Movimento" e "Opinião".

Na sede do Instituto Vladimir Herzog são tomados os depoimentos de Ricardo Carvalho, coordenador do Projeto Resistir é Preciso e de Elifas Andreato, ex-diretor de arte jornais Opinião e Movimento, que relata o episódio da capa em que o cardeal Dom Paulo aparecia em branco e preto, com a roupa vermelha, provocando a fúria do censor. A reportagem narra ainda, com imagens de antigas edições, a experiência do jornal Pasquim, do Rio de Janeiro, "que desafiava a censura com bom humor". O depoimento seguinte é de Ziraldo, ex-cartunista do periódico, que lembra as críticas veiculadas nas brechas, algumas não percebidas pelos censores de Brasília. Ex-editor chefe dos jornais Opinião e Movimento, Raimundo Pereira evidencia a distinção do segundo jornal em relação à mídia comercial, lendo seu logotipo: "(...) dirigido por um conselho eleito pela redação, feito com o trabalho e o dinheiro de mais de trezentas pessoas, entre as quais mais de cem jornalistas, nasce um jornal democrático". O jornalista lembra o episódio de publicação da declaração de independência dos Estados Unidos, vetada pela censura, que foi assim denunciada mundialmente. As dificuldades econômicas teriam sido responsáveis pelo silenciamento definitivo do jornal O Movimento, mesmo com o fim da censura, oficial. Elifas Andreato relata as dificuldades com gráfica, impressão e mesmo com os jornaleiros, que seriam ameaçados por vender um jornal de oposição. "Os recursos para pagamento de gráfica tinham que vir do jornaleiro, porque não vinham de anunciantes. Então esse era o terceiro e mais perverso tipo de censura", conclui o jornalista, em depoimento que encerra a segunda reportagem da série. Na terceira reportagem da série, também produzida pela equipe da TV Brasil em São Paulo, o tema central são as dificuldades de atores e diretores de teatro; a cnesura nesse caso ia dos cortes à violência física, segundo texto do apresentador. Assim como na matéria anterior, uma distinção estabelecida nessa matéria é a introdução de uma fonte da academia, um especialista no assunto, nesse caso a professora Cristina Castilho, coordenadora do Observatório de Comunicação, Liberdade de Expressão e Censura Universidade de São Paulo, cujo depoimento é inserido em diferentes momentos da narrativa audiovisual. Em um deles a professora aborda o trabalho dos chamados "diretores malditos", como Plínio Marcos, Dias Gomes, Gianfrancesco Guarnieri, ligados a partidos comunistas e movimentos sociais.

Autores, atores e diretores de grupos como o teatro popular União e Olho Vivo, o Teatro de Arena, entre outros, relatam suas dificuldades com a censura, a necessidade de apresentações prévias para os censores, e algumas tentativas de burlar as proibições, como a experiência do teatro jornal: "São dramatizações de notícias de jornal. Era um sonho que o Boal tinha e nós conseguimos fazer", lembra a atriz Dulce Muniz. No fragmento seguinte da narrativa da terceira reportagem, a repórter Vanessa Casalino toma como cenário as escadarias do Teatro Municipal de São Paulo, palco de manifestações no passado, com uma realizada em 1968, por atores hoje consagrados que pediram liberdade para a arte. O texto rememora um episódio que teria contado com a participação da atriz Fernanda Montenegro, e abre passagem para a inserção de um depoimento dela, veiculado originalmente na TV Tupi -1968 (Acervo da Cinemateca Brasileira). Para compensar os ruídos no áudio, há inserção de legenda sobre a imagem em preto e branco: "A greve, que pela primeira vez está sendo feita, infelizmente no teatro brasileiro é contra a censura, a favor da cultura", denuncia a atriz. Por meio de uma narração em off a repórter rememora a passeata dos 100 mil e um episódio violento do período, quando em julho de 1968 atores são agredidos e o cenário destruído após uma apresentação da peça Roda Viva, no teatro Rute Escobar. Um ator do Teatro Oficina, Renato Borghi, narra as torturas, que ficaram em sua memória, publicizada com a narrativa audiovisual: "(...) quebraram a perna de atores, fizeram muita maldade, queimaram o bico dos seios das atrizes com cigarros, enfim, foi uma coisa de uma violência total.". Enquanto a violência era atribuída a grupos paramilitares a censura era federalizada com o AI-5, exercida a partir de Brasília e com um caráter mais pseudo-científico segundo a professora Cristina Castilho, que relata a existência de manuais para "instruir o censor". A matéria ainda aborda a utilização do teatro fora dos palcos convencionais, utilizado como forma de conscientização dos estudantes, nas universidades. Também recupera-se na narrativa a experiência do grupo Forja, ligado aos movimentos sindicais. Tim Urbinati, autor e diretor do grupo lembra o período de enfrentamento: "A gente não mandava o texto para Brasília como o teatro profissional tinha que fazer, a gente fez como desobediência civil mesmo"(REPÓRTER BRASIL, 2013). Em uma entrevista de arquivo o então sindicalista Lula defende que o

trabalhador é bom também para produzir arte. Mas as dificuldades que ganhavam os palcos de teatro teriam determinado o ritmo da cultura e das artes, por exemplo, com os autores e atores sendo absorvidos pela televisão, segundo relata a especialista Cristina Costa. A quarta matéria da série aborda a censura ao cinema, incluindo cortes na narrativas do Cinema Nova das pornochanchadas. Os censores proibiam a veiculação tanto de críticas ao regime quanto de imagens consideradas fortes para valores conservadores, como as do filme Dona Flor e seus dois maridos, que teria sido liberado após uma artimanha de Luiz Carlos Barreto, que teria mobilizado a filha do então presidente Geisel; o episódio é relatado no depoimento do cineasta. De acordo com a narrativa da reportagem, a censura moral imposta de 1964 a 1967 teria se intensificado a partir de 1968, com o AI-5. Muitas obras, como "Terra em Transe", tinham sua veiculação proibida no Brasil, mas era exibidas e premiadas no exterior. A narrativa apresenta o trabalho da pesquisadora Leonor Pinto, criadora do site "Memória da Censura no Cinema Brasileiro - 1964-1988", que conta com documentos digitalizados que mostram detalhes dos cortes em mais de 400 filmes. "A censura sobre o cinema ela destruiu mais do que o cinema, ela destruiu vidas. O retrato do brasileiro na tela, destruiu a identidade do Brasil", avalia em depoimento a pesquisadora, que ainda aborda o confisco do longa O Justiceiro, de Nelson Pereira dos Santos pelos militares. A matéria resgata uma entrevista do cineasta à TVE do Rio de Janeiro, em 2010, quando ele relata a reclamação de uma senhora que teria achado que ocorreu um sacrifício real na gravação da cena de morte da cadela Baleia, personagem da trama. A matéria ainda aborda o papel da Embrafilme, e a guarda de grande parte dos filmes censurados no Arquivo Nacional do Rio, 354 películas que foram parcial ou integralmente vetadas, material que estaria disponível para o consulta do público. Em seu depoimento o coordenador de documentação audiovisual do Arquivo Nacional, Marcelo Siqueira, aborda a riqueza do material para conhecer a atuação da censura, e dos atores. Na sua passsagem a repórter Tais Faccioli relata a censura ao filme "Vai trabalhar vagabundo" e outros dos quais a atriz Zezé Motta teria participado. A última entrevistada da matéria lembra a ação da censura que assistia ao ensaio geral e dizia "o que a gente podia falar, o que a gente podia encenar e o que a gente podia cantar". A

narrativa é encerrada a voz de Zezé Motta, que canta "senhora Liberdade, abre as asas sobre nós, abre as asas sobre mim, abre as asas sobre mim...abre as asas sobre nós". No vídeo são exibidos fragmentos do filme Chica da Silva, como a imagem na qual a personagem sorri com a carta de alforria na mão. A última reportagem da série semana do proibido mostra como programas de rádio e tv foram censurados pela ditadura militar. Iniciada com a vinheta do radiojornal Repórter Esso, a narrativa em off da repórter explica que as notícias vinham pelo rádio, uma vez que na década de 1960 a maioria dos lares não contava com aparelhos de TV. Segundo a repórter com o golpe as emissoras teriam tido que mudar de sintonia...tons pesados de áudio introduzem na narrativa o depoimento de Lauro Gomes que tinha começado a trabalhar na Rádio MEC, e conta o desmonte das orquestras de cordas da emissora. Ele lembra que uma apresentadora foi taxada de comunista e impedida de tocar músicas russas em um programa sobre a história do balé; enquanto as memórias do radialista são narradas são exibidas inseridas imagens de fotografias dos antigos estúdio e auditório da Rádio MEC. Nos estúdios da Rádio Nacional, que integra os veículos administrados pela EBC7, a repórter Tais Faccioli conta que a emissora foi uma das que mais sofreu com a censura: "(...) um dia depois do golpe a emissora foi ocupada por militares e 36 funcionários demitidos, entre eles o radialista Gerdal dos Santos, que ficou 16 anos afastado dos estúdios". Em seu depoimento na matéria ele relata a invasão da rádio, que estava no ar, e teria sido fechada, o que considerou "(...) a maior violência de censura existente em nossa terra". No fragmento seguinte, a repórter narra em off a migração de grandes nomes do rádio para a televisão, para fugir da censura. Para isso toma como referência uma pesquisa desenvolvida por Beatriz Kushnir, autora de um livro sobre o assunto, que avalia que a censura sobre a televisão foi mais branda. Entrevistada, a pesquisadora afirma a TV Globo no início dos anos 70 vai contratar "censores aposentados, o que eles vão chamar de programa de qualidade, e fazer uma autocensura em toda a programação, para que a programação não caísse em impecilhos na censura federal".

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A Empresa Brasil de Comunicação foi constituída em 2007 e inclui emissoras de rádio, a Agência Brasil (portal), a TV Brasil Internacional, a NBR e a TV Brasil.

Com imagens de arquivo de O Bem Amado, cedidas pela Rede Globo, a repórter acrescenta em off que a censura prévia não impediu que a primeira novela em cores da televisão brasileira, o Bem Amado, de Dias Gomes, tivesse 37 capítulos retalhados. A sátira ao coronelismo teria incomodado os militares. Na rememoração final do Repórter Brasil, outra trama de Dias Gomes, entra em cena, a história de Roque Santeiro, novela foi censurada no dia da exibição quando a censura descobriu que tratava-se de adaptação da peça "O berço do herói", já censurada anteriormente. Só dez anos depois uma nova versão da novela foi ao ar. Em uma entrevista de arquivo com o dramaturgo, cedida a TVE RJ em 1989, Dias Gomes lembra que "(...) quando a novela foi pro ar e as pessoas perguntavam, porque essa novela foi proibida? não tinha nada para ser proibida". As mudanças exigidas pelos censores incluíam interdições e alterações de nomes, como em Escalada, que contava a história de Brasília. Segundo o dramaturgo Lauro Cesar Muniz os personagens eram proibidos de falar o nome de Juscelino Kubistchek: "Tentei JK não deu. Tentei Nonô, que era o apelido de infância do Juscelino, também não deu. Eu tentei de todas as formas possíveis e não conseguia, vetavam mesmo". A matéria ainda narra problemas enfrentados pelos programas de humor, como Planeta dos Homens e Chico City. Já entre os apresentadores de programas de auditório, Chacrinha e Silvio Santos nunca teriam incomodado, enquanto Hebe Camargo, Bibi Ferreira e Flávio Cavalcante eram vigiados de perto, segundo a repórter. Em 1971 o programa que Flávio apresentava na Tupi teria sido suspenso por um mês por críticas ao regime militar. A narrativa inclui um trecho de edição do programa que está disponível no Arquivo Nacional e teria sido retirada do ar: "Jornalista tem que dizer o que pensa, e depois arcar com a responsabilidade do que diz". Com a abertura e o retorno da liberdade de expressão, o diretor Fernando Barbosa Lima criou na TV Educativa do Rio de Janeiro o programa Sem Censura, definido pela ex-debatedora Vera Barroso como um lugar onde todo mundo podia dizer o que queria porque não tinha mais censura no Brasil. Em tom auto elogioso a matéria é encerrada com imagens de off imagens de Leda Nagle atribuindo a longevidade do programa ao fato de a fórmula "ter dado tão certo que continua fazendo sucesso".

Que as crianças cantem livres ou Considerações Finais A composição de Taiguara, lançada em 1973, serve de pretexto para a reflexão final desse artigo. O cantor exilou-se no mesmo ano em Londres; com 68 canções censuradas, foi um dos artistas mais perseguidos durante a ditadura militar, mas não compareceu à rememoração da TV Brasil. Chegado o momento em que a censura imposta outrora pelo regime militar não se constitui mais em uma proibição, é interessante refletir sobre o que não foi narrado nesse exercício de memória veiculado na série de reportagens do Repórter Brasil. Em um primeiro momento merece destaque a opção pelo enquadramento de formas e espaços artísticos tradicionalmente legitimados como lugar de narração dos impactos ou marcas da censura. Essa opção editorial representa também uma seleção particular daqueles atores sociais que ganhariam voz na "Semana do Proibido", desvelando aspectos que teriam sido ocultados anteriormente. Nesse sentido, caberia perguntar quanto àqueles cidadãos cujo silêncio não parece ter sido superado em tempos de democracia, que permanecem sem acesso ao exercício do direito à comunicação mesmo na rememoração da censura no canal público de televisão. A opção por relatar a censura a partir de manifestações culturais já consolidadas, transforma a figura célebre na fonte preferencial das matérias apresentadas. São os artistas, de maneira geral, que narram a censura no regime militar, a partir de suas vivências. Questiona-se nesse sentido, em que medida essa opção editorial da TV Brasil poderia aproximar-se do que Schudson considera uma das potencialidades da dimensão cultural da memória, um viés também normativo (1993, p.52). Ao realizar a narrativa da memória da censura por meio do depoimento de personagens do mundo artístico, as reportagens veiculadas no Repórter Brasil produzem sentidos que parecem legitimar autoridades já reconhecidas, publicamente, embora silenciadas em um passado. Assim, se a inclusão de vozes e de memórias antes ocultadas pode ser vista como uma forma de aproximar-se dos compromissos de pluralismo e esclarecimento, parte das promessas de uma emissora pública de televisão, sobretudo na veiculação de conteúdos jornalísticos, por outro lado ainda permanece um desafio a construção de uma narrativa mais diversa. Essa diversidade poderia ser enunciada por enquadramentos

menos tradicionais, que permitissem de forma mais intensa a participação do cidadão comum, e a emergência de suas memórias, nas narrativas audiovisuais da emissora pública. Considerando que, como sugere Schudson ao abordar as narrativas de memória sobre o caso Watergate, para o bem ou para o mal, aspectos culturais acabam por constranger a forma de contar histórias, e o passado (SCHUDSON, 1993. p.53), é possível construir no campo da televisão pública, a capacidade de desenvolvimento de novos formatos, estilos, atores, dramaturgias do telejornalismo mais inventivas, inovadoras. Nessas novas narrativas talvez fosse possível, por exemplo, que as mulheres assumissem papéis mais centrais nas tramas informativas. Afinal, aqui as reportagens em vídeo poderiam imitar a vida, em uma inversão do ditado popular, possibilitando a valorização de atrizes pela sua militância e trajetória, e não pelos laços de casamento enunciados na narrativa da repórter, e reforçados pelos créditos na tela. E, ainda seguindo as trilhas de Michael Schudson, se é impossível separar a tradição do passado e sua rememoração, da interpretação do presente, vale ressaltar a importância da (re)construção de memórias antes silenciadas, em que pesem as demandas por uma narrativa mais ampla e criativa. Como propõe a canção de Taiguara, que encerra esse artigo, é preciso "(...)que as crianças cantem livres sobre os muros / E ensinem sonho ao que não pode amar sem dor / E que o passado abra os presentes pro futuro / Que não dormiu e preparou o amanhecer…" Referências SCHUDSON, Michael. Watergate in American Memory: How We Remember, Forget, and Reconstruct the Past. Nova Iorque: Basic Books, 1993. REPÓRTER BRASIL 12/05/2013. Disponível em http://tvbrasil.ebc.com.br/reporterbrasilnoite/episodio/reporter-brasil-exibe-serie-sobre-a-semana-do-proibido. Acesso: 01/05/2015. REPÓRTER BRASIL 13/05/2013. Disponível em http://tvbrasil.ebc.com.br/reporterbrasilnoite/episodio/serie-mostra-censura-sofrida-pela-imprensa. Acesso: 02/05/2015. REPÓRTER BRASIL 14/05/2013. Disponível em http://tvbrasil.ebc.com.br/reporterbrasilnoite/episodio/serie-mostra-como-era-a-censura-militar-ao-teatro. Acesso: 2/05/2015. REPÓRTER BRASIL 15/05/2013. Disponível em http://tvbrasil.ebc.com.br/reporterbrasil-

noite/episodio/serie-mostra-censura-ao-cinema-durante-a-ditadura REPÓRTER BRASIL 16/05/2013. Disponível em http://tvbrasil.ebc.com.br/reporterbrasil-

noite/episodio/serie-mostra-censura-militar-ao-radio-e-a-tv

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