A PERCEPÇÃO DOS ATORES BLUMENAUENSES DE SEGURANÇA PÚBLICA EM FACE DA DESMILITARIZAÇÃO DAS POLÍCIAS NO ATUAL CENÁRIO NACIONAL

July 22, 2017 | Autor: G. Pires de Moraes | Categoria: Police, Police Reform, Desmilitarização
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UNIVERSIDADE REGIONAL DE BLUMENAU - FURB CENTRO DE CIÊNCIAS JURÍDICAS - CCJ CURSO DE DIREITO

GUILHERME PIRES DE MORAES

A PERCEPÇÃO DOS ATORES BLUMENAUENSES DE SEGURANÇA PÚBLICA EM FACE DA DESMILITARIZAÇÃO DAS POLÍCIAS NO ATUAL CENÁRIO NACIONAL.

BLUMENAU 2014

GUILHERME PIRES DE MORAES

A PERCEPÇÃO DOS ATORES BLUMENAUENSES DE SEGURANÇA PÚBLICA EM FACE DA DESMILITARIZAÇÃO DAS POLÍCIAS NO ATUAL CENÁRIO NACIONAL Trabalho de Conclusão de Curso apresentado para obtenção do grau de Bacharel em Direito pela Universidade Regional de Blumenau

Prof. Nildo Inácio – Orientador

BLUMENAU 2014

GUILHERME PIRES DE MORAES

A PERCEPÇÃO DOS ATORES BLUMENAUENSES DE SEGURANÇA PÚBLICA EM FACE DA DESMILITARIZAÇÃO DAS POLÍCIAS NO ATUAL CENÁRIO NACIONAL

Trabalho de Conclusão de Curso aprovado com nota 10 como requisito parcial para a obtenção do grau de Bacharel em Direito, tendo sido julgado pela Banca Examinadora formada pelos professores:

____________________________________________________________ Presidente: Prof. Nildo Inácio – Orientador, FURB

____________________________________________________________ Membro: Prof.ª Cláudia F. S. de C. Becker Silva – Examinadora, FURB

Blumenau, 03 de dezembro de 2014

TERMO DE ISENÇÃO DE RESPONSABILIDADE

Isento a Instituição de Ensino e seus agentes por todas as manifestações contidas nesta pesquisa.

________________________________ Guilherme Pires de Moraes

AGRADECIMENTOS Meus agradecimentos em primeiro lugar para Camila Werling, minha companheira de todas as horas, que mesmo em função de seu mestrado, fez de tudo para que este trabalho fosse possível. Sem você, meu amor, esse trabalho não teria acontecido! Aos meus familiares pelo auxílio e compreensão ao longo desta jornada acadêmica e pela educação que sempre prezaram tanto na minha vida e de meus irmãos. Em especial ao meu pai Marcelo Pires de Moraes e minha mãe Glaucia Sedrez Pires de Moraes pelos aconselhamentos e conversas que sempre tivemos. Agradeço também ao senhor meu avô, João Pires de Moraes que possibilitou os meus estudos e sempre foi inspiração para todos que o conheceram, saudades eternas! Aos companheiros do Rotaract Club de Blumenau pela compreensão, amizade e apoio nas horas que precisei. Vocês são de fato os melhores do mundo! A todos os amigos que auxiliaram para o sucesso deste trabalho, através de conselhos, revisões, sugestões e principalmente em ajudar a conseguir pessoas para as entrevistas, sem a qual não seria possível terminar este estudo. Agradeço os participantes deste estudo, em especial ao 3º Batalhão de Bombeiros Militar de Santa Catarina pela presteza e receptividade, a todos os policias militares e civis que se dispuseram em externar suas opiniões. Meu profundo respeito a todos estes heróis que trabalham para servir a população catarinense. Por fim, ao professor Nildo por toda a ajuda e aconselhamento para a realização deste trabalho e principalmente por me aceitar como seu orientando.

RESUMO Este trabalho trata de um estudo de caráter jurídico e método dedutivo sobre a proposta de desmilitarização das polícias no Brasil, através da percepção dos agentes de segurança pública de Blumenau e o significado que esta assume para os mesmos. Com base em pesquisa de bibliografias e entrevistas, o estudo faz um levantamento do histórico de construção das polícias e mapeia a visão e o discurso dos próprios agentes de segurança acerca da desmilitarização, buscando verificar como estes agentes compreendem o que vem a ser a desmilitarização e qual o seu posicionamento sobre o tema, para então fundamentar o debate de novas perspectivas jurídicas sobre a segurança pública através de posicionamentos análogos e opostos aos discutidos nas bibliografias. O trabalho propõe ainda levantar discussões sobre as recentes Propostas de Emendas Constitucionais a respeito da segurança pública, a PEC 51/2013 e a PEC 430/2009, dando voz aos agentes diretamente envolvidos nestas propostas. Palavras Chave: Desmilitarização. Segurança Pública. PEC. Unificação.

ABSTRACT This paper addresses a study of juridical nature, employing deductive method on the proposal of demilitarization of police forces in Brazil. Through the perception of public security agents in Blumenau and the meaning that it takes for them. Based on bibliographical research and interviews, the study makes a report of the historic build up of the Police forces and maps out the vision and the speech of their own security agents around the demilitarization. It seeks to verify if those agents understand the meaning and their positioning around the theme of demilitarization, for only then substantiate the debate on new legal outlooks about public security, using both, aligned e opposing positions relative to those found in the bibliographic queries. At last, the text evoke discussions about the recent public security oriented Proposed Constitutional Amendments, namely PEC 51/2013 and PEC 430/2009, giving voice to the the agents directly involved in these motions. Keywords: Demilitarization. Public Security. PEC. Police Forces Unification.

LISTA DE ABREVIATURAS E SIGLAS ABNT

Associação Brasileira de Normas Técnicas

Apud

Citado por

Cf.

Confira

FURB

Universidade Regional de Blumenau

PEC

Proposta de Emenda à Constituição

ONU

Organização das Nações Unidas

UN

United Nations

CONSEG

Conferência Nacional de Segurança Pública

SUMÁRIO 1

INTRODUÇÃO ........................................................................................................... 9

2

HISTÓRICO DAS FORÇAS DE SEGURANÇA INTERNA ............................... 11

2.1

PERÍODO PRÉ-REPUBLICANO .............................................................................. 11

2.2

PERÍODO REPUBLICANO....................................................................................... 16

2.3

SANTA CATARINA E AS INSTITUIÇÕES DE SEGURANÇA PÚBLICA .......... 18

3

DISCUSSÃO POLÍTICA ......................................................................................... 21

3.1

PEC 430/2009 ............................................................................................................. 21

3.2

PEC 51/2013 ............................................................................................................... 22

3.3

RECOMENDAÇÕES DA ONU ................................................................................. 25

4

DOS MOTIVOS E PERCEPÇÕES ......................................................................... 28

4.1

SIM, DEVEMOS DESMILITARIZAR!..................................................................... 28

4.2

NÃO DEVEMOS DESMILITARIZAR! .................................................................... 30

4.3

PERCEPÇÃO DOS ATORES DE SEGURANÇA PÚBLICA DE BLUMENAU .... 33

5

CONCLUSÃO ........................................................................................................... 38 REFERÊNCIAS ........................................................................................................ 40 APÊNDICES .............................................................................................................. 43

9

1

INTRODUÇÃO Esta pesquisa versa sobre a proposta de desmilitarização das polícias no Brasil

através da percepção dos agentes de segurança pública de Blumenau e o significado que esta assume para os mesmos, buscando verificar como estes agentes compreendem o que vem a ser a desmilitarização e também qual o seu posicionamento acerca desta temática. Esta pesquisa é de natureza político-jurídica e de método dedutivo utilizando a pesquisa bibliográfica baseada inicialmente em fontes documentais impressas para contextualização do tema, numa perspectiva histórica e conceitual. Foram consultadas também fontes primárias de livros, teses, dissertações, meios eletrônicos e outras fontes documentais. Alguns destes documentos foram encontrados na Biblioteca Martinho Cardoso da Veiga, estrutura pertencente à Universidade Regional de Blumenau. Outra fonte de pesquisa foi o banco de teses da CAPES e sítios eletrônicos que guardam livros e artigos pertinentes ao tema. Além disso, parte do projeto foi baseado em entrevistas realizadas com policiais civis, militares e bombeiros militares da cidade de Blumenau, que integram parte da força responsável pela manutenção da segurança pública. O debate sobre a desmilitarização no país é antigo, porém se faz necessária a discussão sobre o significado que esta assume para os próprios agentes de segurança pública, pois são eles os principais afetados neste processo. É relevante, portanto analisarmos a visão destes profissionais diretamente envolvidos com as questões de segurança pública. De acordo com o caput do art. 5º da Constituição Federal, o direito a segurança é garantia de todo cidadão brasileiro, como direito individual, sendo esta dever do Estado, e também subordinada diretamente aos governadores dos estados. Elencada por muitos cidadãos como assunto de prioridade para os órgãos detentores do poder público, é assunto frequente e vital na sociedade. Em seu art. 144º, dedicado à segurança pública, a Constituição Federal define os órgãos que tem a função de preservar a ordem pública. Nela, profere que a polícia civil, a polícia militar e os bombeiros militares são subordinados aos Governadores dos Estados, do Distrito Federal e Territórios, definindo também as competências de cada instituição, sendo a da polícia civil a de atuar como polícia judiciária e na apuração de infrações penais; a polícia militar cabe o policiamento ostensivo e a preservação da ordem pública; aos bombeiros militares, além das funções atribuídas em lei, devem executar atividades de defesa civil.

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Partindo desta perspectiva, as discussões atuais sobre o tema são em torno de uma Proposta de Emenda à Constituição, a PEC 51/2013, que propõe a reestruturação do modelo de segurança pública a partir da desmilitarização da polícia militar e do corpo de bombeiros militar atual e a unificação das polícias civis e militares numa única instituição de ciclo completo, caso esta proposta seja aprovada serão grandes as mudanças no cenário da segurança pública nacional. A questão da desmilitarização também foi tema de recomendações estrangeiras para o Brasil, a exemplo do relatório sobre o Exame Periódico Universal, realizado pelos países membros do Conselho de Direitos Humanos da ONU em 2012, mostrando que o tema é relevante inclusive para a comunidade internacional. Além disso, desmilitarização e unificação das polícias apresentam-se como um dos possíveis caminhos no cumprimento da função determinada pela lei, porém estas alternativas nem sempre são entendidas pela opinião pública. Através de minhas vivências passadas na vida castrense, que motivaram as indagações acerca da visão dos agentes diretamente envolvidos com a atividade policial, optei então pela temática do trabalho, por acreditar que trazer o debate para o campo acadêmico pode também contribuir para as discussões que envolvem o tema. Para introduzir o leitor, apresento no primeiro capítulo um resumo do histórico das forças e instituições de segurança que surgiram no Brasil desde os tempos da colonização, passando pelas instituições monárquicas e da república, as influências para as criações destas organizações, como se deram suas evoluções e quais as influências que exercem nas instituições presentes ainda hoje. Apresento também o início do processo de militarização destas forças estaduais, suas transformações e alterações ao longo do tempo chegando ao atual modelo militarizado. Em sequência, trago os principais argumentos norteadores das discussões sobre a desmilitarização, a PEC 51/2013 e a PEC 430/2009, suas propostas para a efetiva alteração da Constituição Federal, como propõem que seja a transição entre o modelo atual e o proposto. Apresento ainda as sugestões dos países que participaram da Revisão Universal Periódica promovida pelo Conselho de Direitos Humanos da ONU em 2012 e que aconselharam o Brasil, entre outros tópicos, a acabar com a polícia militarizada. No capítulo final faço um levantamento de pontos favoráveis e contrários à desmilitarização decorrentes das discussões políticas em torno da questão da desmilitarização e também a análise das entrevistas feitas com os agentes de segurança pública na cidade de Blumenau sobre a desmilitarização e unificação das polícias.

11

2

2.1

HISTÓRICO DAS FORÇAS DE SEGURANÇA INTERNA

PERÍODO PRÉ-REPUBLICANO O conhecimento dos diversos contextos de “força policial” que houve no Brasil

torna-se pertinente para melhor compreender o presente e as possíveis alternativas para o futuro. Neste capítulo serão abordados os diversos modelos organizacionais de forças militares ou militarizadas que atuaram no Brasil, apresentando um panorama histórico de sua implantação e mutação constante até o modelo atual de policiamento que temos. Desde o período colonial, quando houve a divisão das terras brasileiras em Capitanias Hereditárias, o donatário detinha pleno poder sobre estas terras e tinha a liberdade de organizar de forma absoluta a administrações da justiça, e assim, os serviços de “polícia”1. De acordo com BORGES FILHO (1994), o fracasso das capitanias hereditárias, fez com que as terras foram unificadas sob o Governo-Geral do Brasil e Tomé de Souza foi nomeado o primeiro governador-geral no ano de 1549. Desta forma vieram para o Brasil as primeiras instituições oficiais para a administração da colônia. A ordem nas capitanias era na sua maioria assegurada pelas forças militares – ordenanças, terços e milícias - nos modelos de organizações portuguesas trazidas da metrópole. A exemplo dos quadrilheiros de Portugal, instituídos em 1367 e que tinham como função manter a disciplina e a ordem das Hostes2, na data de 24 de outubro de 1626, Luiz Nogueira de Brito, o então ouvidor-geral, criou no Rio de Janeiro a instituição dos quadrilheiros. O quadrilheiro liderava um grupo de vinte pessoas, vizinhos e moradores da região onde atuava, e compunham assim, uma quadrilha. A atuação dos quadrilheiros se dava na prevenção de delitos comuns do dia a dia como “casas de jogos, furtos, concubinatos, acalmar desordens, insultos, efetuar prisões e castigos dos culpados e até coibir a feitiçaria” (EGE, 2013. p.17), caracterizando assim um dos primeiros traços de atividade policial de fato no país. Diferente dos quadrilheiros, que foram introduzidos no Brasil a exemplo da experiência portuguesa, o Capitão do Mato surgiu para atender a uma necessidade da colônia na época. Sua figura, muito conhecida no imaginário popular e imortalizada em obras

1

O uso das aspas no termo “polícia” se dá por não se referir ao conceito atual de polícia.

2

Termo utilizado na época para as os grupos com características militares.

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artísticas diversas, tinha como atividade a função de capturar escravos fugidos, e devolvê-los ao seu senhor, mediante pagamento da recompensa. Em seu livro, EGE discorre: A ligação do capitão do mato com as origens das forças de segurança oficiais na colônia remonta a meados do século XVII. Em 1659 a câmara do Rio resolver “criar uma companhia militar para o fim de caçar negros fugidos e destruir lhes os quilombos” (CARNEIRO, 2005 p. 248). Para o comando desta força de repressão foi nomeado o capitão do mato conhecido pela audácia e conhecimento das regiões de diversos quilombos, seu nome era Manuel Jordão da Silva e receberia como recompensa, irresistíveis 2/3 do valor de cada negro capturado. Para remediar estes males já havia a Câmara instituído prêmios pecuniários para a prisão de escravos fugidos, fixando tacas variáveis com a zona em que fossem capturados, as quais deveriam ser pagas pelo respectivos senhores. Com o engodo dessa recompensa haviam surgido numerosos capitães do mato... (Carneiro, 2005 p. 248 apud EGE, 2013 p. 20)

A mesma Câmara do Rio de Janeiro, no ano de 1669, nomeou Atanásio Pereira, outro famoso Capitão do Mato, para que fizesse o “policiamento” de determinadas estradas, pois muitos dos escravos fugidos se refugiavam nas matas da região e praticavam assaltos, furtos e outros delitos. Assertiva definição sobre o tema faz EGE ao citar Cotta: O quadrilheiro capitão do mato, idealizado pela câmara do Rio de Janeiro, seria uma forma híbrida. Uma metamorfose da função tipicamente urbana e polícia do quadrilheiro lusitano para a de caçador de escravos fugidos na cidade do Rio de Janeiro. (COTTA, S D, p. 6 apud EGE, 2013 p. 21)3

Explica BASTOS JÚNIOR (1984) que quando o Marquês do Lavradio assumiu o cargo de vice-rei, no ano de 1796, uma de suas primeiras providências fora a de utilizar a própria cavalaria de sua guarda para o patrulhamento da cidade do Rio de Janeiro. Também regulamentou a polícia municipal e a criação de um regimento de milícias. De acordo com FILHO (1994) em 1808, com a vinda da família real e sua corte para

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COTTA apud EGE, 2013. P. 21.

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o Brasil, o Príncipe Regente D. João VI organizou o serviço policial aos moldes do de Lisboa. Com o alvará de 5 de abril de 1808 criou-se então a Intendência Geral de Polícia da Corte e do Estado do Brasil e no dia 10 de abril do mesmo ano criou o cargo de Intendente Geral da Polícia, cargo este que detinha jurisdição plena em matéria policial, que acabou centralizando diversas atribuições que cabiam a diversos outros integrantes das “forças de segurança”, até mesmo do Ouvidor-Geral. A primeira pessoa que assumiu o cargo [de Intendente Geral da Polícia] foi Paulo Fernandes Viana, que propôs a criação da Divisão Militar da Guarda Real de Polícia e viria a ser criada mais tarde no ano de 1809, através do Decreto de 13 de maio de 1809. O texto deste decreto dizia que: Sendo de absoluta necessidade prover à segurança e tranquilidade publica desta Cidade, cuja população e trafico têm crescido consideravelmente, e se augmentará todos os dias pela affluencia de negócios inseparável das grandes Capitaes; e havendo mostrado a experiência, que o estabelecimento de uma Guarda Militar de Policia é o mais próprio não só para aquelle desejado fim da boa ordem e socego publico, mas ainda para obstar ás damnosas especulações do contrabando, que nenhuma outra providencia, nem as mais rigorasas leis prohibitivas tem podido cohibir: sou servido crear uma Divisão Militar da Guarda Real da Policia desta Corte, com a possível semelhança daquela que com tão reconhecidas vantagens estabelci em Lisboa... (BRASIL, 1809 p.54)

Escreve BORGES FILHO (1994) que a Guarda Militar criada por este decreto na época da monarquia, tornou-se a atual Polícia Militar do Rio de Janeiro, que até hoje comemora a data de 13 de maio de 1809 como a data de sua fundação. Vale ressaltar que o brasão de armas da instituição ostenta além das garruchas cruzadas (símbolo adotado pelas polícias militares), uma coroa e a sigla GRP, notavelmente Guarda Real de Polícia. A Constituição Federal de 1824 pouco falava sobre a organização das forças de segurança, apenas cita que o Imperador era o chefe do poder executivo e entre suas atribuições caberia a de prover tudo que fosse concernente a segurança interna. Também aborda que a organização da polícia interior das províncias e seus regimentos seria feita pela Assembleia Geral dos conselhos das províncias. Anos mais tarde, segundo BASTOS JÚNIOR (1984), uma portaria de 04 de novembro de 1825 efetivou a criação dos comissários de polícia, vale ressaltar, entretanto que a sua criação já havia sido determinada em um aviso de 25 de maio de 1810, na cidade do Rio

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de Janeiro e nas demais que julgassem convenientes. Contudo, o comissariado não durou muito tempo, sendo extinto pela lei de 15 de outubro 1827 e suas funções foram atribuídas ao cargo recém-criado de Juiz de Paz, que a exercia nas freguesias e capelas curadas, somando as atribuições policiais e judiciárias. Com a abdicação de D. Pedro I no dia 7 de abril de 1831, teve início o período regencial no Brasil, tempo este de instabilidade política e agitações públicas. A Regência passou a temer a unidade nacional, uma vez que uma forte oposição aos portugueses se instaurava, além de um medo constante de que o Exército tomasse alguma atitude “prómonarquia”. Assim diz RIBEIRO em sua dissertação: A soldadesca do Exército era formada de negros, mulatos, homens pobres, indivíduos, na maioria dos casos, sem nenhuma qualificação profissional, o que fazia com que fossem pouco considerados socialmente e, mesmo sendo brasileiros em sua maioria, eram vistos com desconfiança por parte dos demais segmentos da sociedade. Essa realidade, mas principalmente o fato de que muitos dos militares que ocupavam os altos postos de comandos eram estrangeiros, fazia com que a força de 1ª linha fosse considerada uma ameaça em potencial ao liberalismo da nova ordem instaurada com a Regência. (RIBEIRO, 2001 p. 40)

Neste período, uma das inovações criadas pela Regência, foi a Guarda Nacional, através da Lei de 18 de Agosto de 1831, que previa, entre outros, em seus artigos, o que segue:

Art. 1° As Guardas Nacionaes são creadas para defender a Constituição, a liberdade, Independencia, e Integridade do Imperio; para manter a obediencia e a tranquilidade publica; e auxiliar o Exercito de Linha na defesa das fronteiras e costas. Art. 2° O Serviço das Guardas Nacionaes consistirá: 1° Em serviço ordinario dentro do Municipio. 2° Em serviço de destacamentos fora do Municipio. 3° Em serviço de Corpos, ou Companhias destacados para auxiliar o Exercito de Linha. Art. 3° As Guardas Nacionaes serão organizadas em todo o Imperio por Municipios. Art. 4° A organização das Guardas Nacionaes será permanente; entretanto o Governo, quando julgar conveniente as poderá suspender ou dissolver, em determinados lugares. Art. 6° As Guardas Nacionaes estarão subordinadas aos Juizes de Paz, aos Juizes Criminaes, aos Presidentes das Provincias, e ao Ministro da Justiça. (BRASIL, 1831)

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Sobre a Guarda Nacional, DOLHNIKOFF diz: [...] os liberais criariam, em 1831, uma nova força coercitiva, que claramente se adequava ao novo arranjo institucional em via de implementação. Tratava-se da Guarda Nacional, cujo projeto de criação foi devidamente aprovado tanto na Câmara como no Senado. A importância da Guarda Nacional estava no fato de que se tornaria a principal força coercitiva do Império, sobrepujando o Exército, deslocado para um segundo plano. Ao contrário deste, a Guarda, obedecendo estruturalmente à orientação das reformas, era organizada por província, onde se submetia ao juiz de paz e ao governo provincial. Inspirada em sua congênere francesa, seu princípio básico era o de que todos os cidadãos brasileiros de 21 a 60 anos, desde que com renda para serem eleitores, nas cidades litorâneas, e para serem votantes nas cidades do interior. O alistamento era de competência do juiz de paz, a quem os guardas nacionais eram subordinados em primeira instância, e, em segunda, aos juízes criminais, presidentes de província e ao ministro da Justiça. Dado o caráter cívico da Arma, deveriam aqueles cidadãos servir sem o recebimento de nenhuma soldo. O governo oferecia-lhes apenas o instrumento bélico, sendo cada guarda responsável pela compra e conservação do seu uniforme. Dado ainda aquele caráter, bem como sua inspiração francesa, os postos de oficiais eram eletivos: cada paróquia, os guardas votavam nos seus oficiais de comando. (DOLHNIKOFF, 2005 p.91)

Menos de dois meses depois “por lei de 10 de outubro de 1831, era autorizada a criação, no Rio de Janeiro e nas províncias, de Corpos de Guardas Municipais Voluntários, ‘para manter a tranquilidade pública e auxiliar a justiça’.” (BASTOS JÚNIOR, 1984 p. 15) Ainda no mesmo ano, diz EGE (2013), que com a lei de 15 de dezembro de 1831 da Assembleia Provincial, foi criado em São Paulo o Corpo de Guardas Municipais Permanentes, dito ainda hoje que este foi o início da história da Polícia Militar de São Paulo. De acordo ainda com BASTOS JÚNIOR: O aparecimento desses corpos militarizados orientados para missões estritamente policiais assinala o nascimento das corporações policiaismilitares nas Províncias, constituindo-se na origem imediata de várias polícias-militares estaduais da atualidade. (BASTOS JÚNIOR, 1984. p.103)

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No ano seguinte, em 1832, foi criado o cargo de Chefe de Polícia, que caberia aos juízes de direito atuantes nas cidades populares. Posteriormente, com a lei nº 261, de 03 de dezembro de 1841, houve uma reforma na organização das polícias, e o cargo de Chefe de Polícia recebeu as mais importantes atribuições que eram dos Juízes de Paz. Em seus artigos 1º e 2º a referida lei dizia: Art. 1º Haverá no Municipio da Côrte, e em cada Provincia um Chefe de Policia, com os Delegados e Subdelegados necessarios, os quaes, sobre proposta, serão nomeados pelo Imperador, ou pelos Presidentes. Todas as Autoridades Policiaes são subordinadas ao Chefe da Policia. Art. 2º Os Chefes de Policia serão escolhidos d'entre os Desembargadores, e Juizes de Direito: os Delegados e Subdelegados d'entre quaesquer Juizes e Cidadãos: serão todos amoviveis, e obrigados a acceitar. (BRASIL, 1841)

No mês seguinte houve a regulamentação da desta lei pelo Decreto nº120 de 31 de janeiro de 1842, onde submeteu à autoridade do Ministro e Secretário de Estado dos Negocios da Justiça toda a administração das polícias do Império, bem como, houve a separação entre polícia administrativa e polícia judiciária. Explica-se que “a função policial e a administração da justiça se confundiam, já que a polícia judiciária tinha competência para julgar determinados crimes.”. (BASTOS JÚNIOR, 1984 p. 16) A organização feita pela Lei nº 261 veio a ser alterada somente trinta anos depois com a lei nº 2033 de 20 de setembro de 1871, que entre outras mudanças, tornou incompatível a função policial e a da magistratura no mesmo cargo. Lei esta que vigorou até a Proclamação da República, tendo somente algumas alterações em 1890, pelo Decreto nº 848.

2.2

PERÍODO REPUBLICANO O Corpo de Guardas Municipais Permanentes de São Paulo, com o passar os anos

ficou conhecida com diversos nomes, como: Guarda de Polícia, Brigada Policial, Força Policial e por fim, no ano de 1891, Força Pública. A influência francesa na polícia de São Paulo pode ser percebida pela sua denominação; o termo “Força Pública” aparece pela primeira vez na

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Declaração Universal dos Direitos do Homem e do Cidadão, proclamada no pós-revolução pela Assembleia Constituinte Francesa, em 26 de agosto de 1789: Art. 12.º A garantia dos direitos do homem e do cidadão necessita de uma força pública; esta força é, pois, instituída para fruição por todos, e não para utilidade particular daqueles a quem é confiada. (EGE, 2003 p.46)

Para tanto, foi contratada pelo governo paulista e pelo ministro das relações exteriores, o Barão do Rio Branco, a Missão Militar Francesa com “o objetivo de estruturar e moldar os policiais paulistas segundo os princípios de severa disciplina, aperfeiçoando a técnica e cultura da organização” (PEDROSO, 2005 p.82). A missão francesa iniciou seu trabalho na data de 28 de março de 1906, período no qual a Força Pública contava em suas fileiras 4.568 homens. Sobre a chegada dos franceses a São Paulo: A missão francesa trouxe muito mais que o reforço da cultura e do ritual militar à instituição, ou de melhorar a capacidade operacional e a disciplina. Os franceses contribuíram em avanços estruturais e no campo da comunicação, locomoção de tropas, canil e artilharia [...] e uma das primeiras providencias adotadas pelo coronel francês à frente das instruções foi a reorganização da distribuição do efetivo, em Batalhões, Companhias e Pelotões. Os uniformes foram revistos, alterados e simplificados, seriam os mesmos em todos os níveis hierárquicos eliminando os exageros, como as luvas e ornamentos reluzentes. (EGE, 2003 p.47)

Em certo episódio, no ano de 1909, o comandante da missão, tenente-coronel Paul Balagny, apresentou um plano de compras de material de campanha e de treinamento moderno de guerra. Essa postura agressiva e intimidadora imputada na Força Pública, era um recado cristalino para o governo central sobre a força da província de São Paulo. Tanto foi, que os membros da Força Pública logo foram conhecidos por integrarem o “pequeno exército paulista”. Cabe ressaltar, a fim de demonstrar o tamanho desta organização o que conta EGE: [...] em Dezembro de 1913 a lei estadual 1395-A criou a Escola de Aviação da Força Pública, nada menos que 28 anos antes da criação da Força Aérea Brasileira! Assim ao término da missão, a milícia de São Paulo tornara-se

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um exército regular muito profissionalizado em comparação com ao Exército Brasileiro e as demais forças estaduais. Os objetivos desta corrida armamentista paulista seriam conhecidos em sua revolução burguesa de 1932, e a experiência adquirida seria multiplicada pelas milícias regionais em todo país. (EGE. 2003 p. 49)

Ainda sobre essa disparidade de poderio entre a Força Pública de São Paulo e o Exército Brasileiro, BICUDO escreve: A Força Pública de São Paulo, cujos efetivos atingiram níveis superiores ao do próprio Exército - em 1930 a Força Pública contava com 14.224 homens, ao passo que o Exército dispunha apenas de 3.675 - chegando a ter artilharia de campo e até mesmo a dispor de aviões de combate. Serviu ela de núcleo de base aos movimentos contra o poder central deflagrados em 1924 e 1932. (BICUDO. 2000)

Esse tempo junto a missão francesa serviu para mostrar a eficiência do modelo militar, para que o Governo de São Paulo estivesse protegido de abusos do governo central e para ter uma força de reação aos movimentos populares, uma vez que a Força Pública foi criada para manter a ordem no perímetro urbano da província, mas detinha todas as características e preparo de um exército pleno. Logo mais o sistema seria replicado pelas demais milícias do país. Em São Paulo, segundo EGE (2003), enquanto a Força Pública se transformava no “pequeno exército paulista”, o policiamento urbano havia deixado de ser a preocupação principal da tropa, o que fez surgir novamente a necessidade de criação de uma nova instituição que realizasse esse patrulhamento, sobretudo na capital, onde em 1920 já havia uma população maior do que 579.000 habitantes.

2.3

SANTA CATARINA E AS INSTITUIÇÕES DE SEGURANÇA PÚBLICA Em Santa Catarina o processo foi semelhante aos modelos mencionados

anteriormente, seguidos por São Paulo e Rio de Janeiro. Feliciano Nunes Pires, o então Presidente da Província, extinguiu os Corpos de Guardas Municipais Voluntários que

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existiam aqui e foram substituídos pela Força Policial, através da Lei Provincial nº 12 de 5 de maio de 1835. O regulamento da Força Policial teve sua regulamentação oficializada somente no ano seguinte, onde incumbia a organização de atender ocorrências de incêndios até a apreensão de infratores das posturas municipais4. No ano de 1916, recebeu o nome de Força Pública e em 1934 viria a ser elevada à categoria de “força auxiliar do Exército Brasileiro”, promoção essa oriunda de um acordo entre a União e o Estado e também inserido no art.167 da Constituição Federal de 19345, condição essa que se mantém até os dias de hoje. Apesar da Constituição de 34 utilizar o termo “polícia militar”, a Força Pública recebeu esta denominação somente em 1946, com a nova Constituição, onde previa também que sua missão era a segurança interna e a manutenção da ordem. Prevê ainda que a União legislará sobre a organização, instrução, justiça e garantias das PM. A Constituição de 1967 deu poderes a União de legislar sobre as Polícias Militares, conforme seguinte:

Art. 8º - Compete à União: XVII - legislar sobre: v) organização, efetivos, instrução, justiça e garantias das policias militares e condições gerais de sua convocação, inclusive mobilização. § 1º - A União poderá celebrar convênios com os Estados para a execução, por funcionários estaduais, de suas leis, serviços ou decisões. § 2º - A competência da União não exclui a dos Estados paera legislar supletivamente sobre as matérias das letras c, d, e, n, q e v do item XVII, respeitada a lei federal. (BRASIL, 1967)

Com a promulgação da atual Constituição, em vigor desde 1988, a função da Polícia Militar está prevista no art. 144 e é subordinada ao Governador de cada Estado. Considerada como o surgimento do que viria a ser a Polícia Civil em Santa Catarina, a data de 29 de julho de 1812, foi o mesmo dia em que nomeou-se o primeiro Intendente Geral de Polícia da “Capitania de Santa Catarina”. As mudanças de nome e organização da instituição seguiram como as demais mudanças citadas anteriormente, passando pela Intendência Geral de Polícia, de onde vieram diversos auxiliares do Intendente Geral que seriam como “delegados” no interior do estado. Depois, em 1834 (dois anos após a reforma do Código de Processo Criminal de 1832), foi criada a Chefia de Polícia, com a Lei 262/1841

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As Posturas municipais são o regramento emanado das câmaras municipais que obrigam ao cumprimento de certos deveres de ordem pública.

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Art. 167 - As polícias militares são consideradas reservas do Exército, e gozarão das mesmas vantagens a este atribuídas, quando mobilizadas ou a serviço da União.

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surgiram os Delegados de Polícia e em 1891 receberiam diversas competências através da Lei nº 104 de 19 de agosto como preparar processos de determinados crimes, proceder com inquérito policial, conceder fiança e também que procedessem todas as diligências para apurar os fatos de crimes assim que soubessem de sua existência. O termo “Policia Civil” passou a ser usado no fim de documentos para diferenciar a Guarda Nacional e a Força Pública. Em 1937 foi criada a Delegacia de Ordem Política e Social – DOPS. O Primeira Estatuto da Polícia Civil é datado de 21 de outubro de 1976 onde houve a reorganização da carreira na polícia civil através das leis 5.266 e 5.267 e revogado pelo segundo Estatuto através da Lei nº6.843 de 28 de julho de 1986. História mais recente das organizações, iniciou-se com a Lei Estadual nº 1.288 de 16 de setembro de 1919, criando a Seção de Bombeiros que constituía parte do efetivo da Força Pública e teve instrução especial para as missões que lhe cabiam com dois integrantes do Corpo de Bombeiros do Distrito Federal. Vale ressaltar que a primeira Organização de Bombeiro Militar fora da capital foi em Blumenau, no ano de 1958. O caráter militar do Corpo de Bombeiro se deve ao fato destes serem subordinados a estrutura organizacional da Polícia Militar de Santa Catarina conforme a Lei Estadual nº 6.217, de 10 de fevereiro de 1983, apesar de ter um Estado-Maior próprio. Somente em 2003, através da Emenda Constitucional nº33 da Constituição do Estado de Santa Catarina, “elevou” o Corpo de Bombeiros Militar à categoria de organização independente e ainda considerada como força auxiliar e reserva do Exército, formando assim o grupo de Militares Estaduais em conjunto com a Polícia Militar de Santa Catarina.

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DISCUSSÃO POLÍTICA Atualmente existem duas grandes Propostas de Emenda à Constituição (PECs)

aguardando para serem votadas, são elas a PEC 430/2009 que propõe a criação de uma nova Polícia do Estado e do Distrito Federal e Territórios, acabando por substituir as atuais Polícias Militares e Civis e a PEC 51/2013 que prevê uma reestruturação do atual modelo de segurança pública e a desmilitarização da polícia. No tocante às reformas no sistema de segurança pública existem diversas outras PECs, dentre as quais podemos citar a PEC 19/2013, PEC 73/20136, PEC 40/2012, PEC 102/2011 entre outras que não serão abordadas nesse trabalho. Outro documento que reavivou o debate sobre a desmilitarização no cenário brasileiro foi o emitido pelo Conselho de Direitos Humanos7 da ONU durante a Revisão Periódica Universal8 em 2012. Essa revisão, que acontece a cada quatro anos, constitui numa analise todos os Países-membros da ONU e verificando se os mesmos estão cumprindo adequadamente as obrigações e compromissos assumidos em tratados internacionais a respeito de direitos humanos. Nas recomendações feitas pelos demais membros, sugeriu-se que o Brasil acabasse com a polícia militarizada. 3.1

PEC 430/2009 A PEC 430/2009 propõe, como dito anteriormente, a criação de uma nova Polícia do

Estado e do Distrito Federal e Territórios e para isso prevê a criação de novos cargos para uma polícia una, que exerça as funções de polícia judiciária quando preciso e haja preventivamente na parte ostensiva e de repreensão de delitos. O autor se preocupou em criar cargos que possam absorver os atuais agentes das forças públicas para essa nova estruturação proposta, que seriam as carreiras de Delegado de Polícia, Perito de Polícia, Investigador de Polícia, Escrivão de Polícia e Policial. Porém, cada cargo é preenchido por concurso público e não é possível ser “promovido” a outro cargo, somente a progressão na mesma carreira. Para a Direção Geral desta nova polícia, prevê que seja exercida por agentes sejam oriundos dos mais altos cargos das atuais Polícias Civis e Polícias Militares e que sejam escolhidos pelo 6

Atualmente esta PEC está tramitando em conjunto com a PEC 51/2013, porém se refere a reestruturação da Polícia Federal.

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HRC - Human Rights Council, na sigla original

8

UPR - Universal Periodic Review, na sigla original.

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Governador para o cargo de “Delegado Geral de Polícia” pelo período de dois anos. Para o mandato seguinte será trocado o Delegado Geral e nomeado outro agente, oriundo da outra organização que não a que estava na Direção Geral, revezando assim o comando entre Delegados da Polícia Civil e policiais da Polícia Militar, até que algum delegado ingressado na nova carreira da Polícia do Estado, desta nova forma de organização, reúna condições para assumir o cargo. Também é previsto nessa PEC, que o Corpo de Bombeiros Militar passe a ser denominado Corpo de Bombeiros dos Estados e do Distrito Federal e Territórios, de natureza civil, com base na hierarquia e disciplina, além de ser dirigido por uma pessoa do último posto e escolhido pelo Governador para um mandato de dois anos, podendo ser indicado novamente. Vale ressaltar parte do que consta na justificativa da PEC, sobre os bombeiros e a natureza civil da sua atividade:

[...] também no âmbito de segurança pública, pretendemos desmilitarizar os corpos de bombeiros, alguns ainda integrantes das polícias militares dos Estados, como fator impulsionador desse importante segmento, haja vista a desnecessidade do trato militar em uma atividade eminentemente civil. (BRASIL, 2009 p. 10)

A PEC, elaborada pelo deputado Celso Russomano, ainda prevê que as guardas municipais atuem na prevenção de delitos, sendo coordenadas pelo delegado de polícia, dando mais competência a estes órgãos que hoje existem, mas têm suas ações limitadas. Cita ainda a questão de que com a separação das duas polícias haveria um gasto dobrado em estruturas e equipamentos que poderiam ser melhores aproveitados numa instituição coesa e gerenciada de forma orgânica, pois além dos gastos já citados, existem rivalidades e conflitos entre as polícias onde uma atua na competência da outra e acabam por não executarem suas funções a contento. 3.2

PEC 51/2013 No ano passado surgiu a PEC 51/2013 de autoria do Senador Lindbergh Farias, que

propõe uma reforma profunda na estruturação dos órgãos de força pública, tendo por base a desmilitarização das Polícias Militares e unificação das atuais Polícias Militares e Civis numa única instituição de ciclo completo9 e de carreira única, tornando possível assim a ascensão do

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Termo utilizado para descrever a polícia que faz tanto a parte ostensiva quanto a parte investigativa e judiciária.

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policial até o topo da carreira e estimulando-o a realizar de forma melhor seu trabalho com promoções através de um sistema meritocrático, diferente do praticado atualmente. A proposta justifica ainda que alguns Estados tentaram timidamente implantar mudanças que tornassem a gestão mais valorativa aos seus integrantes e aproximassem as polícias da sociedade, mas foram barradas pelo engessamento da norma organizacional prevista no art. 144 da Constituição Federal. Reforça ainda a inclusão dos Municípios na responsabilidade de prover a segurança, uma vez deliberado pelo Estado para que possa instituir organizações locais de segurança. Na própria justificativa da PEC foi inclusa algumas sugestões de modelos que podem vir a serem adotados pelos Estados, adequando às necessidades e deixando livre o modelo que melhor aprouver a cada região e que lhe seja efetivo. Cabe mostrar os modelos citados pelo texto, em uma organização baseada em território:

A. Polícia Unificada Civil Estadual. Nesse caso, uma polícia unificada é responsável pela provisão de segurança pública a toda a população do estado, cobrindo todo seu território, por meio do cumprimento de suas funções, envolvendo as atividades ostensivo/preventivas, investigativas e de persecução criminal. B. Polícia Metropolitana (sempre civil e de ciclo completo). Nesse caso, uma polícia civil de ciclo completo é responsável pela provisão de segurança pública à população da região metropolitana daquele estado. Nessa hipótese, uma polícia unificada civil estadual será responsável pela provisão de segurança pública à população dos municípios do estado em questão não atendidos pela ou pelas polícias metropolitanas. C. Polícia Municipal (sempre civil e de ciclo completo). Nesse caso, uma polícia civil de ciclo completo é responsável pela provisão de segurança pública à população de um, de alguns ou de todos os municípios do estado em questão. O critério da decisão será escolhido pelo Estado. Exemplos: pode ser a escala demográfica (privilegiando, por exemplo, apenas a capital ou os municípios cujas populações excedam 500 mil habitantes, etc...), pode ser o histórico da criminalidade ou pode ser generalizada, aplicando-se a todos os municípios do Estado em pauta. A decisão de criar polícia municipal envolve a definição de fonte de receita compatível com a magnitude das novas responsabilidades orçamentárias. D. Polícia Distrital ou Submunicipal ou seja, de área interna ao município. Nesse caso, uma polícia civil de ciclo completo é responsável pela provisão de segurança pública à população de um distrito ou uma área interna ao município. Assim, uma cidade pode criar várias polícias locais e uma polícia municipal responsável pelas áreas não cobertas pelas polícias locais. (BRASIL, 2013 p. 10)

Para uma organização referente às competências das infrações penais, sugere a que as organizações atuem assim:

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A. Polícia Unificada Civil Estadual responsável por prevenir e investigar crimes de pequeno potencial ofensivo. Nesse caso, uma polícia unificada provê segurança pública na esfera infracional em relação a toda a população do estado, cobrindo todo seu território, por meio do cumprimento de suas funções, envolvendo as atividades ostensivo/preventivas, investigativas e de persecução criminal ou responsabilização. B. Polícia Unificada Civil Estadual responsável por prevenir, investigar e dar início à persecução criminal dos suspeitos de participar do crime organizado. Nesse caso, uma polícia unificada provê segurança pública na esfera criminal referida a toda a população do estado, cobrindo todo seu território, por meio do cumprimento de suas funções, envolvendo as atividades ostensivo/preventivas (aquelas pertinentes nos casos de crime organizado), investigativas e de persecução criminal. C. Polícia Unificada Civil Estadual responsável por prevenir, investigar e dar início à persecução criminal dos suspeitos de participar dos demais tipos de crime. Nesse caso, uma polícia unificada provê segurança pública na esfera criminal referida a toda a população do estado, cobrindo todo seu território, por meio do cumprimento de suas funções, envolvendo as atividades ostensivo/preventivas, investigativas e de persecução criminal. (BRASIL, 2013 p. 11)

Ainda a título exemplificativo, considerando ambos os casos supracitados, organização por território e pelo grupo de infrações legais, sugere o seguinte:

A. Polícia Municipal (sempre civil e de ciclo completo) responsável por atuar apenas contra crimes de pequeno potencial ofensivo, em um município do Estado, em alguns deles ou em todos. B. Polícia Unificada Civil Estadual. Uma polícia unificada é responsável pela provisão de segurança pública a toda a população do estado, cobrindo todo seu território, atuando contra todo tipo de criminalidade e infração, exceto os crimes de pequeno potencial ofensivo ou infrações nos municípios onde houver uma polícia municipal com esta incumbência específica. (BRASIL, 2013 p. 12)

Tamanha diversificação de modelos e possibilidades organizacionais agregadas à liberdade de adota-las conforme a necessidade de cada local, segundo o autor, acarretaria numa integralização e cooperação entre as forças policias, mesmo com subdivisões. Além de todo o exposto, a PEC se preocupa com a transparência e controle externo destas polícias, propondo a criação e estruturação de uma Ouvidoria Externa independente das organizações e com autonomia funcional e administrativa. Esta Ouvidoria seria dirigida por um Ouvidor-Geral nomeado pelo Governador do Estado ou Distrito Federal, ou Prefeito (no caso aplicável) dentre cidadãos que tenham reputação ilibada e notória atuação na área de segurança pública e não integre mais as forças policias, para um mandato de dois anos sem recondução ao cargo. Sobre as competências da ouvidoria o autor diz:

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A Ouvidoria terá competência regulamentar (para dispor sobre procedimentos de atuação dos policiais, suspender a execução de procedimentos inadequados, e avaliar e monitorar suas atividades) e disciplinar (para receber e processar reclamações e denúncias contra abusos cometidos por profissionais de segurança pública, podendo decidir, inclusive, pela demissão do cargo). (BRASIL, 2013 p. 08)

Conclusa e assertivamente encerra o autor em sua justificativa da PEC ao escrever:

Acreditamos oferecer uma solução de profunda reestruturação de nosso sistema de segurança pública, para a transformação radical de nossas polícias. A partir da desmilitarização da Polícia Militar e da repactuação das responsabilidades federativas na área, bem como da garantia do ciclo policial completo e da exigência de carreira única por instituição policial, pretendese criar as condições para que a provisão da segurança pública se dê de forma mais humanizada e mais isonômica em relação a todos os cidadãos, rompendo, assim, com o quadro dramático da segurança pública no País. (BRASIL, 2013 p. 13)

3.3

RECOMENDAÇÕES DA ONU O Brasil faz parte dos 193 países que são membros da ONU e também é um dos 51

membros fundadores da ONU e dentre os países signatários de diversos tratados internacionais de direitos humanos. Em 15 de março de 2006 na Assembleia Geral da ONU, através da resolução 60/251, deu-se a criação do Conselho de Direitos Humanos que criou a Revisão Periódica Universal, mecanismo utilizado como forma de verificar e fortalecer a efetividade dos Direitos Humanos e demais liberdades fundamentais, compromissos assumidos nos tratados internacionais pelos Estados. Essa revisão ocorre a cada quatro anos e busca melhorar e avaliar as práticas do Estado em relação a estes direitos. Em 2012 o Brasil passou pela sua segunda RPU, o relatório apresentado pelo Grupo de Trabalho trouxe uma série de recomendações feitas pelos demais países para o Brasil, destacando:

Work towards abolishing the separate system of military police by implementing more effective measures to tie State funding to compliance with measures aimed at reducing the incidence of extrajudicial executions by the police (Denmark); (UN, 2012 p. 18)10

10

Tradução livre: Trabalhar no sentido de abolir o sistema separado de Polícia Militar através da implementação de medidas mais eficazes para amarrar o financiamento estatal para o cumprimento das medidas destinadas a reduzir a incidência de execuções extrajudiciais pela polícia. (Dinamarca).

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Intensify efforts for the security of human rights defenders and reinforce cooperation with all stakeholders, in particular, the states and military police (Czech Republic); (UN, 2012 p. 20)11 Effectively fight against arbitrary and on-duty police killings, in particular by creating a strong framework for impartial investigation (Germany); (UN, 2012 p. 22)12

Essas sugestões compõem o documento com 170 outras sugestões feitas por demais países que avaliaram os dados levantados pela RPU. Vale ressaltar que o documento acima foi elaborado por representantes de 3 países, escolhidos para formularem o documento para o Grupo de Trabalho e estes países foram Polônia, Equador e China. Referente às recomendações que o Brasil recebeu, foi elaborado um documento de resposta as estas recomendações, chamado Addendum, escreve:

This Addendum expresses the acceptance of nearly all recommendations as formulated (159 of a total of 170 recommendations), in the extent that Brazil shares the ideals therein and is committed to their implementation. A small number of recommendations, 10, whose content face institutional constraints, have enjoyed partial support; such position is explained in comments in the items below. Only one recommendation, which is inconsistent with constitutional and legal principles of the Brazilian legal system, could not enjoy the support of the Brazilian State. Also in this case, this Addendum contains the grounds of the non-support, clarifying the elements which justify the position adopted. (ADDENDUM…, 2012 p.2) (grifo meu)13

A recomendação mencionada acima, que não pode ser apoiada pelo Brasil, foi a recomendação feita pela Dinamarca. Com a fundamentação de que não é possível apoiar esta recomendação pois ela vai de encontro a norma constitucional brasileira e foi posta da seguinte forma:

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Tradução livre: Intensificar os esforços para a segurança dos defensores dos direitos humanos e reforçar a cooperação com todos os interessados, em particular, os estados e os policiais militares (República Tcheca).

12

Tradução livre: Lutar efetivamente contra homicídios cometidos por policiais de forma arbitrária e em serviço, em particular através da criação de uma forte estrutura para a investigação imparcial (Alemanha).

13

Tradução livre: Este Adendo expressa a aceitação de quase todas as recomendações como formulado (159 de um total de 170 recomendações), na medida em que o Brasil compartilha os ideais nele e está comprometida com a sua implementação. Um pequeno número de recomendações, 10, cujo conteúdo encara restrições institucionais, receberam apoio parcial; tal posição é explicado em comentários nos itens abaixo. Apenas uma recomendação, que é incompatível com os princípios constitucionais e legais do sistema jurídico brasileiro, não podia contar com o apoio do Brasil. Também neste caso, este Adendo contém os fundamentos do nãoapoio, esclarecendo os elementos que justificam a posição adotada.

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Recommendation No. 60 cannot enjoy the support of Brazil, in light of the constitutional provision on the existence of civilian and military police forces. Civilian Police Forces are responsible for the tasks of judiciary police and for the investigation of criminal offenses, except military offenses. Military police forces are responsible for ostensible policing and for the preservation of public order (art. 144, paragraphs 5 and 6 of the Federal Constitution). It should be noted that Brazil has adopted measures to improve control over the actions of public safety professionals, in particular through ombudsmen and internal affairs offices, as well as through the permanent training of professionals in human rights and the encouragement of the differentiated use of force. (ADDENDUM…, 2012 p.4)14

A decisão do Brasil em adotar este modelo bipartido de polícia foi tomada há muito tempo, como já mencionado na primeira parte deste trabalho e essa decisão reflete hoje numa norma rígida que poderia ser alterada través de uma PEC. Como também já citado anteriormente, muitas propostas estão em andamento e aguardam serem apreciadas pelas câmaras legislativas e votadas. Caso sejam aprovadas será iniciado um longo processo de implementação e adaptação das novas instituições.

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Tradução livre: Recomendação nº 60 não pode contar com o apoio do Brasil, à luz da disposição constitucional sobre a existência de forças policiais militares e civis. Forças da Polícia Civil são responsáveis pelas tarefas de polícia judiciária e pela investigação de infrações penais, exceto infrações militares. Forças policiais militares são responsáveis pelo policiamento ostensivo e pela preservação da ordem pública (art. 144, parágrafos 5º e 6º da Constituição Federal). Deve-se notar que o Brasil adotou medidas para melhorar o controle sobre as ações dos profissionais de segurança pública, em especial através das ouvidorias e corregedorias, bem como através da formação permanente de profissionais em direitos humanos e do encorajamento do uso diferenciado da força.

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4

4.1

DOS MOTIVOS E PERCEPÇÕES

SIM, DEVEMOS DESMILITARIZAR! Buscando melhor compreensão dos pontos levantados por cada lado, é possível

juntar e dispor de diversas hipóteses e motivos que sejam favoráveis à desmilitarização e/ou unificação das polícias. Alguns pontos serão abordados aqui como favoráveis ou vantagens advindas da desmilitarização. Em seu artigo ROCHA (2010), cita algumas vantagens advindas da unificação das polícias: a) Redução dos custos de gestão – como mencionado anteriormente, com duas policias separadas, são duas estruturas distintas que precisam ser financiadas pelo erário, com suas próprias divisões internas, viaturas, equipamentos e vencimentos dos agentes; b) Desmilitarização das policias militares e dos corpos de bombeiros militares – diz o autor que há atualmente certa lentidão em decisões nas polícias, pois a ordem e rigidez militar as impõem isso, este também é um dos motivos para não haver mais a permanência do modelo militar para o corpo de bombeiros. Comenta o autor que seria possível adotar o nome dos cargos nos mesmos moldes dos adotados atualmente, citando, por exemplo, a polícia nos Estados Unidos, que utilizam os nomes dos cargos como sargento, tenente e capitão e que poderia adotar-se o mesmo aqui, uma vez que a hierarquização acontecerá independente da nomenclatura utilizada para designar o cargo de cada pessoa; c) Desvinculação das polícias militares e corpos de bombeiros do Exército – o autor chama a atenção para o termo utilizado na norma constitucional onde diz que as polícias e bombeiros militares são forças auxiliares e reservas do Exército, herança da Constituição de 1934, como exposto no primeiro capítulo, sendo que em momento algum os policias estaduais seriam mobilizados para um front de guerra ou área de conflito visto que suas atribuições são as de mantedores da lei e da ordem, e não o combate regular para o qual são adestradas as tropas do Exército; d) Estabelecimento do ciclo completo de polícia – apesar de não ser o correto, de certa forma a polícia civil acaba tendo o ciclo completo e a militar não, com a unificação automaticamente esse modelo seria adotado pela organização; e) Fim da sobreposição de competência – no modelo unificado uma polícia não exerceria atividades de competência da outra, a exemplo de policiais civis atuando em prevenção a crimes, utilizando viaturas identificadas e uniformizados como uma tropa, ou polícias e bombeiros militares que atuam no serviço de

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inteligência (PM/2 ou P/2 e BM/2 ou B/2 respectivamente) e investigam crimes a pretexto de serem investigações sobre informações; f) Atenuação do rigor dos regulamentos disciplinares – diz o autor que aqueles que estão nas bases da hierarquia das polícias e bombeiros militares têm grande anseio pela unificação, tendo em vista os rigores do Regulamento Disciplinar do Exército (RDE) com pena de prisão administrativa por atos como não prestar continência ou apresentar-se com coturno mal engraxado. Cita como exemplo a ação do ex-governador do estado do Rio Grande do Sul que alterou de forma significativa o regulamento disciplinar da Brigada Militar, de forma à se adequar melhor a atividade policial; g) Estabelecimento de isonomia de remuneração – comum é a disparidade de vencimentos entre os policias das polícias civis e militares, sendo que nas polícias militares existem diversos cargos e níveis salarias e as policias civis tendo menos cargos e menos níveis salariais. Muitos dos problemas apontados pelos policiais militares se referem à supressão de direitos individuais garantidos na Constituição em decorrência de suas atividades profissionais, haja vista a impossibilidade de associação sindical, direito de greve ou de manifestar pensamentos contrários ao Comando (seus superiores hierárquicos, por exemplo) por se sujeitarem a punição. Em seu texto Monteiro diz que os “profissionais que devem respeitar as garantias e liberdades individuais do cidadão, o Estado Democrático de Direito, mas que eles próprios não gozam de cidadania plena” (MONTEIRO, 2009, online). Outro exemplo citado na mesma matéria são os direitos trabalhistas que são negados aos militares, pois os mesmo devem estar prontos para serem acionados a qualquer momento ou numa necessidade continuar trabalhando além de seu horário sem perceber nenhuma quantia a título de hora extra, adicional noturno ou semelhante. Também cita a diferenciação de haver um código penal e um tribunal exclusivo para os militares. Finaliza sua matéria falando: A desmilitarização é um caminho sem volta. Foi registrada nos Princípios e Diretrizes da 1ª Conseg como sendo um dos objetivos a serem alcançados. Embora a desmilitarização não resolva os problemas da segurança pública, libertará os policiais militares da condição de subcidadãos, trazendo-lhes a cidadania plena. Abrirá um caminho para a tão sonhada unificação das policiais estaduais e, consequentemente, para o ciclo completo de polícia. (MONTEIRO, 2009, online)

A menção sobre a 1ª CONSEG (Conferência Nacional de Segurança Pública) é muito oportuna, pois foi um evento de grande porte que aconteceu em Brasília no ano de 2009 e contou com a participação de representantes de diversas associações e entidades civis e

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militares para debater a Política Nacional de Segurança Pública, sendo um marco na história da segurança pública nacional por ser um processo altamente democrático e com atuação conjunta de diversas pessoas de variados segmentos, do poder público, trabalhadores da área de segurança pública e da sociedade civil para debater temas e elaborar propostas sobre o assunto. Uma das diretrizes votadas e que consta nos registros da 1ª CONSEG diz sobre:

Desmilitarização das polícias - Realizar a transição da segurança pública para atividade eminentemente civil; desmilitarizar as polícias; desvincular a polícia e corpos de bombeiros das forças armadas; rever regulamentos e procedimentos disciplinares; garantir livre associação sindical, direito de greve e filiação político-partidária; criar código de ética único, respeitando a hierarquia, a disciplina e os direitos humanos; submeter irregularidades dos profissionais militares à justiça comum. (CONSEG, 2009 p. 81)

Evidencia assim que o exposto anteriormente condiz com as diretrizes propostas pelos participantes da conferência e que foi levado o tema a debate por representantes de variadas organizações e locais do país. 4.2

NÃO DEVEMOS DESMILITARIZAR! Também é defendida por muitos a permanência dos atuais modelos das polícias

militares estaduais, com discursos que reconhecem sim um problema organizacional nas polícias, mas que isso não se relaciona com o fato da militarização, alegando que a base das polícias militares é fundada na hierarquia e disciplina e muito se perderia com a simples abdicação desses preceitos. Ainda em seu artigo, ROCHA (2010) comenta também sobre “desvantagens” que se originariam da desmilitarização das polícias, levantadas por aqueles que são opostos à ideia: a) O governador não terá uma polícia para agir caso a outra pare – mesmo que o direito a greve não seja permitido aos polícias militares, já houve casos de paralisações dos mesmos e nesse caso a polícia civil esteve nas ruas fazendo a parte ostensiva temporariamente, e o mesmo pode ser feito pela polícia militar no caso de uma greve dos polícias civis, que tem o direito a greve como todos os demais servidores públicos; b) Os policiais militares perderão direitos previdenciários – atualmente quando os polícias militares são transferidos para a reserva remunerada, recebem os valores integrais de seus cargos enquanto ainda ativos, esta prerrogativa é exclusiva dos militares. Apesar de a PEC 51/2013 prever a manutenção dos direitos adquiridos, justamente pela sua natureza, levanta-se ainda este fator; c) Os policiais

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militares perderão o direito de ascensão funcional na carreira (promoção) – o tempo de serviço é o fator para a promoção dos militares, assim, é presumível que de tantos em tantos anos a promoção ocorrerá para determinado policial, literalmente uma fila de ascensão na carreira; d) Os militares perderão seus referenciais simbólicos – argumento esse que pode ser facilmente contornado pela adoção do uniformes pelos agentes que integrem a força de policiamento ostensivo e uniformes de gala para solenidades e formaturas. Incentivar o culto ao civismo e aos símbolos nacionais mesmo numa instituição civil, que atualmente não são vistos na polícia civil; e) O que fazer com a cavalaria, os canis e as bandas de música – ainda haveriam tropas especializadas em operações de GLO (Garantia da Lei e da Ordem) onde se faz comum o uso de cavalaria e cachorros adestrados. As bandas de música, símbolos marcantes dos aquartelamentos militares, tanto das Forças Armadas quanto das Polícias Militares, presentes em diversos momentos do cotidiano da vida civil, tem papel de representar seus batalhões junto da comunidade, além de ser fonte de preservação de cultura; f) A unificação acabará com a concorrência – relata o autor que esse argumento caracteriza uma concorrência salutar, quando mais parece uma disputa entre as corporações, já que uma polícia executa algo de competência da outra polícia com intenção de mostrar suas falhas. Os militares alegam que certos problemas não seriam resolvidos pela simples desmilitarização da polícia, exemplo escrito por FONSECA (2011) ao citar que a disciplina militar prega a assiduidade, apresentação pessoal, o culto aos símbolos nacionais, patriotismo e respeito à hierarquia e que estes valores não devem ser condenados por motivo algum. Escreve ainda o autor:

Você que se queixa de ser aplicado em escalas que ultrapassam a carga horária mensal, acha que quem faz isso é uma pessoa de carne e osso ou uma insígnia de patente? Se ele(a) fosse chamado de gerente/inspetor/supervisor, faria de outro jeito? Quem deixa de lhe conceder direitos como licença prêmio, diárias etc., são oficiais superiores ou é um determinado homem/mulher que tem RG, CPF, rosto, foto, matrícula etc.? (FONSECA, 2011, online)

Assim expressa o autor que condutas abusivas de superiores para com seus subordinados são passíveis de ocorrerem em qualquer local de trabalho e área de atuação, não sendo simplesmente a alteração do nome do cargo que fará com que a prática destes se encerre. Ressalta-se que o autor é atualmente integrante da Polícia Militar da Bahia e faz parte do quadro de oficiais. Assunto abordado anteriormente, referente ao direito de formar um sindicato como

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um dos motivos para a desmilitarização, PINHEIRO(2014) escreve sobre um recente entendimento por parte da Corte Europeia de Direitos Humanos que decidiu em favor da liberdade de associação, pois esta é direito de todos independente da profissão. Mesmo sendo passível de revisão, este julgamento é uma decisão importante que pode ser adotada pelos tribunais brasileiros. Caso o legislativo venha a permitir que sindicatos representem os militares, podem fazê-lo de modo que mesmo havendo sindicato as greves sejam vedadas ou somente quando a segurança e ordem interna estiverem ameaçadas. KAWAGUTI (2014) em uma entrevista com José Vicente da Silva Filho, coronel da reserva da Polícia Militar e ex-Secretário Nacional de Segurança Pública, concedida a BBC Brasil sobre a desmilitarização, afirma que a desmilitarização não é a resposta para os problemas do Brasil em relação à segurança pública e sim que o modelo adotado pelas polícias é ineficiente. Questionado acerca da letalidade da polícia brasileira e se a desmilitarização teria influência nesse aspecto, responde que a letalidade é alta sim, mas que se deve muito mais a uma falha de gestão e de governança, pois de estado para estado há mudanças grandes nas taxas de letalidade. Comenta ainda sobre os clamores pela desmilitarização e afirma que a maioria das pessoas não entende plenamente o que vem a ser a desmilitarização, citando como exemplo uma votação aberta no site do Senado questionando sobre a pessoa ser a favor ou contra a PEC 51/2013 onde a opção “contra” teve uma vitória com 8% de diferença nos 98.648 votos computados. Afirma que há uma confusão entre melhorar a polícia e desmilitarizar a mesma e incutem na polícia uma visão de que o bandido é um inimigo e deve ser morto como um inimigo na guerra, visão errônea nas palavras do entrevistado. Enumera ainda problemas da polícia brasileira e afirma que a existência de duas polícias é uma delas, pois elas não se integram, não se entendem e não cooperam; que o militarismo na polícia é ultrapassado, no sentido de ser excessivamente rígido, a exemplo da punição de prisão para quem chegou atrasado pela segunda vez ao serviço; que a polícia é centralizadora para muitas questões a ponto de ser morosa; e da polícia civil sobre o distanciamento do delegado de polícia em se distanciarem demais da base. Questionado acerca do ciclo completo como uma possível alternativa para aumentar a efetividade da polícia brasileira, diz o entrevistado que falta coragem política para adotar tal procedimento e que poderiam ser adotados dois modelo distintos, sendo um deles a exemplo da França, onde as tropas militarizadas são responsáveis pelas áreas interioranas e têm competência investigativa e ostensiva (ciclo completo) e nas capitais e metrópoles atuam as polícias civis, também com ciclo completo, ou então o modelo utilizado nos Estados Unidos e Alemanha (semelhante ao modelo proposto na PEC 51/2013) onde existe tanto a parte ostensiva e

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fardada e conforme a progressão na carreira, é possível de trabalhar na área investigativa. Defendendo argumentos contra a desmilitarização, TEZA (2013) explana sobre o histórico das Polícias Militares e cita o fato da Comissão Provisória de Estudos Constitucionais, encarregada de elaborar um Anteprojeto do que viria a resultar na Constituição Federal de 1988, quase extinguir com a Polícia Militar em suas propostas iniciais e posteriormente, após sucessivas discussões e audiências públicas, viu-se que a polícia militar era vital para o cotidiano e aumentaram suas responsabilidades, conforme o texto constitucional que existe hoje. Refutando afirmativas levantadas por defensores da desmilitarização, como por exemplo: as polícias militares não são legados da ditadura militar, como já citado anteriormente a instituição tem origens muito mais remotas, mas que de fato foi utilizada pelo governo militar, mas cita que o DOPS, por exemplo, era parte da polícia civil. Escreve ainda que os requisitos mínimos para ingressar na polícia militar são no mínimo o de ter o ensino médio completo e algumas polícias, como a de Santa Catarina, exigem curso superior para as praças e Bacharel em Direito para o Oficialato, que o curso formação de um soldado tem duração de 1400 horas e o do oficial 2800 horas e que conforme progridem na carreira, todos os militares são constantemente avaliados por seu desempenho. E ainda que durante todos os cursos de reciclagem e aprimoramento a que são submetidos os militares, existem cadeiras de Direitos Humanos. Descreve que a polícia militar é bastante cobrada sobre suas ações, citando por exemplo as manifestações ocorridas no país em 2013 e seus excessos. O autor defende que estes excessos devem ser apurados e quem os responsáveis devem ser indiciados. Porém, os excessos ocorrem em qualquer área, na esfera civil ou na administração pública. Cita ainda exemplos de polícias internacionais em países como Inglaterra e Austrália onde ocorreram casos famosos em que civis foram mortos pela polícia, que também é civil. 4.3

PERCEPÇÃO DOS ATORES DE SEGURANÇA PÚBLICA DE BLUMENAU Ressalta-se novamente que a presente pesquisa se mostra relevante por demonstrar

qual a percepção dos agentes de segurança sobre o tema da desmilitarização. Uma vez que são estes agentes quem lidam com as pressões do dia a dia que a profissão lhes impõe, da urgência em atender aqueles que necessitam de seus serviços e a perícia de executar suas tarefas nas mais variadas situações, podem opinar de forma mais assertiva sobre o assunto, avaliando se o militarismo interfere no trabalho que desenvolvem e também como percebem a questão da unificação das polícias.

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Para a realização desta pesquisa, foi elaborado um questionário com 6 perguntas acerca do entendimento e opinião dos agentes sobre a desmilitarização e a unificação das polícias, uma vez que os temas são correlatos. As entrevistas foram procedidas entre os dias 09/11/2014 e 12/11/2014 na cidade de Blumenau, através de pesquisas presenciais e também através de meios eletrônicos. Devido à dificuldade de adentrar nas instalações militares por questões burocráticas, foi difícil entrevistar alguns militares, encontra-los nas ruas se tornou então uma opção mais viável. Referente às delegacias de polícia, com pessoal limitado e grande quantidade de trabalho a ser feito, foi difícil encontrar alguém que pudesse responder as questões propostas, assim as respostas foram conseguidas em sua maioria em horários fora do expediente de seus agentes. Outro ponto a ser destacado é que, devido a sensibilidade do tema, é perceptível que alguns dos agentes abordados não se sentiam confortáveis com a ideia de responder as perguntas propostas, sendo que as respostas obtidas pelo meio digital se mostraram mais completas e elaboradas. Para a presente pesquisa foram entrevistadas 25 pessoas que trabalham ou trabalharam em Blumenau na Polícia Militar, Polícia Civil ou Corpo de Bombeiros Militar, de variados cargos (postos e graduações) de cada instituição e com diferentes tempos de serviços. Compõe o universo desta pesquisa a seguinte proporção de entrevistados de cada uma das instituições: 44% pertencentes ao Corpo de Bombeiros Militar, 36% a Polícia Militar e 20% a Polícia Civil. Iniciando com a questão sobre o entendimento da desmilitarização das polícias, no universo da pesquisa, foi praticamente pleno o entendimento da desmilitarização com a desvinculação da corporações da ligação com o Exército Brasileiro, bem como do Código Penal Militar e da justiça militar. É perceptível que o termo “militar” remete a hierarquia e disciplina e que isso influencia a percepção de muitos entrevistados, de forma que desmilitarizando as polícias haveria uma perde significativa neste sentido, argumento recorrente na justificativa do posicionamento da maioria ao ser contra a desmilitarização. Em seguida questionou-se o posicionamento dos entrevistados sobre o tema, onde a maioria demonstrou ser contrária a ideia da desmilitarização. Os motivos entre a maioria é que os princípios basilares da hierarquia e disciplina seriam enfraquecidos e que estes são diferenciais que as corporações militares detêm em relação às outras. Outra justificativa também recorrente é de que a militarização não é o problema da segurança pública atual. Muito relevante é a resposta do tema na entrevista de número 006 onde o soldado da polícia

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militar diz: Depende na forma como ela for implementada nas instituições. A população em geral tende a acreditar que o mero fato de desmilitarizar a polícia e retirar sua condição de militar vai fazer com que ela se torne melhor instantaneamente. Penso que não é o fato da polícia militar utilizar equipamentos militares ostensivos, ter estrutura hierarquizada e ser organizada de forma disciplinada, que a faz ser truculenta ou arbitrária. Somente quem já teve experiência em ocorrências de combate real consegue entender a importância de um tropa disciplinada em condições adversas, característica muito difícil de obter em instituições civis

Entre as justificativas comuns aos que são favoráveis a desmilitarização está a necessidade de se ter uma polícia civil, voltada às questões sociais e que o militarismo hoje está ultrapassado não sendo compatível com a realidade da sociedade. Importante ressaltar que os agentes de Polícia Civil entrevistados são todos a favor da desmilitarização. Unindo as respostas obtidas por meio das entrevistas e a bibliografia levantada e demonstrada anteriormente, nota-se que os argumentos se assemelham em muitos pontos em ambos os lados. Aqueles que defendem a permanência do militarismo defendem que a hierarquia e a disciplina inerente aos militares são necessárias para o exercício da função policial, e que a realidade do estado de Santa Catarina, que atualmente exige o bacharelado em Direito para o oficialato, curso superior para as praça e os cursos internos terem a inclusão de matérias de Direitos Humanos, são fatores que auxiliam na formação do policial, por exemplo. Da mesma forma acontece com os argumentos favoráveis à desmilitarização, como por exemplo, que o uso da nomenclatura militar no nome da instituição dá a entender que o combate é relacionado há um inimigo um inimigo, direitos individuais que são negados aos militares por conta da sua função, que o militarismo não é condizente com as necessidades da sociedade e de excessos que ocorrem dos superiores em função de suas posições. Prosseguindo com a entrevista, o tema seguinte refere-se à unificação das polícias, demonstrando que o entendimento da questão é pleno, compreendendo o ciclo completo da polícia atuando de forma ostensiva e investigativa. Em relação ao posicionamento dos entrevistados sobre a unificação, tem-se que a maioria é favorável, inclusive a maioria dos policiais militares entrevistados. Dentre as justificativas favoráveis a um processo de unificação é possível citar a redução dos custos com as instituições, a centralização de informações, a carreira única, aumento da eficiência no combate à criminalidade, a ausência de conflitos institucionais e usurpação de função. Na entrevista de número 009 escreve o Coronel entrevistado:

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A favor, desde que obedeça a critérios de hierarquia e disciplina, podendo até ser retirado o adjetivo "militar", mas que contenha em suas normas, a necessária obediência as normas e o respeito mútuo. A existência de uma única polícia estadual, reduziria gastos com suas estruturas (delegacias, quartéis por exemplo)...manutenção de um efetivo ideal para cidades e reduziria o poder político que envolve as polícias, principalmente a Polícia Civil. Além disso, uma única polícia teria o conhecimento integral do sistema, executando o policiamento ostensivo qualitativo.

Alegam também que não bastaria “importar” um modelo unificado e implantar aqui, que a teoria pode parecer muito benéfica, mas que a realidade brasileira é muito diversa e por isso deve ser analisada com cautela a questão. Referente aos argumentos contrários a unificação, alegam principalmente que haveria um choque muito grande em unir os profissionais de ambas as instituições, que por terem métodos muito dissonantes de trabalhar seria prejudicial, que não sanaria o problema da segurança pública e que os militares perderiam alguns direitos que possuem. Vale ressaltar que mesmo havendo um posicionamento favorável por parte da maioria dos entrevistados em favor da unificação das polícias, é recorrente o pensamento de que essa proposta não deve acontecer tão logo, devida a complexidade de se alterar de forma tão drástica as instituições que existem hoje. Por fim, a última questão perguntada aos entrevistados foi se a desmilitarização e a unificação podem ser uma alternativa para melhorar as questões de segurança pública no Brasil. Neste item as opiniões são diversas, se dividem praticamente na mesma proporção entre os que acreditam e não acreditam nesta alternativa como solução. Destes, 40% não acreditam que esta seja uma alternativa que resolveria o problema da segurança pública. Outros 44% acreditam que a desmilitarização e unificação das forças de segurança pública são sim uma alternativa possível, entretanto fazem certas ressalvas. Dentro destes 44% que acreditam na proposta, 46% acreditam ser uma alternativa, 36% acreditam na alternativa porém, acreditam não ser esta a solução definitiva, 9% acreditam na eficácia da alternativa, mas acreditam que não acontecerá logo e 9% são favoráveis, porém não sabem se é viável esta mudança. Dentro da percentagem total ainda há 12% dos entrevistados que acreditam que a unificação é uma alternativa sim, porém deve-se manter o caráter militar da polícia. Por fim 4% que divide sua opinião entre sim e não. Um argumento comentado por defensores de ambas as ideias é que havendo ou não a desmilitarização e a unificação, deve haver mais investimentos na segurança pública, mais efetivos de agentes para realizar o hercúleo trabalho de proteger a sociedade, melhoria de

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salários e equipamentos e assim uma melhora condição de trabalho dos agentes. Ressalta-se ainda a resposta na entrevista de número 006:

[...] A polícia é apenas uma engrenagem no funcionamento da segurança pública. Sem educação, investimentos do poder público em qualidade de vida, redução das desigualdades sociais, leis eficientes e sistema prisional satisfatório, a polícia nunca vai funcionar como deveria.

E também na entrevista de número 008:

É mandatório essa desmilitarização e unificação, contudo não são alternativas para a segurança pública. Precisa-se rever todo o processo, alterações nas leis, sistema prisional, perícia e também no investimento em tecnologia e treinamento para os operadores. Não adianta a polícia prender se não há o devido cumprimento da pena, gerando sensação de impunidade.

É possível extrair destas respostas que a percepção dos agentes de segurança pública é a de que integram uma grande máquina e que diversos fatores externos incidem sobre suas profissões, além de que as opiniões diferem bastante, a exemplo da opinião a nível nacional.

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CONCLUSÃO Ao longo deste trabalho buscou-se analisar qual a percepção dos agentes de

segurança pública da cidade de Blumenau sobre a temática da desmilitarização da polícia e também acerca da unificação das polícias, uma vez que ambos os assuntos estão fortemente relacionados. De início abordou-se o contexto histórico das forças de segurança pública interna, responsáveis pela manutenção da lei e da ordem desde os tempos coloniais e sua evolução nos demais períodos da história do país, passando pela fase pré-republicana e republicana até chegar ao modelo atual. Compreender a origem destas instituições, de onde evoluíram, qual necessidade visavam suprir, onde eram falhas e onde as mesmas prosperaram é fundamental para compreender a situação atual destas instituições. Evidenciando as discussões políticas acerca do tema, com a as PEC 430/2009 e a PEC 51/2013 que abordam diretamente a desmilitarização em seus textos e também a recomendação recebida da ONU pelo Brasil no sentido de acabar com a polícia militarizada e com o levantamento dos argumentos favoráveis e os contrários a desmilitarização das polícias. Desta forma, foram elaboradas algumas questões a serem perguntadas aos integrantes das instituições da Polícia Militar, Polícia Civil e Corpo de Bombeiros Militar da cidade para verificar qual a percepção sobre o tema em questão, se demonstravam conhecer as PECs já citadas e modelos adotados por outros países e qual o posicionamento destes profissionais acerca da questão. Sendo somente uma parcela dos agentes entrevistados, cabe ressaltar que estes não podem representar de forma alguma a opinião de toda a instituição. Como as respostas são individuais, não representam o posicionamento de nenhum órgão público o expresso nessas respostas. Conclui-se então que a grande maioria dos agentes entrevistados compreendem o que vem a ser a desmilitarização e suas possíveis consequências. Acerca do tema da desmilitarização e suas consequências, os militares em geral associam a militarização com hierarquia e disciplina e por conseguinte, a desmilitarização com a perca deste elemento basilar de suas instituições. A grande maioria dos militares entrevistados é contrária a desmilitarização, alegando que a militarização não tem influência na situação da segurança pública nacional e que é necessário o militarismo em suas atividades. Os entrevistados oriundos da polícia civil são todos favoráveis a desmilitarização e justificam em sua maioria

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que a polícia com uma matriz civil é uma forma mais democrática e humanizada. A unificação das polícias é defendida pela maioria dos entrevistados, uma vez que parece ser contraditório ao desejo de não haver a desmilitarização, porém a maioria dos agentes concorda em unificar as polícias. Analisando somente entre os militares é pequena a diferença entre quem é favorável à unificação e quem é contra, tornando-se um tema bem dividido entre os mesmos. Porém, mesmo sendo defendida pela maioria, é consenso que não é a solução para a segurança pública, os entrevistados acreditam que seria uma forma mais eficaz e moderna de combater a criminalidade, mas não a solução definitiva. É possível afirmar que o tema divide opiniões tanto entre os agentes integrantes das forças de segurança como da população em geral. A decisão de desmilitarizar o modelo atual de polícia ou alterá-lo de alguma outra forma merece cuidadosos estudos, não é possível simplesmente adotar um modelo estrangeiro, uma vez que Brasil tem suas especificidades que merecem um estudo mais detalhado. É necessário maior investimento na área da segurança pública para que possam cumprir melhora suas funções, com pessoal suficiente, equipamento adequado e aprimoramento constante através de cursos e especializações e uma valorização maior do profissional desta área. Deve-se deixar de lado corporativismos e vantagens pessoais quando se trata de falar sobre a segurança pública, que deve primar pelo bem estar de seus cidadãos.

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APÊNDICES APÊNDICE A – Entrevistas

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