A política de avaliação dos professores no estado de SP: sistematizando os mecanismos de controle sobre o trabalho docente

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III SEMINÁRIO INTERNACIONAL DE GESTÃO EDUCACIONAL ORGANIZAÇÃO DO TRABALHO NA ESCOLA E REFORMAS EDUCATIVAS

ANAIS DE 6 A 8 DE JULHO DE 2011

REALIZAÇÃO:

APOIO:

III SEMINÁRIO INTERNACIONAL DE GESTÃO EDUCACIONAL ―ORGANIZAÇÃO DO TRABALHO NA ESCOLA E REFORMAS EDUCATIVAS‖

ANAIS

Realização:

De 6 a 8 de julho de 2011 Universidade Estadual Paulista – UNESP-Rio Claro II Grupo de Estudo e Pesquisas em Política Educacional, Rio Claro, 06, 07 e 08 de julho de 2011 Vol. 3 (2011)

GREPPE Profa. Dra. Raquel Fontes Borghi (Coordenação – Seção UNESP/RC) Profa. Dra. Regiane Helena Bertagna (Vice-Coordenação – Seção UNESP/RC) Profa. Dra. Theresa Maria de Freitas Adrião (Coordenação – Seção UNICAMP/Campinas) Profa. Dra. Teise Guaranha Garcia (Coordenação – Seção USP/RP) Profa. Dra. Bianca Cristina Correa (Vice-Coordenação – Seção USP/RP) COMISSÃO ORGANIZADORA DO SEMINÁRIO INTERNACIONAL DE GESTÃO EDUCACIONAL: Profa. Dra. Raquel Fontes Borghi - Coordenadora (UNESP/RC) Profa. Dra. Regiane Helena Bertagna (UNESP/RC) Profa. Dra. Teise Guaranha Garcia (USP/RP) Profa. Dra. Theresa Maria de Freitas Adrião (UNICAMP/Campinas) Profa. Dra. Bianca Cristina Correa (USP/RP) Profa. Dra. Silvana Ap. de Souza (UNIOESTE/PR) COMITÊ CIENTÍFICO: Profa. Dra. Regiane Helena Bertagna — Coordenadora (UNESP/RC) Profa. Dra. Adriana Dragone Silveira (Prefeitura Municipal de Rio Claro/SP/ASSER) Profª. Dra. Raquel Fontes Borghi (UNESP/RC) COMISSÃO DE APOIO: Marisa Alves Galli (UNESP/RC) Andréia Cristina Zan (UNESP/RC) Lucimara Golçalves (UNESP/RC) Patrícia Adriana Abdalla (UNESP/RC) Beatriz Aparecida da Costa (UNESP/RC) Ana Lara Casagrande (UNESP/RC) Jaqueline dos Santos Oliveira (UNESP/RC) Liliane Ribeiro de Mello (UNESP/RC) Greice Helena Rovero (UNESP/RC) III Grupo de Estudo e Pesquisas em Política Educacional, Rio Claro, 06, 07 e 08 de julho de 2011 Vol. 3 (2011)

Denise Pinheiro (UNESP/RC) Ricardo Matheus Pires (UNESP/RC) Inajara Iana Silva (UNICAMP) Vitor Mizuki (UNICAMP) Alessandra Cain (UNESP/Araraquara) PARECERISTAS AD HOC: Profa. Dra. Maria Aparecida Segatto Muranaka (UNESP/RC) Prof. Dr. Romualdo Portela de Oliveira (USP) Profa. Dra. Maria Isabel Tuppy (UNESP/RC) Prof. Dr. José Euzébio de Oliveira Souza Aragão (UNESP/RC) Profa. Dra. Maria Aparecida Segatto Muranaka (UNESP/RC) Profa. Dra. Géssica Priscila Ramos (UFSCar/ São Carlos) Profa. Dra. Ilma Ferreira Machado (UNEMAT/ MT) Profa. Dra. Mara Regina Lemes de Sordi (UNICAMP) Profa. Dra. Silvana Aparecida de Souza (UNIOESTE/PR) Profª. Dra. Raquel Fontes Borghi (UNESP/RC) Profª. Dra. Theresa Maria de F. Adrião (UNICAMP/Campinas) Profa. Dra. Regiane Helena Bertagna — Coordenadora (UNESP/RC) Profa. Dra. Adriana Dragone Silveira (Prefeitura Municipal de Rio Claro/SP/ASSER)

EQUIPE DE PRODUÇÃO EDITORIAL: Organização Profa. Dra. Regiane Helena Bertagna Editoração eletrônica e arte-final Liliane Ribeiro de Mello Ricardo Matheus Pires

IV Grupo de Estudo e Pesquisas em Política Educacional, Rio Claro, 06, 07 e 08 de julho de 2011 Vol. 3 (2011)

SUMÁRIO APRESENTAÇÃO ....................................................................................................... 1 PROGRAMAÇÃO DO EVENTO ...................................................................................... 3 TRABALHOS ............................................................................................................. 1 Eixo 1 – Reformas educativas e organização do trabalho na escola ................... 5 ORGANIZAÇÃO E FUNCIONAMENTO DOS CONSELHOS ESCOLARES NO ESTADO DE SÃO PAULO; Juliana Carolina Barcelli, Lucéia Maria de Souza Paula ................................................................................................................................... 5 A AVALIAÇÃO E OS CICLOS: POSSIBILIDADES PARA REPENSAR A ORGANIZAÇÃO DO TRABALHO NA ESCOLA; Ricardo Matheus Pires, Regiane Helena Bertagna ............................................................................................................... 19 GESTÃO DA EDUCAÇÃO NO CONTEXTO DAS POLÍTICAS PÚBLICAS EDUCACIONAIS; Silvio César Nunes Militão ........................................................... 30 A AVALIAÇÃO FORMATIVA NO CONTEXTO DO REFERENCIAL CURRICULAR NACIONAL PARA A EDUCAÇÃO INFANTIL (RCNS): UMA REDEFINIÇÃO DA ORGANIZAÇÃO DO TRABALHO NA ESCOLA DA PRIMEIRA INFÂNCIA; Gisele Gelmi ....................................................................... 41 FORMAÇÃO E FUNÇÃO DO DIRETOR DE ESCOLA: ASPECTOS TEÓRICOS E PRÁTICOS; Maria Eliza Nogueira Oliveira ....................................... 57 REFLEXOS DA REFORMA DA EDUCAÇÃO PROFISSIONAL TÉCNICA DE NÍVEL MÉDIO: ANÁLISE DAS MATRIZES CURRICULARES DO CURSO DE INFORMÁTICA; Beatriz Galvanin, Maria Sylvia Simões .................... 68 UM BREVE DIÁLOGO ENTRE LOURENÇO FILHO E A GESTÃO DA QUALIDADE TOTAL EM EDUCAÇÃO; Inajara Iana da Silva ........................... 103 DISCUTINDO A ORGANIZAÇÃO DO TRABALHO NA ESCOLA E NO PRIMEIRO ANO DO ENSINO FUNDAMENTAL; Marcia Cristina Argenti Perez ........................................................................................................................................ 112 A PROPOSTA CURRICULAR PAULISTA E O PAPEL DO PROFESSOR COORDENADOR; Lucimara Aparecida Neto ........................................................... 124 CURSO DE FORMAÇÃO CONTINUADA A DISTANCIA EM CONSELHO ESCOLAR: EXPERIÊNCIAS E EXPECTATIVAS; Viviane Wellichan, Daniela Santos da Silva, Rúbia Nathália Parra ............................................................................ 142 GESTÃO DEMOCRÁTICA: UMA PROPOSTA DE REFORMA NA QUALIDADE DA EDUCAÇÃO INFANTIL; Elisângela Ferreira Sentanin, Cláudio Benedito Gomide de Souza ............................................................................................ 152 CULTURA ORGANIZACIONAL DA ESCOLA E GESTÃO DEMOCRÁTICA: ALGUMAS REFLEXÕES TEÓRICAS; Maria Gabriela Bersosa, Thais Elena Lotumolo ........................................................................................................................ 162 V Grupo de Estudo e Pesquisas em Política Educacional, Rio Claro, 06, 07 e 08 de julho de 2011 Vol. 3 (2011)

CONCEPÇÕES DE PROFESSORES SOBRE A GESTÃO ESCOLAR; Marcos Jorge, Ana V. de F. da Costa .......................................................................................... 172 AUTONOMIA FINANCEIRA: SONHO OU REALIDADE? Ilda M Duarte, Ana V. Costa, Vera Neves ..................................................................................................... 187 SISTEMAS APOSTILADOS DE ENSINO NOS ANOS INICIAIS DO ENSINO FUNDAMENTAL: ESTRATÉGIA MUNICIPAL PARA A ESCOLA PÚBLICA DE QUALIDADE? Edimar Aparecido da Silva, Yoshie Ussami Ferrari Leite ................................................................................................................................ 200 Eixo 2 – Reformas educativas e trabalho docente .......................................... 213 OS CENTROS DE EDUCAÇÃO DE JOVENS E ADULTOS DE MATO GROSSO E O PROCESSO DE FORMAÇÃO CONTINUADA DOS PROFESSORES; Angela Rita Christofolo de Mello ................................................. 213 FORMAÇÃO CONTÍNUA DE PROFESSORES E A REFORMA CURRICULAR MUNICIPAL; Vanda Moreira Machado Lima .............................. 230 A RESCONSTRUÇÃO DO TRABALHO DOCENTE POR MEIO DA LEI 10639/04; Flávio Santiago, Adriana D. de Souza Carvalho ......................................... 250 PROFESSORAS DO ENSINO FUNDAMENTAL I: DESCORTINANDO OS BASTIDORES DA FORMAÇÃO INICIAL RESSALTANDO O PROTAGONISMO DA PARTICIPAÇÃO EM PROJETOS DE PESQUISA E OS REFLEXOS DESSE PROCESSO NO CENÁRIO ESCOLAR; Márcia Regina Onofre............................................................................................................................. 263 A IMPLANTAÇÃO POLÍTICA DO ENSINO FUNDAMENTAL DE NOVE ANOS SOB O OLHAR DO PROFESSOR; Selma Ferreira de Oliveira ................ 272 INVESTIGANDO SE AS HORAS DE TRABALHO PEDAGÓGICO COLETIVO (HTPCS) PODEM SE CONSTITUIR COMO ESPAÇOS DE FORMAÇÃO CONTÍNUA E DE REFLEXÃO SOBRE OS SABERES DOCENTES; Gabriela Reginato de Souza, Yoshie Ussami Ferrari Leite .................. 283 ANÁLISE DO PLANO DE CARREIRA DOS PROFISSIONAIS DA EDUCAÇÃO EM MUNICÍPIOS PAULISTAS; Rita de Cascia C. Bortolin........ 298 O PROGRAMA SÃO PAULO FAZ ESCOLA E O TRABALHO DOCENTE: O CASO DE UMA ESCOLA PÚBLICA DE RIO CLARO; Amanda Polato, Maria Ap. Segatto Muranaka .................................................................................................... 321 SALÁRIOS DOCENTES, FINANCIAMENTO E QUALIDADE DA EDUCAÇÃO; Andreza Barbosa .................................................................................. 340 A FORMAÇÃO DO GESTOR ESCOLAR; Rosana Cristina Carvalho Fraiz......... 351 O PIBID- PEDAGOGIA COMO POLÍTICA DE FORMAÇÃO DOCENTE: PRÁTICAS E VIVÊNCIAS PEDAGÓGICAS NAS ESCOLAS PÚBLICAS; Suzana Luis Barrios, Sandra Regina Paz da Silva ......................................................... 369 O PLANO DE METAS ―COMPROMISSO DE TODOS PELA EDUCAÇÃO‖: DESDOBRAMENTOS NO TRABALHO DOCENTE; Vilma Aparecida de Souza ........................................................................................................................................ 385 VI Grupo de Estudo e Pesquisas em Política Educacional, Rio Claro, 06, 07 e 08 de julho de 2011 Vol. 3 (2011)

AÇÃO DOCENTE NO SÉCULO XXI: O MAL-ESTAR DOCENTE RESULTANTE DA CRISE DE IDENTIDADE FRENTE ÀS NOVAS DEMANDAS SOCIAIS; Vanessa Malacrida, Helena Faria de Barros ..................... 396 USO DE UM AMBIENTE VIRTUAL DE APRENDIZAGEM NO APOIO AO ENSINO PRESENCIAL EM UM CURSO SUPERIOR; Sérgio Luis Antonello, Jeovani Thomazini, Alessandra Virgínia Montagner ..................................................... 415 MUDANÇAS LEGAIS E COTIDIANO ESCOLAR: FORMAÇÃO DE PROFESSORES EM POLÍTICAS DE ATENDIMENTO À CRIANÇAS E ADOLESCENTES; Débora Cristina Fonseca, Maria Bernadete S. da S. Carvalho .. 428 TRABALHO DOCENTE NA EaD E AS POLÍTICAS PÚBLICAS; Érika Kroll Rezende, Joyce Mary Adam de P. e Silva...................................................................... 441 A POLÍTICA DE AVALIAÇÃO DOS PROFESSORES NO ESTADO DE SP: SISTEMATIZANDO OS MECANISMOS DE CONTROLE SOBRE O TRABALHO DOCENTE; Jean Douglas Zeferino Rodrigues ................................... 451 NEGOCIAÇÃO: INDISPENSÁVEL NO FAZER E PENSAR A ESCOLA DO SÉCULO XXI; Vera Neves, Ilda M. B. N. Duarte, Ana V. de F. da Costa ................. 467 Eixo 3 – Reformas educacionais e controle social da educação ....................... 479 CONSELHOS MUNICIPAIS DE EDUCAÇÃO E O DESAFIO DA CONSTRUÇÃO DEMOCRÁTICA: UM ESTUDO SOBRE CASTANHAL-PA; Lindomal dos Santos Ferreira ........................................................................................ 479 ANÁLISE DE PROJETOS, PROGRAMAS E POLÍTICAS PÚBLICAS NA INVESTIGAÇÃO DA RELAÇÃO ENTRE ESCOLA E ENTORNO; Luana Costa Almeida, Geraldo Antonio Betini .................................................................................. 494 O ASSOCIATIVISMO EM VALINHOS SP; Paula Renata Bassan Morais .......... 504 PLANO NACIONAL DE EDUCAÇÃO: POLÍTICA DE ESTADO OU DE GOVERNO? Elisangela Maria Pereira Schimonek, Maria Aparecida Segatto Muranaka ........................................................................................................................................ 523 Eixo 4 – Reformas educativas e relações públicas e privadas na educação básica ........................................................................................................................ 541 ESTUDOS DE CASOS EM MUNICÍPIOS PAULISTAS COM SISTEMAS APOSTILADOS PARA O ENSINO FUNDAMENTAL I; Alessandra Aparecida Cain ................................................................................................................................ 541 O PROJETO REALFABETIZAÇÃO NO MUNICÍPIO DO RIO DE JANEIRO: ANÁLISE DA RELAÇÃO PÚBLICO – PRIVADA NA EDUCAÇÃO; Carla da Mota Souza, Antonio de Cistolo Ribeiro, Lucy Teixeira............................................... 553 UMA LEITURA DA TEORIA SOBRE A PRIVATIZAÇÃO DO ENSINO PÚBLICO E A VALORIZAÇÃO DO ENSINO PRIVADO: UMA ABORDAGEM SOBRE TAIS QUESTÕES NOS MUNICÍPIOS PAULISTA; Nanci Aparecida Costa, Adilson Aparecido Costa, Marcia Reami Pechula ...................................................................565

VII Grupo de Estudo e Pesquisas em Política Educacional, Rio Claro, 06, 07 e 08 de julho de 2011 Vol. 3 (2011)

CONVENIAMENTO E FINANCIAMENTO DA EDUCAÇÃO INFANTIL: CONTRIBUIÇÕES A PARTIR DA ANÁLISE DE PERIÓDICOS NACIONAIS; Liliane Ribeiro de Mello, Regiane Helena Bertagna ........................... 567 OFERTA DE VAGAS NA EDUCAÇÃO INFANTIL: MATRÍCULAS EM CRECHE E PRÉ-ESCOLA; Ana Lara Casagrande, Jaqueline dos Santos Oliveira 591 FINANCIAMENTO E GESTÃO DA EDUCAÇÃO BÁSICA: CF/1988, PLANO DECENAL DE EDUCAÇÃO PARA TODOS E PDDE; Adriana Inácio Yanaguita ........................................................................................................................................ 602 O PÚBLICO E O PRIVADO: ANÁLISE DAS ALTERAÇÕES NA LEGISLAÇÃO DO ESTADO DE SÃO PAULO DECORRENTES DA EMENDA CONSTITUCIONAL N. 19 (1998-2006); Debora Ap. Pereira Gomes ........................................................................................................................................ 616 A REDEFINIÇÃO DO PAPEL DO ESTADO BRASILEIRO: INDUÇÃO A PARCERIA PÚBLICO-PRIVADAS COM O TERCEIRO SETOR; Denise Pinheiro, Theresa Adrião................................................................................................ 624 A RELAÇÃO ENTRE A MUNICIPALIZAÇÃO DO ENSINO FUNDAMENTAL E ADOÇÃO DE PARCERIAS COM SISTEMA DE ENSINO APOSTILADO: UM ESTUDO EM 16 MUNICÍPIOS PAULISTAS; Lucilene Rossi ................................................................................................................ 631 DIMENSÕES DA REFORMA DO ESTADO: A PARCERIA COMO DIMENSÃO ESTRUTURANTE DA POLÍTICA DE QUALIFICAÇÃO PROFISSIONAL DO BRASIL; Sandra Regina Paz da Silva .................................. 645 RELAÇÕES ENTRE O PÚBLICO E O PRIVADO: O PROGRAMA NAVEMÃE NO MUNICÍPIO DE CAMPINAS; Wisllayne Ivellyze de Oliveira Dri, Nélia da Silva, Thalita Camargo Angelucci ................................................................... 659 INSTITUIÇÕES CONVENIADAS COM O PODER PÚBLICO PARA A OFERTA DE VAGAS EM CRECHE; Beatriz Aparecida da Costa .................... 673 PARCERIAS PÚBLICO-PRIVADO E OFERTA DE VAGAS NA EDUCAÇÃO INFANTIL EM MUNICÍPIOS PEQUENOS DO INTERIOR PAULISTA; Patrícia Adriana Abdalla ................................................................................................ 681 RELAÇÕES ENTRE MUNICIPALIZAÇÃO DO ENSINO FUNDAMENTAL E ADOÇÃO DO SISTEMA PRIVADO DE ENSINO: ANÁLISE DE DOIS MUNICÍPIOS PAULISTAS; Rosilene Rodrigues da Silva Souza .......................... 689 DEFININDO AS FORMAS DE PARCERIAS PÚBLICO-PRIVADAS: IMPLICAÇÕES PARA A EDUCAÇÃO PÚBLICA; Egle Pessoa Bezerra .......... 702 ATUAÇÃO DO GRUPO POSITIVO JUNTO AOS MUNICÍPIOS PAULISTAS: CONSIDERAÇÕES; Kátia Tamara Luiz, Theresa Maria de Freitas Adrião ............................................................................................................................. 718 A PRESENÇA DO GRUPO EMPRESARIAL OBJETIVO NA EDUCAÇÃO PÚBLICA PAULISTA: ALGUNS APONTAMENTOS; Luciana Sardenha Galzerano ....................................................................................................................... 732

VIII Grupo de Estudo e Pesquisas em Política Educacional, Rio Claro, 06, 07 e 08 de julho de 2011 Vol. 3 (2011)

PARCERIA PÚBLICO-PRIVADA EM UM MUNICÍPIO PAULISTA PARA USO DE SISTEMAS PRIVADOS DE ENSINO: DA IMPLEMENTAÇÃO AO ENCERRAMENTO, DIFERENTES AVALIAÇÕES; Vanessa Purificação Garcia, Adriana Sina Telles ........................................................................................................ 747 PARCERIA PÚBLICO-PRIVADA: FUNDAÇÕES DE APOIO E O SEQUESTRO DO FUNDO PÚBLICO; Luciana Rodrigues Ferreira, Emerson Duarte Monte.................................................................................................................. 756 PARCERIA PÚBLICO-PRIVADO E A ADOÇÃO DE SISTEMA PRIVADO DE ENSINO EM UM MUNICÍPIO PAULISTA; Paula de Souza Nunes, Cláudia Vieira Patrício ................................................................................................................ 765 A INSERÇÃO DO SISTEMA COC NA OFERTA DA EDUCAÇÃO MUNICIPAL NO ESTADO DE SÃO PAULO; Roberta Cristina Gobi ............... 776

IX Grupo de Estudo e Pesquisas em Política Educacional, Rio Claro, 06, 07 e 08 de julho de 2011 Vol. 3 (2011)

APRESENTAÇÃO O Grupo de Estudos e Pesquisas em Política Educacional, GREPPE, agregando pesquisadores vinculados às diferentes universidades públicas no Estado de São Paulo, caracteriza-se pela realização de estudos, pesquisas e eventos acadêmicos de caráter predominantemente interinstitucional com o objetivo de promover o aprofundamento teórico e discussão de temas relevantes para a política educacional brasileira. Com seções em três universidades públicas de São Paulo (UNESP-Rio Claro, UNICAMP e USPRibeirão Preto), o GREPPE é composto por docentes, pesquisadores, alunos de graduação e pós-graduação. Este ano, realizamos o ―III Seminário Internacional de Gestão

Educacional: organização do trabalho na escola e reformas educativas‖, com o objetivo de promover o debate e a reflexão sobre diferentes temas e problemáticas da área de política e gestão educacional. O evento, realizado nos dias 06, 07 e 08 de julho de 2011, foi destinado a estudantes de graduação e pós-graduação, professores universitários, professores da rede pública e/ou privada, profissionais da educação e demais pessoas interessadas; sediado no Instituto de Biociências na UNESP de Rio Claro. Nesse terceiro ano de realização do Seminário, o foco de trabalho e reflexão foram as reformas educativas e suas implicações para a organização do trabalho pedagógico. Subdividido em quatro eixos: 1 – Reformas educacionais e a organização do trabalho na escola. 2 – Reformas educacionais e trabalho docente. 3 – Reformas educacionais e controle social da educação. 4 – Reformas educacionais e as relações públicas e privadas na educação básica.

III Seminário Internacional de Gestão Educacional

A partir desses eixos temáticos, o GREPPE coloca em debate as políticas públicas da educação na tentativa de contribuir para as discussões atuais sobre a área em questão.

2 Grupo de Estudo e Pesquisas em Política Educacional, Rio Claro, 06, 07 e 08 de julho de 2011 Vol. 3 (2011)

III Seminário Internacional de Gestão Educacional

PROGRAMAÇÃO DO EVENTO 06/07/2011 14:00h Credenciamento 19h30 Conferência de Abertura Prof. Licínio Lima – Universidade do Minho / Portugal

Coordenação: (UNICAMP)

Prof.ª

Dr.ª

Theresa

Maria

de

Freitas

Adrião

07/7/2011 9:00h Mesa-redonda: A organização do trabalho na escola e as reformas educacionais atuais. Debatedores:

Prof. Dr. Luiz Carlos Freitas - FE/Unicamp; Prof. Dr. Vitor Paro – FE/USP Prof.ª Rita Coelho — SEB / MEC Coordenação: Prof.ª Dr.ª Bianca Cristina Correa (USP/ Ribeirão Preto)

15:00h Mesa-redonda: A relação entre as alterações na organização do trabalho no setor produtivo e as alterações na organização do trabalho na escola Debatedores:

Prof. Dr. Álvaro Moreira Hypolito - FE -Universidade Federal de Pelotas Prof. Dr. Celso Ferreti/CEDES Profª Marlene Shiroma Goldenstein- Escola de Ciências do Trabalho Prof. Dr. Mario Salerno—USP/SP Coordenação: Prof.ª Dr.ª Raquel Fontes Borghi

18:30h Apresentação de trabalhos científicos em formato pôster. 08/07/2011 9:00h Mesa-redonda: Reformas educacionais: Conseqüências sistemas e para os trabalhadores em educação. Debatedores:

para

os

Valéria Aparecida Vieira Vélis: vice-presidente UNCME - União Nacional dos Conselhos Municipais de Educação. 3

Grupo de Estudo e Pesquisas em Política Educacional, Rio Claro, 06, 07 e 08 de julho de 2011 Vol. 3 (2011)

III Seminário Internacional de Gestão Educacional

Heleno Araújo - Representante da Confederação Nacional dos Trabalhadores em Educação-CNTE Lucia Couto - Representante da UNDIME - Estado de São Paulo Coordenação: Prof.ª Dr.ª Teise Guaranha Garcia 14:00h Conferência de Encerramento: A gestão das reformas educativas na educação básica no contexto latino americano Profª María Rosa Misuraca - Universidade Nacional de Luján-Argentina Coordenação: Prof.ª Dr.ª Regiane Helena Bertagna

4 Grupo de Estudo e Pesquisas em Política Educacional, Rio Claro, 06, 07 e 08 de julho de 2011 Vol. 3 (2011)

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TRABALHOS Eixo 1 – Reformas educativas e organização do trabalho na escola

ORGANIZAÇÃO E FUNCIONAMENTO DOS CONSELHOS ESCOLARES NO ESTADO DE SÃO PAULO

Juliana Carolina Barcelli [email protected] Universidade Federal de São Carlos – UFSCar

Lucéia Maria de Souza Paula [email protected] Universidade Federal de São Carlos – UFSCar

Resumo: O fortalecimento dos Conselhos Escolares (CEs) pode promover a distribuição de poder e a participação dos diferentes agentes escolares nas deliberações da escola. Para que as decisões culminem em melhorias, é preciso que esses agentes compreendam a organização e o funcionamento dos CEs para enxergarem a importância da participação para a gestão democrática. Analisamos o funcionamento e a organização dos CEs para averiguar como alguns municípios paulistas estavam efetuando na prática, esse colegiado no processo de democratização da escola. Verificamos que o funcionamento e a organização dos CEs ainda não estão bem esclarecidos para os diferentes segmentos que compõe esse colegiado. Palavras-chave: conselhos escolares; gestão democrática; funcionamento dos CEs.

INTRODUÇÃO 5 Grupo de Estudo e Pesquisas em Política Educacional, Rio Claro, 06, 07 e 08 de julho de 2011 Vol. 3 (2011)

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Os Conselhos Escolares (CEs) possibilitam a distribuição de poder e a participação dos diferentes agentes escolares (gestores, professores, funcionários, alunos, familiares e comunidade) nas deliberações da escola, com o intuito de partilhar diferentes visões de mundo para que decisões coletivas sejam feitas em prol da melhoria da qualidade do ensino. Considerando que o funcionamento e a organização dos Conselhos Escolares (CEs) contribuem para a formação de um espaço democrático nas escolas, esta investigação, ainda em andamento, utiliza de levantamentos bibliográficos e reflexões da prática, para identificar a organização e o funcionamento dos CEs de sessenta e sete municípios do estado de São Paulo que participaram do curso de extensão denominado ―Formação Continuada a Distância em Conselhos Escolares‖ oferecido pelo Departamento de Educação da Universidade Federal de São Carlos – UFSCar/DEd nos anos de 2009 e 2010 em parceira com a Secretaria de Educação Básica do Ministério da Educação (SEB/MEC). Neste momento, estamos analisando e averiguando como estão funcionando os CEs dessas cidades para percebemos como estão organizados, como ocorrem a participação dos conselheiros e qual é a principal função dos CEs, levando em conta que as mobilizações e estratégias devem promover a articulação da gestão democrática na escola pública, com vistas à melhoria da qualidade social da educação básica.

PARTICIPAÇÃO E DELIBERAÇÃO COLETIVA

Levando em consideração que as funções fundamentais dos Conselhos Escolares são: deliberativa, consultiva, fiscalizadora e mobilizadora, faz-se necessário expor as atribuições de cada função dentro dos CEs para conhecermos melhor parte da organização desse colegiado. A função deliberativa tem o objetivo de elaborar normas internas para guiar as ações pedagógicas, administrativas e financeiras da escola; a função consultiva tem como pressuposto básico assessorar e analisar questões levantadas pelos diferentes segmentos da escola para construir sugestões que serão decididas nas reuniões de CEs; a função fiscalizadora tem o intuito de acompanhar as 6 Grupo de Estudo e Pesquisas em Política Educacional, Rio Claro, 06, 07 e 08 de julho de 2011 Vol. 3 (2011)

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questões pedagógicas, administrativas e financeiras e avaliar e cumprir as regras internas da escola; e, for fim, e não menos importante, a função mobilizadora que tem o papel de garantir a participação de todos os segmentos representativos dos CEs e a articulação entre comunidade e escola. Verificamos, a partir do estudo aprofundado das ações desse colegiado, que é imprescindível a participação dos diferentes agentes escolares nesse colegiado para a construção de uma escola realmente democrática. Nas legislações, os Conselhos Escolares são amparados. Podemos verificar esse apoio na Lei Complementar nº. 444/85 - art. 95, Comunicado SE de 31/03/86 (DOE de 01/04/86 pág. 8 - Seção I), Comunicado SE de 10/03/93 e Parecer CEE nº. 6. Com a criação desta lei complementar no estado de São Paulo, os Conselhos Escolares passaram a ter a função deliberativa, sendo que esse colegiado nasce para auxiliar a gestão da escola nas decisões sobre os aspectos administrativos, financeiros e pedagógicos. Sua composição é mais paritária e apresenta um maior envolvimento das comunidades interna e externa a escola. Em nível federal, a Constituição Federal de 1988, no inciso VI do artigo 206 afirma que:

Art. 206. O ensino será ministrado com base nos seguintes princípios: VI – gestão democrática do ensino público na forma de lei (BRASIL, 1998).

Para reforçar o princípio de gestão democrática e promover espaços para que a participação da comunidade ocorra nas decisões da escola, a Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional (LDBEN), nº 9.394/96, expõem em seus artigos 12, 13 e 14 que:

Art. 12. Os estabelecimentos de ensino, respeitadas as normas comuns e as di seu sistema de ensino, terão a incumbência de: VI – articular-se com as famílias e a comunidade, criando processos de integração da sociedade com a escola. Art. 13. Os docentes incumbir-se-ão de: VI – colaborar com as atividades de articulação da escola com as famílias e a comunidade. Art. 14. Os sistemas de ensino definirão as normas da gestão democrática do ensino público na educação básica, de acordo com as suas peculiaridades e conforme os seguintes princípios: II – participação das comunidades escolar e local em conselhos escolares ou órgãos equivalentes (BRASIL, 1996).

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No Plano Nacional de Educação, nº 10.172/2001, também fornece apoio para promover o princípio da gestão democrática na escola pública ao garantir a educação infantil, ao ensino fundamental e ao ensino médio a participação da comunidade na gestão da escola. O Plano de Metas e Compromissos Todos pela Educação (decreto nº 6.094/2007) garante, em seu inciso XXV do artigo 2, que:

Art. 2. A participação da União no Compromisso será pautada pela realização direta, quando couber, ou, nos demais casos, pelo incentivo e apoio à implementação, por Municípios, Distrito Federal, Estados e respectivos sistemas de ensino, das seguintes diretrizes: XXV – fomentar e apoiar os conselhos escolares, envolvendo as famílias dos educandos, com as atribuições, dentre outras, de zelar pela manutenção da escola e pelo monitoramento das ações e consecução das metas do compromisso (BRASIL, 2007).

Podemos notar que a participação é um dos princípios norteadores da gestão democrática. Desse modo, faz-se necessário unir aos preceitos legais com alguns referencias teóricos que nos ajudam a elucidar a importância da implantação dos CEs nas escolas públicas. Segundo Arroyo (2008), educação participativa, autônoma e cidadã, isto é, educação como direito de cidadania participativa e consciente, ocorre quando o sujeito tem subsídios para transformar a sociedade autoritária em que vive, muitas vezes, marcada pela desigualdade social, econômica e cultural. A partir dessa concepção de que ao participar somos capazes de transformar a realidade atual, Bordenave (1992) nos ajuda a pensar, a partir de um estudo etimológico, sobre a palavra participação. Para o autor, o sentido real dessa palavra é: ter parte, fazer parte e tomar parte de algo, ou seja, estar presente não significa que o sujeito poderá modificar a sociedade em que vive, é preciso tornar-se parte de um ambiente, conhecendo suas contradições e seus limites. Segundo Bordenave (1992), o interesse pela participação coletiva tem tomado rumos crescentes, pois é por meio da participação que os homens se interagem e têm o direito de se expressarem. Portanto, torna-se importante estimular a participação em colegiados como os Conselhos Escolares para que haja a transformação da realidade, isto é, cabe a escola assumir a responsabilidade de modificar o instituído.

8 Grupo de Estudo e Pesquisas em Política Educacional, Rio Claro, 06, 07 e 08 de julho de 2011 Vol. 3 (2011)

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Conforme Libâneo (2001), a participação é a melhor maneira de se assegurar a gestão democrática, ou como mostra Santos Filho (1998)

a participação é parte de um processo de educação política e moral, além disso ela é um instrumento do desenvolvimento de hábitos de senso crítico e julgamento, e da responsabilidade. (SANTOS FILHO,1998, p.13)

Notamos, portanto, o quão importante é abrir espaços no ambiente escolar para promover a participação, pois é por meio desta que os indivíduos são motivados a entenderem melhor suas perspectivas e seus ideais, a fim de garantir qualidade do ensino. Além disso, como aponta Santos Filho (1998), garantir a participação é levar o aluno a se conscientizar, é o tornar livre. Pois, a participação ajuda ao cidadão a formar sua consciência perante a sociedade em que está inserido. Acreditamos que para que se alcance a gestão democrática, é preciso que ocorra de fato a democratização da escola. Segundo Lima (2000), para alcançarmos esse objetivo seria preciso que todos os agentes escolares se envolvessem em todos os processos educacionais desta instituição, isto é, desde a interpretação das legislações, passando pela administração central até chegar a sala de aula. Os Conselhos Escolares são essenciais para que trocas de interesses sejam feitas em prol da democracia escolar, as quais possibilitam a formação de um sujeito que reflete sua realidade social e não apenas atenda aos objetivos impostos. Deste modo, os CEs complementam a unidade escolar, pois sendo um órgão consultivo e deliberativo que trata de problemas financeiros, administrativos e pedagógicos da escola, contribui, por meio da participação coletiva, com propostas e projetos para a instituição, articulando-se com os demais espaços coletivos de participação, como Conselho de Classe, Associação de Pais e Mestres (APM), reunião de pais, etc. (LUIZ; CONTI, 2007, p. 4). Fica evidente que uma gestão democrática possibilitaria maior qualidade de ensino, e a busca por ela vêm mobilizando as instituições públicas e até mesmo as políticas educacionais, que passam a abranger programas que contribuem com os processos de democratização da escola. Entre os programas criados pela Secretaria de Educação Básica do Ministério da Educação (SEB/MEC) destaca-se o Programa Nacional de Fortalecimento de Conselhos Escolares que surge em 2004 por meio da 9 Grupo de Estudo e Pesquisas em Política Educacional, Rio Claro, 06, 07 e 08 de julho de 2011 Vol. 3 (2011)

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Portaria Ministerial (nº 2.896/2004 art. 1º) reafirmando a determinação da Lei de Diretrizes e Bases (LDB, 9.394/96), do Plano Nacional de Educação (PNE, 2001) e do Plano de Desenvolvimento da Educação (PDE, 2007). Este programa tem como objetivo principal fortalecer os Conselhos Escolares nas escolas públicas de educação básica ―envolvendo os sistemas de ensino públicos estaduais e municipais, por meio de sua adesão à sistemática de apoio técnico, pedagógico e financeiro do Ministério da Educação‖ (LUIZ; BARCELLI; CONTI, 2010, p. 12). Tem como meta: I – Ampliar a participação das comunidades escolar e local na gestão administrativa, financeira e pedagógica das escolas públicas; II – Apoiar a implantação e o fortalecimento de conselhos escolares; III – Instituir políticas de indução para implantação de conselhos escolares; IV – Promover, em parceria com os sistemas de ensino, a capacitação de conselheiros escolares, utilizando inclusive metodologias de educação a distância; V – Estimular a integração entre os conselhos escolares; VI – Apoiar os conselhos escolares na construção coletiva de um projeto educacional no âmbito da escola, em consonância com o processo de democratização da sociedade; VII – Promover a cultura do monitoramento e avaliação no âmbito das escolas para a garantia da qualidade da educação (BRASIL, 2004).

A SEB/MEC tem sido responsável pelo Programa Nacional de Fortalecimento de Conselhos Escolares que tem como foco a formação continuada de técnicos, diretores e professores das Secretarias Municipais e Estaduais de Educação para que estes se tornem multiplicadores de conhecimentos e ações nos CEs, contribuindo assim para uma efetiva participação dos profissionais da educação e da comunidade na gestão escolar, com vistas a uma gestão democrática. São trabalhados, neste programa, doze cadernos temáticos que ampliam ―a discussão e reflexão sobre os Conselhos Escolares‖ (FERNANDES; RAMOS, 2010, p. 217) e trabalham as novas relações pedagógicas de poder nas escolas ao tratarem esse colegiado como deliberativo, consultivo, fiscalizador e mobilizador. Esse material ressalta que os CEs têm o objetivo de informar aos gestores e dirigentes o que a comunidade pensa sobre a educação escolar, ou seja, busca mostrar que para construir o Projeto Político Pedagógico (PPP) é preciso unir as diferentes concepções de mundo dos agentes escolares. Apesar dos limites colocados por essa política educacional (não ofertar esse curso a todos os segmentos que compõe os Conselhos Escolares e não garantir o acompanhamento de ações para o 10 Grupo de Estudo e Pesquisas em Política Educacional, Rio Claro, 06, 07 e 08 de julho de 2011 Vol. 3 (2011)

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fortalecimento dos CEs), é possível partir dos princípios do programa para construir práticas democráticas de participação. Afinal, segundo Fernandes e Ramos (2010), a escola pode reverter o quadro de controle centralizador da gestão ao elaborar seu PPP nos Conselhos Escolares, pois este conta com a participação de seus diferentes segmentos que, unidos, estruturam os objetivos da escola e lutam para atingi-los. O que Fernandes e Ramos (2010) defendem é que não se pode esperar por mudanças sociais e legislativas para se modificar o cenário educacional. O que se deve fazer é promover espaços de estudos na escola, e fora dela, que levarão a discussões sobre a importância da prática democrática nas unidades escolares e na sociedade.

Assim, tal anseio pela melhoria da qualidade da educação exige medidas no campo do ingresso e da permanência dos educandos na escola, mas também exige ações que possam alterar a atual situação de baixa qualidade da aprendizagem na educação básica, tornando premente a identificação dos condicionantes da política de gestão, bem como a reflexão sobre a construção de estratégias de mudança desse cenário educacional (Fernandes e Ramos, 2010, p. 220-221).

CURSO DE FORMAÇÃO CONTINUADA A DISTÂNCIA EM CONSELHOS ESCOLARES

O curso de Formação Continuada a Distância em Conselhos Escolares foi realizado em parceria com o Programa Nacional de Fortalecimento de Conselhos Escolares (SEB/MEC) e o Departamento de Educação da UFSCar (DEd/UFSCar) e atendeu as Secretárias Municipais de Educação (SME) dos municípios do estado de São Paulo, que solicitaram a formação em seus Planos de Ações Articuladas (PAR), em 2007 e 2008. Luiz; Barcelli; Conti (2010) destacam que este curso de formação foi ofertado entre novembro de 2009 e setembro de 2010, e teve como objetivo formar diretores, professores, dirigentes, e técnicos das secretárias municipais de educação do estado de São Paulo, de maneira que estes se tornassem multiplicadores de conhecimentos e ações no âmbito dos conselhos escolares. Para a concretização desse curso, formou-se uma equipe pedagógica com uma coordenadora geral, dois professores adjuntos do DEd, um supervisor do ambiente virtual, vinte tutores e dois estagiários (administrativo e pedagógico). A equipe 11 Grupo de Estudo e Pesquisas em Política Educacional, Rio Claro, 06, 07 e 08 de julho de 2011 Vol. 3 (2011)

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pedagógica da UFSCar, formada por um público diversificado, foi constituída com o objetivo de articular ações coletivas para a elaboração de atividades e avaliações, bem como revisão do material pedagógico nas perspectivas práticas e teóricas. Estas ações foram realizadas a partir da leitura dos dez cadernos do Programa de Fortalecimento dos Conselhos Escolares. De acordo com Luiz; Barcelli; Conti (2010), para a viabilização virtual do curso, foram criados três espações distintos no ambiente de aprendizagem Moodle1, hospedados no servidor da UFSCar. O primeiro, denominado ambiente coletivo (espaço que permitia livre acesso a todos os cursistas); no segundo espaço foram hospedadas vinte salas de atividades disponíveis apenas na primeira fase do curso e; por fim, no terceiro espaço foram criadas nove salas de atividades para a segunda fase do curso. Além deste acompanhamento virtual, por meio do ambiente de aprendizagem Moodle, a coordenação geral abriu um espaço para debates em fóruns e chats neste ambiente, criando uma sala de coordenação que era acessada por toda equipe pedagógica. Tal espaço constitui-se como o lugar para esclarecimentos de dúvidas e orientação para os tutores, bem como para postas as decisões realizadas nas reuniões presenciais. O curso foi organizado em duas fases. A fase I, com carga horária de 80 horas, teve início em novembro de 2009 e finalizou-se em abril de 2010, contanto com 26 dias de recesso (entre dezembro e janeiro). Ao longo desta fase, foram trabalhadas as principais temáticas dos cinco primeiros cadernos do Programa de Fortalecimento dos Conselhos Escolares. A fase II, assim como a primeira, teve uma carga horária de 80 horas de participação, a qual foi distribuída entre os meses maio e agosto de 2010, não contando os 16 dias de recesso no mês de julho. Para cada caderno foram solicitadas duas atividades obrigatórias, sendo que somente no Caderno 6 teve um fórum avaliativos, além de uma atividade de produção de texto, os demais cadernos foram solicitados apenas duas atividades de texto. Além disso, em específico, como avaliação desta fase os cursistas fizeram um plano de ação no qual deveriam desenvolver ações para o fortalecimento dos CEs de seus munícipios.

1

O Moodle é um Ambiente Virtual de Aprendizagem, ferramenta aberta que possibilita a construção de salas de aula virtuais, compartilhando conhecimento por meio de conteúdos didáticos, comunicação síncrona e assíncrona e se estabelecendo enquanto interface entre educadores e educandos.

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Na segunda fase, os cursistas deveriam responder a um questionário informativo semiestruturado, com 30 questões (abertas e fechadas) elaboradas pela equipe pedagógica da UFSCar. Este questionário objetivava conhecer melhor a estrutura, organização e as ações relacionadas ao CE das diversas SMEs do Estado de São Paulo.

ALGUNS DADOS E ANÁLISES

Como já dito, o levantamento de dados desta pesquisa foi o questionário informativo, disponibilizado no moodle (site do curso de extensão em Conselhos Escolares) na metade da fase II, que continha trinta questões que foram, posteriormente, divididas em cinco categorias para análise, sendo elas: 1) Dados da SME; 2) Caracterização dos Municípios; 3) Estrutura Educacional de cada município (dados qualitativos e quantitativos); 4) Organização de cada SME (dados qualitativos e quantitativos) e 5) Funcionamento dos Conselhos Escolares (organização e ações). Cabe ressaltar que este questionário não era uma atividade obrigatória, de modo que nem todos os cursistas o responderam. As sessenta e sete cidades selecionadas foram divididas em duas perspectivas importantes: municípios de médio porte (população entre 499.000 a 100.000 habitantes) e pequeno porte (população igual ou menor que 99.000 habitantes), critérios estes estabelecidos segundo o Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE). Por ser uma quantidade muito grande de informações, neste texto apresentaremos apenas os dados relacionados as questões 24, 25, 26, 27, 28 e 292 do questionário informativo, que tinham como foco identificar como os Conselhos Escolares estavam organizados e como permaneciam seu funcionamento. Todas as dezoito cidades de médio porte alegaram que o diretor é membro nato dos Conselhos Escolares. Já nas cidades de pequeno porte, evidenciamos que 93,9% das 2

Os enunciados das questões foram estruturados da seguinte forma: 24. O/A diretor (a) de escola é membro nato do CE?; 25. O Conselho tem o caráter de uma Unidade Executora (pode lidar com dinheiro), ou essa função está reservada para a APM?; 26. De que forma os CE têm funcionado? Há reuniões freqüentes?; 27. Como tem sido a participação dos conselheiros, por categorias?; 28. Há um perfil mais ou menos definido de pais que participam no CE? Qual é esse perfil (quanto ao sexo, idade, cor etc.)? e 29. Qual deveria ser o principal papel do CE, em sua opinião?

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respostas dos cursistas afirmaram que o diretor é membro nato do CE e, 6,1% demonstraram que o diretor não é membro nato desse colegiado. Destacamos a importância de se possuir o diretor como membro nato desse colegiado para que ocorra a interlocução entre poder público (União) e a escola. No entanto, não podemos esquecer que a figura do diretor no CE não se restringe a atuação de administrador que garante que as normas do sistema educacional sejam respeitadas nas unidades escolares, mas que seu papel também é valorizar o ensino (caráter pedagógico) e articular comunidade e escola. No que se refere ao funcionamento dos CEs, notificamos que 70,5% das cidades de médio porte não afirmaram como os CEs estavam funcionando, 17% afirmaram que o colegiado estava funcionando bem e 12,5% afirmaram que o CE funcionava razoavelmente. Quanto às reuniões referentes a esse colegiado, as respostas apontaram que apenas 42% das reuniões ocorriam bimestralmente, com possibilidade de convocar

reuniões

extraordinárias,

5,5%

das

cidades

não

responderam

ao

questionamento, outros 5,5% tiveram divergência nas respostas ora apontando ter reuniões bimestrais e ora reuniões semestrais, 4% das respostas afirmaram ter reuniões gerais para eleição, 4% reuniões mensais, 8% reuniões semestrais e 1,5 não souberam responder a questão. Já nos municípios de pequeno porte, os dados apontaram que 20,4% dos CEs têm funcionado de maneira ruim, 8% funcionando bem e 71,6% não colocaram informações sobre o funcionamento dos CEs. Quanto às reuniões, as respostas apontaram que 30,6% indicaram haver reuniões bimestrais, com possibilidade de convocar reuniões extraordinárias a partir do presidente (34,6%), 30,6% afirmaram não existir reuniões sistemáticas, 28,6% declararam não existir reuniões específicas ou previstas no calendário, ocorrendo reuniões conforme necessidade, de maneira esporádica; 6% afirmaram ter reuniões anuais e 2% declararam ter reuniões mensais. Quando questionamos sobre o caráter executor (saber lidar com o dinheiro) dos Conselhos Escolares, 66,7% das cidades de médio porte alegaram que o caráter executor é exclusivo da APM, 16,7% afirmaram que tanto a APM quanto os CEs atuam como unidades executoras, 11,1% alegaram que os Conselhos Escolares possuíam o caráter executor e 5,5% dos cursistas não souberam responder a questão. De acordo com os dados, 85,8% dos cursistas das cidades de pequeno porte, evidenciaram que os Conselhos Escolares não possuíam caráter de uma unidade executora, mas esta atribuição é reservada a APM. Somente, 8,2% afirmaram que os CEs têm caráter 14 Grupo de Estudo e Pesquisas em Política Educacional, Rio Claro, 06, 07 e 08 de julho de 2011 Vol. 3 (2011)

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executor em seus municípios, 2% não souberam responder a questão, 2% evidenciaram que estes dois colegiados desempenham o caráter de unidade executora e 2% revelaram que ainda não tem CEs em suas cidades. Quanto à participação dos conselheiros, por categorias, nas cidades de médio porte, evidenciamos que 44,4% declaram que a participação de todas as categorias era muito boa, outros 16,7% afirmaram que havia pouca participação e 38,9% cursistas não foram nítidos em suas respostas. Já nas cidades de pequeno porte, evidenciamos que 47% declararam que os segmentos participam muito bem, 16,3% apontaram que há pouca participação, 16,3% afirmaram que a equipe pedagógica é a que mais participa, 6,1% evidenciaram que não há CEs em seus municípios e 14,2% dos cursistas não souberam responder esta questão. Dos que afirmaram que há um perfil definido, as respostas mais comuns foram: mulheres mães de alunos e pais e mães mais jovens. No que se refere ao papel dos Conselhos Escolares, 37,5% dos cursistas afirmaram que o órgão colegiado é consultivo, 32,5% deliberativo, 22,5% fiscalizador e 7,5% mobilizador. A partir das respostas, verificamos que o papel consultivo do CE era visto, pelos cursistas, como momento de se pensar em propostas pedagógicas que auxiliem a aprendizagem dos alunos, ajudar a equipe gestora nas questões administrativas da escola, ser mediador entre escola e comunidade, participar da construção e deliberação do projeto político pedagógico. No que se refere a função deliberativa, segundos as respostas dos cursistas, era auxiliar o gestor nas questões administrativas, financeiras e pedagógicas, elaborar normas internas para a escola e planejar e elaborar atividades para a escola como a construção do projeto político pedagógico. O papel fiscalizador foi entendido, em sua maioria, como forma de acompanhar o trabalho pedagógico, fiscalizar e resolver problemas, garantir o cumprimento das normas da escola e acompanhar o processo de ensino-aprendizagem. Já a função mobilizadora se constituiu basicamente em articulação entre comunidade e escola. Já para os cursistas dos municípios de pequeno porte evidenciaram que 35% dos órgãos colegiados é consultivo, 31% deliberativo, 20% fiscalizador e 14% mobilizador. A função consultiva refere-se a participar de forma ativa sobre questões educacionais, levantar possibilidades de solução ou alternativas de ação conjunta, diagnosticar ações necessárias e úteis para a comunidade e facilitar os tramites escolares. Quanto à função deliberativa, se refere a tomadas de decisões, participação de forma ativa sobre questões educacionais, participação efetiva na construção do projeto político pedagógico. O papel 15 Grupo de Estudo e Pesquisas em Política Educacional, Rio Claro, 06, 07 e 08 de julho de 2011 Vol. 3 (2011)

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fiscalizador é caracterizado por garantir o acesso a escola e a melhoria do processo, acompanhar o andamento escolar e fiscalização de ações dentro da escola, acompanhar e avaliar o PPP. E, por fim, o mobilizador foi descrito como: a ponte entre escola e comunidade, coordenação do coletivo da escola, presença na escola em todas as atividades juntamente com a comunidade e democracia participativa para todos.

ALGUMAS CONSIDERAÇÕES

Apesar dessa investigação não estar finalizada, pudemos identificar, por meio dos relatos dos cursistas (que eram técnicos da SME, ou diretores ou professores das redes municipais de ensino), alguns aspectos existentes perante o funcionamento e a organização dos Conselhos Escolares desses municípios paulistas, principalmente no que se refere aos objetivos desse colegiado e o perfil de seus conselheiros, os quais evidenciam que há uma maior preocupação em explicitar a função real dos CEs para que ocorra a descentralização da gestão educacional e a participação de todos os segmentos. De acordo com as análises feitas até o momento, verificamos que grande parte dos cursistas afirmaram que os Conselhos Escolares não possuem caráter de uma unidade executora, pois esta atribuição está reservada a APM. Portanto, ainda se pensa que o papel dos CEs é grande parte consultivo (pensar em propostas pedagógicas que auxiliem a aprendizagem dos alunos, ajudar a equipe gestora nas questões administrativas da escola, ser mediador entre escola e comunidade, participar da construção e deliberação do projeto político pedagógico) ou deliberativo (auxiliar o gestor nas questões administrativas, financeiras e pedagógicas, elaborar normas internas para a escola e planejar e elaborar atividades para a escola como a construção do projeto político pedagógico). Notificamos ainda, que a grande parte dos CEs não anda funcionando muito bem porque as reuniões ocorrem semestralmente ou, em alguns casos, anualmente. Destacamos que pensar a complexidade da escola exige ter maior participação dos agentes escolares nos processos pedagógico, financeiros e administrativos da escola para que esse colegiado passe do plano legal e chegue ao plano real.

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Tanto as cidades de pequeno porte quanto as de médio porte caracterizam a participação de todos os segmentos dos Conselhos Escolares como sendo uma boa participação, declarando que a categoria que participa mais é a equipe pedagógica o que nos mostra que o elo comunidade-escola ainda não está fortificado. Ao que se refere ao perfil dos conselheiros, grande parte das cidades afirmam que não existe um perfil definido, mas quando afirmam apontam que as mulheres e os pais com mais escolaridade participam mais. Entendemos que para se ter uma gestão democrática é preciso mais do que garantir em termos legais a participação da comunidade escolar e local nas decisões da escola, é promover na prática essas ações. Portanto, há a necessidade de incluir na cultura organizacional das escolas espaços que permitam que todos os segmentos conheçam a organização dos CEs e entendam sua real função para não fazê-lo mais uma tarefa a ser cumprida, mas uma causa importante para a democratização do ensino. Assim, em meio a avanços e retrocessos, nota-se que os Conselhos Escolares ainda devem percorrer um longo caminho para efetivamente superar a dualidade entre a sua legitimação perante o governo em exercício (políticas públicas) e a materialização do querer e da legítima luta de vários segmentos da equipe escolar e comunidade.

REFERÊNCIAS ARROYO, M. G. Gestão Democrática: recuperar sua radicalidade política. In: CORREA, B. C.; GARCIA, T. O. (Orgs.). Políticas Educacionais e organização do Trabalho na escola. São Paulo, SP: Xamã, 2008, p. 39-56. BRASIL. Constituição da República Federativa do Brasil: promulgada em 5 de outubro de 1988. Disponível em: . Acesso em: 20 de out. 2006. ______. Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional: Lei n. 9.394/96. Disponível em: . Acesso em: 20 out. 2006. ______. Plano Nacional de Educação (PNE): aprovado em 9 de janeiro de 2001. Disponível em . Acesso em: 30 abr. 2011. ______. Plano de Desenvolvimento da Educação (PDE): promulgado em 24 de abril de 2007. Disponível em: . Acesso em: 08 mai. 2011. 17 Grupo de Estudo e Pesquisas em Política Educacional, Rio Claro, 06, 07 e 08 de julho de 2011 Vol. 3 (2011)

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FERNANDES, Maria Cristina da Silveira Galan; RAMOS, Géssica Priscila. Conselho Escolar, participação e qualidade da educação no âmbito da gestão democrática. Revista Eletrônica de Educação. São Carlos, SP: UFSCar, v. 4, no. 2, p. 210-224, nov. 2010. Disponível em http://www.reveduc.ufscar.br, último acesso 30/04/2011. LIBÂNEO, J. C.. Organização e gestão da escola. Goiânia: Editora Alternativa, 2001. LIMA, L. Organização escolar e democracia radical: Paulo Freire e a governação democrática da escola pública. São Paulo, SP: Cortez: Instituto Paulo Freire, 2000. LUIZ, M. C.; CONTI, C. L. Políticas Públicas e Gestão Democrática: o funcionamento do conselho escolar no sistema municipal de ensino. Educação: teoria e prática. V17, nº 29, Jul/Dez. P.33-50, 2007. LUIZ, M. C.; BARCELLI, J. C.; CONTI, C. L. A. O curso de extensão denominado “Formação Continuada a distancia em Conselhos Escolares” – UFSCar/MEC (Programa Nacional de Fortalecimento em Conselhos Escolares). In: LUIZ, Maria Cecília (organizadoras). Conselho Escolar: algumas concepções e propostas de ação. São Paulo: Xamã, 2010. PORTARIA MINISTERIAL n. 2.896/2004. Diário Oficial da União - nº 180, sextafeira, 17 de setembro de 2004, seção 2, página 7 - ISSN 1677-7050. RISCAL, S. A. Gestão democrática no cotidiano escolar. São Carlos: EdUFSCar, 2009. (Coleção UAB-UFSCar). SANTOS FILHO, J. C. dos. Democracia institucional na escola: uma discussão teórica. Revista de Administração Educacional, v.1, n.2, 1998, p. 1-36. SÃO PAULO (Estado). Lei Complementar nº 444 de 27 de dezembro de 1985: dispõe sobre o Estatuto do Magistério Paulista e dá providências correlatas. São Paulo. 1985. Disponível em . Acesso em: 26 mai. 2011.

Agradecimentos ao Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico CNPq/UFSCar – Bolsa IC (Iniciação Científica).

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A AVALIAÇÃO E OS CICLOS: POSSIBILIDADES PARA REPENSAR A ORGANIZAÇÃO DO TRABALHO NA ESCOLA Ricardo Matheus Pires [email protected] UNESP/Rio Claro/Instituto de Biociências/Departamento de Educação

Regiane Helena Bertagna [email protected] UNESP/Rio Claro/Instituto de Biociências/Departamento de Educação

Resumo: Este trabalho pretende refletir sobre o papel da avaliação na organização do trabalho pedagógico, bem como refletir sobre os diferentes propostas atualmente praticados na escola – os ciclos e a progressão continuada –, e assim contribuir para a construção de práticas pedagógicas e avaliativas transformadoras. A avaliação escolar foi o elemento didático escolhido, pois é considerado chave na organização da escola. A avaliação está em íntima associação com os objetivos que se almejam no trabalho escolar, dentro e fora dos seus muros. Levantadas as características do trabalho pedagógico, se pensa nas mudanças possíveis; a progressão continuada e os ciclos são exemplos de formas de se organizar a estrutura escolar que vem no sentido de reconstruir a prática, relacionadas às questões da redução da evasão por repetência, o respeito ao tempo de cada estudante quanto à aprendizagem. A transformação da realidade escolar é um caminho árduo, mas experiências concretas mostram que é possível. Palavras-chave: Avaliação escolar, ciclos, organização do trabalho pedagógico, reformas educativas.

A AVALIAÇÃO ESCOLAR O compromisso fundamental da avaliação escolar é a melhoria do ensino e a garantia da aquisição de aprendizagem; cumpre-lhe o papel de analisar e propor as revisões e encaminhamentos necessários no ensino para que os objetivos préestabelecidos sejam atingidos (HOFFMANN, 1992; RAPHAEL, 1995; CHUEIRI, 2008). Isso significa dizer que o processo de avaliação na escola prevê verificar se os

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objetivos estão ou não sendo alcançados descrevendo como, por que e de que tipo são as dificuldades e facilidades dos alunos. Diversos autores têm desenvolvido trabalhos que exploram como a prática avaliativa se instaura em nossas escolas públicas, como Sousa (1991) que mostra a prática avaliativa de duas escolas públicas paulistas, onde a avaliação é tomada como instrumento mantenedor da disciplina e do silêncio, classifica e exclui os menos aptos, além de demonstrar a hierarquia latente na escola e, na sociedade. Bertagna (1997), ao analisar a visão de alunos de 4ª e 5ª séries do 1º grau3 sobre a avaliação, demonstra uma avaliação intimamente atrelada aos instrumentos/procedimentos de avaliação e à atitude/comportamento apresentado pelos alunos. Não se percebe na prática dos professores ou na fala dos alunos preocupação com relação a diagnosticar as dificuldades dos alunos para reformular/repensar a prática pedagógica auxiliando os alunos na aquisição do conhecimento. Freitas (2003, p. 59, grifos do autor) formula uma lista dos problemas referentes à escola capitalista, entre eles o papel da avaliação, onde ele diz que ―é possível que a categoria mais decisiva para assegurar a função social que a escola tem na sociedade capitalista seja a da avaliação‖. A avaliação e os objetivos da escola são categorias estreitamente interligadas. A avaliação é a guardiã dos objetivos. Os objetivos em parte estão diluídos, ocultos, mas a avaliação é sistemática (mesmo quando informal) e age em estreita relação com os objetivos. A partir disso podemos nos questionar quais são os reais objetivos da escola e, consequentemente da sociedade em que esta escola esta inserida Ainda, segundo Freitas (2003), o conceito de avaliação extrapola a dimensão da sala de aula, ou, avaliação como uma etapa da metodologia de ensino, podemos notar as implicações sociais e didáticas em nível escolar e fora dele. [...] no cotidiano da escola os objetivos estão expressos nas práticas de avaliação. Na avaliação estão concentradas importantes relações de poder que modulam a categoria conteúdo/método. Ou seja, os objetivos da escola como um todo (sua função social) determinam o conteúdo/forma da escola. No plano didático essa ação se repete e, à sua vez, sedia relações de poder que são vitais não só para o trabalho pedagógico na sala de aula, mas para a sustentação da organização do trabalho pedagógico da escola em geral – seja pela via disciplinar, seja pela via da avaliação do conteúdo escolar, ou das atitudes e dos valores. Deve-se considerar que os objetivos de que falamos não são apenas os explícitos, mas incluem os objetivos ‗ocultos‘ da escola

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Referente ao Ensino Fundamental de oito anos de duração, atualmente expandido para nove anos de duração.

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III Seminário Internacional de Gestão Educacional interiorizados a mando do sistema social que a cerca. (FREITAS, 2003, p. 59)

A ORGANIZAÇÃO DA ESCOLA É função da escola garantir o aprendizado dos alunos. Para que isso aconteça, é necessária uma ação docente, uma ação didática – o ensino – a fim de assegurar a efetiva aprendizagem dos alunos. Porém, a relação ensino-aprendizagem não é direta, unidirecional; nesse processo, segundo Goulart (2001): - O ensino é a ação do professor, é utilizar ferramentas que proporcionem ao aluno a vontade de aprender, o questionamento sobre as coisas, ativar conjuntamente saberes adquiridos e inatos. É, portanto uma atitude de mediação pela qual são providas as condições e os meios para os alunos tornarem-se sujeitos ativos na assimilação de conhecimentos. - A aprendizagem é o processo de assimilação de determinados conhecimentos e modos de ação física e mental. É uma relação cognitiva entre o sujeito e os objetivos de conhecimento. A relação ensino-aprendizagem não é mecânica, não podemos considerar que é uma simples transmissão do professor que ensina para um aluno que aprende. A aprendizagem é particular de cada pessoa, é rítmica e processual. Se tivermos numa sala de aula um professor que ensina determinado conteúdo, têm alunos que aprenderão, outros que aprenderão outra coisa e, muitas outras variáveis possíveis dentro desse processo (PERRENOUD, 2004). E nessa dinâmica, como pode o professor estruturar seu plano de ensino para atingir cada diferente estudante? No trabalho de Martins (apud Freitas 2003) são destacadas premissas importantes que norteiam uma nova lógica para o trabalho pedagógico: [...] é preciso romper com o eixo de transmissão-assimilação (que se caracteriza pela separação entre teoria e prática), em que se distribui um saber sistemático falando sobre ele. Não se trata de falar sobre, mas de se vivenciar e refletir com. Esta é uma característica fundamental da metodologia implementada. [...] No fazer, gera-se o saber. Para obter uma mudança substantiva no processo de ensino – objeto de estudo da didática – não basta mudar o discurso sobre ele; é preciso alterar o processo na prática, de modo que os agentes (futuros professores) vivenciem esse novo processo, reflitam sobre ele e o sistematizem coletivamente (Martins apud Freitas 2003, p. 55)

Além disso, Martins (apud Freitas 2003, p. 55) utiliza uma metodologia de trabalho constituída por quatro momentos: 1. Primeiro momento: descrição da prática no nível empírico;

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2. Segundo momento: a procura de um referencial teórico para explicar a prática; 3. Terceiro momento: a compreensão da prática pedagógica no nível da totalidade; 4. Quarto momento: elaboração de propostas alternativas. Esses momentos descritos pela autora apontam como caminho para a organização do trabalho na escola, sendo que essa forma de caminhar aponta para a desconstrução da idéia de transmissão-assimilação de conteúdos, onde o professor é a figura centralizadora e detentora dos conhecimentos para um professor estimulador e arquiteto de situações-problema junto dos estudantes. Para justificar a desconstrução do eixo transmissão-assimilação de conteúdos, Freitas (2009) explicita a lógica da escola da seguinte maneira: Historicamente, a escola se distanciou da vida, e a compreensão disso é fundamental para se compreender a avaliação na escola. Esse afastamento foi ditado por uma necessidade do capitalismo de uma escola para preparar rapidamente, e em série, recursos humanos para alimentar a produção de forma hierarquizada e fragmentada [...]. Esse afastamento da vida real levou aos processos de aprendizagem artificiais necessários para facilitar a aceleração dos tempos de preparação dos alunos. Ensinar de uma maneira tradicional – verbal e por série – é mais rápido do que por métodos ativos que exijam a participação do aluno [...]. As necessidades de preparação de mão de obra no capitalismo fizeram com que a escola tratasse o conhecimento como algo partido em disciplinas, distribuído por anos e os anos foram subdivididos em partes menores para controlar certa velocidade de aprendizagem do conhecimento [...] (FREITAS, 2009, p. 26)

Pensando na tradição histórica da instituição escolar e sua conseqüente relação com a sociedade da qual origina – capitalista; Freitas analisa e critica a organização do trabalho pedagógico na sociedade capitalista, onde nota-se claramente um ―afastamento da vida‖ no cotidiano escolar, um ―preparar-se para a vida lá fora‖, como se a escola apenas fosse uma entidade de treinamento para viver no mundo. Freitas (2009) propõe ainda que: [...] é fundamental alterar o poder inserido nos tempos e espaços da escola, formando para a autonomia, favorecendo a auto-organização dos estudantes. Isso significa criar coletivos escolares nos quais os estudantes tenham identidade, voz e voto. Significa fazer da escola um tempo de vida, e não de preparação para a vida. Significa permitir que os estudantes construam a vida escolar. (p. 60, grifos nossos)

PENSANDO NA MUDANÇA: A PROGRESSÃO CONTINUADA E OS CICLOS 22 Grupo de Estudo e Pesquisas em Política Educacional, Rio Claro, 06, 07 e 08 de julho de 2011 Vol. 3 (2011)

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Para reduzir os índices de evasão, muitos municípios e estados buscaram nas teorias pedagógicas do ensino em ciclos e na progressão continuada, uma forma de solucionar o problema, uma vez que muitos trabalhos de pesquisa apontavam para o problema da reprovação escolar ao final de cada série. Na Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional – LDB é facultativo a escolha da organização do sistema escolar, sendo assim, de livre escolha pela escola adotá-los ou não. Art.23. A educação básica poderá organizar-se em séries anuais, períodos semestrais, ciclos, alternância regular de períodos de estudos, grupos nãoseriados, com base na idade, na competência e em outros critérios, ou por forma diversa de organização, sempre que o interesse do processo de aprendizagem assim o recomendar. (LDB N° 9.394/96) Art. 32. § 2° Os estabelecimentos que utilizam progressão regular por série podem adotar no ensino fundamental o regime de progressão continuada, sem prejuízo da avaliação do processo de ensino-aprendizagem, observadas as normas do respectivo sistema de ensino. (LDB Lei 9394/96)

Com essa abertura, construíram-se propostas com a pretensão de assegurar a permanência dos alunos na escola uma educação de qualidade, um dessas propostas foi a progressão continuada. Para Neves & Boruchovitch (2004), a progressão continuada Propõe efetuar o trabalho escolar independente de notas. Mais precisamente, isto equivale a dizer que desaparecem os tradicionais boletins e as notas bimestrais, ficando apenas a avaliação formativa no interior da sala de aula com os pareceres descritivos no final de cada bimestre, sem notas ou conceitos (p.77)

A idéia de progressão continuada está ligada às premissas do desenvolvimento individual de cada pessoa e isso tem seu tempo especifico e particular. De acordo com Bertagna (2003, p.79-81), a progressão continuada no Estado de São Paulo foi adotada porque extrapola a compreensão da aprovação automática e contempla o aspecto pedagógico de que toda criança é capaz de aprender. Cada qual tem o direito de se desenvolver no seu ritmo natural e a escola deve garantir a aprendizagem do aluno. Segundo a mesma autora, os textos oficiais da Secretaria do Estado de São Paulo, apontavam a seguintes concepções: [...] diferenciam progressão continuada de promoção automática da seguinte forma: na primeira, a escola age no sentido de fazer o aluno se apropriar de novas formas de pensar, sentir e agir, enquanto na segunda, a criança permanece na escola, independente de progressos terem sido alcançados. (BERTAGNA 2003, p.81)

Mas, infelizmente, no desenvolvimento da pesquisa, a autora demonstrou que na realidade o regime de progressão continuada do Estado de São Paulo não assegurou a concepção emancipadora de progressão continuada como definida acima. Na prática, o 23 Grupo de Estudo e Pesquisas em Política Educacional, Rio Claro, 06, 07 e 08 de julho de 2011 Vol. 3 (2011)

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que ficou mais evidente na proposta foi a chamada ―promoção automática‖, ou seja, indiferente do nível que cada estudante se encontrava ao final do ano letivo, ele não era reprovado e seguia junto com os demais estudantes da sua turma. . Se a idéia de respeitar o tempo de cada estudante é vista com a não-retenção anual, de que forma é dada a oportunidade para que esses se apropriem de conteúdos anteriores se, quando mudam de ano novos conteúdos serão abordados? Em que momento o educando tem a oportunidade de ―aprender a seu tempo‖? Várias experiências foram construídas em diferentes estados do país, utilizandose da concepção de progressão continuada (ritmo de aprendizagem, desenvolvimento pessoal, etc.) e com uma nova organização do trabalho pedagógico (desseriação, trabalho por projetos, etc.), implicando na transformação dos tempos e espaços da escola, e desta forma, introduziu-se a concepção dos chamados ciclos de aprendizagem, ciclos de formação ou apenas ciclos que, ―incorporam a concepção da formação global do sujeito, partindo do pressuposto da diversidade e dos ritmos diferenciados no processo educativo, criando espaços de experiências variadas para dar oportunidade de construção da autonomia e da produção de conhecimentos sobre a realidade‖ (FREITAS, 2009, p.53). Baseadas nessas concepções, outras experiências que procuram uma forma de organização escolar têm sido constituídas, como é o caso da Escola da Ponte – escola portuguesa fundada a mais de 30 anos pelo educador José Pacheco. Marchelli, Dias & Schmidt (2008), caracterizam-na como: [...] uma escola em que não há divisão por séries e as aulas não são separadas por disciplinas. Com a ajuda do professor, os alunos selecionam seus projetos de estudo e são eles também que indicam quando se sentem preparados para serem avaliados, fugindo ao padrão de provas agendadas. (p. 285)

E ainda, segundo esses autores, a filosofia de escola, uma ―escola aberta‖ pautada no sistema de ciclos, vive em seu cotidiano uma prática real e consistente de grandes ideais da concepção de educação, como demonstra Rubens Alves (2001), ao visitar a Escola da Ponte: [...] um único espaço, partilhado por todos, sem separação por turmas, sem campainhas anunciando o fim de uma disciplina e o início de outra. A lição social: todos partilhamos de um mesmo mundo. Pequenos e grandes são companheiros numa mesma aventura. Todos se ajudam. Não há competição. Há cooperação. Ao ritmo da vida: os saberes não seguem programas. É preciso ouvir os ―miúdos‖, para saber o que eles sentem e pensam. É preciso ouvir os ―graúdos‖, para saber o que eles sentem e pensam. São as crianças que estabelecem as regras da convivência: a necessidade do silêncio, do trabalho não perturbado, de se ouvir música enquanto trabalham. São as

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III Seminário Internacional de Gestão Educacional crianças que estabelecem os mecanismos para lidar com aqueles que se recusam a obedecer às regras. Pois o espaço da escola tem de ser como o espaço do jogo: o jogo para ser divertido e fazer sentido, tem de ter regras. [...] A vida social depende de que cada um abra mão da sua vontade, naquilo em que ela se choca com a vontade coletiva. E assim vão as crianças aprendendo as regras da convivência democrática, sem que elas constem de um programa. (p. 67-68)

EXPERIÊNCIAS BRASILEIRAS No Brasil, outras propostas foram constituídas como o projeto mineiro da Escola Plural, onde podemos encontrar o aspecto ‗organização do trabalho pedagógico em ciclos‘ como um dos pilares dessa proposta de estruturação da escola assim como na Escola da Ponte. Castro (2000) descreve o projeto da Escola Plural como: [...] um novo projeto que altera radicalmente a organização do trabalho escolar com rompimento de estruturas excludentes, discriminatórias e hierarquizadas no ensino fundamental de 1ª a 8ª séries, inaugurando os ciclos de formação por idade. Propõe a instituição de novos tempos e espaços escolares, tanto para os professores quanto para os alunos. Rompe com os processos tradicionais e tecnicistas de ensino que se baseiam na concepção cumulativa e transmissiva de conhecimentos. Alterando a relação com os processos de construção de conhecimentos busca novos significados para o conteúdo escolar, numa perspectiva globalizadora de formação integral do aluno. Elimina os mecanismos de reprovação, próprios da concepção seletiva e excludente da avaliação escolar e preconiza uma concepção de avaliação com participação ativa das aprendizes no processo avaliativo. (CASTRO, 2000, p. 31)

Note que a lógica que essas duas experiências (Escola da Ponte e Escola Plural) vivenciam são convergentes. Esse fato é importante para reforçar as concepções teóricas construídas e sempre confrontá-las com as práticas em exercício. A autora continua: [...] buscando, portanto, a construção de uma escola inclusiva, o projeto apresenta como norte, os princípios: construção de uma escola que considera a formação humana na sua totalidade; escola como experiência de produção coletiva; escola capaz de redefinir os aspectos materiais tornando-os formadores; escola capaz de assegurar a vivência de cada idade de formação sem interrupção; escola capaz de garantir a socialização adequada de cada idade; escola capaz de valorizar o processo de construção da identidade de seus profissionais [...] Tendo iniciado diferentes experiências de ensino 4 muitos professores viram, desde o início, no projeto ‗Escola Plural‘, a continuidade e embasamento teórico e institucional dos movimentos de transformação da prática pedagógica como também, um grande desafio: um

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De acordo com a revisão da autora, diversas experiências foram testadas em escolas mineiras desde os anos 70, como por exemplo, o ‗Sistema de Promoção por Avanços Progressivos‘ que objetivava a eliminação da repetência, diminuição dos índices de evasão, etc. (p. 18); ‗Projeto Aceleração de Estudos‘ previa a redução da distorção idade/série, redução da evasão escolar, desenvolvimento de novas metodologias de ensino, etc. (p. 23). Somado a isso, o Congresso Mineiro de Educação, momento que foram discutidos e elaborados diversas medidas de ‗Educação para a Mudança‘, entre elas o ‗Programa de Revitalização das Escolas Normais‘ programa de apoio a formação de professores com maior qualidade (p. 25); ‗Ciclo básico de Alfabetização‘ eliminação da seriação nos anos iniciais de escola (p. 26); ‗Eleição de Diretores‘ democratização da gestão escolar (p. 27); e a ‗Escola Plural‘ implantada em 1995 (p. 30).

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III Seminário Internacional de Gestão Educacional alvo de luta concreta para a construção, no processo de ensino, de uma nova lógica educativa que mudava totalmente as estruturas reguladoras do ensino básico fundamental. (CASTRO,2000, p. 31)

Além do projeto da Escola Plural em Minas Gerais, uma escola do Bairro Butantã, no município de São Paulo-SP, a EMEF Desembargador Amorim Lima desenvolve um projeto pedagógico diferenciado para a escola com a ajuda dos pais, professores, direção e pesquisadores universitários no intuito de transformar a realidade pela qual a escola passava ao final dos anos 90, que refletia em altos índices de evasão, violência, falta de professores e outros motivos que fizeram com que a direção envolvesse os pais na participação da rotina diária da escola de seus filhos. Inicia-se, assim, uma parceria que renderia frutos, pois, cientes da situação da escola, toda a comunidade passou a trabalhar em torno de idéias e ideais para transformar aquela realidade (MARCHELLI, DIAS & SCHMIDT, 2008; SABBA, 2010). Muitas mudanças foram introduzidas, segundo Mariana (2010): As transformações no dia-a-dia da escola foram diversas, porém o estímulo ao autodidatismo representa importante inovação nas metodologias desencadeadas pelo projeto. A substituição das aulas expositivas por trabalhos de pesquisa realizados pelos alunos, por exemplo, almeja o objetivo de alcançar níveis cada vez mais elevados de autonomia. Os trabalhos de pesquisa são realizados em diversos grupos de cinco alunos que, orientados por um tutor, realizam as atividades propostas nos Roteiros Temáticos de Pesquisa. Os Roteiros Temáticos de Pesquisa são roteiros de estudo articulados em torno de temas centrais e respectivos sub-temas, procurando abarcar as bases fundamentais dos Parâmetros Curriculares Nacionais. Ocasionalmente, aulas expositivas podem colaborar para elucidar algumas temáticas desses roteiros. (p.6)

A EMEF Desembargador Amorim Lima é organizada no sistema de ciclos de aprendizagem. Seu projeto político pedagógico é fundamentado pelo compromisso coletivo, onde todos os seus agentes se encorajem num processo de aprimoramento cultural e pessoal coletivo, de forma integral, na construção de uma intencionalidade educativa compartilhada e assumida por todos, intencionalidade essa, calcada nos valores da autonomia, solidariedade, democracia e responsabilidade. Essas experiências iniciaram-se a partir do ―descontentamento‖ com a realidade vigente, com o incomodo de viver o tempo e o espaço escolar de forma tão vazia e distante. Porém, para promover a mudança, muito trabalho foi empregado. Dalben (2000) aponta alguns caminhos para a construção de uma escola organizada por ciclos: A lógica dos ciclos de formação altera bastante o olhar pedagógico do professor sobre a sala de aula. O aluno como um ser sócio-cultural será o centro da nova lógica de organização e priorizado como um sujeito portador

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III Seminário Internacional de Gestão Educacional de conhecimentos construídos ao longo de sua vida. Esta questão, aparentemente óbvia, exige que novos aspectos do processo de ensino sejam considerados. [...] dois princípios básicos: - o ser humano passa por fases de desenvolvimento e, no decorrer destas fases, passa por experiências de vida e desenvolvem-se segundo as suas possibilidades fisiológicas e psicológicas. - o ser humano ao estar no mundo participa da vida, estabelecendo relações com o meio, isto é, mediante suas experiências e nessas relações aprende sobre si e sobre a vida. São estas vivências que lhe oferecerão um referencial de idéias, valores e habilidades para viver e refletir no/sobre o mundo. É, nesse sentido, um sujeito de conhecimento. (DALBEN, 2000, p. 57-58)

POSSIBILIDADES PARA A COMPREENSÃO E TRANSFORMAÇÃO DA REALIDADE ESCOLAR. Sem dúvidas que a mudança não é algo simples e fácil de acontecer, é um processo, ou seja, envolve a conscientização e a discussão com todos os envolvidos. Para Freitas (2009): [...] os ciclos merecem ser apoiados pelo simples fato de contrariar a lógica da seriação e da sua avaliação [...]. Eles não eliminam a avaliação formal e muito menos a informal [...]. As possibilidades de maior sucesso dependem de políticas públicas e das concepções de educação que estão na base dos ciclos. (p. 51)

Como aponta João (2000), ao comentar sobre o processo de construção da Escola Plural: É natural que qualquer inovação seja percebida, em um primeiro momento, como uma utopia, uma engenhoca, um sonho tecnocrata, um carregar água no balaio ou qualquer outra qualificação menos elogiosa. [...] é nesse momento que começa o verdadeiro trabalho de inovação. E ela continua ―na escola, as resistências às inovações são expressas das mais variadas formas, por meio de reações veladas ou explícitas, e quase nunca se percebe a indiferença dos educadores, dos pais ou da comunidade, fato esse que pode ser considerado como positivo. Se as pessoas não são indiferentes, certamente acontecerá a discussão do assunto. (JOÃO, 2000, p. 48)

João (2000, p. 50) pontua também a importância de se avaliar os resultados das inovações implantadas, dos aspectos que precisam ser reformulados ou reorientados. Ela diz que: [...] os resultados tanto positivos quanto negativos devem constituir-se em elementos norteadores na consolidação de uma proposta que, em um determinado momento, foi considerada inovadora e, posteriormente, sem que se percebesse nitidamente um hiato entre os dois momentos, passos a ser uma prática que ganhou um ‗glamour‘ especial porque já começou a se tornar usual e apresentar bons resultados. As dúvidas e os erros assumidos, explicitados e discutidos poderão realimentar a caminhada na busca do aprofundamento para sustentar o restante do percurso necessário à solidificação da proposta. (JOÃO, 2000, p. 48)

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A idéia de ciclos nos leva à formação de uma escola mais democrática, que ensina para a vida e é vida também. Com toda certeza, não é o único modelo de escola que nos ajuda a praticar uma escola cidadã e formativa, porém é uma possibilidade a partir da realidade existente. Portanto, é importante entender e refletir sobre a forma de organização escolar em ciclos, pois esse modelo pode ser uma possibilidade para a construção de práticas transformadoras da realidade escolar, ou seja, possíveis alterações na organização do trabalho escolar. O destaque dado à temática ‗avaliação escolar‘ deve-se ao fato de que por meio desse processo, na grande maioria das escolas, revelam-se as contradições da prática pedagógica; e associado a outras formas de organização escolar – ciclos , por exemplo, possibilite-nos pensar em novas formas de romper com as velhas formas de avaliação sinalizando para outras possibilidades na prática avaliativa e pedagógica, bem como a função da escola em nossa sociedade.

REFERÊNCIAS

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GESTÃO DA EDUCAÇÃO NO CONTEXTO DAS POLÍTICAS PÚBLICAS EDUCACIONAIS

Silvio César Nunes Militão [email protected] FCT/UNESP - Presidente Prudente

Resumo: Este trabalho, em desenvolvimento, teve como objetivo analisar a gestão da educação brasileira no bojo do contexto sócio, político e econômico contemporâneo. Para tanto, valeu-se de levantamento e análise bibliográfica. Os resultados parciais demonstram o redirecionamento que as políticas públicas educacionais, notadamente a gestão da educação, sofreram a partir de 1990 por força da hegemonia/pressupostos do neoliberalismo e da reforma do Estado. Evidenciou-se que, contraditoriamente, tanto a gestão educacional quanto a escolar – dimensões interdependentes da gestão da educação – passaram a ser crescentemente ressignificadas e pautadas pela lógica empresarial, apesar da retórica de participação e autonomia comparecer cada vez mais em textos legais (como a LDB/96) e se fazer presente nas escolas. Palavras-chave: gestão da educação; políticas públicas; neoliberalismo.

A autora Sofia Lerche Vieira (2006) diferencia com precisão duas dimensões da gestão da educação – a educacional e a escolar –, que passaram a ocupar lugar de destaque nas políticas públicas educacionais, particularmente a partir da segunda metade da década de 1990. Para a autora supracitada, a gestão educacional refere-se às iniciativas desenvolvidas no âmbito dos sistemas de ensino. Ela situa-se na esfera macro e sua razão de ser é a escola e o trabalho que nela se realiza. A gestão escolar, por sua vez, situa-se no plano da escola e trata de atribuições sob sua esfera de abrangência. Ela situa-se na esfera micro. A gestão escolar orienta-se para assegurar aquilo que é próprio de sua finalidade (promover o ensino e a aprendizagem), viabilizando a educação como um direito de todos. A gestão educacional e a escolar, apesar das especificidades, se articulam mutuamente, dado que a primeira justifica-se a partir da segunda (VIEIRA, 2006). 30 Grupo de Estudo e Pesquisas em Política Educacional, Rio Claro, 06, 07 e 08 de julho de 2011 Vol. 3 (2011)

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A compreensão de ambas nos remete à necessidade de uma abordagem prévia do contexto sócio, político e econômico que caracteriza o mundo contemporâneo, marcadamente neoliberal, que deu novos contornos à relação entre Estado e políticas públicas e, particularmente, as educacionais, redirecionando-as (MAIA, 2008; MEDEIROS; LUCE, 2006; MELLO, 2004; VIEIRA, 2004). Torna-se, portanto, fundamental compreender o ideário que se convencionou denominar de neoliberal e se tornou hegemônico nos anos 1990, propugnando a reforma do Estado – e da educação – em nível planetário (OLIVEIRA, 1999; SILVA JUNIOR; FERRETI, 2004). O ideário neoliberal, surgido logo após o final da Segunda Guerra Mundial como uma reação teórica e política ao nascente Estado de Bem-Estar Social (aquele que, ancorado na teoria keynesiana, favorece tanto o processo de acumulação capitalista quanto garante aos cidadãos direitos sociais fundamentais, como saúde e educação), luta contra a intervenção estatal nos planos econômico e social e postula a liberação total do mercado (ANDERSON; 1996; MORAES, 2002). Endeusando as virtudes do mercado e satanizando o papel/atuação do Estado (planejador/administrador/controlador) da economia de mercado; produtor direto de bens prestador de serviços; promotor das políticas públicas de corte social), o ideário em questão advoga uma reforma/enxugamento deste modelo de Estado, pautando-se, sobretudo, na desregulamentação das atividades econômicas, num amplo processo de privatização e na supressão de direitos/benefícios sociais (MORAES, 2002; OLIVEIRA, 1999). Na precisa síntese de Frigotto (1995), a ideia força balizadora do neoliberalismo é a de que o setor público (o Estado) é responsável pela crise, pela ineficiência, pelo privilégio, e que o mercado e o privado são sinônimo de eficiência, qualidade e equidade. Desta ideia chave advém a tese do ―Estado mínimo‖ e da necessidade de zerar todas as conquistas sociais, como o direito à saúde, educação etc. Tudo isso passa a ser comprado e regido pela férrea lógica das leis do mercado. Com o esgotamento do Estado de Bem-Estar Social, que assumiu a hegemonia ideológica da sociedade capitalista da segunda Guerra Mundial até a década de 1970, o neoliberalismo sai, então, de seu estado de hibernação para dar novo fôlego e solução à crise mundial dos anos 1970, alcançando seu ponto mais alto nos governos de Thatcher (Inglaterra) e Reagan (EUA), os quais promoveram amplas reformas calcadas na 31 Grupo de Estudo e Pesquisas em Política Educacional, Rio Claro, 06, 07 e 08 de julho de 2011 Vol. 3 (2011)

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diminuição do papel do estado, na desregulamentação da economia, privatização e na redução dos gastos públicos nas políticas públicas sociais. Posteriormente, ao longo dos anos 1980 e 1990, o ideário neoliberal protagonizado por Thatcher e Reagan se espalhou pelos quatro cantos planeta, tornandose hegemônico. É importante salientar que na América Latina, especificamente, o Estado de Bem-Estar Social acabou não se consolidando como nos paises centrais do capitalismo. Entretanto, as criticas feitas pelos neoliberais a tal modelo de Estado logo forma mecanicamente transferidas para os países da região em função da eclosão da crise do endividamento dos anos 1980 e da correspondente implementação dos ―programas de ajuste estrutural‖ conduzidos pelo Fundo Monetário Internacional (FMI) e Banco Mundial como estratégia para garantia do pagamento da dívida externa, compostos por medidas especificas, como: disciplina fiscal, privatização, desregulamentação da economia, liberalização comercial, dentre outras. No final da década de 1980, políticos alinhados ao ideário neoliberal chegam à Presidência na América Latina. No Brasil, especificamente, a virada em direção ao neoliberalismo ocorre com a eleição de Fernando Collor (1990-1992), que iniciou a abertura do mercado doméstico aos produtos internacionais e a privatização das empresas estatais. Entretanto, os preceitos neoliberais ganham consistência somente a partir do primeiro governo do Presidente Fernando Henrique Cardoso (1995-1998), que tendeu para ―reordenar a ação do Estado, limitando, quase sempre, seu raio de ação em termos de políticas públicas e sociais‖, nas quais situam-se as políticas educacionais (LIBANEO; OLIVEIRA; TOSCHI, 2003, p. 93). De forte inspiração neoliberal, o governo FHC – questionando a participação ativa do Estado no desenvolvimento da economia brasileira, seja pela criação das empresas estatais seja pelo estabelecimento de condições para o desenvolvimento industrial do país – propõe a reforma do Estado, tendo em vista torná-lo mais enxuto, menos regulador e ausente da participação direta na produção. É por isso que, a partir de meados da década de 1990, ―o país tornou-se o reino das reformas institucionais – a começar pelo Estado e pela educação – bem como da privatização das empresas estatais‖ (SILVA JUNIOR; FERRETI, 2004, p. 29). Tais reformas estão claramente prescritas no Plano Diretor da Reforma do Estado, elaborado pelo Ministério da Administração e Reforma do Estado (MARE) em 32 Grupo de Estudo e Pesquisas em Política Educacional, Rio Claro, 06, 07 e 08 de julho de 2011 Vol. 3 (2011)

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1995, capitaneado por Luis Carlos Bresser Pereira, que advoga a redefinição do papel do Estado brasileiro, seja em suas bases econômicas seja em suas bases sociais. Neste cenário de remodelação do papel do Estado, conforme apontam vários estudiosos da temática, sai de cena, então, o Estado-executor, assumindo em seu lugar o Estado-regulador/avaliador. É neste novo panorama – de um Estado mínimo para prover, mas máximo para regular e gerenciar – que a partir dos anos 1990 são formuladas e implantadas as políticas/reformas educacionais (praticamente homogêneas) nos diferentes países da América Latina, sob forte influência dos organismos internacionais, notadamente do Banco Mundial, com consideráveis desdobramentos para a gestão da educação (MAIA, 2008, OLIVEIRA, 2002; SILVA JUNIOR; FERRETI, 2004). Desde então, a gestão educacional passa a ser permeada pelo binômio centralização/descentralização que na perspectiva dos organismos internacionais de financiamento – arautos do neoliberalismo no campo da educação – constitui o elemento chave para adequar as políticas educacionais ao movimento em curso (macro) de esvaziamento das políticas públicas de corte social, sendo assim constantemente veiculado em seus documentos ―orientadores‖. A literatura da área aponta que, mediante a estratégia de mesclar aspectos de centralização e descentralização na educação, o Estado consegue, simultaneamente, descentralizar as responsabilidades (financimanento, por exemplo), deixando de ser o principal provedor/executor das políticas educacionais, e centralizar o controle sobre as decisões estratégicas (como o currículo e a avaliação), passando a constituir-se numa instância apenas controladora/avaliadora. No caso brasileiro, especificamente,

a análise feita por

importantes

pesquisadores (LUCK, 2006; MAIA, 2008; MARTINS, 2002; MEDEIROS; LUCE, 2006; PERONI, 2006; SILVA JUNIOR; FERRETI, 2004) mostra que a partir de 1995 a política educacional radicalizou o processo de descentralização da educação, implementando medidas como a redefinição do fluxo financeiro (FUNDEF), a transferência de escolas para a esfera municipal, o reforço financeiro das escolas (PDDE) etc. Mas, ao mesmo tempo, o Estado (agora ―avaliador‖) passou a controlar tais ações descentralizadoras por meio de exames nacionais padronizados, que lhe permite a avaliar o desempenho do sistema e que tem por base os Parâmetros Curriculares nacionais – eufemismo de currículo nacional. 33 Grupo de Estudo e Pesquisas em Política Educacional, Rio Claro, 06, 07 e 08 de julho de 2011 Vol. 3 (2011)

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No novo contexto da gestão educacional, fundamentado nas teses neoliberais das leis do mercado, verifica-se a transposição de conceitos das teorias administrativas empresarias para o campo da educação, tais como: eficiência, eficácia, produtividade, excelência, entre outros (OLIVEIRA, 2004; MAIA, 2008; MARTINS, 2002; MELLO, 2004; PERONI, 2006). Assim,

a

literatura

especializada

indica

a

predominância

da

lógica

empresarial/do mercado na gestão educacional no tempo presente, a qual incorpora um ethos competitivo cuja ênfase é posta nos resultados ou produtos dos sistemas educativos. Os autores da área chamam a atenção, também, para a ressignificação de conceitos que ocorre nas reformas educacionais contemporâneas. Algumas das ―bandeiras‖ de luta do movimento de educadores foram apropriadas e empregada nos processos de reforma apresentando, muitas vezes, um grande descompasso entre o significado original e o que passaram a assumir no contexto atual. Nesse sentido, descentralização, participação e autonomia são casos emblemáticos (OLIVEIRA, 2004; PERONI, 2006; SHIROMA; MORAES; EVANGELISTA, 2000). Na avaliação de Peroni (2006, p. 151), ―hoje, quando analisamos, por exemplo, o conceito de participação, percebemos que se trata de um repasse para a sociedade de tarefas que deveriam ser do Estado, o mesmo acontecendo com a descentralização e a autonomia‖. A propósito, no campo da gestão da educação, a autonomia constitui-se em um dos conceitos mais mencionados no contexto das políticas públicas educacionais em curso. Na atual Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional (LDB/96), a autonomia das escolas comparece, inclusive, em artigo específico: ―Os sistemas de ensino assegurarão às unidades escolares públicas de educação básica que os integram progressivos graus de autonomia pedagógica e administrativa e de gestão financeira, observadas as normas gerais de direito financeiro público‖ (art. 15). Inúmeros autores apontam, porém, a existência de uma aparente autonomia, meramente operacional. Como bem explica Dalila de Oliveira (2004, p. 104), a própria

[...] autonomia pedagógica, compreendida como a liberdade de cada escola construir o seu projeto político-pedagógico, tem 34 Grupo de Estudo e Pesquisas em Política Educacional, Rio Claro, 06, 07 e 08 de julho de 2011 Vol. 3 (2011)

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caráter limitado já que, em muitos casos, tais projetos são elaborados de acordo com critérios de produtividade definidos previamente pelos órgãos centrais e garantidos pelos processos de avaliação.

Cleiton

de

Oliveira

(2007,

p.

99)

complementa,

destacando

as

dificuldades/limitações no que tange à efetivação da autonomia administrativa e financeira. Quanto à primeira, o autor mostra que ela é ―extremamente restrita: os funcionários são, em geral, contratados pelos sistemas e enquadrados em disposições comuns para todas as escolas‖. A autonomia financeira, por sua vez,

[...] não vai além da administração de recursos de pouca monta, em geral com rubricas determinadas a priori, encarregando-se os sistemas do estabelecimento de salários e das despesas de grande monta. O máximo que as escolas conseguem é gerir os recursos advindos das promoções da APM (OLIVEIRA, 2007, p. 99).

Como se vê, pouco de autonomia, na prática, resta às escolas, as quais constituem o último receptáculo da cadeia das instâncias de poder público (MAIA, 2008; OLIVEIRA, 2002). A partir das reformas educacionais dos anos 1990, a escola passa a ser entendida como núcleo da gestão (OLIVEIRA, 2004; MACHADO, 2006; VIEIRA, 2004; 2006). Assim, não é por acaso que a LDB/96 vem dispensar – ineditamente – particular atenção à gestão escolar, detalhando suas incumbências no artigo 12. Segundo a LDB/96, a elaboração e execução de uma proposta pedagógica (ou projeto político-pedagógico, como é mais conhecida) é a primeira e principal das atribuições da escola, devendo sua gestão orientar-se para tal finalidade. A proposta pedagógica é o norte da escola, definindo caminhos e rumos que uma determinada comunidade busca para si e para aqueles que se agregam em seu entorno. Cabe à escola gerir seu patrimônio imaterial (pessoas, ideias, cultura produzida no se interior) e material ( prédio, instalações, equipamentos, laboratórios, livros etc. ) (VIEIRA, 2006).

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Para a autora supracitada, além dessas atribuições e acima de qualquer outra dimensão, está a incumbência de zelar pelo que constitui a própria razão de ser da escola – o ensino e a aprendizagem. Assim, tanto lhe cabe velar pelo cumprimento do pano de trabalho de cada docente, como assegurar o cumprimento dos dias letivos e horas-aulas estabelecidos, assim como prover os meios para a recuperação dos alunos de menor rendimento. Outra importante dimensão da gestão escolar é a relação com a comunidade. Assim, cabe à escola articular-se com as famílias e a comunidade, criando processos de integração entre esta e a sociedade e, ao mesmo tempo, informar os pais e responsáveis sobre a freqüência e o rendimento dos alunos, bem como sobre a execução de sua proposta pedagógica (VIEIRA, 2006). Sabe-se que a articulação entre sociedade e escola, quando realizada de forma efetiva, tem sido um fator determinante no sucesso do processo educativo. Deste modo, é positivo que a LDB acene para o fortalecimento da participação dos usuários na gestão escolar. É preciso, entretanto, estar atento para não se confundir participação nas decisões com participação somente na execução/colaboração financeira (PARO, 1997). Tendo em vista que das escolas espera-se, também, uma gestão democrática, a LDB/96 estabeleceu no seu artigo 14 os princípios que devem norteá-la: I – participação dos profissionais da educação na elaboração do projeto pedagógico da escola (algo óbvio demais, ―já que seria um total absurdo imaginar-se que a elaboração‖ de tal projeto ―pudesse dar-se sem a participação dos profissionais da educação‖); II – participação das comunidades escolar e local em conselhos escolares ou equivalentes (reiterando apenas ―o que já vem ocorrendo na maioria das escolas públicas do país‖) (PARO, 2007, p. 74). Na avaliação do autor supracitado, ao renunciar a uma regulamentação mais precisa do principio constitucional da gestão democrática, a LDB/96 deixa à iniciativa de Estados e municípios a decisão de importantes aspectos da gestão, como a própria escolha dos dirigentes escolares. A propósito, a escolha do diretor pela via da eleição direta e com a participação da comunidade tem sido apontada por numero considerável de pesquisadores (LIBÂNEO, 2008; LIBÂNEO; OLIVEIRA; TOSCHI, 2003; LUCK, 2006; MELLO, 2004; PARO, 1997; 2007) como a forma mais identificada com a democratização da 36 Grupo de Estudo e Pesquisas em Política Educacional, Rio Claro, 06, 07 e 08 de julho de 2011 Vol. 3 (2011)

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educação e da escola. Cabe lembrar, todavia, que tais pesquisadores já sabem também que a eleição do diretor, por si só, não garante a pretendida democratização. Embora o princípio da gestão democrática do ensino público tenha sido consagrado – ineditamente – pela Constituição Federal de 1988 (art. 206, inciso VI) , sendo ratificado também pela LDB/96 (art. 3º, inciso VIII e (pouco) detalhado no art. 14), o modelo de gestão escolar que ainda predomina em boa parte das escolas públicas brasileiras é o técnico-científico – ou burocrático (LIBÂNEO; OLIVEIRA; TOSCHI, 2003; LUCK, 2006; PARO, 1995; 1997; SANTOS, 2002). No modelo em questão, a organização escolar é tomada como uma realidade objetiva, neutra, técnica, que funciona racionalmente e, por isso, pode ser planejada, organizada e controlada, a fim de alcançar maiores índices de eficácia e eficiência (LIBÂNEO; OLIVEIRA; TOSCHI, 2003). O modelo técnico científico de gestão escolar baseia-se na hierarquia de funções, centralização das decisões, nas regras e nos procedimentos administrativos, dando mais ênfase nas tarefas do que nas pessoas. Trata-se de um modelo que valoriza o poder e a autoridade (exercidos unilateralmente) e enfatiza relações de subordinação, retirando (ou diminuindo nelas) a faculdade de pensar e decidir sobre seu trabalho. As escolas que operam com o modelo técnico-científico de gestão escolar, via de regra, apresentam: decisões centralizadas no diretor (único responsável pelo êxito das ações do grupo sob seu comando), baixo grau de participação das pessoas (professores, alunos, funcionários, pais), falta de espírito de equipe, ausência de trabalho coletivo etc.). Em contraposição ao modelo descrito anteriormente, temos a concepção democrático-participativa de gestão escolar, apontada pelos pesquisadores e estudiosos do tema como a mais profícua para assegurar o bom funcionamento da escola e da sala de aula, tendo em vista a aprendizagem dos alunos, bem como para democratizar a educação e a escola. A concepção democrático-participativa parte do pressuposto de que a escola não é uma estrutura totalmente objetiva, neutra e independente das pessoas. Ao contrário, ela depende muito das experiências subjetivas das pessoas e de suas interações sociais, tendo em vista que é uma construção social levada a efeito pelos professores, alunos, pais, funcionários e integrantes da comunidade. Portanto, defende a necessidade de se

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enfatizar tanto as tarefas quanto as relações humanas para atingir com êxito os objetivos da escola (LIBÂNEO; OLIVEIRA; TOSCHI, 2003). A participação, o dialogo, a discussão coletiva são características inerentes à concepção democrático-participativa, a qual se baseia numa forma coletiva de gestão em que as decisões são tomadas por todos e não por um. Há de se considerar, contudo, que a gestão democrático-participativa não significa ausência de responsabilidades e de direção. Assim, uma vez tomadas as decisões coletivamente, participativamente, é preciso que cada membro da equipe assuma sua parte no trabalho e que haja, também, uma ação coordenada e controlada por parte da direção para operacionalização das deliberações. É o que Libâneo, Oliveira e Toschi (2003) chamam de ―gestão da participação‖. É por isso que a concepção democrático-participativa também: Valoriza os elementos internos do processo organizacional – o planejamento, a organização, a direção, a avaliação – uma vez que não basta a tomada de decisões, mas é preciso que elas sejam postas em pratica para prover as melhores condições de viabilização do processo de ensino/aprendizagem (LIBÂNEO; OLIVEIRA; TOSCHI, 2003, p. 326). A gestão democrática da educação, imperativo constitucional e um dos temas mais discutidos ente os educadores no plano da gestão escolar, permanece ainda como importante desafio na operacionalização das políticas de educação e no cotidiano da escola. Ancorando-se em Vieira (2006), podemos depreender de todo o exposto que muito pode, precisa e deve ser feito no sentido de aproximar as duas dimensões da gestão da educação ora examinadas (a educacional e a escolar) uma vez que a finalidade última de ambas tem um norte comum: promover a educação de qualidade para todos, conforme preceituam a Constituição Federal de 1988 e a LDB/96, mesmo em tempos sombrios para as políticas públicas educacionais.

REFERÊNCIAS

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A AVALIAÇÃO FORMATIVA NO CONTEXTO DO REFERENCIAL CURRICULAR NACIONAL PARA A EDUCAÇÃO INFANTIL (RCNS): UMA REDEFINIÇÃO DA ORGANIZAÇÃO DO TRABALHO NA ESCOLA DA PRIMEIRA INFÂNCIA.

GISELE GELMI [email protected] Programa de pós-graduação em Educação – UNESP/Marília . Resumo: O artigo apresenta uma sucinta contextualização histórica das concepções de avaliação, tendo como referencial de análise alguns autores. Em seguida, analisa a avaliação formativa e suas implicações pedagógicas nos diferentes eixos de ensino elencados pelo Referencial Curricular Nacional para a Educação Infantil de 1998 (RCNs). Faz uma breve análise dos Indicadores e Parâmetros de Qualidade para a Educação Infantil de 2009 e suas implicações na avaliação e na redefinição da organização do trabalho na escola, delineando possibilidades para uma avaliação de qualidade neste nível de ensino. Palavras-chave: Avaliação Formativa. Educação Infantil. Políticas para a Infância.

INTRODUÇÃO

Neste artigo levanta-se uma discussão acerca da avaliação formativa defendida pelo Referencial Curricular Nacional para a Educação Infantil de 1998 (RCNs) no contexto de diferentes linguagens elencadas pelo mesmo. Inicialmente fizemos uma contextualização histórica das concepções de avaliação, tendo como referencial de análise alguns autores, em seguida discute-se a avaliação no Referencial e nos Indicadores e Parâmetros de Qualidade para a Educação Infantil de 2009, examinando a relevância da organização do trabalho na escola para a eficácia ou não do atual modelo de avaliação trazido pelos documentos oficiais para este nível de ensino, que pressupõe um fazer pedagógico que permeie a observação diária dos pequenos e o constante diálogo coletivo que implica na redefinição da organização escolar e do ato de avaliar. Tem por objetivo analisar os aspectos essenciais da avaliação formativa trazida pelo Referencial que podem subsidiar a organização do trabalho na escola e a elaboração de 41 Grupo de Estudo e Pesquisas em Política Educacional, Rio Claro, 06, 07 e 08 de julho de 2011 Vol. 3 (2011)

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uma proposta que se paute no pensar sobre: O quê? Quando? Como? E por quê? Avaliar na educação infantil.

1 CONTEXTO HISTÓRICO DA AVALIAÇÃO FORMATIVA

O processo de avaliação se destaca ao longo do século XX e atravessa uma constante evolução conceitual, como ressalta Penna (1997, p. 107): nas décadas de 1920 a 1930 a ênfase recai na avaliação com enfoque técnico, em que o avaliador preocupase apenas com a mensuração, sendo indispensável à utilização de testes e exames; a partir de 1930 a 1940, desenvolve-se a avaliação com papel descritivo com base na expressão ―avaliação educacional‖ dada por Tyler5, em que permeia o enfoque técnico, mas o avaliador procura descrever padrões e critérios no sentido de estabelecer o que é sucesso ou dificuldade de acordo com os objetivos propostos. Nos anos 60 até final dos 80, como os objetivos, na maioria das vezes, não eram claros e visíveis, vislumbrou-se a necessidade de que a avaliação precisava ocorrer antes do final do processo de ensino e aprendizagem para que houvesse se necessário, uma correção no processo, assim, além de medir e descrever era preciso julgar, preocupandose com o mérito e a relevância essenciais ao juízo de valor, construção que resultou numa avaliação centrada no julgamento, dada pelos estudos crescentes na área da psicologia e da sociologia. (PENNA, 1997, p. 108) Penna (1997, p. 109-110) esclarece que no final dos anos 80 e início dos anos 90, conflitos de posições entre avaliador e avaliado, dificuldade de consenso por causa dos diferentes valores e o uso de modelos da área de exatas (aspectos quantitativos) resultaram no conceito de Avaliação com caráter de negociação, com fundamento no construtivismo; nesta há a busca do consenso e o desenvolvimento de um processo interativo e dialógico entre avaliador e avaliado, nesta, o avaliador tem o papel de ―comunicador‖ e todos os recursos desenvolvidos em conceitos avaliativos anteriores são aproveitados, captando também, aspectos humanos, políticos, sociais, culturais e éticos envolvidos no processo (aspectos qualitativos).

5

Ralph Tyler, americano com idéias bem difundidas no Brasil. Chamado de ―pai da avaliação‖, embora chineses e filósofos gregos já tivessem desenvolvido alguma forma de avaliação. (PENNA, 1997, p. 108)

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Em virtude dos avanços ocorridos nos processos de avaliação, principalmente entre finais dos anos 60 e 70 em diante, de acordo com Prado de Souza (1998, p. 163) verificou-se que a avaliação não deveria ser apenas somativa, ou seja, com interesses voltados à análise de resultados do tipo sim/não, passa/não passa, mas deveria ser também formativa6, pois dessa maneira, permite intervir nas ações de ensino e aprendizagem com o curso desse processo ainda em desenvolvimento. Em consonância com os contextos e as evoluções históricas por hora apresentados, atualmente, destaca-se: É preciso conhecer o processo natural de nossas crianças, de nossos jovens, de nossos educadores e de nossas instituições e trabalhar na direção da compreensão e da autenticidade. Falo, portanto, de uma avaliação que vai respondendo, na medida em que vai esculpindo e trabalhando seu objeto de atenção. O avaliador [...] deve ser aquilatado pelo que se aprende dele e, se ele não ensina e não compartilha, melhor será que não avalie. Por outro lado, e reciprocamente, o educador deve ser um avaliador [...] e o que conta [...] é o entendimento, é a sensibilidade e a criatividade de cada avaliador. (PENNA, 1997, p. 112-113) Isto, não significa afirmar que basta uma boa avaliação para desaparecer as dificuldades, pois os alunos apresentam dificuldades de acordo com suas peculiaridades pessoais, desse modo, a avaliação deve servir para nos dar indícios das necessidades do avaliado e coerentemente, procurar soluções para saná-las.

2 A CONCEPÇÃO DE AVALIAÇÃO NO REFERENCIAL CURRICULAR NACIONAL PARA A EDUCAÇÃO INFANTIL

O Referencial Curricular Nacional para a Educação Infantil (RCNs) possui um caráter instrumental e didático para o educador e tem como objetivo primordial auxiliar a prática educativa em creches e pré-escolas objetivando a melhoria do atendimento na Educação Infantil e tem no construtivismo sua maior referência.

6

Segundo a Revista Nova Escola em uma edição especial sobre avaliação o primeiro a usar a expressão ―Avaliação Formativa‖ foi o americano Michael Scriven, em seu livro ―Metodologia da avaliação‖, publicado em 1967. Segundo ele, só com a observação sistemática o educador consegue aprimorar as atividades de classe e garantir que todos aprendam. (2003, p. 27)

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Almeja que as crianças possam viver experiências prazerosas, dentro de uma proposta ―aberta, flexível e não obrigatória‖ (RCN, vol. 1, 1998, p. 14) relacionando objetivos gerais e específicos, organizados por idade, que se define, de 0 a 3 anos na creche e de 4 a 5 anos7 na pré-escola, idade esta estabelecida também na LDB 9394/96. Esta distinção de idade expressa na lei, não quer dizer que não se pode haver uma interação de crianças da creche com as crianças da pré-escola, mesmo porque, é favorável haver momentos em que estas interações aconteçam entre as crianças. O RCN na época de sua implantação trouxe reflexões que apontaram para a modificação da concepção de educação assistencialista na Educação Infantil e reconhece que esta mudança, pressupõe atentar para várias questões que perpassam os aspectos puramente legais. (RCN, Vol. 1, 1998, p. 17) Assim, brincar, cuidar integralmente da criança nos aspectos físicos, psicológicos e cognitivos, proporcionar um ambiente acolhedor rico em espaço e recursos que reconheçam as crianças enquanto sujeitos capazes de ações reflexivas e incentivá-las a interagir com o adulto e com outras crianças, individualizar situações de aprendizagens por meio de novos conteúdos e com os conhecimentos prévios da criança, estabelecer desafios cotidianos, respeitar as competências e as particularidades de cada uma, permitir a formação de vínculos e o confronto com a diferença e o trabalho com a própria dificuldade dentro dos princípios éticos, políticos e estéticos, são sem dúvida, proposições inegavelmente desejáveis trazidas pelos RCNs e exige do educador e do gestor escolar diálogo com as famílias e a comunidade buscando informações necessárias para o trabalho que desenvolvem. No vol. 3, intitulado Conhecimento de Mundo, que contempla os eixos de trabalho, que há as sugestões para a Observação, Registro e a Avaliação Formativa em cada eixo de ensino. Neste, a observação, o registro, o planejamento e a avaliação formativa são instrumentos essenciais para a reflexão sobre a prática direta com as 7

Mudança de idade para a pré-escola estabelecida pela Emenda Constitucional N. 59 de 11 de novembro de 2009, que altera parte do artigo 208, que elenca como objetivo a universalização da pré-escola e do ensino médio, e afirma que: Art. 208. ―O dever do Estado com a educação será efetivado mediante a garantia de: I- educação básica obrigatória e gratuita dos 4 (quatro) aos 17 (dezessete) anos de idade, assegurada inclusive sua oferta gratuita para todos os que a ela não tiveram acesso na idade própria; [...] IV- educação infantil em creches e pré-escola, às crianças até 5 (cinco) anos de idade; (BRASIL, CF. 2010, p. 76) [grifo nosso]. 44 Grupo de Estudo e Pesquisas em Política Educacional, Rio Claro, 06, 07 e 08 de julho de 2011 Vol. 3 (2011)

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crianças e fortalece a idéia de construção de um projeto educativo como um processo inacabado. (RCN, Vol. 1, 1998, p. 41) O RCN propõe algumas maneiras de se fazer este trabalho de registro por meio da escrita com ―registro diário de suas observações, impressões, idéias, etc.‖ compondo assim, um material de reflexão. Opção esta já elencada na LDBEN 9394/96, no art. 31, que esclarece que a avaliação na educação infantil: ―[...] far-se-á mediante acompanhamento, sem o objetivo de promoção, mesmo para o acesso ao ensino fundamental‖. (Grifo Nosso) (RCN, Vol. 1, 1998, p. 59) Este avanço conceitual na concepção de infância, ainda deixa muito a desejar na prática educativa no interior de muitas escolas de Educação Infantil. O próprio RCN reconhece que há um entendimento equivocado da avaliação na Educação Infantil, pois, alguns educadores conferem às produções das crianças ―[...] notas, conceitos, estrelas, carimbo com desenhos de caras tristes ou alegres conforme o julgamento do professor.‖, enquanto que, a “avaliação neste nível de ensino deveria ser processual e destinada a auxiliar o processo de aprendizagem [...]”. (Grifo Nosso) (RCN, Vol. 1, 1998, p. 59) O RCN entende a avaliação como: [...] um conjunto de ações que auxiliam o professor a refletir sobre as condições de aprendizagem oferecidas e ajustar sua prática às necessidades colocadas pelas crianças. É um elemento indissociável do processo educativo que possibilita ao professor definir critérios para planejar atividades e criar situações que gerem avanços na aprendizagem das crianças, tem como função acompanhar, orientar, regular e redirecionar esse processo como um todo. (RCN, Vol. 1, 1998, p. 59) Neste sentido, o RCN (vol. 1, 1998, p. 60) aponta que no processo de avaliação o educador deve acompanhar as conquistas, as dificuldades e as possibilidades de cada criança ao longo do processo de aprendizagem, compartilhando com elas as observações que se referem aos avanços e suas possibilidades de superação, isto ocorre nas várias atividades cotidianas, como por exemplo, quando o professor diz ―olha que bom, você já consegue se servir sozinho‖, ―você já consegue usar o banheiro‖, ou seja, trata-se da observação do que as crianças sabiam fazer antes de chegar à escola e do que elas estão sendo capazes de fazer até o momento. Porém, apontar aquilo que a criança não consegue ou não sabe realizar só faz sentido numa possibilidade de superação, senão, ao invés de auto-estima a avaliação 45 Grupo de Estudo e Pesquisas em Política Educacional, Rio Claro, 06, 07 e 08 de julho de 2011 Vol. 3 (2011)

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pode potencializar o sentimento de impotência e fracasso. Neste sentido, a avaliação na Educação Infantil serve ainda, para: ―[...] identificar pontos que necessitam de maior atenção e reorientar a prática, definido o que avaliar, como e quando em consonância com os princípios educativos que elege. [...] a avaliação deve se dar de forma sistemática e contínua, tendo como objetivo principal a melhoria da ação educativa. O professor, ciente do que pretende que as crianças aprendam, pode selecionar determinadas produções das crianças ao longo de um período para obter informações [...] sobre sua aprendizagem. [...] Os pais, também, têm o direito de acompanhar o processo de aprendizagem de suas crianças, se inteirando dos avanços e conquistas, compreendendo os objetivos e as ações desenvolvidas pela instituição. (RCN, vol. 1, 1998, p. 61) É a partir dessas interações ―que a criança é significada/interpretada como menino/menina, como chorão ou tranqüilo, como inteligente ou não [...]‖ (RCN, vol. 2, 1998, p. 17). É nestas avaliações que se faz da criança que se constroem as características dela, neste sentido, ao propiciar a sua alimentação, higiene, descanso, lazer e etc. cria-se condições para que as crianças adotem ―condutas, valores, atitudes e hábitos‖ importantes, dentro do contexto escolar ou social específico. A observação e a sensibilidade que leve em conta as características próprias dos pequenos8, são fundamentais para identificar as diferentes situações e ter clareza quanto aos encaminhamentos a serem dados, no sentido de dialogar com a família o porquê da dificuldade da criança, desse modo, podem-se planejar momentos específicos de colaboração entre a escola e a família para juntos orientarem a criança. É imprescindível oferecer às crianças situações em que elas ―[...] possam fazer algumas coisas sozinhas, ou com pouca ajuda, deixá-las descobrir formas de resolver os problemas colocados [...]‖. (RCN, vol. 2, 1998, p. 62) Neste sentido, ―A observação das formas de expressão das crianças, de suas capacidades de concentração e envolvimento nas atividades, [...] é um instrumento de acompanhamento do trabalho que poderá ajudar na avaliação e no replanejamento da ação educativa.‖ (RCN, vol. 2, 1998, p. 65) 8

Para um maior aprofundamento nas características próprias da primeira infância ver: MUKHINA. Valéria. Psicologia da idade pré-escolar. Um manual completo para compreender e ensinar a criança desde o nascimento até os sete anos. Trad. Cláudia Beliner. Martins Fontes: São Paulo, 1996.

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O trabalho com os pequenos precisa ser um trabalho de equipe e o planejamento das atividades precisa ser integrado, discutido dentro da coletividade escolar, de preferência com antecedência e oferecendo os recursos necessários.

3 INDICADORES E PARÂMETROS DE QUALIDADE NA EDUCAÇÃO INFANTIL: IMPLICAÇÕES NO TRABALHO ESCOLAR

Com a instauração oficial de uma avaliação que leve em conta as necessidades da criança na Educação Infantil, constitui-se uma série de questões que precisam ser pensadas dentro da escola, desse modo, para que este trabalho possa ser facilitado pela equipe escolar o Ministério da Educação e a Secretaria da Educação Básica lançaram os Indicadores e os Parâmetros de Qualidade na Educação Infantil em 2009, material este que incentiva captar os sinais que revelam aspectos de uma determinada realidade institucional por meio da avaliação coletiva de algumas dimensões, são elas: 1 – planejamento Institucional; 2 – multiplicidade de experiências e linguagens; 3 – interações; 4 – promoção da saúde; 5 – espaços, materiais e mobiliários; 6 – formação e condições de trabalho dos professores e demais profissionais; 7 – cooperação e troca com as famílias e participação na rede de proteção social. (BRASIL, MEC/CEB, 2009, p. 14-17) As escolas receberam exemplares desse material, os quais trazem passo a passo de como a avaliação institucional deve ser realizada, mas a adesão das instituições é voluntária e todos os segmentos devem participar (educadores, gestores, família e demais funcionários). Isto implica numa redefinição da organização do trabalho na escola, que demanda diálogo – comunitário e participativo – identificado com as carências e a satisfação justa: das necessidades, das responsabilidades, dos direitos e deveres dos vários sujeitos sociais, inclusive das crianças, na construção de uma escola de qualidade para a primeira infância.

4 A AVALIAÇÃO FORMATIVA NOS EIXOS DE ENSINO ELENCADOS NO RCNs E A ORGANIZAÇÃO DO TRABALHO NA ESCOLA ―[...] a observação concreta é o que nos pode convencer da importância fundamental da atividade na vida psíquica da 47 Grupo de Estudo e Pesquisas em Política Educacional, Rio Claro, 06, 07 e 08 de julho de 2011 Vol. 3 (2011)

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criança. Os parâmetros de observação são: a qualidade da atividade, o seu conteúdo, a sua duração e o lugar que ocupa em relação ao comportamento global da criança. Nessa situação não se trata de medir o que a criança é capaz de fazer em determinadas circunstâncias, mas de observar os momentos habituais de sua vida, de olhar a criança que está espontaneamente em atividade. Colocar-se questões concretas e variadas, permite ver a criança, descobri-la e depois atuar de forma consequente [...]‖ (FALK, 2011, p. 41-42) Na avaliação formativa, a ênfase está no aprender, isto significa uma mudança em todos os aspectos estruturais e pedagógicos da escola, redefinido suas estruturas, com ações na gestão escolar, no modo de organização do espaço escolar, na sala de aula, no currículo da escola, no relacionamento da equipe, na organização das atividades que serão trabalhadas e principalmente, na maneira em que o professor irá avaliar. Estas ações devem ser interligadas entre si para tornar possível a concretização deste modelo de avaliação. Os eixos são linguagens que consagram formas importantes de expressão e comunicação humanas, por isto, organizar lugares específicos para cada eixo ajuda o trabalho pedagógico na primeira infância. A avaliação deve se realizar de forma sistemática e contínua durante todo o processo de aprendizagem e o trabalho de reflexão do professor se faz pela observação e pelo registro, sendo necessário fazer um levantamento inicial sobre o conhecimento prévio das crianças para depois preparar as atividades, levando em conta que o planejamento deve favorecer a participação individual e de grupo e ser significativo para a criança, bem como, é importante que o educador explicite as conquistas das crianças e forneça informações para que elas avancem cada vez mais no conhecimento. É imprescindível ainda, que os educadores reflitam e discutam sobre os diferentes preconceitos que podem permear as relações cotidianas com as crianças (racial, de gênero, em relação à constituição familiar, religiosa, cultural, relativas a pessoas com deficiência, dentre outros), evitando transmiti-los nas relações com as crianças, pois ―todo trabalho pedagógico implica em transmitir, conscientemente ou não, valores e atitudes relacionados ao ato de conhecer.‖ (RCN, vol. 3, 1998, p. 195) Adentrando aos eixos de ensino elencados, o RCN considera o eixo movimento como uma importante dimensão da cultura humana em que as crianças expressam seus ―sentimentos, emoções e pensamentos‖, assim, a avaliação formativa em relação ao eixo 48 Grupo de Estudo e Pesquisas em Política Educacional, Rio Claro, 06, 07 e 08 de julho de 2011 Vol. 3 (2011)

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movimento requer a avaliação das condições oferecidas às crianças para uma motricidade saudável, isto significa refletir sobre o ambiente e o trabalho desenvolvido na escola que precisa ser desafiador e possibilitar que as crianças exercitem e interajam em ambientes amplos e significativos por meio de recursos apropriados. (RCN, vol. 3, 1998, p. 40-41) O eixo música exerce e desperta uma influencia imediata no comportamento integral da criança. Na educação infantil é possível que a música se faça presentes nas mais diferentes atividades de rotina, no entanto, ao invés das atividades de simples reprodução e memorização é interessante que a criança participe de atividades voltadas à criação e à elaboração musical, confeccionando e mantendo contato com vários instrumentos. A avaliação formativa aqui deve basear-se na observação e documentação que se refere aos aspectos vocais (se as crianças cantam e como); ao desenvolvimento rítmico motor; à capacidade de imitação, de criação e de memorização musical de acordo com o desenvolvimento psíquico de cada criança. (RCN, vol. 3, 1998, p. 77) As artes visuais, de acordo com o RCN (vol. 3, 1998, p. 85) ―expressam, comunicam e atribuem sentido a sensações, sentimentos, pensamento e realidade‖ por meio da organização de ―linhas, formas, volume, espaço, cor e luz, na pintura, no desenho, na escultura, na gravura‖ e etc. As atividades se expressam costumeiramente como atividades de ―desenhar, colar, pintar e modelar com argila ou massinha‖; neste sentido, a avaliação formativa neste eixo requer a permissão, imprescindível, para que a criança possa dialogar com o grupo sobre as suas criações e escutar os colegas, além de receberem uma quantidade suficiente de material para que possam criar e recriar. O eixo linguagem oral e escrita, presente no cotidiano das pessoas, está relacionado com a formação do sujeito, pela possibilidade de ampliar a capacidade de comunicação, expressão e a inserção e participação da criança na interação com as pessoas e com o seu meio sociocultural. É um desenvolvimento gradativo ―associado às competências lingüísticas básicas de falar, escutar, ler e escrever.‖ (RCN, vol. 3, 1998, p. 117) Há várias atividades que podem considerar as crianças na construção do conhecimento sem que elas sejam simplesmente, receptoras passivas. Uma importante atividade é a ―hora da história‖ ou ―roda da leitura‖ que instigam a imaginação das

49 Grupo de Estudo e Pesquisas em Política Educacional, Rio Claro, 06, 07 e 08 de julho de 2011 Vol. 3 (2011)

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crianças, principalmente quando acompanhadas de um entorno de participação e interação com os pequenos. A avaliação formativa aqui deve ser contextualizada conforme a atividade dada, observar seus interesses em manusear livros, ouvir e contar histórias, brincar de ler e escrever, etc. e aproveitar o momento que a criança fala, lê ou escreve, para acompanhar o seu progresso e quando houver avanços explicitá-los a ela. (RCN, vol. 3, 1998, p. 136159) O eixo Natureza e Sociedade trabalham com os fenômenos naturais e sociais, advindos de conteúdos das Ciências Humanas e Naturais, pois as crianças desde o nascimento vão vivenciando experiências e interagem com conceitos, valores, idéias, objetos e representações no cotidiano construindo conhecimento sobre o mundo. Relacionam-se com os diferentes animais, fenômenos da natureza, notícias da TV, fotos, relatos, entrevistas, histórias de antigamente e suas vivências sociais, dentre outros. (RCN, vol. 3, 1998, p. 161-163) Um exemplo que pode ser propiciado e instigado é quando a criança se veste e brinca de faz-de-conta, construindo e reconstruindo, de forma lúdica, a cultura e adquirindo conhecimento sobre o seu entorno: família, amigos, escola, etc. Já nas ciências naturais a experiência é o mais importante, como por exemplo, quando uma criança afunda um objeto na água e observa se este bóia ou afunda ou mesmo quando enche um balde de água e depois misturam com a terra fazendo lama, cuidar de planta e acompanhar o seu desenvolvimento, observar o céu a noite e de dia, as variações do clima, uma visita à uma exposição que esteja ocorrendo na cidade, etc. A avaliação formativa deste eixo requer a participação das crianças em atividades que envolvam exploração do ambiente, manipulação de objetos, participação e compreensão de algumas manifestações culturais de sua comunidade (tradições festivas, musicais, brincadeiras, etc.) e que possam conhecer e valorizar a sua cultura, cotidianamente dentro da escola. (RCN, vol. 3, 1998, p. 203-204) No eixo Matemática, tem estabelecidas as situações que envolvem os números, as relações entre quantidades, a noção de formas, espaço e tempo; utilizando-se da contagem, do repartir, do representar. A criança faz matemática quando procura resolver as situações-problemas enfrentadas no cotidiano. As atividades restritas à memorização, repetição e associação devem ser evitadas, como por exemplo, passar o lápis sob o numeral pontilhado, colar bolinhas de 50 Grupo de Estudo e Pesquisas em Política Educacional, Rio Claro, 06, 07 e 08 de julho de 2011 Vol. 3 (2011)

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crepom sobre os números ou pedir a escrita repetida de um mesmo numeral, assim, recomenda-se as ―ações de classificar, ordenar/seriar e comparar‖ objetos em função de diferentes critérios, bons instrumentos para isto está em jogos de tabuleiro com peças grande de várias cores e formatos geométricos, pode-se usar ainda, objetos e brinquedos que contenham números: telefone, relógio, caixas de diferentes tamanhos, cantigas e rimas envolvendo contagem e números, quadro de aniversariantes, o calendário, painel de pesos e medidas, um percurso com obstáculos, comparar tamanhos, dança das cadeiras, de roda, labirintos, dentre outros. A avaliação formativa deste eixo terá a função de acompanhar o pensamento da criança, observar aquilo que elas já sabem e como pensam ou como reagem a determinadas situações-problemas das atividades cotidianas, para que o educador possa reorientar e planejar suas ações. (RCN, vol. 3, 1998, p. 237-239) De acordo com Perrenoud (1999, p. 152) para ocorrer a avaliação formativa é preciso modificar profundamente a cultura da organização escolar, porque requer uma dinâmica dentro da escola que ultrapassa a força de cada um isoladamente. É preciso uma divisão de tarefas que se processe ao mesmo tempo, por meio da colaboração. Além disso, a avaliação deve ser vista ―como uma possibilidade de refletir sobre o ensino.‖ e não como processo de classificação e seleção, punição e premiação. (PRADO DE SOUZA, 1998, p. 169) A avaliação formativa sob o enfoque dos eixos de trabalho apontados pelo RCN ou de outros eixos que podem ser elencados pela escola, depende da observação atenta sobre a criança, seguida de um relatório cotidiano que servirá de base para a organização do trabalho na escola que perceba a criança ―[...] ativa por si própria e competente desde o nascimento, rica de iniciativas e de interesses espontâneos pelo que a rodeia. As condições que a rodeiam, no sentido amplo do termo, determinam as possibilidades de realizar essas experiências.‖ ((FALK, 2011, p.41) Nesta perspectiva, a organização do espaço escolar que viabilize atividades que podem ser realizadas com autonomia pela criança, requer um planejamento coletivo que tenha como foco a criança, para que possam incentivar nos pequenos as máximas possibilidades de desenvolvimento das suas formas elementares de percepção e reflexão, que serão as bases indispensáveis para a assimilação das diferentes formas de experiência social e de constituição da personalidade da criança. 51 Grupo de Estudo e Pesquisas em Política Educacional, Rio Claro, 06, 07 e 08 de julho de 2011 Vol. 3 (2011)

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CONSIDERAÇÕES FINAIS ―O importante [...] não é identificar problemas de aprendizagem, mas necessidades.‖ (FELIPE DA SILVA, 2003, p. 27) A avaliação formativa serve a um trabalho de regulação individualizada da aprendizagem e da ação pedagógica, busca retomar o problema em suas bases, modificando e redefinindo o planejamento didático do educador e da escola. Porém, diante da pouca utilidade dos métodos tradicionais de avaliação, pode-se incorrer no erro de que não é possível avaliar o trabalho educativo na educação infantil, por isto, a avaliação neste nível de ensino, desperta na maioria dos educadores um sentimento de resistência e desconforto porque tem sido confundida, com fiscalização, identificação de erros e apuração de responsabilidades. Entretanto, se mais do que nunca é preciso que a avaliação tenha um sentido mais formativo dentro do sistema escolar, é preciso fazer evoluir a escola em direção a uma responsabilidade compartilhada, favorecer a cooperação, agir sobre os aspectos de formação, formação continuada e valorização do educador. Proporcionar isto sugere responsabilidades políticas e também, um trabalho do educador gestor na medida em que este possibilita a reflexão e a ação em relação às questões prementes sobre a primeira infância. A avaliação formativa é um instrumento importante para fornecer informações às famílias e solicitar seu apoio para um trabalho em conjunto com o único objetivo de auxiliar a criança a desenvolver-se de maneira integral. Neste sentido, o parâmetro para as conquistas da criança serão os avanços que ela mesma conquistar, sem, no entanto, compará-la com outras crianças, pois é preciso respeitar a sua subjetividade, o seu ritmo, a sua personalidade e seu jeito próprio de conhecer e aprender. É preciso registrar as observações que se faz da criança individualmente e do grupo. E se o educador preferir poderá fazer um relatório descritivo em que serão citadas as propostas do educador, as reações das crianças entre si e as intervenções pedagógicas realizadas. É interessante que a equipe da escola ou o educador peça aos pais que registrem sua avaliação sobre o filho durante o processo educativo, para que se possa compor uma avaliação integral da criança. Na impossibilidade dos pais fazerem um registro escrito, 52 Grupo de Estudo e Pesquisas em Política Educacional, Rio Claro, 06, 07 e 08 de julho de 2011 Vol. 3 (2011)

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este pode ser um registro oral, numa conversa informal em reuniões escolares ou em conversas cotidianas. Neste processo a equipe pedagógica pode e deve constantemente se auto-avaliar, repensando as práticas e o programa de ensino trabalhado com as crianças. Por isto, defende-se que se tenha também na Educação Infantil, a prática do HTPC (Horários de Trabalho Pedagógico Coletivo), de modo que as discussões realizadas sejam enriquecedoras e mediadoras da própria prática escolar gestora e docente. Cada criança possui ritmos e processos de aprendizagem diversos, levando à necessidade de agrupar as turmas de modo diferente; reconhecer que as formas de viver da criança estão longe de serem construídas unicamente por meio da atuação das escolas, embora possam ser enriquecidas a partir da incorporação de conhecimentos e experiências oferecidas nestas, por isto um bom contato com a família ajuda e muito no desenvolvimento sadio dos pequenos. Para incentivar a autonomia da criança é preciso que elas possam ocupar o lugar de sujeitos que avaliam e não apenas de objetos da avaliação, sua participação deve ser interpretada em todas as fases do trabalho, mesmo quando possuem pouca idade, pois as crianças ou bebês riem, choram, balbuciam, fazem cara de alegres, de tristes e de que estão atentos, etc., se expressando a todo o momento. Muitas vezes, os educadores não reconhecem os limites de sua atuação e acabam enfrentando frustrações e desestímulos ao avaliar o seu trabalho deparando-se com problemas de natureza social ou organizacional que geram dificuldades no ensino e aprendizagem das crianças o que leva ao risco do fracasso dos esforços para que se realize uma autêntica avaliação formativa. O principal desafio está em estabelecer objetivos claros e compatíveis com as funções da escola da primeira infância e a organização do trabalho coletivo da escola com base em critérios éticos, políticos e estéticos. Porém, quando os objetivos ficam claros, é possível selecionar indicadores de mudanças que possam ser comparados, ou seja, o antes e o depois da intervenção educativa. Por isto, estabelecer indicadores de uma determinada realidade e estratégias de avaliação institucional e dos processos de ensino e aprendizagem na escola infantil é uma tarefa delicada, mas extremamente necessária. É delicada dada à complexidade do que é o avaliar, pois ao avaliar não é possível dissociar componentes cognitivos das dimensões subjetivas, assim a diversidade das formas de incorporação dos conteúdos à 53 Grupo de Estudo e Pesquisas em Política Educacional, Rio Claro, 06, 07 e 08 de julho de 2011 Vol. 3 (2011)

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vida pessoal está associada a um enredo composto por incontáveis verdades pessoais, grupais e familiares. Isto requer programar coletivamente e adequadamente as atividades, assim, observar e planejar requer pensar as possibilidades diante do contexto e durante todo o processo, pois a avaliação é parte indissociável do processo de ensino e aprendizagem, sendo realizada por meio das observações de grupo e individual, possibilitando interações para que as crianças aprendam mais e melhor nos aspectos cognitivos, afetivos e sociais. Pode-se, por exemplo, pesquisar se ocorreu uma mudança no grau de independência e autonomia da criança, se aumentou o vínculo entre as crianças e a escola, entre a escola e a família, se ocorreu uma maior qualidade no atendimento, se os espaços estão sendo constantemente pensados em prol dos pequenos. As várias fontes estudadas sobre avaliação compreendem que se está longe de esgotar o assunto, pois, o desenvolvimento e estudo deste tema não avançam dentro da escola, apontando a grande discrepância entre os estudos sobre avaliação na teoria e a sua aplicabilidade na prática escolar. Isto tem haver também, com uma formação pedagógica deficitária que não traz um currículo mínimo para se pensar a avaliação de forma diferente. A avaliação formativa serve a um projeto de sociedade que se pauta pela cooperação e pela inclusão, em lugar da competição e da exclusão e é por isto que não tem lugar num sistema educativo que limita o acesso aos saberes. Neste contexto, cumpre às escolas de educação Infantil, ainda que sob condições inadequadas de formação, valorização e trabalho, avaliar e se avaliar constantemente, fazendo-se as seguintes questões: o quê é importante que os pequenos aprendam e o que deve ser ensinado? Quando preciso me aperfeiçoar para sanar as dificuldades dos educandos? Como devo ensinar tendo em vista uma dificuldade individual ou coletiva? O Por quê de determinado educando se desenvolver bem e outro não? Estas são perguntas que devem ser realizadas pela equipe escolar e representa um incentivo para desencadear novos processos de ensino e aprendizagem com as crianças.

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É imprescindível que as crianças possam contar com um ambiente enriquecedor de possibilidades e a escola possa ser um ―lugar da cultura mais elaborada‖9, com profissionais que ofereçam novas possibilidades para brincar, movimentar-se, cantar a vida e as canções da pequena infância, que contem histórias, que tenham capacidade para ouvir as crianças: no silêncio que aparentemente as emudece e na agitação aparentemente sem motivo, sendo a capacidade de observar e ouvir uma das mais importantes. Redefinir a organização do trabalho na escola de primeira infância demanda compartilhar com os pequenos momentos de aprendizagens dentro da mesma e se aventurar na reflexão critica focando a escola e o ser humano que se tem e aqueles que se deseja ter, fazendo da atuação prática o caminho para a conscientização e a mudança, que possa fortalecer a reflexão sobre uma avaliação autenticamente formativa e os ideais de melhores dias para a Educação Infantil.

REFERÊNCIAS BRASIL. Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional. Brasília: DF, Ministério da Educação, 1996. _______. Ministério da Educação. Secretaria da Educação Básica. Indicadores de qualidade na Educação Infantil. Brasília: MEC/SEB, 2009. _______. Referencial Curricular Nacional para a Educação Infantil. Ministério da Educação e do Desporto. Vol. 1, 2 e 3. Brasília: DF, 1998. FALK, Judit (org.). Educar os três primeiros anos: a experiência de Lóczy. Trad. Suely Amaral Mello, revisada por Jaqueline Moll. 2ª Ed. Junqueira&Marin: AraraquaraSP, 2011. FARIAS, M. A. e MELLO, S. A. A escola como lugar da cultura elaborada. Disponível em: . Acesso em: 10 de abril de 2011. FELIPE DA SILVA, Janssen. Avaliar para ensinar melhor. In: Revista Nova Escola: São Paulo, ed. n.º 159, Jan/Fev, 2003. 9

Para maior compreensão deste assunto ver: FARIAS, M. A. e MELLO, S. A. A escola como lugar da cultura elaborada. Disponível em: . Acesso em: 10 de abril de 2011.

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MUKHINA. Valéria. Psicologia da idade pré-escolar. Um manual completo para compreender e ensinar a criança desde o nascimento até os sete anos. Trad. Cláudia Beliner. Martins Fontes: São Paulo, 1996.

PENNA, Theresa F. Avaliação: tendências e tendenciosidades. In: Curso de Especialização em Avaliação à Distância. Vol. 3 – Avaliação de currículos e de programas – Leituras Complementares. MACHADO DE SOUSA, Eda C. B. BARBOSA FRANCO, Maria Laura P. METS, Lisa A. (Orgs.). BRASÍLIA: DF, 1997. PERRENOUD. Philippe. Avaliação: da excelência a Regulação das Aprendizagens – entre duas lógicas. Trad. Patrícia Chittoni Ramos. Porto Alegre: Artmed, 1999. PRADO DE SOUZA, Clariza. Descrição de uma trajetória na/da Avaliação Educacional. In: Idéias 30 – Sistema de Avaliação Educacional. CANHOLATO, Maria da Conceição. AMARAL FERREIRA, Maria J. do. (et al). São Paulo: FDE, 1998.

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FORMAÇÃO E FUNÇÃO DO DIRETOR DE ESCOLA: ASPECTOS TEÓRICOS E PRÁTICOS Maria Eliza Nogueira Oliveira [email protected] UNESP/ Marília

Resumo: Após a publicação da Resolução CNE/CP nº 1/ 2006, foram extintas as habilitações dos cursos de Pedagogia, em que se inclui a habilitação em Administração Escolar. A referida decisão fragilizou a formação do diretor de escola e abriu espaço para a entrada de cursos de formação continuada voltados à capacitação técnica em exercício, visando ao atendimento de metas preestabelecidas no âmbito governamental. Considerando-se a necessária contribuição do diretor de escola para a efetivação de uma educação escolar de qualidade, apresenta-se este trabalho cujo objetivo é refletir acerca do espaço da gestão na formação do pedagogo, considerando-se as políticas educacionais formuladas no contexto mais amplo. Palavras-chave: Administração Escolar. Curso de Pedagogia. Formação e Função do Diretor de Escola.

Desde a década de 1930, vêm se desenvolvendo no Brasil estudos sistemáticos no âmbito da administração educacional em que se destacaram os ensaios teóricos de Anísio Teixeira (1935) e Querino Ribeiro (1938). Essas obras, ainda que se diferenciassem em termos de pressupostos de Administração, tinham em sua essência a orientação técnica e pragmática transposta da Teoria Geral de Administração (TGA) − também denominada de Administração Clássica − desenvolvida, especialmente, por Taylor e Fayol nas primeiras décadas do século passado. De acordo com Sander (2007, p.35), a oficialização dos princípios da TGA deuse no I Simpósio Brasileiro de Administração Escolar, em fevereiro de 1961, onde o campo de estudo e intervenção prática da administração escolar ficou assim conceituado: A Administração escolar supõe uma filosofia e uma política diretoras pré-estabelecidas; consiste no complexo de processos criadores de condições adequadas às atividades dos grupos que 57 Grupo de Estudo e Pesquisas em Política Educacional, Rio Claro, 06, 07 e 08 de julho de 2011 Vol. 3 (2011)

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operam na escola em divisão de trabalho; visa a unidade e economia da ação, bem como o progresso do empreendimento. O complexo de processos engloba atividades específicas − planejamento, organização, assistência à execução (gerência), avaliação de resultados (medidas), prestação de contas (relatório) − e se aplica a todos os setores da empresa − pessoal, material, serviços e financiamento (ANPAE, 1961). Nesse

contexto,

denominado

por

Sander

(2007,

p.

47)

de

―fase

desenvolvimentista‖, a educação passou a ser considerada, mundialmente, um fator essencial para a garantia do desenvolvimento econômico e de uma progressiva ascensão social. Por este motivo, considerava-se de grande importância o planejamento minucioso dos serviços educacionais ―em função dos requerimentos de mão-de-obra para atender às necessidades do processo de industrialização‖ (2007, p. 47). Houve, nesse espaço de tempo, significativa evolução no campo teórico da área de Administração Escolar, em que se destacam as obras de Lourenço Filho (1963) e Alonso (1976), que expressam a necessidade de constituir um conhecimento específico da área que possa servir de subsídio teórico para garantir uma formação, também específica e de qualidade, para os futuros diretores. Demonstrou-se, nesse período, forte preocupação com a construção de uma teoria que servisse de instrumento para o exercício da função de administrador escolar. O investimento na formação de profissionais especializados esteve refletido na Lei da Reforma Universitária n° 5.540 aprovada em 1968 que, de acordo com Cunha (2003), definiu a forma de organização das universidades, mantida até os dias atuais e, em termos de currículo, ocasionou um dos maiores impactos nos cursos de ensino superior por meio da introjeção do ideário tecnicista, cujo foco direcionava-se para a instrumentalização do indivíduo visando, sobretudo, a preparação de mão de obra qualificada para o mercado de trabalho. Nessa perspectiva, o Conselho Federal de Educação instituiu o Parecer n° 252/ 69 que foi incorporado à Resolução/CFE nº. 2/69, cujo objetivo era fixar o conteúdo e duração mínima a serem observados na organização do Curso de Pedagogia em todo o país. O referido Parecer, seguindo aos princípios da racionalidade, eficiência e produtividade da Reforma, criou as chamadas habilitações destinadas à formação de profissionais especializados para o desenvolvimento de um conjunto de atividades relacionadas ao campo educacional, dentre elas a da administração escolar. 58 Grupo de Estudo e Pesquisas em Política Educacional, Rio Claro, 06, 07 e 08 de julho de 2011 Vol. 3 (2011)

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Entre as décadas de 1980 e 1970, o não alcance dos resultados esperados com o amplo investimento na escola pública originou o chamado ―pessimismo pedagógico‖ que culminou no reforço do debate acerca do real papel da educação em termos ―econômicos, políticos e culturais‖. Chegou-se à conclusão que, apesar de importante, a questão econômica não era a única dimensão da gestão educacional e, por este motivo, os olhares passaram a ser direcionados também para as questões relacionadas aos aspectos sociais e culturais da atividade educativa. Denominado por Sander (2007, p. 49) de ―fase sociocultural‖, este novo período, no Brasil, foi marcado pelo pensamento crítico de Paulo Freire (1989) caracterizado pelo forte questionamento das relações de dominação, cujo fim se daria por meio de uma proposta de educação libertadora. Somou-se aos ―valores jurídicos, da racionalidade técnica, das relações subjetivas e intersubjetivas e do valor econômico‖ os ―valores culturais e as aspirações políticas da sociedade brasileira‖. De acordo com Sander (2007, p. 55), nesse período se enunciou o tema da ―especificidade da administração da educação como campo de estudo‖ voltado para uma análise mais aprofundada da atividade administrativa no espaço escolar. Baseada em estudos empíricos desenvolvidos por uma linha de pesquisa educacional específica que vinha se firmando em diversas Faculdades de Educação brasileiras, essa análise considerava a forte relação entre a política e a administração da educação e tinha como objetivo ―responder às exigências e peculiaridades econômicas, políticas e culturais do Brasil‖. Em pesquisa desenvolvida por Pereira & Andrade (2005 apud SANDER, 2007, p. 62) revelou-se [...] a existência de uma crescente preocupação com a definição de uma nova identidade do administrador da educação e a reconstrução de seu perfil político e técnico condizente como o movimento sociopolítico da época. Compromisso político conjugado com formação técnica define a nova identidade do administrador da educação, compatibilizando-a com as exigências éticas e políticas da intelectualidade educacional de vanguarda da época. A pesquisa citada pelo autor revelou também grande interesse pela ―reconstrução teórica‖ da administração da educação, com a clara intenção de ―superar a histórica tradição positivista e funcionalista de corte liberal, por uma orientação ―interacionista‖ 59 Grupo de Estudo e Pesquisas em Política Educacional, Rio Claro, 06, 07 e 08 de julho de 2011 Vol. 3 (2011)

III Seminário Internacional de Gestão Educacional

de natureza sócio-histórica, que se revela nos estudos de base marxista, fenomenológica, existencialista e anarquista‖ (SANDER, 2007, p. 62-63). O novo perfil dos estudos desenvolvidos na área da administração da educação, nesse período, fomentou o desenvolvimento de um novo paradigma de gestão que concebe a atividade administrativa enquanto processo político e não mais enquanto mera atividade tecnocrática. Desse modo, abrem-se as portas para a entrada de uma nova perspectiva de gestão democrática da educação, que valoriza o pensamento crítico e adota ―a participação como estratégia político-pedagógica‖. A partir desses estudos críticos, consolida-se o confronto entre dois paradigmas de administração da educação que representam dois posicionamentos divergentes, para não dizer excludentes. Embora cada um desses paradigmas tenha recebido denominações diferentes, pode-se afirmar que o primeiro, ao conceber a administração enquanto ―processo político‖, se opõe a uma ―administração burocrática‖ que concebe a educação como fator meramente econômico. Com as conquistas democráticas da década de 1980, reforçaram-se as críticas em relação à transposição do modelo de gestão empresarial para as escolas e valorizaram-se os estudos, ―cujas propostas acentuam a dimensão política sobre a técnica e o ato pedagógico sobre o empresarial‖ (SANDER, 2007, p. 64-65). Nessa linha destacam-se os estudos de Paro (1989) e Félix (1986), que denunciam os limites da utilização de práticas administrativas empresariais nas organizações escolares. Para Paro (1986) o processo de produção pedagógico possui uma natureza específica e não pode ser comparado ao processo de produção material das empresas capitalistas. Daí a necessidade de se construir uma teoria específica da administração escolar que considere os reais objetivos da educação que, para o autor, devem estar voltados para a superação da ordem social vigente, o que supõe uma formação voltada para os interesses da classe trabalhadora. Para tanto, há que se desenvolver uma administração totalmente baseada na participação e nos princípios democráticos. Na década de 1990, observa-se a incorporação dos princípios da gestão democrática na nova Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional (LDBEN) n° 9.394 de 1996 que, entre outros dispositivos, prioriza a ―participação dos profissionais da educação na elaboração do projeto pedagógico‖; ―a participação das comunidades escolar e local em conselhos escolares e equivalentes‖; a ―existência de órgãos 60 Grupo de Estudo e Pesquisas em Política Educacional, Rio Claro, 06, 07 e 08 de julho de 2011 Vol. 3 (2011)

III Seminário Internacional de Gestão Educacional

colegiados deliberativos‖; e a concessão de ―progressivos graus de autonomia pedagógica e administrativa e de gestão financeira‖. Baseado nesses princípios, desenvolve-se uma série de trabalhos, demonstrando grande preocupação com a efetivação da gestão democrática no interior da escola. De acordo com Abdian (2010), esses trabalhos passam a defender formas também democráticas de designação do cargo de diretor de escola, que passa, especialmente, pela eleição do referido cargo pela comunidade escolar. Paralelo a este movimento, várias entidades acadêmicas − FORUMDIR, ANPAE, ANPEd, CEDES, Executiva Nacional dos Estudantes de Pedagogia e a ANFOPE

10

− reforçam a necessidade de reestruturação do Curso de Pedagogia por

meio da extinção das habilitações voltadas para a formação do especialista. No caso da habilitação em Administração Escolar, de acordo com Libâneo (2006), a crítica principal apoiou-se em um argumento sociológico que relacionava a divisão técnica do trabalho na escola com a própria fragmentação do curso de Pedagogia que formava de um lado os pedagogos que planejam e pensam, e de outro os professores que executam. Para pôr fim a este quadro, a saída proposta foi a eliminação da divisão de tarefas baseada na fragmentação do trabalho pedagógico por meio da transformação de todos os profissionais da educação em professores. Partindo desse pressuposto, chegou-se à tese da docência como base da formação do pedagogo e, portanto, a transformação do curso de Pedagogia em um espaço privilegiado de formação docente e não mais do pedagogo especialista. Observa-se nesses dois movimentos − formação generalizante do pedagogo e provimento do cargo do diretor por meio de eleição, obedecendo ao princípio da gestão democrática − uma forte contradição entre as ideias propagadas nesse período, pois, ao mesmo em que se defendeu a elaboração de uma teoria específica da administração escolar, empreendeu-se um discurso contrário à necessidade de uma formação especializada para o exercício desta função. Com a instituição das DCNP em 2006, ficam, definitivamente, extintas as habilitações nos cursos de Pedagogia, o que denota a retirada das universidades enquanto espaço de formação dos especialistas na área educacional em que se inclui a 10

FORUMDIR (Fórum de Diretores das Faculdades/Centros de Educação das Universidades Públicas Brasileiras; ANPAE (Associação Nacional de Política e Administração da Educação; ANPEd (Associação Nacional de Pós-Graduação e Pesquisa em Educação; CEDES (Centro de Estudos Educação e Sociedade e ANFOPE (Associação Nacional pela Formação dos Profissionais da Educação.

61 Grupo de Estudo e Pesquisas em Política Educacional, Rio Claro, 06, 07 e 08 de julho de 2011 Vol. 3 (2011)

III Seminário Internacional de Gestão Educacional

formação do gestor escolar. Nota-se que este movimento, apesar de importante para se repensar o papel da escola e sua gestão, contribuiu para o enfraquecimento da área em termos de produção teórica e, consequentemente, em termos de formação. Ao se extinguir as habilitações dos cursos de Pedagogia, entre elas a Habilitação em Administração Escolar, a responsabilidade em relação ao oferecimento de formação específica para o gestor da escola pública recai sobre os próprios sistemas de ensino que passam a oferecer cursos de gestão escolar, novamente, nos moldes da gestão empresarial amplamente criticada pelos cientistas da educação que defendem uma gestão pautada em princípios democráticos que considere as especificidades da escola. Nesse movimento, é possível observar a permanência da prática da gestão empresarial, ainda que de forma menos explícita, porém, não menos eficiente. Trata-se de um novo modelo pautado no discurso da ―participação‖, da ―descentralização‖ e da ―autonomia‖ que, para Benelli (2010, p. 174), não passam de ―conceitos instrumentalizados úteis para manter tudo como está e preservar ou aumentar a mistificação da realidade sociopolítica‖. Esse modelo, também conhecido de ―gestão participativa‖ ou ―Qualidade Total‖, de acordo com Krawczyk (2008, p. 68),

[...] dá ênfase à importância do trabalho em equipe e da extensão das responsabilidades, mas ressalta, de modo especial, a liderança da gestão. Outro de seus pressupostos é que uma boa gerência é a alma do êxito institucional. Isso vem sendo reforçado por várias pesquisas e ações governamentais (curso de capacitação) que reproduzem a concentração de poder e responsabilidades na figura do diretor e, principalmente, intensificam seu caráter administrativo e tecnocrático, em detrimento de seu caráter de educador. A valorização do papel do gestor no âmbito das instituições educacionais condiz com a cultura do novo ―gerencialismo‖ (Ball, 2005) que enfatiza um modelo de organização centrado nas pessoas vistas como responsáveis pela ―produção‖ de serviços públicos de qualidade a partir de um esforço individual, que visa ao atendimento de objetivos supostamente coletivos. Identifica-se, nessa perspectiva, um movimento que leva à adesão cega ao coletivo a partir da aniquilação da individualidade. Este movimento tem como pressuposto a existência de um líder treinado para persuadir os 62 Grupo de Estudo e Pesquisas em Política Educacional, Rio Claro, 06, 07 e 08 de julho de 2011 Vol. 3 (2011)

III Seminário Internacional de Gestão Educacional

indivíduos a contribuírem na construção de um projeto desenvolvido por um determinado grupo que se apresenta como sendo de interesse da coletividade. Dentro desse contexto, é muito comum que os líderes utilizem certos jargões como, por exemplo, ―precisamos vestir a camisa‖ da instituição. Esse jargão é o pontochave da consolidação de uma prática centrada nas pessoas em que o Estado treina os dirigentes das instituições públicas para conduzir os funcionários no sentido da efetivação de projetos delineados pela cúpula governamental, porém, não raramente, se desresponsabiliza ante os resultados desses projetos, cujos efeitos, nem sempre, são os desejados. Nesse movimento, os governos se eximem da função de prover os recursos necessários para a efetivação de políticas públicas e passa a assumir um papel de controle desses serviços por meio de uma política regulatória ao mesmo tempo em que ―decreta‖ autonomia (BARROSO, 1996) às organizações e as reveste de ―liberdade‖ de gestão. Para Krawczyk (2008, p. 68), trata-se de uma ―liberdade negativa‖ e ―individualista‖ que se realiza por meio da redução ao mínimo possível do poder coletivo e estatal. Nessa perspectiva, a autonomia é concebida como [...] liberalização da instituição para dar possibilidade aos sujeitos escolares de atuarem utilizando seus ―próprios‖ recursos (ideias, desejos, valores, contatos sociais, recursos materiais etc.) pela ausência dos tradicionais recursos normativos e da vocação universalista do Estado na sua política financeira. (KRAWCZYK, 2008, p. 68) No caso das escolas, transparece a falsa liberdade dada aos membros da equipe escolar para que elaborem seus ―próprios projetos‖. Falsa porque, ao mesmo tempo em que essa liberdade é garantida em termos de lei, na prática sua efetivação se torna muito limitada, já que todo o trabalho pedagógico passa a ser planejado com base em propostas estipuladas pelo próprio governo que se incumbe de avaliar os resultados por meio de avaliações estandardizadas. Além disso, como instrumento de incentivo, em caso de alcance dos efeitos desejados, o governo passa a conceder prêmios ao esforço institucional e, caso o resultado contrarie as expectativas, ―o fracasso é interpretado como fracasso pessoal dos atores da escola, tirando do Estado qualquer tipo de responsabilidade na gestão dos problemas educacionais‖ (KRAWCZYK, 2008, p. 69). Embora, aparentemente, esse modelo de gestão seja eficaz, pois dá a ilusão da garantia de certo padrão de qualidade, a pesquisa de Abdian (2010) recolhe informações 63 Grupo de Estudo e Pesquisas em Política Educacional, Rio Claro, 06, 07 e 08 de julho de 2011 Vol. 3 (2011)

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valiosas de diretores de escola que confirmam a utilização de estratégias internas para garantir os resultados esperados, ao mesmo tempo em que afirmam que esses resultados, nem sempre, condizem com a realidade vivenciada nas escolas e com as concepções dos sujeitos em relação à qualidade do ensino oferecido. Acreditamos que o resultado dessa forma de gerir as instituições contribui para a manutenção, para não dizer o aumento, do fracasso escolar, pois, ao contrário do que se espera, a avaliação externa passa a ser o fim e não o meio. No chamado ranking, cada escola busca os melhores meios de garantir uma ―boa colocação‖ dando origem a uma competitividade indevida e desnecessária que corrobora o enfraquecimento dos movimentos coletivos, como as associações e sindicatos, considerados de extrema importância para fazer frente às políticas neoliberais que intentam colocar as instituições públicas, precipuamente, a serviço do mercado. De acordo com Abdian (2010), inicia-se a partir desse contexto uma forte tensão entre as pesquisas da área em defesa da gestão democrática e as políticas educacionais que privilegiam o controle em relação ao alcance de metas preestabelecidas que condizem com a visão da racionalidade técnica dos anos 1970. Ainda que haja uma grande divergência em relação à concepção dos objetivos educacionais, tanto a perspectiva da gestão democrática quanto a da gestão empresarial − traduzida nas políticas de controle do Governo − responsabilizam a gestão da escola pela efetivação de uma educação concernente com suas concepções em termos ideológicos. Diante do exposto, a questão que se coloca é: como está sendo formado o pedagogo para vivenciar estas contradições no cotidiano da escola pública? Sem dúvida, a base docente foi uma conquista inquestionável do ponto de vista da formação do educador, mas nosso questionamento, diante do exposto é: em que medida as esparsas disciplinas alocadas no curso de Pedagogia proporcionam ao futuro gestor, agora formado como educador, uma visão do complexo sistema educacional tecido no bojo da política internacional e com diretrizes pré-estabelecidas para as realidades locais? A questão aqui enunciada incorpora-se à defesa da necessidade de competência técnica do gestor escolar, adquirida por meio de formação sólida para este profissional da educação, mesmo que em nível de pós-graduação.

64 Grupo de Estudo e Pesquisas em Política Educacional, Rio Claro, 06, 07 e 08 de julho de 2011 Vol. 3 (2011)

III Seminário Internacional de Gestão Educacional

Compactuando com a ideia de Paro (1989) de que a Administração consiste na ―utilização racional de recursos para a realização de fins‖, coloca-se em questão: de que forma o gestor é levado a conhecer os fins educacionais para, a partir deles, ter conhecimento dos limites e das possibilidades de ação no âmbito escolar? Um dos efeitos da instituição das novas DCNP se refletiu no levantamento da bibliografia a respeito da formação do pedagogo que demonstra uma ampla produção teórica direcionada, quase que exclusivamente, para os aspectos relacionados à formação docente. Constata-se que essa produção está relacionada à visão estreita da ciência pedagógica presente na Resolução de 2006 que, de acordo com Libâneo (2006, p. 849), resulta de um equívoco teórico sem precedentes na tradição da investigação teórica da área, que gera a subsunção da pedagogia na docência, reduzindo a essencialidade dos processos formativos a uma dimensão do trabalho pedagógico. (LIBÂNEO, p. 849, 2006). Por outro lado, de acordo com Abdian (2010), os estudos sobre administração escolar, especialmente a partir da década de 1980, se resumem à temática da gestão democrática que, embora de grande relevância, pouco têm contribuído para a elaboração de subsídios teóricos que auxiliem na formação do gestor escolar, levando-o a desenvolver competências básicas para a efetivação de uma gestão que garanta a qualidade do ensino no interior da escola. Diante do exposto, considera-se urgente a necessidade de repensar os cursos de Pedagogia, levando-se em conta os vários níveis de atuação do pedagogo, dentre eles, a gestão escolar. Sob este ponto de vista, concorda-se com Libâneo (2010) que a atuação do pedagogo escolar é de extrema importância no auxílio aos professores em relação ao trabalho pedagógico, levando-se em consideração que o processo de ensinoaprendizagem não se resume à sala de aula. Ao contrário, trata-se de um processo de alta complexidade que pressupõe a organização de um espaço físico adequado, de recursos materiais, de elaboração de projetos educacionais, entre outros aspectos que demandam conhecimentos especializados referentes à organização administrativa da escola. Não se trata, portanto, de considerar o exercício da função administrativa como tarefa de comando e poder. Conquanto essa concepção ainda seja fortemente difundida em várias esferas sociais, ela não deve ser tomada como justificativa para desconsiderar a relevância dos conhecimentos desenvolvidos no âmbito da Administração Escolar e da 65 Grupo de Estudo e Pesquisas em Política Educacional, Rio Claro, 06, 07 e 08 de julho de 2011 Vol. 3 (2011)

III Seminário Internacional de Gestão Educacional

função atribuída ao diretor de escola, cuja importância é inegável para o alcance de uma educação escolar pública de qualidade para todos.

REFERÊNCIAS:

ABDIAN, G. Z. Formação, função e formas de provimento do cargo do administrador escolar: estudo comparado entre município do Rio Grande do Sul e São Paulo. Relatório de pesquisa de pós-doutorado apresentado ao CNPq. Outubro de 2010. ALONSO, M. O papel do diretor da administração escolar. São Paulo: Diffel, 1976. ALVES, A. J. O planejamento de pesquisas qualitativas em educação. Cad. Pesq. São Paulo (77), p. 53-61, maio, 1991. BARROSO, J. O estudo da autonomia da escola: da autonomia decretada à autonomia construída. In: BARROSO, J. (org.). O estudo da escola. Porto Editora, 1996, p. 167189. BALL. S. J. Profissionalismo, gerencialismo e performatividade. Cadernos de Pesquisa, vol. 35, n. 126, p. 539-654, set./dez. 2005. BENELLI, S. J. Cartografia das instituições de assistência social a crianças e adolescentes da cidade de Marília. UNESP – Assis: 2010 (Pesquisa de PósDoutorado) BRASIL.

MEC/CONSELHO

NACIONAL

DE

EDUCAÇÃO/Conselho

Pleno.

Resolução CNE/CP n° 1/2006, aprovada em 15 de maio de 2006. Institui Diretrizes Curriculares para o Curso de Graduação em Pedagogia, licenciatura. CUNHA, L. A. Ensino superior e universidade no Brasil. In: LOPES, E. M. T.; FILHO, L. M. F.; VEIGA, C. G. 500 anos de educação no Brasil. 3ª ed., São Paulo: Autêntica, 2003, p. 151-204. FÉLIX, M. F. C. Administração Escolar: problema educativo ou empresarial? São Paulo: Cortez, 1986. FREIRE, P. Educação como prática da liberdade. Rio de Janeiro: Paz e Terra, 1989.

66 Grupo de Estudo e Pesquisas em Política Educacional, Rio Claro, 06, 07 e 08 de julho de 2011 Vol. 3 (2011)

III Seminário Internacional de Gestão Educacional

KRAWCZYK, N. R. Em busca de uma nova governabilidade da Educação. In: OLIVEIRA,

D.

A.

(Org.)

Gestão

democrática

da

educação:

desafios

contemporâneos. 9ª ed. Rio de Janeiro: Vozes 2009. p. 61-74. LIBÂNEO, J. C. Diretrizes Curriculares da Pedagogia: imprecisões teóricas e concepção estreita da formação profissional de educadores. Educação e Sociedade. Campinas, vol. 27, n° 96 – Especial, p. 843-876, out. 2006. ______________. Pedagogia e Pedagogos, para quê? 12ª ed. São Paulo: Cortez, 2010. LOURENÇO FILHO, M. B. Organização e administração escolar. São Paulo: Melhoramentos, 1963. PARO, V. H. Administração Escolar: introdução crítica. São Paulo: Cortez e Autores Associados, 1989. RIBEIRO, J. Q. Fayolismo na administração das escolas públicas. São Paulo: Linotechnica, 1938. ______________. Ensaio de uma teoria de administração escolar. São Paulo: Universidade de São Paulo, Faculdade de Filosofia, Boletim n° 158, 1952. SANDER, B. Administração da Educação no Brasil: genealogia do conhecimento. Brasília: Líber Livro, 2007. TEIXEIRA, A. S. Educação pública, sua organização e administração. Rio de janeiro, 1935. ______________. Natureza e função da administração escolar. Salvador: ANPAE, Caderno de Administração Escolar n° 1, 1964.

67 Grupo de Estudo e Pesquisas em Política Educacional, Rio Claro, 06, 07 e 08 de julho de 2011 Vol. 3 (2011)

III Seminário Internacional de Gestão Educacional

REFLEXOS DA REFORMA DA EDUCAÇÃO PROFISSIONAL TÉCNICA DE NÍVEL MÉDIO: ANÁLISE DAS MATRIZES CURRICULARES DO CURSO DE INFORMÁTICA Beatriz Galvanin [email protected] UNESP - Marília/SP Maria Sylvia Simões Bueno UNESP - Marília/SP

Resumo: O artigo apresenta um panorama geral dos aspectos históricos, econômicos e políticos que fundamentam a reforma da Educação Profissional Técnica de Nível Médio a partir da LDB 9.394/96; tomando por referência a composição do conjunto de documentos representados por oito matrizes curriculares do curso de informática, as quais apresentam algum tipo de alteração em sua organização curricular, seja na denominação dos cursos, na legislação pertinente, na carga horária, enfim alterações que tendem a proporcionar minimização e aligeiramento na formação do discente. Palavras-chave: Educação Profissional. Reforma Educacional. Matrizes Curriculares.

Apresentação das Matrizes Curriculares do Curso de Informática

Considerando a implantação da reforma da educação profissional técnica de nível médio a partir da LDB 9.394/96, envolvendo os Decretos 2.208/97 e 5.154/2004, passaremos a descrever a análise efetuada nos documentos Matrizes Curriculares de um Curso de Informática, representando as mudanças em sua organização curricular. As matrizes Curriculares utilizadas para análise são dos antigos cursos no sistema integrado – como referência o curso de Habilitação Profissional Plena de Processamento de Dados e dos novos cursos no sistema modular11 – representado pela Habilitação Profissional Técnica de Nível Médio de Técnico em Informática.

11

Organização curricular em base modular, é pautada na flexibilidade, prevê a possibilidade de percursos educacionais diferenciados. (FIDALGO E MACHADO, Eds., 2000; apud HENRIQUES, PAULO DE TARSO COSTA, 2005, disponível em: http://www.sectma.pe.gov.br/download/Organiza%C3%A7%C3%A3o%20de%20Curr%C3%ADculos%

68 Grupo de Estudo e Pesquisas em Política Educacional, Rio Claro, 06, 07 e 08 de julho de 2011 Vol. 3 (2011)

III Seminário Internacional de Gestão Educacional

Consideramos este curso – Informática -, por se tratar de um dos cursos mais antigos de uma unidade de ensino e que perdura ao longo do período delimitado por esta pesquisa; dessa forma, a fonte de informações é por meio de consulta aos arquivos da secretaria da escola, buscando analisar a documentação interna, neste caso, a organização curricular dos cursos já referidos, descrevendo as alterações ocorridas a partir de 1996 a 2004, assim como conversas informais, com pessoas que participaram desse processo, exemplo, o atual coordenador do curso de Informática que ministra aulas nesta escola desde 1995. Destacamos que o curso de Habilitação Profissional Plena de Processamento de Dados foi criado em 1991 e que na época a unidade de ensino denominava Escola Técnica Estadual de Segundo Grau (ETESG) ―Prof. Pedro Leme Brisolla Sobrinho‖; conforme a Resolução SE 273, de 20/11/1987, cujo curso durava três anos, concluindo a primeira turma em 1993, a segunda turma de 1994 a 199612 e a terceira turma de 1997 a 1999; o estudo partirá deste último período, ou seja, a organização curricular de 1997 a 1999; isto se justifica porque o documento representa à última ―grade‖ que atendia a Lei Federal 5.692/71 e a Lei Federal 7.044/82, dos antigos cursos no sistema integrado – as posteriores atendem aos cursos no sistema modular, após a Lei 9394/96. Enfatizamos que alterações em termos de conteúdos das disciplinas do antigo curso de Processamento de Dados e atual curso Técnico de Informática, se deram por conta de três mudanças significativas: última grade dos antigos cursos do sistema integrado – de 1997 a 1999 primeira matriz do novo curso do sistema modular – de 1999 a 2004 segunda matriz do curso do sistema modular – de 2004 a 2008 Dessa forma, na composição do conjunto de documentos, selecionamos oito matrizes, as quais apresentam no período especificado, algum tipo de alteração em sua organização, seja na denominação dos cursos, na legislação pertinente, na carga horária,

20por%20Compet%C3%AAncias%20-%202005%20-%20vrs.%2002-12-2005.ppt#451,1,Organização de Currículos por Competências acesso em: 15/abr/2007).

12

A partir de 01/01/1994, ocorreu a transferência da unidade de ensino para o Centro Estadual de Educação Tecnológica Paula Souza – assumindo a denominação de Escola Técnica Estadual (ETE) “Prof. Pedro Leme Brisolla Sobrinho”; através do Decreto nº. 37.735 de 27/10/93.

69 Grupo de Estudo e Pesquisas em Política Educacional, Rio Claro, 06, 07 e 08 de julho de 2011 Vol. 3 (2011)

III Seminário Internacional de Gestão Educacional

enfim algum tipo de mudança nestes documentos, como reflexo do processo de reforma da educação profissional.

Quadro Simplificado com as Características das Matrizes Curriculares do Curso de Informática

Matriz

Data da

Denominação

Legislação

Descrição do Conteúdo

homologaç

do Curso

Habilitação

-Lei Federal nº.

-Curso com séries anuais / duração de 3

Profissional

5.692/71

anos/ (sistema integrado)

Plena de

-Deliberação CEE

-Parte comum com 2.064 horas

Técnico em

29/82

-Parte

ão

Matriz 1

20/03/1998

diversificada/

mínimo

Processament

profissionalizante com 1.914 h

o de Dados

(incluía 350 h de estágio) -Matérias livres com 200 horas -Carga horária total do curso com 4.178 horas

Matriz 2

18/05/1999

Habilitação

-Lei Federal nº.

-Curso com períodos semestrais /

Profissional de

9.394/96

duração

Técnico em

-Decreto

Informática

2.208/97

nº.

de

3

semestres/

(sistema

modular) -Conteúdos Profissionalizantes:

-Parecer CNE nº.

-mínimo profissionalizante com 1.660 h

05/97

(incluía 400h de estágio);

-Indicação

CEE

nº. 01/97

-disciplinas optativas com 240h; -Carga horária total do curso com 1.900 horas. -Cada módulo, dá ao aluno concluinte uma titulação - Qualificações: 1º Ciclo – Auxiliar Administrativo 1º +2º Ciclos – Programador 1º +2º +3º Ciclos – Técnico em Informática.

Matriz 3

30/03/2001

Técnico em

-Lei Federal nº.

-Curso em módulos/ com duração de 3

Informática

9.394/96

semestres

70 Grupo de Estudo e Pesquisas em Política Educacional, Rio Claro, 06, 07 e 08 de julho de 2011 Vol. 3 (2011)

III Seminário Internacional de Gestão Educacional -Decreto

nº.

-3 módulos com carga horária de 500h

Área

2.208/97

cada por semestre, totalizando 1.500 h.

Profissional:

-Resolução

-estágio – extinto a partir do 1º

Informática

CNE/CEB 04/99

nº.

semestre de 2001; embora conste na grade 120h. Módulo I – Qualificação: Auxiliar Administrativo Módulo II – Qualificação: Programador Módulo III – Habilitação: Técnico em Informática.

Matriz 4

30/11/2001

Técnico em

-Lei Federal nº.

-Curso em módulos/ com duração de 3

Informática

9.394/96

semestres

-Decreto nº.

-3 módulos com carga horária de 500h

Área

2.208/97

cada por semestre, totalizando 1.500 h.

Profissional:

-Resolução

-não especifica sobre estágio

Informática

CNE/CEB nº.

Módulo I – Qualificação Profissional:

04/99

Auxiliar de Informática

-Parecer

Módulo II – Qualificação Profissional:

CNE/CEB nº.

Programador de Computadores

16/99

Módulo III – Habilitação Profissional:

-Indicação CEE

Técnico em Informática.

08/2000 -Portaria CETEC, de 26/01/2001, aprova o plano de curso.

Matriz 5

13/07/2004

Técnico em

-Lei Federal nº.

-Curso em módulos/ com duração de 3

Informática

9.394/96

semestres

-Decreto nº.

-3 módulos com carga horária de 500h

Área

2.208/97

cada por semestre, totalizando 1.500 h.

Profissional:

-Resolução

-não especifica sobre estágio

Informática

CNE/CEB nº.

-alteração nas disciplinas;

04/99

-alteração na denominação dos

-Parecer

módulos:

71 Grupo de Estudo e Pesquisas em Política Educacional, Rio Claro, 06, 07 e 08 de julho de 2011 Vol. 3 (2011)

III Seminário Internacional de Gestão Educacional

Matriz 6

31/01/2005

CNE/CEB nº.

Módulo I – Qualificação Profissional

16/99

de Nível Técnico de Auxiliar de

-Indicação CEE

Informática

08/2000

Módulo I+II – Qualificação Profissional

-Portaria CETEC,

de Nível Técnico de Programador de

de 26/01/2001,

Computadores

aprova o plano de

Módulo I+II+III – Habilitação Técnico

curso.

em Informática.

Técnico em

-Lei Federal nº.

-Curso em módulos/ com duração de 3

Informática

9.394/96

semestres

-Decreto nº.

-3 módulos com carga horária de 500h

Área

5.154/2004

cada por semestre, totalizando 1.500 h.

Profissional:

-Resolução

Não especifica sobre estágio.

Informática

CNE/CEB nº.

-Denominação dos módulos:

04/99

Módulo I – Qualificação Profissional de

-Parecer

Nível Técnico de Auxiliar de

CNE/CEB nº.

Informática

16/99

Módulo I+II – Qualificação Profissional

-Indicação CEE

de Nível Técnico de Programador de

08/2000

Computadores

-Portaria CETEC,

Módulo I+II+III – Habilitação Técnico

de 26/01/2001,

em Informática.

aprova o plano de curso.

Matriz 7

13/12/2005

Técnico em

-Lei Federal nº.

-Curso em módulos/ com duração de 3

Informática

9.394/96

semestres

-Decreto nº.

-3 módulos com carga horária de 500h

Área

5.154/2004

cada por semestre, totalizando 1.500 h.

Profissional:

-Resolução

Não especifica sobre estágio.

Informática

CNE/CEB nº.

-Há alteração na denominação dos

04/99

módulos:

-Parecer

Módulo I – Qualificação Profissional

CNE/CEB nº.

Técnica de Nível Médio de Auxiliar de

16/99

Informática

-Indicação CEE

Módulo I+II – Qualificação Profissional

72 Grupo de Estudo e Pesquisas em Política Educacional, Rio Claro, 06, 07 e 08 de julho de 2011 Vol. 3 (2011)

III Seminário Internacional de Gestão Educacional

Matriz 8

13/10/2006

08/2000

Técnica de Nível Médio de

-Portaria CETEC,

Programador de Computadores

de 26/01/2001,

Módulo I+II+III – Habilitação

aprova o plano de

Profissional Técnica de Nível Médio de

curso.

Técnico em Informática.

Técnico em

-Lei Federal nº.

-Curso em módulos/ com duração de 3

Informática

9.394/96

semestres

-Decreto nº.

-3 módulos com carga horária de 500h

Área

5.154/2004

cada por semestre, totalizando 1.500 h.

Profissional:

-Resolução

Não especifica sobre estágio.

Informática

CNE/CEB nº.

Módulo I – Qualificação Profissional

01/2005

Técnica de Nível Médio de Auxiliar de

-Parecer

Informática

CNE/CEB nº.

Módulo I+II – Qualificação Profissional

16/99

Técnica de Nível Médio de

-Indicação CEE

Programador de Computadores

08/2000

Módulo I+II+III – Habilitação

-Portaria CETEC,

Profissional Técnica de Nível Médio de

de 26/01/2001,

Técnico em Informática.

aprova o plano de curso.

Análise da Organização Curricular do Curso de Informática Matriz 1 A matriz 1, representada no quadro anterior, homologada em 1998, apresenta a Habilitação Profissional Plena de Técnico em Processamento de Dados da ETE prof. Pedro Leme Brisolla Sobrinho (curso criado em 1991), no antigo sistema de ensino integral, anterior à Reforma da Educação Profissional. Tinha por objetivo este curso: ―dotar o aluno de conhecimento técnico de Sistemas Operacionais, Linguagem de Programação, aplicação prática de Análise de Sistemas e técnicas Administrativas‖; e ainda: ―conscientizá-los dos direitos e deveres como Técnico em Processamento de Dados‖. (PLANO DE ENSINO, 1998). Nesta matriz, predomina a Lei Federal nº. 5.692/71 que reformulou a Lei Federal n.º.4.024/61 no tocante ao ensino de primeiro e de segundo graus, atual educação 73 Grupo de Estudo e Pesquisas em Política Educacional, Rio Claro, 06, 07 e 08 de julho de 2011 Vol. 3 (2011)

III Seminário Internacional de Gestão Educacional

básica, introduzindo a profissionalização generalizada no ensino médio, então denominado segundo grau; traz, no seu artigo 4º, que ―os currículos do ensino de 1º e 2º graus terão um núcleo comum, obrigatório em âmbito nacional, e uma parte diversificada para atender, conforme as necessidades e possibilidades concretas, às peculiaridades locais, aos planos dos estabelecimentos e às diferenças individuais dos alunos‖; e ainda, ―para o ensino de 2º grau, o Conselho Federal de Educação fixará, além do núcleo comum, o mínimo a ser exigido em cada habilitação profissional ou conjunto de habilitações afins‖ (§ 3º do art.4º). Destacamos que a Lei Federal nº. 5.692/71 foi criada no período ditatorial, conforme consta no Portal Pedagógico de Santa Catarina, destacamos que ―o movimento de militarização dos governos latino-americanos, para garantir no continente os interesses políticos e econômicos das economias capitalistas desenvolvidas do Norte, marcou a educação com a introdução do tecnicismo‖, definindo o termo como ―um movimento que coloca as técnicas educacionais acima dos conteúdos curriculares, a compulsória profissionalização do ensino médio e um patrulhamento ideológico feroz sobre a educação‖, pois ―só permitia o ensino dentro dos princípios aprovados pelo governo e pelos grupos econômicos aos quais o mesmo servia‖ (PORTAL DIA-A-DIA EDUCAÇÃO, 2007). De acordo com a Lei 5.692/71, na matriz 1, o CEETEPS, segue suas orientações, percebidas na denominação do curso, como Habilitação Profissional Plena (sistema integrado), na duração do curso, de 3 anos, na especificação de parte comum com 2.064 horas e parte diversificada (mínimo profissionalizante) com 1.914 horas, com predomínio do estágio (incluída 350 horas), e ainda constando às chamadas ―matérias de livre escolha‖, com 200 horas, destacando o curso uma carga horária de 4.178 horas. Como relatado no início, esta matriz 1, foi implantada na Escola Técnica Estadual de Segundo Grau (ETESG) ―Prof. Pedro Leme Brisolla Sobrinho‖; atual ETE Prof. Pedro Leme Brisolla Sobrinho, como primeira turma, de 1991 a 1993, como segunda turma, de 1994 a 1996, e como terceira turma, de 1997 a 1999, perdurando assim, por 9 anos.

Matriz 2 Na matriz 2, homologada em 1999, apresenta a Habilitação Profissional de Técnico em Informática da ETE prof. Pedro Leme Brisolla Sobrinho, podemos perceber 74 Grupo de Estudo e Pesquisas em Política Educacional, Rio Claro, 06, 07 e 08 de julho de 2011 Vol. 3 (2011)

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alteração na denominação do curso, que deixou de constar ―Habilitação Profissional Plena‖ por não incluir as disciplinas da ―parte comum‖ (sistema integrado, de 3 anos de duração), e passou para ―Habilitação Profissional‖ por atender ao sistema modular (somente com disciplinas profissionalizantes, com duração de 3 semestres, onde cada módulo dá ao aluno concluinte uma titulação). Percebemos também uma mudança significativa na denominação do curso de ―Processamento de Dados‖ para ―Informática‖, representando assim maior abrangência, ou seja, além de envolver o desenvolvimento de software como antes, devido à intensificação das tecnologias, agora inclui também atividades relacionadas à parte de hardware, redes, internet...; este aspecto que pode ser percebido na alteração de algumas disciplinas, como a inclusão de ―Arquitetura de Computadores e Redes‖. Apresenta o técnico em informática, com novo perfil, ―o profissional que desenvolve e opera sistemas, aplicações, interfaces gráficas; monta estrutura de banco de dados, e codifica programas; projeta, implanta e realiza manutenção de sistemas e aplicações; seleciona recursos de trabalho, linguagens de programação, ferramentas e metodologias para o desenvolvimento de sistemas‖ (ETE Prof. Pedro Leme Brisolla Sobrinho, 2007). Apresenta também, como alteração, um aumento na carga horária referente ao estágio de 350h para 400h, embora haja a diminuição na carga horária total do curso de 4.178 h para 1.900 horas.

Esta

matriz

contempla a Lei Federal nº. 9.394/96 a segunda LDB, a qual revogou a Lei Federal nº. 5.692/71, estabelecendo as Diretrizes e Base da Educação Nacional – abordando sobre a educação profissional em ―articulação‖ com o ensino médio; e o Decreto nº. 2.208/97, que trata da separação no oferecimento do curso técnico do ensino médio. Nesse sentido, afirma Guimarães (2007) que as mudanças das políticas para o ensino médio e educação profissional, configuram um período de crise, percebidos na legislação dos anos 90 em relação à trabalho e educação. Destaca a autora que na LDB e no Projeto de Lei nº. 1.603/96 (que resultou no Decreto 2.208/97), há conflito em duas concepções pedagógicas sobre a relação trabalho e educação: - a Concepção Conservadora, que considera o ensino médio como escolarização clássica, onde a formação se dá através do conhecimento e da competência técnica; e o ensino técnico é considerado ―preparação instrumental para o trabalho e no ambiente de trabalho‖. De outra forma, a Perspectiva Dialética Gramsciana, enfatiza uma escola única e politécnica, focada na ―educação política dos trabalhadores, voltada para formação do sujeito autônomo, da consciência crítica e emancipatória‖. (GUIMARÃES, 2007). 75 Grupo de Estudo e Pesquisas em Política Educacional, Rio Claro, 06, 07 e 08 de julho de 2011 Vol. 3 (2011)

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Como alguns dos pontos fracos ou falhos do Decreto Federal 2.208/97, Ivers (2000) ressalta: 1) supõe a ruptura entre o saber acadêmico, desvalorizado por não ser prático, e o saber para o trabalho, desvalorizado por não ser teórico. – 2) minimiza o fato de que um currículo integrado, composto organicamente de conteúdos gerais e técnicos seria mais adequado – 3) confia uma tarefa de alta complexidade pedagógica ao aluno, quando permite cursar diferentes módulos em diferentes instituições. Com a edição da nova LDB e toda legislação que a ela se seguiu, segundo Palma Filho (2005, p.14-15) demonstram as mudanças de rumos da questão educacional brasileira a partir dos anos 90, representados pelo Plano Nacional de Educação, Diretrizes Curriculares e estabelecimento de um Sistema Nacional de Avaliação. Inclusive o Centro Paula Souza, criou o SAI - Sistema de Avaliação Institucional o qual foi validado em 1998 e implantado em 1999 em todas ETEs e Fatecs. Percebemos assim, que na organização da matriz 2, segue as determinações da LDB 9.394/96 e o Decreto 2.208/97, pois este determina no artigo 3º a Educação Profissional em três níveis: Básico, Técnico e Tecnológico, no caso a Habilitação Profissional de Técnico em Informática; no artigo 5º, define a Educação Profissional de nível técnico terá ―organização curricular própria e independente do ensino médio, podendo ser oferecida de forma concomitante ou seqüencial a este‖ – assim, a matriz 2, apresenta somente conteúdos profissionalizantes e modularizados (três módulos de um semestre cada, totalizando um ano e meio de curso). O artigo 6º do Decreto Federal 2.208/97 aborda sobre a ―formulação dos currículos plenos dos cursos do ensino técnico‖, que obedecerá ao seguinte: ―estabelecerá diretrizes curriculares nacionais, constantes de carga horária mínima do curso, conteúdos mínimos, habilidades e competências básicas, por área profissional‖ (inciso I); ―os órgãos normativos do respectivo sistema de ensino complementarão as diretrizes definidas no âmbito nacional e estabelecerão seus currículos básicos, onde constarão as disciplinas e cargas horárias mínimas obrigatórias, conteúdos básicos, habilidades e competências, por área profissional (inciso II); ―o currículo‖ básico, referido no inciso anterior, não poderá ultrapassar setenta por cento da carga horária mínima obrigatória, ficando reservado um percentual mínimo de trinta por cento para que os estabelecimentos de ensino, independente de autorização prévia, elejam disciplinas, conteúdos, habilidades e competências específicas da sua organização curricular (inciso III). Atendendo a este inciso III, do Art.6º do Decreto 2.208/97, percebemos na matriz 2, a inclusão de 76 Grupo de Estudo e Pesquisas em Política Educacional, Rio Claro, 06, 07 e 08 de julho de 2011 Vol. 3 (2011)

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disciplinas optativas, focadas em matemàtica (financeira), inglês (instrumental), tecnologia e meio ambiente, ética e cidadania, direito e legislação, e leitura e produção de texto; embora deixe de apresentar as disciplinas da ―parte comum‖ da matriz anterior. Matriz 3 Na matriz 3, homologada em março de 2001, apresenta a organização curricular do Curso Técnico em Informática, especificando a Área Profissional: Informática podemos perceber que esta matriz, além de atender a Lei Federal nº. 9.394/96, em conformidade com o Decreto nº. 2.208/97, faz menção à Resolução CNE/CEB nº. 04/99, através da qual, são instituídas as Diretrizes Curriculares Nacionais para a Educação Profissional de Nível Técnico, definindo seus princípios norteadores. No artigo 5º estabelece que ―a educação profissional de nível técnico será organizada por “áreas profissionais”, para isto, apresenta um quadro com 20 habilitações, com as respectivas cargas horárias mínimas de cada habilitação; conforme percebemos na matriz 3, Área Profissional: Informática. O artigo 6º define competência profissional como ―a capacidade de mobilizar, articular e colocar em ação valores, conhecimentos e habilidades necessários para o desempenho eficiente e eficaz de atividades requeridas pela natureza do trabalho‖; e, em seu parágrafo único, faz referência ―as competências requeridas pela educação profissional, considerada a natureza do trabalho‖, são: competências básicas, competências profissionais gerais; e, competências profissionais específicas de cada qualificação ou habilitação. No artigo 7º, enfatiza que os perfis profissionais de conclusão de qualificação, de habilitação e de especialização profissional de nível técnico serão estabelecidos pela escola, consideradas as competências. No artigo 9º garante a Resolução nº. 04/99, que ―a prática constitui e organiza a educação profissional e inclui, quando necessário, o estágio supervisionado realizado em empresas e outras instituições‖; assim percebemos a extinção do estágio a partir do 1º semestre de 2001 na matriz 3. No artigo 18 destaca que a observância das diretrizes constantes nesta Resolução seria obrigatória a partir de 2001. Segundo Lopes (2002, p. 291) as Diretrizes Curriculares Nacionais para a Educação Profissional de Nível Técnico compõem o conjunto de documentos que serviram de apoio no planejamento e desenvolvimento do currículo da escola; integrando princípios curriculares como interdisciplinaridade, contextualização e 77 Grupo de Estudo e Pesquisas em Política Educacional, Rio Claro, 06, 07 e 08 de julho de 2011 Vol. 3 (2011)

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currículo por competências no seu discurso. Onde, análises procuram desbastar o que Veríssimo (apud ZIBAS, 2005, p.26) denominou de ―inferno semântico‖ das diretrizes curriculares onde ―os significados partilhados por uma literatura progressista são sutilmente enviesados ou tornados ‗híbrido‘, como aponta Lopes (2002a), procurando legitimação ao embaralhar os campos político-ideológicos, confundindo a crítica.‖ (ZIBAS, 2005, p.26). A matriz 3 apresenta uma redução de carga horária em comparação à organização curricular da matriz 2, a qual totalizava 1.900h e agora totaliza 1.500 horas, mantendo as mesmas disciplinas, porém extinguindo o estágio (400 horas).

Matriz 4 Podemos perceber poucas alterações na organização curricular do Curso Técnico em Informática representado na Matriz 4, homologada em novembro de 2001, em relação à Matriz 3. As alterações registradas são em relação aos textos normativos, que além da Lei Federal nº. 9.394/96, o Decreto nº. 2.208/97, a Resolução CNE/CEB nº. 04/99, menciona o Parecer CNE/CEB nº. 16/99 que define os princípios gerais e específicos da educação profissional de nível técnico e a Portaria CETEC, de 26/01/2001, a qual aprova o plano de curso. Há também alteração na matriz 4, em relação à denominação da qualificação no Módulo I, que na matriz 3, especificava como Qualificação: Auxiliar Administrativo, e na matriz 4, passou a especificar como Qualificação Profissional: Auxiliar de Informática. Mantém os três módulos com carga horária de 500h cada por semestre, totalizando 1.500 h, não mencionando sobre estágio.

Matriz 5 A matriz 5, homologada em julho de 2004, apresenta na organização curricular do Curso Técnico em Informática, os mesmos textos normativos da matriz 4, porém há alterações significativas em termos de mudanças nas disciplinas e na denominação dos módulos. Percebemos no módulo I, da matriz 5, que há um aumento da carga horária das disciplinas técnicas, específicas do curso, sem o aumento da carga horária total deste módulo; na realidade houve exclusão de disciplinas como Ética e Cidadania, Direito e Legislação, Leitura e Produção de Textos, apresentando redução de 10 disciplinas 78 Grupo de Estudo e Pesquisas em Política Educacional, Rio Claro, 06, 07 e 08 de julho de 2011 Vol. 3 (2011)

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ofertadas na matriz 4, para 7 disciplinas no módulo I da matriz 5. No módulo II, há a extinção da disciplina Tecnologia e Meio Ambiente, e no módulo III têm-se a impressão que há uma ―compactação‖ de disciplinas, como: Gestão, Cidadania e Qualidade com carga de 40 horas. Um ponto em comum nos módulos I, II e III da matriz 5, é a alteração na denominação das disciplinas, que antes estavam focadas em Técnicas e Linguagens de Programação, Técnicas de Sistemas de Processamento de Dados e Técnicas de Operação, e em decorrência da difusão das tecnologias são substituídas para Operação e Desenvolvimento de Software, Aplicativos para Internet, Redes de Computadores e outras; buscando atender as alterações na Informática que antes consistia no processamento de informações e agora agregam novos elementos como a internet, redes, etc. Quanto à alteração na denominação dos módulos: Módulo I – Qualificação Profissional de Nível Técnico de Auxiliar de Informática Módulo I+II – Qualificação Profissional de Nível Técnico de Programador de computadores Módulo I+II+III – Habilitação Técnico em Informática. Pretende atender ao que está determinado no Decreto Federal 2.208/97, quanto aos níveis da educação profissional, no artigo 3º como: ―básico: destinado à qualificação e reprofissionalização de trabalhadores, independente de escolaridade prévia‖ (inciso I); o ―técnico: destinado a proporcionar habilitação profissional a alunos matriculados ou egressos do ensino médio, devendo ser ministrado na forma estabelecida por este Decreto‖ (inciso II); e o ―tecnológico: correspondente a cursos de nível superior na área tecnológica, destinados a egressos do ensino médio e técnico‖ (inciso III).

Matriz 6 A matriz 6, homologada em 28/01/2005, mantêm as mesmas disciplinas da matriz 5, porém, há a substituição do Decreto 2.208/97, para o Decreto Federal 5.154/2004, embora continue com a Resolução CNE/CEB nº. 04/99, e o Parecer CNE/CEB nº. 16/99 que define as Diretrizes Curriculares e os Princípios gerais e específicos da educação profissional de nível técnico do Decreto anterior. Através da revogação do Decreto n. 2.208/97 pelo Decreto Federal 5.154/2004, destacam Frigotto, Ciavatta & Ramos (2005) esperava-se que o tratamento a ser dado à educação profissional seria de reconstruí-la como política pública e corrigir distorções 79 Grupo de Estudo e Pesquisas em Política Educacional, Rio Claro, 06, 07 e 08 de julho de 2011 Vol. 3 (2011)

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de conceitos e de práticas decorrentes de medidas adotadas anteriormente, que de maneira explícita ―dissociaram a educação profissional da educação básica, aligeiraram a formação técnica em módulos dissociados e estanques, dando um cunho de treinamento superficial à formação profissional e tecnológica‖, acrescentando ainda que restabeleceu-se a possibilidade de integração curricular dos ensinos médio e técnico. Dispõe o Decreto 5.154 de 23/07/2004 (BRASIL, 2004) que a ―educação profissional técnica de nível médio‖ - será desenvolvida de forma articulada com o ensino médio - dar-se-á de forma integrada, concomitante, ou subseqüente.

Matriz 7 Matriz 7, homologada em 13/12/2005, podemos observar a alteração na denominação dos módulos em conformidade com o Decreto nº. 5.154/2004, com fundamento no Parecer CNE/CEB n° 39/2004, homologado em 6 de janeiro de 2005, e a Resolução CNE/CEB nº. 1, de 03 de fevereiro de 2005; a qual ―atualiza as Diretrizes Curriculares Nacionais definidas pelo Conselho Nacional de Educação para o Ensino Médio e para a Educação Profissional Técnica de nível médio às disposições do Decreto nº. 5.154/2004‖. A Resolução CNE/CEB nº. 1/2005, no artigo 3º dispõe que: ―a nomenclatura dos cursos e programas de Educação Profissional passará a ser atualizada‖ especificando que o termo: ―Educação Profissional de nível técnico‖ passa a denominar-se ―Educação Profissional Técnica de nível médio‖ (inciso II).

Porém,

a matriz 7 embora apresente as novas nomenclaturas dos módulos, não faz menção ao Parecer 39/2004 e Resolução 01/2005 do Decreto nº. 5.154/2004, mas sim a Resolução e Parecer do Decreto anterior (Decreto 2.208/97). Relatam os autores Frigotto, Ciavatta & Ramos (2005), que o Parecer n. 39/2004 e a Resolução n. 01/2005, que atualizariam as Diretrizes Curriculares Nacionais vigentes às disposições do Decreto n. 5.154/2004, contraditoriamente resultaram na manutenção das concepções que orientaram a reforma realizada por meio do Decreto n. 2.208/97. A adequação das Diretrizes Curriculares Nacionais à Educação Profissional Técnica de nível médio ao Decreto n. 5.154/2004 para orientar os sistemas de ensino e as escolas em sua implantação, permaneceram com os princípios e conteúdos do decreto anterior. Destacam os autores Frigotto, Ciavatta & Ramos (2005) que, na disputa pela revogação do Decreto n. 2.208/97 por um novo decreto, o sentido do texto que dispunha 80 Grupo de Estudo e Pesquisas em Política Educacional, Rio Claro, 06, 07 e 08 de julho de 2011 Vol. 3 (2011)

III Seminário Internacional de Gestão Educacional

sobre a necessidade de se observar os objetivos contidos nas Diretrizes Curriculares Nacionais, não estava na manutenção das diretrizes vigentes, mas sim na perspectiva de novas diretrizes que deveriam ser lavradas posteriormente, após debate com os sistemas e as instituições de ensino e docentes. Sobre o Parecer n. 39/2004, Frigotto, Ciavatta & Ramos (2005), afirma que, para se implantar a nova forma introduzida por esse decreto, qual seja, a integração do ensino médio com a educação profissional, não se poderiam manter as mesmas diretrizes definidas para o ensino médio e para a educação profissional técnica vigentes. A demonstração de que não há qualquer "nova concepção" pedagógica nesse parecer é a compreensão de que a educação profissional técnica de nível médio deva ser oferecida simultaneamente e ao longo do ensino médio. A proposta de integração distingue-se de simultaneidade. Este último princípio está de acordo com aquele que se manifesta permanentemente no parecer: o da independência entre os cursos. Não foi isso que se buscou instituir com o Decreto n. 5.154/2004. Uma das alterações propostas pelo parecer e incorporada pela Resolução n. 01/2005, no seu primeiro artigo, foi o acréscimo de um parágrafo 3º ao artigo 12 da Resolução n. 03/98, descrevendo as formas como a educação profissional técnica de nível médio poderá se articular com o ensino médio, sem revogar o parágrafo 2º O texto desse parágrafo determina que a possibilidade de o ensino médio prepare para o exercício de profissões seja condicionada à independência dos cursos. Na hipótese de não ter sido um descuido do relator, haveria, certamente, o propósito de se manter o princípio da independência dos cursos que se tentou superar com o novo decreto. Dessa forma, Frigotto, Ciavatta & Ramos (2005) enfatizam que apesar de reconhecer a forma integrada como um curso único, com matrícula e conclusão únicas, o parecer considera que os conteúdos do ensino médio e os da educação profissional de nível técnico são de "naturezas diversas". Re-estabelece-se, assim, internamente ao currículo, uma dicotomia entre as concepções educacionais de uma formação para a cidadania e outra para o mundo do trabalho, ou de um tipo de formação para o trabalho intelectual e de outro tipo para o trabalho técnico e profissional.

Matriz 8 Na Matriz 8, homologada em 13/10/2006, em relação aos textos normativos, podemos perceber que embora faça referência ao Decreto nº. 5.154/2004, e a sua 81 Grupo de Estudo e Pesquisas em Política Educacional, Rio Claro, 06, 07 e 08 de julho de 2011 Vol. 3 (2011)

III Seminário Internacional de Gestão Educacional

respectiva resolução (Resolução CNE/CEB nº. 1/2005), permanece a Resolução CNE/CEB nº. 4/99 e o Parecer CNE/CEB nº. 16/99 pertencentes ao Decreto anterior; demonstrando como afirmam alguns autores, que não há uma nova concepção para a Educação Profissional Técnica de Nível Médio. Resultado da Análise da Organização Curricular do Curso de Informática Diante da composição do conjunto de documentos analisados, envolvendo oito matrizes curriculares do curso de Informática da ETE Prof. Pedro Leme Brisolla Sobrinho, as quais apresentaram no período de 1996 a 2004, algum tipo de alteração em sua organização, seja na denominação dos cursos, na legislação pertinente, na carga horária, enfim algum tipo de mudança como reflexo do processo de reforma da educação profissional, foi possível identificar alguns aspectos que serão destacados em tópicos para melhor compreensão: a). Carga horária e tempo de duração do curso Percebe-se nas matrizes curriculares que ao longo do período delimitado 1996 a 2004, há redução na carga horária e no tempo de duração do curso; a carga horária inicia com 4.178 horas, passando para 1.900 horas, depois 1500 horas, condensando de 3 anos para 3 semestres a duração total; b). Extinção do estágio Ocorre a extinção do estágio ou a substituição do mesmo por Trabalho de Conclusão de Curso, resultando na diminuição de 400 horas na carga total do curso, pois estas eram destinadas ao estágio; c). Adaptação das matrizes às mudanças do mercado Há uma preocupação em adaptar as matrizes acompanhando as mudanças que ocorrem no mercado evidenciadas através de alterações na nomenclatura do curso, alteração nas disciplinas - tanto na denominação, quanto na exclusão de algumas disciplinas de caráter humanístico e aumento na carga horária em disciplinas técnicas; d). Inconstância nas determinações Se considerarmos um período de 8 anos entre a primeira e a última matriz do curso Técnico em Informática, teremos uma média de uma matriz por ano com algum tipo de alteração, revelando a inconstância nas determinações; pois se a média de duração do curso são 3 semestres, quando nem mesmo uma turma está se formando, há modificações na matriz para a próxima turma do curso. 82 Grupo de Estudo e Pesquisas em Política Educacional, Rio Claro, 06, 07 e 08 de julho de 2011 Vol. 3 (2011)

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e). As matrizes reproduzem as determinações da legislação educacional Percebe-se nos conteúdos das matrizes curriculares que fazem menção à legislação educacional; citam as leis, os decretos e efetuam adaptações nos conteúdos para atendêlas. CONSIDERAÇÕES FINAIS

Ao verificar os aspectos da reforma adotada pelo CEETEPS, através de análise documental realizada em uma de suas unidades de ensino - ETE Prof. Pedro Leme Brisolla Sobrinho, nas matrizes curriculares do curso Técnico de Informática, pode-se mapear o encaminhamento dado pela instituição na implantação da reforma da Educação Profissional Técnica de Nível Médio; registrando-se assim, as proposições desenvolvidas por essa instituição. Esta pesquisa permitiu desvelar os fundamentos da reforma, especificando suas determinações e relações com o contexto em que se trocam influências. Ainda, a reforma educativa é percebida na organização e gestão da escola a qual será responsabilizada pela formação do trabalhador. Dessa forma, a descentralização, a flexibilidade dos currículos, a autonomia das unidades escolares, o estabelecimento de um processo de avaliação externa sobre os sistemas de ensino fazem parte de alguns dos conceitos incorporados nas reformas, além de modelos e métodos de gestão privada, sobretudo empresarial, que tendem a ser apresentados como paradigmas. Esta percepção se consolida nos documentos oficiais, na legislação, que expressam as políticas adotadas pelo governo e também na literatura com análise-crítica de alguns autores sobre as reformas. Dessa forma, tomando por referência a Legislação Educacional referente à educação profissional técnica de nível médio, a partir LDB 9.394/96 abrangendo os Decretos 2.208/97 e 5.154/2004, através dos recortes efetuados, as terminologias convergem aos conceitos como: flexibilidade, competência, autonomia e dispõem que o MEC promoverá processo nacional de avaliação da educação garantida a divulgação dos resultados. Também é destacado na análise-crítica de alguns autores selecionados que abordam sobre a reforma educacional que há necessidade de distinguir as realidades: mercado de trabalho e mundo do trabalho, que dissociaram a educação profissional da educação básica, aligeiraram a formação técnica em módulos dissociados; que deveriam integrar os princípios da ciência, do trabalho e da cultura na formação dos alunos. Tais 83 Grupo de Estudo e Pesquisas em Política Educacional, Rio Claro, 06, 07 e 08 de julho de 2011 Vol. 3 (2011)

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autores criticam a sobreposição de disciplinas de formação geral e específica ao invés da integração, e enfatizam que a proposta de integração difere da idéia de simultaneidade; que re-estabece a dicotomia entre um tipo de formação para o trabalho intelectual e outro para o trabalho técnico e profissional; reiterando a ênfase no individualismo e na formação por competências voltadas para a empregabilidade, bem como reforçando o viés ―adequacionista‖ da educação aos princípios neoliberais. Tais análises críticas destacam ainda, que as reformas educacionais estão buscando: obter um melhor desempenho escolar no que tange à aquisição de competências e habilidades relacionadas ao trabalho; obter controles mais direto sobre os conteúdos curriculares e sua avaliação; adotar teorias e técnicas gerenciais próprias do campo da administração de empresas; requerer a participação em processos competitivos para o acesso aos recursos. Assim, pode-se perceber que no contexto local, caracterizado pelo CEETEPS, através de uma de suas unidades de ensino, a ETE Prof. Pedro Leme Brisolla Sobrinho, articula-se com os demais contextos através das terminologias e ideologia presentes em seus documentos, pois com a análise documental das Matrizes Curriculares do Curso de Informática, percebemos nestas matrizes, reprodução das determinações da legislação educacional, incluindo decretos e resoluções; redução de carga horária e tempo de duração do curso; extinção do estágio; adaptação das matrizes às mudanças do mercado; e inconstância nas determinações, o que nos leva a visualizar reflexos da reforma educacional na unidade investigada que evidenciam aligeira mento e precarização da formação.13

REFERÊNCIAS

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Atualmente, as diretrizes curriculares para o ensino médio estão sendo alteradas, abrindo um espaço maior para cursos integrados e rediscutindo as principais categorias teóricas envolvidas. Todavia, ainda não há nada definitivo. Enquanto isso, em São Paulo, parece haver uma tendência de ampliação da carga horária dos cursos a partir de 2011.

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______. Ministério da Educação e Cultura. Conselho Nacional de Educação. Câmera de Educação Básica. Resolução nº. 04 de dezembro de 1999b. Institui as Diretrizes curriculares nacionais para a educação profissional de nível técnico. Disponível em: < http://portal.mec.gov.br/setec/arquivos/pdf/legisla06.pdf > Acesso em: 12 jul. 2006. 85 Grupo de Estudo e Pesquisas em Política Educacional, Rio Claro, 06, 07 e 08 de julho de 2011 Vol. 3 (2011)

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USO DE SISTEMA INFORMACIONAL PELO GESTOR ESCOLAR: UM ESTUDO EM REPRESENTAÇÕES SOCIAIS Elisabete Ferreira Soares [email protected] Universidade Católica de Santos – UNISANTOS

Resumo: Sistema informacional gera relatórios que favorecem organização da escola e implementação de reformas educacionais. A pesquisa de abordagem qualitativa, apoiada pelo estudo das representações sociais, questiona: quais são as representações sociais de gestores escolares sobre a utilização de um sistema informacional? A investigação iniciou com levantamento no Banco de Teses da Capes, seguiu com pesquisa exploratória que analisou o registro de reuniões de professores, aplicação de questionário e, direcionado às representações sociais, um instrumento teste. Consultouse, Lévy (2001), Lima (2001), Moscovici (2003), Nóvoa (1993), Spink (1995), entre outros. Palavras-chave: sistema informacional; gestor escolar; representações sociais

Introdução A implantação de um sistema informacional em uma rede de ensino mostrou-se, como uma ferramenta facilitadora do trabalho rotineiro da escola uma vez que informatizou, a princípio, a maior parte do trabalho da secretaria da escola e gera relatórios atualizados em tempo real. E tais relatórios podem auxiliar o gestor escolar na organização do trabalho na escola e nas tomadas de decisões que incidem no aprimoramento educacional. Essa mudança não pode ser considerada como um fato isolado. É a marca de um tempo, onde as constantes inovações tecnológicas introduzidas mudam valores, hábitos e costumes. A Internet permite o acesso a muitas informações sobre a escola que auxiliam na tomada de decisão tanto para a implantação de políticas públicas, como para a gestão da escola. Este artigo descreve a pesquisa em andamento que investiga as representações sociais de gestores escolares em relação ao uso de dados informacionais. Modernidade, em uma linguagem popular, pode significar: fazer mais coisas, em menos tempo, de forma mais segura; ter instrumentos cada vez menores, com mais recursos, com mais funcionalidades. Quando uma inovação surge no mercado 87 Grupo de Estudo e Pesquisas em Política Educacional, Rio Claro, 06, 07 e 08 de julho de 2011 Vol. 3 (2011)

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comercial, algo mais evoluído já está em processo de produção. Assim, fica-se sempre aguardando a próxima novidade. Com maior resistência ou não, a cada introdução de novas tecnologias, todos têm suas vidas afetadas, desde a pessoa mais humilde, que utiliza um cartão eletrônico para receber um benefício do governo, até os que têm acesso aos aparelhos eletrônicos mais sofisticados e de última geração. Lévy (2000, p.44), assim apresenta o quanto a rotina diária de todos está impregnada de tecnologia: ...os computadores do hardware (sensores, memórias, processadores etc.) podem ser encontrados em outros lugares que não os computadores propriamente ditos: cartões inteligentes, terminais de bancos, robôs, motores, eletrodomésticos, automóveis, copiadoras, fax, câmeras de vídeo, telefones, rádios, televisões, até os nós das redes de comunicação... em qualquer lugar onde a informação digital seja processada automaticamente.

As atuais tecnologias minimizaram as distâncias geográficas e expandiram a comunicação. Hoje, redes científicas e tecnológicas ligam entre si centros de pesquisa e empresas do mundo inteiro. Mesmo ocorrendo a desigualdade social que impossibilita que todos tenham o mesmo nível de acesso às tecnologias, ―por meio dos computadores e das redes, as pessoas mais diversas podem entrar em contato, dar as mãos ao redor do mundo‖ (LÉVY, 2000, p. 119). Os avanços da tecnologia de comunicação ocorreram de forma mais ágil e rápida após a invenção do telégrafo elétrico, depois pelos meios de comunicação de massa e, chegando aos nossos dias, com a rede de comunicação – Internet. ―Se o século XX foi o século da produção industrial, dos bens de consumo durável, o século XXI será o século da informação, da sociedade do conhecimento‖ (DOWBOR, 2008, p. 37). Nesse cenário de desenvolvimento tecnológico, temos na informática um novo campo de conhecimento, com conceitos próprios e várias áreas de especialização. O dicionário Houaiss da Língua Portuguesa, define a informática como o ―ramo do conhecimento dedicado ao tratamento da informação mediante o uso de computadores e demais dispositivos do tratamento de dados‖. Bio (1996) destaca que o termo ―sistema‖ é utilizado em várias áreas de conhecimento, mas traz em si o sentido de conjunto de elementos que se organizam. O autor, ao tratar de tecnologia de informação, considera sistema como: um conjunto de elementos interdependentes, ou um todo organizado, ou partes que interagem formando um corpo unitário e complexo. No

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III Seminário Internacional de Gestão Educacional entanto, é preciso distinguir sistemas fechados, como as máquinas, o relógio, etc., dos sistemas abertos, como os sistemas biológicos e sociais: o homem, a organização, a sociedade (p.18).

Dowbor (2008) esclarece que um sistema de informação permite organizar, coletar, processar, transmitir e disseminar dados. Em um sistema de informação várias partes trabalham juntas, com o objetivo de um fluxo mais confiável e menos burocrático. Um sistema de informação bem desenvolvido permite maior agilidade e organização dos dados, redução de custos e ganho de produtividade. O autor ainda destaca que a informática, associada às telecomunicações permite: a) estoque de forma prática, cada vez mais simples, um grande volume de informação; b) acesso de banco de dados sociais e individuais de uso simples e prático; c) transmissão da informação de forma flexível, de baixo custo e preciso; d) integração da imagem fixa ou animada, do som ao texto; e) manejo de sistemas sem ser especialista, isto significa que a utilização de um sistema não necessita que o usuário aprenda uma linguagem de programação. Neste último item, o fator humano é essencial para a utilização do sistema. Dowbor (2008, p. 26), a esse respeito, cita que os programas classificados como redes sociais podem ter ―o processo pouco mais complicado que o da aprendizagem do uso da máquina de escrever, mas exige também uma mudança de atitudes frente ao conhecimento de forma geral, mudança cultural que esta sim é frequentemente complexa.‖ O sistema de informação gera dados que são a matéria bruta. Os significados que são associados a esses dados geram uma informação. Assim, a um mesmo dado podem ser associados diversos valores, conforme o contexto e todas as variáveis possíveis. Esse dado visto com o valor a ele atribuído torna-se uma informação. Experiências anteriores envolvendo essa informação remetem ao conhecimento, que é um dos indicadores para a utilização dessa informação. Fazendo uma incursão nos conhecimentos da área de informática, Bio (1996, p.29) apresenta tais conceitos: Quanto à ―informação‖, haveria muitas formas de conceituá-la, depende do ângulo de observação e do campo de conhecimento em que se busque tal conceito. Do ponto de vista mais específico de sistemas de informação, examina-se o conceito a partir do entendimento da informação como resultado do tratamento de dados. Assim, pode-se entender o dado como um elemento da informação (um conjunto de letras ou dígitos), que, tomado isoladamente, não transmite nenhum conhecimento, ou seja, não contém significado

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III Seminário Internacional de Gestão Educacional intrínseco. Por exemplo, as anotações ―Cia. XYZ S.A‖, ―Cr$ 30.000,00‖, ―saldo devedor‖, por si sós não transmitem uma informação, são apenas dados. Entretanto, quando se diz: ―Cia. XYZ S.A. - saldo devedor = Cr$ 30.000,00‖, aí, sim, a partir da associação dos dados, transmite-se um conhecimento. Portanto, o tratamento e a estruturação dos dados geram uma informação.

A gama de dados oferecidos pela tecnologia de informação e a forma como são trabalhados tornam-se essenciais na utilização da tecnologia. Ganha-se tempo para o acesso aos dados e espaço para o armazenamento de informações, mas é o homem e não a máquina que fará a diferença no aplicativo desse conhecimento. Dowbor (2008, p. 9) esclarece que: As tecnologias em si não são ruins. Fazer mais coisas com menos esforço é positivo. Mas as tecnologias sem a educação, conhecimentos e sabedoria que permitem organizar o seu real aproveitamento, levamnos apenas a fazer mais rápido e em maior escala os mesmos erros.

As tecnologias do conhecimento incidem também na área da educação. As inovações tecnológicas levam a escola a rever seus objetivos como instituição educacional. Pela primeira vez na história da humanidade, a maioria das competências adquiridas por uma pessoa no início de seu percurso profissional estarão obsoletas no fim de sua carreira. A segunda constatação, fortemente ligada à primeira, diz respeito à nova natureza do trabalho, cuja parte de transação de conhecimentos não para de crescer. Trabalhar quer dizer, cada vez mais aprender, transmitir saberes e produzir conhecimentos (LÉVY, 2000, p.157).

A tecnologia de informação disponibiliza, em rede, dados que possibilitam à escola uma ampla visão da comunidade escolar, que se estende a vários campos de atendimento ao aluno: Bolsa Família, Índice de Desenvolvimento Humano (IDH), Índice de Desenvolvimento da Educação Básica (IDEB), Prova Brasil, entre outros. Outros dados são gerados na própria escola, como o registro das movimentações do aluno como permanência, transferência e abandono, o rendimento escolar que indica aprovação e reprovação, o número de alunos atendidos por tipo de ensino e por turma, entre outros, e retrata a particularidade de cada unidade escolar e o conjunto dessas informações: a rede de ensino em que está inserida. A tecnologia da informação possibilita a reunião desses dados em sistemas informatizados com atualização quase total e em tempo real. A consulta a essas 90 Grupo de Estudo e Pesquisas em Política Educacional, Rio Claro, 06, 07 e 08 de julho de 2011 Vol. 3 (2011)

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informações auxilia a implantação de políticas públicas, em uma visão ampla, como a tomada de decisão do diretor de escola em sua gestão. O estudo do uso dos dados de um sistema dessa natureza deu origem à investigação relatada neste artigo, que apresenta a pesquisa norteada pela questão: quais seriam as representações sociais dos gestores escolares sobre a utilização de um sistema informacional? Encaminhar a abordagem deste trabalho para representações sociais torna-se plausível por esta indicar um conjunto de conceitos, explicações e afirmações que se originam no cotidiano, nas comunicações intergrupais, tidas como teorias do senso comum, que permitem a interpretação e a construção da realidade social Esta pesquisa justifica-se pela relevância do tema abordado, pois se busca discutir a atuação do gestor escolar sob uma ótica ainda pouco abordada: a relação do gestor com os dados informacionais que tem a disposição para a tomada de decisão. Outro fator de destaque neste trabalho é a possibilidade de transposição deste estudo para outras situações similares, ou seja, mesmo este estudo tendo como referência um sistema informacional implantado em uma rede municipal, a reflexão aborda a utilização de informações disponíveis pela tecnologia da informação, acessíveis ao gestor escolar, na tomada de decisão, independente do sistema de ensino ao qual a instituição esteja vinculada, bem como pelos responsáveis pelas reformas educacionais. Este texto descreve brevemente o sistema implantado em uma rede escolar municipal, situa a escola como uma organização educativa e seu espaço de autonomia, detalha o caminho percorrido até o momento, bem como os dados coletados e as considerações preliminares.

Um sistema informacional e a gestão escolar Acompanhando os avanços de tecnologia de informação, um sistema informacional foi implantado em uma rede municipal do Estado de São Paulo. Sua programação atende ao segmento administrativo, relacionado a alunos e professores como os módulos Alunado e Atribuição e o segmento pedagógico, com o módulo Avaliação. O desenvolvimento em linguagem e bases estruturais amplas permite a interligação dos três módulos, com a vantagem de viabilizar informações de um módulo para outro.

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O sistema gera relatórios com as informações cadastradas, sempre atualizadas em tempo real, conforme as movimentações do sistema. Lévy (2000, p. 52) cita que ―a informação digitalizada pode ser processada automaticamente, com um grau de precisão quase absoluto, muito rapidamente e em grande escala quantitativa‖. Os relatórios disponibilizam vários tipos de consulta, desde o geral, como a rede de ensino, ou específico de um aluno. Esses ainda oferecem dados sobre a organização da rede escolar municipal, como número de alunos por escola, por nível de ensino, por curso, por turma, vagas disponíveis, divergência de idade/série, incluídos por unidade, inscrições, matrículas, movimentação de alunos, vagas, distribuição de uniformes, quadros de classes e salas, distribuição dos profissionais, suas jornadas, por escola, por cargo, por classe, componente curricular, com quantidade numérica e relação nominal, movimentação de funcionários e de jornadas, entre outros. Os relatórios da avaliação apresentam informações sobre os resultados bimestrais por classe, aluno, componente curricular, índices de aproveitamento da rede, por nível de ensino, escola, classe e dados sobre resultados finais como índice de aproveitamento de aluno por escola, por nível de ensino, índice de promoção/retenção, porcentagem de retenção em componentes críticos por classe, entre outras informações. A magia do sistema é ter todos esses dados, atualizados em tempo real. Os relatórios estampam o retrato de uma classe, de uma rede de ensino. Se antes havia um espaço de tempo entre o dado registrado manualmente, a tabulação de toda informação, para posteriormente se fazer alguma análise e intervenção, a partir da implantação do sistema esses resultados estão disponíveis no momento do cadastro dos dados. E o que é feito com esse tempo? Como é utilizada essa informação? Mesmo estando disponível o acesso, essa informação é utilizada pelos diretores? O sistema continua sendo visto apenas como uma ferramenta que facilitou a movimentação e registro dos dados escolares? Os gestores escolares têm ciência de que os dados disponíveis permitem, em tempo real, a visão da escola como um todo e de cada aluno em particular? Qual o sentido desses dados para os gestores escolares? Essas foram algumas indagações que moveram o início deste estudo. Atualmente, a escola dispõe de um conjunto de dados que podem ser valorados e utilizados como informação para a tomada de decisão. Esta pesquisa, embora apresente o sistema implantado em uma rede municipal, estende-se em suas reflexões a um universo maior, pois dados informacionais estão disponíveis em rede, como os 92 Grupo de Estudo e Pesquisas em Política Educacional, Rio Claro, 06, 07 e 08 de julho de 2011 Vol. 3 (2011)

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resultados do Saresp, Provinha Brasil, Ideb, Censo Escolar, entre outros, que tanto podem ser utilizados a um nível meso, pela própria escola, como a um nível macro, pelas instâncias superiores responsáveis por implantar as reformas educacionais. Se as pessoas mudam o seu modo de vida, a escola também muda com toda essa tecnologia disponível e acessível. Essa mudança vai além de destinar espaços na escola para os laboratórios de informática ou acrescentar mais um componente curricular – informática educativa ou nome similar – na matriz curricular. O estudo apresentado segue outra direção. Propõe-se a investigar a gestão escolar, na figura do gestor da escola, que tem acesso a informação atualizada em tempo real. Para se tratar da gestão escolar é necessário situar onde ela ocorre - a escola - e as bases que dão sustentação a essa instituição. A escola é a ―organização educativa‖ onde a ação é resultante de sua finalidade específica: o processo educativo que envolve alunos, professores, funcionários, pais e comunidade (LIMA, 2001) e este é o ambiente em que se desenvolve a presente pesquisa.

Ambiente da pesquisa Sob o olhar de Lima (2001), a escola é entendida como ―organização educativa complexa e multifacetada‖ (p. 10). O autor aponta que a escola como organização educativa tem princípios e procedimentos que estão relacionados à ação de coordenar todos os envolvidos no processo educativo, tendo em vista atingir aos objetivos e preferências a que se propõe. Ao discutir os modelos de organização, Lima destaca que há desconexão entre o que a escola apresenta como modelo de organização e o que de fato ocorre em sua rotina. A escola em um modelo burocrático apresenta papéis bem definidos, rigidez, hierarquia de cargos e especialização. Em um universo que o autor denomina como ―não oficial‖, aparecem ―os conflitos organizacionais, a definição problemática dos objetivos, as dificuldades impostas por uma tecnologia ambígua e as estruturas informais‖ (p. 28). Situa-se assim o modelo anárquico de organização que não abrange juízo de valor ou crítica negativa, nem tampouco o sentido de indicar má organização, ou mesmo, desorganização, mas o contraste com a organização burocrática. Significa desconexão entre estruturas, atividades, objetivos, decisões e realizações.

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A escola como organização não é exclusivamente burocrática, nem exclusivamente anárquica, porém a escola está ―formalmente organizada e estruturada de acordo com o modelo imposto uniformemente em todo país‖ (LIMA, 2001, p. 40). Como instituição, a escola está inserida em um contexto legal, obedece à hierarquia das leis e normas que a regem. Na Constituição Federal, no referente às bases da educação nacional ao regimento escolar que estabelece as normas próprias de cada escola, há um campo de abrangência, moldados pelos princípios e normas que toda a nação deve seguir, até a realidade de cada sistema escolar. Um dos princípios da Constituição Federal, no capítulo que se refere à educação, é a gestão democrática que, no âmbito escolar, está atrelada à ideia de participação do coletivo na tomada de decisões e de autonomia, reconhecendo-se que a própria legislação estabelece uma autonomia relativa por dispositivos legais. Apesar dessas limitações, a autonomia é uma conquista se comparada ao poder centralizador da década anterior a 1980, pois de alguma forma há o incentivo ao pluralismo de ideias, ao respeito à diferença e à construção de um projeto que busque a qualidade da escola. Mesmo estando subordinada à hierarquia administrativa, há espaço na organização escolar para a tomada de decisão. ―As instituições escolares adquirem uma dimensão própria, enquanto espaço organizacional onde também se tomam importantes decisões educativas, curriculares e pedagógicas‖ (NÓVOA, 1992, p.15).

A tomada de qualquer decisão é precedida de uma avaliação. Avalia-se inconscientemente antes de se tomar qualquer escolha, sem perceber que isso está ocorrendo. Ao atravessar uma rua, analisam-se as condições do trânsito: a velocidade dos veículos, a distância e o tempo necessário para alcançar ao outro lado da rua. A partir dessa avaliação toma-se então a decisão sobre a melhor forma de executar a ação pretendida. Em uma escola não é diferente. Em diversos momentos e de várias formas a avaliação ocorre de um modo informal. Para Freitas (2009) a avaliação não ocorre somente ao término do processo. Ela acontece, de forma inconsciente ou não, o tempo todo e orienta as ações tanto da escola como da sala de aula. O autor destaca ainda: Deve-se levar em conta que a avaliação não incorpora apenas objetivos escolares, das matérias ensinadas, mas também objetivos ligados à função social da escola no mundo atual, os quais são incorporados na organização do trabalho pedagógico global da escola.

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III Seminário Internacional de Gestão Educacional Ao enfatizarmos a sala de aula, não devemos esquecer que ela está inserida em um ambiente maior, a escola (p.17).

A avaliação necessita de um olhar ampliado, que vai além da medida ou resultado de uma aprendizagem, sem análise de todo o contexto. Por um lado, tem-se a avaliação da aprendizagem, que se for imbuída de propósitos democráticos, deve superar práticas inadequadas e, por outro, a construção de uma avaliação sistemática para a escola. Os dados que os sistemas informatizados apresentam auxiliam na construção de imagem mais próxima à realidade da escola para a tomada de decisão. A equipe gestora pode trabalhar esses dados, contextualizar essas informações, dar sentido aos valores brutos apresentados para melhor direcionar a gestão e, por conseguinte, a ação pedagógica. Sem perder de vista que neste momento o propósito é situar o gestor escolar em seu contexto de atuação que é a escola, é necessário ainda destacar que essa escola é uma instituição que integra um sistema educacional e, em particular, neste trabalho, a rede municipal em que foi implantado um sistema informatizado para a gestão da escola. Em suma, este trabalho originou-se de dois olhares que se cruzam: a tecnologia informacional que é a marca da atualidade e a escola, na figura do gestor escolar. Ao se ter claro que esta pesquisa direcionou seu olhar para a utilização de dados informacionais pelo gestor escolar, tornou-se necessário estabelecer qual aspecto será abordado e o que se pretende com este trabalho. Um mesmo assunto pode favorecer muitas abordagens, vários pontos a serem esclarecidos e diversas formas de se refletir um mesmo tema. A linha condutora passa a ser a questão problema, pois estará de alguma forma traçando a rota, e ao estar de fato estabelecida, funciona como uma a bússola, norteadora da ação do pesquisador: Quais seriam as representações sociais dos gestores escolares sobre a utilização de um sistema informacional?

As Representações Sociais A representação social é um processo próprio do cotidiano que ocorre em determinado contexto histórico da sociedade. Assim, as representações sociais permitem ao indivíduo a percepção da realidade que ele e seu grupo produzem e o saber construído no cotidiano e nas práticas sociais.

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As representações aparecem muitas vezes, como produto das ações e comunicações. Moscovici (2003) destaca que: Pessoas e grupos criam representações no decurso da comunicação e da cooperação. Representações, obviamente, não são criadas por uma indivíduo isoladamente. Uma vez criadas, contudo, elas adquirem uma vida própria, circulam, se encontram, se atraem e se repelem e dão oportunidade ao nascimento de novas representações, enquanto velhas representações morrem (p. 41).

As representações sociais são um modo de percepção e interpretação do mundo, no qual símbolos ganham significados por meio das relações dos sujeitos com os objetos e acontecimentos. O sujeito ou o grupo social a que pertence produz comportamentos, que se tornam comuns ao meio social, formando dessa forma um conhecimento que propicia a atuação sobre a realidade. Moscovici (2003) destaca que ―eu simplesmente percebo que, no que se refere à realidade, essas representações sociais são tudo que nós temos, aquilo a que nossos sistemas perceptivos, como cognitivos estão ajustados‖ (p. 32) Destaca-se ainda, que a representação seja um processo do sujeito enquanto sujeito social, isto é, a representação não é um produto independente, mas construção resultante das condições em que surge e circula. Moscovici (2003) aponta para uma sociedade pensante, em que as pessoas procuram conhecer e compreender as coisas que as cercam e tentam resolver os seus problemas. ―Quando estudamos representações sociais nós estudamos o ser humano, enquanto ele faz perguntas e procura respostas ou pensa, e não enquanto ele processa informação, ou se comporta. Mais precisamente, enquanto seu objetivo não é comportar-se, mas compreender‖ (p.43). Pela representação social é possível dar sentido à realidade que rodeia o sujeito, tornando o que parecia imperceptível em percebível, o incógnito em conhecido. O processo que torna familiar o não familiar envolve a compreensão de modelos anteriores e, desta forma, a memória prevalece sobre a lógica e torna o desconhecido em contexto de conhecimento. As representações sociais também são incrementadas pelas informações científicas que circulam na mídia e as próprias versões populares que se formam dessas mesmas informações (SPINK, 1993).

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As representações sociais surgem como o elo entre o conhecimento científico e o saber produzido pelo senso comum, construindo conceitos significativos ao que se apresentava como estranho ao indivíduo, familiarizando o objeto desconhecido. A representação social permite ao indivíduo estabelecer uma maneira de ser e estar no seu grupo social, visto possibilitar a construção de significados da realidade, que dão segurança diante do novo e que não faz parte do seu entendimento. O saber é elaborado pelo próprio indivíduo e está intimamente relacionado ao meio social ao qual está inserido, pela construção de símbolos e conceitos. Com base nestes fundamentos, esta investigação busca quais seriam as representações sociais dos gestores escolares sobre a utilização de um sistema informacional.

Percurso investigativo A pesquisa em si torna-se uma engrenagem onde todos os elos se entrosam, tendo como referência uma questão problema. A formulação da questão problema deste trabalho não surgiu simultaneamente à decisão de iniciar este estudo. Ela foi alterada ao longo do processo de pesquisa conforme o encontro de outros estudos abria novos horizontes à reflexão. Moroz e Gianfaldoni (2002, p.42) afirmam que ―é do confronto entre sua inquietação inicial e a literatura disponível que o pesquisador vai chegar à formulação de seu problema de pesquisa‖. As pesquisas iniciais de campo – levantamento da produção acadêmica no Banco de Teses da Capes e questionário aos gestores escolares – ofertaram pistas do que estava obscuro e pesou ainda nesta decisão: buscar o que a própria autora não sabia, em função do seu envolvimento profissional com o objeto de pesquisa e os sujeitos pesquisados. Se nessa relação de estudo e profissional, muitas hipóteses foram surgindo e muitas respostas foram dadas, chegou-se a uma que não se tinha a resposta pronta e que se julgou estimulante pesquisar, pois poderia preencher uma lacuna e contribuir com o conhecimento na área. Esta pesquisa foi incitada pela mudança tecnológica associada a introdução de um sistema informacional em uma rede escolar e a relação do gestor com os dados informacionais. Daí a questão: quais seriam as representações sociais dos gestores escolares sobre a utilização de um sistema informacional? Ao se responder esta questão tem-se por objetivo buscar uma aproximação às representações sociais que estão sendo construídas pelo gestor escolar, quanto às

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possibilidades de uso de um sistema informacional que lhe é acessível e lhe proporciona atualização imediata ou, quase imediata, das informações para a gestão escolar. Em decorrência do objetivo proposto, entende-se a abordagem qualitativa como a indicada para esta investigação e, busca nas representações sociais responder à questão problema. Este estudo não contraria o que Lüdke e André (1986, p. 46) apontam sobre os estudos qualitativos: ―o processo de coleta se assemelha a um funil. A fase inicial é mais aberta para que o pesquisador possa adquirir uma visão bem ampla da situação, dos sujeitos, do contexto e das principais questões do estudo‖ e foi desta forma que foi conduzido este trabalho. Os primeiros passos da pesquisa foram importantes para a delimitação progressiva do problema, de um campo amplo que seria o do uso de dados informacionais para a tomada de decisão, para enfatizar que o que seria estudado, as representações sociais, e quem seria o sujeito dessa investigação, o gestor escolar. A trajetória desta investigação teve início com a busca da produção acadêmica no Banco de Teses da Capes, objetivando identificar pesquisas nessa área, que auxiliassem a definição do objeto de estudo pelo levantamento do que já é consenso e das lacunas que ainda precisam ser esclarecidas. Verificou-se que mesmo não havendo condições de se afirmar que toda a produção postada foi devidamente mapeada, foram encontradas quatro dissertações e nenhuma tese que abordassem a utilização da tecnologia de informação pelo gestor escolar na tomada de decisão. Essa constatação indicou que esta pesquisa estaria adentrando por um caminho onde há muitas lacunas a serem preenchidas. Não se pode dizer que é inédita, porém, pouco se tem produzido a este respeito e muito há de ser feito. ―A partir da consulta à literatura especializada, é possível dirigir as investigações para ramos mais profícuos, evitando-se a replicação de trabalhos por desconhecimento sobre o que já foi realizado‖ (MOROZ; GIANFALDONI, 2002, p. 26). Procurando conhecer se os dados informacionais eram utilizados como subsídios para a tomada de decisão foi feito um levantamento documental exploratório em duas escolas, verificando o registro das reuniões de aperfeiçoamento semanal. Essa consulta teve por objetivo verificar se nas reuniões com o grupo de professores havia referência sobre a utilização das informações contidas nos relatórios do sistema informacional, como subsídio para a tomada de decisão. 98 Grupo de Estudo e Pesquisas em Política Educacional, Rio Claro, 06, 07 e 08 de julho de 2011 Vol. 3 (2011)

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O passo seguinte da pesquisa, um questionário exploratório, indicou que a melhor opção a esta pesquisa era ter como sujeito o gestor escolar, visto este ser o responsável por coordenar toda ação da escola, estando sob sua responsabilidade a utilização do sistema informacional na gestão escolar. Já direcionando para as representações sociais, outros quatro gestores se submeteram a um instrumento tríplice de pesquisa composto por associação de palavras, projeção com complementação de historia e perfil. Na etapa de análise de dados será utilizada a análise de conteúdo, em que se procura ―tornar visível o invisível, fazendo perceber o que não se percebe e ver o que normalmente não se vê‖ (GHEDIN; FRANCO, 2008, p.76).

Fundamentação A leitura das obras que embasaram este trabalho ocorreu em diferentes momentos das diversas etapas desta investigação, auxiliando na delimitação do problema. Segundo Moroz e Gianfaldoni (2002, p. 37-38) ―a leitura de uma obra é sempre fonte importante de informações sobre publicações relativas ao campo de interesse em que ela se insere‖. A pesquisa sobre a utilização dos dados informacionais remete à incursão a outras áreas de conhecimento. Para compreender a adoção de recursos informacionais na gestão escolar encontramos em Bio (1996), Dowbor (2008) e Lévy (2000) as reflexões sobre as inovações tecnológicas. Os fundamentos sobre a escola como organização educativa e alguns temas como

gestão escolar, autonomia, avaliação, entre outros, que auxiliam a

contextualização da ação do gestor escolar foram encontrados em Barroso (2000), Bordignon e Gracindo (2000), Cury (2000), Freitas (2009), Lima (2001), Martins (2002), Nóvoa (1992) e Sousa (s/d). Para o estudo das representações encontrou-se em Moscovici (2003) a fonte desta abordagem e o detalhamento nos autores: Arruda (2002), Franco (2004), Sá (1995), Souza Filho (1995) e Spink, (1993). Quanto à metodologia, esta pesquisa baseou-se em Bogdan e Biklen (1994), Ghedin e Franco (2008), Lüdke e André (1986), Moroz e Gianfaldoni (2002) Mazzotti e Gewandsznajder (1998).

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Considerações preliminares Este trabalho busca olhar a escola em um tempo de inovações tecnológicas. Dowbor (2008) considera que ―o universo de conhecimentos está sendo revolucionado tão profundamente, que ninguém vai sequer perguntar à educação se ela quer se atualizar‖ (p.12). A implantação de um sistema informacional na rede municipal oferece à escola muito mais que uma ferramenta de trabalho. O sistema disponibiliza relatórios que podem auxiliar no fortalecimento da gestão democrática, fornecer dados para análise e reflexão, que podem conduzir à tomada de decisão mais objetiva e fundamentada. Mas, quais seriam as representações sociais dos diretores de escola sobre a utilização de um sistema informacional na gestão escolar? O percurso desta pesquisa em busca da resposta a essa questão, ainda não está concluído, porém alguns indícios ou análises preliminares podem ser apresentadas. Estão postadas quatro dissertações e nenhuma tese no período de 2006 a 2008. A utilização de dados informacionais na tomada de decisão do gestor escolar, de acordo com o que está postado no Banco de Teses da Capes, ainda é assunto pouco explorado pela área de educação, apesar da expansão da tecnologia. Na análise documental das atas de reuniões com os professores de duas escolas, não se detectou registros sobre a utilização dos dados do sistema como fonte de dados para análise e encaminhamentos. No questionário aberto aplicado a quatro diretores, em nenhuma das respostas encontrou-se qualquer referência à utilização de dados informacionais para a tomada de decisão, quer sejam dados gerados pelo sistema implantado na rede municipal ou por órgãos oficiais externos. Os sujeitos da pesquisa são diretores que em sua rotina diária utilizam o computador, acessam a Internet e aos sites de conteúdo, mantendo-se atualizados por jornais on-line. A pesquisa prossegue em busca da resposta para a questão: quais seriam as representações sociais dos diretores de escola sobre a utilização de um sistema informacional na gestão escolar?

Referências

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UM BREVE DIÁLOGO ENTRE LOURENÇO FILHO E A GESTÃO DA QUALIDADE TOTAL EM EDUCAÇÃO

Inajara Iana da Silva [email protected] Unicamp

Resumo: Este texto, que serve como base teórica para o projeto de mestrado intitulado ―A atuação da Fundação Pitágoras na educação pública de Sorocaba/SP: análise sobre as implicações para organização do trabalho na escola‖ desenvolvido no âmbito do Greppe e financiado pela Fapesp, tem como objetivo identificar alguns pontos importantes da obra de Manoel Bergström Lourenço Filho no que diz respeito principalmente à função do administrador escolar e colocá-los em debate com a teoria da Qualidade Total na Educação. Palavras-chave: Gestão de Qualidade Total, Função do administrador escolar, Lourenço Filho.

Introdução O presente estudo nasce da necessidade de compreender melhor as teorias de administração escolar para que sirvam como embasamento teórico para o projeto de mestrado intitulado ―A atuação da Fundação Pitágoras na educação pública de Sorocaba/SP: análise sobre as implicações para organização do trabalho na escola‖ desenvolvido no âmbito do Grupo de Estudos e Pesquisa em Política Educacional (Greppe). Esse projeto financiado pela Fundação da Amparo à Pesquisa do Estado de São Paulo (Fapesp) tem como objetivo analisar as consequências para a organização do trabalho na escola, enfatizando a gestão escolar, da parceria entre a Fundação Pitágoras e a Secretaria Municipal de Educação de Sorocaba. O programa de gestão implantado pela Fundação Pitágoras no município de Sorocaba é o Sistema de Gestão Integrado e tem seu arcabouço teórico na Gestão de Qualidade Total. Esse texto, que serve como base teórica para a referida dissertação de mestrado, pretende identificar alguns pontos importantes da obra de Manoel Bergström Lourenço Filho no que diz respeito principalmente à função do administrador escolar e colocá-los 103 Grupo de Estudo e Pesquisas em Política Educacional, Rio Claro, 06, 07 e 08 de julho de 2011 Vol. 3 (2011)

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em debate com a teoria da Qualidade Total na Educação, para tanto foi utilizado o livro ―Organização e Administração escolar: curso básico‖ de 1963 em sua oitava edição em 2007. A escolha de Lourenço Filho14 como autor referência base para esse estudo é justificada por tratar-se de um ―clássico‖ da literatura sobre administração escolar visto que sua obra faz parte do grupo15 que inaugura no Brasil a construção do conhecimento nessa área.

A Organização e Administração escolar de Lourenço Filho Lourenço Filho apresenta em seu livro três perspectivas gerais para compreender a Educação como processo social são elas a histórica, a comparativa e a de eficiência Na perspectiva histórica, as questões de educação são propostas em termos socioculturais os mais amplos, ou, como certos autores modernos preferem dizer, antropológicos. Na comparativa, fala-se de estruturas e funções gerais dos sistemas nacionais de ensino, segundo aspectos que se tipificam a cada época, à vista de condições gerais, conjugadas por ação política. Na perspectiva de eficiência, fala-se em termos de objetivos graduados, a serem obtidos por instrumentação racional, com maior domínio da ação intencional de educar [...] (Lourenço Filho, 2007, p. 37).

Para o autor, quando os estudos são de Organização a Administração Escolar é a perspectiva de eficiência que deve ser considerada por ser essa capaz de coordenar elementos e recursos (meios) a fim de atingir resultados determinados. Ao tratar das teorias gerais de organização e administração Lourenço Filho remonta suas referências teóricas aos expô-las em dois grupos, o das Teorias Clássicas e o das Teorias Novas. No primeiro grupo estão Frederick Taylor e Henri Fayol, conhecidos pelo desenvolvimento da Teoria Geral da Administração marcada pela orientação empresarial capitalista. É notável no texto que a tendência que maior influência exercia sobre o pensamento de Lourenço Filho era a de Fayol e os autores que continuaram sua obra. Discorrendo sobre as Teorias Novas o autor demonstra seu interesse pela Psicologia e ressalta o fato de as Teorias Clássicas não abordarem as relações dos trabalhadores, suas necessidades e sua efetiva participação na concretização de uma 14

Sobre o autor Lourenço Filho ver trabalho de Carlos Monarca e Ruy Lourenço Filho intitulado ―Por Lourenço Filho: Uma biobibliografia‖. Brasília, Inep/MEC, 2001.

15

Outros autores de relevante importância para a formação de uma teoria da Administração escolar no Brasil são: Querino Ribeiro, 1952; Carneiro Leão, 1953; Anísio Teixeira, 1968.

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organização. Sem desmerecer a importância dessas teorias Lourenço Filho aponta que por meio de uma leitura atenta da obra de Taylor e Fayol é possível perceber que as idéias desses autores caminhavam no sentido de realçar as ―organizações de trabalho como grupos sociais e humanos‖ (LOURENÇO FILHO, 2007, p. 54) e que as Teorias Novas apenas somam ao considerar a motivação do comportamento humano. A compreensão de Lourenço Filho de que a administração escolar em nada difere da administração de qualquer outro empreendimento é semelhante à de Ribeiro (1952) sendo que o primeiro avança na teoria da Administração considerando que além do aspecto formal de departamentalização que a Administração assume com condições hierárquicas bem determinadas é preciso um fluxo de informações entre os setores na escola para que os objetivos específicos dessa organização sejam alcançados. No capítulo sobre a ação dos administradores escolares o autor classifica como atividades fundamentais do administrador informar-se e decidir. Da combinação dessas duas atividades básicas formam-se as funções do administrador escolar, são elas ―planejar e programar‖, ―dirigir e coordenar‖, ―comunicar e inspecionar‖ e ―controlar e pesquisar‖. O administrador deve ser capaz de esmiuçar os objetivos gerais da educação em planos de ação e programas que promovam o estabelecimento de metas de curto ou longo prazo e essas são suas primeiras funções, planejar e programar Planejar significa figurar, em termos simbólicos, o que se deve realizar, em qualidade e quantidade; e programar, estabelecer objetivos graduais que permitam a realização final desejada. Plano e programas são aplicáveis a um empreendimento, no seu todo em projetos integrais; ou a setores, em projetos setoriais. A determinação de tais setores dependerá da natureza das operações e de sua distribuição no tempo e no espaço (LOURENÇO FILHO, 2007, p. 87).

Um empreendimento que tem planejamento adequado necessita segundo Lourenço Filho da existência de uma figura que tome decisões e que detenha o poder de influenciar na ação de outras pessoas. Esse aspecto é apresentado nas palavras ―dirigir, chefiar, comandar‖ (LOURENÇO FILHO, 2007, p. 77). A ação de dirigir associada à de coordenar resulta na divisão de tarefas e consequentemente nas responsabilidades e nos níveis de autoridade dos diversos indivíduos envolvidos no processo. Para que o administrador possa decidir adequadamente e coordenar de maneira satisfatória o trabalho dos subordinados o autor acredita que seja imprescindível comunicar e inspecionar 105 Grupo de Estudo e Pesquisas em Política Educacional, Rio Claro, 06, 07 e 08 de julho de 2011 Vol. 3 (2011)

III Seminário Internacional de Gestão Educacional Muitas coisas não se executam satisfatoriamente por ausência ou insuficiência de informação de cima para baixo, e muitos problemas evitáveis se geram por desconhecimento, por parte dos dirigentes, da situação real do trabalho (LOURENÇO FILHO, 2007, p. 88).

A segunda ação dessa função do administrador escolar é inspecionar. O autor coloca que esta palavra não é utilizada no sentido de fiscalização, mas é empregado no sentido de comunicar a fim de que as informações circulem ―contribuindo para maior solidariedade geral entre os que trabalhem [...]‖ (LOURENÇO FILHO, 2007, p. 88). Quanto à função de controle e pesquisa Lourenço Filho acredita tratar-se de um desdobramento natural da boa inspeção Controlar significa confrontar o desempenho de papéis diferenciados, ou verificar a forma pela qual as responsabilidades de cada qual são aceitas e correspondidas; e pesquisar, levar adiante essa análise, nos elementos, fatores gerais e circunstâncias ocasionais do trabalho. Em qualquer nível o administrador terá de pesquisar ou investigar para que bem possa decidir (LOURENÇO FILHO, 2007, p. 88).

Mais adiante no livro o autor destaca a escola como um sistema não isolado e sujeito a influências da sociedade. Lourenço Filho contribui ainda para a construção de uma teoria da Administração Escolar ao declarar a importância da consistência jurídica que por meio da legislação determina as diretrizes da educação, mas admite que ―[...] a legislação e sua complementação têm grande importância, não sendo, porém, a fonte única, nem original, da ação de organizar e administrar escolas.‖ (Lourenço Filho, 2007, p. 106).

Breves considerações sobre a Gestão de Qualidade Total na Educação A opção feita nesse texto por colocar em diálogo esse clássico da Administração escolar com a teoria da Qualidade Total deriva da tentativa, ainda que embrionária, de remontar e compreender as bases da Teoria da Administração da Educação e principalmente pelos indícios de que a teoria da Qualidade Total na educação utiliza-se de alguns princípios da Teoria Geral da Administração que estão presentes na obra de Lourenço Filho. O objetivo desse texto não é fazer um tratado sobre o surgimento da Qualidade Total da década de 1930 com figuras como William E. Deming, Joseph Juran, Walter Shewhart e Crosby, mas apenas relembrar algumas características básicas da Gestão de Qualidade Total (GQT) que foram tão fortemente propagadas por Cosete Ramos e João Catarin Mezomo na década de 1990 no Brasil. Esses, entre outros autores, foram 106 Grupo de Estudo e Pesquisas em Política Educacional, Rio Claro, 06, 07 e 08 de julho de 2011 Vol. 3 (2011)

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responsáveis pela transmissão dos princípios da GQT e para tanto escreveram verdadeiros manuais para implantação dessas idéias nas escolas, um passo a passo imensamente detalhado e carregado de expressões de incentivo muitas vezes exageradas. Embora a GQT tenha atingido seu auge na década de 1990 na educação brasileira algumas pesquisas recentes16 indicam que o uso dessa teoria na administração de escolas no Brasil não foi extinto apesar das críticas acertadas feitas por autores como Paro, 1986; Fidalgo & Machado, 1994; Gentili & Silva, 1995; Oliveira, 1997. Algumas das características básicas e mais marcantes da GQT são: trabalho em equipe, relação ―fornecedor-cliente‖, destaque na figura da liderança e avaliação de processos baseada em dados. A relevância dada pela GQT ao trabalho de equipe não é simplesmente para que todos na escola trabalhem no mesmo sentido, com o mesmo objetivo, mas trata-se na verdade, como explica Mezomo, de reforçar uma necessidade intrínseca das pessoas que trabalham na escola que é a disposição de atender as expectativas que as outras pessoas têm delas. Ainda segundo o autor, as pessoas precisam ser treinadas para resolver problemas e conseguir trabalhar em equipe (MEZOMO, 1999). Ao tratar da relação ―fornecedor-cliente‖ Mezomo destaca que cliente é toda pessoa envolvida direta ou indiretamente com o processo de ensino e aprendizagem, esse cliente pode pertencer ou não ao âmbito escolar. Com linguagem marcadamente comercial o autor ressalta a importância de a escola compreender como seu cliente quer ser atendido e o que espera do serviço prestado O que falta é que a escola redescubra sua razão de ser, que são seus clientes, e veja neles sua força e a fonte de sua revitalização. É atendendo seus clientes e encantando-os com seus serviços de qualidade que ela será considerada como o verdadeiro patrimônio da comunidade. Chegou a ―hora da verdade‖. Ou a escola se ―clienteliza‖, ou os clientes decretarão a sua falência pela inutilidade de seus serviços (MEZOMO, 1999, p. 124).

Para Mezomo a GQT rompe com o pensamento tradicional e apresenta-se com uma nova filosofia de administração e metodologia de trabalho podendo ser a única

16 Sobre isso ver, por exemplo, EIRAS, N. S. S. Programa de qualidade total e gestão em educação: um estudo no município de Limeira. Dissertação de Mestrado. Unesp – Rio Claro. 2009. SILVA, I. I. Estratégias municipais para a oferta da educação básica: análise da parceria público-privado no município de São José dos Campos. 2008. Trabalho de Conclusão de Curso em Ciências Biológicas, UNESP, Rio Claro.

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capaz de fornecer ferramentas que possibilitem a saída da escola de sua situação crítica (MEZOMO, 1999). Cosete Ramos que corrobora com o pensamento de Mezomo acredita que na escola prevalece um sistema de administração autoritário copiado das empresas privadas e herdado dos militares A característica básica deste paradigma autoritário de gestão é uma forte ênfase na montagem de estruturas organizacionais, separadas em níveis hierárquicos, baseadas na divisão de funções e calcadas na ordem e na obediência (RAMOS, 1995, p. 9).

Apesar dessa fala, Ramos acredita que o Método Deming, inicialmente aplicado em empresas, pode ser aplicado em escolas visto que essas são organizações humanas que ainda que tenham objetivos específicos não são responsáveis por anular a validade e efetividade dos pontos de Deming. Defensora dessa teoria Cosete Ramos destaca o sétimo ponto de Deming que faz referência à figura do líder, a liderança é uma das características mais marcantes da GQT que converte a função do administrador de supervisionar para liderar. O líder busca a cooperação, preocupando-se em tornar a atividade interessante e oferecendo as melhores condições possíveis de trabalho; tudo isso numa atmosfera contagiante de energia e entusiasmo. O líder envolve ativamente o pessoal na tarefa, ouvindo e acatando suas propostas, fazendo com que participem das decisões e elogiando o esforço individual e coletivo (RAMOS, 1994, p.26)

Mezomo considera ainda que o líder deva ser capaz de compreender a mente humana e proporcionar, por meio de um processo de capacitação constante, o fortalecimento dos trabalhadores escolares permitindo que eles se auto-administrem a fim de se desenvolverem plenamente. Concluindo as características básicas da GQT está a avaliação dos processos baseados em dados, essa teoria compreende que para obter sucesso em seu objetivo programado é preciso antes de tudo que haja um objetivo, e a melhor maneira de traçálo é compreendendo a situação real da escola e pontuando problemas a serem superados. O vocabulário próprio da GQT é repleto de palavras como valores e missão, todos os envolvidos no processo de ensino e aprendizagem de maneira direta ou não devem ter suas missões muito claras e preferencialmente expostas, assim, a merendeira escolar tem em um cartaz sua missão e ao final de cada refeição escolar a merenda será julgada na sua qualidade em diversas categorias, essa avaliação serve para que a escola

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saiba se a função da merendeira está sendo cumprida e se sua clientela está contente com o serviço prestado. Além desse controle, a GQT é fortemente apoiada pelo pensamento estatístico é preciso coletar dados e principalmente analisá-los corretamente para que seja possível cumprir o compromisso de melhora contínua, pois esses dados analisados transformamse em fatos que podem indicar os pontos positivos e os negativos que devem ser melhorados. Mezomo atenta para a necessidade de planejar para que a administração escolar não ocorra por intuição, mas baseada em objetivos claramente definidos e para tanto apresenta o processo PDCA (Plan-Do-Check-Act) de Deming No P (Plan) se realiza o planejamento do que se quer que ocorra (mudanças em qualidade, solução de problemas, etc. ...), reunindo dados, organizando recurso, definindo objetivos, criando estratégias, etc. ... No D (Do) se parte para execução do que foi planejado. No C (Check) se procede à avaliação da ação executada, objetivando verificar se ela respondeu ou não ao planejado. No A (Act) se procede à revisão necessária do planejamento, redesenhando aquilo que for necessário (MEZOMO, 1999, p. 139).

Ainda segundo o autor essa técnica é adequada para permitir uma melhoria continuada além de promover o pensamento crítico e estimular a colaboração (MEZOMO, 1999). Portanto, como foi possível observar a GQT é um modelo de administração pautada em referenciais capitalistas concebida para ser aplicada em empresas e praticamente não foi alterada ao ser implantada na educação.

Considerações finais Uma análise mais detalhada da GQT permite encontrar alguns elementos da Teoria Geral da Administração fato esse que não deve causar nenhum espanto visto que a Qualidade Total é uma construção teórica que inevitavelmente captou recursos daquilo que foi construído sobre Administração. Entre esses elementos da GQT é possível estabelecer um diálogo com a obra de Lourenço Filho em alguns aspectos, principalmente aos que se referem à função do administrador escolar.

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Lourenço Filho organiza as funções do administrador escolar em duplas, na primeira função exposta que seria ―planejar e programar‖ o autor propõe que o administrador seja capaz de projetar as ações futuras como metas buscando obter um resultado. Esse discurso é semelhante ao encontrado na GQT especialmente na primeira fase do processo PDCA apresentado por Mezomo. Ao tratar da função de ―dirigir e coordenar‖ Lourenço Filho assume liderança como uma qualidade própria do indivíduo Não obstante, não se poderá dissimular que as funções de direção sempre se individualizam. Derivam de agentes que são pessoas, pelo que certo coeficiente individual nelas se apresenta como irredutível. Essa é a razão por que muito se insiste em atributos pessoais do administrador, em especial em sua capacidade de bem interpretar o espírito comum da organização, optando e decidindo no melhor sentido de sua coesão. Quando bem exercida, a essa qualidade cabe o nome de liderança (LOURENÇO FILHO, 2007, p. 78).

Apesar de o autor considerar que o funcionamento do planejamento exige uma figura administrativa que decida ela não está assim tão distante da figura aparentemente mais ―amistosa‖ do líder na GQT, ambos são responsáveis pela divisão de tarefas e coordenação dos subordinados, ainda que na GQT esse termo não seja usado devido à idéia de trabalho em equipe e não de hierarquização entre os trabalhadores escolares. Talvez um dos pontos mais próximos entre a teoria da Qualidade Total e o discurso de Lourenço Filho seja a função do administrador escolar de ―comunicar e inspecionar‖. Lourenço Filho avançou no que existia até então ao considerar a escola como um espaço no qual o fluxo de informações deve ser contínuo para que a busca de sua metas seja efetiva. A GQT prega a troca de informações a fim de estabelecer dados e fatos que permitam uma utilização racional de recurso para atingir os fins desejados. A última função apontada por Lourenço Filho para o administrador escolar e ―controlar e pesquisar‖ que na verdade antecipa a característica da GQT da avaliação dos resultados obtidos e categorização dos pontos a serem mantidos e daqueles que devem ser melhorados. Cabe ressaltar que apesar desses apontamentos feitos não parece possível e nem justo caracterizar a obra de Lourenço Filho como um estimulo à aplicação de um modelo de gestão empresarial na escola como é de fato a GQT que efetivamente transfere para o ambiente escolar estratégias típicas da empresa capitalista. Paro (2010) ressalta a importância de os fins serem claros na educação para que a Administração possa fornecer meios que não os contradigam 110 Grupo de Estudo e Pesquisas em Política Educacional, Rio Claro, 06, 07 e 08 de julho de 2011 Vol. 3 (2011)

III Seminário Internacional de Gestão Educacional O essencial a se considerar é que, se o fim a alcançar é o homem como sujeito, a maneira e os métodos utilizados precisam ser coerentes com esse fim. Sendo assim, o educando (que no processo de educação se transforma em sua personalidade viva para se constituir no ser humano educado, que é produto desse processo) precisa envolver-se nessa atividade como sujeito [...] (PARO, 2010, p.30).

A partir do exposto fica claro que não é possível ou sequer concebível considerar que sendo objetivo da educação formar o homem como sujeito o meio mais adequado para fazê-lo seja por meio da Gestão de Qualidade Total.

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DISCUTINDO A ORGANIZAÇÃO DO TRABALHO NA ESCOLA E NO PRIMEIRO ANO DO ENSINO FUNDAMENTAL

Marcia Cristina Argenti Perez [email protected] Faculdade de Ciências e Letras, UNESP Araraquara

Resumo: A lei nº 11.274/2006 estende o Ensino Fundamental de oito para nove anos, estabelecendo o ingresso da criança a este nível de ensino aos 6 anos de idade. Esta investigação teórica teve como proposta analisar a articulação entre o texto legal e os significados atribuídos à organização do trabalho na escola, buscando identificar os pontos positivos e os vulneráveis na implantação do Ensino Fundamental de 9 anos com o ingresso das crianças aos seis anos de idade. Os resultados mostram as escolas estão enfrentando grandes desafios e dificuldades de organização do trabalho na escola. Concluímos a abrangência do problema e questionamos à necessidade de investimento na formação docente e atualização do currículo escolar. Palavras-chave: Escola, Formação docente, Currículo.

A organização do Ensino Fundamental de 9 anos, definida recentemente pela legislação federal brasileira na Lei nº 11.274/06 suscita diversas discussões acerca da adequação do currículo, rotina, espaços, práticas educativas e formação dos professores. Em virtude dessa determinação de ordem legal, sem o necessário preparo das redes de ensino, a presente investigação teve como proposta analisar a articulação entre o texto legal e os significados atribuídos às práticas docentes, buscando identificar os pontos positivos e os vulneráveis na implantação/implementação do Ensino Fundamental com o ingresso das crianças aos seis anos de idade. Procedemos à realização de pesquisa bibliográfica, recorrendo aos dispositivos legais, aos documentos de orientação produzidos pelo Ministério da Educação-Brasil e estudos acadêmicos recentes relacionados a temática da presente investigação. Partimos da premissa de que a mudança para o Ensino Fundamental de Nove Anos traz, ao mesmo tempo, expectativas, desafios e incertezas, pois, embora não tenha havido a discussão necessária e nem tenham acontecido, no momento, medidas

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desejáveis de formação continuada para os professores, a mudança já está regulamentada e em plena execução. É sabido que desde a Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional Brasileira (LDB), Lei 9.394 de 20 de Dezembro de 1996, já se prevê a ampliação do Ensino Fundamental para nove anos com início aos seis anos de idade. No ano de 2001, a Lei nº 10.172 estabelece o Plano Nacional de Educação (PNE) (2001–2011) que reconhece a proposta de ampliação do Ensino Fundamental como uma meta da educação nacional. Constatamos que, quando o PNE determina essa medida têm-se dois direcionamentos básicos: ―oferecer maiores oportunidades de aprendizagem no período da escolarização obrigatória e assegurar que, ingressando mais cedo no sistema de ensino, as crianças prossigam nos estudos, alcançando maior nível de escolaridade‖ (BRASIL, 2001, p. 20). Destaca-se também o fato de o PNE (BRASIL, 2001) enfatizar a expansão do atendimento, com garantia de qualidade, a fim de assegurar a efetivação de um processo educativo adequado e baseado nas dimensões e nas especificidades da infância. Neste contexto, em 6 de fevereiro de 2006, é sancionada a lei nº 11.274 que amplia o Ensino Fundamental de oito para nove anos, com matrícula obrigatória para crianças aos seis anos, a ser efetivamente cumprida em sua totalidade no território nacional até o ano de 2010. Em Perez (2009a), apresentamos discussão sobre o entendimento do ingresso da criança aos seis anos no Ensino Fundamental não poder se restringir apenas às alterações estruturais, sem o acompanhamento de mudanças relacionadas à renovação das propostas pedagógicas a serem desenvolvidas nos anos iniciais nesse nível de ensino. Esta compreensão passa a ser emergencial, principalmente pelo histórico de distorções entre programas e ações governamentais e suas descontinuidades nas práticas escolares. O MEC, já no ano de 2003, inicia o processo de efetivação dessa nova política, por meio do programa de Ampliação do Ensino Fundamental para Nove Anos, sob a coordenação da Secretaria de Educação Básica (SEB)/Departamento de Políticas de Educação Infantil e Ensino Fundamental (DPE)/Coordenação Geral do Ensino Fundamental (COEF) que promovem encontros regionais para discussão sobre a temática entre diferentes setores do ensino, e a divulgação de documentos de orientação,

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intitulados: 1) Relatório do Programa (BRASIL, 2004a), 2) Ensino Fundamental de nove anos: orientações gerais (BRASIL, 2004). O Relatório do Programa (BRASIL, 2004) apresenta dados do Censo Escolar de 2003, focando as matrículas por estado e a duração do Ensino Fundamental; (apenas seis estados não contavam com nenhuma matrícula para o ensino em 9 anos – Acre, Mato Grosso do Sul, Rio Grande do Norte, Roraima, Rondônia e Sergipe), além de detalhamentos acerca das atividades do MEC no desenvolvimento do Programa. O segundo documento Ensino Fundamental de nove anos: orientações gerais (BRASIL, 2004) oferece discussões didático-científicas em torno das demandas da escolarização no Brasil, abordando temáticas relacionadas às questões legais e teóricas acerca da organização do Ensino Fundamental de 9 anos e discussões específicas sobre reorganização do trabalho pedagógico e

formação dos professores, enfatizando o

ingresso da criança com 6 anos. Como educadora, entendemos, então, que o grande desafio é consolidar o ingresso das crianças de seis anos no Ensino Fundamental para além de mudanças estruturais e estatísticas de elevação do atendimento da Educação Básica, em favorecimento da qualidade da educação, como direito de todas as crianças. Nessa perspectiva, o próprio documento do MEC (BRASIL, 2006b), no tocante ao processo de desenvolvimento e aprendizagem das crianças, ressalta o sucesso dessa política a partir do conhecimento e do respeito às características etárias, sociais, psicológicas e cognitivas dos educandos. A respeito desses aspectos, destacamos aqui as análises de alguns pesquisadores que já antecipam alguns questionamentos sobre o cenário no qual esta política está inserida; apontamos os trabalhos de Arelaro (2005), Gorni (2007), Sarturi (2007) Saveli (2007), Perez (2009a) que justificam que a escolha da ampliação do Ensino Fundamental deve-se ao princípio da otimização de um sistema baseado na lógica de ciclos de aprendizagem que não retém alunos nos anos iniciais, favorecendo a universalização do acesso à demanda de 6 anos dentro da estrutura já existente, implicando poucas exigências relacionadas ao currículo e aos recursos humanos e contra essa proposição ser oferecida aos alunos de 15 anos, no final do Ensino Fundamental. Somando-se a essas análises, inclui-se a ampla possibilidade de uso dos recursos do FUNDEB, perante a relevância pedagógica de mais tempo para a socialização e a aprendizagem dos conteúdos escolares básicos, compensando a desigualdade de oferta própria do segmento da Educação Infantil. 114 Grupo de Estudo e Pesquisas em Política Educacional, Rio Claro, 06, 07 e 08 de julho de 2011 Vol. 3 (2011)

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Temos constatado, em resultados preliminares de algumas pesquisas (PEREZ, 2007, 2009), na sistematização de resultados de atividades de projetos de extensão universitária (PEREZ, 2010) e em eventos científicos, a repercussão da prática da Escola de 9 anos expressa em inúmeras queixas e demonstrações de insegurança nas práticas escolares em relação às reais possibilidades de reorganização escolar, a partir das novas demandas, em contrapartida à ausência de efetivos investimentos em recursos materiais, humanos e epistemológicos para o repensar a formação e a atuação docente em uma nova política educacional. Podemos aqui formular inúmeros questionamentos: como repensar os conteúdos e as práticas escolares ao longo dos 9 anos de escolarização? Que ensinar às crianças de 6 anos: os conteúdos do último ano da Educação Infantil ou os do antigo 1º ano do Ensino Fundamental, da escolarização de 8 anos? Como favorecer uma transição saudável entre o ambiente institucional da Educação Infantil ou familiar com as práticas do Ensino Fundamental? Quais as especificidades do trabalho pedagógico que favorecem as culturas infantis? Como (re)pensar a formação inicial e continuada dos profissionais da educação? O documento do MEC Ensino Fundamental de nove anos: orientações gerais para a inclusão de crianças de seis anos (BRASIL, 2006) é bem explicito, ao reconhecer que não se trata de somar ou mesclar os conteúdos de ambos os anos escolares, mas sim de construir uma nova proposta pedagógica, coerente com as especificidades das crianças de seis anos. Deixa evidente que essa proposta precisa ser construída: ―temos, neste momento, uma complexa e urgente tarefa: a elaboração de diretrizes curriculares nacionais para o Ensino Fundamental de nove anos‖ (BRASIL, 2006, p. 9). Referindo-se à educação escolar, podemos refletir sobre o quanto o período que compreende as idades entre 5 e 7 anos, períodos em que a criança brasileira, segundo a nova legislação poderá ser atendida na Educação Infantil e, obrigatoriamente a partir dos 6 anos no Ensino Fundamental, remete ao educando em um período psicológico e cognitivo propicio ao investimento no desenvolvimento da imaginação, do pensamento por intermédio de imagens, da percepção, do raciocínio lógico, da comparação e da identificação da propriedade dos elementos, da criatividade e das criações lúdicas e simbólicas. Historicamente o ensino escolar valoriza o desenvolvimento do pensamento abstrato sem estar vinculado a situações concretas, direcionadas, na maioria das vezes,

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ao processo de alfabetização, no qual o conhecimento é tratado de forma fragmentada em áreas específicas (BRUNETTI, 2007). No tocante ao currículo escolar, constatamos que a formação da criança no 1º. ano do Ensino Fundamental está direcionada às práticas escolares em torno da alfabetização, com ênfase na aquisição da leitura e da escrita. Arce (2007) e Angotti (2008) denunciam que esta tendência está presente nas concepções de escolarização já na Educação Infantil, como uma pré-formação para a escolarização formal. Neste contexto, pensar a restrição das ações escolares com fins específicos à alfabetização, não evoca apenas uma tendência das práticas escolares, passa a ser também um apelo de outros segmentos da sociedade. Portanto, pensar a ampliação do ensino, como também refletir sobre a reorganização das propostas pedagógicas e a imprescindível adequação das práticas relacionadas às especificidades da infância passam a englobar os grandes desafios para a educação brasileira. Conceitualmente, do ponto de vista da corrente psicológica Histórico-Cultural, a ―atividade principal‖ não é a atividade que ocupa a maior parte do tempo da criança, mas aquela em que se desenvolve a origem das mudanças qualitativas na psique infantil, isto é, mudanças que a elevem para o pensamento abstrato, para o mundo das ideias. No que concerne à vida das crianças na escola de Ensino Fundamental alguns estudiosos sinalizam que, ao longo da história da educação (BRUNETTI, 2007; FRADE, 2007; KRAMER, 2006), há a cristalização de um modo de ser criança no contexto escolar que a considera mais em sua dimensão ―aluno‖ do que em suas especificidades infantis e lúdicas. Este modelo de ser aluno é incorporado pela própria condução dos educandos em suas relações com a organização escolar, com a cultura escolar, com os deveres e a relação formal com a aquisição dos conhecimentos. Vigotsky (2001) defende a brincadeira, do conjunto de atividades que a criança realiza, como a atividade que promove as mais significativas influências no desenvolvimento da personalidade infantil e em sua formação psíquica. Assim, um trabalho adequado com as crianças nos leva aos seguintes questionamentos: qual a concepção que temos de infância ou infâncias? Quem é a criança do primeiro ano? Que é ser criança? É nosso entendimento, embora pouco presente nos debates públicos, que crianças com seis anos completos ou por completar apresentam características que as vinculam mais ao contexto da Educação Infantil que ao do Ensino Fundamental. Como afirma Faria (2005), a infância continua nas séries 116 Grupo de Estudo e Pesquisas em Política Educacional, Rio Claro, 06, 07 e 08 de julho de 2011 Vol. 3 (2011)

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iniciais do Ensino Fundamental, e as descobertas propiciadas por recentes investigações sobre a condição infantil, que se valeram de categorias diferentes das convencionais, levam-nos a repensar a educação da infância, inclusive no Ensino Fundamental. Kramer (2006b), por sua vez, aponta que a Educação Infantil e o Ensino Fundamental são indissociáveis e, para tanto, devem assumir a apropriação da cultura como suporte para a educação das crianças, respeitando-se, em contrapartida, nas duas modalidades de ensino, as crianças nas suas singularidades. Desde o trabalho da história da infância, tendo como precursor Ariés (1975), as especificidades das crianças e das infâncias vêm ganhando destaque nos estudos, sobretudo na emergente área da Sociologia da infância (SARMENTO, 2007; SIROTA, 2001). Postulamos, então, a necessidade de compreender as crianças como atores sociais, e a infância como categoria social produtora de cultura. Do contrário, pouco corroboramos para a construção de espaços, práticas e currículos que sejam coerentes com a categoria social da infância. Para Lima (2008) é imprescindível que o professor conheça a criança pequena para que possa exercer plenamente seu papel de educador, o que inclui valorizar e reconhecer suas manifestações privilegiadas, com destaque para as atividades lúdicas. Ainda, conforme aponta Sarmento (2004), a ludicidade, a imaginação, as interações sociais e a repetição são eixos que estruturam as culturas infantis. A criança, por volta dos 6 anos, amplia seus interesses além do mundo infantil e dos objetos, estende as possibilidades de relações sociais, estabelece interações mais diversificadas com os adultos, compreende, paulatinamente, as atitudes e as várias formas de atividades humanas: trabalho, lazer, produção cultural e científica. O jogo e a brincadeira, nessa etapa, são formas de expressão e apropriação do mundo das relações, das atividades e dos papéis dos adultos. A criança, por intermédio das atividades lúdicas, atua, mesmo que simbolicamente, nas diferentes esferas humanas, reelaborando sentimentos, conhecimentos, significados e atitudes (BISSOLI, 2005). Contudo é comum a concepção que atribui ao jogo e à brincadeira a finalidade de ser ―passatempo‖, ―desgaste de energia excedente‖, quando, para a criança, brincar é algo essencial para suas aprendizagens e desenvolvimento. Contatamos que as atividades lúdicas são entendidas como atividades supérfluas, e, como diria Dornelles (2005), atividades ocupacionais com menos status e menos importância, se comparadas com as demais. Se as atividades lúdicas, como o jogo e a brincadeira fazem parte das 117 Grupo de Estudo e Pesquisas em Política Educacional, Rio Claro, 06, 07 e 08 de julho de 2011 Vol. 3 (2011)

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especificidades da infância, as dificuldades de considerá-las no processo educativo ocorrem como um desafio a ser enfrentado mais pelos adultos do que pelos educandos. É valido, também, não podermos deixar de rever práticas escolares que tendam a uma ―didatização‖ das atividades lúdicas, como bem lembra Wajscop (2001) ao tratar das situações de propostas pedagógicas que visam apenas à repetição de exercícios, focando, por exemplo, coordenação motora e auditiva por meio de brinquedos, desenhos mimeografados e músicas ritmadas. O que ocorre nessas atividades, segundo a autora, é que as crianças não têm oportunidade de decidir sequer os seus temas. O controle pertence totalmente ao adulto, que, por sua vez, garante que o conteúdo contido naquela atividade seja trabalhado unicamente em prol de um objetivo escolar predeterminado. Claro que a questão não é emitir um posicionamento contra a alfabetização no primeiro ano, todavia é necessário o trabalho com múltiplas formas de linguagem e expressão, que devem constituir o currículo nas séries iniciais do Ensino Fundamental. Como já sinalizamos, as especificidades da infância apontam para a importância do jogo e da brincadeira no processo de aprendizagem e desenvolvimento das crianças. Vigotsky (2001), ao analisar a relação entre o brinquedo e a escrita na prática escolar, ressalta que o primeiro pode ser visto como um componente da pré-história da escrita, considerando que a apropriação deste complexo código requer um nível elevado de desenvolvimento da capacidade simbólica. Para esse teórico, a diferença entre uma criança de três e outra de seis anos, nas situações lúdicas, está, principalmente, no modo pelo qual empregam as várias formas de representação, tornando-se cada vez mais complexas. Uma contribuição importante, portanto, da brincadeira, reside no aspecto de que, quanto mais a criança brinca, mais ela desenvolve a sua capacidade simbólica, e esta favorece a aprendizagem de códigos sociais mais complexos, neste caso específico, a escrita (LURIA, 1988). Assim, a antecipação dos conteúdos do Ensino Fundamental poderá não ser bem sucedida, se ignorar este fato, e ainda causar o encurtamento da infância e a diminuição desse tempo de vivências específicas, em especial, com relação à dimensão lúdica, que se caracteriza como atividade indispensável para a formação da criança, especialmente, de sua capacidade simbólica e socialização. Sob essa ótica, é preciso que essas considerações sejam debatidas por dirigentes, gestores, professores e ampliadas para a sociedade em geral, para possibilitar a reflexão. Tomando como a Psicologia da Educação e, de forma mais recente, os diálogos com a 118 Grupo de Estudo e Pesquisas em Política Educacional, Rio Claro, 06, 07 e 08 de julho de 2011 Vol. 3 (2011)

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Sociologia da Infância, é possível atestar a presença e a importância das atividades lúdicas no contexto do Ensino Fundamental, nas séries iniciais. Sugerimos, então, que a ludicidade deva se constituir como atividade indispensável nas práticas educativas, nos anos iniciais do Ensino Fundamental. Vale, também, questionar que esta ideia se torna polêmica, pois a ludicidade é, até certo ponto, concebida como inerente às práticas na infância; resta a investigação: acaso a ludicidade encontra-se permitida e valorizada no contexto escolar, face às mudanças estruturais e às especificidades da criança de 6 anos? Partindo das discussões atuais acerca da promulgação da Lei nº 11274/2006 a qual instituiu o Ensino Fundamental de nove anos, assim como o término do prazo (início do ano letivo de 2010) para que os sistemas de ensino realizassem as adequações necessárias, o presente projeto almeja como resultados contribuir para o debate a respeito da reestruturação desse nível de ensino, tendo em vista a especificidade da infância, verificando as reais condições e as emergentes modificações ao atendimento das crianças de 6 anos matriculadas no Ensino Fundamental. O debate acerca do Ensino Fundamental de nove anos bem como do ingresso das crianças de seis anos no Ensino Fundamental ainda está longe de terminar. É necessário que o corpo educativo, cada qual em sua comunidade escolar, discuta sobre as transformações necessárias, a fim de não julgar antecipadamente os alunos de seis anos de idade como imaturos ou incapazes face à organização do Ensino Fundamental. Nesse sentido, a ampliação do Ensino Fundamental bem como o ingresso das crianças de seis anos de idade nesse nível de ensino tem como desafio a possibilidade de repensar o conceito de infância, abrindo espaço para a discussão sobre os princípios de organização da rotina e do currículo, não apenas nas séries iniciais do Ensino Fundamental, mas também nas séries subsequentes, verificando que a infância não está presente apenas na Educação Infantil e que ela não se esgota quando a criança ingressa no Ensino Fundamental. Sob essa ótica, antecipamos a apresentação de possíveis temas, dentre outros, para discussão no coletivo de cada unidade escolar, não sem delimitar, previamente, os respectivos campos de atuação de professores e demais profissionais da educação: a) aprofundamento da concepção de infância, de alfabetização e de letramento; b) reestruturação da proposta político-pedagógica para o Ensino Fundamental de nove anos, com ênfase nas dimensões do desenvolvimento humano; c) redefinição da 119 Grupo de Estudo e Pesquisas em Política Educacional, Rio Claro, 06, 07 e 08 de julho de 2011 Vol. 3 (2011)

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proposta pedagógica da Educação Infantil de zero a cinco anos; d) ênfase ao lúdico e ao brincar nas metodologias; e) definição de ações de formação continuada em serviço, com horário fixo previsto no calendário oficial, levando-se em conta a inclusão de crianças com necessidades educacionais especiais; f) consideração do processo contínuo de aprendizagem, orientando o progresso dos alunos nos dois primeiros anos do Ensino Fundamental de nove anos; g) definição de programas para a correção da defasagem idade/série; h) adequação do espaço físico; i) aquisição de materiais e equipamentos pedagógicos.

REFERÊNCIAS

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A PROPOSTA CURRICULAR PAULISTA E O PAPEL DO PROFESSOR COORDENADOR Lucimara Aparecida Neto [email protected] UNESP-Marília

Resumo: O Governo do Estado de São Paulo implementa a partir de 2008 uma nova política curricular com o objetivo de padronização do ensino. A nova política incumbe, ainda, o Professor Coordenador (PC) na gestão desta proposta nas unidades escolares. Nossa pesquisa analisa as atribuições do PC em São Paulo frente à nova Proposta Curricular. Investigamos de que maneira o PC assume o papel de gestor do novo currículo nas unidades em que trabalha. Para melhor compreender suas atribuições profissionais nos dias atuais, reportamo-nos a autores que abordam historicamente essa função, tais como Quaglio (1994), Machado (1998), Silva Jr. (1984), Saviani (2002) e Kuenzer (2002). Como fonte de documentação, recorremos à legislação educacional, ao Estatuto do Magistério Paulista e, mais especificamente, ao documento da Proposta Curricular do Estado de São Paulo. Nosso percurso metodológico pauta-se na pesquisa qualitativa. Optamos pelo levantamento bibliográfico, entrevistas semi-estruturadas e, por fim, pela análise de conteúdo dos dados coletados. (BARDIN, 1997) Por se tratar de pesquisa ainda em andamento, os resultados parciais de nosso estudo indicam uma ruptura fundamental na função desempenhada pelos Professores Coordenadores nas escolas públicas paulistas, assumindo no campo da gestão escolar, a responsabilidade pela efetiva implementação do novo currículo nas escolas e a melhoria dos indicadores de desempenho escolar no contexto das políticas de avaliação da educação básica. Palavras-chave: Nova Proposta Curricular do Estado de São Paulo; Professor Coordenador; Gestão do Currículo

Introdução A proposta desse trabalho nasceu em virtude de minha necessidade de compreensão a respeito da função do coordenador pedagógico, hoje conhecido como Professor Coordenador. Meu interesse, partiu do contato com os textos que versam a respeito dessa função, como também, pelo contato direto com Professores Coordenadores. Para um melhor entendimento da função do Professor Coordenador, fez-se necessário, contudo, situá-lo num contexto mais geral que vai além dos limites da escola, qual seja, investigar as políticas educacionais que são implementadas tendo 124 Grupo de Estudo e Pesquisas em Política Educacional, Rio Claro, 06, 07 e 08 de julho de 2011 Vol. 3 (2011)

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como enfoque o processo de ensino-aprendizagem, bem como refletir sobre as práticas dos que atuam diretamente nas escolas, sobretudo naquelas do sistema público. Dessa monta, no caso específico do Estado de São Paulo, seria a partir de 2008, quando da implementação da Nova Proposta Curricular (SÃO PAULO, 2008), que o Professor Coordenador assume no âmbito da política educacional paulista um papel preponderante na gestão escolar, qual seja, o PC assume cada vez mais a função de gestor do currículo escolar e acompanhamento do ensino e aprendizagem em cada um dos ciclos nos quais a escola pública paulista está subdividida (ciclos I e II do Ensino Fundamental, Ensino Médio e a Educação de Jovens e Adultos). No âmbito ainda das ações da política educacional inscreve-se também a responsabilização dos gestores acerca dos resultados da aprendizagem escolar quando dos processos de avaliação externa da escola, quando mais uma vez o PC vê seu trabalho sendo cobrado a partir de tais resultados. Dada essa dimensão e as especificidades da função do Professor Coordenador, estudá-lo torna-se uma tarefa difícil, principalmente se considerarmos que seu trabalho está em constante (re) construção pelas políticas públicas. É pertinente salientarmos, dessa forma, que as escolas estão sujeitas a um sistema político amplo que trata o currículo escolar de forma homogênea, que padroniza a avaliação escolar e que, além de outros fatores, não considera os aspectos intrínsecos de cada escola, e também não possibilita a cada unidade escolar estabelecer com autonomia seu projeto político-pedagógico. Foi a partir de todas essas inquietações referentes às implementações das políticas educacionais recentes, somadas à maneira como é estabelecido isso no currículo escolar e no cotidiano de cada escola, que nos surgiu a idéia de desenvolvermos uma pesquisa que versasse sobre esses aspectos, sendo o papel desempenhado pelo Professor Coordenador no contexto da Nova Proposta Curricular do Estado de São Paulo (2008) nosso fio condutor para a análise. Desse modo, no intuito de delimitar nosso objeto de estudo, buscaremos focalizar nossa análise na função desempenhada pelo Professor Coordenador no contexto da Nova Proposta Curricular do Estado de São Paulo (2008) que, por sua vez

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está inserida num projeto político mais amplo do governo estadual paulista, qual seja, o ―São Paulo faz escola‖ 17. Para atingir nossos propósitos, este trabalho pretende responder à seguinte questão: Como vem sendo implementada a Proposta Curricular do Estado de São Paulo no contexto escolar? Qual é o papel atribuído ao Professor Coordenador na implementação de tal proposta? Decorrentes de nosso problema de pesquisa, este trabalho ainda procura entender os seguintes aspectos: I.

Considerando que uma das funções atribuídas ao PC é a responsabilidade pela formação continuada de professores, como é desenvolvida essa ação no contexto das Horas de Trabalho Pedagógico Coletivo?

II.

Qual a responsabilidade atribuída ao Professor Coordenador em relação aos resultados da avaliação da aprendizagem escolar dos alunos?

III.

Qual ainda o papel do PC na aplicação do currículo e das metodologias de ensino estipuladas pela política educacional paulista? A fim de compreendermos a função do Professor Coordenador no que concerne à

Nova Proposta Curricular (2008), estabelecemos como objetivos específicos da pesquisa: a) verificar e analisar a prática do Professor Coordenador diante da Nova Proposta Curricular, estabelecendo se há relação ou não há relação entre a prática do PC e a qualidade do ensino realizado na escola. b) problematizar a questão da formação em serviço de professores e a prática do PC frente a essa formação e às suas atribuições como responsável pela implementação da Nova Proposta Curricular.

17

O projeto ―São Paulo faz escola‖ é um amplo projeto do governo estadual paulista que instituiu para todas as escolas públicas do estado de São Paulo um currículo único, cujo objetivo, além de padronizar o ensino, fosse também de melhorar a eficiência do ensino publico paulista como também, os índices de desempenho escolar nas avaliações feitas pela SEE e pelo MEC.

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Acreditamos que a relevância desse estudo é para o fato de que as escolas estão inseridas numa conjuntura sociopolítica e num contexto de amplas reformas que necessitam ser analisadas e discutidas. Nossa pretensão é contribuir com ―nosso olhar‖ para a discussão de tais políticas, lançando questionamentos sobre o tema, e almejamos que nossa pesquisa colabore, incentive e sirva de subsídios a outras discussões que venham a surgir a respeito da formação continuada de professores e para o avanço na busca de uma educação pública de qualidade.

Caminhos que nos levam a pesquisa: considerações metodológicas Por se tratar de uma pesquisa, que tem como enfoque o trabalho do Professor Coordenador, acreditamos ser necessário serem ressaltados aqui alguns aspectos inerentes á escola, sua função socializadora de conhecimentos, bem como, a diversidade encontrada nesse espaço de socialização.Acreditamos que, o pesquisador que se propõe a pesquisar a escola, seja essa pesquisa delimitada ao estudo da função de um profissional dessa unidade, no nosso caso o Professor Coordenador, é necessário que este pesquisador esteja disposto a mergulhar neste universo de complexidade da instituição escolar, que a caracteriza como lugar de aprendizagem. Entendemos que a opção metodológica a ser utilizada numa determinada pesquisa, deve se pautar por uma constante reflexão acerca do problema a ser pesquisado e a melhor forma de compreender essa problemática. Considerando que a escola, em seu caráter dinâmico, com relações pessoais, institucionais e realidades que identificam os sujeitos que ali se inserem, optamos por uma análise a partir do paradigma qualitativo. De acordo com Oliveira- Formosinho (2002) Os proponentes do paradigma qualitativo assumem que há múltiplas realidades e não uma, cada uma relativa à experiência de que a constrói e que , portanto, a pesquisa subjetiva é a única possível.Como conseqüência, todos os estudos são influenciados por valores até um nível indeterminado.(Oliveira-Formosinho, 2002:97)

Atentos ao exposto acima e buscando melhor captar o trabalho a que propomos, ou seja, de analisar e compreender as atribuições do Professor Coordenador, teremos como opção para coleta de dados os seguintes procedimentos de pesquisa: levantamento bibliográfico a fim de nos interarmos do assunto proposto e também como fonte de 127 Grupo de Estudo e Pesquisas em Política Educacional, Rio Claro, 06, 07 e 08 de julho de 2011 Vol. 3 (2011)

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melhores esclarecimentos do assunto abordado;a pesquisa documental por se constituírem em uma rica fonte de informações; a entrevista e análise de conteúdo. Destarte, optamos pela entrevista semi-estruturada, como técnica de coleta de dados, na qual seguiremos um roteiro que será formulado. De acordo com Trivinos (1987) A entrevista semi-estruturada, em geral, é aquela que parte de certos questionamentos básicos , apoiados em teorias e hipóteses, que interessam à pesquisa, e que, em seguida , oferecem amplo campo de interrogativas, fruto de novas hipóteses que vão surgindo à medida que se recebem as respostas do informante.Desta maneira, o informante, dentro do foco principal colocado pelo investigador, começa a participar na elaboração do conteúdo da pesquisa.(TRIVINOS, 1987:146)

Em face de termos como objeto de estudo a escola, e no caso especifico dessa pesquisa, a função do Professor Coordenador, optamos como critério de seleção dos entrevistados o que Gil (1999) considera como ―conveniência e acessibilidade‖. Essa técnica é aquela em que o pesquisador seleciona elementos que serão essenciais para o desenvolvimento da pesquisa. O método de discussão dos dados a que nos propomos será a análise de conteúdo. Conforme Bardin (1977:28) essa análise é um ―conjunto de técnicas de análise das comunicações visando obter, através de procedimentos sistemáticos e objetivos de descrição do conteúdo das mensagens, indicadores que permitam inferir conhecimentos relativos às condições de produção/recepção das mensagens.‖ Após esse percurso metodológico, será feita a análise e discussão dos dados à luz do referencial teórico.

A trajetória da Coordenação Pedagógica em São Paulo: o que mudou?

No decorrer de nossa pesquisa, nos deparamos com a necessidade de entendermos com mais a finco a função do professor coordenador no ambiente escolar. Dessa maneira, imbuídos no desejo de um melhor entendimento dessa função, nos recorremos ao ―passado histórico‖ da trajetória da função do Professor Coordenador. Assim, nos reportamos ao início dessa função com a figura do Supervisor Escolar e caminhamos por esse percurso até chegarmos aos dias atuais com a figura do Professor Coordenador. 128 Grupo de Estudo e Pesquisas em Política Educacional, Rio Claro, 06, 07 e 08 de julho de 2011 Vol. 3 (2011)

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Historicamente, a Supervisão Escolar paulista inicia-se na década de 60. Paschoal Quaglio (1994) argumenta que, a ―supervisão escolar tem o início de sua história na passagem dos anos 50 para os 60.‖ De acordo com o autor referido, que pauta-se em Silva Jr, nos diz que Os anos 50/60 são um possível marco inicial para a caracterização histórica da supervisão em São Paulo. Há aí um primeiro momento de irradiação da idéia de supervisão escolar.Cursos de férias e de atualização pedagógica são oferecidos a professores e diretores da rede estadual pelo Serviço de Expansão Cultural da Secretaria de Educação.Textos e documentos do PABAEE (Programa Americano Brasileiro de Assistência ao Ensino Elementar) eram tidos, para todos os efeitos, como material de primeira ordem e fonte obrigatória de atualização e aperfeiçoamento profissional.(QUAGLIO,1994:131)

Silva Jr (apud QUAGLIO,1994:132) aponta que a Supervisão Escolar desenvolveu-se primeiramente nos Ginásios Vocacionais e no Grupo Escolar Experimental da Lapa sob o nome de Orientação Pedagógica.Argumenta o autor, que o que se pretendia com a supervisão era um trabalho basicamente voltado para a harmonização da programação e dos procedimentos do conjunto das áreas curriculares e que ―orientar pedagogicamente significava, assegurar a unidade da proposta curricular‖. Interpretando essa passagem do autor acima citado, podemos perceber que já nesse período havia uma preocupação com o que se ensinava, com o currículo escolar tal como visto hoje nas escolas estaduais paulistas, onde o currículo escolar é ―préestabelecido‖.No decorrer de nossa pesquisa, percebemos existirem momentos em que vão ao encontro dos primórdios da Supervisão Escolar e que hoje estão configurados na figura do Professor Coordenador. Dá-se a entender que poucas foram as mudanças e que predominou a gênese da função, isto é, o Supervisor Escolar nos anos 70 e o Professor Coordenador ambos estiveram e/ou estão imbuídos de ―gerenciar‖ o trabalho docente. Esse gerenciamento torna-se mais evidente nos anos de 1970, quando teremos legalmente a vigência do Supervisor de ensino no ambiente escolar por meio da reestruturação dos cargos e carreiras do magistério. Influenciada pelo processo de produção industrial, pelo sistema taylorista-fordista,.a educação escolar irá separar o ―pensar do fazer‖ no interior das escolas isto é, a escola será dividida entre os profissionais que realizam o trabalho de ensino e aprendizagem no caso, os professores, e aqueles que pensam sobre o que deve ser ensinado, como devem ser ensinados,

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―fiscalizando‖ o trabalho que se realiza,e neste cenário, o supervisor de ensino ganha um importante papel no controle do sistema educativo. Destarte, Kuenzer(2002) e Saviani(2002) afirmam ser a partir da década de 70 que irá se intensificar a influência do modelo de racionalidade técnica na educação, acentuando-se a fragmentação do trabalho docente e a separação entre as atividades intelectuais e as de ação pedagógica, ocasionando-se um grande abismo entre os docentes e os chamados técnicos da educação. Consoante kuenzer(2002) A divisão capitalista faz com que atividade intelectual e material, o gozo e o trabalho de produção e o consumo caibam a indivíduos distintos e nesta relação, ―a escola se constitui como uma das formas de materialização dessa divisão ou seja, como espaço, por excelência, do acesso ao saber teórico, divorciado da práxis. Assim, a escola fruto da prática, fragmenta, expressa e reproduz essa fragmentação, por meio de seus conteúdos, métodos e formas de organização e gestão‖ (KUENZER, 2002:52-53)

A influência desse modelo industrial na educação deixou marcas na estruturação dos sistemas educativos e provocou por meio da Lei 5692/71 a consolidação de uma rede hierárquica no interior das escolas. Tal lei previu a regulamentação dos cargos e funções na educação brasileira. Outro fator primordial para a institucionalização do Supervisor nas escolas foi a Reforma do Curso de Pedagogia que por meio do Parecer número 252/69, visou uma adequação ao modelo de racionalidade técnica e teve como resultado a obrigação dos cursos de Pedagogia de oferecerem diferentes habilitações , dentre elas a de Supervisão Escolar. Os estatutos e planos de carreira do magistério surgidos nesse período foram responsáveis por corroborarem legalmente à estrutura vertical e hierarquizada nos diferentes sistemas de ensino, demonstrando a distinção entre o profissional do magistério (o professor) e o especialista ou nos termos de Saviani (2002) o ―pedagogo generalista‖ chamado técnico em educação (administradores, orientadores e supervisores). Silva Jr (1984) (apud Quaglio, 1994:146) corrobora com o termo usado por Saviani e afirma que O sistema escolar do Estado de São Paulo considera como ―especialista‖ os diretores de escola, os supervisores de ensino e os orientadores educacionais. Convencionalmente considera como técnicos os muitos componentes das muitíssimas equipes que povoam os órgãos de administração intermediaria e de administração central

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III Seminário Internacional de Gestão Educacional do sistema. Finalmente, não costuma referir-se ao que efetivamente com os alunos e com o ensino identificando-os especialistas de ensino.Prefere nomeá-los de apenas ―professores‖ ou ―docentes‖.(SILVA JR,1984 QUAGLIO,1994:146).

lidam como como apud

A legislação, a Reforma do curso de Pedagogia, a ditadura militar e a influência do modelo de racionalidade técnica foram alguns dos elementos que favoreceram a institucionalização e a consolidação do cargo de supervisor. Nos anos que se seguiram à regulamentação deste cargo, qualquer trabalho crítico no interior das escolas se fragilizou. De acordo com Saviani (2002) e Alonso (2002), os anos seguintes á institucionalização da supervisão escolar, as funções deste profissional reduziu-se aos trabalhos de ordem administrativa, burocrática e de controle externo na implementação das determinações oficiais. Nisso acarretou um distanciamento por parte dos professores que se sentiam acuados frente ao supervisor, não o considerando como um parceiro, como aquele com quem contar e também, observa-se que o papel político do supervisor é deixado de lado para ficar apenas com o cumprimento da fiscalização do trabalho docente. Silva Jr (1984) (apud QUAGLIO,1994) a esse respeito afirma que Quando a Supervisão se instala de maneira generalizada em toda a estrutura da Secretaria da Educação a orientação para o ensino sofre um processo de distanciamento e a ritualização dos procedimentos torna-se imperativa a tal ponto que, na percepção dos professores, Supervisão e burocratização quase se identificam. E preciso, no entanto, tentar cuidadosamente para as circunstâncias em que esse processo se manifestou. Como setor do aparelho do Estado, a Secretaria da Educação não tinha como ser preservada do tecnocratismo que dominava todo o aparelho. (SILVA JR, 1984 apud QUAGLIO,1994:137)

Apoiando-nos em Silva Jr (1997), podemos enfatizar que o caráter centralizador do processo educativo estava passando nesse momento,de intensificação do desejo de uma sociedade democrática e igualitária, por um processo de reestruturação e o Supervisor de ensino viria a sofrer novamente transformações de sua função. Essa característica atribuída aos Supervisores como aquele que é o especialista da educação, distanciava os professores desse que, na teoria deveria ser um parceiro, na prática tornou-se um fiscalizador do trabalho docente.

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Dada essa situação, de descontentamento dos professores com o trabalho do supervisor, o entendendo como uma ameaça e não como um parceiro, haverá nesse período uma resignificação da função supervisora, visto que, como afirma Silva Jr (1997) ―de ameaçador, o supervisor passou a ser ameaçado.Para que a educação brasileira se reorganizasse em direção à transformação social seria preciso livrá-la do ―reacionismo‖ de seus especialistas.‖(SILVA JR,1997:94). A defesa do papel político da supervisão intensificou-se com a abertura política dos anos 1980 e a possibilidade de reduzir as críticas ao sistema escolar estabelecido. Norteados pelas discussões que ocorreram no país no período pós-ditadura militar, a Supervisão Escolar foi colocada como objeto das críticas sobre a educação como nos afirma Alonso (2002) quando argumenta que o Supervisor foi apontado como um dos responsáveis pelo insucesso escolar e pelo controle externo das escolas. Neste contexto, favorecido pelos ideais progressistas de valorização da escola e do professor; de democratização do ensino e de modificação da gestão escolar, surgiu um amplo movimento de análise e reorientação do trabalho de Supervisão no Brasil que passou a defender a resignificação da Supervisão no cenário educacional. Imbuído de críticas, à função do Supervisor,deveria ter um outro significado e nos anos de 1990, por parte dos professores e supervisores, haverá um amplo movimento em prol da redescoberta da supervisão que deveria ser resignificada como uma função necessária e facilitadora nos processos de gestão escolar. De acordo com o autor Saviani (2002) pode-se afirmar que as novas possibilidades de gestão escolar possibilitariam ao supervisor exercer um papel fundamentalmente político na articulação do projeto político pedagógico das escolas, alterando suas rígidas estruturas de poder e favorecendo o processo de valorização do professor como sujeito da educação. Sendo parte do processo de democratização, ao Supervisor de ensino foi destinado o trabalho mais burocrático e centrado em unidades de administração (Diretorias de Ensino) de onde acompanhavam um número relativamente elevado de escolas A presença dos supervisores nas Diretorias de Ensino, intitulados até meados da década de 90 como Delegacias de Ensino tem outras implicações na educação paulista. De acordo com Alonso (2002:170), por estar alocada na Diretoria de Ensino, a ―Supervisão Educacional em São Paulo teve sua imagem associada ao poder, ao 132 Grupo de Estudo e Pesquisas em Política Educacional, Rio Claro, 06, 07 e 08 de julho de 2011 Vol. 3 (2011)

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sistema, mais que às escolas e aos professores‖. Assim, os professores raramente os enxergavam como parceiros. Este isolamento provocou reivindicações para a alocação de um profissional que desempenhasse a função supervisora no interior das escolas, objetivando-se o fortalecimento do trabalho coletivo e o favorecimento de momentos de reflexão sobre a prática pedagógica. Tal prática seria exercida, nos próximos anos pelo Coordenador Pedagógico. A Coordenação Pedagógica será prevista legalmente como um cargo a ser preenchido mediante concurso público de provas e títulos pro professores que tenham no mínimo três anos de efetivo exercício na rede estadual e formação em Pedagogia com habilitação em Supervisão Escolar. (São Paulo, 1986:39) A aprovação dá direito ao Coordenador Pedagógico de escolher uma unidade escolar para acompanhar as atividades pedagógicas, objetivando uma maior proximidade com o corpo docente e discente, portanto, uma atividade distinta daquela exercida pelos supervisores que centram suas atividades em um local de trabalho externo. No ano de 1974 fica previsto pela primeira vez a possibilidade legal de criação do cargo de Coordenação Pedagógica no Estatuto do Magistério do Estado de São Paulo (Lei 114/74) lei essa que, regulamentou a criação dos cargos e funções da Secretaria de Educação de São Paulo. Este Estatuto, por meio dos artigos 10 e 12 determinaram que a Coordenação Pedagógica ficasse na categoria de função sendo que do coordenador pedagógico se exigiria ser portador de curso superior de graduação em Pedagogia preferencialmente, com habilitação em Supervisão Escolar e ter no mínimo cinco anos de experiência docente na carreira do magistério. Neste estatuto aparece pela primeira vez a função do Professor Coordenador, de quem se exigia para a ocupação da função ter curso superior de graduação correspondente à licenciatura plena em pelo menos uma das disciplinas em que devia atuar e ter no mínimo três anos de efetivo exercício docente na carreira do magistério. Assim, o Coordenador Pedagógico deveria ser um especialista com formação em Pedagogia, enquanto que o Professor Coordenador seria apenas um licenciado em qualquer disciplina do currículo escolar.

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O Professor Coordenador, de quem não se exigia a formação específica em Pedagogia, iria trabalhar com os professores, auxiliando-os nas discussões curriculares e na implantação de novos programas e métodos de ensino. A Supervisão Escolar e a Coordenação Pedagógica são cargos previstos na estrutura legal do funcionalismo público e estadual e somente podem ser ocupados por aprovados em concursos estaduais. Já o Professor Coordenador é ocupante de uma função temporária que não se submete a concursos de efetivação na rede. A distinção da função de professor coordenador em relação as cargo de supervisor e coordenador pedagógico é fundamental para entender o papel que atualmente este profissional desempenha nas escolas, onde desde meados dos anos 90, com experiências pontuais ou mais generalizadas, está procurando articular o trabalho coletivo. O Estatuto do Magistério de 1974 estabeleceu, nos requisitos para o preenchimento dos cargos e funções, que o Coordenador Pedagógico e o Professor Coordenador ocupariam as funções através da designação de professores. A designação para o preenchimento destas funções deveria ser posteriormente regulamentada o que ocorreu, apenas no final de 1975. Com a greve de 1978 o governo estadual paulista irá propor um novo projeto de lei complementar que visava a regulamentação do estatuto de cujas discussões participaram representantes docentes e especialista da educação escolhido pelo governo. Em fins da década de 70 é aprovada a lei complementar nº 201/78 que dispunha sobre o Estatuto do Magistério , substituindo a legislação anterior que estava em vigor desde 1974. Neste novo Estatuto, a Coordenação Pedagógica foi transformada em cargo, exigindo-se para tal ―habilitação específica de grau superior, correspondente à licenciatura plena e experiência mínima de cinco anos.‖ (SÃO PAULO, 1979:45).Com este Estatuto, a atividade do Professor Coordenador continuou sendo como função do Magistério, prevendo em seu artigo 7° que ―além dos postos de trabalho correspondentes aos cargos e funções- atividades do quadro do magistério, haverá, na lotação da Secretaria da Educação, postos de trabalho de Professores Coordenadores, privativos de ocupantes de cargos docentes‖.

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Apesar de estar previsto legalmente, a função de Professor Coordenador não se traduziu em ações práticas, caracterizando-se como uma lei que tinha valor apenas no papel. Nos anos seguintes, a luta pela democratização da sociedade colocou a educação como foco dos ideais progressistas. Houve uma intensificação da atividade sindical, bem como das reivindicações por uma escola mais justa e democrática. Fruto desta abertura política, a educação pública conheceu na década de 80 projetos de reformulação pedagógica que pregavam um novo olhar sobre a educação. A democratização política e a chegada ao poder de partidos de oposição foram fundamentais para a implantação de projetos inovadores no campo educacional. No Estado de São Paulo, o grande marco dessa democratização foi a eleição de Franco Montoro em 1982 para Governador do Estado e assumindo a pasta da Educação Paulo de Tarso Santos. Essa eleição foi resultado da transição do governo militar para o governo civil, caracterizando assim, a abertura democrática, a participação popular nas decisões políticas. Este governo implantou uma série de reformas que deram início às inovações pedagógicas que transformaram o contexto educacional dos anos 80. De acordo com Faria (2005), este seria um momento de grande expectativa de reconstrução democrática, exigindo dessa forma que houvesse uma maior participação do povo, como também a desconcentração de poderes, traduzida politicamente como descentralização. Ainda citando a autora, a mesma afirma que na área da Educação Houve tentativas de incrementação de projetos que sinalizavam nessa direção, entre eles a discussão do Documento Orientador da Política Educacional, que envolvia a participação dos pais, alunos e educadores na análise e formulação de propostas.Infelizmente tal processo criou uma expectativa não confirmada, pois quase nada se teve de retorno e, posteriormente, em meio a greves e manifestações salariais propuseram-se, via decreto, a nova política pedagógica, denominada ―Ciclo Básico‖. (FARIA,2005:96)

O governo Montoro (1982) como já citado antes, irá criar medidas para o enfrentamento dos problemas da escola pública paulista, como por exemplo, a reorganização das Diretorias Regionais de Ensino; a criação dos Conselhos Municipais de Educação; a construção de novas escolas, os investimentos na melhoria da merenda escolar, as melhorias das condições dos trabalhos dos professores, a criação dos Conselhos de Escola; a reformulação do currículo e a implantação do Ciclo Básico (C.B) em 1984. 135 Grupo de Estudo e Pesquisas em Política Educacional, Rio Claro, 06, 07 e 08 de julho de 2011 Vol. 3 (2011)

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O Ciclo Básico foi instituído através do Decreto 21833 de Dezembro de 1983 e implantado pela Secretaria Estadual de Educação (SEE). Sua implantação a partir do ano de 1984 permitiu o prosseguimento dos estudos entre a 1ª e a 2ª Série do Primeiro Grau. A jornada de trabalho do professor que atuava no C B era composta por 26 horasaula de docência, 8 horas-atividade, cumpridas em local de livre escolha e6 horas-aula de trabalho pedagógico cumpridas na escola, destinadas á participação em reuniões pedagógicas, preparação de recursos didáticos e capacitação sendo que este foi um fato decisivo para que a função do Professor Coordenador, prevista legalmente desde 1974, se tornasse real. Para acompanhar e auxiliar o professor frente a alteração curricular proposta pelo Ciclo Básico, foi introduzida nas escolas que ofereciam classes de 1ª e 2ª Séries, a figura do Professor Coordenador, cuja escolha deveria ser realizada pelo grupo de professores que elegeriam entre os docentes alguém para realizar temporariamente o trabalho de articulação pedagógica. O novo Estatuto do Magistério foi elaborado e aprovado durante o Governo Montoro (1982-1986) sob a perspectiva da abertura democrática e da participação popular. Com o Estatuto, foi mantido o cargo de Coordenador Pedagógico de quem se exigiria para o ingresso mediante concurso , a formação em Pedagogia com habilitação em Supervisão e experiência mínima de três anos de docência. Consta também, no Artigo 21 da Seção IV, as condições legais para a regulamentação do trabalho do Professor Coordenador, até então prevista noutros estatutos mas até então não regulamentada. Em consonância com o autor Quaglio (1994), este afirma que o ―trabalho do Coordenador Pedagógico seria melhor executado se houvesse os Professores Coordenadores entre os docentes das Unidades Escolares, designados por um ano sem prejuízo da docência‖. Em 1991, elege-se para o governo paulista Antonio Fleury Filho, que possuía como ―slogan‖ de seu governo o programa intitulado ―Desenvolvimento e Justiça Social com Democracia‖, sendo a educação prioridade de seu governo. Como forma de conter os problemas que a educação pública paulista vinha sofrendo,o Governo Fleury cria o ―Núcleo de Gestão Estratégica (NGE) constituído por pessoas de vários segmentos e de notoriedade comprovada no campo educacional, para pensar a educação paulista e propor soluções alternativas.‖ (FARIA, 2005:97) 136 Grupo de Estudo e Pesquisas em Política Educacional, Rio Claro, 06, 07 e 08 de julho de 2011 Vol. 3 (2011)

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De acordo com a autora Faria (2005), a proposta do NGE, entre outras questões, pautava-se na necessidade de se construir uma nova escola que preparasse os alunos para a cidadania. ―A escola deveria ser um espaço destinado ao crescimento intelectual, cultural e ético e profissional de seus alunos, levando em consideração as três dimensões: cultural, política e formação para o trabalho.‖ Em face desses objetivos, o Governo promove a implantação do ―Projeto Escola Padrão‖ , que estabelecia algumas unidades escolares para trabalharem em um regime diferenciado, podendo desfrutar de maiores benefícios em relação às demais escolas estaduais. Para Fleury Filho (apud Machado, 1998:56) a ―educação pública deveria obedecer a padrões de excelência‖ de modo que os egressos do sistema de ensino possam efetivamente concorrer ―no mundo do trabalho em pé de igualdade com os que cursam escolas privadas‖. A implantação dessas escolas, como nos afirma Faria (2005), gerou polêmicas na rede educacional paulista, pois Uma reforma cuja estratégia de gestão priorizava a autonomização a gestão escolar, algo há muito desejado pelas comunidades escolares, teve em sua estratégia de implantação um grande dificultador, criando percepções diferentes na rede: a primeira era a de que havia escolas ―escolhidas‖ e escolas ―preteridas‖; a segunda porque, a partir de então, se definiram tratamentos diferenciados dentro da rede: uma para as ―escolas-padrão‖ outro para as ―escolas comuns‖. (FARIA,2005:98)

Dentre outras medidas implantadas pelo Governo Fleury (1991), temos a instituição do Quadro de Apoio Escolar (QAE), com a implantação do Coordenador Pedagógico nas Unidades Escolares. Nestas escolas, a Coordenação Pedagógica era formada pela coordenação geral (coordenação do período diurno e noturno) e coordenação de áreas ou matérias afins, sendo que o Coordenador de áreas ou matérias afins não se desvinculava totalmente da sala de aula, dividindo sua carga horária entre o trabalho com os pares e o exercício da docência. Nas Escolas Padrão, o Professor Coordenador era um professor escolhido por seus pares com o aval do Conselho de Escola, experiência semelhante ocorrida com o Ciclo Básico, mas que se colocou como uma novidade ao ser utilizada como estratégia de escolha dos coordenadores em escala maior. Os anos finais de 1990 foram marcados pelo fim da Escola Padrão e pela imposição de reformas educacionais que alteraram profundamente o cotidiano das 137 Grupo de Estudo e Pesquisas em Política Educacional, Rio Claro, 06, 07 e 08 de julho de 2011 Vol. 3 (2011)

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escolas públicas paulistas, pois, tais ―reformas expressaram a peculiaridade de constituir um único projeto com múltiplas ações, principiado na gestão de Rose Neubauer e consolidado no governo do Geraldo Alckmin‖ (FARIA,2005:100). A reforma do ensino paulista, conhecida como ―Escola de Cara Nova‖, promoveu alterações sem precedentes na rede pública de ensino, impondo aos professores mudanças como a progressão continuada; a reorganização escolar; as salas ambientes; a implantação de projetos; a flexibilização do ensino médio, dentre outras medidas. Dentre as medidas que chegaram às unidades escolares através do pacote da ―Escola de Cara Nova‖ estava a implantação da função de Professor Coordenador em todas as escolas públicas com mais de dez classes em funcionamento, sendo que estes trabalhariam prioritariamente com ciclos de ensino diferentes, já que, a partir da reorganização da rede estadual realizada em 1995, foram separados as escolas de Ciclo 1, Ciclo 2 e Ensino Médio. A expansão da função de Professor Coordenador para todas as escolas foi garantida com a publicação da Resolução da Secretaria da Educação nº28 de 4/Abril/1996, que dispõe sobre o processo de escolha para a designação de professor para exercer as funções de Coordenação Pedagógica.(SÃO PAULO,1997:106-107) De acordo com a Resolução, o Professor Coordenador seria submetido a uma prova escrita, elaborada pela Secretaria Estadual de Educação; a uma apresentação de uma proposta de trabalho individualizado para cada unidade escolar, a uma eleição pelos pares e a ratificação pelo Conselho de Escola. A designação do P.C teria validade por um ano e seria precedida de avaliação anual por seus pares, que mediante o trabalho realizado, poderiam reconduzir ou não os Professores Coordenadores às funções. A Resolução da Secretaria da Educação 28/96 nos permite distinguir claramente o papel da Supervisão , um especialista que realiza seu trabalho fora do ambiente cotidiano das escolas, da função do Professor Coordenador, sendo que este não é um ―expert‖ da educação, mas um par, um igual, um sujeito que ocupa uma função que pressupõe a convivência constante com as dificuldades e os dilemas presentes no cotidiano dos professores de uma escola pública. No ano de 2007, assume o Governo do Estado de São Paulo, José Serra que tem como membro integrante da Pasta da Secretaria de Educação Maria Helena Castro. A

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meta estipulada pelo então governador, era dar continuidade na melhoria da alfabetização com ênfase no uso das avaliações para promover a qualidade do ensino. O Governo Serra (2007) irá implantar uma série de mudanças na gestão do ensino. Com a publicação da Resolução da SE número 88 de 19 de Dezembro de 2007, é instituída a função de Professor Coordenador que deveria atuar, juntamente com os professores, nas escolas estaduais. A Resolução acima citada, irá preparar o caminho para um projeto amplo do Governo Estadual que irá modificar as características do ensino paulista. Nesse momento, teremos a implantação da nova Proposta Curricular do Estado de São Paulo, fato que acontece no ano de 2008. Como dito antes, o Governo pretendia dar um salto qualitativo na educação paulista e como forma de obter êxito nesse projeto, lança mão de uma proposta curricular única para todas as escolas estaduais e estipula formas de avaliação no intuito de quantificar o ensino no Estado. Nesse cenário, a Proposta Curricular do Estado de São Paulo, deveria ser implantada nas escolas estaduais e teria como disseminador de tal, o Professor Coordenador, que deveria esclarecer os fundamentos e princípios; conduzir a reflexão da comunidade escolar e organizar o planejamento da escola com base na Proposta Curricular , com vistas à melhoria da qualidade do ensino. Destarte, podemos afirmar, com base na Resolução da Secretaria da Educação que caberia ao Professor Coordenador atuar como ―gestor‖ na implantação dessa política e que competiria ao P C: Ampliar o domínio dos conhecimentos e saberes dos alunos, elevando o nível de desempenho escolar evidenciado pelos instrumentos externos e internos de avaliação Intervir na prática de sala de aula, incentivando os docentes a diversificarem as oportunidades de aprendizagem, visando à superação das dificuldades detectadas junto aos alunos Promover o aperfeiçoamento e o desenvolvimento profissional dos professores designados com vistas à eficácia e á melhoria de seu trabalho. No intuito de uma melhor e maior divulgação da Proposta Curricular Paulista e imbuído na busca por um ensino de qualidade, a Secretaria de Educação do Estado de São Paulo, irá disponibilizar para as escolas da rede estadual, cadernos que 139 Grupo de Estudo e Pesquisas em Política Educacional, Rio Claro, 06, 07 e 08 de julho de 2011 Vol. 3 (2011)

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contêm os princípios e as diretrizes da proposta curricular, além dos conteúdos curriculares a serem trabalhados em sala pelo professor. Os cadernos disponibilizados foram o ―Caderno do Gestor‖; ―Caderno do Professor‖ e o ―Caderno do Aluno‖. Assim, podemos ler no Caderno do Gestor, como justificativa para a aplicação pelas escolas da proposta curricular, que

Em um mundo no qual o conhecimento é usado de forma intensiva,o diferencial será marcado pela qualidade da educação recebida.A qualidade do convívio, assim como dos conhecimentos e das competências constituídas na vida escolar, será o fator determinante para a participação do indivíduo em seu próprio grupo social e para que tome parte de processos de crítica e renovação.(Caderno do Gestor,2008).

Face ao exposto acima, fica-se subentendido que caberá a cada escola responsabilizar-se pela qualidade do ensino que é oferecido em cada unidade e que, ficará sob a função do Professor Coordenador, a responsabilidade por esse ensino de qualitativo, proposto para a cidadania. Na concepção do Governo Estadual ele fez sua parte, dando oportunidades iguais a todos os alunos, unificando o currículo escolar, preparando seus professores e gestão escolar para um melhor ensino/aprendizado. Mas, como a proposta está sendo trabalhada nas escolas públicas paulistas? Como as escolas apreenderam a proposta? Como a gestão escolar, em especial, o Professor Coordenador, interpreta a Proposta Curricular? Como o PC realiza a função de transpor e gerir a Proposta Curricular, na unidade em que trabalha? Essas são questões norteadoras de nosso trabalho pretendemos responde-lás no decorrer dessa pesquisa.

REFERÊNCIAS

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CURSO DE FORMAÇÃO CONTINUADA A DISTANCIA EM CONSELHO ESCOLAR: EXPERIÊNCIAS E EXPECTATIVAS

Viviane Wellichan [email protected] Universidade Federal de São Carlos – UFSCar

Daniela Santos da Silva [email protected] Universidade Federal de São Carlos – UFSCar

Rúbia Nathália Parra [email protected] Universidade Federal de São Carlos – UFSCar

Resumo: Esse trabalho tem como objetivo relatar como tem sido a participação de cursistas (técnicos das secretarias de educação, de quatro estados brasileiros) no curso de formação continuada a distancia em Conselho Escolar que está sendo oferecido pela Universidade Federal de São Carlos (UFSCar), em parceria com a Secretaria Básica de Educação do Ministério de Educação (SEB/MEC), neste ano de 2011. Temos como pano de fundo a reflexão sobre o conselho escolar e a gestão democrática. Palavra chave: Conselho Escolar; gestão democrática; participação.

A importância dos Conselhos Escolares e a prática da gestão democrática no sistema educacional

O trabalho coletivo, em conselhos, segundo registros da história, tem sido uma das estruturas mais antigas. Na Educação brasileira, mais especificamente, no governo provisório de Getúlio Vargas, houve a criação do primeiro órgão que se responsabilizaria pela administração

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da educação nacional, denominado Ministério dos Negócios da Educação e Saúde Pública. Com a primeira Lei de Diretrizes e Bases da Educação (LDB), a 4.024/61, instituiu-se, o Conselho Federal de Educação como o órgão da administração direta do Ministério da Educação e Cultura e os Conselhos Estaduais de Educação como órgãos das Secretarias de Educação dos estados. Infelizmente, durante o governo militar, o Conselho Federal de Educação, assumiu um caráter de órgão técnico e consultivo, deixando de ser normativo. Foi apenas com a LDB 9.394/96, que os conselhos educacionais ganham novas características. Os municípios sinalizaram a necessidade de obter seus próprios sistemas municipais de educação. E, a partir dessa necessidade, os conselhos municipais de educação passaram a ter uma importância significativa na determinação dos destinos da Educação Básica. Os municípios passaram a ser considerados como entes federados, autônomos e passíveis de receber e administrar receita tributária. Sendo assim, as verbas da área educacional foram elevadas, principalmente em função do Fundef/Fundeb. Os conselhos municipais passaram a ter importância no papel de fiscalização e determinação das políticas públicas municipais. Nessa perspectiva, a gestão democrática tem sido um dos pilares da política educacional atual, e está associada ao estabelecimento de mecanismos legais e institucionais de participação política. Esse princípio esta vinculado ao fato que a participação política da população tem um papel fundamental na formulação das políticas educacionais, no seu planejamento e definição da utilização dos recursos públicos. Essa participação da comunidade garante a democratização assim como a universalização do ensino. Essa concepção está pautada na base da gestão democrática, em que a escola deve fazer parte da sociedade. Assim, nessa sociedade, deve-se dar início ao aprendizado de práticas democráticas e igualitárias que devem contribuir para a democratização das relações de toda a sociedade. Nesse aspecto a comunidade escolar deveria refletir sobre o papel da educação no futuro da sociedade a partir do momento do estabelecimento das diretrizes e planejamento das atividades escolares.

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Uma gestão democrática deve envolver todos os segmentos da comunidade escolar e local em discussões dos rumos da educação, envolvendo a participação de pais e alunos, professores e funcionários na construção de uma proposta educativa da escola. Embora o conceito de democracia seja um dos mais antigos, a garantia da participação de todos nas decisões políticas é um dos aspectos mais difíceis de se concretizar. Segundo Luiz e Wellichan (2011), A gestão democrática tem seus conceitos baseados no compartilhar decisões, visando uma educação de qualidade com transparência e co-responsabilidade. Nesse aspecto, caracteriza-se por privilegiar a partilha do poder, e a necessidade de vincular ações pedagógicas, administrativas e políticas da unidade escolar, diferente da perspectiva da administração por gerenciamento e suas exigências. Para que esse princípio se concretize (com vistas a uma construção democrática), na expectativa de superar as dificuldades cotidianas da escola, é preciso que as pessoas atuem de forma participativa e colegiada. (LUIZ, M.C. e WELLICHAN, V., 2011, p.4)

Entende-se que os conselhos escolares (CEs) possibilitariam a participação de todos de dentro e de fora da escola, com perspectiva de que os recursos destinados à educação fossem utilizados com mais eficiência e controle. A adoção dos conselhos escolares permite a ampliação do controle social nas decisões públicas por meio da participação, envolvendo segmentos da população. Estes espaços proporcionariam uma forma de constituição de sujeitos democráticos que poderiam atuar nas políticas públicas, ao mesmo tempo em que, também são importantes agentes propulsores de novas políticas. Sabemos que são vários os problemas que impedem a concretização dos CEs, fazendo os educadores e a comunidade desacreditarem nesse colegiado. Um deles é a inibição da participação por meio de uma administração centralizadora, na qual um único líder detém o poder. Essa dificuldade é encontrada na própria estrutura administrativa da escola, que hierarquicamente apresenta o diretor como representante do Estado na escola, e não representante da escola junto ao Estado. Outro problema é o fato de que a própria legislação limita as atribuições de gestão da escola, associando a participação dos pais e da comunidade às outras formas de colaboração, como a de caráter assistencialista e financiamento das atividades escolares. A questão da participação da comunidade já se fazia presente na escola, desde as reformas educacionais das décadas de 1920 e 1930. Primeiramente, essa participação se deu por meio das caixas escolares e associações de pais e mestres. A caixa escolar visava comprometer os pais na obtenção de recursos para prover condições de estudo 144 Grupo de Estudo e Pesquisas em Política Educacional, Rio Claro, 06, 07 e 08 de julho de 2011 Vol. 3 (2011)

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para os alunos pobres. Garantia a aceitação do aluno e sua boa aparência. As APMs (Associação de Pais e Mestres) apareceram por volta de 1930 com o intuito de integrar a escola à comunidade.Objetivava a união de pais e mestres, bem estar das crianças e o bom funcionamento escolar. Sua obrigatoriedade foi determinada na Lei de Diretrizes e Bases 5.692/71. Ainda continuam sendo confundidas com os conselhos escolares, assumindo o papel de maior importância na vida da escola. Como sempre participaram como arrecadadores para o orçamento do suplementar da escola, participar como gestores da política escolar parece, para os pais, algo ilusório, fora de suas funções. A escola deve ser vista como um ambiente educativo, um espaço de formação. Lugar onde os componentes, estudantes e familiares decidam sobre o trabalho pedagógico e aprendam mais sobre a comunidade a qual fazem parte. Para que a sociedade seja fortalecida é necessário que haja a formação de indivíduos reflexivos, que tenham disponibilidade de dialogar, tendo a consciência da importância da cidadania, de aprendê-la e exercê-la, por meio da participação nos âmbitos políticos. Quando estudamos a escola devemos levar sempre em consideração a multiplicidade de elementos que dela fazem parte. O espaço escolar é o resultado da interação de diferentes grupos e, para estabelecer as possibilidades de participação, deve-se estabelecer o tipo de organização, associação e grupos sociais que são produzidos no interior desse espaço. A composição pode ser determinada por grupos de diferentes concepções, permitindo a compreensão de que os grupos não são estáticos, mas associações constituídas por interesses e identificações variadas. Os pais, geralmente, buscam prestigio por meio da associação com grupos de prestigio de professores e diretores. O conselho escolar, em cada escola, vai se constituir como um reflexo dos diferentes agrupamentos que se dá dentro do espaço escolar e das tensões existentes esses agrupamentos políticos e sociais, desempenhando um papel segundo os interesses dos grupos da escola. A autoridade do conselho é proporcional à autoridade e prestígio de seus representantes junto aos agrupamentos que compõem a escola. A instituição escolar é um espaço constituído de tensões e conflitos oriundos da multiplicidade e amplitude de elementos que interferem em sua organização. Esse espaço resulta da interação dos diferentes grupos, que organizam, também, em subgrupos. E é exatamente dentro dessa organização que se pode procurar o papel que o conselho vai assumir. Dentro dessa perspectiva o conselho seria concebido comom 145 Grupo de Estudo e Pesquisas em Política Educacional, Rio Claro, 06, 07 e 08 de julho de 2011 Vol. 3 (2011)

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espaço de mediação entre os diferentes agentes, conhecendo o pensamento dos diferentes interlocutores e buscando estratégias para a superação de divergências, sem a perda das distintas opiniões e a multiplicidade de posições. O conselho seria um espaço público, onde agente assumiriam posições divergentes e que, no final, todos reconheceriam sua posição de igualdade. Sendo assim, seria capaz de estender esse espaço para o espaço escolar, pois não apenas os representantes devem ser considerados iguais, mas, também, todos os agentes escolares. Isso seria um grande passo para a redução de uma relação autoritária, de preconceitos de gênero, sociais ou étnicos.Com essa mediação é possível que seja deslocada para os agentes internos, a tendência de se rebelar contra o sistema, que é o principal responsável pela a estrutura e organização escola tal qual a conhecemos hoje. Sabemos o quanto é difícil a participação da comunidade no ambiente escola e nas decisões tomadas dentro dele devido à grande burocratização estatal. A respeito disso Fernandes e Ramos (2010) dizem que Assim, tal anseio pela melhoria da qualidade da educação exige medidas no campo do ingresso e da permanência dos educandos na escola, mas também exige ações que possam alterar a atual situação de baixa qualidade da aprendizagem na educação básica, tornando premente a identificação dos condicionantes da política de gestão, bem como a reflexão sobre a construção de estratégias de mudança desse cenário educacional. (FERNANDES e RAMOS, 2010, p.220-221)

É necessário que os profissionais da educação tenham consciência de que o processo educacional deve incentivar o aluno no desenvolvimento de suas potencialidades, fazendo com que ele seja participativo. Assim, um modelo de gestão autoritária, centralizada e conservadora tornaram-se ultrapassado, uma vez que leva a fragmentação e alienação do ser humano. As melhorias educacionais não se dão apenas com medidas no campo de acesso e permanência dos alunos na escola, mas também, com as medidas relacionadas aos processos de gestão, sem mencionar dos recursos necessários, e insuficientes, e dos fatores econômicos, sociais e culturais, etc. Por mais que a escola seja pensada com base em modelos organizacionais, tendo princípios e métodos de experiência administrativa, ela possui especificidades próprias, diferentes de empresas industriais, por exemplo. É voltada para a formação de pessoas, estabelecendo relações interpessoais, baseando-se em práticas educativas, levando em consideração a qualidade do processo educativo e não somente o quantitativo como 146 Grupo de Estudo e Pesquisas em Política Educacional, Rio Claro, 06, 07 e 08 de julho de 2011 Vol. 3 (2011)

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dados fornecidos pelo IDEB (Índice de Desenvolvimento da Educação Básica), SARESP (Sistema Avaliativo de Rendimento Escolar de São Paulo) etc.

O curso de Formação Continuada a distancia em Conselhos Escolares

O curso de Formação Continuada a distancia em Conselhos Escolares já foi ofertado no ano de 2009/2010, pela UFSCar (Universidade Federal de São Carlos), em parceria com a SEB/MEC (Secretaria de Educação Básica do Ministério da Educação), somente para o Estado de São Paulo. E, em 2011, está sendo reofertado para quatro estados brasileiros: São Paulo, Paraná, Santa Catarina e Rio Grande do Sul. Seu objetivo é incentivar os técnicos das secretarias de educação, diretores e professores a fortalecer os conselhos escolares dentro das escolas e estimular a participação da comunidade, mostrando que é necessário que haja dentro desses ambientes escolares uma gestão democrática pautada nas decisões coletivas para a construção do conhecimento. O curso está sendo ofertado a distancia, por meio da plataforma moodle. O site disponibiliza um Ambiente Coletivo, uma sala de coordenação e vinte salas de atividades. Em cada sala de atividade estão disponíveis: os cadernos a respeito dos conselhos escolares (editado pelo Programa Nacional de Fortalecimento dos Conselhos Escolares via MEC), e os mapas das atividades que eles devem realizar. Com o levantamento da participação desses alunos/cursistas, bem como o acompanhamento do trabalho realizado no curso, como: fóruns de debates e/ou atividades, podemos entender melhor como são planejadas e executadas as ações relacionadas aos conselhos escolares, principalmente via Secretaria de Educação nas mais variadas cidades (de diferentes estados), nos possibilitando um panorama da realidade das escolas públicas. A participação facilita o crescimento da consciência crítica da população, fortalece seu poder de reivindicação e a prepara para adquirir mais poder na sociedade (BORDENAVE, 1994, p. 12)

Os dados revelados nessa pesquisa têm intuito de nos mostrar como vem sendo a participação dos técnicos da secretaria básica de educação, e dizem respeito ao curso que está sendo ofertado em 2011. São dados ainda parciais pelo fato do curso estar em andamento. Ele é realizado em duas fases (I e II), com já dissemos, por meio de 147 Grupo de Estudo e Pesquisas em Política Educacional, Rio Claro, 06, 07 e 08 de julho de 2011 Vol. 3 (2011)

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exercícios baseados nos 10 cadernos do Programa Nacional de Fortalecimento dos Conselhos Escolares, e algumas outras reflexões formuladas pela equipe da UFSCar. A fase I no curso consiste na reflexão sobre vários temas encontrados nos cinco primeiros cadernos do MEC. Além disso, a equipe da UFSCar elaborou um questionário informativo para conhecer melhor a situação das Secretarias de Educação e dos conselhos escolares. Os alunos aprovados nesta fase podem matricular-se na fase II que consiste na reflexão sobre temas levantados nos cadernos restantes. No final do curso, os cursistas devem elaborar um plano de ação para fomentar o CE em suas cidades. Para a efetivação da Fase I, foram ofertadas 800 matriculas, das quais seriam distribuídas 200 vagas para cada Estado. Porém, a procura foi muito grande, tivemos 1900 inscrições, sendo que apenas 1293 cursistas foram matriculados. Assim, tivemos matriculados: 466 alunos do estado de São Paulo, 316 do estado do Paraná, 273 do estado do Rio Grande do Sul, e 214 do estado de Santa Catarina. O curso possibilitava que a matricula fosse feita por profissionais da secretaria municipal ou estadual de educação de sua respectiva cidade. Averiguamos que, de todos os alunos participantes, 1189 eram da secretária municipal de educação, e 68 da secretaria estadual. Em principio, os alunos foram inseridos no ambiente coletivo, espaço aonde os cursistas têm uma pequena formação para lidar com o moodle. Somente depois dessa formação é que os introduzíamos em salas de atividades. Cada sala de atividade, batizada com o nome de animal em extinção, tinha um tutor e um bolsista para acompanhar as atividades propostas pelo curso. Temos 20 salas de atividades que, em média, foram compostas por 50 alunos, cada. No curso ofertado em 2010, houve significativa evasão de cursistas 18, por motivos variados, por isso programamos para essa segunda versão, mais tempo para a realização de cada atividade, e ao final de cada caderno uma recuperação paralela. Mesmo nessa perspectiva de motivar os cursistas, percebemos que significativa parte dos nossos alunos/cursistas ainda não participa ativamente do curso, deixando muitas atividades sem conclusão. Apesar de estarmos ofertando a Fase I, já temos em média, 45 pedidos de desistências formais, aos responsáveis pelo curso na UFSCar.

18

Verificar dados mais detalhados sobre o curso ofertado em 2010, no livro: LUIZ, M. C. (org.) & et all. Conselho Escolar: algumas concepções e propostas de ação, SP: Xamã, 2010.

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Se levarmos em conta as 20 salas de atividades, nota-se uma média de 15 a 25 alunos/cursistas que não têm realizado suas atividades obrigatórias, recorrendo assim, as atividades da recuperação paralela. Destaca-se que, para esses cursistas postarem a recuperação paralela de cada caderno, disponibilizamos duas alunas bolsistas de graduação, que ficam conectadas diariamente ao site do curso, e ficam enviando mensagens lembrando-os das atividades que ainda não foram postadas. Para analisar a situação de cada aluno em particular, dividimos as salas de aula, e a cada término de um caderno, enviamos a cada aluno, em particular, um parecer sobre sua participação durante o caderno estudado. Assim, podemos perceber que grande parte desses alunos tem interesse de participar, mas precisa de mais tempo para a realização das tarefas. Outros pedem o afastamento do curso e alguns não entram em contato. No primeiro caderno podemos notar a grande dificuldade que os alunos tiveram em se adaptar ao ambiente de aprendizagem, já no segundo e no terceiro caderno a não participação dos alunos se deu devido à falta de tempo dos mesmos em realizar as atividades propostas, por isso conforme fomos realizando, progressivamente, as atividades de cada caderno, notamos que o número de alunos/cursistas que utilizou as tarefas de recuperação paralela foi aumentando. Apesar da grande dificuldade de muitos alunos/cursistas não participarem ativamente do curso, podemos notar que os que participam têm se empenhado para fortalecer ou até mesmo implantar o conselho escolar em suas cidades. Considerações finais Os conselhos escolares devem ser espaços que proporcionem a democratização nas relações de poder no ambiente escolar. Nascem com o propósito de partilhar o poder entre os agentes educacionais, para que as decisões tomadas sejam coletivas e em prol da qualidade do ensino. Surgem com a idéia de uma escola democrática, que forme cidadãos críticos aptos a atuar conscientemente dentro e fora da escola. Para que isso aconteça, é preciso que haja uma divisão de poder, a participação da comunidade e a construção coletiva do conhecimento. Sabemos que não apenas nas escolas públicas, mas de uma maneira geral, temos dificuldades de garantir uma gestão democrática, em que as tomadas decisões sejam coletivas dentro do sistema educacional. Na perspectiva dos conselhos escolares isso é 149 Grupo de Estudo e Pesquisas em Política Educacional, Rio Claro, 06, 07 e 08 de julho de 2011 Vol. 3 (2011)

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possível, principalmente por incentivo as práticas democráticas de participação, que se daria por meio de discussões coletivas entre os diferentes segmentos desse colegiado. Dentro do ambiente escolar devemos criar espaços onde se promovam estudos reflexivos sobre a importância de prática democrática nas escolas e na sociedade como um todo; salientamos que esses espaços, também podem acontecer fora da escola. O curso a distancia em Conselhos Escolares busca levantar essa reflexão sobre práticas democráticas e promover exercícios de como os CEs podem ser trabalhados e instaurados dentro das escolas públicas, disponibilizando espaços de discussões e trocas de experiências, por meio de fóruns de debates. Destaca-se, também, que esse curso de extensão a distancia, em especial conta com o desempenho dos tutores que é de suma importância, pois é com eles que os alunos/cursistas terão contato, e a expectativa de se sentirem motivados a continuar o esta ―jornada‖ de terminar o curso e fomentar os CEs. Notamos que a procura por matricular-se ao curso foi extremamente significativa, principalmente os técnicos das secretarias básicas de educação, porém a falta de tempo tem sido uns dos fatores relevantes para que esses alunos/cursistas deixem de participar ativamente de todas as atividades propostas, ocasionando assim, algumas desistências. O acompanhamento desse curso a distancia tem nos possibilitado abarcar experiências de como os conselhos escolares de diversas secretarias municipais e estaduais de diferentes cidades dos Estados de São Paulo, Rio Grande do Sul, Santa Catarina e Paraná têm sido constituídos, como estão funcionando, e como são fortalecidos, nos permitindo averiguar experiências bem sucedidas que são únicas, mas que nos permitem socializar ações de sucesso. Além disso, temos visto a preocupação de muitos técnicos das secretarias, assim como diretores e professores preocupados em fazer com que a escola tenha uma gestão democrática baseada na participação da comunidade, tendo em vista a importância dessa participação nas decisões dos processos educacionais que formarão alunos capacitados para atuarem na sociedade de uma maneira mais crítica. O mais importante e de certa forma nos motiva, é que nossos alunos/cursistas vêem no curso uma possibilidade de melhoria dos conselhos escolares onde atuam.

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Referencias BORDENAVE, Juan E. Díaz O que é participação - 8ª ed. – São Paulo: Brasiliense, 1994, (Coleção primeiros passos). FERNANDES, Maria Cristina da Silveira Galan; RAMOS, Géssica Priscila. Conselho Escolar, participação e qualidade da educação no âmbito da gestão democrática. Revista Eletrônica de Educação, Revista Bilíngue do Programa de Pós-Graduação em Educação da UFSCar, Vol.4, n. 2, 2010. Disponível em >Erro! A referência de hiperlink não é válida. acesso em 9/06/2011. LUIZ, Maria Cecília; WELLICHAN, Viviane. Formação Continuada em Conselho Escolar e algumas reflexões sobre a prática da gestão democrática. In: Anais do XXV Simpósio Brasileiro Série Cadernos nº 11 – 2011 – ISSN 1677-3862. Riscal, Sandra Aparecida. Considerações sobre o Conselho Escolar e seu papel mediador e conciliador. In: Conselho Escolar: algumas concepções e propostas de ação, São Paulo: Ed. Xamã, 2010.

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GESTÃO DEMOCRÁTICA: UMA PROPOSTA DE REFORMA NA QUALIDADE DA EDUCAÇÃO INFANTIL

Elisângela Ferreira Sentanin [email protected] UNESP- Faculdade de Ciências e Letras/ Araraquara

Cláudio Benedito Gomide de Souza UNESP- Faculdade de Ciências e Letras/ Araraquara

Resumo: A educação infantil vem ganhando espaço no âmbito das políticas públicas, priorizando a qualidade da educação. Essa busca é compartilhada com o Conselho de Escola através de uma gestão democrática. O objetivo do trabalho foi desenvolver e avaliar as ações de cinco projetos propostos pelo Conselho e verificar os benefícios da gestão democrática e as suas reformas no processo de aprendizagem. Os resultados contribuíram para a clarificação do processo de gestão democrática e mostraram a importância dos envolvidos no processo educacional construírem uma educação pública de qualidade. Palavras-chave: Gestão democrática; Educação infantil; Conselho de Escola

JUSTIFICATIVA Nos últimos anos, o mundo passou por transformações radicais que alteraram, na mesma proporção, o modo de vida do ser humano em todos os sentidos. Assistimos a uma revolução cultural, originada por mudanças de valores e paradigmas, causadas por uma série de acontecimentos. Como parte integrante, a educação tem se expandido na busca de novas ferramentas e metodologias que orientem e auxiliem na efetividade dessas mudanças. Neste contexto, insere-se a educação infantil, primeira etapa da educação básica, que tem a finalidade de proporcionar formação integral da criança, no desenvolvimento de sua capacidade de aprendizagem, na elevação do nível de inteligência e na interação social mediante a ação sobre os objetos, as circunstâncias e os fatos.

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Atualmente ela vem sendo foco de discussões nas políticas educacionais com o propósito de reformas na busca da qualidade do ensino. Um exemplo disto é o Plano Nacional de Educação – PNE, aprovado pela Lei no 10.172, de 09 de janeiro de 2001, priorizando reformas que visam à melhoria da qualidade do ensino em todos os níveis. No PNE estão estabelecidas as diretrizes para a educação infantil, pois se acredita que este nível da educação seja a base da formação da personalidade humana, da inteligência, da vida emocional e da socialização. São as primeiras experiências da vida que marcam mais profundamente a pessoa. Quando positivas, tendem a reforçar as atitudes de autoconfiança, cooperação, solidariedade e responsabilidade. As ciências que se debruçaram sobre a criança nos últimos cinqüenta anos, investigando como se processa o seu desenvolvimento, coincidem em afirmar a importância dos primeiros anos de vida para o desenvolvimento e aprendizagem posteriores. E têm oferecido grande suporte para a educação a formular seus propósitos e atuação a partir do nascimento. A pedagogia mesma vem acumulando considerável experiência e reflexão sobre sua prática nesse campo e definindo os procedimentos mais adequados para oferecer às crianças interessantes, desafiantes e enriquecedoras oportunidades de desenvolvimento e aprendizagem. A educação infantil inaugura a educação da pessoa (LEI No 10.172, DE 9 DE JANEIRO DE 2001). Uma das metas da educação infantil presente no Plano Nacional de Educação (2001) é ―implantar conselhos escolares e outras formas de participação da comunidade escolar e local na melhoria do funcionamento das instituições de educação infantil e no enriquecimento das oportunidades educativas e dos recursos pedagógicos‖. Diante desta proposta percebe-se grande apreço pela democratização da gestão do ensino público. O conceito de gestão democrática, que prevê o sentido de cooperação e autonomia, passa a ser difundido na instituição escola e esta nova proposta vem sendo utilizada como ideias inovadoras na busca da ação participativa (LUCK, 2008). A autora ressalta ainda que aposta na instituição escola com um novo propósito, ou seja, com a função de uma gestão democrática através da participação ativa de todos os envolvidos no processo educacional. Atualmente é perceptível a iniciativa e incorporação da gestão democrática em práticas escolares, pois o olhar não está mais voltado somente para um poder centralizado no diretor. De acordo com Dourado (2008), a gestão democrática deve ser uma prática social permeada de autonomia, de possibilidades de participação e de 153 Grupo de Estudo e Pesquisas em Política Educacional, Rio Claro, 06, 07 e 08 de julho de 2011 Vol. 3 (2011)

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contribuições e aprendizado. Esta democratização do ensino surge em caráter de qualidade em que o Estado busca cumprir seus objetivos e, em muitos casos, propõe um planejamento por objetivos e metas, mas esta qualidade depende de toda comunidade escolar, inclusive do diretor (ANDRADE, 2006; PARO, 2009; CARAPETO, 2007). A função do diretor, entendida como administrativa e burocrática (ALONSO, 1979), deixa de ter veracidade a partir do momento em que os olhares voltam-se mais ao meio exterior e isto é reforçado por Natércio (1994) quando apresenta este olhar de forma fundamental para contribuição neste processo. Esta questão também está explícita no Decreto no 6.094, de 24 de abril de 2007, artigo 2o, inciso XXII ―promover a gestão participativa na rede de ensino‖ apresentando-nos mais um fator de incentivo a gestão democrática. Mas, conforme Azevedo (1997, p.59) ―não se pode esquecer que a escola e, principalmente a sala de aula, são espaços em que se concretizam as definições sobre a política e o planejamento que as sociedades estabelecem para si próprias, como projeto ou modelo educativo que se tenta pôr em ação‖. Este tipo de gestão é visível e incentivado por uma Prefeitura Municipal do interior de São Paulo através do Conselho de Escola. O Conselho de Escola desta Prefeitura é constituído por representantes da comunidade escolar atuando em sintonia com a administração da escola, definindo caminhos para a tomada de decisões administrativas, financeiras e político-pedagógicas de acordo com as necessidades da escola. Sua função é participar das decisões da escola, acompanhando a aplicação de recursos e discutindo prioridades da instituição, além de avaliar a atuação da escola na execução do projeto político pedagógico, bem como participar das discussões sobre assuntos de interesse da comunidade escolar. É constituído de vários objetivos e, dentre eles destacamos o acompanhamento e avaliação do trabalho pedagógico desenvolvido pela comunidade escolar, realizando as intervenções necessárias, tendo como pressuposto o projeto político-pedagógico da escola e também, a garantia do cumprimento da função social e da especificidade do trabalho pedagógico da escola, de modo que a organização nas atividades educativas escolares esteja pautada nos princípios da gestão democrática. O Conselho é composto pelo diretor da escola, pedagogos, professores, demais funcionários da escola, alunos maiores de 16 anos e pais ou responsáveis por alunos. Uma de suas funções é a colaboração na execução das medidas definidas no conselho escolar, desenvolvendo ações no âmbito de sua 154 Grupo de Estudo e Pesquisas em Política Educacional, Rio Claro, 06, 07 e 08 de julho de 2011 Vol. 3 (2011)

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competência. É regido pelo Decreto-Lei no 11 de 5 de fevereiro de 2003, pelo Decreto no 203 de 13 de junho de 2007, e pela Lei Municipal no 13.889 de 18 de outubro de 2006 (PREFEITURA MUNICIPAL DE SÃO CARLOS, 2011). Seguindo este modelo de gestão as instituições de educação infantil dessa Prefeitura, implantaram os conselhos de escola como parte integrante da proposta de uma gestão democrática. Dentro de suas contribuições para a gestão da escola, uma de suas ações que abordamos neste trabalho, foi a participação efetiva dessa equipe nas propostas pedagógicas, executadas através de projetos. Dentre as instituições de educação infantil abordaremos uma escola como modelo no desenvolvimento de projetos com a parceria escola-comunidade.

OBJETIVOS Este trabalho teve por objetivo desenvolver e avaliar os projetos pedagógicos propostos pelo conselho de escola em parceria da comunidade nos anos de 2008 a 2010, e verificar os benefícios de uma gestão democrática e as suas reformas no processo de ensino e aprendizagem de alunos de uma instituição de educação infantil em uma rede pública municipal do interior de São Paulo. Como objetivo secundário avaliou a aceitação, dessa nova proposta por parte dos envolvidos no processo (diretor, professores, funcionários, pais e comunidade).

METODOLOGIA Este estudo foi realizado em um centro municipal de educação infantil de uma cidade do interior de São Paulo. O motivo pela escolha desta instituição justifica-se pelo fato de apresentar propostas de reforma em sua gestão, através de uma gestão democrática, principalmente em relação à sua proposta pedagógica. Ela possui o Conselho de Escola que é composto pelo diretor, professores, funcionários, pais de alunos e pessoas da comunidade. Durante as reuniões do Conselho, na maioria das vezes, havia uma preocupação com o aspecto pedagógico da escola, principalmente por parte dos professores, pois a Prefeitura não possuía nenhuma diretriz que norteava o trabalho docente. Conforme sugestões levantadas pela equipe do Conselho de escola, durante o ano de 2008, 2009 e 2010, foram desenvolvidos alguns projetos em parceria da comunidade objetivando a melhoria na qualidade do ensino. O projeto que deu início a esse ciclo foi ―Com as mãos na horta: um projeto implantado na educação infantil‖ 155 Grupo de Estudo e Pesquisas em Política Educacional, Rio Claro, 06, 07 e 08 de julho de 2011 Vol. 3 (2011)

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que teve duração de um ano, e de acordo com Sentanin et al. (2008), sua finalidade foi proporcionar às crianças o contato com a natureza nos primeiros anos de vida para adquirirem atitudes e comportamentos saudáveis, sendo a escola também responsável por esta ação. Foi desenvolvido com o objetivo de ensinar e criar nos alunos hábitos alimentares saudáveis; promover a conscientização ambiental, proporcionar o contato da criança com a natureza, reforçar a merenda escolar, ajudar as famílias socialmente, contribuindo com os vegetais e hortaliças que foram colhidos, incentivar, também nos pais, hábitos saudáveis e utilizar a observação direta das crianças para o acompanhamento e obtenção de dados e informações sobre o desenvolvimento dos vegetais. Consistiu de cinco etapas e os resultados alcançados mostraram que este tipo de atividade com as crianças proporcionaram uma familiarização com as hortaliças e, principalmente, estes hábitos foram estendidos aos familiares, fora do ambiente escolar. Este projeto demonstrou que o trabalho desenvolvido pelos professores torna-se qualitativo e significativo a partir do momento que extrapolam os limites da escola, deixando de ser somente projetos educacionais para tornarem-se também projetos sociais, envolvendo a família e a comunidade. Do ponto de vista ambiental, a realização possibilitou às crianças uma aproximação com o meio ambiente, oferecendo-lhes oportunidade de contato direto com a terra, e sua conscientização. No ano de 2009 foi desenvolvido o projeto de informática que teve como objetivo implantar, acompanhar e avaliar um sistema de inclusão digital no processo de ensino-aprendizagem (SENTANIN, 2009). O material utilizado foi cedido por uma escola particular da cidade e era composto de um micro-computador completo, com caixas de som, um teclado de sistema iluminado e uma mesa preparada para o desenvolvimento de atividades associados ao teclado. O conjunto permitia a utilização simultânea de três crianças. No computador estava instalado um software que continha programas educativos voltados para crianças de 3 a 6 anos. Vale ressaltar, que o projeto atendeu a proposta do Conselho de Escola que tinha a finalidade de aprendizagem das crianças e também o incentivo à comunidade na busca dessa tecnologia. O software foi uma ferramenta de complementação das atividades desenvolvidas, como forma de inserção das crianças e, posteriormente dos familiares, no ambiente da tecnologia de informação. As atividades eram desenvolvidas, primeiramente, em sala de aula e, posteriormente, aplicadas diretamente no computador.

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Também no ano de 2009 foi realizado o projeto ―As diferenças raciais na educação infantil: um projeto desenvolvido em parceria escola/comunidade‖ em que Sentanin et al. (2009) enfatizam que muitos preconceitos raciais que ocorrem na sociedade muitas vezes têm inicio ainda quando crianças, com pequenas diferenças entre si vivenciadas, principalmente em relação à cor da pele, inicialmente sem qualquer tipo de malícia mas que, por inúmeras vezes, se concretizam em preconceitos raciais futuros. Levando-se em consideração esses fatores e alguns aspectos apresentados na literatura, foi desenvolvido este trabalho, com o objetivo de desmistificar, conscientizar, educar e fazer com que as crianças, professores, pais e a comunidade, refletissem sobre a questão étnico-racial. Por meio de atividades desenvolvidas com as crianças, familiares, comunidade e professores, foram trabalhados os aspectos relacionados aos estereótipos presentes na sociedade. Dando continuidade em 2010, ao trabalho desenvolvido no ano anterior, foi realizado o projeto ―Proposta desmistifica diferenças étnico-raciais na educação infantil‖. Para que a diferença racial não torne, um preconceito, Sentanin (2010) ressalta a importância de ações educativas introduzidas no cotidiano das crianças desde seus primeiros anos de vida. Reforça que a educação tem papel fundamental nesse contexto, sendo de extrema importância o desenvolvimento de projetos como este, que enfatizem as diferenças culturais, raciais e sociais no ambiente escolar, associados ao seu projeto político pedagógico. Em função desta realidade, este projeto teve como objetivo trabalhar com as crianças as questões de preconceitos raciais existentes, abordar temas étnico-raciais envolvendo a instituição escola/comunidade, proporcionar formação aos professores sobre o tema e desenvolver na criança, conceitos relacionados à formação humana enfocando virtudes que colaborem com a diminuição do preconceito racial. O projeto, desenvolvido em parceria escola/comunidade, constou da confecção de bonecos a partir do contorno corporal dos alunos e suas características, curso de formação de professores, pais e demais interessados com palestrantes provenientes do Continente Africano, levantamento de dados étnico-raciais e de uma festa realizada e voltada à comunidade acerca do tema. Com o desenvolvimento das atividades verificou-se que as crianças envolvidas passaram a conviver mais harmoniosamente entre elas em relação às questões da cor da pele. Em atividades realizadas nas rodas de conversa pode-se avaliar que as crianças realmente haviam internalizado os objetivos propostos. Em relação aos professores, percebeu-se uma motivação e um maior interesse em trabalhar 157 Grupo de Estudo e Pesquisas em Política Educacional, Rio Claro, 06, 07 e 08 de julho de 2011 Vol. 3 (2011)

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as diferenças étnico-raciais com os alunos através de projetos sobre o tema principalmente por ter o apoio da família. O interesse dos alunos também pode ser verificado por meio de comentários realizados por alguns pais sobre os relatos feitos em casa pelas próprias crianças sobre as atividades realizadas. Ainda no ano de 2010 foi realizado o projeto ―Cadê a água limpa? Projeto desenvolvido em parceria escola/comunidade‖. Durante as atividades de higiene desenvolvidas com as crianças da fase três de um Centro Municipal de Educação Infantil como, escovar os dentes, lavar as mãos, beber água e utilizar o banheiro, notouse um desperdício considerável de água. Diante disto, segundo Sentanin et al. (2010), desenvolveu-se um projeto em parceria escola/comunidade, pois tanto a família quanto a escola tem a responsabilidade hoje de participar da construção de valores básicos da consciência cidadã da criança, para que no futuro tenham hábitos éticos, sadios e responsáveis quanto à preservação e desenvolvimento sustentável da terra. Teve por objetivo conscientizar as crianças para o uso racional de água, trabalhar em parceria com a comunidade visando à responsabilidade e a construção de valores ambientais e estimular hábitos de higiene como jogar lixos em lugares adequados. Foi desenvolvido em parceria com a comunidade. Primeiramente conversou-se com os pais (em reunião) sobre o projeto que seria desenvolvido enfatizando a importância da participação da comunidade para que o mesmo pudesse ser efetivo. Ele constou de um aquário com um peixinho beta e comida adequada ao animal. As crianças levavam o peixe para casa para que, junto com os pais, pudessem oferecer os devidos cuidados ao peixinho. A intenção foi de promover uma conscientização ambiental. Também foram desenvolvidas atividades como contação de histórias, músicas e filmes. Foi confeccionado junto às crianças um rio limpo e sujo para demonstrar a irresponsabilidade do homem com a natureza, bem como as conseqüências destrutivas que ocorrem no planeta. Os pais colaboraram com recortes de revistas que continham gravuras com objetos que são depositados irregularmente na natureza, e na escola, através de rodas de conversas, momentos em que relatavam a experiência do cuidado com o peixinho em casa. O melhor caminho a trilhar por nossa geração é fazer do lar um exemplo e da escola um centro de mudanças de valores, hábitos e atitudes através da educação ambiental como conceito transversal aos diálogos familiares. Os familiares confeccionaram folders de conscientização e distribuíram à comunidade do bairro. Através dos relatos dos pais notou-se que as crianças passaram a ter mais responsabilidade em relação aos cuidados 158 Grupo de Estudo e Pesquisas em Política Educacional, Rio Claro, 06, 07 e 08 de julho de 2011 Vol. 3 (2011)

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com o meio ambiente (jogar o lixo no lixo, regar as plantas, cuidar dos animais de estimação, etc.). Durante as atividades desenvolvidas verificou-se o entusiasmo das crianças em relação à preservação, bem como os cuidados com a água nos momentos de higiene. Estas questões ambientais estão se tornando emergencial e as soluções precisam sair do campo teórico governamental para serem urgentemente aplicadas com a participação de comunidade consciente de sua responsabilidade.

RESULTADOS E CONCLUSÕES A educação infantil vem conquistando e ganhando cada vez mais espaço no âmbito das políticas públicas, priorizando reformas na qualidade do atendimento das crianças até cinco anos. Essa busca da qualidade, que visa o desenvolvimento integral do indivíduo, em seus aspectos físico, cognitivo, motor e social, é compartilhada com o Conselho de Escola que tem o propósito de uma gestão democrática. O centro municipal de educação infantil em que foi desenvolvido este projeto priorizava a democratização do ensino como qualidade na educação e acreditava na sala de aula como lugar em que se concretizava qualquer tipo de planejamento educacional e político. Essa instituição, através de seu Conselho de Escola, que era parte integrante de uma gestão democrática, apresentava várias propostas de projetos pedagógicos. Os projetos nortearam o trabalho docente e garantiram uma aprendizagem efetiva a partir do momento em que escola e família participaram do mesmo processo. Para as crianças os conceitos trabalhados faziam parte do seu cotidiano facilitando assim o ensino e aprendizagem. Os trabalhos desenvolvidos nos anos de 2008 a 2010 buscaram, prioritariamente a qualidade pedagógica através da parceria família e comunidade. Porém, os benefícios foram percebidos na questão da participação efetiva de pais e comunidade nos assuntos da escola tanto pedagógicos quanto administrativos. Foi um incentivo e encorajamento para a sociedade, inclusive várias pessoas da comunidade se mobilizaram e integraram a equipe da APM (Associação de Pais e Mestres) pensando no recurso do PDDE (Programa Dinheiro Direto na Escola) como investimento na melhoria da instituição em benefício da educação dos seus filhos. Em relação aos professores, houve em um primeiro momento, algumas dificuldades em conciliar ideias, sugestões e a própria presença dos pais na escola durante a participação das atividades propostas nos projetos. Verificando os benefícios

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dessa parceria na efetivação do trabalho proposto e nos resultados da aprendizagem das crianças este estereótipo foi sendo quebrado. Acredita-se que este tipo de trabalho tenha contribuído para a clarificação do processo de gestão democrática na educação e sirva para a melhoria contínua do processo. Porém está colocada aos educadores, familiares, comunidade e demais envolvidos no processo de educação a tarefa da construção de alternativas para educação pública e de qualidade mediante políticas educacionais decididas e elaboradas democraticamente.

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CULTURA ORGANIZACIONAL DA ESCOLA E GESTÃO DEMOCRÁTICA: ALGUMAS REFLEXÕES TEÓRICAS

Maria Gabriela Bersosa [email protected] Universidade Federal de São Carlos – UFSCar

Thais Elena Lotumolo [email protected] Universidade Federal de São Carlos – UFSCar

Resumo: Este trabalho teve como objetivo refletir sobre a cultura organizacional e a gestão democrática, partindo do pressuposto de que é importante evidenciarmos a organização da escola, o modelo de gestão que nela está sendo praticado e as políticas públicas educacionais presentes em seu contexto, já que são esses aspectos que nos possibilitam saber qual a concepção de educação que é seguida, o tipo de aluno que se pretende formar, as relações que existem no meio educativo, e se a autonomia se faz presente no ambiente escolar. Dessa forma, serão discutidas maneiras de contemplar a gestão democrática no espaço educativo, envolvendo a autonomia, o trabalho coletivo e a participação na organização escolar. Palavras-chave: políticas públicas, cultura organizacional, gestão democrática.

Nesse texto nos propomos a refletir sobre a cultura organizacional e a gestão democrática, partindo do pressuposto de que é importante evidenciarmos a organização da escola, o modelo de gestão que nela está sendo praticado e as políticas públicas educacionais presentes em seu contexto, já que são esses aspectos que nos possibilitam saber qual a concepção de educação que é seguida, o tipo de aluno que se pretende formar, as relações que existem no meio educativo, e se a autonomia se faz presente no ambiente escolar. É importante lembrar que os princípios gerais de organização e gestão desenvolvidos no século XX e que estão inseridos no contexto da Revolução Industrial são marcados pela idéia da racionalidade, da eficácia e da eficiência, que traz consigo a 162 Grupo de Estudo e Pesquisas em Política Educacional, Rio Claro, 06, 07 e 08 de julho de 2011 Vol. 3 (2011)

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busca constante de se produzir cada vez mais, de uma forma mais econômica. Embora, a princípio, essa lógica tenha se originado nas indústrias e empresas, as instituições escolares também passaram a fazer parte dela. E apesar de que ao longo dos anos tenham existido outras formas de pensar a administração escolar, acredito que essa seja a que ainda é predominante nas escolas o que pode ser notado em muitas práticas que já se encontram, de certa forma, arraigadas em seu interior e que advém muitas vezes das políticas que nela se inserem, exigindo resultados que são verificados, constantemente, através de avaliações. Nessa direção, Fonseca e Oliveira (2009) nos ajudam a visualizar qual o impacto de algumas políticas públicas na administração escolar através de uma pesquisa realizada por eles nos anos 90 em que examinaram dois programas governamentais, o Pró-Qualidade e o Fundescola, projetos que integravam a política de financiamento do Banco Mundial para o desenvolvimento da gestão da escola básica. Torna-se necessário contextualizar que na década de 90 o Brasil passava por uma reestruturação política, econômica e educacional com inspiração essencialmente neoliberal, descentralizadora, que retirava do Estado a responsabilidade sobre determinados assuntos, transferindo-a para os estados e municípios. Tudo isso, como não podia ser diferente, acabou por influenciar a gestão educacional que também precisou adaptar-se às demandas da nova estrutura produtiva e tecnológica que se voltava para um caráter mais gerencial. Segundo Vieira (2007), a escola e sua cultura organizacional se configuram como um espaço de reconstrução e de inovação, oferecendo elementos para a formação de novas políticas. Dessa forma, analisar as políticas públicas de educação requer compreender as ações oriundas das diferentes esferas do poder público, a escola e seus agentes educacionais. De acordo com a autora (op.cit. 2007), toda unidade escolar deveria buscar a excelência do ensino e aprendizagem de seus alunos, e para tanto faz necessário uma gestão que seja verdadeiramente democrática e participativa. Para Pereira (2008), existe a necessidade de compreendermos realmente do que se tratam algumas políticas públicas, já que elas trazem discursos inovadores no processo de formação cultural e social. Estes discursos se representam na legislação educacional, e carregam como premissa uma educação de qualidade e para a cidadania. Portanto, se faz necessário repensar no tipo de sujeito que as políticas públicas desejam formar. A escola precisa de consciência política e visão crítica em sua prática 163 Grupo de Estudo e Pesquisas em Política Educacional, Rio Claro, 06, 07 e 08 de julho de 2011 Vol. 3 (2011)

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organizacional, com vistas a não reproduzir ideologias do mercado e não funcionar como instrumento de reprodução de desigualdades e das relações de produção. Ao optar por uma postura política, cria uma posição que visa ou os interesses do capital ou a transformação social. Segundo Rothen e Conti (2010) as influências das políticas públicas educacionais, tanto no trabalho quanto na formação docente, representam um direcionamento, dos quais fica evidente a função social da escola. Assim, para se pensar em uma educação de qualidade, é preciso buscar mecanismos de ações democráticas e políticas quem rompam com as práticas já cristalizadas dentro da esfera organizacional.

A perspectiva da gestão democrática e o Projeto Político Pedagógico

A partir dos anos 1970 e 1980, temos no Brasil, uma busca pela autonomia pedagógica das escolas, principalmente com relação à construção dos projetos políticopedagógicos. Dessa forma, a política educacional propôs uma gestão escolar tendo como base uma administração e um financiamento descentralizados, embora os processos avaliativos ainda continuassem centralizados na União. Segundo Michels (2006), essa perspectiva influenciou e influencia ainda hoje, a organização do tempo na escola, focalizando o professor como ―elo‖ de ligação entre a escola e sociedade. Sendo assim, por mais que essa reforma busque mudanças, ela não propõe a transformação da escola, pois mantém as relações já pré-estabelecidas. Tal reforma educacional no Brasil discorre sobre assuntos importantes, como por exemplo, a gestão, o financiamento, a avaliação, a formação de professores, o currículo e a inclusão. Dessa forma, a escola deve apresentar flexibilização nos aspectos mencionados, já que os mesmos compõem a organização escolar. Nesse contexto, Lima (2003) nos leva a perceber que os modelos organizacionais influenciam as políticas, as reformas de ensino, a legislação e a questão da autonomia da escola, já que toda instituição recria e interpreta o que lhe é decretado, além de seguir algumas medidas burocráticas comuns a todas instituições. Os modelos organizacionais da escola podem ser compreendidos como analíticos, normativistas ou 164 Grupo de Estudo e Pesquisas em Política Educacional, Rio Claro, 06, 07 e 08 de julho de 2011 Vol. 3 (2011)

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numa perspectiva sociológica, estando em um constante processo de estruturação através da ação do homem. Para Mendonça (2001), há resistência e dificuldade na implantação de uma gestão democrática na escola por conta de fatores de interferência política e de mecanismos autoritários que estão embutidos na história das relações escolares e de toda a sociedade. O processo de patrimonialismo e burocratização do Brasil impediram a modernização do Estado, além de dificultar a implantação de uma gestão democrática no ensino público. Diante disso, o ensino enfrenta dificuldades de implantar um sistema participativo, pois apresenta um modelo arraigado de não participação e de modelos individualistas. Antigamente a gestão escolar era baseada no modelo clássico de administração e tinha uma visão mecanicista. Luck (2007) descreve a respeito do aspecto crítico da gestão, que visa que todos os membros da escola estejam capacitados para resolver os problemas e tomar as decisões necessárias. É preciso que haja programas que sejam desenvolvidos com a perspectiva do crescimento dos profissionais, de forma que eles possam avaliar seu desempenho. Também é muito importante nesse processo que a escola abra as portas para a participação dos responsáveis pelos alunos na gestão escolar, para que dessa forma eles percebam que podem colaborar com opiniões e sugestões. Como contraponto, Paro (2008) discorre sobre as tentativas de democratização da escola que não trouxeram resultados. Segundo ele, é necessária uma mudança total da estrutura escolar para que possa ser implantada uma gestão democrática. A educação tradicional deve ser superada para que haja a formação de um sujeito histórico-social dentro das relações que estabelece na sociedade. A escola deve ser pensada em sua totalidade e ter uma harmonia entre as atividades meio e fim para ser democrática. Por isso, aspectos como organização, melhor estrutura didática, currículo, trabalho docente, autonomia do educando e integração da comunidade com a escola são de extrema importância para a mudança do atual espaço escolar e a busca da democracia. Arroyo (2008) relata que durante a década de 1980, em virtude dos movimentos sociais, surgiram muitas reflexões e debates a respeito da gestão democrática, sendo que ela contrapunha-se ao controle do poder centralizado do Estado e buscava tornar a escola um espaço público, libertando-a das formas tradicionais de privatização. A busca pela gestão democrática não deveria ficar apenas na defesa de princípios, mas sim em lutar também pela garantia de direitos pela transformação social, política e pedagógica. 165 Grupo de Estudo e Pesquisas em Política Educacional, Rio Claro, 06, 07 e 08 de julho de 2011 Vol. 3 (2011)

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Após mais de duas décadas, alguns campos do cotidiano escolar tiveram mais influências que outros com relação à reflexão sobre a gestão democrática. Pode-se destacar o campo da eleição direta, o sistema de votação e a elaboração do plano pedagógico. Segundo Libâneo (2001) descreve também está relacionada com o modelo organizacional da escola, sendo que ele define a gestão como uma maneira de mobilização de meios e procedimentos para que sejam atingidos os fins que a instituição escolar necessita. Com base no autor, para que se construa uma escola democrática é preciso que as condições pedagógicas e organizacionais sejam asseguradas. Libâneo (2001) nos mostra algumas concepções de organização e gestão, como o modelo organizacional de uma instituição que possui uma gestão democráticoparticipativa. Esta deve apresentar metas que sejam comuns a todos, como responsabilidade, comunicação, espírito de conquista e liderança. Nessa concepção é possível perceber que a mesma tem sua prática baseada em uma relação entre a gestão da escola e a participação dos membros da mesma. Portanto, é uma forma coletiva de gestão no processo de tomada de decisão e escolha de objetivos. Nessa concepção democrático-participativa existe uma corrente teórica que considera a organização escolar como cultura, já que esse espaço educativo é composto por experiências e interações sociais das pessoas que compõem esse contexto. A organização escolar busca relações de participação e engloba a construção cultural das pessoas, além de continuar valorizando aspectos organizativos, como o planejamento, a gestão, a direção e a avaliação. Para Arroyo (2008), a gestão da educação ocorre em todos os âmbitos da escola, inclusive dentro da sala de aula, onde o projeto político pedagógico é desenvolvido. A tomada de decisão resulta de um processo contínuo que se inicia com a consciência da necessidade de decidir. Isso pode ser feito individualmente de forma autoritária ou coletivamente, propiciando a riqueza de ideias e a participação dos interessados. Para que isso aconteça, é preciso que haja diálogo e respeito entre os membros. A representação do projeto político pedagógico para Pereira (2008), significa ter um espaço da coletividade escolar e a autonomia no seu meio educativo. Segundo Riscal (2009) o projeto político pedagógico é um instrumento da administração escolar que teve origem na concepção de gestão democrática e na sua elaboração coletiva que demanda discussão e reflexão em torno da concepção de 166 Grupo de Estudo e Pesquisas em Política Educacional, Rio Claro, 06, 07 e 08 de julho de 2011 Vol. 3 (2011)

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educação da sociedade com a escola. Assim, o que caracteriza o projeto político pedagógico é o seu processo de construção, pois se constitui como a instauração de um meio democrático de decisão na escola e estabelece uma organização do trabalho pedagógico baseado num debate democrático. A gestão democrática permite a superação da competitividade e do autoritarismo das relações entre os diferentes agentes da educação escolar. O projeto político pedagógico é uma forma de autonomia das escolas, em que é possível afirmar o que deseja a comunidade escolar na forma de um documento oficial, podendo estabelecer seus objetivos quanto à educação e a maneira como a escola se organiza para atingi-los. Baseando-se em uma escola democrática na qual as decisões são tomadas coletivamente, o projeto político pedagógico elaborado e discutido pelos membros da comunidade escolar não deve ser padronizado para todas as escolas, já que cada instituição é única. Algumas considerações

O profissional da educação deve ter o compromisso de garantir que os princípios humanos sejam desenvolvidos nos conteúdos pedagógicos, visando à qualidade da educação para todos em sociedade. A gestão democrática é de fundamental importância para a formação dos educadores, visto que nela está contida a possibilidade de formar de cidadãos justos, participativos, responsáveis e solidários. Na formação dos profissionais da educação, Ferreira (2006) descreve acerca da trajetória de lutas, conflitos, desvalorização da profissão e ausência de condições necessárias à qualidade da formação pelo poder público. Segundo a autora, a razão da instituição escolar é de formar o ser humano na dimensão pessoal e profissional, fortes intelectualmente, capazes tecnicamente, ajustados emocionalmente e ricos de caráter. A escola é um local diferenciado, uma vez que fornece um tipo de formação que não é facilmente adquirida em outro lugar. A vida futura das pessoas que passarem pela escola terá como reflexo o que a escola propiciou ao aluno. Portanto, os profissionais da educação devem ter uma formação de qualidade que possibilite o acesso à cidadania. De acordo com Libâneo (2001), a escola atual necessita proporcionar formação cultural e científica, sendo contra a exclusão econômica, política, cultural, pedagógica. Dessa forma, o papel da escola é tão fundamental na função de criar subsídios para que

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a população amplie sua capacidade reflexiva e crítica com relação à produção e difusão do saber científico e da informação. Para Santos Filho (1998), o papel da escola é formar o aluno para os valores da democracia e o respeito pela dignidade. Visto que na democracia, todos podem debater sobre problemas até chegarem ao certo consenso, as diferentes opiniões possibilitam uma construção e as diferenças possibilitam a mudança. A gestão democrática surge com o intuito de alimentar a existência de espaços para a expressão dos interesses e desejos dos membros de uma instituição, que tem sua própria cultura e exerce determinado poder. Visando o entendimento da forma de funcionamento da escola e possibilitando novas maneiras de gerir essa instituição, é necessário que haja uma melhor compreensão acerca da cultura escolar. Segundo Teixeira (2002, p. 40) o conceito de cultura, que ―é o elo que une sistemas simbólicos, códigos, normas e as práticas simbólicas cotidianas que interagem pela reapropriação e reinterpretação daquilo que constitui a memória social‖. Dessa forma, a escola é um sistema sociocultural que se diferencia das outras instituições, já que ela cria e reproduz normas e constitui uma identidade e cultura própria. Assim, a organização da escola tem sua realidade específica, manifestando-se por meio de valores, crenças, ideologias e comportamentos, que constituem uma determinada cultura escolar. Com isso, o espaço escolar busca que os alunos tenham aprendizagem e desenvolvimento, porém ao mesmo tempo das aprendizagens dos conteúdos, ocorre à aprendizagem da cultura escolar, também importante para a formação dos mesmos.

O conceito de cultura organizacional, baseado na participação ativa dos indivíduos e na análise do simbólico, permite compreender a realidade da escola como um processo de construção social e opõe-se à tradição estrutural funcionalista (TEIXEIRA, 2002, p. 45).

A cultura escolar para Oliveira (2002) é um conjunto de mecanismos de controle da vida da escola, uma vez que vai além dos costumes e hábitos de determinada sociedade. É preciso considerar que existem diferentes culturas e há vários tipos de indivíduos em cada cultura. O modelo burocrático, segundo Teixeira (2002), ainda está presente em virtude do centralismo administrativo que foi exercido ao longo do período colonial, marcando

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a cultura do povo brasileiro e amarrando a escola a instâncias burocráticas administrativas centrais. Para Paro (1993), a escola tem como função a apropriação e a transmissão do saber historicamente acumulado, além do desenvolvimento da consciência crítica da realidade, objetivos próprios do processo pedagógico e que fazem parte de uma educação transformadora. Nesse sentido, Abrucio (2010) nos leva a observar que as políticas públicas educacionais devem desenvolver-se no sentido da melhoria do processo de formação, capacitação e profissionalização dos agentes escolares. É preciso partir da gestão escolar que temos para implementar novas concepções e criar condições para que se estimule a participação e os fins democráticos. Democratizar a escola é democratizar a sociedade e buscar a transformação social.

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CONCEPÇÕES DE PROFESSORES SOBRE A GESTÃO ESCOLAR Marcos Jorge [email protected] Universidade Estadual Paulista ―Júlio de Mesquita Filho‖ – campus de Bauru

Resumo: O estudo apresenta as concepções de professores sobre a gestão escolar atual. Discute as políticas educacionais dos anos 90, destacando a avaliação e a gestão escolar como meios para impor à escola mecanismos de qualidade e eficiência. Aponta a introdução de uma cultura gerencial de controle sobre o trabalho docente e a participação da comunidade. Trata-se de uma pesquisa exploratória com aplicação de questionários de perguntas fechadas construído no modelo da Escala de Likert e com tratamento estatístico de análise fatorial. Os resultados indicam para uma ênfase na concepção oficial de gestão escolar e no compartilhamento das responsabilidades como bases de uma gestão escolar democrática. Palavras-chave: Gestão escolar. Escala de Likert. Política educacional.

Delimitação do Problema

A gestão educacional operada atualmente nos diversos sistemas de ensino municipais e estaduais é tributária, primeiro da reestruturação capitalista, e um dos seus efeitos diretos, as mutações do mundo do trabalho a partir de meados da década de 70 e, segundo, da ação política dos governos latino-americanos dos anos 90, que seguindo o ideário neoliberal pregado pelo Banco Mundial, desmontaram uma incipiente estrutura de bem estar social, ainda incompleta, e implementaram o chamado Estado Mínimo na região. (ANTUNES e ALVES, 2004; FONSECA, 1997). Para a análise do fenômeno educacional e a sua gestão no contexto colocado, é importante observar que do primeiro processo (a reestruturação da produção capitalista) um dos elementos que se destaca é a incorporação (pelo discurso e prática educacionais) das teses que buscavam aplicar novas formas de gerir o capital no interior das fábricas, visando a maximização da produtividade, a partir da maquinaria informatizada, e da gestão dos recursos humanos agora, em grande parte, ―liberado‖ da antiga especialização fordista-taylorista do trabalho manual e mecânico, inserido numa nova 172 Grupo de Estudo e Pesquisas em Política Educacional, Rio Claro, 06, 07 e 08 de julho de 2011 Vol. 3 (2011)

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divisão social do trabalho, onde se perseguem como paradigmas de formação de ―recursos humanos‖, não o aprimoramento das destrezas físicas a partir do treinamento e da repetição de gestos, mas sim as ―habilidades individuais‖, as ―capacidades cognitivas‖ e os ―comportamentos colaborativos‖ dos trabalhadores para a um novo modelo de empresa ou corporação, que opera a partir de ―grupos‖, ―círculos‖ ―equipes‖, ―times‖ etc. Dessa maneira, o ponto a salientar, é que o toyotismo, como novo paradigma de gerenciamento fabril, propagou incansavelmente, ao longo dos anos 90, a ―idéia de que a reintegração de atividades e o emprego de uma mão-de-obra mais qualificada eram necessários ao desenvolvimento de um trabalho mais rico e variado‖ (SHIROMA e CAMPOS, 1997, p.13 - 4). Estabelecia-se então que a qualificação do trabalhador, via uma educação básica pública supostamente de qualidade inequívoca, era a solução para que o tímido capitalismo brasileiro, com seus baixos níveis de produtividade, remate de inúmeras décadas de descaso do Estado com a educação, finalmente se colocaria em condições de inserir-se no descortinado e competitivo mercado global. Tal discurso tão característico dos falsos ―diagnósticos‖, que pulularam no decorrer da década, sobre o alcance da modernização interna e da inserção globalizada do capitalismo brasileiro, instigaram ―iniciativas de promoção de programas de educação para a competitividade, uma vez que a educação adquiria uma centralidade [naqueles] novos ―modelos‖ de produção‖ (SHIROMA e CAMPOS, 1997, p.14). Carreada pelo empresariado nacional e internacional, governos de todas as esferas e mídias, a sociedade civil (em organização pós-ditadura) assistia e participava, em menor grau, de um incerto movimento todos pela educação, palavra de ordem sempre lembrada e bradada nos discursos conservadores e progressistas do país em seus momentos de ―tensão‖ ou ―explosão‖ de contradições, tão característicos daqueles movimentos de ―transição‖ ou de redistribuição do poder político entre as elites nativas na esteira do ajustamento da nação a uma ―nova ordem‖ que se impunha soberana mundo afora. Novamente um velho problema estrutural se apresentava e à escola lhe era debitada responsabilidade de superação.

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Cabia agora aos governantes assumirem suas responsabilidades diante dos desafios da globalização e ―induzir eficiência‖ aos seus sistemas educacionais e à escola pública ser a formadora dos cidadãos trabalhadores e consumidores desse novo tempo. No decorrer daquele processo, conceitos do campo disciplinar e ideológico do mundo empresarial, como competências, empregabilidade e capital humano adentraram no debate educacional atropelando, convenientemente, uma discussão qualitativamente superior, resultante do movimento da Constituição de 88, que construída no interior dos movimentos sociais pela educação, amadurecia e propunha uma política educacional, de Estado e não de governos, tendo por bases os fundamentos republicanos de universalidade, laicidade, gratuidade e qualidade.

A gestão escolar no novo arranjo das políticas educacionais dos anos 90

As políticas educacionais a partir dos anos 90 impuseram um modelo de gerenciamento dos sistemas educacionais onde se destacam duas grandes tendências. A primeira impõe a avaliação externa do sistema, formulada, implementada e executada por organismos internacionais, por exemplo, o Programme for International Student Assessment (PISA) ou Programa Internacional de Avaliação de Alunos, instituição vinculada a Organisation for Economic Co – operation and Development – (OCDE) ou Organização de Cooperação e de Desenvolvimento Economico ou pelos governos federal através do Ministério da Educação ou estaduais e municipais pelas suas Secretarias de Educação. Esses mecanismos internacionalizados e centralizados de avaliação buscam medir em grande escala o ―domínio de habilidades vinculadas à preparação para o trabalho e as necessidades do mercado globalizado‖, reflexo dos princípios que regem as atuais políticas educacionais, centradas na universalização da educação básica, entendida como patamar mínimo e único de direito social dos cidadãos. (SILVA, 2010, p. 51). A segunda tendência é a extinção do conceito de sistema educacional introduzindo a segmentação e diferenciação das escolas, que passariam a ser qualificadas a partir do gerenciamento do seu corpo dirigente, do trabalho de seus professores e da inserção e participação da comunidade, tais elementos seriam os formadores da identidade da unidade escolar, os marcadores que serviriam para defini-la 174 Grupo de Estudo e Pesquisas em Política Educacional, Rio Claro, 06, 07 e 08 de julho de 2011 Vol. 3 (2011)

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e destacá-la em relação às demais, o corolário dessa aliança, transformada num ―capital social‖, com interferência mínima do Estado, resultaria então, nos índices positivos de avaliação, que por sua vez refletiriam a ―eficiência‖ da gestão, a ―excelência‖ da formação e a ―produtividade‖ de seus professores. Esse ideário que impõe e responsabiliza a escola pelo seu desempenho, medido por avaliações que escapam de seu controle, busca introduzir, ou talvez re-introduzir a exemplo da década de 70, quando a teoria do capital humano na esteira do projeto modernizador do regime militar, monopolizou o debate e alastrou-se pelas políticas públicas, tornando-se hegemônica no campo educacional; assim, retorna ao debate educacional a ideologia liberal, de corte conservador, agora relida sob a ótica da competitividade global, que se coloca como mecanismo único e infalível de provir nossas escolas da tão almejada qualidade e necessária eficiência que o Estado, por décadas a fio, falhou fragorosamente em realizar. Na esteira da implementação dessa política educacional pragmática e utilitarista, porque concebe a educação básica como ―mínimo social‖, a escola como mera agência de preparo incipiente para o trabalho e o mercado como parâmetro de sua concepção e organização, se coloca uma contradição que, segundo Oliveira (2004, p. 1128) se expressa na ―difícil equação entre a macrorrealidade dos sistemas educacionais e o cotidiano escolar‖, assim, as conjunturas em que se desenrolam as disputas em torno de uma escola minimamente democrática e de qualidade, se pautam pela primazia de uma concepção de gestão escolar que impõem a ―desprofissionalização do professor e a proletarização do magistério‖, processos urdidos, sistematizados e iniciados na década de 80, re-elaborados e continuados nos anos 90 e ainda almejados, buscados e em curso ao longo desse século XXI (OLIVEIRA, 2004, p. 1133). Operando dentro dos limites dessa política educacional de viés neoliberal, onde prevalece a ação política de um Estado mínimo que legisla e incumbe-se apenas do binômio avaliação/controle, desobriga-se do financiamento e da manutenção material do sistema, a gestão escolar, agora ―flexibilizada‖, deve se abrir para a ―participação‖ da sociedade e da comunidade local como parceiros desse novo tempo da nossa educação básica. Está assim delineada a direção futura da nossa política educacional, a massificação dessa escola mínima é uma realidade, mas a tão almejada qualidade é uma dimensão a ser buscada, pelos ―atores sociais‖ diretamente nas escolas e não no Estado.

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Nesse novo arranjo de gestão da escola prevalece aquilo que Shiroma e Evangelista (s/d, p.7) chamam de gerencialismo, termo que está ―intimamente associado ao novo conceito de profissionalismo [escolar] no que tange às noções de eficiência, habilidade e competência‖, dimensões essas a serem arduamente buscadas pelos profissionais da educação e exigidas pela sociedade. Assim desvia-se do Estado a função com a manutenção e qualidade do sistema educacional, enquanto estrutura, que é transmigrada para a gestão escolar, constituída a partir de uma divisão social do trabalho, que nesse processo de engenharia social:

converte-se em gerencialismo, estratégia pela qual os lideres escolares mantêm a burocracia da organização para assegurar seu poder e controle sobre a escola mais do que para ajudar seus membros a realizar seus propósitos. O elemento crucial no uso do gerencialismo nas escolas talvez esteja na criação de um tipo particular de liderança cujo papel no redesenho do setor público possibilita que a direção política permaneça em nível central, mas a responsabilidade cotidiana por sua implementação seja deslocada para a periferia. Este movimento extrai a essência da liderança local e a reduz a uma função meramente técnico-racional. (SHIROMA e EVANGELISTA, s/d, p. 8).

Configuração da pesquisa e discussão dos resultados

O presente estudo se caracteriza como uma pesquisa exploratória onde foi aplicado um questionário com perguntas fechadas e respostas dispostas em escalas e de múltipla escolha. Todas as questões envolviam situações referentes ao cotidiano da escola e o questionário foi aplicado ao grupo no início do ano letivo do curso de complementação em gestão escolar. A pesquisa envolveu 25 pedagogos (as) formados (as) entre os anos de 2006 e 2009 no curso de Pedagogia do Departamento de Educação da Faculdade de Ciências da Universidade Estadual Paulista ―Júlio de Mesquita Filho‖ campus de Bauru. A formação desse grupo está ligada a um curso de complementação em gestão escolar que se realiza ao longo de 2010 (primeira turma) e 2011, o universo desse estudo faz parte dessa segunda turma do ano de 2011. Todos foram religados à instituição e matricularam-se no curso, para a disciplina de gestão escolar foi solicitado o preenchimento de um questionário que versava sobre

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temas que integravam o plano da disciplina e que seriam problematizados com bibliografia específica e debatidos ao longo do curso. Num primeiro momento o objetivo da sondagem é verificar as concepções de professores sobre a gestão escolar nos modelos atuais, utilizar esse material como um indicativo para as dinâmicas de aula e posteriormente, ao final do curso, reaplicar um novo questionário com a intenção de verificar as possíveis mudanças de concepções dos professores – alunos. Neste trabalho é apresentado, portanto, o instrumento e as respostas que captam as primeiras impressões e tendências que esses professores - alunos, relativamente recém – formados e recém - iniciados na carreira do magistério, concebem a respeito do tema da gestão escolar.

Figura 1 – Questão envolvendo a constituição da gestão escolar

Em relação à questão 1, que abordava sobre a constituição do trabalho da gestão escolar, obtive-se como grande número de respostas a opção do compartilhamento de responsabilidades entre os segmentos da escola e a comunidade (19 respondentes ou 76%). Supõe-se que essa relativa unanimidade é devida ao grande apelo dos governos, mídias e outros setores sociais, inclusive os próprios segmentos da escola, que incorporam os discursos oficiais e midiáticos em favor da aproximação da escola com o seu entorno local, que nele se envolva, e este por sua vez, passe a assumir a unidade 177 Grupo de Estudo e Pesquisas em Política Educacional, Rio Claro, 06, 07 e 08 de julho de 2011 Vol. 3 (2011)

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escolar como parte de seu cotidiano e, obviamente, assuma suas responsabilidades em relação a mesma. Acredita-se que a formação e, fator mais determinante, a atuação de grande parte dos indivíduos da amostra, já se encontrarem trabalhando nas redes públicas, municipal e estadual de educação, tenha contribuído para essa visão mais ―oficial‖ do que seria a gestão escolar atualmente. As outras opções indicaram a centralidade do papel do diretor (2 respondentes ou 8%)

ou que esse sujeito teria proeminência no encaminhamento da gestão (4

respondentes ou 16% da amostragem). Embora minoritárias, essas opções expressam um perfil mais exeqüível, porque mais próximo da realidade jurídica que ampara os sistemas educacionais. A despeito do fato, de legalmente o Conselho Escolar ser instância decisória, no limite, em razão da lei, esse colegiado é consultivo e não deliberativo. Cabe a última palavra ao diretor, que é na escola, o funcionário que zela pelas prerrogativas do Estado e não da comunidade, o que resulta numa gritante contradição, entre os objetivos proclamados de uma política educacional, que visa a descentralização radical, e a realidade onde se desenrola essa ―diretriz oficial‖, pois:

Está ele [o diretor] na condição de quem é capaz de fazer obedecer a vontade do Estado, de quem é representante legal, mas não tem poder de fazer valer a própria vontade, se esta for contrária à do Estado, mesmo que ela coincida com a vontade do colegiado ou da instituição escolar que dirige. Daí decorre a vulnerabilidade do diretor que, obediente às determinações do Estado, deve assumir a responsabilidade também pelas deliberações do conselho, por que é a ele, diretor, não ao conselho, que o Estado pede contas do funcionamento da escola. (PARO, s/d, p. 7).

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Figura 2 – Questão envolvendo a responsabilidade pela gestão escolar

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A figura 2 reflete a opinião dos respondentes sobre as responsabilidades últimas da gestão escolar, buscou-se problematizar o papel do Conselho Escolar como instância deliberativa, a figura jurídica da comunidade, bem como o cenário em que essa comunidade poderia ser chamada para responder por suas deliberações em relação à escola, e finalmente o papel do diretor. Os resultados, embora apontassem para uma escala de dez pontos percentuais para cada opção, mantiveram-se estáveis não ocorrendo, ao contrário da questão 1, uma preferência majoritária numa única resposta. Do conjunto da amostragem, 11 respondentes ou 44%, entenderam que o compartilhamento das responsabilidades é o encaminhamento mais aceitável e realista em razão das políticas educacionais em voga. Tornar o Conselho Escolar um colegiado mais atuante e verdadeiramente responsável pela condução da gestão escolar foi a opção de 8 respondentes ou 32% da amostragem, talvez em decorrência das experiências vivenciadas ao longo da década, em parte devido à municipalização, mas também pelas exigências legais, paulatinamente parece estar se firmando a opinião de que o Conselho Escolar deve ser concebido e exercitado como uma instituição de natureza política e não como um mero avalista das deliberações do diretor ou das secretarias de educação. Finalmente nessa questão 6 respondentes ou 24% da amostra concebem a gestão escolar como uma responsabilidade do diretor e assim deve continuar. O terceiro conjunto de questões (gráfico 1) explorado junto aos respondentes dizia respeito ao grau de complexidade de alguns problemas enfrentados pela gestão escolar. Englobou-se seis grandes situações que acredita-se fazem parte do cotidiano de qualquer escola e mobiliza sobremaneira os segmentos escolares, e em particular, a direção. Para a análise desse tópico utilizou-se uma escala do tipo Likert, Ferrai e Tarumoto (s/d) observam que esse é um instrumento muito difundido e adequado que permite a construção de escalas do tipo ―aprovo/desaprovo, concordo/discordo, satisfeito/insatisfeito, muito importante/pouco importante‖ e complementam que:

O tipo de escala de Likert mais usual é a de cinco pontos, como por exemplo, a escala de Likert padrão, desde ‗discordo totalmente‘ até o ‗concordo totalmente‘ passando pelo ‗discordo‘, ‗nem discordo/nem concordo‘ e pelo ‗concordo‘ [...] as afirmações devem ser classificadas em favoráveis e desfavoráveis e para cada afirmação

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III Seminário Internacional de Gestão Educacional deverão ser atribuídos graus de favorabiliddae e desfavorabilidade (FERRAI e TARUMOTO, s/d, p. 5045).

Assim, construiu-se uma escala que classificava as situações selecionadas em muito simples num extremo, e muito complexo na outra ponta, tendo entre elas, as opções simples, média complexidade e complexo.

O problema da violência (situação A) não apresentou dispersão entre as opções que a escala permitia e concentrou as respostas entre o muito complexo e complexo, indicando que esse tema, ou melhor, situações de violência são vivenciadas e enfrentadas no dia a dia das escolas e fazem parte do cotidiano de diretores, professores, alunos e funcionários indistintamente. As relações interpesoais, onde abrangeu-se os conflitos de interesses entre os segmentos da escola (situação B) e as questões relativas ao campo pedagógico (situação C) concentraram as opiniões na opção mediana da escala apresentando, em ambos os casos, discreta dispersão nas outras possibilidades de escolha. O relacionamento da escola com o Estado, via secretaria ou diretoria de ensino (situação D) registrou uma dispersão significativa que partiu da opção simples até a opção muito complexo, com forte concentração dos respondentes na mediana da escala. Vale ressaltar que os números distribuem-se de forma homogênea indicando, aparentemente, ser esta situação uma área delicada na gestão escolar. 181 Grupo de Estudo e Pesquisas em Política Educacional, Rio Claro, 06, 07 e 08 de julho de 2011 Vol. 3 (2011)

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O relacionamento da escola com os pais de alunos, em particular, e com a comunidade, em geral (situação E) destacou, ao que parece, o quanto é preciso ainda avançar na relação entre a escola e o seu entorno local. Nessa questão houve uma forte concentração da opinião dos respondentes na zona complexa e de média complexidade. em relação a essa situação. A literatura educacional registra a complexa e contraditória relação entre a escola e a comunidade, bem como o instável movimento de inserção e participação dos pais ou responsáveis em participar ativamente da gestão escolar. Está bem documentado que a despeito de um estranhamento dos primeiros em relação ao mundo burocrático e hierarquizado da escola, esses (pais e responsáveis) quando mobilizados e incentivados pela direção da escola se mobilizam em favor da mesma o que resulta no melhor desempenho da aprendizagem dos filhos (SILVA, 2010; MENDONÇA, 2001). Quanto ao relacionamento da escola com o seu corpo discente (situação F) novamente observou-se uma tendência a conceber essa relação, que é a essência da existência da escola, como complexo e medianamente complexo. Vale apena registrar que a questão registrou uma distribuição de opiniões sobre todas as opções que a escala permitia, sugerindo que o relacionamento entre os alunos e a gestão escolar é uma situação que mobiliza muito os professores.

Gráfico 2 – Concepções sobre a relação comunidade x escola

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A - A comunidade entende a importância da escola mas não participa da sua gestão B - A comunidade entende que a função da escola é apenas transmitir conhecimentos C - A comunidade ignora a escola como parte de seu cotidiano e entorno social D - A comunidade participa de forma instável tendendo a abandoná-la ao longo do ano E - A comunidade participa da escola de forma regular e compreende sua importância F - A comunidade não estabelece relação entre participar da gestão e o desempenho de seus filhos

O gráfico 2 diz respeito sobre as concepções dos professores – alunos sobre as a relação comunidade e gestão escolar, o questionário englobou seis afirmações, que procuravam sintetizar algumas ideias mais comuns sobre a participação da comunidade no cotidiano e na gestão da escola. A escala de resposta aos itens foi estruturada com três alternativas (verdadeiro, parcialmente verdadeiro e errado) sem as variâncias de extremos (muito verdadeiro e muito errado) mas eliminando também a lei do terceiro excluído. Optou-se por essa estrutura pois a intenção era medir não as possíveis certezas absolutas, que os respondentes pudessem vir a manifestar, mas sim que tais concepções ou ideias fossem medidas em termos mais realistas, uma vez que todos atuam nas redes públicas de ensino. A escala assim proposta permitiu um mínimo de ambiguidade (parcialmente verdadeiro) e a opção da polarização entre o certo e o errado, entendeu-se que as respostas refletiram essa dimensão da dúvida, da contestação e talvez do contraditório, quando da análise sobre as possíveis motivações que levam, ou não levam, a comunidade a participar da gestão da escola. A primeira questão dizia respeito sobre a possibilidade da comunidade ser capaz de estabelecer uma vinculação entre a sua participação na gestão escolar e a importância atribuída a essa mesma escola (questão A). Essa dimensão está vinculada à percepção que, supostamente, a comunidade concebe em relação às funções, ou função, precípua da escola, que se resumiria, na visão de mundo dessa comunidade, à mera transmissão do conhecimento (questão B). Os resultados mostram um número muito próximo de respostas para ambas as questões, que oscilam entre a opção verdadeiro e parcialmente verdadeiro (21 para A e 19 para B). Dessa forma essas respostas traduziriam uma concepção de que o entorno local compreende a importância da escola (transmitir conhecimentos) mas não participa da

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sua gestão, pois nada teria a contribuir pois carece, exatamente daquilo do qual a escola é a detentora, ou seja, o monopólio do conhecimento. As questões C e D procuravam medir as concepções sobre o quanto a escola é percebida como uma instituição que integra a comunidade e não apenas mais um prédio do governo no bairro. O nível de consciência sobre essa dimensão do ―assumir‖ a escola, enquanto ―sua‖, poderia refletir-se na constância ou no hábito incorporado de participação dessa comunidade na gestão da ―sua‖ unidade escolar. As respostas indicaram (para a questão C) uma forte concentração na ―opção da dúvida‖ (parcialmente verdadeiro) e os professores tenderam a rechaçar as ideias da completa alienação (verdadeiro) ou da consciência plena (errado). Quanto a percepção sobre a frequência da participação (questão D) foi a única que apresentou uma homogeneização nas respostas com uma distribuição relativamente proporcional entre o número de respondentes e as possibilidades da escala multi-itens (21 respondentes nas opções verdadeiro e parcialmente verdadeiro), refletindo talvez um padrão que marca a dimensão da participação em relação ao tema e à realidade da gestão escolar no Brasil contemporâneo. As duas últimas ideias (questão D e E) concentraram as preferências dos respondentes em apenas duas opções das três apresentadas, a primeira referia-se a noção de uma participação ideal da comunidade junto a escola, a realidade parece demonstrar (nenhuma resposta na opção verdadeiro) o quanto estamos longe desse ―momento perfeito‖ onde escola e entorno local trabalham numa sinergia ou simbiose institucional em prol dos interesses de todos. A última ideia (questão E) procurou explorar, através de uma negativa, se a comunidade estabelecia relação entre o desempenho escolar do filho (ou seu sucesso escolar) com a participação dos pais ou responsáveis na gestão escolar. Diante dos resultados (25 respostas distribuídas entre verdadeiro e parcialmente verdadeiro) é possível inferir que a experiência desses professores é forte indicativo na percepção e análise daquilo que é a realidade do nosso sistema de ensino, seja municipal ou estadual, em relação ao valor social atribuído a escola pelas classes populares.

Conclusões

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O estudo de caráter exploratório e parte inicial de uma pesquisa mais ampla sugere que as concepções dos professores sobre a gestão escolar são fortemente influenciados pelas experiências do mundo do trabalho. Embora todos os respondentes foram formados em Pedagogia, numa universidade estadual pública paulista e portanto possuem, em princípio, uma formação sólida e atualizada em relação ao campo educacional, algumas de suas respostas distanciam-se do corpo teórico-metodológico, ao menos proclamado, dos programas das disciplinas da instituição de formação. Parece prevalecer o reforço a alguns conceitos já cristalizados e pré-concebidos, com destaque para a relação entre a comunidade ou entorno local e sua relação com a escola. Na outra ponta aparece com relativo destaque respostas que reafirmam as políticas oficiais, principalmente nas questões que definem conceitualmente e em termos de divisão social do trabalho, a dinâmica da gestão escolar. Há indicações em que as preferência recaem com ênfase nos conceitos, por exemplo, do compartilhamento das responsabilidades em oposição às instituições já previstas, legalizadas e instituídas para a realização concreta da tarefa coletiva, como o Conselho Escolar. Finalmente o trabalho registra as lacunas e dificuldades de coincidir os objetivos propostos pelas políticas educacionais, através da miríade de leis que desabam sobre as escolas, com a difícil realidade vivida nos nossos sistemas educacionais, muitos premidos entre as contingências e conveniências políticas ou pelo indefectível estado de carência material que grassa país afora.

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MENDONÇA, Erasto Fortes. Estado patrimonial e gestão democrática do ensino público no Brasil. Educação & Sociedade, Campinas (SP), vol. 22, nº 75, p. 84 – 108, ago. 2001. OLIVEIRA. Dalila Andrade. A Reestruturação do trabalho docente: precarização e flexibilização. Educação & Sociedade, Campinas (SP), vol. 25, nº 89, p. 1127 - 1144, set./dez. 2004. PARO, Vitor Henrique. Estrutura da escola e prática educacional democrática. Disponível em: http://www.anped.org.br/reunioes/30ra/trabalhos/GT05-2780--Int.pdf Acesso em 09/04/2011. SHIROMA, Eneida Oto. e EVANGELISTA, Olinda. Profissionalização como estratégia de gerenciamento de professores. Disponível em: http://www.gepeto.ced.ufsc.br/arquivos/1paraevora.pdf . Acesso em 28/05/2011. SHIROMA, Eneida Oto. Qualificação e reestruturação produtiva: Um balanço das pesquisas em educação. Educação & Sociedade, ano XVIII, nº. 61, p. 13 – 35, dez. 1997. SILVA, Itamar Mendes. Autoavaliação e gestão democrática na instituição escolar. Ensaio: Avaliação e Políticas Públicas em Educação, Rio de Janeiro, vol. 18, nº 66, p. 49-64, 2010.

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AUTONOMIA FINANCEIRA: SONHO OU REALIDADE? Ilda M Duarte [email protected] UNIG/UMINHO

Ana V. Costa [email protected] UNIG/UNESA

Vera Neves [email protected] UNIG/UMINHO

Resumo: O projeto objetivou identificar se autonomia financeira é mito ou constatação no chão das escolas e desse modo desvelar o pensar e o fazer. Enfoca a participação, o amparo legal da Lei 9394/96, cita as Resoluções e Portarias da SEEDUC/RJ, caracteriza a população alvo, ou seja, 20% do segmento dos professores, alunos, pais e funcionários randomicamente. Após o recolhimento, os dados foram tabulados e analisados qualitativamente. Extraiu-se que autonomia se faz presente nas escolas, através da imposição da lei, mas a comunidade abraçou a idéia tornando-a um compromisso coletivo. Constataram-se avanços e retrocessos, porém ao término a conclusão é que autonomia financeira trouxe melhorias visíveis ao espaço escolar não sendo um sonho, mas uma verdade incontestável. Palavras-chave: Autonomia. Participação. Compromisso.

Introdução O processo de autonomia vem ocorrendo nas Unidades Escolares da Secretaria do Estado de Educação desde abril de 1995 através dos Decretos 1925 e 1929 de 03 de abril e da Portaria n° 005/95 de 25/04 e, posteriormente Lei nº 3067 de 25/09/98, que dispõe sobre a Autonomia das Unidades Escolares das escolas pública do Estado do Rio de Janeiro que em seu artigo 1º - estabelece as diretrizes da autonomia, visando a gestão democrática, ao melhor aproveitamento dos recursos e a qualidade da educação, em seu artigo 2º explicita que esta autonomia far-se-á através de um conjunto de práticas integradas esferas administrativas, financeira e pedagógica, com a participação dos 187 Grupo de Estudo e Pesquisas em Política Educacional, Rio Claro, 06, 07 e 08 de julho de 2011 Vol. 3 (2011)

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diversos segmentos da comunidade escolar, através das Associações de apoio às Escolas AAES. Em 08/12/2004, a Secretaria de Estado de Educação baixa a Resolução nº 2727 complementado a Lei 3067 de 25/09/1998 quanto à atualização das rotinas para a prestação de conta, instituído no seu artigo 3º que os recursos serão liberados em base no plano de gestão em parceria com a comunidade em consonância com o planejamento geral da Secretaria de Estado de Educação sendo que os planos de gestão substituem o termo de compromisso das escolas. A partir dos Decretos e Resoluções, as escolas encontram-se autônomas, ou seja, recebem recursos diretos do Governo Federal e decidem juntos, direção, professores e comunidade escolar, a melhor forma de aplicá-lo. Tal fato, sem dúvida, veio modificar os hábitos até então instituídos onde as decisões estavam centradas na mão do diretor. Da decisão solitária passou-se a solidária no cotidiano escolar. As associações existentes que apenas referendavam o decidido, passaram a ocupar lugar de relevância com vez, voz e voto nas assembléias. Passo a passo, dia-a-dia as unidades escolares se reestruturam, tornando-se fortalecidas capazes de definir o projeto político pedagógico que atenda as reais necessidades da comunidade em que se encontram inseridas. Há muito Lobrot (1966, p. 27) já dizia: "mudando a mentalidade dos atores por pouco que seja ver-se-á imediatamente a instituição mudar‖. Dentro desta vertente espera-se que o diretor seja um dinamizador de todo o processo pedagógico, objetivando o aprimoramento das reais capacidades dos alunos e preparando-os para um mundo em constantes mutações, este é o desafio imposto as Unidades Escolares, uma nova direção. Daí, a necessidade da presente pesquisa, de constatar através de dados quantitativos e qualitativos as transformações ocorridas a partir da autonomia financeira SONHO ou REALIDADE. Neste sentido, algumas hipóteses nortearam o trabalho: houve transformações no cotidiano escolar a partir da nova política pedagógica administrativa? Os segmentos que compõem a comunidade escolar têm clareza do que seja autonomia, gestão participativa, compartilhada ou colegiada? Existe coerência do discurso e da prática em relação à criação e participação dos conselhos e conseqüente autonomia?

Revisão de literatura 188 Grupo de Estudo e Pesquisas em Política Educacional, Rio Claro, 06, 07 e 08 de julho de 2011 Vol. 3 (2011)

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Tendo o cotidiano como pano de fundo utilizamos os estudos de Pennin (1989) que nos aponta esta riqueza através de sua obra, ratificando a importância do cotidiano para compreender o papel socializador da escola, quer seja na transmissão de conteúdos acadêmicos ou na veiculação das crenças e valores que aparecem nas ações e interações, assim como nas rotinas e nas relações sociais que caracterizam o cotidiano da experiência escolar. Essas são as razões pelas quais o cotidiano é a fase embrionária de uma proposta democrática – colegiada e consequente autonomia. Buscamos também em Apple e Soares fundamentação para explicar as contradições existentes no espaço escolar assim como Giroux (1997, p.79) que há muito dizia: ―as forças materiais ideológicas que promovem reprodução cultural e social também produzem formas de resistência‘ e que os efeitos advindos dos trabalhos educacionais no cotidiano escolar não sejam simples reflexos passivos‖. Será preciso também a leitura da obra de Lefebvre citado por Pennin (1989, p.13) afirmando que este foi o primeiro autor a fazer da vida cotidiana, objeto de uma reflexão filosófica e sistemática, conceituando práxis, como totalidade em ato. Em seu caminhar o estudo buscou fundamentação teórica em Castoriardis (1982), tido como um dos pioneiros nos estudos de autonomia; apoiou-se também em Rodrigues (1991), Gadotti (1997), Freire (1996) e Demo (1986) que em seus livros enfatizam a escola como espaço democrático lócus do diálogo, da participação, da autonomia de todos os atores envolvidos no processo educacional. Ressaltamos que somente na metade do século XX o termo autonomia passou a ser associado a uma concepção emancipatória da educação e utilizamo-nos de uma citação de Fischer (1984, p.22) que ratifica o dito acima: autonomia é uma fase, uma etapa de crescimento da organização social a ser buscada e ser mantida dinâmicamente, onde aqueles que dela fazem parte não são meros executores e muito menos só delegadores de poder a seus representantes, mais sim criadores de suas normas (leis) de convivência.

Para Castoriardis (1982, p. 123), a ―autonomia seria o domínio do consciente sobre o inconsciente‖. No entanto Gadotti (1993, p.38) ratifica a idéia de autonomia atrelada à democracia ao citar: ―a ideia de autonomia é intrínseca a idéia de democracia e cidadania – cidadão é aquele que participa do governo e só pode participar com graus de liberdade e autonomia para exercê-lo‖.

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A linha de pensamento dos autores estudados nos induz a afirmação que para se obter a autonomia é necessário criar espaços de experimentação, do novo, lutar contra o poder instituído e deste processo surgir parcerias num constante intercâmbio com a sociedade redimensionando a função social da escola e dos educadores referendada por Freire (1986, p.49) através da assertiva ―[...] os homens criam e recriam, integrando-se às condições de seu contexto, respondendo aos seus desafios [...] transcedendo-se [...], fazendo história‖. Entende-se autonomia não como liberdade para agir como bem aprouver aos dirigentes, e sim a possibilidade de discutir e pensar sobre fatores relevantes para, coletivamente, decidir sobre qual o melhor caminho para se atingir os objetivos. Significando, responsabilidade prestação de contas unidade e capacitação de comunicação. Gadotti (1993, p. 49-50) afirma que esta só se efetiva num conjunto de medidas políticas que visem à participação, a saber: ―autonomia dos movimentos sociais; abertura de canais de participação; transparência administrativa‖.

Caminhada Metodológica A temática que esta pesquisa se propôs a desenvolver, e fundamentalmente os elementos que a impulsionaram, determina a escolha metodológica de uma abordagem qualitativa de enfoque etnográfico. Para fins do presente estudo adotou-se a abordagem iluminativa que segundo André (1988) é mais uma estratégia geral de pesquisa e avaliação do que em método religioso. A denominação "iluminativa" deriva da proposta de que o objeto seja estudado e analisado à luz do contexto ao qual pertence. O objetivo desta abordagem é estudar o tema, assunto, programa ou inovação como um todo; seus pressupostos e fundamentos, suas formas de operação, resultados e dificuldades, como as pessoas envolvidas no programa encaram suas vantagens e desvantagens. Em lugar de medida, são preferidas a descrição e interpretação. Seguindo os passos da abordagem iluminativa, o presente trabalho desenvolveu-se em três estágios: exploração, levantamento de dados e organização; elaboração, identificação e coleta de dados e, posteriormente, análise e interpretação dos dados coletados. No primeiro estágio foi feito o levantamento do universo das escolas estaduais do município de Nova Iguaçu com o respectivo quantitativo de alunos, professores e 190 Grupo de Estudo e Pesquisas em Política Educacional, Rio Claro, 06, 07 e 08 de julho de 2011 Vol. 3 (2011)

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funcionários e, de posse desses dados, apontou-se 20% (vinte por cento) como um percentual fidedigno.

UNIVERSO DA PESQUISA

UNIVERSO PESQUISADO

Alunos

Professores

Pais/Comunidade

Funcionários

Alunos

Professores

Pais/Comunidade

Funcionários

9.540

2.555

1.010

720

1.908

511

202

144

No segundo estágio foram elaborados questionários diferenciados de acordo com as especificidades do grupo. Nessa etapa deu-se início ao trabalho de campo. Em relação ao terceiro estágio, composto da análise e interpretação de dados, para melhor efeito de estudo, foram grupadas as respostas por categorias e empreendida a análise por itens ou bloco de informação e logo após, a construção do documento contendo os resultados e considerações finais obtidas.

População-Alvo: Objeto de Reflexão do Presente Estudo O município de Nova Iguaçu (Rio de Janeiro) é composto de seis territórios19 denominados setor de planejamento integrado assim distribuídos: Centro (trinta e duas localidades); Sudoeste (onze localidades); Noroeste (oito localidades) e Nordeste (onze localidades). Dentro desse território, foram indagados/pesquisados vinte por cento do segmento dos professores, alunos e funcionários e pais de forma randômica de cada unidade de ensino das 66 (sessenta e seis) escolas que compõem o universo da rede estadual, composta por escolas regulares e CIEPs 20. O percentual de vinte por cento do universo de 66 (sessenta e seis) escolas estaduais, que corresponde aproximadamente 12 (doze) escolas. A pesquisa foi aplicada em professores, alunos, funcionários e pais de forma randômica utilizando-se como instrumento questionário misto o que permitiu desvelar o objeto da pesquisa ―Autonomia Financeira: sonho ou realidade no quotidiano das escolas do Município de Nova Iguaçu‖. Após o recolhimento dos dados, os mesmos foram tabulados e transformados em gráficos, possibilitando também a visualização do quadro apresentado. 19

Fonte: Atlas Geográfico atualizado da Cidade de Nova Iguaçu s/d Prefeitura Municipal de Nova Iguaçu

20

Centro Integrado de Educação Pública (Projeto idealizado pelo Prof. Dr. e sociólogo Darcy Ribeiro na primeira gestão do Governo Brizola no Estado do Rio de Janeiro – Brasil

191 Grupo de Estudo e Pesquisas em Política Educacional, Rio Claro, 06, 07 e 08 de julho de 2011 Vol. 3 (2011)

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Os questionários possuem o mesmo teor para as categorias apresentadas permitindo um confronto dos dados no sentido de extrair a veracidade das informações.

Caracterização Geral das Unidades Escolares As unidades escolares pesquisadas situam-se na periferia da cidade de Nova Iguaçu, sendo o nível social econômico destas comunidades de baixo poder aquisitivo, formada em sua maioria por pedreiros, empregadas domésticas, biscateiros e poucos trabalham com carteira assinada. Quanto ao aspecto da saúde pública o atendimento é precário com poucos postos de saúdes o que faz com que a população tenha que se dirigir aos hospitais de grande porte no centro de Nova Iguaçu e na cidade do Rio de Janeiro. Quanto às condições de saneamento, detectamos do regular ao insuficiente. O comércio é composto de ―pequenas vendas‖ denominadas ―biroscas‖. No entanto o que chamou nossa atenção foi a quantidade de casas de materiais de construção, demonstrando ser área em franca expansão populacional. Encontramos em determinadas áreas pesquisadas quadras de esportes públicas (iniciativa da PMNI), porém a maioria é desprovida deste beneficio e a população local utiliza as dependências das escolas, sendo a única área disponível de recreação existente, muito utilizada nos fins de semana pela comunidade. A religião está muito presente nessas comunidades através de inúmeros templos evangélicos, em maioria, e poucas igrejas católicas, como também centros espíritas. Quanto aos meios de transportes podemos considerar esse aspecto como bom, com várias linhas de ônibus. No entanto, devido ao desencontro entre governos Estaduais e Municipais, muitos alunos são impedidos de transitarem nos ônibus gratuitamente, ocasionando um transtorno às escolas quanto à assiduidade dos mesmos às aulas. Quanto ao atendimento educacional, optamos por considerar regular devido ao número de crianças e jovens existentes nas localidades. A cada dia, surgem novos conjuntos habitacionais e as escolas existentes não dão conta do atendimento a todos que desejam ingressar ou retornar aos bancos escolares. Um item a ressaltar é que nos locais pesquisados existem as associações de bairro que realizam um trabalho efetivo na comunidade e que lutam por melhoria das condições de vida local, assim como se fazem presentes junto às direções escolares,

192 Grupo de Estudo e Pesquisas em Política Educacional, Rio Claro, 06, 07 e 08 de julho de 2011 Vol. 3 (2011)

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contribuindo efetivamente com a melhoria do atendimento, dando respaldo às ações da gestão o que sem dúvida acarreta benefícios para ambas às partes. Representação Gráfica e Análise dos Dados Coletados e Apresentados Como você percebe as relações entre as pessoas que trabalham na sua escola? PAIS/COMUNIDADE

PROFESSOR

FUNCIONÁRIOS

ALUNOS

80

600

150

1500

60

400

100

1000

200

50

40 20

0

0

500

0

1

1

0

1

ÓTIMA

52

ÓTIMA

381

ÓTIMA

37

BOA

64

BOA

100

BOA

140

SOFRÍVEL

8

SOFRÍVEL

12

SOFRÍVEL

RUIM

20

RUIM

18

RUIM

1

ÓTIMA

1228

BOA

480

10

SOFRÍVEL

130

15

RUIM

70

Em relação à primeira pergunta quanto às relações entre as pessoas que trabalham nas escolas, pais, funcionários, alunos e professores foram unânimes em apontar como boa, significando dizer que a convivência, o trato como o outro é ponto relevante e nos remetemos à Maturama (1996, p. 35): ―se eu não sou capaz de ver o outro como legitimo outro, não tenho preocupação ética‖. Existem espaços de participação na escola? PAIS/COMUNIDADE

P R OF ES S OR ES

FUNCIONÁRIOS

ALUNOS

102,5

100

102

1000

80

20

1000

101,5 101

60 40

1050

950

100,5

900

100

0

Quanto à segunda se existe espaço de participação, o sim aparece expressivamente 1

0

850

99

481

SIM

1

99,5

800

1

1

apesar de nas categorias funcionários, pais e alunos o não despontar significativamente 30

NÃO

84

SIM

60

NÃO

SIM

100

NÃO

102

SIM

1008

NÃO

900

demonstrada nos gráficos, e nos induz afirmar que as Unidades Escolares necessitam ampliar suas ações não se restringindo aos professores, o que ficou clarificado pelos respondentes. Você já participou de reuniões para discutirem problemas referentes à utilização das verbas para à escola? FUNCIONÁRIOS

PROFESSORES

100

PAIS/COMUNIDADE

300

150

200

100

100

50

0

0

ALUNOS 1000

80

800

60 40

600 400

20 0

200

1

1

0

1

1

SIM

50

SIM

200

SIM

98

SIM

650

NÃO

80

NÃO

249

NÃO

84

NÃO

830

DESCONHEÇO

14

DESCONHEÇO

DESCONHEÇO

20

DESCONHEÇO

428

62

No terceiro questionamento os respondentes foram bem diretivos em relação à inferência nas reuniões para a utilização da verba. Funcionários, alunos e pais afirmaram contundentemente não, como também desconhecem. Em relação aos professores observa-se uma equiparação entre o sim e o não seguido do desconheço.

193 Grupo de Estudo e Pesquisas em Política Educacional, Rio Claro, 06, 07 e 08 de julho de 2011 Vol. 3 (2011)

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Os dados apurados na segunda e na terceira indagação demonstram que há necessidade de se investir no processo de comunicação mais ágil, com fluidez onde todos tenham conhecimento do que ocorre nos espaço escolar e citando a SMESP21 em Lima Licínio (2002, p.62): ―a escola é um espaço da comunidade e uma das suas funções e a organização [...] e inclusão de todos‖. Você tem conhecimento o que seja autonomia financeira ? FUNCIONÁRIOS 100 80

PROFESSORES

PAIS/COMUNIDADE

400

103

300

102

200

101

100

100

0

99

1000 800

60 40 20 0

1

1

ALUNOS 1200

600 400 200 0

1

1

SIM

90

SIM

353

SIM

102

SIM

820

NÃO

54

NÃO

158

NÃO

100

NÃO

1088

Quanto à quarta pergunta, se sabem o que é autonomia financeira, professores e funcionários afirmaram ter conhecimento; em relação aos alunos foram uníssonos na afirmação do não e corroboram o mesmo ao afirmar que não participam das reuniões como também desconhecem, em sua maioria afirmaram não terem sido convocados, como também há desinteresse. No entanto os pais em sua totalidade afirmam ter conhecimento. Daí nos remetermos a Freire (1996, p. 45) que sinaliza a importância de inserir a todos nos contextos decisórios: ―tudo que a gente puder fazer no sentido de convocar os que vivem em torno da escola, e dentro da escola, no sentido de participarem, de tomarem um pouco o destino da escola na mão também. Tudo que a gente puder fazer neste sentido é pouco ainda [...]‖.

O autor enfatiza a importância do processo de comunicação em todos os níveis do espaço escolar de forma paritária, inversamente o que a pesquisa nos mostrou, alguns segmentos bem informados, outros não. Você, em algum momento, já participou da reunião para escolher os Membros da Associação? FUNCIONÁRIOS 80

ALUNOS

PAIS/COMUNIDADE

PROFESSORES 300

150

200

100

100

50

0

0

1200 1000

60 40

0

400 200

1

SIM

59

NÃO

75

DESCONHEÇO

800 600

20

10

1

SIM

200

NÃO

250

DESCONHEÇO

61

0

1

1

SIM

110

SIM

600

NÃO

46

NÃO

1050

DESCONHEÇO

46

DESCONHEÇO

258

Em relação à quinta questão os professores contradizem a questão anterior ao responderem não, desconhecendo as reuniões para escolherem os membros da 21

SMESP – Secretaria Municipal do Estado de São Paulo

194 Grupo de Estudo e Pesquisas em Política Educacional, Rio Claro, 06, 07 e 08 de julho de 2011 Vol. 3 (2011)

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associação como também afirmaram nunca terem participado; em relação aos alunos reafirmam o explicitado anteriormente nunca participaram das reuniões, como também ratificam não terem sido convocados. Os pais, já dito anteriormente responderam afirmativamente, já terem participado de reuniões da associação, porém, analisando os dados apresentados identifico uma média elevada de pais desconhecendo e não participando das reuniões e retomo o dito anteriormente, a falta de comunicação igualitária entre todos os segmentos, uma vez que os professores negativamente se posicionaram e nos reportamos às determinações da SEEDUC/RJ todas as escolas públicas com força da legislação, devem ter uma associação de pais e professores e um conselho escolar enquanto órgãos que funcionem como braço financeiro das escolas para recebimento dos diferentes recursos, merenda, manutenção e etc. É condição sine qua non que os diretores lancem mão das associações para terem suas planilhas financeiras aprovadas e conseqüentemente enviadas à SEEDUC/RJ e posteriormente ao tribunal de contas por tratar-se de dinheiro público (transparência) princípio este, indispensável ao bom andamento da unidade escolar. O recebimento direto da verba, pela escola, trouxe melhorias? PAIS/COMUNIDADE

PROFESSORES

FUNCIONÁRIOS

150

500

150

400

100

2000 1500

100

300

1000

200

50

ALUNOS

50

500

100 0

0

0

1

1

0

1

1

SIM

106

SIM

428

SIM

140

SIM

1610

NÃO

30

NÃO

23

NÃO

42

NÃO

298

DESCONHEÇO

8

DESCONHEÇO

60

DESCONHEÇO

20

DESCONHEÇO

0

Caso sim, assinale onde: FUNCIONÁRIOS

PAIS/COMUNIDADE

100

PROFESSORES

ALUNOS

150

1500

100

1000

50

500

80

250 200

60

150 100

40 20 0

0

1

Reforma no prédio

82

Investimento, banda, coral, etc.

30

Compra de materiais

32

0

1

50 0

1

Reforma no prédio

100

Reforma no prédio

1000

Investimento, banda, coral, etc.

60

Investimento, banda, coral, etc.

500

Compra de materiais

42

Compra de materiais

498

1

Reforma no prédio

200

Investimento, banda, coral, etc.

91

Compra de materiais

100

Form. Cont.

120

Quanto à sexta questão o sim foi unânime nos segmentos pesquisados, significando dizer que a descentralização das verbas trouxe benefícios a escola, sendo visível por todos, e apontam a utilização em reformas do prédio, investimentos em projetos e aquisição de materiais. Inclusive os professores sinalizaram investimento na formação continuada, demonstrando que as direções estão empenhadas num trabalho 195 Grupo de Estudo e Pesquisas em Política Educacional, Rio Claro, 06, 07 e 08 de julho de 2011 Vol. 3 (2011)

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pedagógico de qualidade, atendendo as reivindicações da comunidade através de projetos que envolvam a todos interna e externa, modificando a cara da escola que no dizer de Freire, (1981, p. 31): ―mudar a cara da escola implica também em ouvir meninos e meninas, comunidade de bairros, pais, mães, professores, supervisoras, zeladores e merendeiras enfim todos‖. Existe prestação de contas do dinheiro recebido FUNCIONÁRIOS

PROFESSORES

100

PAIS/COMUNIDADE

400

80

ALUNOS

150

1000 800

300

100

60

600

200

40

400

50 100

20 0

200 0

0

1

0

1

1

1

SIM

85

SIM

301

SIM

102

SIM

820

NÃO

35

NÃO

125

NÃO

47

NÃO

458

DESCONHEÇO

24

DESCONHEÇO

DESCONHEÇO

53

DESCONHEÇO

630

85

A sétima indagação deu continuidade à questão anterior em relação aos destinos das verbas e se têm ciência da prestação de contas. Em relação às respostas dos pais houve empate técnico (se assim podemos nos expressar), quanto aos alunos despontou um expressivo não seguido do desconheço, em relação aos funcionários e professores afirmaram ter conhecimento da prestação de contas. Extrai-se da análise desta questão, que professores e funcionários por estarem mais próximos da direção têm ciência dos acontecimentos, o que não ocorre com pais e alunos. Fica uma indagação em relação a este distanciamento que foi uma tônica presente nas escolas pesquisadas. FUNCIONÁRIOS

PROFESSORES

PAIS/COMUNIDADE

ALUNOS

80

250

120

1200

60

200

100

1000

80

800

60

600

40

400

150 40

100

20

50

20

0

0

0

1

1

ÓTIMO

60

ÓTIMO

160

ÓTIMO

BOM

60

BOM

211

BOM

REGULAR

24

REGULAR

140

REGULAR

200 0

1 40 102 60

1

ÓTIMO

450

BOM

1050

REGULAR

408

A última questão contradiz a anterior em todos os segmentos. O nível de satisfação em relação à escola foi considerado pela maioria dos respondentes como bom e ótimo. Apreende-se das questões analisadas que as direções em sua maioria, já incorporaram o sentido/objetivo da autonomia como uma conquista coletiva e para seu efetivo funcionamento é preciso à atuação dos conselhos escolares e das unidades executoras.

196 Grupo de Estudo e Pesquisas em Política Educacional, Rio Claro, 06, 07 e 08 de julho de 2011 Vol. 3 (2011)

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Todos os envolvidos no processo escolar têm que caminhar na direção de uma escola de qualidade no processo administrativo-pedagógico, que se concretiza através da formação de uma consciência crítica nos estudantes. Quanto à coletividade não terem medo de se expressar (tal fato foi constatado no ato da pesquisa) é sinal que o processo democrático deu início a sua instauração, desencadeando expectativas e esperanças na construção de um espaço escolar onde a convivência, o respeito ao outro seja uma prática cotidiana, equilibrando as forças internas e externas, no sentido de no futuro se obter sinergia através de um grupo dinâmico de trabalho (equipe escolar), caminhando na mesma direção com atitudes produtivas e pró-ativas, indo ao encontro das escolas dos sonhos enfatizadas por Freire (1996) e parafraseando-o, a escola que diz sim a vida, a escola do prazer, o espaço do fazer amigos, do diálogo, da convivência em grupo. Convivência esta, que só se realiza no espaço democrático através de uma gestão que propicie oportunidade de autonomia aos segmentos envolvidos identificando a escola como espaço público de fato, reconhecendo-a e ocupando-a.

Considerações finais Do estudo realizado, apreende-se que autonomia se faz presente nas escolas através da imposição da lei, no entanto a comunidade escolar abraçou a idéia tornando-a um compromisso coletivo que deve ser levado a termo por todos os atores sociais que convivem no espaço escolar. No decorrer da pesquisa constatamos avanços e retrocessos que, fazem parte do processo democrático, e parafraseando Demo (1996) para ocorrer crescimento é preciso diálogo, o dissenso, o fazer em grupo no caminhar do consenso. Neste sentido, professores, pais, funcionários e alunos se posicionaram em alguns questionamentos contraditórios, porém ao término das indagações chegam a um denominador comum de que a autonomia financeira trouxe melhorias visíveis no espaço escolar. Quanto á falta de comunicação igualitária entre todos os segmentos, identificamos que esta prática é resquício de uma escola tradicional onde o professor era o centro do processo, no entanto detectamos que o processo democrático instalado nas escolas é uma conquista dos seus usuários e que aprender a trabalhar em conjunto é um objetivo de formação que se impõem hoje para todas as pessoas.

197 Grupo de Estudo e Pesquisas em Política Educacional, Rio Claro, 06, 07 e 08 de julho de 2011 Vol. 3 (2011)

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No entanto ficou nítido a ―realidade,‖ ou seja, o que realmente ocorre nas escolas, a falta de maiores esclarecimentos por parte das direções do significado real de autonomia. E agindo nesse sentido estarão atuando como verdadeiros líderes que no dizer de Fullan e Hargreaves (2003, p. 107) ―[...] o diretor, como um símbolo de cooperação, é um dos elementos chave para a formação e para a reforma da cultura da escola [...]‖ Esta premissa fará com que toda a comunidade escolar / didático-administrativa, tenha como meta à autonomia, que significa o sucesso da escola e o conseqüente objetivo maior da sua existência que é o sucesso dos estudantes e a formação para a vida. Ao final deste trabalho entendemos que autonomia financeira no cotidiano das escolas estaduais do Município de Nova Iguaçu não é um mito e sim uma verdade incontestável, tendo a provação da comunidade escolar que apontam muitas conquistas. No entanto ficou claro que há um longo caminho a trilhar na busca do ideal, mas que o real constatado na pesquisa nos deixa esperançosa da escola que desejamos para as gerações futuras pautada na transparência, na flexibilidade, no diálogo e aberta às inovações.

Referências bibliográficas CASTORIARDIS, C. A criação histórica: o projeto pela autonomia. Porto Alegre: Palmerina, 1991. DEMO, P. Pobreza política. São Paulo: Cortez, 1991. _____. Participação é conquista: noções de política social e participativa. São Paulo: Cortez, 1996. _____. Avaliação qualitativa. São Paulo: Cortez, 1991. _____. Desafios modernos da educação. Petrópolis: Vozes, 1993. ESTEVÃO, C. A. V. Educação, justiça e democracia. Um estudo sobre as geografias da justiça em educação. São Paulo: Cortez, 2004. FISHER, N. Espaços de autonomia. Revista da educação AEC do Brasil. n. 54, p.2129, 1989. FREIRE, P. Pedagogia da esperança: um reencontro com a pedagogia do oprimido. 5. ed. São Paulo: Paz e Terra, 1998. ______. Pedagogia da autonomia. Saberes necessários à prática educativa. São Paulo: Paz e Terra, 1996. 198 Grupo de Estudo e Pesquisas em Política Educacional, Rio Claro, 06, 07 e 08 de julho de 2011 Vol. 3 (2011)

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FULLAN, M; HARGREAVES, A. A escola como organização aprendente: buscando uma educação de qualidade. Porto Alegre: Artes Médicas, 2003. GADOTTI, M. e R. J. (Orgs). Autonomia da escola: princípios e propostas. São Paulo: Cortez, 1997. GIROUX, H. A. Os professores como intelectuais: rumo a uma pedagogia crítica da aprendizagem. Porto Alegre: Artes Médicas, 1997. LIMA, L. C. Organização escolar e democracia radical: Paulo Freire e a governação democrática da escola pública. São Paulo: Cortez, 2002. RODRIGUES, N. Por uma nova escola. O transitório e o permanente na Educação. São Paulo: Cortez, 1991. PENNIN, S. T. S. de. Cotidiano e escola: obra em construção. SP: Cortez, 1989. RIO DE JANEIRO – Secretaria Estadual de Educação – Resolução N.º 1925 de 04/04/95, torna obrigatório a autonomia das escolas e conseqüentemente criação da A. A. E. _____ – Gabinete do Governador. Lei nº 3067 de 25 de setembro de 1998. Publicado no D.O de 29/09/98 que dispõem sobre a autonomia. _____ – Secretaria Estadual de Educação – Resolução N.º 2727 de 08/12/04, complementa a Lei 3067 de 25/9/1998.

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SISTEMAS APOSTILADOS DE ENSINO NOS ANOS INICIAIS DO ENSINO FUNDAMENTAL: ESTRATÉGIA MUNICIPAL PARA A ESCOLA PÚBLICA DE QUALIDADE?

Edimar Aparecido da Silva [email protected] FCT - UNESP- campus de Presidente Prudente

Yoshie Ussami Ferrari Leite [email protected] FCT - UNESP- campus de Presidente Prudente

Resumo: A adoção de sistema apostilado de ensino, por esferas municipais, pode representar um novo elemento para a busca de qualidade da escola pública atualmente. Desse modo, este projeto de pesquisa tem como objetivo compreender quais as implicações, que o sistema de apostilado traz para os anos iniciais da escola pública, mediante investigação junto ao município de Álvares Machado-SP. Como resultados parciais, apresentamos o levantamento de trabalhos acadêmicos. Palavras-chave: Ensino Apostilado; Escola Pública; Sistemas Municipais de Ensino.

INTRODUÇÃO E JUSTIFICATIVA O presente trabalho refere-se a uma pesquisa de mestrado em fase inicial, vinculada a linha de pesquisa ―Políticas Públicas, Organização Escolar e Formação de Professores‖ do Programa de Pós-Graduação em Educação da Universidade Estadual Paulista de Presidente Prudente. Trata-se de um estudo que tem como objetivo compreender como o uso de um sistema apostilado de ensino, pela rede municipal de Álvares Machado, pode contribuir para o fornecimento de novos elementos para a busca de aspectos qualitativos na escola pública no contexto atual. Segundo Beisiegel (1980), o processo de democratização da escola pública, permitiu uma grande expansão nas oportunidades de acesso, para que os alunos das classes populares tivessem direito à educação. Desta forma, a exclusão da classe trabalhadora, de uma escola que ao longo de décadas foi elitista, reverteu-se através da ampliação quantitativa de vagas. 200 Grupo de Estudo e Pesquisas em Política Educacional, Rio Claro, 06, 07 e 08 de julho de 2011 Vol. 3 (2011)

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Embora tenha acontecido à incorporação da classe popular em uma escola, então direcionada à elite, surge o desafio de garantir aspectos qualitativos capazes de adequar a escola às necessidades de uma nova clientela, como apontam os estudos de Beisiegel (1980), Paro (2002), Oliveira e Araujo (2003) e Leite e Di Giorgi (2004). Nessa perspectiva, de quais aspectos qualitativos falamos? Entendemos que de modo geral, se torna difícil entre pesquisadores de diversas áreas do conhecimento chegar a um consenso do que é qualidade, por esta ser ―uma palavra polissêmica, ou seja, comporta diversos significados (...) e por possibilitar interpretações diferentes do seu significado segundo diferentes capacidades valorativas‖ (OLIVEIRA e CARDOSO, 2003, p. 7) Em face ao debate, Paul Singer (1996) pontua a existência de duas posições antagônicas em torno da qualidade educacional: Vamos chamar a primeira posição de civil democrática, porque ela encara a educação em geral e a escolar em particular como processo de formação cidadã, tendo em vista o exercício de direitos e obrigações típicos da democracia. (...) O que se contrapõe a essa visão é a que denominarei produtivista. Esta concebe a educação, sobretudo escolar como preparação dos indivíduos para o ingresso, da melhor forma possível, na divisão social do trabalho. (...) Educar seria primordialmente isto: instruir e desenvolver faculdades que habilitem o educando a integrar o mercado de trabalho o mais vantajoso possível. (SINGER, 1996, p.5) Partindo dessa compreensão, aproximamo-nos da concepção civil democrática que denota a educação um processo emancipatório às classes sociais que foram excluídas ao longo de décadas, do exercício de seus direitos e obrigações comuns a democracia. Valorizamos a escola pública como espaço de conquistas e mudanças frente aos problemas sociais vivenciados pela maioria da população brasileira. Nesse contexto, percebemos que entre as medidas acompanhadas com as políticas de democratização do ensino e direcionadas para a escola pública, esta à criação da FAE (Fundação de Assistência ao Estudante) em 1983, que representa um dos primeiros passos para a garantia de aspectos qualitativos por meio de vários programas, como o PNAE (Programa Nacional de Alimentação Escolar), PLIDEF

201 Grupo de Estudo e Pesquisas em Política Educacional, Rio Claro, 06, 07 e 08 de julho de 2011 Vol. 3 (2011)

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(Programa do Livro Didático - Ensino Fundamental), programas editorais, de material escolar, bolsas de estudos e outros. (CASSIANO, 2004) Em 1985, outra política elaborada de forma a contemplar os alunos do ensino fundamental da rede pública brasileira, é observada através do PNLD (Programa Nacional do Livro Didático), que tem como objetivo a aquisição e distribuição universal e gratuita de livros didáticos, através do FNDE (Fundo Nacional de Desenvolvimento da Educação), órgão federal responsável pela captação de recursos para o financiamento de programas voltados para o ensino fundamental. (CASSIANO, 2004) Neste cenário, o reconhecimento de uma escola pública como direito de todos é conquistada com a promulgação da Constituição de 1988, que de acordo com Leite e Di Giorgi (2008, p. 15): (...) apresenta o mais longo capítulo sobre educação. Consagrase como direito público subjetivo e estabelece o princípio da gestão democrática do ensino público, o dever do Estado em prover creche e pré-escola ás crianças e o ensino fundamental obrigatório e gratuito para todos. O acompanhamento das mudanças ocorridas na economia e nas relações políticas e sociais do cenário mundial, ocorridas a partir dos anos 90, inauguram o surgimento de políticas neoliberais e a redefinição de novos papéis do Estado. Os discursos de democratização foram então, articulados aos interesses da Reforma do Estado e o debate em torno das políticas educacionais e da gestão da educação e da escola pública adquire conteúdos gerenciais, dando-se inicialmente no campo das legislações (ROSSI, 2009). Consideramos a Emenda Constitucional nº 14, de 12 de setembro de 1996, que através da modificação dos artigos do capítulo da educação e da nova redação ao art. nº 60 do Ato das Disposições Constitucionais Transitórias presente na Constituição Federal de 1988, objetiva a intervenção da União nas esferas estaduais caso não aplicassem o mínimo percentual exigido por lei, a revisão e definição das responsabilidades das unidades federativas na oferta do ensino, o detalhamento dos recursos aplicados pela União na erradicação do analfabetismo e a criação do FUNDEF (Fundo de Manutenção e Desenvolvimento do Ensino Fundamental e a Valorização do Magistério) (LEITE e DI GIORGI, 2008). 202 Grupo de Estudo e Pesquisas em Política Educacional, Rio Claro, 06, 07 e 08 de julho de 2011 Vol. 3 (2011)

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Em seqüência, é aprovada no dia 20 de dezembro de 1996, a Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional (9.394/96), que define nos artigos 70 e 71, as despesas que podem e as que não podem ser consideradas como manutenção e desenvolvimento do ensino. Também, confirma as responsabilidades das esferas municipais e dos recursos financeiros para a organização da educação (CARAVINA, 2009) Em 24 de dezembro de 1996, o Congresso Nacional aprova a Lei Federal nº 9.424/1996 regulamentando o FUNDEF. O fundo seria composto por 15% da arrecadação proveniente de impostos e transferências constitucionais (ICMS, FPE, FPM, IPI/Exp. e Ressarcimento pela Desoneração de Exportações) (CARAVINA, 2009). São elencadas, portanto, prioridades: aos Municípios a Educação Infantil, aos Estados, o Ensino Médio, para a União, Ensino Superior e dividido entre os Estados e os Municípios, em regime de colaboração e com suplementação financeira da União, e do Ensino Fundamental. Nessa perspectiva, a distribuição do FUNDEF privilegiaria o número de matrículas do ensino fundamental mantidas pelas esferas estaduais e municipais na proporção das escolas cadastradas das respectivas redes de ensino. Diante deste contexto, visando entre outras coisas à desconcentração e descentralização de recursos e competências que se deu o início, de forma mais intensa, do processo de municipalização do ensino fundamental no Estado de São Paulo. Concordamos que a regulamentação do FUNDEF acelerou o processo de municipalização no Estado de São Paulo, pois [...] muitos prefeitos dos municípios paulistas se viram diante de um dilema: dar por perdido o percentual da receita retido no FUNDEF ou assumir a responsabilidade pela oferta de ensino fundamental municipal através da celebração de convênios com o Estado ou através da criação de uma rede própria de ensino fundamental, recebendo assim o repasse de verbas do FUNDEF. (CARAVINA, 2009, p. 40). Em 1997, o primeiro ano das novas gestões municipais eleitas, ocorre à maior proporção de municipalizações, sendo que um terço dos municípios assinam convênios com a Secretaria Estadual de Educação, antecipando a implementação do FUNDEF. (MARTINS, 2003) 203 Grupo de Estudo e Pesquisas em Política Educacional, Rio Claro, 06, 07 e 08 de julho de 2011 Vol. 3 (2011)

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Segundo Martins (2003, p.9), em 1998, houve um refluxo e apenas 43 municípios aderiram à municipalização. Já no ano de 1999, ainda conforme a autora, o processo retoma seu fôlego incorporando mais 18% dos municípios. Sabemos que, a municipalização no Estado de São Paulo compreendeu municípios de pequeno, médio e grande porte com capacidade fiscal, administrativa, perfil político partidário e cobertura do ensino fundamental totalmente diferentes entre si, ora privilegiando o todo o ensino fundamental, ora privilegiando apenas aos anos iniciais. (MARTINS, 2003) Na tabela seguinte, é possível observar, que o número de matriculados na rede municipal obteve um

enorme crescimento

no período de 1996 a 2008.

Proporcionalmente, nota-se, que mesmo com quase a totalidade da responsabilidade do segundo ciclo do ensino fundamental, o sistema estadual paulista apresentou uma diminuição no número de alunos matriculados.

TABELA 01 - Estado de São Paulo – Número de Matriculas do Ensino Fundamental Regular Público ANO 1996 1997 1998 1999 2000 2001 2002 2003 2004 2005 2006 2007 2008

ESTADUAL 5.078.539 4.634.560 4.436.407 4.052.972 3.865.320 3.550.793 3.285.418 3.106.812 3.001.513 2.954.426 2.945.985 2.841.788 2.771.588

87% 81% 79% 73% 71% 67% 63% 61% 59% 58% 57% 56% 55%

MUNICIPAL 726.704 1.075.850 1.194.819 1.544.184 1.595.881 1.771.167 1.935.101 2.011.743 2.075.869 2.127.994 2.249.262 2.278.235 2.293.609

13% 19% 21% 27% 29% 33% 37% 39% 41% 42% 43% 44% 45%

TOTAL 5.805.243 5.710.410 5.631.226 5.564.156 5.461.201 5.322.560 5.220.519 5.118.555 5.077.382 5.082.420 5.195.247 5.120.023 5.065.197

Fonte: INEP/MEC – Censo Escolar de 1996 a 2008 – www.inep.gov.br. Tabela elaborada por Maria Solange Caravina, 2009.

Após dez anos de vigência, o FUNDEF foi extinto em 31 de dezembro de 2006. Nesse período, concordamos com Caravina (2009, p. 36) que ―houve um avanço 204 Grupo de Estudo e Pesquisas em Política Educacional, Rio Claro, 06, 07 e 08 de julho de 2011 Vol. 3 (2011)

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no atendimento do ensino fundamental, pouco faltando para atingir a universalização no Brasil‖. Dias antes, no dia 19 de dezembro de 2006 foi promulgada a Emenda Constitucional n° 53 (EC nº 53), dando nova redação ao artigo 60 do Ato das Disposições Constitucionais Transitórias, instituindo, então, o Fundo de Manutenção e Desenvolvimento da Educação Básica e de Valorização dos Profissionais da Educação (FUNDEB) como substituto do FUNDEF (CARAVINA, 2009). O FUNDEB, em relação à natureza, organização e funcionamento se assemelha ao FUNDEF por ter os recursos retidos de cada Estado, repartidos proporcionalmente ao número de alunos matriculados na educação básica das redes estaduais e municipais. Sendo as principais diferenças em relação à abrangência e ao volume de recursos envolvidos (CARAVINA, 2009). Partindo dessas novas determinações, notamos que cada município dispõe de certa autonomia para utilização dos seus recursos. Assim, concordamos com Militão (2007 p. 83) que ―em cada caso de municipalização que se desenvolve no âmbito do território paulista, mesmo apresentando semelhanças, é único, uma vez que é extremamente dependente da conjuntura local‖. Frente às enormes desigualdades regionais, há a preocupação com as dificuldades dos municípios em organizarem seus sistemas de ensino na construção do próprio currículo. Muitas vezes, frente à busca de soluções imediatas para a consecução da oferta educacional, as redes municipais buscam como estratégia a oferta de sistemas apostilados de ensino. Conforme matéria publicada, em 16 de setembro de 2009 no Jornal Valor Econômico de São Paulo, afirma-se que mais de um terço das cidades paulistas usam apostilas. De acordo com Adrião et. al. (2009) os sistemas apostilados de ensino, estão principalmente presentes nos municípios de pequeno porte. Consideramos entretanto, que o fornecimento destas apostilas podem advir de parcerias com empresas privadas coordenadas pelos maiores grupos educacionais do país, como COC, ANGLO, OBJETIVO e POSITIVO

205 Grupo de Estudo e Pesquisas em Política Educacional, Rio Claro, 06, 07 e 08 de julho de 2011 Vol. 3 (2011)

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Diante desta situação, observamos a necessidade de uma reflexão mais ampla sobre o ensino apostilado, tanto no que se refere aos seus aspectos políticos, como, em seus aspectos pedagógicos, devido muitas vezes a sua intencionalidade de proporcionar um currículo para a escola pública. Para a fundamentação desta pesquisa, de forma a possibilitar melhor compreensão do uso de sistemas apostilados de ensino, consideramos o professor como um profissional da educação imprescindível, capaz de transcender os limites que se apresentam no cotidiano de seu trabalho. Segundo Ghedin (2007.p.18) Isso supõe que cada professor analise o sentido político, cultural e econômico que cumpre à escola; com esse sentido condiciona a forma em que ocorrem as coisas no ensino; o modo como se assimila a própria função; como se tem interiorizado os padrões ideológicos sobre os quais se sustenta a estrutura educativa. Portanto, atento ao delineamento de políticas no uso de sistemas apostilados de ensino, que permeiam o trabalho docente e diante da construção de uma escola pública de qualidade, levantam-se as seguintes indagações: No atual contexto político-social do país quais elementos estão implicados na utilização dos sistemas de ensino apostilados? Quais implicações o uso de sistemas apostilados, traz para o trabalho docente e para a aprendizagem dos alunos na rede municipal de Álvares Machado? Como o trabalho docente se organiza diante da aquisição de um sistema de ensino apostilado? RESULTADOS PARCIAIS Com o objetivo de compreender como os trabalhos acadêmicos estão desenvolvendo a temática dos sistemas apostilados de ensino, realizamos um levantamento de dissertações e teses, considerando o período de 2000 a 2010, nos programas de Pós Graduação em Educação das seguintes instituições paulistas: UFSCARi, USPii, UNESPiii de Presidente Prudente, Rio Claro, Araraquara e Marília, UNICAMPiv e PUC-SPv. Também realizamos um levantamento junto ao banco de Teses e Dissertações da Capesvi/MEC de forma a obter uma visão mais ampla sobre as produções. Constatamos que a maioria dos trabalhos concentra-se no Programa de Pós Graduação em Educação da UNESP de Rio Claro, devido ao ―Projeto Estratégias Municipais para a Oferta da Educação Básica: Uma análise de Parcerias Público206 Grupo de Estudo e Pesquisas em Política Educacional, Rio Claro, 06, 07 e 08 de julho de 2011 Vol. 3 (2011)

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Privado no Estado de São Paulo‖, financiado pela FAPESPvii e coordenado pelas professoras: Profª Drª Theresa Adrião, Profª Drª Teise Garcia, Profª Drª Raquel Borghi e Profª Drª Lisete Arelaro. Este projeto teve como objetivos: organizar um banco de dados sobre o perfil das parcerias efetuadas entre o conjunto dos municípios paulistas e a esfera privada para a oferta da educação básica e desenvolver estudos de caso em municípios intencionalmente selecionados, tendo em vista a vigência, durante o período de 1996 a 2006, de parcerias entre a poder público local e o setor privado em uma das seguintes modalidades: aquisição de material pedagógico na forma de "sistema de ensino"; contratação de instituições privadas para gerir e ou elaborar políticas de gestão da educação municipal; subvenção pública a instituições privadas para a oferta de vagas. Assim, em relação ao levantamento da UNESP de Rio Claro, encontramos quatro trabalhos em nível de Mestrado. O primeiro, defendido em 2008 por Jeferson Antonio do Prado, orientado pela Profª Drª Marilena Ap. Jorge Guedes de Camargo, tem o título ―Compreensão Da Atividade Pedagógica Configurada Em Uma Rede De Inter -Relações: Franquia Escolar‖. O trabalho buscou compreender sobre em que medida as tensões interdependentes no espaço e no tempo da sala de aula, (a estrutura organizacional, os pressupostos, os valores, as condições e metodologia de trabalho, os horários das aulas, as disciplinas, o nome da escola, a rede pela qual se vincula, e em especial o material apostilado sistematizado adotado), de uma escola particular franqueada instrumentalizam o olhar do professor auxiliando na compreensão de sua atividade docente, utilizando ao referencial teórico as obras de Norbert Elias quanto aos estudos da categoria de inter-relação entre indivíduo e sociedade concebidos como uma rede de funções interdependentemente. Entretanto, a pesquisa investigou o material apostilado de acordo com as particularidades dos professores do ensino médio e de uma instituição particular o que não relaciona-se propriamente com os objetivos do nosso estudo. O segundo trabalho, também defendido no ano de 2008 é de autoria de Egle Pessoa Bezerra, orientado pela Profª Drª Theresa Adrião, com o título ―Parceira públicoprivada nos municípios de Brotas e Pirassununga: Estratégias para a oferta de ensino?‖. A dissertação versa sobre a constituição de parcerias entre a administração pública brasileira e o setor privado, ressaltando seus reflexos para a educação nos municípios 207 Grupo de Estudo e Pesquisas em Política Educacional, Rio Claro, 06, 07 e 08 de julho de 2011 Vol. 3 (2011)

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paulistas de Brotas e Pirassununga. Este trabalho toma por base as condições jurídicas e administrativas deste novo aparato, e sua adoção pelos municípios paulistas de Pirassununga e Brotas. O terceiro trabalho corresponde é de autoria de Alessandra Aparecida Caim, também orientado pela Profª Drª Theresa Adrião, defendido em 2009, com o título ―O atendimento ao Ensino Fundamental: Análise de parcerias de 2 municípios paulistas e o setor privado na aquisição de `Sistema de ensino' ―. O estudo teve como objetivo investigar e analisar a implantação e as conseqüências das parcerias público-privadas estabelecidas entre a administração pública municipal e a iniciativa privada, no estudo de dois casos intencionalmente selecionados: os municípios de Ipeúna e Santa Gertrudes que adotaram um sistema de modelo pedagógico único. A pesquisadora privilegiou apenas entrevistas com os gestores municipais e representantes da empresa em questão. Finalmente, a última dissertação encontrada no Programa de Pós Graduação em Educação do Instituto de Biociências da UNESP campus de Rio de Claro, é da autora Lucilene Rossi, também orientado pela Profª Drª Theresa Adrião, com o título ―Oferta educacional e parceria com o setor privado: um perfil dos municípios paulistas com até 10.000 habitantes‖. Foi defendido no ano de 2009, e teve como objetivo analisar a tendência na adoção de parcerias entre prefeituras municipais e empresas privadas para a compra de material apostilado nos municípios com até 10.000 habitantes, buscando traçar um perfil destes. O trabalho apontou que a combinação de destes fatores: fragilidade financeira, municipalização do ensino fundamental, programa partidário e ―marketing‖ das empresas gerou a grande expansão das parcerias públicoprivado de sistemas de ensino apostilados nos municípios com até 10.000 habitantes. Em nosso levantamento realizado no Programa de Pós Graduação em Educação Escolar da UNESP campus de Araraquara, encontramos dois trabalhos em nível de Mestrado. O primeiro foi, defendido em 2008, por Ivair Fernandes de Amorin e orientado pela Profª Drª Paula Ramos de Oliveira, com o título ―Reflexões críticas sobre os sistemas apostilados de ensino‖. Teve como objetivo analisar as apostilas presentes nos sistemas municipais amparado pelos filósofos frankfurtianos signatários da Teoria Crítica valendo-se de categorias como Indústria Cultural e Semiformação para elucidação do objeto de estudo que contempla o processo formativo do aluno.

208 Grupo de Estudo e Pesquisas em Política Educacional, Rio Claro, 06, 07 e 08 de julho de 2011 Vol. 3 (2011)

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O outro trabalho encontrado na UNESP de Araraquara foi defendido em 2009 sendo de autoria de João Ernesto Nicoleti, orientado pelo Profº Drº Ricardo Ribeiro, intitulado ―Ensino apostilado na Escola Pública: tendência crescente nos municípios da região de São José do Rio Preto-SP‖. O objetivo da pesquisa foi investigar como ocorre a contratação de sistemas privados de ensino para fornecimento de apostilas a alunos da rede municipal de Ensino Fundamental; bem como de material e treinamento a professores que atuam nas escolas municipais da região de São José do Rio Preto. O levantamento no Programa de Pós Graduação em Educação da UNESP campus de Marília possibilitou que encontrássemos a dissertação defendida no ano de 2010 de Fernanda Marcela Delgado, sob orientação da Profª Drª Maria Silvia Simões Bueno, com o título ―A educação municipal e a relação público x privado: um estudo de caso em Fernão/SP‖ - que apresenta uma discussão sobre a lógica de quase-mercado inserida na educação brasileira, especificamente no município de Fernão, Estado de São Paulo, bem como questiona a interferência de organizações escolares privadas em espaços públicos. No banco de teses e dissertações do Programa de Pós Graduação em Educação: Currículo da PUC - São Paulo, encontramos a dissertação defendida em 2010 - A contratação de uma empresa privada pela rede pública municipal de Poá – SP (Gestão 2005-2008) A voz dos professores do Ensino Fundamental - de autoria de Cláudia Barbosa Santana Mirandola, orientada pela Profª Drª Branca Jurema Ponce que teve como objetivo compreender como foi o processo de contratação da empresa educativa e como os professores vivenciaram a implantação e a implementação da proposta apostilada de ensino. De acordo com o levantamento realizado vale ressaltar que não encontramos trabalhos diretamente relacionados com a temática em questão, nos Programas de Pós Graduação em Educação da UNICAMP, USP, UNESP campus de Presidente Prudente e UFSCAR em vista ao período consultado. Para ampliar a busca de teses e dissertações, garantindo uma visão de âmbito nacional, também consultamos a base de dados da CAPES/MEC onde pesquisamos pela palavra apostila, e encontramos trabalhos direcionados à área técnica, envolvendo informática, por exemplo, ou outro conhecimento específico. Já com a expressão ―sistemas apostilados‖, identificamos apenas os trabalhos já mencionados. 209 Grupo de Estudo e Pesquisas em Política Educacional, Rio Claro, 06, 07 e 08 de julho de 2011 Vol. 3 (2011)

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As pesquisas que identificamos apontam elementos importantes sobre o ―ensino apostilado‖, como as parcerias público-privado para a oferta deste material didático, a vivência dos professores frente a um ensino apostilado de natureza privada e uma análise critica do processo formativo dos alunos, diante de um material também fornecido por instituições privadas. Podemos considerar que os trabalhos ainda são poucos, pois o uso de sistemas apostilados trata-se de uma estratégia atual, pressuposta pelo processo de municipalização do ensino, podendo advir de parcerias com instituições privadas. Diante desta política, nosso estudo poderá contribuir para uma melhor compreensão dos sistemas apostilados de ensino na escola pública atual, tendo como protagonistas desta análise, os professores, os quais consideramos capazes de refletir frente às implicações que envolvem o seu trabalho. REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS ADRIÃO, T. (et. al). Uma modalidade peculiar de privatização da educação pública: a aquisição de ―sistemas de ensino‖ por municípios paulistas. Educação e Sociedade, Campinas, v. 30, n. 108, out. 2009 AMORIN, Ivair Fernandes de. Reflexões críticas sobre os sistemas apostilados de ensino.2008. Tese (Mestrado em Educação). 2008. 192f .Faculdade de Ciências e Letras de Araraquara. Universidade Estadual Paulista, Araraquara, 2008 BEISIEGEL, C. de R. Relações entre a quantidade e a qualidade no ensino comum. Revista ANDE. 1980. BEZERRA, Egle Pessoa. Parceira público-privada nos municípios de Brotas e Pirassununga: Estratégias para a oferta de ensino? 2008. Tese (Mestrado) Instituto de Biociências de Rio Claro, Universidade Estadual Paulistas, Rio Claro, 2009. BRASIL. Emenda Constitucional nº 14 de 12 de setembro de 1996. Modifica os art. 34, 208, 211 e 212 da Constituição e dá nova redação ao art. 60 do Ato das Disposições Condicionais Transitórias. Disponível em Acesso em 20. Mar.2010.

______. Lei 2.424 de 24 de dezembro de 1996. Dispõe sobre o Fundo de Manutenção e Desenvolvimento do Ensino Fundamental e Valorização do Magistério. Na forma prevista no art. 60 § 7 do Ato das Disposições Condicionais Transitórias. Disponível em < http:// www.mec.gov.br > Acesso em 20. Mar.2010. CAIN, Alessandra Aparecida. O atendimento ao Ensino Fundamental: Análise de parcerias de 2 municípios paulistas e o setor privado na aquisição de `Sistema de 210 Grupo de Estudo e Pesquisas em Política Educacional, Rio Claro, 06, 07 e 08 de julho de 2011 Vol. 3 (2011)

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ensino.2009. f. Tese (Mestrado) Instituto de Biociências de Rio Claro, Universidade Estadual Paulistas, Rio Claro, 2009. CARAVINA, Maria Solange. Impacto da municipalização do ensino fundamental público e as condições de trabalho dos professores no município de Presidente Prudente – SP. 2009. 185f. Tese (Mestrado) – Faculdade de Ciências e Tecnologia. Universidade Estadual Paulista, Presidente Prudente, 2009 CASSIANO, Célia Cristina de Figueiredo. Aspectos políticos e econômicos da circulação do livro didático de história e suas implicações curriculares. História, São Paulo, v.23, p.33-48, 2004. DELGADO, Fernanda Marcela. A educação municipal e a relação público x privado: um estudo de caso em Fernão/SP2007. 120f. Tese (Mestrado) – Faculdade de Filosofia e Ciências, Universidade Estadual Paulista, Marília, 2007. GHEDIN, Evandro (org.). Perspectivas em formação de professores /Evandro Ghedin (org). Manaus : Valer, 2007 LEITE, Y. U. F.; DI GIORGI, C. A. G. A qualidade na/ da escola pública. No prelo, 2008. MARTINS, Angela Maria. Uma análise da municipalização do ensino no Estado de São Paulo. Cad. Pesqui. São Paulo, n. 120, nov. 2003 . Disponível em < http://www.scielo.br/scielo.php?script=sci_arttext&pid=S010015742003000300011&ln g=pt&nrm=iso >. Acesso em 20 mar. 2010. MILITÃO, Silvio César Nunes. O processo de municipalização do ensino no Estado de São Paulo: uma análise do seu desenvolvimento na região de governo de Marília. 2007. 228f. Tese (Doutorado) – Faculdade de Filosofia e Ciências, Universidade Estadual Paulista, Marília, 2007. MIRANDOLA, Cláudia Barbosa Santana. A contratação de uma empresa privada pela rede pública municipal de Poá – SP (Gestão 2005-2008) A voz dos professores do Ensino Fundamental. 2010.160f. Tese (Mestrado) – Pontifica Universidade Católica de São Paulo, São Paulo, 2010. NICOLETI, João Ernesto. - Ensino apostilado na Escola Pública: tendência crescente nos municípios da região de São José do Rio Preto-SP. 2009. 97f. Tese (Mestrado em Educação). Faculdade de Ciências e Letras de Araraquara. Universidade Estadual Paulista, Araraquara, 2009 OLIVEIRA, R. P. de; ARAUJO, G. C. de. Qualidade do ensino: uma nova dimensão da luta pelo direito à educação. Rev. Bras. Educ., Rio de Janeiro, n. 28, 2005. Disponível em: < http://www.scielo.br/scielo.php?script=sci_arttext&pid=S141324782005000100002&ln g=pt&nrm=iso >. Acesso em: 15 mar. 2010. 211 Grupo de Estudo e Pesquisas em Política Educacional, Rio Claro, 06, 07 e 08 de julho de 2011 Vol. 3 (2011)

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PARO, V.H., Gestão democrática da escola pública. São Paulo: Ática, 2002 ROSSI, Lucilene. Oferta educacional e parceria com o setor privado:um perfil dos municípios paulistas com até 10.000 habitantes. 2009.181f. Tese (Mestrado) Instituto de Biociências de Rio Claro, Universidade Estadual Paulistas, Rio Claro, 2009. SERGIO ZACCHI .Apostilas fomentam disputa PT x PSDB. Valor Econômico. São Paulo, 16 nov. 2009. Caderno Especial. Disponível em < http://eeducador.com/index.php/notas-mainmenu-98/5723-apostilas > Acesso em 17 mai. 2010. SINGER. Paul. Poder Política e Educação. Conferência de Abertura da XVIII Reunião da ANPEd, Caxambu, outubro de 1995. In Revista Brasileira da Educação. Nº 1. Jan/Fev/Mar/Abr, 1996. p. 5- 15.

212 Grupo de Estudo e Pesquisas em Política Educacional, Rio Claro, 06, 07 e 08 de julho de 2011 Vol. 3 (2011)

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Eixo 2 – Reformas educativas e trabalho docente

OS CENTROS DE EDUCAÇÃO DE JOVENS E ADULTOS DE MATO GROSSO E O PROCESSO DE FORMAÇÃO CONTINUADA DOS PROFESSORES

Ângela Rita Christofolo de Mello [email protected] Universidade Metodista de Piracicaba

Resumo: O objetivo deste texto é apresentar parte da pesquisa de doutorado em educação em que estamos analisando a política de implantação e o funcionamento dos Centros da Educação de Jovens e Adultos em Mato Grosso (CEJAs). A investigação é de abordagem qualitativa e para esta comunicação nos valemos de entrevistas que foram realizadas com a equipe de implantação dos CEJAs em Mato Grosso nos anos de 2008 e 2009. Ao todo foram feitas seis entrevistas no segundo semestre de 2010. As questões foram organizadas em quatro categorias. Para a apresentação deste texto selecionamos os dados referentes à 4.ª categoria: capacitação e formação continuada para os professores dos CEJAs. Palavras-chave: Formação continuada, Atuação Docente, CEJAs.

Considerações Iniciais: Ações para elevação da escolaridade: o caso de Mato Grosso

Pesquisa realizada anteriormente (Mello, 2008), em que analisamos o Programa LetrAção, desenvolvido no Estado de Mato Grosso permitiu compreender

no período de 2004 a 2007,

os dilemas relacionados às políticas públicas destinadas à

Educação de Jovens e Adultos, dentre eles destacaram-se: a ausência de acompanhamento avaliativo interventivo, a desintegração da equipe executiva, a não qualificação dos alfabetizadores, a falta de espaço físico e material didático para docentes e discentes, os ―treinamentos‖ oferecidos aos alfabetizadores e a indiferença das Secretarias Municipais de Educação e da sociedade civil.

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Entretanto, as justificativas contidas no documento preliminar, denominado Relatório de Redimensionamento da EJA22, elaborada para a implantação dos Centros da Educação de Jovens e Adultos (CEJAs) em Mato Grosso, apresentam avanços que nos fazem acreditar que esta modalidade de ensino está conquistando o seu espaço na Educação Básica deste Estado, por isso o interesse em apresentar um mapeamento do processo de implantação dos CEJAs em Mato Grosso. Neste texto, nos deteremos apenas na categoria que discute os aspectos relacionados as capacitações e as formações continuadas oferecida aos docentes dos CEJAs. A análise da trajetória das políticas públicas implementadas para atender a EJA no Estado de Mato Grosso permite perceber que, de certa forma, estas políticas incidem sob as decisões tomadas em âmbito nacional, pelo Ministério da Educação e Cultura (MEC). Em 1990 a concepção supletivadora foi mantida junto com o aligeiramento dos cursos, nas políticas públicas pensadas para a EJA, enquanto que a diversidade de formas de atendimentos propiciadas por meio da existência dos Centros de Estudos Supletivos (CES), Núcleos de Estudos Supletivos (NES) e pelos Núcleos de Educação Permamente (NEPs), foram extintas juntamente com estes Centros e Núcleos. Estas ações, efetuadas no início da década de 1990 caminharam em sentido diverso às decisões internacionais e aos compromissos firmados pelo Brasil com a Educação para Todos. A Aprovação de um Programa para o atendimento à modalidade da EJA em Mato Grosso apenas no ano de 2002, após a aprovação das Diretrizes Curriculares Nacionais para a EJA em 2000, dentre outras evidencias, confirmam a influência que as políticas públicas federais exercem sobre as estaduais e municipais.

22

Entende-se que a implantação de uma política só se faz a partir das práticas e da realidade vivenciada pelos atores da escola, sem o que se corre o risco de, uma vez mais, distanciar-se da cultura que produziu certas características, modos de pensar e de fazer a EJA — base concreta para a mudança. O redimensionamento, portanto, visa a subsidiar a implantação de uma política permanente de atendimento a jovens e adultos não-escolarizados, segundo suas especificidades culturais, de vida, trabalho, local de ca, material e das escolas, bem como a situação da vida escolar dos estudantes. (OCRJA/MT, 2011, p. 146).

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Em Mato Grosso a oferta à modalidade da EJA, na década de 1990, foi marcada pelo retrocesso provocado pela extinção dos CES, NES e NEPs. As Escolas de Suplência implantadas no Estado desconsideraram as experiências promissoras vivenciadas nestes espaços e funcionaram muito próximas às escolas regulares, com a única diferença de que nestas escolas os jovens e os adultos tinham a chance de concluir dois anos de escolarização em um ano civil. Além das Escolas de Suplências, Mato Grosso desenvolveu no final dos anos de 1990 o Programa de Alfabetização de Adultos (ALFA). No início dos anos de 2000 o Conselho Estadual de Educação de Mato Grosso aprovou a Resolução 180/2000. A Secretaria de Estado de Educação lançou em 2004 o Programa LetrAção e em 2006 o Projeto Beija-Flor23. De forma que a última política voltada para a Educação de Jovens e Adultos em Mato Grosso, foi a implantação dos CEJAs nos anos de 2008 e 2009. Segundo a equipe de redimensionamento, responsável pelo mapeamento das unidades, criação e implantação dos Centros, as razões desta implantação foram o reconhecimento e a avocação da EJA como uma modalidade de ensino para que pudesse garantir ao seu público potencial o ingresso, a permanência e a terminalidade da Educação Básica. Todavia, conforme afirma Oliveira (2004) 1990 inaugura um novo momento na educação brasileira, comparável, em termos de mudanças, à década de 1960, em que se registrou a tessitura do que seria vivenciado nas duas décadas seguintes. Se nos anos de 1960 assiste-se, no Brasil, à tentativa de adequação da educação às exigências do padrão de acumulação fordista e às ambições do ideário nacional-desenvolvimentista, os anos de 1990 demarcam uma nova realidade: o imperativo da globalização (OLIVEIRA, 2004, p. 03).

Segundo

Oliveira

(2004),

a

substituição

do

ideário

―nacional-

desenvolvimentista‖ pelo ―globalismo‖ na década de 1990, provocou grandes transformações nos objetivos educacionais na perspectiva de adequá-los às imposições da nova ordem social que já não acredita que apenas com a elevação da escolarização, as diferenças sociais possam ser reduzidas. Neste contexto, a Conferência Mundial sobre Educação para Todos, realizada em Jomtien, na Tailândia, em março de 1990, sob o lema de uma educação para a 23

Este Projeto foi lançado em 2006, com a aprovação do Conselho Estadual de Educação por um período de quatro anos. Tinha como objetivo atender os alunos egressos do Programa LetrAção e a demanda potencial do segundo e terceiro segmento. Foi extinto no final do ano de 2009, depois de vencido a aprovação para o seu funcionamento em caráter experimental.

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III Seminário Internacional de Gestão Educacional

―equidade

social‖,

tentou

orientar

as

reformas

educacionais

dos

países

subdesenvolvidos. O compromisso firmado em Jomtien estabeleceu que os países mais pobres e populosos do mundo deveriam expandir a Educação Básica e elevar o nível de atendimento às populações. Porém, o Brasil não previu aumentos dos investimentos à educação o que comprometeu a sua expansão educacional. Assim, ao mesmo tempo em que há uma imposição pela ampliação da oferta educacional, a descentralização pedagógica, administrativa e financeira da União, desobrigou o governo federal de assumir todos os níveis da educação. Em se tratando da EJA, como já mencionamos anteriormente, observa-se a manutenção da supletivação e o aligeiramento dos cursos ofertados. Esta descentralização foi assegurada na Lei de Diretrizes e Bases da Educação nacional (9394/96), sendo esta, sua principal característica. Com a atual legislação, sob a bandeira da ―autonomia‖, as escolas buscam melhorar a qualidade do ensino, por meio de parcerias e adoção de programas e projetos colaborativos, ao mesmo tempo em que as avaliações externas realizadas pelos governos federal, estadual e até mesmo municipal, cobram elevações dos indicadores de aprendizagem, na tentativa de atender ao que foi assegurado pelos representantes da Organização das Nações Unidas para os governos dos países latino-americanos: ―Transformação produtiva com equidade‖, ou então, uma educação que permita que as pessoas em vulneráveis situações de vida, encontrem caminhos para sobreviverem. Neste sentido, orientadas pelo ideal de ―equidade social‖, as reformas educacionais da década de 1990 passam a ter como principal imperativo dos sistemas escolares, formar os indivíduos para a empregabilidade, já que a educação geral é tomada como requisito indispensável ao emprego formal e regulamentado, ao mesmo tempo em que deveria desempenhar papel preponderante na condução de políticas sociais de cunho compensatório, que visem à contenção da pobreza (OLIVEIRA, 2004, p. 03).

A educação sustentada pelo slogan produzido pelos organismos internacionais, ―Transformação produtiva com equidade‖, de certa forma, justifica as políticas públicas propostas para o redimensionamento da EJA em Mato Grosso. Conforme explicitado no ―Relatório Preliminar Redimensionamento da EJA 2007/2008‖, elaborado pela sua comissão, [...] considerando a necessidade de reconhecer as especificidades dos sujeitos da Educação de Jovens e Adultos e dos diferentes tempos e

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III Seminário Internacional de Gestão Educacional espaços formativos, o Centro tem por objetivo oferecer formas diferenciadas de atendimento que compreenda a educação formal e informal integrada ao mundo do trabalho ao longo da vida (RPREJA, 2007/2008, p. 7 - Grifo nosso).

Analisando o referido objetivo, inferimos que a implantação dos CEJAs teve dupla função: qualificar os trabalhadores para atender à demanda da força trabalhadora do Estado e melhorar o baixo IDH da população mato-grossense, por meio da elevação da escolarização formal. A escola compreendida a partir das relações de classe em uma sociedade capitalista, segundo Costa (1995), com o slogan de uma educação voltada para a ―equidade‖ social, continua contribuindo para a conservação do status quo, ou seja, para que as situações de desigualdades e injustiças sociais se mantenham e se acentuam cada vez mais. O mesmo autor explica que, os programas, os projetos, ou determinadas políticas públicas portam ―interesses e determinações sociais muito fortes agindo sobre a escola, tornando-se ela instrumento do poder dominante‖ (1995, p. 84). Segundo Bourdieu (2005) a equidade formal estabelecida por todas as escolas, entre todos os alunos reproduzem e legitimam as desigualdades sociais, haja vista, que na escola as diferenças culturais não são respeitadas e as avaliações escolares levam em consideração o que o aluno deveria saber e não o que ele sabia quando chegou à escola. Então, [...] tratando formalmente de modo igual, em direitos e deveres, quem é diferente, a escola privilegiaria, dissimuladamente, quem, por sua bagagem familiar, já é privilegiado. Nessa perspectiva, Bourdieu compreende a relação de comunicação pedagógica (o ensino) como uma relação formalmente igualitária, que reproduz e legitima, no entanto, desigualdades anteriores (NOGUEIRA & NOGUEIRA, 2002, p. 22).

Foi com esta compreensão que nos dispusemos a investigar em que medida o desenho original da política foi colocado em prática, segundo a percepção dos atores diretamente envolvidos na construção e na implementação da proposta de implantação dos Centros da EJA em Mato Grosso. Para isto, dentre outros aspectos analisamos como a equipe que implantou os CEJAs estruturou as capacitações e as formações continuadas aos seus respectivos professores e como estas vêm sendo realizadas. Porém, são muitas as indagações em relação à criação a ao funcionamento dos Centros da EJA em municípios mato-grossenses. O fato de os CEJAs terem começado a funcionar sem uma orientação curricular pronta, poderia comprometer a proposta. Os professores que estão atuando nos Centros são professores do ensino regular e a sua 217 Grupo de Estudo e Pesquisas em Política Educacional, Rio Claro, 06, 07 e 08 de julho de 2011 Vol. 3 (2011)

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formação inicial poderia dificultar sua atuação na modalidade da EJA. Segundo entrevistas realizadas apreende-se que até o ano de 2010, não havia material suficiente para todos os alunos de todos os segmentos e o recebido, não estaria sendo utilizado porque os professores estavam com dificuldade em compreender a sua proposta didática. Portanto, continuavam aguardando formação específica. Mato Grosso possui ao todo, 141 municípios. Os 24 Centros da EJA foram implantados em apenas 20 municípios. Segundo as contribuições dos membros da Comissão de Redimensionamento, para a escolha dos municípios foram levados em consideração primeiro a demanda da modalidade e o alto percentual de evasão apresentado nas escolas que ofertavam a EJA e outras modalidade de ensino. Os vinte municípios também possuem a maior densidade demográfica e estão em regiões de considerável desenvolvimento econômico. Diante deste panorama neste trabalho apreenderemos em analisar em que medida a política pública pensada para os Centros da EJA em Mato Grosso se aproxima ou se distância do que foi idealizado em relação à capacitação e a formação continuada dos professores.

Capacitação e formação continuada para os professores dos Centros da Educação de Jovens e Adultos de Mato Grosso

A EJA é uma modalidade de ensino que trabalha com um público muito diverso e diferenciado. Esta característica peculiar exige uma proposta pedagógica e um tratamento didático específico. Para tanto, é preciso a utilização de uma variedade singular de recursos e de estratégias didáticas. Porém, nos deparamos com um problema inveterado de difícil superação. Além da quase inexistência da oferta de Licenciaturas em Pedagogia para a EJA, as licenciaturas tradicionais contam com uma restrita carga horária para as disciplinas que trabalham os fundamentos teóricos e metodológicos desta modalidade de ensino. Esta realidade faz com que a maioria dos professores conclua as licenciaturas sem estarem aptos para atuarem na EJA. O problema foi aduzido por um dos professores que fez parte do redimensionamento da EJA. Para ele, “um dos grandes problemas nosso é a formação, não só a nível nacional como a nível estadual, porque nacionalmente a gente percebe que todas as discussões de formação de educadores para a EJA envolvem as universidades, e, as universidades não têm oferecido, por exemplo, das mais de 700 que temos no país, não ofertam disciplinas,

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III Seminário Internacional de Gestão Educacional ou cursos específicos para a EJA. Temos algumas, muito poucas que ofertam disciplinas no curso e outras ofertam curso de Pedagogia especifico para a EJA. Mas, diante do público e da demanda da EJA que temos no país, as universidades que se interessam e ofertam o curso são insuficientes. Além de que, os outros cursos que chamamos de normais não dão conta de preparar professores para atuar na EJA. Na verdade, é com o nosso fazer, por meio das nossas dificuldades, que, aos trancos e barrancos vamos estruturando os currículos, as metodologias, as propostas e construindo algo que se adéque a realidade daquele município, daquela escola. Então, vê se que a formação ainda é muito carente” (Sílvio).

Zeichner (1993) afirma que apesar do reconhecimento da importância de uma boa formação acadêmica e da preparação dos professores para as disciplinas e ou modalidades que irão atuar, políticas recentes limitam a área da educação nos programas de formação inicial e continuada de professores, concedendo a tarefa de formação e atualização docente a formadores com pouca ou nenhuma experiência nos cursos de formação profissional e em docência. Esta particularidade deixa os cursos oferecidos, científicos ou técnicos. Como a implantação dos CEJAs, os professores que assumiram a tarefa de trabalhar a Proposta Pedagógica foram os mesmos que já estavam lotados nas respectivas escolas e que trabalhavam com diferentes formas de ofertas de ensino consideradas regulares. Diante deste contexto, perguntamos para a equipe que redimensionou a EJA em Mato Grosso se a SEDUC/MT havia oferecido capacitação aos docentes para atuarem nos CEJAs. Uma das professoras entrevistadas afirmou que “sim, houve formação, no ano passado nós fechamos com o seminário em que os professores fizeram trocas de experiências dos projetos desenvolvidos. Eles apontaram quais foram às dificuldades pedagógicas apresentadas e como que as superaram, isso no ano passado. Desde 2008 a gente sempre fez duas, três formações para estes profissionais. Nós contamos também com os CEFAPROS que fazem essa formação. A gente passa todo o material e dá formação para os professores formadores dos CEFAPROS e os formadores dos CEFAPROS, in loco, nos pólos, oferecem esta formação no “Sala de Professor”24. Então, é uma formação continuada” (Sara).

Zeichner (1993) explica que os professores podem contribuir para uma base codificada de ensino. Para isto eles precisam ser ouvidos e suas experiências 24

―Sala de Professor‖ é o nome de um projeto de formação continuada implantado em todas as Escolas Estaduais do Estado de Mato Grosso, a partir do ano de 2005, que a Superintendência de Formação, por meio dos Centros de Formação e Atualização dos Profissionais da Educação Básica (CEFAPROs) acompanha.

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consideradas. Entretanto, os programas, propostas e orientações curriculares continuam sendo elaborados por pessoas que ―estão fora da sala de aula, para os que estão dentro das salas de aula‖ (p. 17), ―ignorando os conhecimentos, a realidade e as experiências dos professores‖ (p. 17). Neste sentido, o seminário citado pela Prof.ª Sara parece ter levado em consideração as observações de Zeickner ao proporcionar a troca de experiências dos projetos desenvolvidos em que foram apontados as dificuldades e o que os professores fizeram para superá-las. Para este autor, o conceito de professor como prático reflexivo, ―reconhece a riqueza da experiência que reside na prática dos bons professores‖ (p. 17). Todavia, o conceito da ―racionalidade técnica‖ 25 também ficou evidenciado na fala desta professora, quando afirmou que as formações são passadas aos formadores que posteriormente as reproduzem in loco. Um dos professores entrevistados contou que o Estado tem oferecido algumas formações, mas, reconhece que estas ainda não são continuadas nem suficientes para que o docente se sinta preparado para desempenhar o seu trabalho apropriadamente. “Nós temos feito algumas formações, mas não são continuadas ainda, tem acontecido alguma, acontece num ano, no outro não. Hoje temos alguns avanços, mas, que ainda é pouco, que também está em processo, que é ter nos Centros de formação um formador da EJA. Então, temos os CEFAPROS que estão contribuindo, todos os Centros de Formação tem direito a ter um formador para a EJA. Embora o Projeto Sala de Professor precise melhorar, precise ser repensado, voltada para a gente, tem contribuído, ainda é pouco porque um formador, por mais que ele queira, por mais que ele planeje, ele não dá conta da demanda que temos de formação, é muito para ele. Por exemplo, aqui em Cuiabá temos um formador no CEFAPRO e, temos os cinco Centros, as escolas, praticamente 40 escolas de EJA que pertence a esse CEFAPRO com um formador. Então, este formador não dá conta. Ele não dá conta de preparar a formação e executar essa formação com esse grupo e nem de acompanhar. Da mesma forma acontece nos municípios em que o formador tem que dar conta de um pólo, que abrange vários municípios e várias escolas. Esse formador tem que viajar para outros municípios distantes o que dificulta ainda mais o seu trabalho. Mas, mesmo com todas estas dificuldades já é um avanço, é um ganho, mas que precisa ser repensado para melhorar, para atingir mais os objetivos, porque hoje o nosso grande problema pedagógico é a formação” (Sílvio).

25

Segundo Contreras (1994) sustentado pela concepção positivista do conhecimento científico, o modelo da racionalidade técnica na medida em que as relações causais podem se transformar em relações instrumentais, ou ainda, estabelece experiências que permitam comparar quais são os meios que melhor conseguem os fins, faz com que o conhecimento prático seja reduzido a um conhecimento técnico.

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III Seminário Internacional de Gestão Educacional

Em meio a tantas limitações e contradições que permeiam os espaços educativos, Sacristán ((2002) afirma suspeitar ―que a maior parte da investigação sobre a formação dos professores é enviada, parcial, desestruturada e descontextualizada, que não entre na essência do problema‖, (p. 82). Talvez seja por isso que Charlot (2002) afirma que ―os professores, na verdade, estão se formando mais com os outros professores dentro das escolas do que nas aulas das universidades ou dos institutos de formação‖ (p. 90). Em face desta realidade, o desenvolvimento da Proposta Pedagógica dos CEJAs ficou comprometido, porque sem formação específica para se trabalhar com as especificidades da EJA o próprio material parcialmente disponibilizado, quase não tem sido utilizado. Para trabalhar os conteúdos, os professores acabam seguindo o livro didático do ensino fundamental regular, que possui uma linguagem infantilizada para o ensino dos pequenos. A contribuição de mais uma professora, confirma esta situação: “quando o professor tem essa formação específica, ele reconhece o valor do material adequado, quando não tem, considera como um material comum” (Lia). Como explicamos anteriormente, as formações continuadas geralmente ficam a cargo dos professores formadores dos CEFAPROs que recebem capacitações da equipe da SEDUC/MT e assumem o compromisso de serem multiplicadores. Contudo, uma das professoras entrevistadas advertiu que “o multiplicador precisa repassar na ponta. O formador da EJA nos CEFAPROs foi um ganho para nós, uma conquista, mas, tivemos formadores que participaram destas formações e falava contra a EJA, não tinha perfil, não se identificava com a EJA nem tinha vontade de se identificar‖ (Lia).

A mesma professora afirmou que foi uma luta e uma conquista disponibilizar este professor nos CEFAPROs. Porém, “temos que ficar colado com a formação, porque a formação não tem clareza dessa diferenciação da EJA, mas, eles não querem fazer formação, nós tivemos sérios embates, porque eles falam que nós aqui da EJA queremos ser os bam bam bam” (Lia). A professora explicou que a preocupação se justifica porque é preciso capacitar os docentes dos CEJAs, “porque se eles não tiverem clareza da postura da EJA vão estragar tudo. Nós fizemos todo um agendamento, algumas reuniões, mas, isso tudo é muito precário. Estão sendo confiadas muitas atribuições aos CEFAPROs, porque nós sabemos que é uma política que está sendo gestada e uma política não se faz de um dia para o outro. Mas, as especificidades da EJA precisam ser trabalhadas, acompanhadas [...], tem que ver o que esse professor formador está fazendo, julgar mesmo

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III Seminário Internacional de Gestão Educacional a atuação dele, se ele não acreditar na EJA, não tem porque estar lá, mas, as vezes ficam um tempão estragando. Então, o formador do CEFAPRO deve ser um bom aliado nosso, ele deve ser formado por nós do currículo porque as universidades ainda não formam” (Lia).

A professora fez questão de lembrar que seria importantíssimo o trabalho das universidades com a formação inicial e continuada. Afirmou que a própria SEDUC/MT é carente de profissionais com competência para fazer estas formações, por isso, “precisamos dos profissionais das universidades para fazer esta formação. Tenho um amigo que está na Federal de Tocantins que fala que não acredita nesta formação que nos inventamos. Falei, é melhor ter essa formação que inventamos para a Educação Básica do que nada, porque as universidades não oferecem, e aí?” (Lia).

Não basta que as universidades ofereçam formações iniciais e continuadas aos professores. Schön (1992) orienta que as universidades devem incrementar as practicums reflexivas na formação inicial, nos espaços de supervisão e na formação continuada de forma que os próprios espaços de formação inicial e continuada e os espaços escolares em geral, possam se tornar numa practicum reflexiva para os professores. Desse modo, estas instituições devem apoiar o trabalho dos professores que já se iniciaram como reflexivos. Ainda em relação às capacitações ou formações continuadas um dos entrevistados contou que em 2008 a equipe do redimensionamento trabalhou com os professores dos seis Centros pilotos. Então, estes professores tiveram formação específica para atuarem nos CEJAs, ao mesmo tempo em que contribuíram para se chegar à atual estruturação da proposta. Porém, em 2009 estas formações foram reduzidas e em 2010 não aconteceram. Esta situação foi confirmada por mais um dos entrevistados que afirmou que em 2009 aconteceu formação, mas, sabemos que estas foram em números reduzidos. “Olha houve nos dois primeiros anos houve muita formação para os professores. Neste ano de 2010, nós ainda não tivemos a oportunidade de fazer formação. Mas, no ano de 2008, para os seis primeiros Centros houve uma formação de 80 horas, em 2009 houve uma formação no início para coordenadores e diretores, no meio do ano houve outro para coordenadores de área e pedagógico, e no final do ano houve outra para coordenadores de área e professores” (José).

Porém, as contribuições dos entrevistados nos permitem afirmar que geralmente os professores não são chamados para as formações e, quando são, apenas um percentual de cada CEJA pode participar, conforme afirmou o mesmo professor: 222 Grupo de Estudo e Pesquisas em Política Educacional, Rio Claro, 06, 07 e 08 de julho de 2011 Vol. 3 (2011)

III Seminário Internacional de Gestão Educacional “Não vieram todos os professores, nós oferecemos cinco vagas por Centro para os professores que nós iríamos custear passagem, alimentação e hospedagem. No momento, creio eu que não temos condições de ofertar formação para todos os professores. Para trazer todos seria um número muito grande e nem todos tem disponibilidade para virem do interior para Cuiabá” (José).

A SEDUC/MT acordou com os coordenadores pedagógicos e com os professores formadores dos CEFAPROS que estes seriam convidados na condição de multiplicadores, ou seja, sempre que viessem a Cuiabá/MT para receberem formação assumiriam o compromisso de repassar aos professores dos CEJAs. Desse modo, o professor afirmou que “trabalhamos com esta intenção, de que o que for trabalhado aqui seja repassado para os demais professores. Nós trabalhamos com os CEFAPROs também, os formadores da EJA dos CEFAPROs são responsáveis para levar a formação in loco em todos os CEJAs” (José). No entanto, segundo Zeichner (1993) ―os professores também

têm

conhecimentos que embasam suas práticas e práticas que embasam suas teorias e esse conhecimento pode ser sistematizado‖, (p. 262/263), sem desconsiderar o contexto sociopolítico, econômico e cultural que caracteriza cada instituição de ensino, sempre prestando muito atenção nas conseqüências do seu ensino. Neste sentido, o trabalho dos multiplicadores de ―repassar‖ o que lhe foi ―passado‖ pode não levar em consideração os saberes docentes construídos pelos próprios professores. A concepção da racionalidade técnica novamente pode ser observada nas afirmações deste professor. Este modelo de formação impõe pela própria natureza da produção do conhecimento, uma relação de subordinação. Outro dilema vivenciado nas Escolas Estaduais do Estado de Mato Grosso e nos CEJAs é em relação às trocas de professores. A forma de contagem de ponto que a SEDUC utiliza para atribuir aulas aos docentes, nem sempre permite que o professor fique na mesma escola, turma ou modalidade de ensino. Isso para a formação continuada é um problema muito sério. Por exemplo, para alfabetizar o professor precisa ter leituras e compreensões que o processo de alfabetização exige. Quando o professor assume uma turma de alfabetização e começa a participar das formações continuadas voltadas para o professor alfabetizador ele inicia um processo de construção de saberes docentes específico para uma melhor realização do seu trabalho. Porém, na maioria das vezes este professor, no ano seguinte, vai para outro segmento. Isso faz com que o trabalho do formador seja continuamente interrompido e ele não 223 Grupo de Estudo e Pesquisas em Política Educacional, Rio Claro, 06, 07 e 08 de julho de 2011 Vol. 3 (2011)

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consegue avançar nas discussões e aprofundar os conceitos teóricos e metodológicos acerca das especificidades de um segmento ou modalidade educativa. Esta realidade pode ser confirmada com as afirmações de um dos professores entrevistados, para ele, “outro fator que dificulta a formação dos educadores da EJA é a troca de professores [...], o professor não pode escolher a sua área de atuação, se efetivar nesta área, e se qualificar continuadamente para esta especificidade” (José). A versão de que os profissionais dos CEJAs receberam capacitações nos anos de 2008 e 2009 foi reforçada por mais um dos professores entrevistados. Segundo ele “a Secretaria em 2008 e 2009 organizou vários encontros que trouxeram um número grande de profissionais de cada um dos Centros para poder discutir a proposta. Tiveram encontros de gestores, encontros de coordenadores de área, seminários que trouxeram os profissionais, fora as visitas, as idas aos CEJAs que a equipe fazia para apresentar a proposta para a comunidade e para discutir a proposta” (Alex).

As afirmações deste professor nos permitem compreender que há equívocos em relação à concepção de formação continuada. Discussão e apresentação de proposta são ações pedagógicas necessárias, mas, não podem ser consideradas como capacitação e formação continuada de professores. O mesmo professor reforçou que a formação continuada in loco, oferecida a todas as escolas do Estado, por meio do Projeto Sala de Professor promove discussões importantes. “Os estudos feitos na própria unidade escolar promove discussões de qualidade porque todos os docentes trabalham com a mesma modalidade e os estudos são voltados para a EJA. Então, quem não conhece está aprendendo com quem já sabe e todo mundo acaba compartilhando. Na maioria dos Centros desde o zelador da escola até o diretor participa da mesma Sala de Professor. Os CEJAs oferecem a formação continuada por meio do Projeto Sala de Professor para todos. Estive em Confresa estes dias para falar sobre a proposta e estava todo mundo da escola participando, todos foram convocados para ouvir sobre a proposta” (Alex).

Inteirar toda a equipe de profissionais dos CEJAs acerca do seu funcionamento é sem dúvida muito importante para o bom andamento de um trabalho mais coletivo, mais integrado. Porém, como afirmamos anteriormente, quando se trata de formação continuada, há especificidades que precisam ser trabalhadas em separado. A nossa experiência como professora formadora tem nos mostrado que para ser professor formador é preciso ter perfil. Entretanto, esta tarefa tanto nas Escolas 224 Grupo de Estudo e Pesquisas em Política Educacional, Rio Claro, 06, 07 e 08 de julho de 2011 Vol. 3 (2011)

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Estaduais de Mato Grosso, como nos CEJAs sempre fica sob a responsabilidade dos coordenadores pedagógicos, que são acompanhados pelos formadores dos CEFAPROs, que nem sempre consegue desempenhar proficientemente a função de professor formador. Contudo, quando perguntamos para um dos entrevistados se os coordenadores estariam dando conta de realizar as formações continuadas ele nos disse que “sim, que os coordenadores são uma extensão da equipe da EJA” (Alex). A presença de um formador nos CEFAPROS especificamente para cuidar da modalidade da EJA se consolidou no ano de 2009. Porém, nem todos os CEFAPROs possuem formadores da EJA. Segundo um dos entrevistados a equipe da EJA têm colocado estes profissionais junto com eles nas discussões, mas, alguns formadores têm encontrado barreiras em relação aos CEJAs. “Temos dentro dos CEFAPROs o formador da EJA que as vezes por incompreensão de alguns gestores acerca da modalidade, ou até mesmo dos colegas formadores, tem tido dificuldade de implementar alguns trabalhos. Mas, acredito que é no mesmo plano que nós sofremos aqui algumas situações de incompreensões” (Alex).

Então, analisamos que são muitos os embaraços que os CEJAs enfrentam. Como foi afirmado pelos entrevistados, assim como havia formadores dos CEFAPROs que não acreditavam na proposta dos CEJAs, havia também gestores, coordenadores e professores dos CEJAs que não acreditavam nos trabalhos de formação continuada in loco, orientado e acompanhado pelos professores formadores dos CEFAPROs. As reflexões de Zeichner (1993) estão embasadas em suas experiências, no que ele viveu como aluno e como professor. Foram as experiências vivenciadas como professor formador que mostraram que treinamento de diferentes métodos de ensino oferecido aos docentes não dão conta das questões advindas das práticas das escolas. Para ele, apenas por meio de muitas reflexões, as coisas poderão acontecer normalmente na escola. Porém, para que esse trabalho de formação continuada possa ser realizado, é preciso que os professores tenham autonomia para fazerem escolhas, de acordo com a sua concepção de educação.

Considerações Finais

Gómez (1992) afirma que o processo de escolarização na sociedade ocidental, de certa forma, foi democratizado e o acesso a Educação Básica está assegurado a todos os 225 Grupo de Estudo e Pesquisas em Política Educacional, Rio Claro, 06, 07 e 08 de julho de 2011 Vol. 3 (2011)

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cidadãos. No entanto, a grande luta é pela qualidade do ensino que ainda está muito distante dos indicadores desejados. Neste contexto, a maior responsabilidade por esta educação de qualidade, é atribuída ao professor, no interior da sala de aula, sem desconsiderar, é claro, a influência de outros fatores. Na tentativa de resolver o problema do fracasso escolar, são oferecidos inúmeros cursos de formação inicial, capacitação, atualização e qualificação docente. No entanto, não podemos esquecer que somos frutos de uma escola tradicional em que o professor era o detentor de todo o saber e o aluno um mero receptor de conteúdos prédeterminados e apresentados como verdades imutáveis. Certamente por isso, o professor da formação inicial e continuada de professores tem tanta dificuldade para oferecer um ensino, considerado por Gómez (1992) como ―reflexivo‖. Estes formadores trabalham as concepções progressistas de ensino e falam como deve ser a atuação docente nesta perspectiva. Porém, a sua atuação como professor formador, a forma como direciona as formações, quase sempre contraria os fundamentos das atuais teorias do desenvolvimento humano por eles apresentadas. Na racionalidade técnica ou instrumental, primeiro aprendem-se os conteúdos científicos básicos aplicáveis, para depois aprender competências e capacidades de aplicação. A aprendizagem é embasada na teoria comportamentalista em que o aprendiz é excitado a responder a estímulos de ordem técnica e mecânica. Neste sentido, o processo investigativo acerca da formação oferecida aos professores dos CEJAs nos permite afirmar que as poucas ―capacitações‖ oferecidas, em sua maioria apenas aos multiplicadores, caminham nesta direção. Porém, o modelo de racionalidade técnica é incompleto, porque segundo Schön (1992), ignora as competências e as práticas requeridas em situações divergentes. Todavia, nem por isso deve ser totalmente desprezado, pois em muitas situações a única forma de intervenção eficaz consiste na aplicação das teorias e técnicas resultantes da investigação básica e aplicada. O que não se pode, orienta Gómez (1992), é considerar a atividade prática do professor, como uma atividade exclusiva e prioritariamente técnica ―é mais correcto encará-la como uma actividade reflexiva e artística, na qual cabem algumas aplicações concretas de carácter técnico‖ (Idem, p. 100). O professor da EJA, assim como os que atuam em outras modalidades de ensino, atua num ambiente complexo em que os educandos se encontram em diferentes estágios de desenvolvimento cognitivo, vêm de diferentes espaços sociais, com diferentes 226 Grupo de Estudo e Pesquisas em Política Educacional, Rio Claro, 06, 07 e 08 de julho de 2011 Vol. 3 (2011)

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culturas, credos e oportunidades de aprendizagem. Esta realidade requer do educador muita dinâmica no jeito de ensinar e no domínio de diferentes práticas interventivas, para oportunizar a todos, uma aprendizagem significativa e também, para contornar problemas da vida cotidiana. Portanto, as formações continuadas devem se atentar para estes aspectos. Estas questões são analisadas por Schön (1992) como um processo de reflexãona-ação. Neste processo de reflexão-na-ação, a fundamentação teórica do educador é de suma importância, pois toda prática educativa é fundamentada em uma concepção de ensino, mesmo que o educador, muitas vezes, não tenha consciência disso. Assim, a formação continuada é de suma importância para o educador, que, quando não inserido neste processo, corre o risco de fossilizar o seu conhecimento prático, empobrecendo a cada dia a sua reflexão na e sobre a ação. Diante disso, o modelo técnico de formação de professores deveria ser substituído pelo modelo reflexivo e artístico de formação de professores em que a prática adquire o papel central de todo o currículo. Contrariamente às teorias provenientes da racionalidade técnica, que situam a prática no final do currículo de modo a possibilitar uma aplicação dos conhecimentos adquiridos, no modelo reflexivo, a formação inicial e continuada de professores deveria começar pelo estudo e análise da ação de ensinar. Contudo, ―o conhecimento na ação só é pertinente se for flexível e se apoiar na reflexão na e sobre a ação. Trata-se de partir da prática para desencadear uma reflexão séria sobre o conjunto das questões educativas, desde as rotinas às técnicas, passando pelas teorias e pelos valores‖ (Gómez, 1992, p. 112). Desse modo, os processos de formações continuadas de professores devem priorizar situações em que os professores possam submergir-se no mundo complexo da sala de aula desde o primeiro momento, quando ingressa no curso, para que possa compreendê-lo de forma crítica e vital, implicando-se efetiva e cognitivamente em interações da situação real, questionando as suas próprias crenças e explicações, propondo e experimentando alternativas, participando na reconstrução permanente da realidade escolar. Entretanto, não foi isso que as análises desta investigação identificaram, uma vez que as formações oferecidas aos CEJAs, segundo a equipe de redimensionamento da EJA, foram pontuais e parciais, resumindo-se na apresentação da proposta pedagógica e nas formas de ofertas da modalidade existentes nos CEJAs de Mato Grosso. 227 Grupo de Estudo e Pesquisas em Política Educacional, Rio Claro, 06, 07 e 08 de julho de 2011 Vol. 3 (2011)

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Os dados acerca da formação continuada desenvolvida pelos coordenadores pedagógicos dos CEJAs e acompanhada pelos professores formadores dos CEFAPROs a partir do ano de 2009, estão sendo coletados por meio de entrevistas direcionadas aos coordenadores pedagógicos e de área, professores formadores dos CEFAPROs e gestores dos CEJAs. Esperamos apresentar algumas considerações sobre este aspecto em uma próxima oportunidade.

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FORMAÇÃO CONTÍNUA DE PROFESSORES E A REFORMA CURRICULAR MUNICIPAL

Vanda Moreira Machado Lima [email protected] UNESP/ Faculdade de Ciências e Tecnologia- FCT

Financiamento: PROGRAD/ UNESP- Programa Núcleo de Ensino

Resumo: Esta pesquisa diagnosticou as necessidades formativas dos professores, como subsídios para ações de formação contínua, que se constituíram em discussões curriculares na rede municipal de Tupi Paulista, SP. Utilizamos a pesquisa qualitativa e como instrumentos: questionário, análise documental e seminários reflexivos. Constatamos que os cursos de formação contínua devem articular teoria e prática, e considerar a realidade e as necessidades formativas. A partir desse diagnóstico estabelecemos uma parceria entre rede municipal e universidade para o desenvolvimento de formação contínua que visa à reflexão coletiva das necessidades docentes no processo de reforma curricular nos anos iniciais. Palavras-chave: Formação Contínua; Escola Pública e Reforma Curricular. INTRODUÇÃO Este artigo tem como objetivo apresentar o diagnóstico das necessidades formativas dos professores, a partir do qual foram desenvolvidas ações de formação contínua que visam à reflexão coletiva no processo de reforma curricular nos anos iniciais. Iniciamos a pesquisa em 2009, mediante parceria entre rede municipal e universidade, numa perspectiva de valorização da instância municipal. Desenvolver pesquisas em escolas municipais é relevante, principalmente após o processo de municipalização que envolveu o país a partir de 1990. Muitos municípios construíram os seus Sistemas de Ensino, tornando-se responsáveis por todas as funções inerentes a essa nova situação, entre elas a formação contínua dos professores. Na maioria dos municípios brasileiros, esse processo ocorreu de forma atropelada, sem que houvesse um preparo para a incorporação de uma rede de ensino fundamental. Esta pesquisa priorizou a escola pública como ponto de partida e de chegada. Garcia (2001) questiona se o que pesquisamos contribui para melhorar a prática pedagógica e a aprendizagem dos alunos. Gatti (2002), por sua vez, adverte-nos quanto 230 Grupo de Estudo e Pesquisas em Política Educacional, Rio Claro, 06, 07 e 08 de julho de 2011 Vol. 3 (2011)

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às limitadas possibilidades de as pesquisas educacionais chegarem de fato à sala de aula. Contribuir para uma escola pública de melhor qualidade é um compromisso que exige dos pesquisadores diálogo contínuo, crítico e corajoso entre universidade e escola. Esse princípio norteou as ações desta pesquisa, propiciando às escolas parceiras momentos de reflexão coletiva, para que as ideias resultantes do estudo circulem, provoquem discussões e questionamentos, de forma que possam repercutir positivamente na sala de aula das escolas públicas. A escola pública dos anos iniciais é o foco desta pesquisa, pois a compreendemos como fundamento e base de toda a educação escolar. ―Dela é que depende o destino ulterior de toda a cultura de um povo moderno. Se de outras se podem prescindir e a algumas nem sempre se pode atingir, ninguém dela deve ser excluído, sob qualquer pretexto, sendo para todos imprescindível‖ (TEIXEIRA, 1956, p. 25). A abordagem metodológica foi qualitativa, utilizando como instrumentos o questionário, a análise documental e seminários reflexivos, envolvendo 36 professores dos anos iniciais que lecionam nas três unidades escolares da rede municipal de Tupi Paulista, município localizado no interior do Estado de São Paulo, a aproximadamente 680 km da capital, com uma população de 14.262 habitantes. Desenvolvemos dois questionários, um em 2009 e outro, em 2011, ambos aplicados no Horário de Trabalho Pedagógico Coletivo (HTPC). Usamos a análise documental, a partir da legislação, para compreender a especificidade da escola dos anos iniciais e para resgatar a essência dos componentes curriculares da base comum dos anos iniciais. O seminário reflexivo, realizado em encontros mensais, visa promover a aprendizagem ativa, o debate, a estruturação de conceitos, enfim, proporcionar a ―todos os participantes uma reflexão aprofundada de determinado problema, a partir de textos e em equipe‖ (SEVERINO, 2002, p. 63), num clima de colaboração recíproca e trabalho coletivo. Priorizamos no seminário o estudo e a reflexão coletiva do processo de reforma curricular nos anos iniciais. Os resultados parciais desse trabalho serão apresentados a seguir, juntamente com o diagnóstico das necessidades formativas dos professores.

FUNDAMENTAÇÃO TEÓRICA 231 Grupo de Estudo e Pesquisas em Política Educacional, Rio Claro, 06, 07 e 08 de julho de 2011 Vol. 3 (2011)

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A escola surge para substituir a educação que ocorria na família e na Igreja, tornando-se um dos espaços capazes de transformar a sociedade e de promover o exercício da cidadania, que significa ser partícipe da vida social e política do país. Assim a ―escola constitui espaço privilegiado para esse aprendizado, e não apenas para ensinar a ler, a escrever e a contar, habilidades importantes, mas insuficientes para a promoção da cidadania‖ (LIBÂNEO, OLIVEIRA, TOSCHI, 2003, p. 145). A socialização do saber historicamente acumulado e a formação de seres humanos compõem a função social da escola, realizada por meio da prática educativa que ―envolve a presença de sujeitos que ensinam e aprendem ao mesmo tempo, de conteúdos (objetos de conhecimento a ser aprendido), de objetivos, de métodos e de técnicas coerentes com os objetivos desejados‖ (LIBÂNEO, OLIVEIRA, TOSCHI, 2003, p. 168). Faz parte dessa função da escola formar pessoas críticas, que assumam seu lugar na sociedade como sujeitos históricos, capazes de compreender o mundo e escolher o modo de atuar sobre ele, respeitando seus limites, mas criando possibilidades. Para isso, é fundamental assegurar uma formação qualificada aos professores, que os prepare para a participação ativa no projeto político pedagógico da escola e a convivência com os colegas e com os alunos, no compromisso com a emancipação do povo, bem como para o trabalho coletivo e interdisciplinar, imprescindível para romper com a fragmentação das disciplinas específicas. E os programas de formação contínua podem contribuir para esse fim, desde que considerem efetivamente o papel crucial dos professores, suas necessidades formativas e sua realidade educacional. Os cursos de formação de professores, para viabilizar ações significativas, precisam discutir a prática docente a partir da teoria, com base na qual se torna possível conhecer bem o espaço de trabalho docente e ter a ―noção mais exata dos limites e das possibilidades de sua ação transformadora em sala de aula‖ (SILVEIRA, 1995, p. 28). Considerando que é papel do professor proporcionar aos alunos acesso aos conhecimentos historicamente produzidos pela humanidade e sistematizados nas diferentes áreas do saber, o suposto é que tenha domínio dos conteúdos que ensinará. Sua formação acadêmica, portanto, é necessária, na medida em que lhe proporciona os subsídios teóricos para sua prática docente. Além disso, é essencial a busca por métodos

232 Grupo de Estudo e Pesquisas em Política Educacional, Rio Claro, 06, 07 e 08 de julho de 2011 Vol. 3 (2011)

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eficazes de ensino que possibilitem ao aluno participação ativa no processo de ensino e aprendizagem, assim como o desenvolvimento de sua capacidade crítica. A qualidade do trabalho pedagógico também está relacionada às condições de salário, jornada de trabalho e equipamentos didáticos, entre outras, que só serão asseguradas mediante pressão organizada dos docentes. Abster-se de participar das lutas sindicais significa um descompromisso, consciente ou não, com a qualidade do ensino. Então o engajamento sindical é uma necessidade que se impõe a todos os professores que se preocupam com o ensino que ministram (SILVEIRA, 1995). A sala de aula é o espaço específico da atuação política e transformadora do professor, e a aula, como sua atividade essencial, exige do docente que tenha clareza sobre quem é o seu aluno, qual conteúdo pretende ensinar, que metodologia utilizar. E, finalmente, é preciso que seja ―coerente com os princípios e valores que proclama em sala de aula‖ (SILVEIRA, 1995, p.29). Constituir um profissional com todas essas qualidades representa certamente um grande desafio aos cursos de formação inicial e contínua de professores. Visto que a profissão de professor ―exige que se continue a estudar durante toda a vida profissional, até mesmo em âmbitos que, nesta etapa de sua formação, nem sequer suspeitam‖ (IMBERNÓM, 2000, p.65), entendemos a formação contínua como a possibilidade de proporcionar aos professores oportunidades para vivenciar um processo constante do aprender a profissão, não como resultado do acúmulo de informação, nem como a solução para uma formação inicial insuficiente, mas como um momento para repensar as suas práticas e construir novos conhecimentos, imprescindível no desenvolvimento profissional docente. Ser professor significa estar sempre se construindo, num processo que tem início, mas não tem fim. As pesquisas sobre formação contínua têm valorizado as necessidades formativas dos professores como ponto de partida, superando a dicotomia teoria e prática, a falta de articulação das ações formativas com a realidade docente e o caráter pontual e assistemático das ações que ocorriam sob a forma de ―treinamento‖ e ―reciclagem‖. A análise de necessidades formativas é considerada uma etapa do planejamento de programas de formação, na medida em que orienta a formulação de objetivos e fornece informações para a definição de conteúdos e atividades. O êxito em 233 Grupo de Estudo e Pesquisas em Política Educacional, Rio Claro, 06, 07 e 08 de julho de 2011 Vol. 3 (2011)

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reformas educacionais depende da valorização do professor como um parceiro ativo (RODRIGUES e ESTEVES, 1993). Daí considerar-se a escola o espaço privilegiado para a formação contínua. No entanto,

Se exageros houve nas propostas de formação contínua fora da escola, precisamos agora tomar o cuidado de não correr o risco contrário, pois dependendo dos objetivos, o ideal é que a formação contínua ocorra num processo articulado fora e dentro da escola. Por um lado, a prática da formação contínua no cotidiano da escola apresenta muitos pontos positivos, mas por outro, a saída dos educadores para outros locais formadores também pode ser bastante enriquecedora (FUSARI, 1997, p.168).

A formação contínua fora da escola, em congressos regionais, estaduais e nacionais, propicia enriquecimento profissional, pessoal e cultural ao professor. Distanciar-se da escola, da família e da própria cidade constitui possibilidade de conhecer pessoas, autores e obras; trocar experiências e materiais; ampliar contatos; participar de programas culturais como teatro, cinema e shows, visitar museus, livrarias, exposições e locais históricos. (FUSARI, 1997). Priorizar a escola como espaço de formação não significa afirmar que o professor só pode aprender sua profissão na escola.

Mas é imprescindível ter-se clareza hoje de que os professores aprendem muito compartilhando sua profissão, seus problemas, no contexto de trabalho. É no exercício do trabalho que, de fato, o professor produz sua profissionalidade. Esta é hoje a idéiachave do conceito de formação continuada (LIBÂNEO, 2001, p.23). A escola não é apenas o lugar em que os professores ensinam, mas o espaço em que aprendem ―aquilo que é verdadeiramente essencial: aprendem sua profissão‖ (CANÁRIO, 1997, p.1), constroem seus saberes docentes, visto que se defrontam diariamente com situações contraditórias, conflituosas e desafiantes que exigem decisões. Assim ao longo de seu percurso profissional, aprendem, desaprendem, reestruturam o aprendido, fazem descobertas, testam hipóteses, elaboram novas práticas e reconstroem seus saberes. 234 Grupo de Estudo e Pesquisas em Política Educacional, Rio Claro, 06, 07 e 08 de julho de 2011 Vol. 3 (2011)

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Assim, a preocupação com a formação docente, seja a inicial ou a contínua, deve ter como meta prioritária alcançarmos uma escola pública de qualidade, como a concebem Davis e Grosbaum,

Se os alunos, cada um no seu ritmo, conseguem aprender continuamente, sem retrocessos, a escola é sábia e respeitosa. Se suas crianças e jovens são frequentadores assíduos das aulas, seguros de sua capacidade de aprender e interessados em resolver os problemas que os professores lhes impõem, ela está cumprindo o papel de tornálos pessoas autônomas, capazes de aprender pela vida toda. Se os alunos estão sabendo ouvir, discordar, discutir, defender seus valores, respeitar a opinião alheia e chegar a consensos, ela pode se orgulhar de estar formando cidadãos. E mais que tudo, se ela conseguir oferecer uma educação de boa qualidade a todos os seus alunos, independentemente de sua origem social, raça, credo ou aparência, certamente é uma escola de sucesso (2002, p. 77).

Diante dessas considerações, julgamos relevante auxiliar redes municipais n desenvolvimento de ações de formação contínua que considerem as necessidades formativas de seus docentes e busquem proporcionar um ensino de qualidade em suas escolas públicas.

NECESSIDADES FORMATIVAS DOS PROFESSORES Com base no levantamento de dados feito em 2009, envolvendo 36 docentes dos anos iniciais, verificamos que a maioria dos professores pesquisados (94,4%) manifestou interesse por cursos de formação contínua, o que pode demonstrar um compromisso dos docentes com o seu desenvolvimento profissional. Indagados sobre o que um curso de formação contínua deveria contemplar, os docentes apontaram, como conteúdo a ser trabalhado, especialmente a ―prática pedagógica na sala de aula, articulação teoria e prática, debates, reflexões‖ (69,4%) e as ―necessidades do professor e da escola‖ (11,1%). Quanto às modalidades de formação, identificaram a necessidade de os cursos serem ―dinâmicos‖ (2,8%) e ―propiciar troca de experiências‖ (2,8%). Constatamos que 73,7% das respostas dos professores enfatizam que um curso de formação contínua não deveria contemplar apenas teoria ou pouca prática. Essa ideia é reforçada pelo fato de que 7,9% dos apontamentos docentes revelam o 235 Grupo de Estudo e Pesquisas em Política Educacional, Rio Claro, 06, 07 e 08 de julho de 2011 Vol. 3 (2011)

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descontentamento com cursos que tratam de assuntos descontextualizados de sua realidade. Em relação às maiores necessidades formativas, os docentes registraram: a ausência de tempo para estudo (15,1%), a valorização profissional (15,1%), a orientação da equipe pedagógica (15,1%) e a participação em cursos para adquirir novos conhecimentos (11,3%). Dos professores pesquisados, 17% deixaram essa questão em branco. Quando questionados sobre os conteúdos considerados mais difíceis e mais fáceis, várias categorias foram mencionadas, mas priorizamos, nas Tabelas 1 e 2, as três que apresentaram maiores percentuais indicadas para cada disciplina dos anos iniciais. A ausência da disciplina de Educação Física se justifica por haver professor especialista na rede municipal pesquisada.

Tabela 1 - Conteúdos considerados difíceis de serem trabalhados nos anos iniciais Disciplinas

Língua Portuguesa

Matemática

História

Geografia

Ciências

Arte

Categorias

Difícil Freq.

%

Resposta em branco

9

17,6

Interpretação de textos

9

17,6

Nova ortografia

9

17,6

As quatro operações

10

20,0

Tabuada

10

20,0

Resolução de problemas

9

18,0

Resposta em branco

22

61,1

Cronologia

6

16,7

Articular temas atuais e antigos

5

13,8

Resposta em branco

23

63,8

Leitura de mapas

10

27,8

Articular temas atuais e antigos

1

2,8

Resposta em branco

22

59,5

Experiências

10

27,0

Corpo humano

1

2,7

Resposta em branco

18

37,5

236 Grupo de Estudo e Pesquisas em Política Educacional, Rio Claro, 06, 07 e 08 de julho de 2011 Vol. 3 (2011)

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Teatro

9

18,7

Artes visuais

6

12,5

Fonte: Pesquisa (2009)

Tabela 2 - Conteúdos considerados fáceis de serem trabalhados nos anos iniciais Disciplinas

Língua Portuguesa

Matemática

História

Geografia

Ciências

Arte

Categorias

Fácil Freq.

%

Resposta em branco

20

44,4

Leitura

8

17,8

Oralidade

6

13,3

Resposta em branco

20

54,1

Sistema numérico decimal

6

16,2

Sequência numérica

5

13,5

Resposta em branco

23

60,5

História da criança

7

18,4

Pesquisa

3

7,9

Resposta em branco

24

66,7

Município

5

13,9

Vivências

3

8,3

Resposta em branco

22

61,1

Aulas práticas

6

16,7

Meio Ambiente

4

11,1

Resposta em branco

29

72,5

Música

2

5,0

Teatro

2

5,0

Fonte: Pesquisa (2009)

Os dados acima evidenciam a presença significativa de respostas em branco, principalmente na Tabela 2, superando os 50% em todas as disciplinas, com exceção de Língua Portuguesa (44,4%). Essa informação pode revelar que ou os professores não conhecem suas necessidades formativas, ou que não quiseram expressar suas 237 Grupo de Estudo e Pesquisas em Política Educacional, Rio Claro, 06, 07 e 08 de julho de 2011 Vol. 3 (2011)

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dificuldades e facilidades em relação aos conteúdos. Observa-se ainda que alguns conteúdos comparecem, ao mesmo tempo, tanto na lista dos mais difíceis como na dos mais fáceis. Embora inicialmente interpretado como incoerente, esse fato mostra que os professores divergem quando tratam das necessidades formativas. Outra questão a ser destacada é que quando deveriam citar os conteúdos trabalhados nos anos iniciais, houve respostas que discorriam sobre aspectos de metodologia, o que pode ser interpretado como ausência de compreensão dos conceitos citados, ou mesmo a dificuldade dos docentes em apresentar os conteúdos das disciplinas que lecionam. Em relação à Matemática, por exemplo, resolução de problemas não se refere a conteúdo, mas sim a metodologia. Também nas disciplinas de História, Geografia e Ciências foram registradas dificuldades ou facilidades como articular temas atuais e antigos, leitura e interpretação, pesquisa, leitura de mapas, vivências, experiências e aulas práticas, todas elas relacionadas a metodologia. Notamos assim a necessidade de aprofundamento na compreensão dos conteúdos a serem trabalhados em cada uma das disciplinas dos anos iniciais. É preciso considerar que a metodologia é também um aspecto relevante para a formação contínua nessa rede municipal. Acreditamos que, para atuar na docência, o professor precisa ter muitos saberes, porém, o domínio do conhecimento da área específica de atuação é o primeiro e essencial saber. Ser professor dos anos iniciais é uma tarefa complexa e desafiante. Exige-se dentre tantos saberes, o domínio do conhecimento de diferentes áreas, como Língua Portuguesa, Matemática, História, Geografia, Ciências, Arte e Educação Física.

REFORMA CURRICULAR NOS SEMINÁRIOS REFLEXIVOS Considerando o diagnóstico das necessidades formativas dos professores, elaboramos a segunda fase da pesquisa, com o intuito de elaborar ações de formação contínua que priorizassem questões curriculares. Afinal, os dados coletados em 2009 apontavam as dificuldades docentes referentes aos conteúdos dos anos iniciais. Desse modo tornou-se imprescindível compreender que [...] o essencial, a ―espinha dorsal‖ de cada área do conhecimento, é, mais que uma tarefa, um desafio, a ser enfrentado pelos educadores em seu conjunto, pela equipe escolar como um todo. Impossível vencê-lo sem essa visão de 238 Grupo de Estudo e Pesquisas em Política Educacional, Rio Claro, 06, 07 e 08 de julho de 2011 Vol. 3 (2011)

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totalidade, em que parte e todo, geral e específico se interrelacionam, se interdependem e se determinam mutuamente. Isto exige um trabalho articulado, integrado, coordenado, unitário, em que professores das diferentes modalidades, graus, níveis, séries, termos, disciplinas, planejam, avaliem constantemente e reflitam em conjunto sobre o geral e os específicos de seu trabalho, a partir de orientações básicas comuns (SAVIANI, 2009, p. 10).

Priorizando as características apontadas pelos professores pesquisados em 2009, os seminários reflexivos constituíram o programa de formação contínua que enfatizou a reflexão coletiva sobre a reforma curricular, procurando entender e definir ―o quando, o como, o onde e também o quê e o para que as crianças e jovens aprendem nas escolas‖ (COLL, 2006, p. 1). A palavra currículo, ao longo da história da educação e de acordo com cada época, teve vários significados. Entendida às vezes, praticamente como sinônimo de uma lista de conteúdos, foi considerada também como experiência de aprendizagem e finalmente referiu-se a planos de ensino. Nesta pesquisa, compreendemos currículo como o conjunto de experiências de aprendizagem, organizado sob responsabilidade da escola, girando em torno do conhecimento escolar, que representa sua matéria-prima e contribui para a formação cidadã de nossos alunos. O ―currículo define o que ensinar, o para quê ensinar, o como ensinar e as formas de avaliação, em estreita colaboração com a didática‖ (LIBÂNEO, 2001, p. 141), configurando assim a projeção, o desdobramento do projeto pedagógico. Sacristán (1998), por sua vez, define o currículo como a concretização da posição da escola face à cultura produzida pela sociedade. Desse modo, o currículo comunica princípios essenciais de uma proposta educativa, aberta ao exame crítico para que possa ser traduzida em prática. Segundo a Resolução CNE/ CEB nº 7/2010, o currículo é ―constituído pelas experiências escolares que se desdobram em torno do conhecimento, permeadas pelas relações sociais, buscando articular vivências e saberes dos alunos com os conhecimentos historicamente acumulados e contribuindo para construir as identidades dos estudantes‖ (art. 9º). Assim concebido, o currículo é elemento crucial na escola e nos obriga a uma reflexão constante sobre o que estamos ensinando. Na articulação entre o que ensinar e para que ensinar, é preciso compreender que

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[...] os conteúdos não são mágicos: eles dependem de todo um arranjo que envolve metodologia, relação professoraluno, utilização do espaço, condições materiais, enfim, os vários fatores que fazem a mágica funcionar. No entanto, eles também têm poder. Poder de motivar, poder de atrair. Poder de criar o prazer da descoberta, bem como de suscitar o tédio que acompanha o inútil ou o incompreensível. Poder de chacoalhar corações e mentes, de gerar crítica, compreensão, revolta, admiração. O que eu conheço, como eu penso e o que eu sinto me dizem muito sobre o mundo. Esse poder dos conteúdos nos ajuda na busca de atingir nossos objetivos na educação. Não faz muito sentido pensar em conteúdo sem pensar em objetivo, são duas coisas que devem anda juntas (FERNANDES, 2010, p. 11).

Com a parceria entre a rede municipal e a universidade, formamos uma equipe composta por 24 pessoas, das quais 54,2% são professores, priorizando os efetivos, e 45,8% congregam outros profissionais (secretária municipal, diretor de escola, coordenador, psicóloga, psicopedagoga, incluindo a pesquisadora). A partir de 2011, juntaram-se à equipe quatro alunos bolsistas dos cursos de licenciatura, completando assim o grupo que participa dos seminários reflexivos. Acreditamos que só é possível obter êxito em reformas educacionais considerando o professor como um parceiro ativo, levando em conta suas necessidades pessoais e profissionais. A relevância do papel dos professores no sucesso ou no fracasso de uma reforma educativa não pode ser minimizada, visto que deles depende o alcance das mudanças, pois são, em última instância, quem decide se quer mudar ou não (ALMEIDA, 1999). Nesse sentido, defendemos como essencial a presença do professor dos anos iniciais nos seminários reflexivos, em que se propõe discutir a reforma curricular, visto ser ele

[...] o profissional que atua mais próximo do aluno e, ao mesmo tempo, detém os conhecimentos específicos das diversas áreas do saber envolvidas na produção dos conhecimentos presentes no ensino, o que o coloca em posição privilegiada para pensar a seleção dos conteúdos (FERNANDES, 2010, p. 15-16).

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III Seminário Internacional de Gestão Educacional

A participação dos membros da equipe é assegurada pela rede municipal, cujos responsáveis os dispensam das atribuições regulares, conferindo-lhes a tarefa de socializar as atividades com os demais colegas de trabalho. Os motivos que levaram os profissionais a participarem dos seminários reflexivos foram diversos, porém os três mais citados foram: ―ampliar e aprimorar os conhecimentos‖ (33,3%), ―aprender sobre o tema de estudo proposto, currículo‖ (23,1%) e ―participar da elaboração do currículo dos anos iniciais para o município de Tupi Paulista‖ (20,5%). Nos seminários reflexivos de 2010, discutimos o objetivo da escola pública, o papel do professor, do diretor, do coordenador pedagógico e de outros profissionais que atuam nas escolas municipais e refletimos sobre o currículo. A partir de 2011, iniciamos a reflexão sobre a reforma curricular dos anos iniciais para as escolas do município pesquisado. Dos temas desenvolvidos nos seminários reflexivos, abordaremos neste artigo a reflexão sobre o papel da escola pública, cuja especificidade foi inicialmente apresentada pela pesquisadora, juntamente com textos sobre o assunto. Na discussão surgiu a necessidade de rever o objetivo de cada escola expresso no projeto pedagógico. Notou-se que os objetivos das três escolas eram idênticos. Realizamos um levantamento sobre o papel da escola, considerando a opinião de funcionários, pais, alunos e professores, que foi pesquisada mediante um questionário, aplicado e tabulado por cada unidade. O resultado foi apresentado, discutido e modificado no seminário reflexivo, e, posteriormente, nas escolas. Finalmente, esse objetivo retornou ao seminário e decidimos, a partir do material apresentado, elaborar o papel social da escola pública municipal de Tupi Paulista, que ficou assim explicitado: 1. Garantir acesso, permanência e aprendizagem de todos os alunos. 2. Proporcionar um ensino de qualidade, favorecendo o desenvolvimento integral dos alunos, garantindo-lhes o acesso à cultura, aos conhecimentos historicamente acumulados, e a formação de valores, de solidariedade e de tolerância na vida social. 3. Considerar, em suas propostas pedagógicas, princípios éticos (autonomia, responsabilidade, solidariedade, respeito ao bem comum); estéticos (sensibilidade, criatividade, ludicidade, diversidade de manifestações artísticas e culturais) e políticos

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(direitos e deveres de cidadania, criticidade, respeito à ordem democrática), conforme prevê a legislação educacional. 4. Acompanhar os resultados de avaliações externas e internas visando à progressão

no

desenvolvimento

contínuo

dos

envolvidos

no

processo

de

ensino/aprendizagem. 5. Elaborar, discutir e implementar o Projeto Pedagógico, o Regimento Escolar e outras normas que se fizerem necessárias, por meio da reflexão coletiva, com vistas ao consenso e ao bem comum. 6. Estabelecer maior articulação entre escola e família. No início de 2011, aplicamos o segundo questionário a todos os professores dos anos iniciais da rede municipal, sendo 36, com o objetivo de coletar dados para a continuidade da pesquisa. Ao analisarmos as respostas dos professores sobre qual é a função da escola pública dos anos iniciais, os dados surpreenderam, com destaque para, entre outras, as seguintes afirmações: a formação de um cidadão crítico e atuante (20%), construir e oferecer acesso aos conhecimentos acumulados pela humanidade (16,5%), construir autonomia cognitiva e moral, com ênfase nos valores (11,8%), formar pessoas comprometidas com a transformação social e capazes de mudar sua realidade (10,6%), propiciar ensino de qualidade (7,1%), e contribuir para o desenvolvimento intelectual e social do indivíduo (7,1%). Conceitos presentes nas leituras e discutidos nos seminários e nos debates nas escolas foram constatados nas respostas, o que consideramos um avanço, ainda que isso possa significar, de um lado, apenas uma mudança de discurso, ou de outro, a apreensão de uma nova concepção. Questionamos os professores sobre a elaboração de seus planos de ensino, com o objetivo de detectar o que influencia a elaboração do conteúdo trabalhado nos anos iniciais. As respostas apontaram aspectos significativos sobre o que neles é considerado e como são construídos (Tabelas 3 e 4).

Tabela 3 - Elaboração do plano de ensino dos anos iniciais Categorias Consid erando ...

Aluno (interesse, relevância, dificuldades, aprendizagens, necessidades, faixa etária, desenvolvimento) Conhecimento da realidade do aluno, escola e município

TOTAL Freq % 17,8 16 7

7,8

242 Grupo de Estudo e Pesquisas em Política Educacional, Rio Claro, 06, 07 e 08 de julho de 2011 Vol. 3 (2011)

Formato...

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Parâmetros curriculares nacionais (PCN)

7

7,8

Planos anteriores, modificando o que for necessário

6

6,7

Orientação e apoio da coordenação e direção

4

4,4

Resultado de avaliações externas

3

3,3

2

2,2

15

16,7

11

12,2

Período de planejamento

5

5,5

Trocas de experiências com professores

4

4,4

Resposta inadequada

1 90

1,1

Objetivos da escola e da Secretaria Municipal de Educação Reuniões coletivas com todos os professores da rede municipal por ano Pesquisando, estudando e tendo embasamento teórico

Total Fonte: Pesquisa (2011)

99,8

Tabela 4 - Escolha dos conteúdos para os anos iniciais

Formato.

Considerando...

Categorias

Freq

%

Alunos (necessidades, interesse, realidade, estágio de desenvolvimento, nível de interpretação) Plano de ensino adequando as especificidades e andamento da turma Análises das avaliações externas

20

26,7

15

20

9

12

Parâmetros curriculares nacionais (PCN)

7

9,3

Diretrizes curriculares nacionais

5

6,7

Objetivos propostos

4

5,3

Livros didáticos Conteúdos que são significativos, desafiadores e que proporcionem desenvolvimento do aluno Contexto social da escola e do aluno

4

5,3

3

4

2

2,7

Enfatize na leitura, escrita e cálculo

1

1,3

1

1,3

1

1,3

3

3,9

75

99,8

Estudando e refletindo a prática diária Pesquisando Respostas inadequadas

Total

TOTAL

243 Grupo de Estudo e Pesquisas em Política Educacional, Rio Claro, 06, 07 e 08 de julho de 2011 Vol. 3 (2011)

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Fonte: Pesquisa (2011)

Notamos que os professores priorizaram o aluno, destacando que na elaboração dos seus planos e na escolha dos conteúdos ministrados nos anos iniciais consideram o interesse,

dificuldades,

aprendizagens,

necessidades,

realidade,

estágio

de

desenvolvimento, nível de interpretação, faixa etária das crianças, suas especificidades e o andamento da turma. Quanto às oportunidades de elaboração dos planos, foram enfatizadas as reuniões e discussões coletivas envolvendo toda a rede municipal por ano, o que resultou na construção de planos de ensino idênticos nas três escolas, fato confirmado na análise documental. Em relação à escolha dos conteúdos observamos a presença de duas categorias, que a nosso ver, mesmo com percentuais baixos, caracterizam o que os professores valorizam no trabalho dos anos iniciais: conteúdos significativos, desafiadores e que proporcionem desenvolvimento do aluno; e valorização da leitura, da escrita e do cálculo como conteúdos para os anos iniciais. Percebemos que os planos de ensino utilizados em anos anteriores são consultados na elaboração dos novos, mas não são mencionados na escolha dos conteúdos. Já os livros didáticos e as matrizes curriculares nacionais são apontados apenas na seleção dos conteúdos e desconsiderados nas respostas dos professores pesquisados relativas à elaboração dos planos. Outro dado interessante é a presença da categoria ―Orientação e apoio da coordenação e direção‖ para a elaboração dos planos de ensino, ausente, no entanto, na escolha dos conteúdos. Pode-se supor que o primeiro momento - a elaboração do plano de ensino - seja entendido pelos professores como tarefa mais burocrática, enquanto o segundo - a seleção de conteúdos - refira-se à escolha do que será trabalhado diariamente na sala de aula, função mais afeita à função docente. Ao questionarmos os professores sobre o modo como ocorreu a escolha dos livros didáticos em 2010, o trabalho coletivo se destacou. Aproximadamente 40% das respostas evidenciaram que a opção foi decidida coletivamente pelos docentes, por série, envolvendo toda a rede municipal, com discussões e reuniões entre professores e coordenação.

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No final de 2010, realizamos uma avaliação dos seminários reflexivos. Dos dados coletados, as quatro categorias que registraram os aspectos mais significativos do trabalho foram: 

27,3% - momentos de reflexão, estudo, socialização, trocas de

experiências e aprendizado; 

20,5% - referencial teórico desenvolvido;



15,9% - possibilidade de articular textos acadêmicos com a nossa

realidade; 

15,9% - presença, participação e entrosamento dos professores, gestores

e da secretaria municipal de educação. Alguns relatos da equipe reforçam os aspectos mencionados:

As leituras dos textos, com as reflexões no grupo e sempre voltando para o questionamento de como estamos caminhando, ou seja, refletindo o papel do professor. (Sujeito 5). O espaço de estudo proporcionado, o conteúdo abordado, a dinâmica estabelecida para os estudos e a reflexão da própria prática de trabalho. (Sujeito 17). Os aspectos significativos, que já haviam sido apontadas como essenciais em ações de formação contínua nos dados coletados em 2009, evidenciaram o papel relevante da reflexão, da socialização, do estudo teórico e da valorização da realidade do município. A próxima fase da pesquisa visa focalizar os conhecimentos fundamentais de cada uma das disciplinas que compõem a base comum nacional dos anos iniciais do ensino fundamental como Língua Portuguesa, Matemática, Ciências, História, Geografia, Arte e Educação Física.

CONSIDERAÇÕES FINAIS A pesquisa identificou aspectos importantes para o planejamento e desenvolvimento de ações de formação contínua de qualidade como: estabelecer parcerias fortes, tanto com professores, quanto com dirigentes municipais de educação; focar, nos cursos de formação contínua, a articulação entre teoria e prática; construir espaços de estudo, pesquisa e reflexão coletiva; considerar a realidade e as necessidades formativas. 245 Grupo de Estudo e Pesquisas em Política Educacional, Rio Claro, 06, 07 e 08 de julho de 2011 Vol. 3 (2011)

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A reivindicação dos professores por uma formação que enfatize sua prática pode ser entendida como anseio por ―receitas de bolo‖, ou desvalorização da teoria, o que de fato não está de todo ausente. No entanto, a ênfase na prática não significa necessariamente uma desvalorização do embasamento teórico, podendo representar um desejo de que as dificuldades docentes, advindas dos problemas reais que enfrentam na prática profissional no seu espaço de trabalho, sejam discutidas e enfrentadas nas ações formativas. Percebe-se a ânsia do professor em melhorar sua prática para atender seus alunos com qualidade. Essa ideia é reforçada pelo fato de que 7,9% dos apontamentos docentes revelam o descontentamento com cursos que tratam de assuntos descontextualizados de sua realidade. Lecionar nos anos iniciais é uma tarefa complexa e desafiante, visto que os professores trabalham com as diferentes áreas do conhecimento, nem sempre sendo formados para exercer a docência com sucesso. Quando se posicionaram sobre o que acham mais fácil/mais difícil de ensinar em cada área, revelaram o que efetivamente trabalham. Detectamos aí a necessidade de uma reflexão sobre os conteúdos significativos em cada disciplina para uma formação adequada dos alunos, visto que verificamos a presença de aspectos metodológicos numa questão que solicitava a menção a conteúdos. A pesquisa evidenciou que o aluno é a prioridade dos professores quando se referiram, no questionário, à elaboração dos planos de ensino e à seleção dos conteúdos a serem trabalhados nos anos iniciais. Afirmam, para essas tarefas, considerar o interesse, as dificuldades, aprendizagens, necessidades, a faixa etária, o estágio de desenvolvimento e a realidade das crianças. Desse dado emerge um questionamento: até que ponto essas informações traduzem de fato a realidade, ou são apenas uma resposta que o professor acredita ser adequada para a questão? Aprofundaremos essa indagação, posteriormente, quando realizarmos as entrevistas com os docentes. As avaliações externas e os Parâmetros Curriculares Nacionais foram mencionados pelos professores também na questão sobre a elaboração dos planos e a seleção dos conteúdos. Vale uma ressalva nesse aspecto, pois embora as avaliações externas devam ser consideradas, é preciso atenção para que elas não sejam a única referência na escolha do que ensinar nos anos iniciais. Segundo Libâneo (2001, p. 202), ―dependendo das finalidades postas pelos governos em relação à avaliação do sistema

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de ensino, ter-se-á uma escola funcional a serviço dos interesses de agências externas à escola.‖ Na rede municipal pesquisada, chama atenção a presença forte do trabalho coletivo entre as três unidades escolares que atendem alunos dos anos iniciais. Na elaboração dos planos de ensino (16,7%) e na escolha dos livros didáticos (39,5%), notamos a predominância das discussões coletivas envolvendo os professores, divididos por série em que atuam, e sob a orientação dos coordenadores pedagógicos. A realização de reuniões de HTPC, com a participação de todos os professores, é um hábito nessa rede municipal, o que possibilita o envolvimento de todos nas decisões coletivas que afetam as unidades escolares. O processo de reflexão e de autoanálise na elaboração coletiva do currículo dos anos iniciais garante qualidade e identidade ao ensino municipal, exigindo vontade política para viabilizar envolvimento e investimento em ações de formação contínua que proporcionem conhecimento pedagógico e comprometimento dos docentes em relação ao seu trabalho e desenvolvimento profissional. Os sistemas de ensino devem proporcionar, às suas escolas, momentos coletivos de reflexão sobre a proposta curricular, para que os professores discutam o que é próprio de cada série, de cada idade, de cada nível de ensino, visando à construção de uma proposta curricular centrada no interior da escola, responsável por pensar e produzir seu currículo, ―onde o profissional se forma e forma, ensinando e aprendendo a conviver e a aprender‖ (MOREIRA, 2004). Nesta pesquisa, a rede municipal tem garantido espaço para que os professores ―se encontrem, estudem, troquem experiências, discutam sobre suas atividades e ações, reflitam juntos sobre suas práticas, sobre as questões que os afligem‖ [...] (RIBAS e CARVALHO, 1999, p.39), como um modo de contribuir para um ensino de qualidade. A reflexão coletiva favorece um nível cada vez mais elevado de consciência sobre a prática e uma compreensão crítica da atividade docente baseada na teoria. Esta é uma investigação que visa criar conhecimentos que auxiliem a intervenção nas escolas públicas municipais, com um desejo de melhorar a qualidade de ensino em nossa região. Acreditamos ter dado um passo significativo para que esse desejo se torne realidade.

REFERÊNCIAS 247 Grupo de Estudo e Pesquisas em Política Educacional, Rio Claro, 06, 07 e 08 de julho de 2011 Vol. 3 (2011)

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A RESCONSTRUÇÃO DO TRABALHO DOCENTE POR MEIO DA LEI 10639/04 Flávio Santiago [email protected] Universidade Federal de São Carlos

Adriana Duarte de Souza Carvalho [email protected] Universidade Federal de São Carlos

Resumo: O objetivo dessa pesquisa é compreender a Lei 10639/03, que alterou a LDB 9394/96, tornando obrigatório o ensino de História e Cultura Afrobrasileira e Africana no currículo oficial da educação básica, exigindo uma mudança no trabalho docente e demando um novo olhar do profissional da educação sobre a heterogeneidade. Dessa forma, queremos mostrar a atuação do Conselho de Educação que, estabelecendo as Diretrizes Curriculares Nacionais para a Educação das Relações Etnicorracias e para o Ensino de História e Cultura Africana e Afrobrasileira, através da aprovação do parecer CNE 003/04 e sua Resolução 01/04, implementou uma política pública que foi eficaz ao exigir uma nova reflexão sobre o trabalho docente e propondo reformas educacionais. Palavras-chave: trabalho docente, reformas educacionais, Lei 10639/03.

1. Introdução Historicamente, as instituições escolares e algumas pesquisas relativas a estas instituições vêm se ausentando de reflexões sobre a educação e as relações etnicorraciais (CAVALLEIRO, 2005), e, principalmente, das decorrências destas relações no trabalho docente. O silenciamento da escola e dos professores em relação a preconceitos contra determinados grupos etnicorraciais é um dos elementos que contribui para a construção de um olhar único, homogeneizado, muitas vezes voltado a um aspecto sociocultural

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europeu branco26, pregando no sentido etnicorracial uma educação formal de embranquecimento, em contraposição com a sociedade heterogênea que vai à escola. Dessa maneira: O sistema educacional [brasileiro] é usado como aparelhamento ideológico de controle nas estruturas de discriminação cultural. [...] Onde e quando a história da África, o desenvolvimento de sua cultura e civilização, as características, do seu povo, foram ou são ensinadas nas escolas? Quando há alguma referencia ao africano ou negro, é no sentido do afastamento e da alienação da identidade negra. (NASCIMENTO apud SANTOS 2005, p. 23).

Os sistemas educacionais, justamente com os educadores manipulados ideologicamente por essas instituições, se pautam em uma ideologia racial que faz da brancura o ―sujeito universal e essencial‖, até normalizado, associando a uma situação de privilégios que desacredita na presença da austeridade de sua posição e por isso mesmo é incapaz que compreender a experiência do outro (ROSSATO & GESSER, 2001, p. 11). Tornando o padrão branco sinônimo de pureza artística, nobreza estética, majestade moral, sabedoria cientifica. A partir desse aparelho ideológico, muitas ações pedagógicas propostas por educadores, acionam mecanismos de poder que fixam um modelo de sociedade e punem todos aqueles que dele desviam, mutilando a particularidade cultural de diversos segmentos da população negra (ABRAMOWICZ & OLIVEIRA, 2006, p. 47).

2. Objetivos Dessa maneira, queremos apontar como milhares de crianças diariamente vivenciam práticas racistas e discriminatórias nas diversas instituições escolares, as quais contribuem para que diferenças fenotípicas sejam entendidas como pressupostos naturais das desigualdades sociais. Queremos, ao mesmo tempo, apontar como reformas educacionais, principalmente aquelas concernentes ao trabalho docente, podem ser capazes de mudar esse quadro. Para Cavalleiro (2005), o racismo cotidiano não só impede o florescimento do potencial intelectual de milhares de mentes brilhantes nas escolas brasileiras, como 26

Essa forma de educar se organiza tomando como referencial privilegiado as culturas européias, atribuindo-lhe sempre o protagonismo na história geral da humanidade, em detrimento das civilizações não européias, esse pensamento pode ser denominado de Eurocentrismo (Silva, 2005, p. 121)

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também nos embrutece ao longo de nossas vidas, impedindo de sermos seres realmente livres. O racismo e as práticas discriminatórias no interior das instituições escolares tornam elementos de coerção e neutralização de diferentes vozes, entre ela as negras, tendo como objetivo central construir uma única perspectiva de mundo, embebida em uma visão eurocêntrica branca, desvalorizando e ignorando as outras: a indígena, a africana e asiática. Entretanto, esta forma de educar-se pautada na desvalorização do outro e na negação da diferença não é concebida por todos os homens e mulheres do mundo, existindo, paralelamente, uma luta constante para que se desconstruam esses processos de ensino e aprendizagem e (re)construam novas formas de ensinar e aprender no cotidiano escolar. No nosso entendimento, o papel do docente é fundamental para se pensar a revalorização da alteridade e na inclusão da diferença. A luta ao longo do século XX do Movimento Negro pela construção da educação das relações etnicorracias, e por mudanças na educação escolar pode ser tomada como um exemplo de reivindicações para a transformação dessa forma de educar-se. O Movimento Negro apresenta novas propostas para se ensinar e aprender, desarticulando a visão unitária (eurocêntrica) estabelecida dentro dos currículos, e também possibilite a construção do respeito e valorização de todas as raízes culturais que constituem a nação brasileira. Dessa maneira, queremos apontar como as instituições de ensino, juntamente com os professores, podem incorporar esses saberes, de forma a desarticular tais currículos homogêneos.

3. A Lei 10639/2003 Essa luta não se trata de uma discussão partidária ou de modismo educacional, antes, é uma postura ética daqueles que se dispões a trabalhar ao encontro das diferenças existentes no interior das escolas (GOMES, 2006). Além disso, é uma luta por uma legislação que inclua currículos por meio do qual a diversidade seja constante das vozes de nossos educadores não tratando somente de oferecer aprendizagem a negros indígenas ou marginalizados, mas sim a todos aqueles que estiverem dispostos a trocar conhecimento e quebrar desconfianças (BRASIL, 2004).

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As ações e reivindicações do Movimento Negro têm o propósito de promover oportunidades de educação que permita a criação de condições do exercício pleno da cidadania (GONÇALVES & SILVA, 2000). Cidadania que requer o conhecimento, o respeito e a valorização de todas as raízes culturais que constituem a nação (MORAIS; OLIVEIRA; SILVA, 2008, p. 33). Segundo Rodrigues (2006), a luta do Movimento Negro por mudanças nas formas de ensinar e aprender dentro das escolas acontece a partir da compreensão da educação como base sobre a qual se estrutura a forma de pensar e agir de um povo. Esta compreensão foi se construindo a partir dos anos 1930 quando a educação escolar passou a ser compreendida como sinônimo de instrução, que proporcionaria fornecer instrumentos para a promoção das demandas da população negra e contribuir para o combate às desigualdades sociais e raciais (CAVALHEIRO, 2006, p. 17). Ao reivindicar o reconhecimento da cultura, da política e da história da população negra para os sistemas de ensino, o Movimento Negro faz críticas ao currículo escolar e à profissão docente – entendidos como atividades políticas que podem ser vistas em dois sentidos: em uma ação e em um efeito, não se restringindo somente a idéias e abstrações, mas a experiências e práticas concretas construídas por sujeitos (GOMES, 2006, p. 31). Como resultado dessa luta é aprovado a Lei 10639/2003, que alterou a Lei de Diretrizes e Bases da Educação Brasileira (LDB) - 9394/1996 nos artigos 26-A e 79-B, tornando obrigatório o ensino de História e Cultura Afro-brasileira e Africana no currículo oficial da educação básica e incluindo no calendário escolar o dia 20 de novembro como ―Dia Nacional da Consciência Negra‖. O objetivo central dessa lei é corrigir desigualdades educacionais e garantir o reconhecimento do valor da história e da cultura dos diferentes povos que constituem a nação brasileira (MORAIS; OLIVEIRA; SILVA, 2008, p. 33).

Abandonado o

ocultamento da diversidade no Brasil, que tem cultivado entre indígenas, negros e empobrecidos o sentido de não pertencimento à sociedade, ocasionando uma distorção das relações etnicorraciais, pregando uma democracia racial em uma sociedade em que não se vê as diferenças (SILVA, 2007). De fato, a Constituição de 1988, intitulada por muitos de ―Constituição Cidadã‖, vem dizer que a diversidade brasileira e todos aqueles excluídos da sociedade, devem ter acesso a direitos sociais, incluindo, evidentemente, o ensino de História e Cultura 253 Grupo de Estudo e Pesquisas em Política Educacional, Rio Claro, 06, 07 e 08 de julho de 2011 Vol. 3 (2011)

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Afro-brasileira e Africana no currículo oficial da educação, para que a diversidade seja posta nos currículos escolares. 27 A literatura, contudo, apresenta severas críticas à constitucionalização de direitos sociais empreendida pelo Assembléia Constituinte de 1986-88. O problema levantado é que a Constituição de 1988 não prevê condições reais para a concretização plena desses direitos, o que acaba transformando-os em meras promessas não cumpridas pelo Estado ou então em figuras de retórica sem nenhum vigor coercitivo. Os direitos sociais, constitucionalizados em 88, não teriam um caráter jurídico, limitando-se a ser apenas um simples conjunto de decisões políticas, sem nenhum caráter coercitivo. A Constituição não teria determinado uma proteção juridicamente exigível aos direitos sociais, pois esses dependem de mecanismos institucionais que um juiz não pode, pelo tipo de cargo que ocupa, criar. Em outras palavras, a efetivação dos direitos sociais depende de decisões que são políticas, não jurídicas, ou seja, está sujeita à da implementação de políticas públicas. Os direitos sociais, portanto, não seriam de fato autênticos direitos, mas apenas princípios dirigentes da política social e econômica do Estado ou então meros programas de ação para os governantes.

4. Políticas Públicas para Reformas Educacionais do Trabalho Docente A fim de estabelecer o cumprimento da Lei 10.639/2003, o Conselho de Educação se manifesta, estabelecendo as Diretrizes Curriculares Nacionais para a Educação das Relações Etnicorracias e para o Ensino de História e Cultura Africana e Afro-Brasileira, através da aprovação do parecer CNE 003/2004 e sua Resolução 01/2004. Nossa hipótese é, portanto, que as Diretrizes Curriculares Nacionais para a Educação das Relações Etnicorracias e para o Ensino de História e Cultura Africana e Afro-Brasileira, através da aprovação do parecer CNE 003/2004 e sua Resolução

27

Constituição Federal de 1988, Art. 5º: Todos são iguais perante a lei, sem distinção de qualquer natureza, garantindo-se aos brasileiros e aos estrangeiros residentes no País a inviolabilidade do direito à vida, à liberdade, à igualdade, à segurança e à propriedade, nos termos seguintes (...) Art. 6o São direitos sociais a educação, a saúde, o trabalho, a moradia, o lazer, a segurança, a previdência social, a proteção à maternidade e à infância, a assistência aos desamparados, na forma desta Constituição.

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01/2004 são um modelo de política pública implementado para a modificação do processo de exclusão promovido pelo nosso sistema educacional e seus educadores. Como destaca o parecer CNE 003/2004, as Diretrizes Curriculares Nacionais para a Educação das Relações Etnicorracias e para o Ensino de História e Cultura Africana e Afro-Brasileira, trata-se de uma ―política curricular fundada em dimensões históricas, culturais, sociais e antropológicas oriundas da realidade brasileira, e busca combater o racismo e as discriminações que atingem particularmente os negros‖ (BRASIL, 2004, p. 10). Educar-se nas relações etnicorraciais é promover a reeducação das relações entre negros e não negros, emergindo as dores e medos que têm sido geradas pelos processos de opressão existentes na sociedade (BRASIL, 2004, p.14), proporcionando uma formação de cidadãos e cidadãs empenhados em promover mudanças sociais e que lutem por igualdade no exercício dos direitos próprios a diferentes pertencimentos etnicorraciais (SILVA, 2007, p. 490). Esse papel deve ser cumprido através de nosso professores, através da Diretrizes supramencionada. Compreendendo o conceito raça no termo educação das relações etnicorraciais com: (...) uma construção social forjada nas tensas relações entre brancos e negros, muitas vezes simuladas como harmoniosas, nada tendo a ver com o conceito biológico de raça cunhado no século XVIII e hoje sobejamente superado. Cabe esclarecer que o termo raça é utilizado com freqüência nas relações sociais brasileiras, para informar como determinadas características físicas, como cor de pele, tipo de cabelo, entre outras, influenciam, interferem e até mesmo determinam o destino e o lugar social dos sujeitos no interior da sociedade brasileira (BRASIL, 2004, p. 14).

E o conceito etnia: (...) serve para marcar que essas relações tensas devidas a diferenças na cor da pele e traços fisionômicos o são também devido à raiz cultural plantada na ancestralidade africana, que difere em visão de mundo, valores e princípios das de origem indígena, européia e asiática (BRASIL, 2004, p. 14).

A educação das relações etnicorraciais se fundamenta como uma política de reconhecimento que ―requer adoções de políticas educacionais que valorizem a diversidade, a fim de superar as desigualdades etnicorracias presentes na sociedade‖ (BRASIL, 2004, p. 11), bem como de reparação para a educação dos negros, ―buscando 255 Grupo de Estudo e Pesquisas em Política Educacional, Rio Claro, 06, 07 e 08 de julho de 2011 Vol. 3 (2011)

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a valorização do patrimônio histórico-cultural afro-brasileiro, de aquisição das competências e dos conhecimentos tidos como indispensáveis para continuidade nos estudos‖ (BRASIL, 2004, p. 11). Isso implica, necessariamente em reformas educacionais e no reposicionamento de nossos educadores. O conjunto de ações voltadas para o reconhecimento e reparação pode ser entendido como uma política de ações afirmativas que visa corrigir desigualdades raciais e sociais, ―orientada para oferecer tratamento diferenciado com vista a corrigir desvantagens e marginalizações criadas e mantidas por estruturas sociais excludentes e discriminatórias‖ (BRASIL, 2004, p. 12). Como se vê, é complexa, mas não pode ser tomada como impossível a tarefa de educar para/na educação das relações etnicorraciais, construírem-na é proporcionar a ―edificação‖ de um olhar para além do único, é possibilitar a abertura para diferentes encontros ao movimento do pensamento. A escola a partir dessa perspectiva deixa de sancionar o correto o hegemônico o transcendental para possibilitar linhas de fungas para diferentes percepções de mundo e construções dos conhecimentos (PELBART, 2005). Isto possibilita emergir o pensamento africano não a partir de estereótipos construídos socialmente, mas sim de ―maneira própria dos negros se porem no mundo ao receber o mundo em si‖ (SILVA, 2005, p. 06). E isso, depende, necessariamente, dos nossos educadores e do olhar dos mesmos para a alteridade africana. Trata-se de trazer procedimentos e pensamentos que orientem a produção de conhecimento, oriundos de valores e princípios próprios da matriz africana, apresentando não somente uma mentalidade ―europeu-branco‖ para entender os fenômenos, mas também rompendo com a compreensão de homogeneidade do conhecimento (SILVA, 2005, p. 33). Neste sentido, a parte da história do Brasil forçada ao esquecimento nas senzalas, em quilombos, terreiros e memórias individuais de negros ganha força e se estabelecem como parte do currículo oficial das redes de ensino, produzindo percepções múltiplas de fatos antes concebidos a partir de uma perspectiva homogênea. A transformação dos pensamentos negros em conteúdos programáticos do currículo e sua transmissão por nossos professores promovem a remoção de um passado construído sobre práticas de dominação e de exclusão, e cria-se força de emancipação,

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entendida como um instrumento para a construção de uma identidade e de um pertencimento etnicorracial positivo (BARBOSA & SILVA, 1997). A escola se torna assim um espaço privilegiado para o encontro com as diferenças, produzindo não um padrão único de aluno, de currículo e de práticas pedagógicas, tornando as diferenças um triunfo a ser explorado por sua riqueza e possibilidade de troca de conhecimento (GOMES, 2003, p 117). Impelindo ações positivas e democráticas entre diferentes grupos etnicorraciais, não se tratando de reafirmar o mito da democracia racial, mas sim construir espaços para que possibilite a construção de um olhar para a diferença, em que o reconhecimento da inestimável contribuição dos negros à nação brasileira seja tangível, desarticulando e desconstruindo o racismo que vem causando ao longo de cinco séculos prejuízos inestimáveis (SILVA, 2008). Enegrecer a educação com pensamento de base teórica africana é possibilitar garantir o respeito e valorização de um povo cuja ancestralidade foi negada e conduzida a um status de (sub)cultura por um sistema de poder ligadas a exploração e exclusão (SHUJJA & SILVA, 2005). Não se trata de reduzir somente o ensino a questões estruturais da sociedade ou manifestações culturais pontuais, tais como: canção, comida típicas, indumentárias, mas sim de incorporar no ensino o conjunto de valores culturais do mundo africano, tal como se exprime na vida, nas instituições e nas obras dos negros. Neste sentido, como apresenta Silva (2007, p.501.), é esperado que o jeito de ser, viver, pensar de diferentes grupos etnicorraciais sejam respeitados e incluídos nas atividades de ensino, não significando que se descuide ou fragilize a aprendizagem de conhecimentos específicos das ciências, objeto central em todos os níveis de ensino. Ao contrário, a meta é completar tais aprendizagens, promovendo juntamente com o estudo das contribuições européia para a humanidade, as africanas, indígenas, entre outras. Como apresentado no Parecer CNE/CP 003/2004(p. 20-1), a educação das relações etnicorracial deve promover oportunidades em que ponham em comunicação diferentes sistemas simbólicos e estruturas conceituais, buscando formas de convivência respeitosa, construindo um projeto de sociedade em que todos sejam encorajados a expor, defender sua especificidade etnicorracial e a buscar garantias para que ninguém deixe de fazê-lo.

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Para construção deste ensino o Parecer CNE/CP 003/2004, propõe princípios que as instituições de ensino e os professores devem usar como referência ao planejar e conduzir ações para a educação das relações etnicorraciais: O primeiro princípio refere a ―consciência política e histórica da diversidade‖, entendida como condutores para uma

(...) igualdade básica de pessoa humana como sujeito de direitos; à compreensão de que a sociedade é formada por pessoas que pertencem grupos etnicorraciais distintos, que possuem cultura e história próprias, igualmente valorizadas e que em conjunto constroem, na nação brasileira, sua história; ao conhecimento e à (...) valorização da história dos povos africanos e da cultura afro-brasileira na construção histórica e cultural brasileira; à superação da indiferença, injustiça e desqualificação com que os negros, os povos indígenas e também as classes populares às quais os negros, no geral pertencem, são comumente tratados [...] (BRASIL, 2004, p. 18-19). O segundo princípio constitui o ―fortalecimento de identidades e de direitos‖, nos orienta para

(...) o desencadeamento de processo de afirmação de identidades, de historicidade negada ou distorcida; o rompimento com imagens negativas forjadas por diferentes meios de comunicação, contra os negros e os povos indígenas; os esclarecimentos a respeito de equívocos quanto a uma identidade humana universal; o combate à privação e violação de direitos; a ampliação do acesso a informações sobre a diversidade da nação brasileira e sobre a recriação das identidades, provocada por relações etnicorraciais; as excelentes condições de formação e de instrução que precisam ser oferecidas, nos diferentes níveis e modalidades de ensino, em todos os estabelecimentos, inclusive os localizados nas chamadas periferias urbanas e nas zonas rurais (BRASIL, 2004, p. 19). O terceiro princípio é ―ação educativa de combate ao racismo e a discriminação‖ compreendido como (...) a conexão dos objetivos, estratégias de ensino e atividades com a experiência de vida dos alunos e professores, valorizando aprendizagens vinculadas às suas relações com pessoas negras, brancas, mestiças, assim como as vinculadas às relações entre negros, indígenas e brancas no conjunto da sociedade; a crítica 258 Grupo de Estudo e Pesquisas em Política Educacional, Rio Claro, 06, 07 e 08 de julho de 2011 Vol. 3 (2011)

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pelos coordenadores pedagógicos, orientadores educacionais, professores, das representações dos negros e de outras minorias nos textos, materiais didáticos, bem como providências para corrigi-las; condições para professores e alunos pensarem, decidirem, agirem, assumindo responsabilidade por relações etnicorraciais positivas, enfrentando e superando discordâncias, conflitos, contestações, valorizando os contrastes das diferenças; valorização da oralidade, da corporeidade e da arte, por exemplo, como a dança, marcas da cultura de raiz africana, ao lado da escrita e da leitura; educação patrimonial, aprendizado a partir do patrimônio cultural afro-brasileiro, o cuidado para que se dê um sentido construtivo à participação dos diferentes grupos sociais, etnicorraciais na construção da nação brasileira, aos elos culturais e históricos entre diferentes grupos etnicorraciais, às alianças sociais; participação de grupos do Movimento Negro, e de grupos culturais negros, bem como da comunidade em que se insere a escola, sob a coordenação dos professores, na elaboração de projetos político-pedagógicos que contemplem a diversidade etnicorracial (BRASIL, 2004, p. 1920). A finalidade destes princípios é que os descendentes de africanos, assim como todos os cidadãos brasileiros, tenham valorizado a sua identidade etnicorracial, e construam através da educação para/das relações etnicorracias um olhar pautado na diferença.

5. Conclusão A construção do olhar para diferença não deve ser estabelecida dentro da lógica da tolerância neoliberal, mas sim ser produzido através da recusa da homogeneização, que ocorre nos dispositivo que montamos quando nos subordinamos a um modelo único, ou a uma dimensão predominante (PELBART, 1993, p. 23). Deve também ser construída a partir de uma nova tomada de posição de nossos professores e sistemas educacionais diante daquilo que é diverso, que é, antropologicamente falando, o outro. Como destaca Gusmão (1999, p. 50), a escola como um espaço de transformação ao encontro das diferenças etnicorraciais deve questionar a validade e a legitimidade do modelo que é tomado como único no interior da cultura da qual somos herdeiro. É importante destacar, como ressalta Silva (2009, p. 45) que não se tratar de leviana rejeição a pensamentos alheios ao mundo africano, tampouco de mera mudança de pontos de vista ou de referências teóricas usualmente empregadas, mas de premência 259 Grupo de Estudo e Pesquisas em Política Educacional, Rio Claro, 06, 07 e 08 de julho de 2011 Vol. 3 (2011)

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por nova mentalidade, imprescindível para que se compreendam ou expliquem processos educativos vivenciados pelos negros. O propósito é romper com significados produzidos em perspectivas eurocêntricas e que têm sido adversos a africanos e afrodescendentes, por instigá-los a se submeter a interesses e pensamentos que se pretendem universais. Desta forma, para se obtiver êxito, a escola e seus professores não podem improvisar, temos que desfazer de mentalidades racistas, superando o etnocentrismo europeu, reestruturando relações etnicorraciais e sociais (BRASIL, 2004, p.15). A educação para/das relações etnicorraciais rompe com a idéia de sistema de ensino pautado no único, contudo, ―não pode ficar reduzida a palavras e a raciocínios desvinculados da experiência de ser inferiorizados vividos pelos negros, tampouco das baixas classificações que lhe são atribuídas nas escalas de desigualdade social, econômicas educativas e política (BRASIL, 2004, p.15)‖. É necessário também, que os professores/as tenham um comprometimento político a favor da afirmação das diferenças, desconstruindo em sua prática cotidiana de concepções homogeneizadas como, por exemplo, o padrão considerado ideal de homem: com determinadas características associadas a uma estética eurocêntrica super valorizada em detrimento de quaisquer estéticas que não se assemelham a esta. É importante destacar que não se trata de acrescentar conteúdos em datas específicas criando ―momentos da diversidade‖, mas de trabalhar os processos educativos a partir da perspectiva da diferença, mostrando que existem diferentes visões de mundo, e distintas realidades socioculturais e históricas. Educar deve se tornar um ato político (Freire, 1978), em que descriminações, pensamentos racistas, e quaisquer formas de desumanização dos sujeitos envolvidos não sejam percebidas como algo natural, corriqueiro, passageiro. O ensino teria por finalidade a ampliação das percepções de mundo, de sujeito e de realidades socioculturais construindo um ambiente em que o outro não seria mais um elemento, mas sim peça fundamental para construção da ação educativa. Educar-se nas/para as relações etnicorraciais é propiciar a criação de espaço de fortalecimento do pertencimento etnicorracial de negros e também dos não-negros, dando subsídios para lutar contra desigualdades e opressões, promovendo o reconhecimento da história e cultura de todos os povos. E isso só poderá ser realizado

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através de mudanças estruturais de nossos sistemas escolares e de nossos educadores. E através de políticas públicas que visem criar mecanismos de efetivação dessas práticas.

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PROFESSORAS DO ENSINO FUNDAMENTAL I: DESCORTINANDO OS BASTIDORES DA FORMAÇÃO INICIAL RESSALTANDO O PROTAGONISMO DA PARTICIPAÇÃO EM PROJETOS DE PESQUISA E OS REFLEXOS DESSE PROCESSO NO CENÁRIO ESCOLAR Márcia Regina Onofre [email protected] Universidade Federal de São Carlos

Resumo: O objetivo do estudo foi o de investigar o impacto das experiências de iniciação à pesquisa na formação inicial e no desempenho profissional de docentes do Ensino Fundamental I da SME de Araraquara. Para a obtenção dos dados foi realizada, uma pesquisa preliminar - questionários distribuídos a 259 profissionais atuantes. Num segundo momento foram realizadas entrevistas com 16 professoras. Os resultados obtidos indicam que a formação inicial constitui o espaço de aprendizado fundamental para a construção dos saberes docentes e que as atividades de iniciação à pesquisa são indispensáveis para um bom desempenho profissional. Palavras-chave: professoras do ensino fundamental I, formação inicial, projetos de pesquisa

Ao analisarmos a história da educação brasileira verificamos que o Estado tem permanentemente procurado formas de garantir o controle sobre o sistema de ensino, elaborando, para isso, programas educacionais e políticas curriculares em prol de uma sempre valorizada inovação pedagógica. Nos últimos anos os apelos por uma nova ―política de equidade e de qualidade‖ incluíram desde a elaboração e efetivação da nova lei de diretrizes e bases da educação (Lei Federal no. 9394/96), passando pela ênfase na necessidade de materiais de apoio e de subsídios ao trabalho dos professores (Parâmetros Curriculares Nacionais - PCNs) e pela realização de Programas envolvendo formação continuada de professores (PEC, PEC Formação Universitária e Pedagogia Cidadã no Estado de São Paulo e outros similares em outros Estados), campanhas de forte apelo à comunidade e ONGs acompanhadas de propagandas e comerciais (―Amigos da escola‖, por exemplo), até políticas públicas de avaliação do ensino preconizando a valorização do magistério 263 Grupo de Estudo e Pesquisas em Política Educacional, Rio Claro, 06, 07 e 08 de julho de 2011 Vol. 3 (2011)

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(por exemplo: Bolsa Escola, FUNDEF, FUNDEB, SARESP, ENEM, ENADE), além de programas de incentivo à Municipalização do Ensino. A história da educação no Brasil mostra, com clareza, a definição e o controle do Estado sobre o que as escolas devem ensinar, revelando as recorrentes tentativas do Estado de manter o controle ideológico sobre a sociedade e implementar um processo de homogeneização cultural mediante a ação da escola. Tais idéias encontram respaldo seja em autores como Popkewitz (2001) – ancorados na pesquisa científica em educação, seja em autores como Delors (1999) – respaldados em relatórios encomendados por organismos internacionais como a UNESCO, para a orientação das políticas públicas para a Educação, especialmente nos chamados ―países em desenvolvimento‖. Ou seja, em um ou outro caso, a idéia de ―escola salvadora‖ é tão atual como o foi nos séculos XVIII e XIX. Segundo Popkewitz (2001), o discurso missionário e redentor do sistema escolar visto como ―salvador‖ e ―libertador‖ dos maus hábitos e atitudes incorretas das crianças, através de uma concepção individualizante de educação, acaba por relacionar e reduzir os sucessos e os fracassos das crianças a características de personalidade, motivação e auto-estima. Assim vão se naturalizando, por exemplo, concepções ―classificadoras‖ de crianças: ―pobres‖, ―que não aprendem‖, ―desmotivadas‖, ―sem condição cultural e social‖, ―de famílias desestruturadas‖, comumente encontrados em discursos de professores das diferentes etapas da escolaridade. Embora com objetivos e perspectivas teórica e ideológica diferentes, também Delors (1999), em Relatório elaborado para a UNESCO, em função de sua atuação na chamada ―Comissão Internacional sobre Educação para o século XXI‖, apresenta características muito parecidas da realidade escolar atual, apontando os mesmos problemas escolares e de atuação dos professores, e propondo possíveis ações para a superação desses desafios tomados como próprios da sociedade mundial globalizada. É possível perceber nessa afirmação que o discurso educacional mundial vê o professor como o ―redentor‖, capaz de sanar todos os males da sociedade. Nesse sentido, o docente é visto como transformador social, agente de mudança, responsável pela qualidade do ensino e, conseqüentemente, pelo sucesso do aluno no mercado de trabalho. Ou seja, tal concepção do papel do professor desconsidera a importância e a

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reestruturação de um investimento econômico e social decente no país e enfatiza a ideologia de uma escola ―salvadora‖ e ―redentora‖. Nesse sentido, o Relatório Delors destaca que além das competências pedagógicas, exigir-se-á do professor a formação para a pesquisa. Para tanto, o Relatório projeta a formação superior para todos os profissionais (contraditoriamente, não necessariamente universitária), defendendo uma formação inicial com vínculo entre a universidade e os institutos de formação. O Relatório Delors aponta a importância de uma formação de qualidade como a grande responsável pela diminuição do fracasso escolar. Novamente não são postos em destaque o papel do Estado e as conseqüências de políticas econômicas e sociais que dêem conta da superação da miséria e da situação precária em que vive mais da metade da população dos países em desenvolvimento. Esses são exemplos de dois tipos de discursos (de um lado, o discurso da pesquisa científica em educação e, de outro lado, o discurso estatal e de seus documentos) que servem de legitimação ideológica para a organização da sociedade e de suporte teórico para o convencimento da necessidade da mudança estrutural do Estado. Um exemplo ou expressão dessas relações de poder no cenário educacional brasileiro pode ser encontrado na forma como foram se configurando, nos últimos anos, as políticas de formação de professores. É o que mostra, por exemplo, o estudo de Silva (2001), que analisa a partir dos anos 1990, a reestruturação das políticas públicas para a formação de professores, em decorrência das mudanças na economia global, passaram, mais do que nunca, a ser objeto de profundos e intensos embates políticos e de confrontos de projetos societários. De acordo com Silva (2001), nos anos 1990, as políticas de formação de professores ganharam força devido às mudanças no mundo do trabalho em nível mundial, gerando novas relações de produção e de poder. A posição dos grupos hegemônicos em relação às transformações, em confronto com os demais segmentos da sociedade, norteou a construção das políticas públicas e, especificamente, a de formação de professores. Ou seja, um conjunto de ações, sob a orientação dos organismos internacionais (FMI, BM, BIRD), compôs o repertório das políticas educacionais que passaram a reger o sistema de ensino, impostas pelas exigências da ―nova ordem mundial‖. 265 Grupo de Estudo e Pesquisas em Política Educacional, Rio Claro, 06, 07 e 08 de julho de 2011 Vol. 3 (2011)

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Frente às aceleradas mudanças, as políticas públicas para a formação de professores, baseadas na lógica do mercado, passaram a fazer parte de um conjunto de políticas que objetivou vincular as instituições sociais, entre elas a escola, às novas configurações do capitalismo. Seguindo nessa direção, o autor ainda aponta para o fato de as políticas de formação de professores terem sido inseridas num conjunto de ações do Estado para adequar o exercício docente à nova configuração da sociedade do século XXI. Como se pode observar, as políticas públicas de formação de professores, ou seja, as configurações dos próprios currículos de formação docente são engendradas não para resolver questões que afetam a estrutura do sistema formativo, mas para assumir o controle do processo de acordo com princípios dos grupos hegemônicos que comandam o Estado, em confronto constante com os movimentos sociais e que se expressam, por exemplo, nas determinações do Banco Mundial para os países considerados ―em desenvolvimento‖, como a América Latina e Caribe e os países do Continente Africano. Em 1996, segundo Shiroma, Moraes e Evangelista (2002), no Brasil, as propostas derivadas dessa concepção dão o tom da Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional- LDBEN – 9394/96. As aspirações alimentadas em quase duas décadas foram autoritariamente substituídas pelo projeto do então Senador Darcy Ribeiro. De acordo com Scheibe (2002), a 9394/96 é contraditória, pois a mesma Lei que determinou a formação em nível superior de todos os professores, contraditoriamente criou os Institutos Superiores como os locais de preferência para essa formação. Para a autora, o modelo dos Institutos Superiores de Educação (ISEs) coloca, também, uma clara intenção de desresponsabilizar as instituições universitárias pela formação dos professores. Considerando que a formação inicial é momento-chave da construção de uma socialização e de uma identidade profissional, essa determinação é desqualificadora para a profissionalização docente no país. Assim, esse modelo de formação acarreta prejuízos à formação docente ao privá-la das atividades de pesquisa que devem caracterizar o ensino superior. Tudo indicava, desde o princípio, que as instituições que desejassem criar Cursos Normais Superiores não seriam obrigadas a desenvolverem a pesquisa. Mais do que isso, é importante também assinalar que esse modelo de formação tem como tônica a melhoria dos indicadores educacionais em relação à titulação do 266 Grupo de Estudo e Pesquisas em Política Educacional, Rio Claro, 06, 07 e 08 de julho de 2011 Vol. 3 (2011)

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quadro docente, sem uma implicação efetiva na melhoria da qualidade de formação e das condições de trabalho futuras dos professores. A década de 1990 foi marcada por fóruns, debates e encontros regionais, nacionais e internacionais que discutiram a instauração de novos referenciais e modelos de formação, com ênfase, como já reiterado por Torres (1998), na formação continuada e em serviço. Questões como ―autonomia, reflexão, identidade profissional, investigação, competências‖, deixam de ser responsabilidade das instituições de formação e os profissionais da educação passam a ser considerados protagonistas de seu próprio crescimento e desenvolvimento profissional docente. Fica, pois, claramente delineada a contradição: de um lado, os órgãos governamentais dão ênfase à responsabilidade do trabalho dos professores vistos como ―agentes de mudança social‖ e, de outro lado, professores e profissionais ligados à educação vão cada vez mais se tornando inseguros com as novas tendências, ansiosos por atender às reais necessidades da escola, mas com a formação profissional cada vez mais ―aligeirada‖. Outro exemplo marcante de descrição desse processo de transformações na concepção e configuração da formação dos professores no Brasil, nas duas últimas décadas, pode ser encontrado em Torres (1998). Segundo a autora – em estudo sobre as tendências da formação docente nos anos 1990, no qual faz uma análise crítica da influência dos organismos internacionais sobre as políticas públicas educacionais dos ―países em desenvolvimento‖ – em vez de políticas que reconheçam a necessidade de um sistema unificado de formação docente, envolvendo a formação inicial e continuada, e de uma renovação profunda em seus conteúdos e metodologias, propõe-se o embate formação inicial versus capacitação em serviço como dois momentos distintos e desvinculados de formação. De acordo com Torres (1998), os técnicos do Banco Mundial, baseando-se em um conjunto de estudos especialmente ―encomendados‖ para esse fim, asseguram que a capacitação em serviço ―rende mais com menos dinheiro‖. Nessa mesma direção, um estudo por mim realizado em pesquisa de Mestrado (ONOFRE, 2000), analisando o Programa de Educação Continuada da Secretaria Estadual de Educação do Estado de São Paulo (PEC/SEE/SP) desenvolvido nos anos de 1996 e 1997, revela aspectos importantes desse processo, levantados por meio dos olhares dos diferentes profissionais participantes do Programa. A pesquisa realizada 267 Grupo de Estudo e Pesquisas em Política Educacional, Rio Claro, 06, 07 e 08 de julho de 2011 Vol. 3 (2011)

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aponta esse Programa de formação continuada dos professores do ensino público estadual paulista como uma iniciativa política, em muitos aspectos inovadora (tempo de duração de 2 anos, espaço de ―maturação de idéias e práticas‖ entre os encontros). No entanto, a pesquisa constata que o Programa representou apenas um ensaio nesse campo de ação. Sua realização consistiu muito mais numa circunstância gerada pela possibilidade de financiamento do Banco Mundial (30 milhões de dólares gastos em dois anos de funcionamento do programa) do que a expressão de uma política de formação contínua dos professores pelo Governo do Estado de São Paulo. Finalmente, os resultados do estudo revelam, especialmente, que a formação continuada não pode tornar-se solução para as lacunas e mazelas dos cursos iniciais de formação. Pelo contrário, a necessidade de investimento na melhoria específica dos cursos de formação inicial é prioritária e constitui condição fundamental para a concretização dos objetivos básicos das ações de formação continuada que visam ao desenvolvimento profissional dos educadores. O quadro acima exposto resultou em hipóteses que foram investigadas em minha Tese de Doutorado (ONOFRE, 2006) confirmando a importância do investimento na formação inicial dos professores. Realizada entre os anos de 2004 e 2006, o estudo teve por objetivo traçar o perfil dos profissionais ligados aos anos iniciais do ensino fundamental da Secretaria Municipal de Educação de Araraquara - SP (Professores,

Professores

Coordenadores,

Diretores,

Assistentes

Educacionais

Pedagógicos) e de suas trajetórias profissionais, buscando pesquisar o impacto específico das experiências de iniciação à pesquisa no processo de formação inicial e no desempenho profissional de professores/as do Ensino Fundamental I da Secretaria Municipal de Educação de Araraquara. Para a obtenção dos dados foi realizada, em 2004, uma pesquisa preliminar, por meio de questionários distribuídos a 259 profissionais atuantes como docentes e como especialistas nas equipes técnicas das escolas de Ensino Fundamental I da Secretaria Municipal de Araraquara, com o objetivo de traçar o perfil pessoal, bem como caracterizar a trajetória de formação e a carreira desses profissionais. Desse total (259), foram devolvidos 142 questionários. A pesquisa revelou que desses 142 profissionais respondentes, 32 ou 25,60% revelavam trajetória profissional diferenciada, ocupando posições de destaque na Secretaria: 16 atuando nas funções de coordenadores, diretores e assistentes educacionais pedagógicos e 16 atuando em salas de aula como 268 Grupo de Estudo e Pesquisas em Política Educacional, Rio Claro, 06, 07 e 08 de julho de 2011 Vol. 3 (2011)

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professoras da rede de ensino municipal. Com o apoio teórico de autores como Pérez Gómez, Antonio Contreras e Henry Giroux e focalizando, especificamente, as16 professoras que permaneciam nas salas de aula exercendo funções docentes foram realizadas entrevistas intensivas, buscando analisar, nos depoimentos das professoras, a relação que percebiam entre as experiências de iniciação à pesquisa vividas na formação inicial e o exercício da sua profissão. Os dados obtidos revelaram um perfil dos profissionais respondentes majoritariamente composto por mulheres, jovens, com nível superior, com uma trajetória de formação anterior em escolas públicas, com maior freqüência entre os anos 1980 e 1990 e que, expressivamente, procuram formação contínua em cursos de 30h, em cursos de pós-graduação lato-sensu e, até mesmo, em cursos de pós-graduação stricto-sensu. Os resultados obtidos indicaram que, na visão das profissionais: a formação inicial constitui o espaço de aprendizado fundamental para a construção dos saberes necessários ao trabalho do professor; atividades de iniciação à pesquisa, são condições fundamentais para um bom desempenho e sucesso profissional; formação com tais características parece contribuir para o sucesso profissional e o acesso a posições de liderança na carreira docente; são necessárias políticas públicas voltadas para investimentos específicos na iniciação à pesquisa em cursos de formação inicial para o magistério; bons cursos de formação inicial para o magistério podem ser concebidos também como parte de um plano de cargos, salários e condições de trabalho, possibilitando aos professores a progressão funcional e, conseqüentemente, o nãoabandono da rede pública de ensino em busca de melhores condições de salário e de trabalho. Esses resultados revelam, portanto, que um processo de formação inicial de qualidade, atrelado ao envolvimento em grupos de pesquisa é de fundamental importância no processo de construção do perfil profissional das docentes. Esses resultados só vêm confirmar o que pesquisas na área (ZEICHNER, 1993; STENHOUSE, 1984; GIOVANNI, 2000; LUDKE, 2001; ANDRÉ, 2001;) vêm defendendo: a importância de se articular atividades de pesquisa como componente necessário nos processos de formação inicial, com vistas à formação de um bom profissional docente.

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Como pudemos observar, a construção de atitude de pesquisa, especialmente na formação inicial, não representa a tentativa de reduzir os futuros professores a meros técnicos, mas sim, como afirma Giroux (1997), concebê-los como intelectuais transformadores, com a responsabilidade e compreensão sobre o que devem ensinar, como devem ensinar, quais os objetivos por que lutam no desenvolvimento de suas ações. Neste sentido, acreditamos no papel da Universidade como um espaço de construção de conhecimento e de compromisso político e intelectual, mas também como um espaço de articulação entre ensino e pesquisa, como afirma André (2001). Destacamos ainda a importância das análises teóricas e o papel da pesquisa na articulação entre o saber e a prática, colaborando para um processo de ação-reflexãoação, com vistas, a formar um profissional consciente e emancipado, autônomo e comprometido politicamente, principalmente na transformação da ordem social, como bem ressaltam Giroux (1997) e Contreras (2002). Precisamos, portanto, segundo André (2001), examinar com cuidado a proposta de formarmos ―professores-pesquisadores‖ para não cairmos nas suas armadilhas: não atribuir aos professores um papel redentor, de resolução mágica dos graves problemas educacionais, nem simplificar, tais propostas de forma demasiada, deixando de considerar as exigências mínimas para sua efetivação. Um balanço das diferentes reflexões e contribuições dos estudiosos apresentadas até aqui permite ressaltar a importância dos estudos específicos sobre a construção de atitudes de pesquisa no professor em formação e sobre o impacto desse processo em seu desenvolvimento profissional posterior. Para isso, são necessárias políticas voltadas para o investimento nos cursos de formação inicial e de programas que auxiliem no desenvolvimento de atividades de pesquisa que englobem todos os alunos. Acreditamos que nossas discussões e reflexões não se esgotam aqui, mas permitem apontar pistas para que novos estudos sejam desenvolvidos, no sentido da contribuição e da melhoria da formação inicial e, conseqüentemente, do desempenho profissional docente.

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Bibliografia ANDRÉ, M. E. A. (Org.) (2001): O papel da pesquisa na formação e na prática dos professores, Campinas, Papirus. BRASIL. (1997): Lei no. 9394 de 20 de dezembro de 1996. {Estabelece as Diretrizes e Bases da Educação Nacional}, Jornal da APASE, Jan. CONTRERAS, D. J. (2002): A autonomia de professores, São Paulo, Cortez. DELORS, J. (Org.) (1999): Educação: um tesouro a descobrir. Brasília/São Paulo, MEC, UNESCO, Cortez. GIOVANNI, L. M. (2000): Aprendendo sobre a profissão docente com o exercício da liberdade para refletir. Relatório final de pesquisa do projeto de Desenvolvimento Profissional e Transformação na escola, FAPESP, nov. GIROUX, H. (1997): Os professores como intelectuais, Porto Alegre, Artes Médicas. LUDKE, M. (Coord.) (2001): O professor e a pesquisa, Campinas, Papirus. ONOFRE, M. R. (2006): A experiência de pesquisa na formação básica e seu impacto na atuação docente na visão de profissionais do ensino fundamental, Tese de Doutorado do Programa de Pós-Graduação em Educação Escolar – Faculdade de Ciências e Letras, Araraquara, UNESP. ONOFRE, M. R. (2000): O Programa de Educação Continuada da Secretaria Estadual de Educação (PEC/SEE/SP – 1997-98) na visão de docentes formadores, professores participantes e Especialistas de ensino, Dissertação de Mestrado do Programa de Pós Graduação em Educação Escolar – Faculdade de Ciências e Letras. Araraquara, UNESP. POPKEWITZ, T. S. (2001): Lutando em defesa da alma: a política do ensino e a construção do professor, Porto alegre, Artmed. SCHEIBE, L. (Org.) (2002): Formação de professores: políticas e debates, Campinas, Papirus. SHIROMA, E. O.;Moraes, M.C. M.; Evangelista, O. (2002): Política Educacional, Rio de Janeiro, DP&A. SILVA, J. F. (2001): Políticas de Formação para professores: aproximações e distanciamentos políticos e epistemológicos, Dissertação de Mestrado apresentada a Universidade Federal de Pernambuco. Recife. STENHOUSE, L. (1984): Investigación y desarollo del curriculum, Madri,Morata. TORRES, R. M: ―Tendências da formação docente nos anos 90‖. In: Warde, M. (Org.) (1998): Novas políticas educacionais: críticas e perspectivas, São Paulo, PUCSP, p. 173-19. ZEICHNER, K. M. (1993): A formação reflexiva de professores: idéias e práticas, Lisboa, Educa. 271 Grupo de Estudo e Pesquisas em Política Educacional, Rio Claro, 06, 07 e 08 de julho de 2011 Vol. 3 (2011)

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A IMPLANTAÇÃO POLÍTICA DO ENSINO FUNDAMENTAL DE NOVE ANOS SOB O OLHAR DO PROFESSOR

Selma Ferreira de Oliveira [email protected] FFC– UNESP, Marília–SP

CAPES

Resumo: O presente texto busca discutir e socializar parte de uma investigação que procura desvendar o olhar do professor sobre a implantação do ensino fundamental de nove anos analisando se a sua ampliação é suficiente para promover alterações efetivas na prática do professor que atua no primeiro ano desse nível de ensino. O estudo adota princípios da pesquisa qualitativa, da análise de conteúdo, na exploração dos documentos legais e da pesquisa de grupo focal para a coleta de dados junto aos professores. Constatou-se que há distanciamentos entre as proposições políticas e sua efetivação na escola, já que as reformas políticas nem sempre vêm acompanhadas dos recursos necessários à sua efetivação. Palavras-chave: ensino fundamental de nove anos, atuação docente, reforma educacional.

Este texto faz parte de um estudo, em andamento, que pretende discutir e socializar reflexões acerca dos seguintes questionamentos: a proposta do ensino fundamental de nove anos se constitui desafiadora o suficiente para promover mudanças efetivas na atuação do professor do primeiro ano do ensino fundamental? Qual é o olhar do professor sobre essa proposição política? O estudo dessa política torna-se relevante pela escassez de investigações sobre as possíveis implicações que essa medida política traz a atuação docente no contexto escolar. As questões e dúvidas levantadas acerca da política educacional que envolve o ensino fundamental merecem ―além de respostas, reflexão e pesquisa‖ Santos e Vieira (2006, p. 779). Silva Júnior e Ferreti (2004, p.77) dependem que as reformas são

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movimentos de reafirmação e questionamento, as rupturas e continuidades na escola diante de uma reforma precisam ser investigadas. A história do ensino obrigatório no Brasil é resgatada por Oliveira (2007, p.671) afirmando que o ensino primário passou a ser direito subjetivo com a Constituição Federal de 1934, mesmo com a insuficiência de vagas constatada naquele momento histórico. A ampliação do tempo de escolarização foi uma conquista gradual no Brasil. A Lei de Diretrizes e Bases da Educação n. 4.024/61, determinava quatro anos na formação inicial do indivíduo. A ampliação de quatro para oito anos ocorreu com a Lei n. 5.692/71, que unificou as duas fases de ensino: primário e ginasial. Determinar o direito a educação e promover o acesso ao ensino obrigatório no Brasil são etapas que caminham em ritmos diferenciados, ou seja, há uma facilidade para determinar os direitos educacionais, na forma da lei, no entanto, a sua efetivação, por motivos políticos, sociais e econômicos, pode levar até décadas ou nem mesmo a sua concretização. O ensino fundamental de nove anos foi proposto em 2006 por

meio

da

Lei

11.274. Art. 32. O ensino fundamental obrigatório, com duração de 9 (nove) anos, gratuito na escola pública, iniciando-se aos 6 (seis) anos de idade, terá por objetivo a formação básica do cidadão [...]

Após a sua proposição a política vem sendo discutida em diferentes aspectos por autores como Kramer (2006), Barreto (1998), Gorni (2007), Dantas e Maciel (2001) entre outros. A ampliação dos anos de estudo e a antecipação da entrada das crianças na escola é uma tendência dos países em desenvolvimento, que pretendem, por meio da educação, desenvolver-se economicamente. Novas exigência de qualificação para o trabalho demandam a elevação do nível de formação profissional para a inserção no mercado globalizado. A busca pela universalização e pelo aprimoramento da qualidade do ensino tornou-se latente (OLIVEIRA, 2007, p.666). Uma meta mais econômica do que propriamente educacional. Há algum tempo já se sabia das dificuldades em avançar qualitativamente na educação, a proposição de mudanças ao ensino fundamental era necessária. Arelaro 273 Grupo de Estudo e Pesquisas em Política Educacional, Rio Claro, 06, 07 e 08 de julho de 2011 Vol. 3 (2011)

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(2005, p.1048), apontou que na década de 1990, o Brasil foi um dos sete países piores do mundo em todas as suas modalidades de ensino, diante desse fato era preciso propor mudanças. Em 2007, a UNESCO (p. 231) apresentou um relatório sobre o ensino obrigatório nos países da América Latina e Caribe e indicou que a entrada das crianças na escola em 36 países, ocorria antes dos sete anos, ou seja, em 15 países aos cinco anos, e em 21 países aos seis anos e, em apenas 5 países começava aos sete anos, entre eles o Brasil. A UNESCO verificou, ainda, que dos 41 países que compõem o bloco da América Latina e Caribe, a maioria dos sistemas educacionais, 31 países, oferecem dez ou mais anos de escolarização obrigatória. Gorni (2007, p. 71) analisa as políticas educacionais que se apresentam na atualidade e defende ser essa uma possibilidade de rever ―a dívida social brasileira para com uma grande parcela da população‖, que esteve excluída ou teve restrições no acesso à educação por um período de tempo significativo. A ampliação de mais um ano ao ensino fundamental é tida como um fato positivo, pois, correspondente a ampliação do direito subjetivo à educação, restrito somente ao ensino fundamental. A oferta de mais um ano no ensino fundamental assegura maior oportunidade de estudo, contemplando, principalmente, os estados brasileiros em que a educação infantil era para poucos em razão da insuficiência de vagas. Gorni (2007, p.69) analisa, com desconfiança, a proposta política da antecipação da entrada de crianças com seis anos na escola e o ensino fundamental de nove anos. Sua desconfiança está relacionada a intencionalidade das políticas propostas questionando se seriam apenas mudanças estruturais não comprometidas com a qualidade da educação, ou se haveria mesmo um real comprometimento com esse nível de ensino. Para Gomes (2004, p.48) as reformas educacionais são realizadas no bojo de uma relação de poder historicamente constituída pelos atores sociais – as secretarias de educação e as escolas – competindo à escola apenas a execução do que fora proposto, uma atuação mecânica, sem reflexão. No contexto de implantação da atual política é importante lembrar algumas constatações sobre como era o ensino fundamental de oito anos que o fragilizava: a) no ensino fundamental havia uma preocupação maior com a sistematização do ensino274 Grupo de Estudo e Pesquisas em Política Educacional, Rio Claro, 06, 07 e 08 de julho de 2011 Vol. 3 (2011)

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aprendizagem contrapondo a proposta de ensino-aprendizagem vivenciada na educação infantil que privilegiava o lúdico, o imaginário; b) o rompimento brusco da educação infantil para o ensino fundamental tornava o processo de desenvolvimento infantil fragmentado. Diante dessas constatações algumas orientações são dadas aos professores do ensino fundamental de nove anos por meio de um livro elaborado pela Secretaria da Educação Básica – SEB – e pelo Ministério da Educação – MEC, intitulado ―Ensino fundamental de nove anos: orientações para a inclusão da criança de seis anos de idade‖, nesse material as orientações tem por objetivo superar o rompimento brusco de formação do aluno no período de transição da educação infantil para o ensino fundamental. Aos profissionais que atuam no ensino fundamental recomenda que revejam suas concepções de infância, do brincar, acompanhada de sugestões para lidar com a inclusão das crianças de seis anos na escola, de modo que a infância seja vivida em sua plenitude. Aprender brincando é uma das metas estabelecidas às crianças de seis anos que adentram as escolas (BRASIL, 2007, p.31). Adotamos como referencial teórico para a realização do estudo a concepção de escola como organização considerando que ―as organizações são sempre as pessoas em interação social‖ com uma margem de autonomia relativa, nem sempre reproduzindo integralmente as regras hierarquicamente estabelecidas podendo inclusive ser infiéis as normas determinadas (LIMA, 2001, p.94). O contexto escolar é construído por indivíduos que interagem entre si a partir de normas oficiais e normas informais construídas no seio da comunidade escolar. As normas informais podem contribuir tanto para a adaptação de uma determinação legal como para o não cumprimento. Para Lima (2001, p.112) as determinações políticas não são suficientes para provocar alterações nas escolas ―as diversas realidades escolares não se transformam automaticamente por simples mudança dos modelos decretados‖. As mudanças ocorrem influenciadas por fatores relacionados a interesses, objetivos e circunstâncias diversas no contexto escolar. Segundo Cury (2000, p.8) tal fato ocorre porque o ―próprio sentido expresso da lei entra em choque com as adversas condições sociais de funcionamento da sociedade‖.

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A escola tem o seu próprio mecanismo de funcionamento e ao propor mudanças educacionais ―o Estado confronta-se com as posturas políticas já sedimentadas‖ construídas historicamente (FALSARELLA, 2002, p. 78). Santos e Vieira (2006, p.779) apontam também um fator relevante capaz de comprometer a efetivação de uma política que é a diversidade de interpretação dos dispositivos legais, o que é perfeitamente possível uma vez que o trâmite para a implantação de uma política percorre várias instâncias com interpretações diversas sobre um mesmo tema. Oliveira (2007, p.662) aponta dois fatores que julga interferir na implantação de uma política educacional, que é a dinâmica do próprio sistema educacional e, ainda, a política econômica, ou seja, além da questão cultural vivenciada no cotidiano escolar o fator econômico também impõe limitações à efetivação de uma política. Para Minto e Muranaka (1995, p.65) ―Ninguém desconhece que os sistemas de ensino refletem a atenção recebida ao longo de um tempo – educação é processo. O sucesso de qualquer política social depende, sobretudo, de alocação de verbas‖. As reformas propostas à educação devem ser discutidas juntamente com as instituições escolares ou tendem a sofrer novas reformulações se desvirtuando das originalmente propostas, ou seja, o velho é reacomodado sobre a roupagem do novo. Ocorre a apropriação do discurso da proposta política sem uma mudança substancial (GOMES, 2004, p.48). Não é novidade que ―há um fosso entre o real e o legal‖ (MINTO, 1995, p.68), diante desse fato é necessário repensar o modo como as políticas são elaboradas e propostas. São muitos os fatores que comprometem a efetivação de uma política educacional e, possivelmente, todos são do conhecimento dos propositores e gestores de políticas, o que gera novos questionamentos: falta vontade política? Não sabem como proceder? Não querem fazer?

O professor no contexto de implantação do ensino fundamental de nove anos De acordo com Neves (1999, p.18) ―os novos padrões de sociabilidade humana requerem [...] um novo espaço social de aprendizagem profissional e cultural, e a escola, 276 Grupo de Estudo e Pesquisas em Política Educacional, Rio Claro, 06, 07 e 08 de julho de 2011 Vol. 3 (2011)

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uma vez refuncionalizada, apresenta-se como lócus privilegiado para tal tipo‖. A escola é um espaço para a aprendizagem tanto dos alunos como dos profissionais que nela atuam e precisa agir coerentemente ao tempo e espaço histórico de modo a suprir as necessidades de aprendizagem de um dado momento. O processo de uma implantação de uma política educacional por si só não garante o seu sucesso. Em meio a tais contratempos, a proposta deve ser pelo menos convincente aos professores, uma vez que eles são os responsáveis diretos por consolidar ou não uma reforma no contexto escolar, como defende Nóvoa (1992, p.28) ―a mudança educacional depende dos professores e sua formação. Depende da transformação de suas práticas pedagógicas em sala de aula‖. A transformação do modo como o professor atua demanda formação inicial sólida, formação em serviço, estrutura física para viabilizar inovações e reconhecimento financeiro. A política de ampliação do ensino fundamental de oito para nove anos apresenta a tendência das políticas analisadas por Ball (2002, p.4), que vê as reformas como mecanismos para ―reformar professores e para mudar o que significa ser professor‖. No contexto de proposição da política de ampliação do ensino fundamental podemos constatar tal fato por meio de recomendações específicas ao professor nos modos como ele deve agir – prática pedagógica e pensar – concepções de infância, do ensinoaprendizagem, do brincar. As reformas educacionais propõem mudanças às práticas docentes e atua na tentativa de alterar a identidade social dos professores, mas essas mudanças é apenas parte de um processo que pode levar a transformação da educação no Brasil, uma vez que a educação não é composta apenas por professores isolados. Há um contexto favorecedor ou não de sua prática pedagógica. As reformas buscam um novo professor, capaz de atingir novas metas em um mesmo contexto de atuação, com as mesmas condições de trabalho. Os professores sabem os limites e as possibilidades de sucesso das políticas elaboradas para serem implantadas na escola, diante dessa situação cabe investigar o que pensa o professor sobre o ensino fundamental de nove anos e as probabilidades de mudanças efetivas em sua prática de ensino. Dentro das perspectivas da proposta do ensino fundamental de nove anos Kramer (2007, p.21) defende que ―são necessárias condições concretas de trabalho com

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qualidade e ações coletivas que viabilizem formas de enfrentar os desafios e mudar o futuro‖. A política em si é vista com bons olhos, no entanto, são questionáveis as condições para a sua implantação.

Caminhos percorridos

O estudo está em andamento e foi dividido em várias etapas de trabalho. A pesquisa bibliográfica compõe uma dessas etapas com a função de contribuir para a ampliação de um referencial teórico que possibilite contextualizar as políticas propostas ao ensino fundamental em uma perspectiva histórica buscando desvendar a motivação para a proposição, dar suporte as discussões acerca do tema, além de apontar as possibilidades de mudanças que de fato a política possa favorecer. A pesquisa adota uma abordagem qualitativa (LÜDKE e ANDRÉ, 1986) buscando interpretar a realidade e o contexto em que se insere a problemática do estudo. Neves (2006, p.3) aponta os benefícios dos métodos qualitativos que são ―considerados mais ricos, completos, globais, reais‖ pelo fato de ter uma relação direta com o objeto da pesquisa. O estudo da política de ampliação do ensino fundamental demanda, ainda, uma análise dos documentos oficiais – legislação e orientações dadas pelo MEC – para suas efetivações. Nos documentos oficiais, que regulamentam a ampliação do ensino fundamental, a exploração do material ocorreu em seu aspecto político, administrativo e pedagógico, recebendo maior ênfase o aspecto pedagógico e buscou, ainda, analisar as sugestões de mudanças para a atuação docente. Para a análise da reforma do ensino fundamental a abordagem do ciclo de política foi adotada como um método a fim de estudar a política em cinco contextos: da influência, da produção de texto, da prática, dos resultados ou efeitos e o contexto de estratégia política (BOWE; BALL; GOLD, 1992). Dos cinco contextos destacaremos o contexto da prática e dos resultados e efeitos, uma vez que está diretamente relacionado ao tema da atuação docente diante da proposta política, foco da investigação.

278 Grupo de Estudo e Pesquisas em Política Educacional, Rio Claro, 06, 07 e 08 de julho de 2011 Vol. 3 (2011)

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A pesquisa de grupo focal é o diferencial deste estudo, e foi adotada na coleta de dados juntos ao professores por possibilitar que ao mesmo tempo em que os professores falem sobre a realidade de sua atuação reflitam sobre os limites e avanços de sua prática. O grupo focal permite que diferentes percepções e atitudes acerca da política sejam elaboradas e novas opiniões poderão ser formadas a partir da fala de outros indivíduos sobre o tema em discussão (GATTI, 2005). A fala dos professores enriquece esse estudo e permite expor o seu ponto de vista acerca da política do ensino fundamental de nove anos, uma vez que viabilizam a implantação da política em sala de aula e, por isso, são também os seus primeiros avaliadores. Para moderar o processo de discussão acerca do objeto em pauta algumas temáticas são definidas nessa etapa, são elas: ensino fundamental de nove anos e formação docente, ensino fundamental de nove anos e qualidade de ensino, limites e possibilidades para a implantação do ensino fundamental de nove anos, mudanças na prática pedagógica após a implantação do ensino fundamental de nove anos. Para o tratamento dos dados a análise de conteúdo será utilizada respeitando as três fases que a compõe: a) a pré-análise, momento destinado a organização do material; b) a exploração desse material, codificando; e a interpretação dos resultados que procede após a categorização e classificação dos elementos que compõem o estudo (BARDIN, 1977, p.683). Ludke e André (1986, p.31) defendem que a análise por meio de associações e relações entre os dados coletados fazem emergir novas idéias, permitem que a discussão acerca da problemática seja elucidada, além de possibilitar o alcance dos objetivos da pesquisa. Enfim, as políticas devem ser refletidas sob o aspecto da possibilidade, ou seja, considerando as condições favoráveis para a realização das mudanças propostas. Até o momento foi possível identificar que os discursos oficiais contidos nos documentos apresentados pelo MEC para o ensino fundamental de nove anos não apresentam novidades além do ano adicional de estudo. Percebe-se um maior direcionamento ao primeiro ano desse nível de ensino (BRASIL, 2007, p.11), embora, a proposta afirma apresentar uma re-significação das concepções e práticas de ensino– aprendizagem no ensino fundamental como um todo, que implicaria na re-elaboração e análise do projeto político pedagógico do ensino fundamental. 279 Grupo de Estudo e Pesquisas em Política Educacional, Rio Claro, 06, 07 e 08 de julho de 2011 Vol. 3 (2011)

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É tarefa difícil propor a valorização do brincar em um contexto em que na há verbas para a compra ou instalação de brinquedos, a valorização da infância, onde a mobília não é adequada para a criança de seis anos, uma aprendizagem significativa em que as salas de aula mal cabem as carteiras e os recursos didáticos do professor são mínimos. Faz-se necessário o aumento dos recursos destinados à educação e aprimoramento na gestão dos recursos já existentes. A valorização da infância, do brincar, a preocupação com uma aprendizagem significativa, com um professor disposto a ensinar, um processo de avaliação capaz de fornecer dados para rever as necessidades de aprendizagem do aluno, são algumas angústias herdadas do ensino fundamental de oito anos. As preocupações com a qualidade do ensino tendem a se estatizar no papel e às vezes são lembradas sob a roupagem de uma nova reforma política.

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______. Lei n. 11.274, de 6 e fevereiro de 2006. Altera a redação dos artigos 29, 30, 32 e 87 da Lei nº. 9.394, de 20 de dezembro de 1996, que estabelece as diretrizes e bases da educação nacional, dispondo sobre a duração de 9 (nove) anos para o ensino fundamental, com matrícula obrigatória a partir dos 6 anos de idade. Diário Oficial da União, Brasília, DF, 2006. _______. Lei n. 5 692, de 11 de agosto de 1971, que ―fixa as diretrizes e bases para o ensino de 1o. e 2o. graus e dá outras providências‖. Diário Oficial da União, Brasília, DF, 1971. _______. Ministério da Educação. Secretaria de Educação Básica. Ensino Fundamental de nove anos: orientações para a inclusão da criança de seis anos de idade. Brasília, DF, 2007. CURY, Carlos Roberto Jamil. Legislação educacional brasileira. Rio de Janeiro: DP&A, 2000. FALSARELLA, Ana Maria. Políticas de capacitação e mudanças no cotidiano escolar. In: SAMPAIO, Maria das Mercês Ferreira. O cotidiano escolar face às políticas educacionais. Araraquara: JM Editora, 2002. GATTI, Bernadete Angelina. Grupo focal na pesquisa em ciências sociais e humanas. Brasília: Líber Livro, 2005. GOMES, Cândido Alberto. Quinze anos de ciclos no ensino fundamental: um balanço das pesquisas sobre sua implantação. Revista Brasileira de Educação, Rio de Janeiro, Jan/Fev/Mar/Abr 2004, n. 25. GORNI, Doralice Aparecida Paranzini. Ensino Fundamental de 9 anos: estamos preparados para implantá-lo? Ensaio: Aval. Pol. Educ., Rio de Janeiro, v.15, n.54, jan./mar. 2007. KRAMER, Sônia. As crianças de 0 a 6 anos nas políticas educacionais no Brasil: Educação Infantil e/é fundamental. Educação & Sociedade, Campinas, vol. 27, n.96, out. 2006.

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INVESTIGANDO SE AS HORAS DE TRABALHO PEDAGÓGICO COLETIVO (HTPCS) PODEM SE CONSTITUIR COMO ESPAÇOS DE FORMAÇÃO CONTÍNUA E DE REFLEXÃO SOBRE OS SABERES DOCENTES

Gabriela Reginato de Souza [email protected] FCT – UNESP - campus de Presidente Prudente

Yoshie Ussami Ferrari Leite [email protected] FCT – UNESP - campus de Presidente Prudente

Financiamento: Fundação Amparo à Pesquisa do Estado de São Paulo (FAPESP)

Resumo: O presente trabalho faz parte de uma pesquisa de mestrado em andamento que procura investigar as HTPCs. Temos como objetivo deste trabalho apresentar o levantamento inicial realizado sobre a produção acadêmica de teses e dissertações que englobam o tema das HTPCs. A metodologia consistiu em um levantamento na base de teses e dissertações de universidades do estado de São Paulo e da Capes/MEC. As pesquisas sobre as HTPCs destacam seus limites e potencialidades. Assim, procuramos contribuir no estudo deste tema focando nos saberes docentes. Palavras-chave: Formação Contínua; Saberes docentes; HTPCs.

INTRODUÇÃO E JUSTIFICATIVA

O presente trabalho apresenta nosso projeto de pesquisa que se encontra em andamento e procura investigar as Horas de Trabalho Pedagógico Coletivo (HTPCs), partindo do pressuposto de que a escola também é um local de formação de professores (ZEICHNER, 1993; TARDIF, 2010). Trata-se de uma investigação inserida na linha de pesquisa Políticas Públicas, Organização Escolar e Formação de Professores do Programa de Pós-graduação em Educação da Universidade Estadual Paulista (UNESP) de Presidente Prudente. A escola pública atual, que abrange praticamente a totalidade da 283 Grupo de Estudo e Pesquisas em Política Educacional, Rio Claro, 06, 07 e 08 de julho de 2011 Vol. 3 (2011)

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população, é bastante recente. Durante séculos a educação brasileira era voltada para uma pequena parcela da população, ou seja, as classes dominantes. O restante da população era simplesmente excluído do acesso à escola pública. De acordo com Beisegel (1980, p.49) esta escola para poucos fazia parte do contexto de ―uma sociedade tradicional, economicamente semi-colonial‖. Porém, com o aparecimento das denominadas ―massas populares urbanas‖ (BEISEGEL, 1980, p.50) ocorreram várias mudanças que englobaram a própria política brasileira. Uma destas mudanças que se deu em 1930, graças às reivindicações destas massas populares, foi o início do ―processo de democratização do ensino‖. A partir desta democratização surgem diversas críticas à escola pública, porém, para Beisegel (1980) não se trata de negar os problemas da escola e sua dificuldade de lidar com este novo público e suas demandas, mas sim que os profissionais da educação não se deixem levar por discursos conservadores e contrários à presença das classes populares no interior da escola. Segundo Leite e Di Giorgi (2004, p.136) a ampliação quantitativa da escola, ou seja, sua democratização, não veio acompanhada de medidas e de ações essenciais que garantissem a melhoria qualitativa do ensino. Praticamente todas as escolas ainda mantêm uma estrutura organizacional tradicional, onde permanecem ações conservadoras e pautadas por princípios burocratizantes, fato que dificulta a realização de mudanças pedagógicas por parte dos professores e gestores, que poderiam trazer benefícios para a educação. Precisamos partir da valorização da escola que temos que foi conquistada pela população, mas tendo consciência de que há um longo caminho a ser percorrido (que irá exigir muito dos professores e outros profissionais da educação como os gestores) para que ela se torne uma instituição de qualidade. Exige-se dos docentes um novo papel que, segundo Ghedin, Leite e Almeida (2008), envolve um posicionamento favorável em relação à escola pública e seus alunos, sendo consoante ao paradigma de formação do professor crítico-reflexivo. Assim reconhecemos a importância da escola pública contar com a participação de um intelectual crítico e não de um técnico, já que, segundo Contreras (1997 apud GHEDIN 2002 p.140), ―o intelectual crítico está preocupado pela captação e potenciação dos aspectos de sua prática profissional que conservam uma possibilidade 284 Grupo de Estudo e Pesquisas em Política Educacional, Rio Claro, 06, 07 e 08 de julho de 2011 Vol. 3 (2011)

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de ação educativamente valiosa‖. O profissional formado a partir desta perspectiva, ao contrário daquele formado em uma perspectiva técnica, reflete coletivamente sobre sua prática valorizando os saberes produzidos por ele mesmo e pelos outros docentes no contexto de seu trabalho. Assim, torna-se um desafio fazer com que estes conhecimentos sejam respeitados por todos os que participam das decisões sobre a educação. Além disso, de acordo com Zeichner (1993) o professor críticoreflexivo também reconhece que o processo de aprender e ensinar se desdobra durante toda a sua vida profissional. Os programas de formação de professores costumam formar estes profissionais para ensinar; porém o conceito de professor reflexivo defende que estes sejam preparados também para compreender seu exercício docente e se aperfeiçoar durante o tempo e que sejam responsáveis pelo seu próprio desenvolvimento profissional. O professor crítico-reflexivo é aquele que age de forma autônoma em relação ao seu trabalho e percebe que ele está inserido em um contexto que vai muito além das paredes da sala de aula. Trata-se também de colocar nas mãos dos docentes as atitudes primordiais e também as decisões em relação ao seu trabalho, o que engloba ter consciência de que é muito importante continuar estudando e aperfeiçoando seus conhecimentos por meio de processos de formação contínua. Com base em Silva (2000, p.21) compreendemos que a formação contínua de professores pode ser definida como ―o conjunto de atividades que se realizam após a formação inicial, que tem como objetivo desenvolver os conhecimentos e as competências dos professores tendo em vista o seu aperfeiçoamento profissional‖. Assim, pensando na importância da existência de espaços coletivos para a formação docente em conformidade com o paradigma do professor críticoreflexivo, acreditamos que a própria escola pode oferecer momentos privilegiados para a formação contínua dos professores e a produção e socialização de seus saberes. Os Referenciais para a Formação dos Professores (BRASIL, 2002), ao tratar da formação contínua, confirmam esta ideia, ao considerarem a importância da escola como um local de formação docente. O desenvolvimento profissional permanente requer um processo constante e contínuo de reflexão, discussão, confrontação, e experimentação coletiva, para o qual é necessário não só que as instituições contratantes assumam a responsabilidade de propiciar as condições institucionais e materiais, mas que o professor tome para si

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III Seminário Internacional de Gestão Educacional a responsabilidade por sua formação. Só essa co-responsabilidade permitirá a superação da relação de tutela que mantêm a formação em serviço do professor a mercê de circunstâncias político-institucionais as mais diversas. Para isso, é preciso assegurar condições institucionais para que os professores possam estudar em equipe, compartilhar e discutir sua prática com os colegas, apresentar seu trabalho publicamente, reunir-se com pais de alunos e demais membros da comunidade, desenvolver parcerias com outras instituições, participar do projeto educativo da escola, definindo, coletivamente, metas, prioridades, projetos curriculares, processos de avaliação, normas de convivência, temáticas de formação continuada, e prioridades para a utilização dos recursos disponíveis. (BRASIL, 2002, p. 66).

Os Referenciais deixam claro que o professor precisa se conscientizar de que é responsável por sua própria formação, mas também necessita de condições institucionais para que isso aconteça. Alvarado Prada et al. (2001) nos chamam a atenção para o fato de que o processo de formação contínua costuma ser considerado como externo ao trabalho do professor e que pouco respeita e considera os seus saberes e a sua experiência profissional. Com base nessa reflexão, podemos dizer que a formação contínua precisa respeitar a experiência e os saberes dos professores garantindo sua participação em todas as etapas do processo de formação, tendo sempre como base o contexto real em que o professor realiza o seu trabalho. Além disso, também é muito importante que a formação contínua considere as necessidades docentes. Segundo Silva (2000) os programas de formação contínua que utilizam as necessidades formativas apontadas pelos docentes como base para sua elaboração costumam ser bem sucedidos, pois contam com o envolvimento dos formandos ao longo de todo o processo. Ao refletir sobre o status ocupacional dos docentes, Almeida (1999, p.39) afirma que estes [...] caminham na direção de um novo profissionalismo docente [...] articulado a dois aspectos centrais. O primeiro é que eles precisam ser detentores de um saber específico, imprescindível à sua ação e desenvolvido no interior da profissão. O segundo é que o trabalho docente precisa ser desenvolvido e concebido de maneira coletiva, inserido e orientado por um projeto educativo, capaz de expressar os compromissos da escola diante das necessidades comunitárias e sociais. Nessa concepção o professor está em constante processo de desenvolvimento profissional, onde a formação contínua se coloca como elemento central.

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Assim, é imprescindível considerar a complexidade dos saberes provindos da experiência dos professores. É na relação entre teoria e prática que Roldão (2006) acredita estarem as grandes questões relativas ao conhecimento profissional docente que hoje fazem parte da agenda da formação e da profissionalização dos professores. De acordo com Montero (1995 apud ROLDÃO, 2006, p.9) os saberes docentes podem ser definidos como ―O conjunto de informações, aptidões e valores que os professores possuem, em conseqüência de sua participação em processos de formação (inicial e em exercício) e da análise da sua experiência prática [...]‖. Esta definição do conhecimento dos professores é muito semelhante à de Ghedin (2002) já que este autor afirma que os saberes da experiência e da cultura são o centro do saber docente. Nas definições dos dois autores está presente a idéia de que os saberes docentes se constroem na relação entre teoria e prática. Levando em consideração a importância da teoria e da prática para que o professor realize o seu trabalho com os alunos, Tardif (2010, p.39) define o professor ideal como ―[...] alguém que deve conhecer sua matéria, sua disciplina e seu programa, além de possuir certos conhecimentos relativos às ciências da educação e à pedagogia e desenvolver um saber prático baseado em sua experiência cotidiana com os alunos‖. De acordo este autor é preciso considerar e valorizar a complexidade dos saberes provindos da experiência dos professores. Assim, segundo Tardif (2010, p. 36) ―[...] o saber docente pode ser definido como um saber plural formado pelo amálgama, mais ou menos coerente, de saberes oriundos da formação profissional e de saberes disciplinares, curriculares e experienciais‖. De acordo com Tardif (2010) os saberes adquiridos pelos professores por meio da prática do seu trabalho tornam-se, gradativamente, a base de sua competência profissional e é a partir desses saberes que os professores julgam os problemas e limites presentes em sua formação inicial e contínua. A prática docente não se limita à mera execução de determinadas tarefas de maneira mecânica, mas se constitui como um espaço de aprendizagem por meio dos desafios que surgem no cotidiano da sala de aula, da reflexão e troca de experiências que os professores realizam entre si. 287 Grupo de Estudo e Pesquisas em Política Educacional, Rio Claro, 06, 07 e 08 de julho de 2011 Vol. 3 (2011)

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Diante disso, entendemos que a formação contínua realizada por meio das HTPCs, no interior das escolas públicas, tem um grande potencial para promover o atendimento das necessidades docentes e a construção dos saberes dos professores. É necessário também, que os docentes e gestores tenham representações sociais positivas em relação a esta atividade para que ela seja devidamente valorizada e aproveitada enquanto um espaço-tempo de formação contínua em serviço. Segundo Jodelet (2001, p.22) as representações sociais podem ser definidas como ―[...] uma forma de conhecimento, socialmente elaborada e partilhada, com um objetivo prático, e que contribui para a construção de uma realidade comum a um conjunto social. [...]‖. Considerando que as representações sociais podem resultar em determinas atitudes por parte dos sujeitos de acordo com o seu conteúdo (JODELET, 2001) é importante levá-las em consideração na formação de professores, para que estas representações não se tornem mais um obstáculo ao trabalho docente. O histórico das HTPCs no Estado de São Paulo demonstra que este espaço-tempo de formação pode ser considerado como uma conquista dos professores que tinham como objetivo melhorar a qualidade do ensino público reivindicando condições para a realização de sua formação em serviço (MENDES, 2008). Segundo

Mendes

(2008,

p.40),

as

HTPCs

caracterizam-se

essencialmente por serem um [...] momento, uma oportunidade de ação ou resultado da ação cujo objetivo é a reflexão, ordenação, sistematização e crítica realizada em um grupo de pessoas que se reúnem em associações. A HTPC traz como principal característica a valorização da escola como local de formação e o fortalecimento do coletivo como força motivadora de mudanças; entendemos este espaço coletivo como o lócus privilegiado para a construção do trabalho docente, uma vez que possibilita aos docentes a troca de experiências, a contribuição mútua na construção de sua ―pedagogia‖ [...].

Assim, defendemos a importância das HTPCs enquanto um espaçotempo formativo de direito dos professores, que pode ser capaz de contribuir para a sua formação contínua e a constituição de seus saberes. Neste sentido defendemos também a importância de compreender as representações sociais que se constituíram a respeito das Horas de Trabalho Pedagógico Coletivo (HTPCs). Considerando o que foi apresentado até o momento, destacamos que o 288 Grupo de Estudo e Pesquisas em Política Educacional, Rio Claro, 06, 07 e 08 de julho de 2011 Vol. 3 (2011)

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presente trabalho faz parte de um levantamento teórico para a realização de nossa pesquisa de mestrado, que procura analisar se as Horas de Trabalho Pedagógico Coletivo (HTPCs) têm sido concebidas e realizadas nas escolas públicas municipais de Rancharia de maneira a contribuir para a formação contínua dos professores e para a reflexão sobre os saberes docentes de forma a atender aos desafios da escola pública brasileira. Acreditamos que o levantamento e a análise do que as teses e dissertações já realizadas abordaram em relação às HTPCs são uma etapa importante para a compreensão de nosso objeto de estudo.

OBJETIVOS

Neste trabalho temos como objetivo apresentar o levantamento inicial realizado sobre a produção acadêmica de teses e dissertações que englobam o tema das Horas de Trabalho Pedagógico Coletivo (HTPCs).

METODOLOGIA

Nossa pesquisa de mestrado será realizada no município de Rancharia-SP, no qual será selecionada uma escola dos anos iniciais do Ensino Fundamental, inserindo-se em uma abordagem qualitativa que, de acordo com o que apresentam Bogdan e Biklen (1994, p.13), ―envolve a obtenção de dados descritivos, obtidos no contato direto do pesquisador com a situação estudada, enfatiza mais o processo do que o produto e se preocupa em retratar a perspectiva dos participantes‖. Em relação à etapa inicial da pesquisa em que nos encontramos no presente momento, que também pode ser inserida em uma abordagem qualitativa, a metodologia empregada foi um levantamento de teses e dissertações que apresentam como objeto de estudo Horas de Trabalho Pedagógico Coletivo (HTPCs), em quatro universidades públicas do estado de São Paulo sendo elas a Universidade Federal de São Carlos (UFSCAR), a Universidade Estadual Paulista (UNESP), a Universidade Estadual de Campinas (UNICAMP) e a Universidade de São Paulo (USP) e uma 289 Grupo de Estudo e Pesquisas em Política Educacional, Rio Claro, 06, 07 e 08 de julho de 2011 Vol. 3 (2011)

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universidade particular, nomeadamente, a Pontifícia Universidade Católica de São Paulo (PUC-SP). Visando obter uma compreensão mais ampla das produções acadêmicas sobre o tema estudado em nossa pesquisa de mestrado, também foi feita uma pesquisa na base de teses e dissertações da Capes/MEC.

RESULTADOS PARCIAIS A seguir apresentamos, resumidamente, as informações obtidas por meio da análise dos trabalhos acadêmicos de mestrado e doutorado que estudaram as Horas de Trabalho Pedagógico Coletivo (HTPCs). No Programa de Pós-Graduação em Educação da UNESP de Presidente Prudente, encontramos apenas um trabalho em nível de mestrado que possui como tema central as HTPCs. Trata-se da dissertação de mestrado de Cíntia Cristina Teixeira Mendes sob a orientação do professor doutor Alberto Albuquerque Gomes intitulada ―HTPC: Hora de trabalho Perdido Coletivamente?‖ cuja defesa data do ano de 2008. A autora teve como objetivo analisar e compreender as representações sociais dos docentes da rede municipal de ensino de Presidente Prudente-SP sobre as HTPCs. Os resultados demonstram que para os docentes, devido a diversos problemas relacionados com a forma de gestão, a atitude do orientador pedagógico, a participação dos professores, as HTPCs são consideradas como horas de trabalho perdido. No Programa de Pós-Graduação em Educação da UNESP de Araraquara identificamos um trabalho de mestrado, de autoria de Márcia Cristina de Souza Bueno, com o título ―Formação contínua em serviço: um estudo com os profissionais dos centros de educação infantil‖ que foi defendido em 2007 e orientado pelo professor doutor Ricardo Ribeiro. Seu objetivo foi identificar quais são os espaços destinados a formação em serviço dos profissionais dos Centros de Educação Infantil, dentre estes espaços foram selecionadas as HTPCs e as Reuniões Pedagógicas oferecidas aos profissionais. Em seus resultados Bueno ressalta problemas na preparação profissional dos responsáveis pela educação infantil municipal que acabam dificultando que as HTPCs e as Reuniões pedagógicas possam tornar-se espaços de formação. O levantamento no programa de Pós-Graduação em Educação da UNICAMP, resultou na identificação de um trabalho de mestrado, cujo título é ―A 290 Grupo de Estudo e Pesquisas em Política Educacional, Rio Claro, 06, 07 e 08 de julho de 2011 Vol. 3 (2011)

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produção de saberes e conhecimentos no cotidiano escolar: imagens de limites e possibilidades da ação educativa‖ que foi escrito por Tamara Abrao Pina Lopretti com a orientação do professor doutor Guilherme do Val Toledo Prado e defendido em 2008. O objetivo da pesquisa era investigar o processo de produção, mobilização e significação dos saberes e conhecimentos docentes, ocorrido nos espaços-tempo coletivos da escola. A autora abordou em seu estudo o espaço-tempo que, no contexto do estudo é denominado trabalho docente coletivo (TDC), mas que pode ser diretamente relacionado às HTPCs, além de acompanhar um grupo de trabalho de primeira à quarta série e observar a sala de uma das professoras. Em seus resultados Lopretti afirma que foi possível entrar em contato com diversos saberes, construídos pelos docentes participantes da pesquisa a partir das situações de limites e possibilidades que sugiram em sua prática. No Programa de Pós-Graduação em Educação da USP identificamos dois trabalhos de mestrado relativos à temática das HTPCs. Um deles, defendido em 2007 por Antonio Berguelo dos Santos, denomina-se ―Formação Continuada de Professores em Serviço: tentativas, avanços e recuos na busca de práticas cooperativas durante o HPTC‖ e foi orientado pela professora doutora Elsa Garrido. A outra dissertação de mestrado, cuja autora é Isaneide Domingues e que teve como orientadora a professora doutora Maria Isabel de Almeida intitula-se ―O horário de trabalho coletivo e a (re) construção da profissionalidade docente‖. Não foi possível fazer uma análise destes trabalhos, pois estes não estão disponíveis para consulta no site da USP. No levantamento realizado no Programa de Pós-Graduação em Educação da UFSCAR encontramos apenas um trabalho a nível de doutorado que se debruça sobre a temática das HTPCs. Trata-se da tese de Isabela Custódio Talora Bozzini, com o título ―A construção do espaço coletivo escolar: o HTPC em foco‖ que foi defendida em 2005 com a orientação da professora doutora Denise de Freitas. Neste caso também não foi possível fazer uma análise do trabalho já que não o encontramos disponível no site da UFSCAR . Na busca de teses e dissertações da PUC-SP identificamos dois trabalhos: um de mestrado e o outro de doutorado. A dissertação de mestrado ―A percepção de professores da escola pública sobre as Horas de Trabalho Pedagógico Coletivo: um espaço de aprimoramento profissional?‖ data de 2001, sendo de autoria de Ângela Cecília Emilio coma orientação da professora doutora Claudia Leme Ferreira 291 Grupo de Estudo e Pesquisas em Política Educacional, Rio Claro, 06, 07 e 08 de julho de 2011 Vol. 3 (2011)

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Davis. Seu objetivo era identificar se os professores reconhecem as HTPCs como um espaço de aprendizagem profissional. De acordo com os dados obtidos os professores ainda não consideram as HTPCs como espaços de formação e sugerem alterações nas mesmas para que possibilitem a formação contínua docente. A tese de doutorado, por sua vez, tem o título ―A formação continuada de professores no HTPC: alternativas entre as concepções instrumental e crítica‖ foi defendida em 2003 por Marisa Garcia que teve como orientadora a professora doutora Bernardete Angelina Gatti. Seu objetivo foi descrever e analisar o espaço destinado à formação contínua de professores nas HTPCs, tendo como base a ―Teoria Crítica‖, também denominada de ―Escola de Frankfurt‖. Os dados obtidos demonstram que as Horas de Trabalho Pedagógico Coletivo são um espaço em que predomina a ambiguidade entre o que a autora denomina de uma ―semiformação instrumental‖ e uma ―formação dialógica e crítica‖. Garcia também afirma que este espaço-tempo de formação vem sendo reduzido apenas a um elo entre a escola e o sistema educacional, com suas diretrizes, hierarquias e seu papel de ―reprodução social sistêmica‖. Na consulta realizada na base de teses e dissertações da Capes/MEC, do total de trabalhos verificados, encontramos mais seis (além daqueles que já haviam sido identificados nos sites das Universidades), todos em nível de mestrado, realizados no período de 2000 a 2011, que tiveram as HTPCs como objeto de estudo. Na Universidade Regional do Noroeste do Rio Grande do Sul (UNIJUI) no ano de 2004, encontramos o trabalho de Marli Terezinha Wagner Adams, com o título ―Formação continuada no contexto escolar: intencionalidades, resistências e desafios‖ sob a orientação do professor doutor Milton Antonio Auth. Este trabalho não pode ser analisado por não estar acessível no site da universidade. Na Universidade Católica de Santos, foi realizada em 2005 a pesquisa ―A Escola como lócus da Formação Contínua: Investigando a partir das HTPCs‖ realizada por Aparecida Maria Meneguim com a orientação da professora doutora Maria Amélia Rosário Santoro Franco. Seus objetivos eram proporcionar informações contextualizadas sobre o desenvolvimento das HTPCs em escolas públicas da rede estadual e reconhecer as possibilidades destas instituições serem locais de formação contínua. Os dados obtidos revelam que as HTPCs apresentam pontos positivos e também fragilidades. A autora constatou que por si só as HTPCs não vem sendo capazes de garantir a formação contínua docente, porém, há uma expectativa positiva 292 Grupo de Estudo e Pesquisas em Política Educacional, Rio Claro, 06, 07 e 08 de julho de 2011 Vol. 3 (2011)

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dos professores, de que os problemas neste espaço-tempo de formação podem ser superados. No centro Universitário Moura Lacerda foi possível identificar o trabalho de mestrado ―A Contribuição dos Horários de Trabalho Pedagógico Coletivo (HTPCs) na Formação Continuada de Professores Iniciantes‖ cuja autoria é de Sérgio Donizeti Mariotini, sob a orientação da professora doutora Miriam Cardoso Utsumi e que foi defendido em 2007. Seu objetivo foi analisar a contribuição dos professores iniciantes para tornar as HTPCs mais dinâmicas e no desenvolvimento de práticas reflexivas, bem como a contribuição deste espaço-tempo coletivo para a formação contínua destes profissionais. Os dados demonstraram que, mesmo possuindo uma formação mais recente os professores iniciantes não dinamizaram as HTPCs, mas pelo contrário aguardavam os encaminhamentos dos professores mais experientes e da direção, buscando apoio e troca de experiências neste espaço. Estes dados chamam a atenção do pesquisador para aspectos relativos à formação inicial dos professores. Originadas da Universidade Metodista de São Paulo identificamos duas pesquisas de mestrado. Uma delas, intitulada ―HTPC: horário de trabalho pedagógico coletivo ou horário de trabalho perdido?‖, foi realizada por Paula Raquel Gonçalves Sousa, com a orientação da professora doutora Jane Soares de Almeida em 2007. O objetivo era investigar o que acontece nas HTPCs em relação à formação contínua. Não foi possível fazer uma análise dos resultados obtidos nesta pesquisa, pois o trabalho não se encontra disponível na íntegra no site da universidade. O trabalho de Carolina Yamamoto data de 2008 e tem como título ―Formação continuada na escola‖, a orientadora é a professora doutora Marília Claret Geraes Duran. O objetivo foi investigar em que medida professores e gestores consideram as HTPCs como um local de formação contínua. Como resultados a autora destaca que apesar do reconhecimento das escolas como um espaço de formação continuada, esta não é o local mais importante, e a formação realizada neste espaço ainda estaria em processo de constituição. Por fim identificamos um trabalho na Universidade Estadual de Londrina em nível de mestrado e que foi defendido em 2008 por Rejane Aparecida Czekalski; o título da dissertação é ―Apropriação da hora-atividade como espaço para formação de professores em serviço: um estudo sobre a organização do trabalho docente em Telêmaco Borba – Pr‖ e a orientadora é a professora doutora Doralice Aparecida 293 Grupo de Estudo e Pesquisas em Política Educacional, Rio Claro, 06, 07 e 08 de julho de 2011 Vol. 3 (2011)

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Paranzini Gorni. A autora utiliza uma denominação diferente, mas a atividade estudada partilha das características que encontramos também nas HTPCs. A pesquisa de Czekalski teve como objetivo investigar a hora-atividade como espaço de formação contínua em serviço de professores de educação básica. Como resultados apresenta-se que os professores reconhecem a importância da hora atividade como um espaço de estudo e formação contínua, mas que esta ainda não vem sendo suficiente para que esta formação se realize. Um ponto positivo seria a riqueza de trocas de experiências entre os docentes realizadas no decorrer da hora atividade e um dos problemas levantados é a necessidade de haver mais tempo para este processo. Os estudos que analisamos sobre as HTPCs, trazem importantes elementos para a reflexão sobre as falhas que estes espaços-tempo de formação ainda apresentam. Em contrapartida estas pesquisas também apontam que os professores reconhecem a escola como um importante local de formação, ainda que apresentem insatisfação no que se refere a alguns aspectos. Isto demonstra que apesar das fragilidades as HTPCs tem potencial para se constituírem como espaços de formação contínua no interior das escolas, em conformidade com os estudos que apontam a importância da formação contínua centrada na escola. Podemos considerar, baseados nas produções acadêmicas já realizadas a respeito das HTPCs, que estes espaços-tempo de formação ainda tem muito a melhorar. Buscamos assim, a partir do aprofundamento de alguns aspectos ainda pouco explorados em alguns estudos, como é o caso dos saberes docentes (TARDIF, 2010), refletir sobre estes problemas e buscar maneiras de superá-los. Pretendemos, por meio desta pesquisa, contribuir para a melhora qualitativa da escola pública, atualmente uma instituição aberta á maioria da população, e que pode tornar-se um espaço de formação contínua de professores e construção de seus saberes. Trata-se, assim, de considerar a formação contínua centrada na escola pública como uma rica possibilidade de contribuir com a formação de professores e consequentemente para a melhora qualitativa da escola pública que almejamos. Ao refletirem sobre a relação entre a formação de professores e a construção da qualidade da escola pública democratizada, Leite e Di Giogi (2004, p.144), a partir da conhecida ideia de Paulo Freire ―a educação sozinha não muda a sociedade, mas esta certamente não muda sem uma mudança da educação‖ afirmam que 294 Grupo de Estudo e Pesquisas em Política Educacional, Rio Claro, 06, 07 e 08 de julho de 2011 Vol. 3 (2011)

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―a formação de professores sozinha não muda a educação, mas esta certamente não muda sem uma mudança na formação dos professores‖. Nesta perspectiva, e considerando especificamente os processos de formação contínua de professores, concordamos com os autores e acreditamos na contribuição da formação docente para a melhora da escola pública para as populações que conquistaram seu direito de adentrar esta instituição.

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297 Grupo de Estudo e Pesquisas em Política Educacional, Rio Claro, 06, 07 e 08 de julho de 2011 Vol. 3 (2011)

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ANÁLISE DO PLANO DE CARREIRA DOS PROFISSIONAIS DA EDUCAÇÃO EM MUNICÍPIOS PAULISTAS

Rita de Cascia Carminatti Bortolin [email protected] UNESP – Universidade Estadual Paulista ―Júlio de Mesquita Filho‖

Resumo: O presente trabalho analisa o plano de carreira dos docentes em municípios paulistas, municípios estes que, foram selecionados por já se inserirem no âmbito da pesquisa do Grupo de Estudos e Pesquisas em Política Educacional (GREPPE) da UNESP – Universidade Estadual Paulista ―Júlio de Mesquita Filho‖, campus de Rio Claro. O principal objetivo é o de analisar se o processo de municipalização influenciou de alguma forma a elaboração dos planos pelos municípios. Através da analise e estudo dos planos de cada município, a partir de algumas categorias a serem aprofundadas, foi possível observar maior autonomia das cidades quanto à gestão da educação e algumas diferenças entre o que foi disposto por cada plano. Palavras-chave: Municipalização. Plano de Carreira do Magistério. Políticas Educacionais.

Este trabalho se insere na pesquisa que vem sendo elaborada pelo Grupo de Estudos e Pesquisas em Política Educacional (GREPPE), desenvolvida por pesquisadores do Departamento de Educação da UNICAMP, Profª Drª Theresa Maria de Freitas Adrião e da UNESP campus Rio Claro Profª Drª Raquel Fontes Borghi; pela pesquisadora do Departamento de Psicologia da FFLCRP – Ribeirão Preto, Profª Drª Teise Garcia, e pela pesquisadora do Departamento de Administração e Economia da Educação da FEUSP, Profª Drª Lisete Regina Gomes Arelaro. A pesquisa acima citada tem como objetivo geral analisar a natureza e as conseqüências, para a oferta da educação municipal, de parcerias firmadas entre municípios paulistas e setores da esfera privada a partir da assunção pelos municípios da responsabilidade pela oferta do ensino fundamental. Farão parte da amostra municípios muito pequenos, pequenos, médios, grandes e muito grandes que estabeleceram parcerias/convênios no período de 1997 a 2006, período de vigência do FUNDEF, em três modalidades: - aquisição de material didático e assessoria pedagógica com incidência direta sobre o projeto pedagógico das escolas e da rede; 298 Grupo de Estudo e Pesquisas em Política Educacional, Rio Claro, 06, 07 e 08 de julho de 2011 Vol. 3 (2011)

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- oferta de vagas em instituições privadas subvencionadas pelo poder público; - assessorias para a gestão educacional com impacto direto sobre o modelo da oferta educativa. O objetivo inicial deste trabalho, no contexto da pesquisa que vem sendo realizada pelo GREPPE, é analisar os planos de carreira dos docentes nos municípios que estabeleceram parceria/convênio para a compra de material apostilado e assessoria pedagógica, buscando identificar possíveis interferências da instituição privada parceira nas condições de trabalho dos profissionais da educação nos seguintes municípios: Municípios Analisados Tamanho

Município

Até 10.000

Ipeúna

De 10.001 a 50.000

Brotas

De 50.001 a 100.000

Votuporanga

De 100.001 a 500.000

Taubaté

+ de 500.001

São Bernardo do Campo

Primeiramente, de acordo com Adrião (2007), tem-se como pressuposto que a implementação de parcerias é apenas uma das conseqüências das medidas estabelecidas para a reforma do estado, implantadas no país a partir dos anos 90, a qual, como resposta a uma suposta crise de eficácia da administração pública, propõe, desde então, tanto a adoção da administração gerencial, quanto à transferência para esferas locais da oferta de serviços públicos. Em segundo lugar, o processo de municipalização deixou sob a responsabilidade dos municípios e suas condições políticos/econômicas as condições de trabalho docente. São os municípios os responsáveis por estabelecerem salários, plano de carreira, regime jurídico, jornada de trabalho entre outros. Assim, a preocupação do presente estudo é verificar se as instituições privadas que estão constituindo parceiras com os municípios estão tendo alguma influência/interferência nas condições de trabalho dos profissionais da educação. Este trabalho apresenta a análise dos planos de carreira para os profissionais da educação, a análise dos os planos de carreira dos municípios de Brotas, Ipeúna, São Bernardo do Campo, Taubaté e Votuporanga de acordo com categorias pré-definidas. 299 Grupo de Estudo e Pesquisas em Política Educacional, Rio Claro, 06, 07 e 08 de julho de 2011 Vol. 3 (2011)

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CARACTERIZAÇÃO DOS MUNICÍPIOS BROTAS O município de Brotas localiza-se na região central do estado de São Paulo, limitandose com Dourado, Ribeirão Bonito, São Carlos, Itirapina, São Pedro, Torrinha e Dois Córregos. Possui cerca de 20.996 habitantes e uma área de 1.101 km²; é considerado pelo IBGE um dos maiores municípios do estado em área. O município conta com 6 (seis) creches, sendo 3 (três) municipais e 3 (três) particulares; 6 (seis) unidades de pré-escola, sendo 3 (três) municipais e 3 (três) de iniciativa privada. Em relação ao Ensino Fundamental, o município conta com 9 (nove) unidades, das quais 5 (cinco) são municipais, 2 (duas) particulares e 2 (duas) estaduais. As escolas passaram pelo processo de municipalização no ano de 2002 e o município teve seu plano de carreira elaborado em 2001, reformulado em 2005 com vigência até 2008. O Plano de Carreira de Brotas segue as disposições da Lei Complementar Municipal nº 11 de 31 de agosto de 2006. Abaixo constam os números de matrícula e de estabelecimentos em cada rede de ensino com base nos dados do Seade e Edudata28. Matrículas na Rede de Ensino Estadual de Brotas MATRICULAS INICIAIS DA REDE ESTADUAL - BROTAS ANO 1997 1998 1999 2000 CRECHE PRÉ-ESCOLA 0 0 0 EF I 906 924 EF II 1373 1288

2001 0 862 1186

2002 0 0

2003 0 0

2004 0 0

2005 0 0

2006 0 0

1042

971

1055

1171

1053

2004 49 766 1161 -

2005 49 800 1132 -

2006 59 500 1454 177

Matriculas na Rede Municipal de Brotas MATRICULAS INICIAIS DA REDE MUNICIPAL - BROTAS ANO 1997 1998 1999 2000 CRECHE 40 40 PRÉ-ESCOLA 538 531 668 606 EF I 87 181 EF II -

2001 42 615 260 -

2002 43 640 1189 -

2003 35 740 1231 -

Matriculas na Rede Privada de Brotas

28

SEADE, 2008 e EDUDATA, 2008

300 Grupo de Estudo e Pesquisas em Política Educacional, Rio Claro, 06, 07 e 08 de julho de 2011 Vol. 3 (2011)

III Seminário Internacional de Gestão Educacional MATRICULAS INICIAIS DA REDE PRIVADA - BROTAS ANO 1997 1998 1999 CRECHE 0 PRÉ-ESCOLA 42 42 56 EF I 329 EF II 107

2000 0 49 378 197

2001 77 50 370 240

2002 71 69 348 336

2003 59 65 396 401

2004 44 61 358 374

2005 59 51 326 334

2006 142 95 335 313

Conforme apresentado nas tabelas acima, verifica-se que Brotas atua na educação infantil desde 1997 e, no ensino fundamental, desde 1999, o número de matrículas cresceu consideravelmente em 2002 após o processo de municipalização do ensino – que se deu em 2001. Ainda em 2002, pode-se observar que o número de matrículas na rede estadual despencou.

IPEÚNA O município de Ipeúna localiza-se na região Centro Oeste do estado de São Paulo, limitando-se com Rio Claro, Itirapina, Charqueada, São Pedro e Piracicaba. Possui cerca de 5.164 habitantes e área de 207km², conforme dados do IBGE e do site da Prefeitura Municipal de Ipeúna (IPEÚNA, 2008). O município conta com uma creche e uma unidade de pré-escola, sendo ambas responsabilidades do município. Em relação ao Ensino Fundamental, a cidade conta com

duas

escolas, uma estadual

e a outra municipal (IPEUNA, 2008).

Conforme o site da Prefeitura Municipal de Ipeúna (2008), o município possui um Plano de Carreira para os professores em vigor desde dezembro de 2003, porém, encontra-se em análise, pois há interesse dos membros da Secretaria da Educação e dos profissionais da educação em alterá-lo. A lei vinculada ao Plano é a Lei Municipal nº 596 de 09 de dezembro

de

2003.

Abaixo constam os números de matrícula e de estabelecimentos em cada rede de ensino com base nos dados do Seade e Edudata29, observando que os dados faltantes são os que as fontes não dispunham. Matriculas na Rede Estadual de Ensino de Ipeúna

29

SEADE, 2008 e EDUDATA, 2008

301 Grupo de Estudo e Pesquisas em Política Educacional, Rio Claro, 06, 07 e 08 de julho de 2011 Vol. 3 (2011)

III Seminário Internacional de Gestão Educacional MATRICULAS INICIAIS DA REDE ESTADUAL - IPEUNA ANO 1997 1998 1999 2000 CRECHE 0 0 0 0 PRÉ-ESCOLA 0 0 0 0 EF I 0 0 0 0 EF II 401 364

2001 0 0 0 356

2002 0 0 0 366

2003 0 0 0 402

2004 0 0 0 407

2005 0 0 0 443

2006 0 0 0 444

2004 201 253 442 0

2005 76 271 436 0

2006 98 169 567 0

2004 0 0 0 0

2005 0 0 0 0

2006 0 0 0 0

Matrículas na Rede Municipal de Ensino de Ipeúna MATRICULAS INICIAIS DA REDE MUNICIPAL - IPEUNA ANO 1997 1998 1999 2000 CRECHE 78 108 PRÉ-ESCOLA 267 334 281 279 EF I 360 EF II 0 0 0 0

2001 141 250 396 0

2002 167 250 393 0

2003 144 258 419 0

Matrículas na Rede Privada de Ensino de Ipeúna MATRICULAS INICIAIS DA REDE PRIVADA - IPEUNA ANO 1997 1998 1999 2000 CRECHE 0 0 0 0 PRÉ-ESCOLA 0 0 0 0 EF I 0 0 0 0 EF II 0 0 0 0

2001 0 0 0 0

2002 0 0 0 0

2003 0 0 0 0

As tabelas apresentam que a rede estadual de ensino só possui matrículas referentes às séries finais do ensino fundamental e, como o município ainda não assumiu tais séries, o número de matrículas na rede estadual tem aumentado. Já em relação às creches municipais, vê-se um grande aumento no número de alunos matriculados próximo ao período em que ocorreu a municipalização do ensino. Na pré-escola, observa-se que as matrículas são, todas, pertencentes à rede municipal de ensino. Sendo assim, o número referente a essa série, varia conforme a demanda. Em relação às séries iniciais do ensino fundamental, deve-se notar que o número de matrículas na rede municipal tem tido um aumento constante, salientando que esse nível de ensino é somente de responsabilidade do município, não havendo unidades privadas ou estaduais.

SÃO BERNARDO DO CAMPO A cidade de São Bernardo do Campo localiza-se na região sudoeste da região metropolitana do estado de São Paulo, limitando-se com São Vicente, Cubatão, Santo André, São Caetano do Sul, Diadema e São Paulo. Possui cerca de 781.390 habitantes e uma área de 407,1 km².

302 Grupo de Estudo e Pesquisas em Política Educacional, Rio Claro, 06, 07 e 08 de julho de 2011 Vol. 3 (2011)

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O município conta com 70 creches, sendo 43 municipais e 27 particulares; 116 unidades de pré-escola, sendo 73 municipais e 43 de iniciativa privada. Em relação ao Ensino Fundamental, o município conta com 184 unidades, das quais 70 são municipais, 44 particulares e 70 estaduais. As escolas passaram pelo processo de municipalização no período de 1998 a 2002. São Bernardo do Campo teve seu plano de carreira elaborado em 26 de novembro de 1998, e segue as disposições da Lei Municipal nº 4681. Abaixo constam os números de matrícula e de estabelecimentos em cada rede de ensino com base nos dados do Seade e Edudata30, observando que os dados faltantes são os que as fontes não dispunham. Matrículas na Rede Estadual de Ensino de São Bernardo do Campo MATRICULAS INICIAIS DA REDE ESTADUAL - SÃO BERNARDO DO CAMPO ANO 1997 1998 1999 2000 2001 2002 CRECHE 0 0 0 PRÉ-ESCOLA 0 0 0 EF I 24846 23025 14023 EF II 54255 51429 49529

2003 0 0 5469 48120

2004 0 0 0 50109

2005 0 0 0 50175

2006 0 0 0 49880

Matrículas na Rede Municipal de Ensino de São Bernardo do Campo MATRICULAS INICIAIS DA REDE MUNICIPAL - SÃO BERNARDO DO CAMPO ANO 1997 1998 1999 2000 2001 2002 CRECHE 1600 1684 PRÉ-ESCOLA 23801 22458 22491 21800 21889 22028 EF I 30032 31319 39470 EF II 0 0 0

2003 1893 23615 46546 0

2004 1891 24360 49775 0

2005 2397 26194 49700 0

2006 2762 24024 49430 0

Matrículas na Rede Privada de Ensino de São Bernardo do Campo MATRICULAS INICIAIS DA REDE PRIVADA - SÃO BERNARDO DO CAMPO ANO 1997 1998 1999 2000 2001 CRECHE 554 PRÉ-ESCOLA 2500 2191 2060 1994 2499 EF I 5974 5892 EF II 6719 6818

2002 563 2493 6041 7110

2003 631 2707 6389 7139

2004 608 2848 6673 7271

2005 794 2845 6713 7594

2006 774 2395 7513 7968

Pode-se observar que as matrículas na rede estadual, em relação às séries iniciais e finais do ensino fundamental, reduziram consideravelmente, principalmente no período de 2003, quando o município passou pelo processo de assunção da responsabilidade pelas unidades de ensino. No mesmo período, nota-se que não há matrículas no nível do ensino infantil.

30

SEADE, 2008 e EDUDATA, 2008

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III Seminário Internacional de Gestão Educacional

Na rede municipal, tem-se um aumento geral no número de matrículas no nível de educação infantil, um grande aumento em relação às séries iniciais do ensino fundamental, e a manutenção do número de alunos nas séries finais do ensino fundamental que, como discutido anteriormente, é de responsabilidade do estado. Quanto à rede privada, nota-se que, no geral, os números se mantiveram nos níveis de educação infantil, enquanto que, no ensino fundamental, houve um aumento de matrículas tanto nas séries iniciais quanto nas finais.

TAUBATÉ O município de Taubaté localiza-se na região do Vale do Paraíba, possuindo cerca de 265.514 habitantes e uma área de 625,9 km². Faz fronteira com Monteiro Lobato, Tremembé, Pindamonhangaba, Caçapava, Redenção da Serra, Lagoinha, São Luís do Paratininga. O município conta com 91 creches, sendo 53 municipais e 38 particulares; 113 unidades de pré-escola, sendo 68 municipais e 45 de iniciativa privada. Em relação ao Ensino Fundamental, o município conta com 98 unidades, das quais 46 são municipais, 30 particulares e 22 estaduais. As escolas passaram pelo processo de municipalização em 1998. Taubaté ainda não possui um plano de carreira para o magistério, pois segundo a Secretaria de Educação do município, o estatuto ainda está sendo discutido. Abaixo constam os números de matrícula e de estabelecimentos em cada rede de ensino com base nos dados do Seade e Edudata31, observando que os dados faltantes são os que as fontes não dispunham. Matrículas na Rede Estadual de Ensino de Taubaté MATRICULAS INICIAIS DA REDE ESTADUAL - TAUBATE ANO 1997 1998 1999 2000 CRECHE 0 0 PRÉ-ESCOLA 0 0 EF I 10485 9305 EF II 14591 13350

2001 0 0 7805 10607

2002 0 0 5175 9238

2003 0 0 3401 7540

2004 0 0 2790 6331

2005 0 0 796 5262

Matrículas na Rede Municipal de Ensino de Taubaté

31

SEADE, 2008 e EDUDATA, 2008

304 Grupo de Estudo e Pesquisas em Política Educacional, Rio Claro, 06, 07 e 08 de julho de 2011 Vol. 3 (2011)

2006 0 0 670 3787

III Seminário Internacional de Gestão Educacional MATRICULAS INICIAIS DA REDE MUNICIPAL - TAUBATE ANO 1997 1998 1999 2000 CRECHE 873 489 PRÉ-ESCOLA 5956 5875 6153 7717 EF I 5954 6988 EF II 3686 4583

2001 902 7469 8507 6885

2002 974 8205 11496 8226

2003 1072 10094 13216 9230

2004 2029 10624 13864 2929

2005 1466 8578 15767 3006

2006 1850 5756 16164 3033

2004 730 2167 3002 2929

2005 918 1981 3043 3006

2006 868 1669 3074 3033

Matrículas na Rede Privada de Ensino de Taubaté MATRICULAS INICIAIS DA REDE PRIVADA - TAUBATE ANO 1997 1998 1999 2000 CRECHE 563 467 PRÉ-ESCOLA 1929 1838 1783 1816 EF I 3076 2916 EF II 3329 3327

2001 572 1828 3016 3211

2002 721 2228 3069 3095

2003 769 2157 3033 2993

As tabelas indicam que as matrículas na rede estadual caíram consideravelmente, uma vez que o estado tinha sob sua responsabilidade somente as séries iniciais e finais do ensino fundamental. Ao mesmo tempo, principalmente entre 2003 e 2004, houve uma explosão de matrículas na rede municipal nesse nível de ensino. Na rede privada, tanto o ensino infantil quanto o fundamental não tiveram grandes mudanças em relação ao número de matrículas. Na rede municipal, é possível observar um bom aumento no número de matrículas na educação infantil. Conforme citado anteriormente, o processo de municipalização em Taubaté iniciou-se em 1998 e, até 2006, fim do período estudado, há um crescimento constante das matrículas na rede municipal de ensino.

VOTUPORANGA O município de Votuporanga localiza-se na região noroeste do estado de São Paulo, limitando-se com Parisi, Álvares Florence, Sebastianópolis do Sul, Nhadeara, Floreal, Magda, Cosmorama e Valentim Gentil. Possui cerca de 77.622 habitantes e uma área de 422,9 km². O município conta com 20 creches, sendo 13 municipais e 7 (sete) particulares; 26 unidades de pré-escola, sendo 14 municipais e 12 de iniciativa privada. Em relação ao Ensino Fundamental, o município conta com 26 unidades, das quais 11 são municipais, 5 particulares e 10 estaduais. As escolas passaram pelo processo de municipalização em 1999. Votuporanga teve seu plano de carreira elaborado em 11 de dezembro de 2001, e segue as disposições da Lei Complementar nº 40.

305 Grupo de Estudo e Pesquisas em Política Educacional, Rio Claro, 06, 07 e 08 de julho de 2011 Vol. 3 (2011)

III Seminário Internacional de Gestão Educacional

Abaixo constam os números de matrícula e de estabelecimentos em cada rede de ensino com base nos dados do Seade e Edudata32, observando que os dados faltantes são os que as fontes não dispunham. Matriculas na Rede Estadual de Ensino de Votuporanga MATRICULAS INICIAIS DA REDE ESTADUAL - VOTUPORANGA ANO 1997 1998 1999 2000 CRECHE 0 0 0 0 PRÉ-ESCOLA 0 0 0 0 EF I 0 0 0 3176 EF II 5239 5161

2001 0 0 3087 4892

2002 0 0 1836 4774

2003 0 0 84 4550

2004 0 0 87 4407

2005 0 0 78 4392

2006 0 0 77 4434

2005 554 2074 4125 0

2006 710 1058 4794 0

2005 80 396 642 769

2006 129 523 751 767

Matrículas na Rede Municipal de Ensino de Votuporanga MATRICULAS INICIAIS DA REDE MUNICIPAL - VOTUPORANGA ANO 1997 1998 1999 2000 CRECHE 310 280 PRÉ-ESCOLA 1641 1440 1387 1453 EF I 1107 EF II 0 0 0 0

2001 288 1462 1155 0

2002 202 1494 2467 0

2003 386 1844 4102 0

2004 441 1928 4141 0

Matrículas na Rede Privada de Ensino de Votuporanga MATRICULAS INICIAIS DA REDE PRIVADA - VOTUPORANGA ANO 1997 1998 1999 2000 CRECHE 0 0 0 0 PRÉ-ESCOLA 72 64 57 109 EF I 0 0 0 851 EF II 0 0 757 845

2001 151 393 847 853

2002 96 493 797 812

2003 97 445 731 788

2004 82 418 708 760

Pode-se verificar que o governo do estado apenas cuidava do ensino fundamental e, ao longo do período analisado, em decorrência do processo de municipalização que ocorreu em 2000, o número de matrículas diminuiu consideravelmente. Já na rede municipal, observa-se um grande aumento no número de matrículas em todos os níveis de ensino e, na rede privada, o município teve um aumento de alunos na educação infantil, apresentando uma leve queda no número de educandos nas séries iniciais do ensino fundamental e um constante número nas séries finais do mesmo nível de ensino.

ANÁLISE DOS PLANOS DE CARREIRA DOS MUNICÍPIOS Foram analisadas as disposições dos Planos de Carreira dos Municípios de Brotas, Ipeúna, São Bernardo do Campo e Votuporanga. Taubaté ainda não possui um Plano, pois seu estatuto ainda está em discussão pelos profissionais da educação e governantes 32

SEADE, 2008 e EDUDATA, 2008

306 Grupo de Estudo e Pesquisas em Política Educacional, Rio Claro, 06, 07 e 08 de julho de 2011 Vol. 3 (2011)

III Seminário Internacional de Gestão Educacional

do município. Assim, para os quatro municípios que o possuem, serão analisadas segundo categorias pré-definidas mais adiante. Conforme apresentado anteriormente, os planos de carreira deveriam ser elaborados em um prazo de seis meses de vigência da Lei nº 9424/96 com base em diretrizes provindas do Conselho Nacional de Educação. Porém, essas diretrizes só foram aprovadas quase três meses após o fim do prazo estipulado pela Lei. O Ministério da Educação, por iniciativa do Projeto Nordeste/FUNDESCOLA, elaborou e distribuiu o material intitulado ―Plano de Carreira e Remuneração do Magistério Público‖ no ano de 2000, a partir dos dispostos nas diretrizes da Resolução nº 03/97 e na LDB nº 9394/96 para a elaboração de planos de carreira. É um material abrangente no qual são apresentadas desde a contextualização legal até as mais diversas possibilidades para implementação dessas diretrizes. O documento do MEC em questão trata de vários temas para discussão, dos quais se destacam abaixo alguns assuntos que serão objetos de estudo neste trabalho: Regime Jurídico Abrangência do Plano de Carreira Cargos na Carreira Formação para o Magistério Remuneração no novo plano de carreira Jornada de Trabalho Vantagens na Carreira Progressão na Carreira REGIME JURÍDICO De acordo com BRASIL (2000), até a promulgação da Constituição Federal de 1988, predominava o entendimento de que a administração pública podia adotar o regime estatuário ou o celetista para seus servidores. Após a promulgação da Constituição, a União, os Estados, o Distrito Federal e os Municípios instituíram o regime jurídico único, em atendimento ao disposto no art. 39, via de regra com a adoção do regime estatuário. Porém, a Emenda Constitucional nº 19/98 retirou do texto constitucional a

307 Grupo de Estudo e Pesquisas em Política Educacional, Rio Claro, 06, 07 e 08 de julho de 2011 Vol. 3 (2011)

III Seminário Internacional de Gestão Educacional

referência ao regime jurídico único, dando a entender a possibilidade de adoção de um ou outro regime, ou de ambos. Para melhor compreensão das diferenças entre os dois regimes, o Documento do MEC, distribuído aos municípios como orientação para a elaboração dos planos de carreira, apresenta um quadro comparativo. Suas principais características seguem abaixo: Comparativo entre os regimes jurídicos, estatutário e celetista Regime

Ingresso Benefícios

Regime Estatutário Instituído por lei (da União, dos Estados, do Distrito Federal ou dos Municípios), em relação ao respectivo servidor. Por concurso público (art. 37, II da Constituição). Estabilidade do servidor após três anos de efetivo exercício. Possibilidade de perda do cargo, previstas na Constituição Federal.

Aposentadoria Pelo próprio poder público.33

Regime Celetista Sujeito a alterações por lei federal. A adoção do regime é determinada por lei local. Por concurso público (art. 37, II da Constituição). Direito a: 1- Fundo de garantia (FGTS). 2- Aviso prévio. 3- Seguro-desemprego. A ausência de estabilidade não submete o servidor à dispensa imotivada. Aposentadoria pelo regime geral da previdência social. (INSS).

Fonte: BRASIL, 2000, p. 13

O texto do Documento induz a acreditarmos que o regime celetista seria o mais indicado, pois são apresentados vários elementos que sugerem a vantagem de se adotar esse regime. Em prol do regime estatuário, há o argumento de que este possui o menor custo financeiro imediato, ―uma vez que não obriga o Poder Público em relação a encargos peculiares do regime celetista (como FGTS, o aviso prévio e o seguro desemprego)‖ (BRASIL, 2000, p.12). Em contrapartida, o regime estatutário é criticado por gerar obrigações futuras, com o ônus de aposentadorias e pensões. Dessa forma, enquanto o regime estatutário tende a adiar uma parcela significativa dos encargos financeiros que cabem a ele, o regime celetista apresenta mais encargos imediatos. 33

A reforma da previdência (Emenda Constitucional n.º 20/98) introduz modificações no direito à aposentadoria do servidor público e do trabalhador rural e urbano.

308 Grupo de Estudo e Pesquisas em Política Educacional, Rio Claro, 06, 07 e 08 de julho de 2011 Vol. 3 (2011)

III Seminário Internacional de Gestão Educacional

Com referência novamente ao quadro, é possível destacar um primeiro ponto relativo aos regimes jurídicos, a Constituição reserva à União a competência para legislar sobre o direito do trabalho (art. 22, I). Com a adoção do regime celetista, o município, de certa forma, abre mão de sua capacidade constitucional de legislar sobre seu pessoal, no que se refere aos direitos e obrigações constantes da Consolidação das Leis do Trabalho – CLT. A opção pelo regime trabalhista tem efeito considerável para o Município, como se colocar sob alcance da Justiça do Trabalho, na apreciação de controvérsias sobre questões

trabalhistas

dos

servidores.

O segundo ponto apresentado no quadro define a obrigação universal de submissão ao concurso

público,

independentemente

do

regime

jurídico.

Segundo BORGHI (2005), um dos grandes problemas é que a ausência da estabilidade pode ensejar desmandos político-administrativos, pondo em risco o cargo do servidor, ainda que se trate de um bom profissional. A aposentadoria, próximo ponto tratado no quadro, deve ser considerada com as alterações constitucionais que lhe dizem respeito. Conforme a Emenda Constitucional nº 20/98, as regras de aposentadoria até então vigentes são garantidas para os servidores que tenham todos os requisitos completos para a aposentadoria, de forma integral. E àqueles que ainda estão em processo de aposentadoria, ou seja, para os que deram entrada no processo de aposentadoria ao longo de alterações feitas pelo município em relação ao regime jurídico, cabem as normas de transição. Para os servidores que ingressarem no serviço público após a homologação da Emenda, o poder público adotará as mesmas regras de aposentadoria do INSS, desde que institua regime de previdência complementar para seus servidores titulares de cargo efetivo, aplicável a tais servidores por opção (Borghi, 2005). Dessa forma, a mudança aponta na direção da adoção de tratamento igualitário quanto à aposentadoria, nivelando os servidores públicos aos trabalhadores em geral. Nos Planos de Carreira de Ipeúna, Brotas e Votuporanga, consta que, os integrantes da Carreira do Magistério Público Municipal e Servidores serão regidos pela Consolidação das Leis do Trabalho (CLT) enquanto que São Bernardo do Campo apresenta que seus integrantes se incluem no Quadro de Pessoal Estatutário, utilizando-se do regime celetista, apenas, para a contratação de professores substitutos. Podemos relacionar a 309 Grupo de Estudo e Pesquisas em Política Educacional, Rio Claro, 06, 07 e 08 de julho de 2011 Vol. 3 (2011)

III Seminário Internacional de Gestão Educacional

tabela com a interferência no processo de municipalização, através do qual o número de profissionais estatutários tem diminuído consideravelmente. ―Em longo prazo, os Estados deixam de gastar com aposentadorias e pensões de grande parte dos profissionais da educação, particularmente de primeira a quarta séries, transferindo esses encargos aos Municípios ou ao INSS‖. (BORGHI, 2007). Regime Jurídico por Município Regime Jurídico Ipeúna Brotas São Bernardo do Campo Votuporanga

Celetista Celetista Estatutário Celetista

ABRANGÊNCIA DO PLANO DE CARREIRA Em relação à abrangência do plano de carreira, é discutido no Documento do MEC se o plano de carreira municipal deve incluir somente os profissionais do magistério (docentes e pessoal de suporte pedagógico) ou todos os trabalhadores da educação (conjunto de trabalhadores que atuam na educação, nas instituições de ensino e órgãos de educação, em atividades-fim ou atividades-meio, inclusive pessoal de apoio técnicoadministrativo como motorista, vigia, servente, secretários de escola, etc.), somente os profissionais do ensino fundamental ou de toda a educação básica (educação infantil, ensino fundamental e ensino médio). Atualmente, com o FUNDEB, 60% (sessenta por cento) dos recursos devem ser aplicados na remuneração dos profissionais do magistério público da educação básica. Desse modo, esta questão estaria resolvida. Porém, discute-se abaixo como os municípios pesquisados abordam o tema da abrangência. O Plano de Carreira do Município de Brotas, em seu Art. 5º, dispõe que a abrangência do plano se estende aos profissionais da educação, que exercem atividades de Docência e Coordenação Escolar e também aos profissionais que prestam suporte pedagógico como Direção, Assistente de Direção, Supervisão e Coordenação Pedagógica, nas Unidades Escolares Municipais.

310 Grupo de Estudo e Pesquisas em Política Educacional, Rio Claro, 06, 07 e 08 de julho de 2011 Vol. 3 (2011)

III Seminário Internacional de Gestão Educacional

Em Ipeúna, o Plano de Carreira do Município, em seu Art. 2º, explicita que a Lei aplicase aos profissionais que exercem atividades de Docência e aos que oferecem Suporte Pedagógico direto a tais atividades, os quais são encarregados de ministrar, planejar, inspecionar, supervisionar, orientar e administrar a educação básica. Em São Bernardo do Campo, o Plano de Carreira, em seu Art. 9º, regulamenta que o plano abrangerá a Carreira de Professor de Educação Básica, Professores da Educação Especial e ainda, Direção, Administração do Ensino e Orientadores Pedagógicos que, atuarão na área de orientação, planejamento e supervisão do Ensino Municipal. O Plano de Carreira de Votuporanga, em seu Art. 5º, divide a abrangência de seu documento em duas classes: a classe docente, composta por professores de Educação Básica e, a classe de suporte pedagógico composta pelos Coordenadores Pedagógicos, Coordenadores do Centro Municipal de Educação, Vice-Diretor de Escola, Diretor e Supervisor de Ensino. Em todos os Planos a abrangência inclui todos os profissionais da Educação Municipal, o que vai diferenciar os Planos é na forma com a qual distribuem seus Cargos no Magistério como veremos a seguir. CARGOS NA CARREIRA DO MAGISTÉRIO A discussão central no Documento refere-se a duas opções relativas a cargos e carreiras. A primeira, de cargo único de professor e, a segunda, de cargos diferenciados. um único cargo de professor, ao qual correspondem todas as funções de magistério, exercidas de acordo com a habilitação do titular do cargo; cargos diferenciados, sendo um de professor e outro de profissionais de apoio à docência. Mesmo apresentando as duas opções, o Documento faz claramente a defesa do cargo único: A definição de um cargo único de professor é a opção que melhor atende ao princípio de que a docência seja, de fato, o foco de toda a atividade do magistério, na medida em que todos os profissionais da educação são, em primeiro lugar, docentes e podem, como uma segunda atividade, exercer funções de apoio à docência. [...] Tal opção preserva a unidade do trabalho escolar, favorece a integração dos docentes com aqueles que estão no exercício do apoio pedagógico e

311 Grupo de Estudo e Pesquisas em Política Educacional, Rio Claro, 06, 07 e 08 de julho de 2011 Vol. 3 (2011)

III Seminário Internacional de Gestão Educacional assegura, a partir do foco na docência, a identidade profissional dos integrantes do magistério (BRASIL, 2000, p.30).

Os cargos na carreira do magistério nos planos de carreira analisados são dispostos da seguinte maneira: Cargos na Carreira por Município Cargos na Carreira Ipeúna Diferenciado Brotas Único São Bernardo do Campo Diferenciado Votuporanga Único FORMAÇÃO PARA O MAGISTÉRIO Segundo o Art. 62 da LDB, a formação exigida para os profissionais da educação básica é a de nível superior, em curso de licenciatura, de graduação plena, em universidades e institutos superiores de educação, admitida, como formação mínima para o exercício do magistério na educação infantil e nas quatro primeiras séries do ensino fundamental, a oferecida em nível médio, na modalidade Normal. Quanto à formação para o Ensino Médio, a LDB, ainda no Art. 62, estabelece que os docentes que atuarão nesse nível de ensino deverão possuir formação em curso superior, sendo licenciatura de graduação plena. Mesmo assim, sabe-se que há ainda muitos docentes que não possuem essa habilitação, nem na rede pública nem na privada. No Plano de Carreira do Município de Brotas, a Formação exigida para exercício de Docência na Educação Infantil e Fundamental é de Curso Normal em Nível Superior ou Licenciatura de Graduação Plena em Pedagogia, sendo admitido excepcionalmente o Curso Normal de Nível Médio até o termino da década da educação. Já para o Ensino Médio apenas serão aceitas as graduações em Curso Superior, Licenciatura Plena, com habilitação exclusiva em área própria ou formação superior em área correspondente. Em Ipeúna, o Plano de Carreira traz como requisitos para a formação de docentes do Ensino Infantil e Ensino Fundamental a formação em Curso Normal em Nível Médio ou Superior ou Licenciatura de Graduação Plena em Pedagogia. Para o Ensino Médio é exigida a formação em Curso Superior, Licenciatura de Graduação Plena, com habilitação especifica em área própria ou formação superior em área correspondente. 312 Grupo de Estudo e Pesquisas em Política Educacional, Rio Claro, 06, 07 e 08 de julho de 2011 Vol. 3 (2011)

III Seminário Internacional de Gestão Educacional

O Plano de São Bernardo do Campo estabelece que para a Educação Infantil, Ensino Fundamental e Ensino Médio é necessária a habilitação específica em magistério em Nível de Ensino Médio, ou Curso Superior em Pedagogia com Licenciatura Plena. Votuporanga apresenta em seu Plano de Carreira que a formação exigida para a Educação Infantil e Ensino Fundamental deve ser de Licenciatura de Graduação Plena ou Curso Normal em Nível Médio ou Superior, enquanto que, para o docente do Ensino Médio é exigida a Licenciatura de Graduação Plena, com habilitação especifica em área própria ou formação superior em área correspondente. Dessa forma, é possível observar que apenas Brotas estipula um fim para a contratação de docentes com formação apenas em nível de Ensino Médio, enquanto que, os outros municípios aceitam essa formação para exercício da atividade docente dos primeiros níveis de Ensino sem prazo para a exigência de nível superior. É possível observar também que o requisito de formação para a docência no Ensino Médio, tem sido a de Nível Superior em todos os municípios. De acordo com dados do Edudata, nota-se que cada vez mais o número de professores com formação no nível médio tem diminuído, ao passo que a formação em nível superior tem crescido consideravelmente. Vale à pena ressaltar que atualmente são oferecidos cursos com titulação superior dos mais diversos tipos, como ensino superior a distancia, ensino superior em curto prazo, entre outros. Portanto, não se pode garantir a melhora da qualidade de ensino apenas pelo o que mostram os certificados apresentados pelos professores; é necessária uma formação contínua e avaliação do desempenho dos professores constantemente. REMUNERAÇÃO NO NOVO PLANO DE CARREIRA O MEC, através do Documento distribuído aos municípios em 2000 para orientação na elaboração dos Planos de Carreira, discute a questão da remuneração em torno do piso salarial e retoma que a Constituição Federal, em seu art. 206, VII e a LDB nº 9394/96, art. 67, dispõem sobre a existência de planos de carreira para o magistério público, com piso salarial profissional. Frente a essas disposições, a CNTE – Confederação Nacional dos Trabalhadores da Educação - defende um piso salarial de abrangência nacional, uma vez que a profissão se estrutura nacionalmente, com as exigências de qualificação mínima definidas em lei 313 Grupo de Estudo e Pesquisas em Política Educacional, Rio Claro, 06, 07 e 08 de julho de 2011 Vol. 3 (2011)

III Seminário Internacional de Gestão Educacional

federal. A oposição ao piso nacional argumenta que a Constituição relaciona o piso salarial com os planos de carreira – expressão colocada no plural, cabendo a cada sistema de ensino, de acordo com a nova LDB, a elaboração do seu. Segundo BORGHI (2005, p. 75), no Estado de São Paulo, até o momento, não se tem visto nenhuma mobilização nesse sentido. A fragmentação e diferenciação salarial e contratual entre os diversos Municípios podem ser mais interessantes para desmobilizar os profissionais da educação em suas lutas por melhores condições de trabalho. No âmbito federal, a Lei nº 11.738/08 prevê que o piso salarial profissional para os profissionais do magistério público da educação básica será de R$ 950,00 (novecentos e cinqüenta reais) mensais, para a formação em Nível Médio, na modalidade Normal. Abaixo desse piso, a União, os Estados, o Distrito Federal e os Municípios não poderão fixar o vencimento inicial das carreiras do magistério público da educação básica para a jornada de, no máximo, 40 (quarenta) horas semanais. O Art. 5º acrescenta ainda que o piso salarial será atualizado anualmente, no mês de janeiro, a partir do ano de 2009. Como meio facilitador da análise, será utilizada, como base para os cálculos de remuneração, a carga horária de 30 (trinta) horas nos municípios. Salário-Base dos Profissionais do Magistério Público por Município Salário-Base Ipeúna Brotas São Bernardo do Campo Votuporanga

R$ 786,37 R$ 1.114,68 R$ 2.646,08 R$ 1.533,08

JORNADA DE TRABALHO Em 1996, a legislação, pela primeira vez, abordou a jornada de trabalho dos integrantes do magistério: A LDB (art. 67, II) determina que os novos planos de carreira devam assegurar um ―período reservado a estudos, planejamento e avaliação, incluído na carga de trabalho‖. Recentemente, a Lei nº 11.738/08 estabelece que, na composição da jornada de trabalho, observar-se-á o limite máximo de 2/3 (dois terços) da carga horária para o desempenho das atividades de interação com os educandos. O Art. º27 do Plano de Carreira de Brotas traz em seu Inciso II que 314 Grupo de Estudo e Pesquisas em Política Educacional, Rio Claro, 06, 07 e 08 de julho de 2011 Vol. 3 (2011)

III Seminário Internacional de Gestão Educacional No Ensino Fundamental a Jornada será de 30 (trinta) horas de trabalho semanal [...] composta por 25 (vinte e cinco) horas em atividades com os alunos e, 5 (cinco) horas de trabalho Pedagógico, das quais, 2 (duas) horas de Trabalho pedagógico na escola e 3 (três) horas em local de livre escolha pelo docente. Em Ipeúna o Plano de Carreira do Município regulamenta a Jornada de Trabalho em seu

Art. º20, Inciso II de forma semelhante à de Brotas: Jornada mínima de 30 (trinta) horas de trabalho semanais, destinadas a Docentes da Educação Básica e Especial [...] composta por:

a)

25 (vinte e cinco) horas em atividades com alunos

b)5 (cinco) horas de trabalho pedagógico, das quais 2 (duas) horas em trabalho pedagógico coletivo na escola, 3 (três) horas em local de livre escolha pelo docente.

Em São Bernardo do Campo a Jornada de Trabalho é explicitada na Tabela I do Plano de Carreira do Município da seguinte forma: Para os professores de Educação Básica e Ensino Fundamental, a carga horária de 30 (trinta) horas é dividida em 25 (vinte e cinco) horas para atividades em sala de aula, 3 (três) horas para atividade coletiva na escola e 2 (duas) horas para atividade em local de livre escolha.

Votuporanga não explicita a Jornada de 30 (trinta) horas, utilizada como base, porem seu Plano de Carreira dispõe sobre a carga de 20 (vinte) e 25 (vinte e cinco) horas e contempla dentro dessas jornadas o respectivo tempo para trabalho pedagógico. Como exemplo, o Art. º26 em seu Inciso II apresenta: Jornada Básica de Trabalho Docente, composta por: a) 25 (vinte e cinco) horas em atividades regulares com aluno b) 2 (duas) horas de trabalho pedagógico na escola c) 3 (três) horas de atividades de recuperação, reforço e outras

Em relação ao local do trabalho pedagógico, Votuporanga, através do seu Plano, dispõe que o mesmo pode ser realizado na escola ou em outro local da rede municipal de ensino. Os planos de carreira dos quatro municípios apresentam algumas opções de jornadas de trabalho (24 (vinte e quatro) horas, 30 (trinta) horas, 40 (quarenta) horas). Contudo, independentemente da carga horária, todos os planos tratam da destinação de horas da prática docente para o trabalho pedagógico coletivo e individual.

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VANTAGENS NA CARREIRA O Documento do MEC descreve que, além do salário ou vencimento, retribuição pecuniária pelo exercício do cargo público, o profissional pode receber vantagens que, somadas ao primeiro, totalizam sua remuneração. Essas vantagens constituem-se em indenizações, gratificações e adicionais. - Indenizações: são valores devidos ao servidor em virtude de deslocamentos ou viagens a serviço, sendo as três mais comuns: ajuda de custo, transportes e diárias. As indenizações não se incorporam à remuneração. - Gratificações: são de natureza transitória e não se incorporam à remuneração, a não ser que a lei determine expressamente o contrário. São vantagens concedidas aos servidores que estão prestando serviços próprios da função em condições anormais, ou concedidas aos servidores que apresentem encargos pessoais ou situações individuais que a lei especifica. No primeiro caso, trata-se de gratificação que visa a compensar o servidor pelo exercício de função própria do cargo em condições especiais (difícil acesso até a escola); no segundo, trata-se de gratificação pelo exercício da função que, não sendo própria do cargo, deve ser desempenhada por servidor publico efetivo, tais como as funções de direção, chefia e assessoramento. Há, portanto, diferentes espécies de gratificações, como as compensatórias e as por função. - Adicionais: são vantagens pecuniárias que a administração consente aos servidores em razão do tempo de exercício – ―adicional por tempo de serviço‖, trata-se de uma vantagem pecuniária automática a cada número de anos de efetivo exercício; há planos de carreira que tratam essa periodicidade como anuênios, ou biênios, ou triênios ou qüinqüênios, ou, em face da natureza peculiar da função que exige conhecimentos especializados ou regime próprio de trabalho. Neste último caso, incluem-se o ―adicional por dedicação exclusiva‖ ao sistema de ensino que é um adicional concedido aos profissionais que apenas se dedicam ao exercício do magistério e, quando for o caso, o ―adicional por titulação‖, que é concedido quando o profissional possui títulos como o de pós-graduação stricto sensu (mestrado e doutorado). A maioria dos adicionais, como o de tempo de serviço e o de titulação, tem caráter permanente e, por isso, são incorporáveis.

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Vantagens da Carreira do Magistério por Município

Ipeúna Brotas São Bernardo do Campo Votuporanga

Vantagens Indenização Gratificação, Adicional e Indenização Indenização Gratificação e Indenização

PROGRESSÃO NA CARREIRA A estrutura básica da carreira corresponde a sua linha de progressão, com a definição de posicionamentos escalonados e das condições de mudança de uma para outra dessas posições. A organização de carreiras no serviço público implica tradicionalmente a distribuição dos cargos efetivos, referentes a uma determinada atividade profissional, em ―classes‖. Por sua vez, as classes constituem degraus na carreira, correspondentes a conjuntos de cargos iguais em responsabilidades e vencimentos. A passagem de uma classe para outra se constitui em uma forma de progressão conhecida como ―promoção‖ na carreira. A promoção deve ocorrer periodicamente, podendo ser, por exemplo, anual ou a cada dois anos, o que deve ser definido no plano de carreira. Além da progressão, quando for o caso, por alteração de nível de titulação, a estrutura básica da carreira do magistério deve corresponder ao tratamento a ser dado aos incentivos de progressão por qualificação do trabalho docente, previstos na Resolução nº 03/97 (art. 6º, VI). Para a progressão na carreira, em cada município da amostra, foram verificados os seguintes quesitos: Requisitos Para Progressão na Carreira do Magistério por Município Município Brotas Ipeúna São Bernardo do Campo Votuporanga

Avaliação de Desempenho

Qualificação

X X X X

X X X

Permanência

X X X

Conforme a tabela, para todos os municípios analisados, os Planos incluem a avaliação de desempenho como condição fundamental para a progressão na carreira do 317 Grupo de Estudo e Pesquisas em Política Educacional, Rio Claro, 06, 07 e 08 de julho de 2011 Vol. 3 (2011)

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magistério. É importante destacar que, em Brotas, independente do tempo de permanência na escola, se o profissional não for bem na avaliação, ele não pode receber sua progressão. O município adota esse quesito da avaliação e a qualificação adicional como principais fatores para a progressão dos professores e profissionais da educação.

CONSIDERAÇÕES FINAIS Com base no processo de municipalização do ensino e a luta pela valorização do magistério, elabora-se todo um aparato legal que tem como objetivo a valorização do magistério destacando a criação do FUNDEB que, apesar de ser um fundo voltado para a valorização do magistério, destinando uma parcela de seus recursos para a remuneração dos profissionais da educação em efetivo exercício no ensino fundamental público e, ademais, regulamentando a necessidade de elaboração de planos de carreira, o que se percebe é uma estagnação da qualidade da educação e, conseqüentemente, da qualidade das condições de trabalho dos profissionais. O Ministério da Educação, por iniciativa do Projeto Nordeste/FUNDESCOLA, elaborou e distribuiu aos municípios um documento intitulado: ―Plano de Carreira e Remuneração do Magistério Publico‖ (BRASIL, 2000). Esse documento apresenta as disposições para que os municípios possam elaborar seus planos de carreira. Os municípios passaram, então, a formular e a implementar seus Planos e a ser responsáveis pelas regulamentações da carreira docente, estipulando jornada de trabalho, remuneração, regime jurídico, vantagens, e outros. Também foram apresentados os municípios analisados (Brotas, Ipeúna, São Bernardo do Campo, Taubaté e Votuporanga), incluindo uma breve caracterização de cada, bem como os números correspondentes às matriculas da Educação Básica. A partir dos dados, foi possível concluir que o número de matrículas teve um grande aumento durante o processo de municipalização do ensino nas cidades e que a maior queda ficou nas unidades estatais. Ao longo deste trabalho, foram analisadas sete categorias dos Planos de Carreira dos municípios em questão (com exceção de Taubaté, que ainda não possui seu Plano). Foram elas: Regime Jurídico, Abrangência do Plano de Carreira, Cargos na Carreira, Formação para o Magistério, Remuneração, Jornada de Trabalho, Vantagens na Carreira 318 Grupo de Estudo e Pesquisas em Política Educacional, Rio Claro, 06, 07 e 08 de julho de 2011 Vol. 3 (2011)

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e Progressão na Carreira. Através da leitura dos Planos foram explicitadas as diferenças e semelhanças entre eles. A partir das análises realizadas neste trabalho observa-se que ainda há muito a estudar e melhorar em relação à carreira docente e à valorização do magistério e, portanto, sugere-se a continuação de pesquisas nesta área. Recomenda-se a analise da influência da terceirização de serviços privados na escola pública e o impacto das parcerias sobre o trabalho dos docentes.

REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS ADRIÃO. T.; Estratégias municipais para a oferta da educação básica: uma análise de parcerias público-privado no Estado de São Paulo. Rio Claro, 2007. Mimeo. BORGHI, R. F. (Org.); PEREZ, M. C. A. (Org.). Educação: políticas e práticas. 1. ed. São Carlos: Suprema, 2007. v. 500. BORGHI, R. F. Municipalização do ensino fundamental e valorização docente. Educação Unisinos, v. 11, n.3, PP. 165-173. 292p BRASIL. Diário Oficial da União. Constituição da República Federativa do Brasil. Brasília, Senado Federal, 1988.292 p. BRASIL. Lei nº. 9.394, de 20 de dezembro de 1996. Estabelece as diretrizes e bases da educação nacional. Diário Oficial da União, Ano CXXXIV, nº. 248, Brasília, DF, 1996a. pp. 27.833-27.841. BRASIL. Lei n.º. 9424 de 24 de dezembro de 1996. Dispõe sobre o Fundo de Manutenção e Desenvolvimento do Ensino Fundamental e de Valorização do Magistério. Diário Oficial da União. Brasília, DF, seção 1, 1996b. pp.28442-28444. BRASIL. Emenda Constitucional nº. 14, de 12 de setembro de 1996. Modifica os Art. 34, 208, 211 e 212 da Constituição Federal, e dá nova redação ao Art 60 do Ato das Disposições Constitucionais Transitórias. Diário Oficial da União. Brasília, DF, seção 1, 1996c. pp. 28442-28444. BRASIL. Resolução CNE/CEB n.º 03 de 03 de setembro de 1997. Estabelece Diretrizes para os Novos Planos de Carreira e Remuneração do Magistério dos Estados, do Distrito Federal e dos Municípios. Diário Oficial da União. Brasília, DF, seção 1, 1997. p. 22987. BRASIL. Emenda Constitucional nº. 19, de 1998. Modifica o regime e dispõe sobre princípios e normas da Administração Pública, servidores e agentes políticos, controle de despesas e finanças públicas e custeio de atividades a cargo do Distrito Federal, e dá outras providências. Diário Oficial da União. Brasília, DF, n. 109-E, 1998. p.1-3, seção I. 319 Grupo de Estudo e Pesquisas em Política Educacional, Rio Claro, 06, 07 e 08 de julho de 2011 Vol. 3 (2011)

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O PROGRAMA SÃO PAULO FAZ ESCOLA E O TRABALHO DOCENTE: O CASO DE UMA ESCOLA PÚBLICA DE RIO CLARO

Amanda Polato [email protected] Universidade Estadual Paulista ―Julio de Mesquita Filho‖ – Unesp – Campus Rio Claro

Maria Aparecida Segatto Muranaka [email protected] Universidade Estadual Paulista ―Julio de Mesquita Filho‖ – Unesp – Campus Rio Claro

Resumo: O artigo discute as mudanças ocorridas no trabalho docente com a implantação do Programa São Paulo Faz Escola, pela Secretaria de Educação do Estado (SEE), nas escolas públicas estaduais de educação básica, em 2008. Para tanto, tece um paralelo com as políticas educacionais ocorridas desde a década de 1990, com a Reforma de Estado, e as relações do Brasil com órgãos financeiros internacionais, como o Banco Mundial. Os dados da pesquisa foram obtidos em 2009, em uma escola pública do município de Rio Claro/SP, durante a execução do Trabalho de Conclusão de Curso (TCC) do curso de Geografia, pela Universidade Estadual Paulista. Palavras-chave: Programa São Paulo Faz Escola, autonomia do professor, trabalho docente.

1 Introdução O presente trabalho, decorrente de monografia apresentada em 2009, objetivou a análise do Programa São Paulo Faz Escola, implantado nas escolas estaduais (ciclo II do ensino fundamental e ensino médio) do estado de São Paulo pela Secretaria de Educação no ano de 2008. O trabalho teve ponto de partida a pesquisa bibliográfica e documental e, posteriormente, foi realizada a coleta de dados junto a uma escola pública estadual do município de Rio Claro/SP. Foram examinados os documentos oficiais elaborados pela Secretaria de Estado da Educação (SEE) e aqueles oriundos do Sindicato dos Professores do Ensino Oficial de São Paulo (Apeoesp). Junto à escola pública houve a participação nas reuniões de planejamento, realizadas em fevereiro de 321 Grupo de Estudo e Pesquisas em Política Educacional, Rio Claro, 06, 07 e 08 de julho de 2011 Vol. 3 (2011)

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2009, e entrevistas com a diretora, com a coordenadora pedagógica e com um professor da escola. O Programa São Paulo Faz Escola, quando de sua implantação, trazia uma proposta curricular para cada disciplina, bem como um caderno bimestral para cada uma delas, ambos de uso do professor. Nestes cadernos, além do conteúdo didático, havia também sugestões de exercícios e avaliações a serem aplicadas aos alunos e propostas de como ensiná-los. Além desses materiais, havia o caderno do Gestor destinado aos diretores e coordenadores contendo propostas de organização de seu trabalho e um jornal para os alunos. No ano de 2009, o que antes era denominado proposta curricular passou a ser currículo oficial do estado de São Paulo. Em relação ao ano anterior, outras diferenças puderam ser observadas: a elaboração de cadernos de cada disciplina também para os alunos, cujos conteúdos foram adaptados dos cadernos dos professores e apresentavam espaço destinado às tarefas, além da extinção do jornal do aluno. A expectativa do Estado com a implantação de tal projeto, que ainda perdura nos dias atuais, era a melhora no desempenho das escolas em avaliações externas, tais como: Sistema de Avaliação de Rendimento Escolar do Estado de São Paulo (Saresp). O Saresp está diretamente relacionado ao Índice de Desenvolvimento da Educação do Estado de São Paulo (IDESP), que avalia o desempenho dos estudantes apenas do estado de São Paulo e apresenta os resultados por escola e por município; Sistema de Avaliação do Ensino Básico (Saeb), que está relacionado à melhora do Índice de Desenvolvimento da Educação Básica (IDEB), que avalia o desempenho dos estudantes por região do Brasil e por estado. O objetivo dessas avaliações, segundo o proclamado, era justamente detectar as falhas do sistema educacional em cada unidade escolar para que assim pudessem ser tomadas medidas para solucioná-las.

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Anteriormente à implantação do Programa, o material mais utilizado em sala de aula era o livro didático. Neste período, os professores tinham a oportunidade de participar, de certa forma, da escolha do material didático, já que de tempos em tempos um rol de títulos era disponibilizado para que os professores pudessem analisar qual seria o melhor para ser adotado no ano consecutivo. Porém, com o advento do Programa, o professor se deparou com um tipo de material nunca anteriormente trabalhado. Dessa forma, a principal relevância desta pesquisa foi entender como este novo material afetou o trabalho do professor. As políticas públicas para o ensino fundamental a partir da década de 1990 Inúmeras crises assolaram o sistema capitalista de produção desde que este começou a se propagar pelo mundo. Dentre elas, podemos citar a crise do Estado mínimo (liberal) no início do século XX que deu lugar ao Estado de Bem-Estar Social. Este defendia a intervenção do Estado na economia de maneira a garantir os bens sociais básicos à população. Tal política econômica começou a ruir em meados da década de 1970, quando o Estado deu sinais de incapacidade de assumir todas as suas funções de maneira eficaz. Nesse contexto, as teses neoliberais retomaram as teses clássicas do liberalismo, defendendo as liberdades individuais, criticando a intervenção estatal e elogiando as virtudes reguladoras do mercado (HÖFLING, 2001). No caso do Brasil, entretanto, Chauí (1994) aponta que o neoliberalismo não teve adversários a combater, não precisou destruir os direitos adquiridos pelos trabalhadores, como na Europa, pois estes não alcançaram a cidadania no plano dos direitos sociais. Assim, a proposta neoliberal apenas conservou o arcaico poder das oligarquias. No início da década de 1980, o Brasil passou por uma crise econômica motivada por dois fatores: o aumento da dividida externa, provocada pela elevação das taxas de juros nos Estados Unidos e a crise mundial do petróleo (GOMES, 2006). Na tentativa de controlar a crise se iniciou uma Reforma do Estado, de caráter essencialmente neoliberal, que ganhou impulso com a da criação do Ministério da Administração e Reforma do Estado (MARE) no governo Fernando Henrique Cardoso, tendo como ministro Luis Carlos Bresser Pereira. 323 Grupo de Estudo e Pesquisas em Política Educacional, Rio Claro, 06, 07 e 08 de julho de 2011 Vol. 3 (2011)

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Segundo Bresser Pereira (1997, p. 7-8), no caderno 1 do MARE, a Reforma do Estado envolveu problemas interdependentes, destacando-se um deles para esta análise: a delimitação do tamanho do Estado, na qual estão envolvidas a privatização, a ―publicização‖ e a terceirização. O então ministro do MARE justificou a necessidade de redução do tamanho do Estado em função do seu crescimento excessivo no século XX e a ampliação de suas funções, principalmente na área social. Para delimitar, então, suas funções, foram distinguidas três áreas de atuação: as atividades exclusivas do Estado, os serviços sociais e científicos do Estado, a produção de bens e serviços para o mercado (BRESSER PEREIRA, 1997, p. 22). As atividades exclusivas do Estado, segundo o autor, são: definir as leis do país; impor a justiça; manter a ordem; defender o país e representá-lo no exterior; policiar; arrecadar impostos; regulamentar as atividades econômicas; fiscalizar o cumprimento das leis; formular políticas na área econômica e social e, em seguida, realizar transferências para a educação, a saúde, a assistência social, a previdência social, a garantia de uma renda mínima, o seguro desemprego, a defesa do meio ambiente, a proteção do patrimônio cultural e o estímulo às artes; garantir a estabilidade da moeda, do sistema financeiro, e investimento na infraestrutura e nos serviços públicos. A produção de bens e serviços para o mercado, sempre dominada pelas empresas privadas, no século XX, passou a receber investimentos do Estado, já que a empresa privada não tinha condições de fazer. Em contrapartida, a partir da década de 1980, foi o Estado que passou a não mais ser capaz de arcar com tais investimentos, sendo necessária a privatização para reduzir suas dívidas (BRESSER PEREIRA, 1997, p.24). Por último, entre as atividades exclusivas do Estado e a produção de bens e serviços para o mercado, o autor coloca os serviços sociais e científicos do Estado, que não lhes são exclusivos. Nesta categoria estão: as escolas, as universidades, os centros de pesquisa científica e tecnológica, as creches, etc. Seu financiamento em grandes proporções é uma atividade exclusiva do Estado, porém não sua execução. Pelo contrário, estas são atividades competitivas que podem ser controladas não apenas

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através da administração pública gerencial, mas principalmente, segundo Bresser Pereira (1997), pelo controle social e da constituição de quase-mercados. Nestes termos não há razão para que estas atividades permaneçam dentro do Estado, sejam monopólio estatal. Mas também não se justifica que sejam privadas - ou seja, voltadas para o lucro e o consumo privado - já que são, freqüentemente, atividades fortemente subsidiadas pelo Estado, além de contarem com doações voluntárias da sociedade. Por isso a reforma do Estado nesta área não implica em privatização mas em publicização - ou seja, em transferência para o setor público não-estatal. A palavra publicização foi criada para distinguir este processo de reforma do de privatização. E para salientar que, além da propriedade privada e da propriedade estatal existe uma terceira forma de propriedade relevante no capitalismo contemporâneo: a propriedade pública não estatal (BRESSER PEREIRA, 1997, p. 25).

Neste contexto, Francisco de Oliveira critica e questiona de maneira irônica as organizações sociais da Reforma: Quem é, realmente, o público nas organizações sociais da reforma do Estado by Bresser Pereira? [...] Onde está o público não-estatal, essa pérola bresseriana? Em nenhum lugar, com a vantagem de que ninguém pode cobrar nada a essa organização social, posto que ela é não-estatal, não está sujeita a regras de publicização. Com que se parece isso? Com uma empresa privada. O que foi suprimido? O conflito como publicização de interesses divergentes, como movimento da des-privatização do privado (OLIVEIRA, 2001, p. 23).

Da mesma forma, Peroni trata da falta de clareza da publicização apontada na Reforma: Verificamos que permanecem obscuras as questões fundamentais: como será essa parceria? O que significa ser ―assegurado pelo Estado, mas viabilizado pelo mercado‖? No momento em que não fica claro quem financia, questionamos: como se pode afirmar que está ―assegurado pelo Estado‖? Assegurado para quem? Para todos? Para todos que podem pagar? Qual será o papel do Estado em se tratando de políticas sociais, pois observamos, nos documentos e declarações, que o financiamento e regulação estarão por conta da sociedade. Isto permite-nos concluir que o Estado está querendo passar para a sociedade tarefas que deveriam ser suas, principalmente no âmbito de políticas sociais (PERONI, 2003, p. 63).

Peroni (2003) argumenta que a crise fiscal foi apenas uma das facetas da crise do Estado, que passou também por uma grande crise do capital, e toda a estratégia de Reforma proposta resolveu apenas parte do problema e fragilizou o Estado no que se refere às políticas sociais. 325 Grupo de Estudo e Pesquisas em Política Educacional, Rio Claro, 06, 07 e 08 de julho de 2011 Vol. 3 (2011)

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Nessa premissa de crise fiscal também estavam inseridas as políticas educacionais, que também passaram a sofrer propostas de racionalização de recursos, com a descentralização do financiamento como parte da estratégia para se conseguir este fim (PERONI, 2003). As atuais características da educação brasileira não são somente resultados da Reforma do Estado, mas também das relações multilaterais que o Brasil manteve com organizações financeiras internacionais, principalmente o Banco Mundial (BM), no período da Reforma. Dessa forma, torna-se impossível estudar os rumos que a educação tem tomado no país sem considerar as ações e influências do BM. O Banco Internacional para o Desenvolvimento e a Reconstrução (BIRD), mais conhecido como Banco Mundial, foi criado em 1944, na Conferência de Bretton Woods, e tem relações com o governo brasileiro desde 1946. As relações entre o BM e o Ministério da Educação (MEC) são de assistência técnica na área econômica e social, de cooperação e de ―ajuda‖ aos países em desenvolvimento (SILVA, 2003, p.286). A atuação do Banco Mundial de conceder empréstimos e fornecer pacotes de medidas e propostas aos países em desenvolvimento, inclusive no âmbito educacional, é severamente criticada por diversos autores. Ao fixar um corpo de representantes como seu grupo de trabalho em determinada região, o Banco Mundial colhe diagnósticos de situações específicas, divulgando-os como modelos a serem seguidos. E mais, a sua presença diária permite uma constante avaliação do devedor, no que se refere a sua capacidade de pagamento da dívida, monitoramento e fiscalização quanto ao uso correto dos recursos, além de pressioná-los para adotar comportamentos adequados aos princípios do Banco, mas lesivos para o país. Com estes procedimentos e com o discurso de colaboração, os técnicos passam a fiscalizar e monitorar os empréstimos. A posse de diagnósticos locais permite que se apropriem das singularidades e as generalizem, e que se suprimam a história e a cultura da população local (SILVA, 2003, p. 287).

A autora não fala em ―ajuda‖ do BM aos países em desenvolvimento, mas sim em interesse em apropriar-se das riquezas dos países devedores. Com relação às propostas do Banco para a educação, os países que as solicitam, mesmo tendo características e necessidades diferentes, recebem um pacote em comum,

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que garante melhorar o acesso, a equidade e a qualidade dos sistemas escolares (TORRES, 2000). Alguns dos elementos mais importantes no pacote da reforma educacional propostos pelo BM, segundo Torres (2000), são: prioridade sobre a educação básica, considerada responsável pelos maiores benefícios sociais e econômicos e elemento essencial para um desenvolvimento sustentável e de longo prazo; melhoria da qualidade e eficiência da educação, devendo ser verificadas através do resultado do rendimento escolar; ―prioridade sobre os aspectos financeiros e administrativos da reforma educativa‖; ―descentralização e instituições escolares autônomas e responsáveis por seus resultados‖; participação do setor privado e organismo não-governamentais (ONGs); arrecadação e redistribuição de recursos adicionais para a educação de primeiro grau, sugerindo maior contribuição das famílias e das comunidades nos custos da educação; definição das políticas e prioridades baseadas e na análise econômica. (cf. TORRES, 2000, p. 130-138) O caráter dessas propostas também é criticado, tendo em vista que a análise econômica transformou-se na metodologia principal para a definição das políticas educativas, assumidas sem críticas por muitos governos (CORRAGIO, 2000). Torres (2000) ainda ressalta a ausência da participação dos professores e da pedagogia no modelo proposto pelo BM, pautado em variáveis quantificáveis e que não contempla os aspectos qualitativos. As propostas do BM também mostraram fragilidades no âmbito curricular e pedagógico, ou seja, na essência do elemento educativo, com uma visão estreita de 327 Grupo de Estudo e Pesquisas em Política Educacional, Rio Claro, 06, 07 e 08 de julho de 2011 Vol. 3 (2011)

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currículo, entendido meramente como conteúdo, ou seja, o método de ensinar não foi abordado (TORRES, 2000, p. 142). Torres (2000, p. 144-151) ainda aponta outras fragilidades nas recomendações do Banco, como o ―viés ocidental e anglo-saxão‖, pois a maioria dos estudos provém de países desenvolvidos, e o enfoque de manual. O BM apresentou ainda uma série de outras propostas, esclarecendo o que serve e o que não serve para a educação: oferecer livros e guias didáticos para os professores ao invés de instalar computadores; ampliar o tempo fixo de instrução ao invés de reduzir o tamanho da classe; prioridade para formação docente em serviço (preferencialmente à distância) ao invés de longos programas iniciais de formação(cf. TORRES, 2000, p. 153). Assim, como argumenta Torres (2000, p. 176-179), em meio a todas essas medidas propostas para melhorar a qualidade, equidade e eficiência do sistema educativo, o que se percebe é que, na realidade, o Banco Mundial reforça o modelo educativo tradicional, já que: limita a educação à escola; não se conecta com outros setores, como saúde, emprego; é fragmentada; trabalha sempre em curto prazo; é autoritária na tomada de decisões; privilegia quantidade em detrimento da qualidade; dissocia o pedagógico do administrativo; prioriza o investimento nos materiais sobre o investimento nas pessoas; está baseado em um pressuposto de homogeneidade; 328 Grupo de Estudo e Pesquisas em Política Educacional, Rio Claro, 06, 07 e 08 de julho de 2011 Vol. 3 (2011)

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não distingue ensino e aprendizagem; baseia-se em um modelo frontal de transmissão de ensino, no qual falar equivale a ensinar e ouvir equivale a aprender; elabora políticas sem considerar pesquisas e experiências passadas. No Brasil a atuação do Banco Mundial na educação ficou mais evidente no governo de Fernando Henrique Cardoso, quando foram aprovadas: em 1996 a Lei de Diretrizes e Bases da Educação (LDB) e a Emenda Constitucional n°. 14, responsável por modificar alguns artigos da Constituição Federal, delegando a responsabilidade do ensino fundamental (que se tornou obrigatório) aos Estados e Municípios, bem como seu financiamento mediante a criação de um Fundo de Manutenção e Desenvolvimento e de Valorização do Magistério; a lei complementar (Lei n°. 9.424/96) que ao normatizar a CF/88 implementou, de fato, o Fundo de Manutenção e Desenvolvimento do Ensino Fundamental (FUNDEF), que redistribuía o dinheiro para o ensino fundamental. Este ato comprova a prioridade do BM com apenas esta parcela de ensino (FRANCO; ALVES; BONAMINO, 2007). O governo federal desconsiderou o debate e não elevou o porcentual do valor aluno anual, os salários dos profissionais da educação, e favoreceu a expansão da educação média e superior pela via da privatização (SILVA, 2003). Outras medidas tomadas pelo ministro da Educação, Paulo Renato de Souza, no governo de FHC, foram a elaboração dos Parâmetros Curriculares Nacionais (PCN), que aliado ao FUNDEF e a LDB estiveram no centro da política educacional do período e o aprimoramento e a ênfase da avaliação nacional com a criação do Sistema Nacional de Avaliação da Educação Básica (Saeb ), como forma centralizada de controle de resultados Em relação à educação, a ideologia neoliberal apoia-se na produtividade estabelecendo como base do resultado educacional, padrões, indicadores e medidas – que estruturam a implantação ou organização de um currículo nacional e a criação de um sistema de avaliação para a aferição desses padrões (CABRAL, 2002, p. 25).

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As estratégias para a educação, incluindo financiamento e o pretenso controle da qualidade, via avaliações sistêmicas, indicaram um ajuste estrutural do cenário educacional com o modelo político-econômico adotado pelo governo de Fernando Henrique Cardoso, caracterizado pela redução gradativa das funções do Estado e pela valorização da produtividade, do individualismo e do consumismo. A influência do ideário neoliberal nas políticas educacionais brasileiras ocorreu na década de 1990, no governo de Fernando Henrique Cardoso, e ainda em algumas políticas recentes tais como: a prioridade da formação docente em serviço e com o estímulo ao ensino à distância como formação inicial e as avaliações de desempenho escolar, sejam elas de âmbito nacional, como a Prova Brasil, ou estadual, como o Saresp. Esta última política mencionada merece destaque tendo em vista que esse sistema é o reflexo perfeito da busca pela eficácia, pela produtividade almejada pela corrente neoliberal e que devem posteriormente ser traduzidas em números para exaltar a ―qualidade‖ da educação. Quando os números revelam o contrário, como aconteceu com o estado de São Paulo em seus baixos índices de desempenho no Saresp e Prova Brasil, procurou-se reverter tal situação com a implantação do Programa Escola de Tempo Integral (implantado em algumas escolas no final do governo de Geraldo Alckmin) e da implantação do Programa São Paulo Faz Escola, com o objetivo de ―guiar‖ os professores.

O trabalho docente com o advento do Programa São Paulo Faz Escola Desde que as avaliações externas começaram a ser aplicadas para avaliar o rendimento do aluno e compor índices que supostamente revelam a qualidade do ensino, o trabalho dos professores tem se voltado quase que exclusivamente para tais avaliações. Tal fato pode ser comprovado observando-se o planejamento da escola estudada no ano de 2009, quando os gestores demonstravam toda sua preocupação, desde o início do ano, em começar a trabalhar com os alunos os temas que possivelmente seriam cobrados nessas avaliações. 330 Grupo de Estudo e Pesquisas em Política Educacional, Rio Claro, 06, 07 e 08 de julho de 2011 Vol. 3 (2011)

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Há que se ressaltar que o estado de São Paulo passou a estipular metas para cada unidade escolar. Se a escola não alcançar determinado índice do IDESP (que é determinado pelo resultado na prova do Saresp), previamente estipulado pelo SEE, os professores não recebem um ―bônus‖ em seu salário. [...] Quando a escola não alcança a meta determinada, os profissionais da educação que lá atuam, não recebem os bônus. É, verdadeiramente, uma política de ―culpabilização e castigo‖. Essa medida tem tudo a ver com a responsabilização dos que atuam nas escolas e a isenção de responsabilidade da administração (FÓRUM ESTADUAL EM DEFESA DA ESCOLA PÚBLICA, 2009, sem paginação).

O Programa São Paulo Faz Escola surgiu como alternativa para padronizar os currículos das escolas públicas estaduais e garantir que todos os conteúdos cobrados na avaliação estejam inseridos nos materiais didáticos. Goodson (2007) considera este tipo de currículo como prescritivo, carregado de místicas com relação ao Estado, à escolarização e à sociedade. Segundo ele, as escolas são controladas por esse currículo e podem gozar de certa autonomia, desde que o gerenciamento das prescrições não seja desafiado. E é claro que existem ―custos de cumplicidade‖ na aceitação do mito da prescrição; esses custos envolvem, sobretudo e de várias maneiras, a aceitação de modelos estabelecidos de relações de poder. Talvez o mais relevante seja que as pessoas intimamente ligadas à construção social cotidiana do currículo e da escolarização, os professores, sejam por isso efetivamente alijados do ―discurso da escolarização‖. Para continuar a existir, seu poder cotidiano deve permanecer basicamente silencioso e sem registros [...]. Os vestígios do poder cotidiano e da autonomia para as escolas e para os professores dependem de continuar-se a acatar a mentira fundamental (GOODSON, 2007, p. 243-244).

As avaliações externas, baseadas no currículo prescritivo, são ―reducionistas‖ e ―pouco reflexivas‖ e contribuem para aumentar a pressão sobre os professores. Além disso, a falta de necessidade de planejar a aula faz com que os professores percam esta habilidade, que leva, por sua vez, a falta de controle sobre seu trabalho e à alienação (APPLE, 1997). Sob a pressão e influência exercida pelas avaliações o conhecimento a ser privilegiado nas escolas passa a ser baseado apenas em informações, em fatos, sem a necessidade de análise crítica sobre eles e que pode facilmente ser medido em testes padronizados (APPLE, 1997). 331 Grupo de Estudo e Pesquisas em Política Educacional, Rio Claro, 06, 07 e 08 de julho de 2011 Vol. 3 (2011)

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Mesmo antes da adoção de um currículo oficial padronizado para o estado de São Paulo, a discussão a respeito da autonomia dos professores (na verdade a perda dela) já era um assunto recorrente. Contreras (2002, p. 33) considera que os docentes, enquanto categoria, estão passando pelo processo de proletarização, tendo em vista que estão ―sofrendo transformações, tanto nas características de suas condições de trabalho como nas tarefas que realizam, fatos que os aproximam cada vez mais das condições e interesses da classe operária‖. [...] A análise da proletarização do ensino, baseada nos estudos sobre a proletarização em geral, indica a perda de autonomia no trabalho como perda humana em si, que supõe realizar uma tarefa reduzida ao seguimento de prescrições externas, perdendo o significado do que se faz e as capacidades que permitiam um trabalho integrado, com uma visão de conjunto e decisão sobre seu sentido. A desqualificação, a rotina, o controle burocrático, a dependência de um conhecimento alheio legitimado e a intensificação conduzem à perda de autonomia, perda que é em si mesma um processo de desumanização no trabalho (CONTRERAS, 2002, p. 194).

A autonomia, para o autor, portanto, passa a ser exercida por diretrizes externas, fazendo com que o professor exerça o papel de consumidor de pacotes de processos educativos produzidos por grupos de acadêmicos e pesquisadores universitários, além de especialistas com funções administrativas, de planejamento e de controle do sistema educacional, destituindo, assim, seu papel no processo educativo. No que tange ao conceito de autonomia Contreras (2002) destaca: [...] a autonomia, no contexto da prática de ensino, deve ser entendida como um processo de construção permanente no qual devem se conjugar, se equilibrar e fazer sentido muitos elementos. Por isso, pode ser descrita e justificada, mas não reduzida a uma definição autoexplicativa (CONTRERAS, 2002, p. 193).

Com relação às reformas educacionais às quais diversos países foram submetidos o autor coloca que é necessário não apenas considerar os âmbitos legais e as diretrizes de atuação, mas também a expansão de ideias, pretensões e valores que acabam por se transformar. Nesse sentido, é necessário destacar a reforma educacional brasileira, em conjunto com a Reforma de Estado, de cunho essencialmente neoliberal, visando à 332 Grupo de Estudo e Pesquisas em Política Educacional, Rio Claro, 06, 07 e 08 de julho de 2011 Vol. 3 (2011)

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adaptação da sociedade a este modelo, ao processo de globalização e a redução das responsabilidades do Estado, delegando-as para o mercado e para o terceiro setor. A análise de Contreras sobre a reforma educacional ocorrida na Espanha nas décadas de 1960 e 1970 é válida para o caso brasileiro, principalmente para a reforma realizada no estado de São Paulo com a implantação do Programa São Paulo Faz Escola: [...] a autonomia, mais do que uma pretensão para os professores, poderia chegar a ser um estorvo na realização fiel das reformas esboçadas. As modificações que os professores poderiam introduzir nas inovações planejadas significavam um fracasso, uma adulteração das mesmas, e era necessário contêlas. Planejar bem a educação era reduzir ao máximo a possibilidade de que se fosse deformada pelos professores (CONTRERAS, 2002, p. 230). Este excerto é comprovado pela declaração da então secretaria da educação, Maria Helena Guimarães de Castro nos próprios cadernos do Programa, que considera ineficiente a autonomia conferida pela LDB de 1996 e propõe um novo currículo a ser seguido a risca pelos professores. A utilização deste novo modelo seria controlada por avaliações externas de desempenho discente. Com as atuais políticas educacionais, portanto, claramente se pode verificar a proletarização (apropriando aqui a analogia que José Contreras utilizou de maneira tão pertinente) e a alienação do professor, conforme comentado por Michael Apple (1997) ao tratar da perda de controle de seu trabalho. A perda de autonomia, tanto do professor como da escola, fica evidente, então, com a obrigação do docente de ―consumir pacotes‖ elaborados por profissionais que pouco estão envolvidos com o cotidiano da escola, da sala de aula e, consequentemente, com suas principais adversidades. Na visão da Apeoesp, os professores passaram a atuar como implementadores de um modelo, devendo respeitar cronograma, burocracia e conteúdos pré-estabelecidos pelo Programa e que não consideram as especificidades do aluno(PROPOSTA, 2008?).

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Observa-se ainda que as medidas indicadas pelo BM, e seguidas pela SEE, fazem do professor um profissional cada vez mais supérfluo e substituível e pressupõe que qualquer um pode ser treinado para a mera aplicação dos ―cadernos‖. O Programa São Paulo Faz Escola frente à autonomia dos professores Para tratar especificamente a questão da autonomia dos professores em sala de aula após a implantação do Programa, foram entrevistados um professor, a diretora e a coordenadora pedagógica de uma escola estadual do município de Rio Claro/SP. Dados os limites desse artigo, reproduziremos aqui apenas parte do material coletado. Quando questionada se o material restringiu a autonomia do professor, a coordenadora respondeu: Eu acho que não, porque ele tem o material que deve ser trabalhado, então ele vai trabalhar do jeito que ele quiser, ele não está falando você tem que trabalhar em pé e fazer tal coisa, ele te dá a diretriz para ser seguida, mas ele não está tirando a sua liberdade de trabalho. Ele tira sim a liberdade de quem não queria trabalhar, não queria pesquisar. Para o professor que usava aquele livro amarelado incomodou e muito [...].

Incoerentemente, na questão seguinte, a coordenadora admitiu que foi orientada pela SEE a ―assistir‖ algumas aulas dos professores, para assim verificar se os professores estavam ou não fazendo uso do material. Como então falar em autonomia se o professor foi obrigado a seguir uma diretriz e ainda foi fiscalizado em seu local de trabalho? O que significa ―diretriz para ser seguida‖, segundo a fala da coordenadora? A resposta da coordenadora foi um retrato do que trata Goodson (2007), segundo o qual as escolas que seguem um currículo prescritivo podem gozar de alguma autonomia, porém o gerenciamento das prescrições não pode ser desafiado, ou seja, o currículo é um mecanismo das relações de poder da sociedade. Nesse sentido, é importante lembrar a análise que Contreras (2002) faz sobre a reforma educacional ocorrida na Espanha na década de 1960 e 1970 quando a autonomia dos professores poderia representar um obstáculo para a pretensão do governo.. No caso paulista, com suas políticas educacionais em consonância com a Reforma do Estado ocorrida na década de 1990, o professor passa a ser considerado um

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mero ―consumidor de pacotes‖, ou como ―implementadores e repetidores de conteúdos‖, na expressão da Apeoesp, encontrada no material divulgado pela entidade. A diretora da escola, por sua vez, admitiu que o material tira a autonomia dos docentes, porém não fez nenhum tipo de crítica a esse respeito por se tratar de um Programa introduzido pela SEE, devendo então seguir à risca as ―orientações‖. O professor afirmou na entrevista que se sentiu pressionado a utilizar o material e que perdeu sua ―liberdade de cátedra‖, e que, por mais que concorde com o currículo mínimo para o estado de São Paulo, considera um retrocesso a forma como o Programa foi implantado. Quanto à obrigatoriedade do uso do material

a coordenadora e a diretora

afirmaram que a SEE não se pronuncia claramente à possível punição para o professor que não utilizar o material, mas garantem que é papel da direção e coordenação da escola fiscalizar o uso e fazer com que os professores mais resistentes passem a utilizálo, fato este que já ocorreu na escola. A seguir, um trecho da entrevista da coordenadora: Sobre punição eu não sei o que vai ser feito, eu sei que eu tenho que assistir aula, tenho que ver quem está usando e não está usando, meu papel é fazer com que eles usem. Eu detectei dois que estavam resistentes ao uso e estão usando. Estão aceitando o uso? Estão usando porque eu mandei, mas eu não sei se estão vestindo a camisa [...].

Ainda na fala da orientadora: [...] Primeiro é que eu acho que se eu estou no estado e ele está me mandando trabalhar com isso, ou eu aceito ou eu saio do estado, ele não está me obrigando, me amarrando [...], mas se eu estiver mesmo contra isso, eu tenho arrumar outra coisa para fazer. Então, ou eu falo a língua deles ou eu estou fora, uma vez que eu estou aqui e estou falando a língua deles eu tenho que falar da melhor maneira possível [...].

A diretora afirmou no mesmo sentido: [...] é o que a Secretaria estabelece e enquanto diretora eu exijo que se siga à risca e na íntegra o que está aí.

Percebe-se mais uma vez a maneira como o professor foi destituído de sua liberdade, não importando sua opinião a respeito do material, mas sim se está obedecendo ou não a ordem da coordenadora. No caso do professor entrevistado e que 335 Grupo de Estudo e Pesquisas em Política Educacional, Rio Claro, 06, 07 e 08 de julho de 2011 Vol. 3 (2011)

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oferecia resistência ao uso do material ficou claro que foi obrigado a trabalhar com o material, mesmo não estando de acordo com ele, e passou a apenas executar e não questionar a respeito. Ainda com relação à punição, a coordenadora afirmou que esta acaba sendo o não recebimento do bônus que é vinculado ao IDESP, este baseado no SARESP, que por sua vez é baseado no conteúdo do material, ou seja, o governo atrelou o pagamento do bônus ao cumprimento das metas estabelecidas pelo IDESP. Trata-se, então, do que o Fórum Estadual em Defesa da Escola Pública denominou de ―culpabilização e castigo‖, a responsabilidade pelos baixos desempenhos em índices e avaliações e, portanto, a baixa qualidade da educação, é atribuída à escola, sendo esta então castigada não recebendo o bônus. Nesse sentido questiona-se: não seria também o professor o fiscalizador de seu colega, uma vez que se as notas dos alunos não forem suficientes para alcançar a meta estabelecida para a escola todos os agentes (professores, pessoal de suporte pedagógico e administrativo) deixam de ganhar o bônus? Estaria sendo estimulada a competitividade em lugar da solidariedade? Outro retrato da obrigatoriedade do uso do material é a fiscalização da avaliação que o professor aplica aos alunos: A avaliação não mudou muito, só que hoje você tem que cobrar as habilidades e competências previstas no caderno e é cobrado para que faça isso (entrevista do professor).

O professor, como pôde se observar, diante das pressões não encontrou outra alternativa se não fazer uso do material, já que acatar a orientação do Programa pode implicar na complementação do salário com o bônus, não apenas seu ganho individual, mas de todos os que trabalham na escola. .

Considerações Finais Tanto as análises bibliográficas como o estudo de caso permitiu concluir que a reforma educacional inserida na Reforma do Estado, no governo de Fernando Henrique Cardoso, com o ministro Bresser Pereira à frente o Ministério da Administração e Reforma do Estado (MARE) e sob as orientações neoliberais do Banco Mundial, reflete-se na educação pública do estado de São Paulo até mesmo nos dias atuais. 336 Grupo de Estudo e Pesquisas em Política Educacional, Rio Claro, 06, 07 e 08 de julho de 2011 Vol. 3 (2011)

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Verificou-se claramente que com o advento de um Estado avaliador, surgem as avaliações externas (estaduais e nacionais) que visam medir o desempenho dos alunos e, assim, pretensamente medir a qualidade do ensino. O baixo desempenho do estado de São Paulo nessas avaliações, principalmente no SARESP, tornou-se o mote político para se dar uma resposta à sociedade como o esforço do governo para reverter tal situação. Surge, assim, o Programa São Paulo Faz Escola, com seus Currículos Oficiais para cada disciplina, ―orientando‖ todos os passos do professor em sala de aula, com os conteúdos que possivelmente serão cobrados na avaliação externa, com o objetivo de elevar o estado a melhores patamares em índices que dizem refletir a qualidade da educação, como o IDESP. As consequências da adoção desse Programa foi a perda de autonomia e liberdade da instituição de ensino – autonomia esta conferida pela LDB de 1996 – e do professor em sala de aula, que passou a ser vigiado por gestores da escola, que, por sua vez, também são pressionados pela diretoria de ensino a agir de tal forma e até pelos próprios colegas em função do bônus salarial instituído pelo governo. Dessa forma, segundo o constatado na escola estudada, o professor, mesmo tento uma posição crítica a respeito do Programa e dos materiais distribuídos, se viu obrigado a utilizá-los, mesmo que isso acarretasse em perda da qualidade da aula por se tratar de um material muitas vezes indiferente à realidade do aluno. Ressalte-se ainda, o processo de cooptação do professor, feito pelo Estado, por meio da concessão de bônus a toda equipe escolar atrelado aos índices de desempenho. O Programa, que segundo a SEE seria responsável por melhorar a qualidade da educação, pode limitar certos conteúdos em detrimento de outros, não contemplados por não comporem o SARESP. Ele também impede que o professor consiga sanar as lacunas no conhecimento dos alunos, seja pela simples pressão de haver um tempo determinado para cada conteúdo ou pela presença de um membro da direção ou coordenação fiscalizando seu trabalho. Professores e gestores são induzidos cada vez mais a não questionar as políticas educacionais implantadas, mesmo que de maneira autoritária. Sua função no interior da instituição de ensino passa a ser a de executar ordens, colocar em prática programas, projetos e planos urgidos de forma horizontal, do centro do poder para a sala de aula. 337 Grupo de Estudo e Pesquisas em Política Educacional, Rio Claro, 06, 07 e 08 de julho de 2011 Vol. 3 (2011)

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Entretanto as vozes dissonantes não poderão ser totalmente silenciadas, o embate em torno de projetos diferentes e até mesmo divergentes permearam e continuaram a permear a história.

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Tradução

de

Sandra

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SALÁRIOS DOCENTES, FINANCIAMENTO E QUALIDADE DA EDUCAÇÃO

Andreza Barbosa [email protected] Universidade Estadual Paulista (UNESP) Rio Claro

Resumo: No bojo das discussões a respeito da melhoria da qualidade da educação, frequentemente surgem questões relacionadas ao trabalho e aos salários dos professores. E, como o pagamento dos salários representa o maior percentual dos gastos com educação, tratar da remuneração docente suscita a discussão sobre financiamento da educação e, consequentemente, a relação deste com a qualidade da educação. Visando discutir a relação existente entre salários docentes, financiamento e qualidade da educação básica no Brasil, esse trabalho apresenta resultados parciais de uma pesquisa de caráter bibliográfico-documental que teve como corpus de análise as pesquisas relacionadas à remuneração docente produzidas, principalmente, por pesquisadores da educação e da economia e outros documentos relativos à temática. Palavras-chave: Salários docentes. Financiamento. Qualidade da Educação.

INTRODUÇÃO

No bojo das discussões a respeito da melhoria da qualidade da educação, frequentemente surgem questões relacionadas ao trabalho e aos salários dos professores. E, como o pagamento dos salários representa o maior percentual dos gastos com educação, tratar da remuneração docente suscita a discussão sobre financiamento da educação e, consequentemente, a relação deste com a qualidade da educação. Nesse sentido, ainda que possa parecer correto afirmar que a maior qualidade da educação carece de maiores investimentos neste setor, isso não é consenso. Existem pesquisadores que têm afirmado a inexistência de relação entre volume de recursos e qualidade do ensino. Esses argumentos têm servido ainda para justificar o não investimento na elevação dos padrões de remuneração dos professores. Assim, a

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temática dos salários docentes parece estar diretamente relacionada ao financiamento e à importância deste para a qualidade da educação. Visando discutir a relação existente entre salários docentes, financiamento e qualidade da educação básica no Brasil, esse trabalho apresenta resultados parciais de uma pesquisa de caráter bibliográfico-documental que teve como corpus de análise as pesquisas relacionadas à remuneração docente produzidas, principalmente, por pesquisadores da educação e da economia e outros documentos relativos à temática.

SALÁRIOS DOCENTES, FINANCIAMENTO E QUALIDADE DA EDUCAÇÃO

A grande maioria dos professores brasileiros é funcionária dos sistemas públicos de ensino, principalmente dos estados e municípios e, como os salários dos profissionais da educação representam a maior parte dos gastos com educação – cerca de 75% (CARREIRA, PINTO, 2007; CAMPANHA NACIONAL PELO DIREITO À EDUCAÇÃO34, 2010) – a discussão dos salários dos professores envolve, necessariamente, a discussão sobre o financiamento da educação. Além dos professores serem em grande número (a maior parte do funcionalismo público), o fato do poder público ser o maior empregador da categoria no Brasil coloca a questão da remuneração docente intimamente relacionada à receita pública per capita (PINTO, 2009). Isso explica, inclusive, por que há tanta resistência em se admitir que os professores são mal remunerados por alguns setores e também por que é tão difícil resolver esse problema:

Como gastos com pessoal significam essencialmente salários a serem pagos aos profissionais da educação, em particular aos professores, entende-se por que é tão difícil resolver a questão dos baixos salários pagos no Brasil e por que alguns administradores educacionais ou pesquisadores no Brasil procuram mostrar que os professores não ganham tão mal quanto se afirma, ou então que não existe relação

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A Campanha Nacional pelo Direito à Educação, criada em 1999, é uma rede que articula mais de 200 grupos e entidades distribuídas por todo o país, incluindo movimentos sociais, sindicatos, organizações não governamentais nacionais e internacionais, fundações, grupos universitários estudantis, juvenis e comunitários, visando atuar pela ampliação do direito à uma educação pública, gratuita e de qualidade no Brasil.

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III Seminário Internacional de Gestão Educacional entre o valor dos salários e a qualidade do ensino. (PINTO, 2008, p. 65).

Nesses moldes, Pinto (2009, p. 61), afirma que ―[...] mudar de forma significativa o padrão de remuneração dos professores e demais trabalhadores da educação no Brasil significa ampliar os gastos com ensino [...]‖. E isso, por sua vez, implica definir o que seria necessário para o financiamento de uma educação pública de qualidade. Porém, a discussão acerca da qualidade da educação é bastante complexa e abrangente, envolvendo múltiplas dimensões. Camargo et. al. (2005) apontam para a existência de aspectos quantificáveis que envolvem os custos básicos de manutenção e desenvolvimento de uma educação de qualidade e aspectos subjetivos que, por sua vez, envolveriam as características da gestão, a natureza do trabalho docente, a visão dos agentes escolares e da comunidade sobre o papel da escola, etc. Esses autores também apontam que ―[...] a qualidade da escola implica a existência de insumos indispensáveis, de condições de trabalho e de pessoal valorizado, motivado e engajado no processo educativo.‖ (CAMARGO et. al., 2005, p. 204-205). Dessa forma, ainda que não haja muito consenso a respeito do que seria uma educação de qualidade, admite-se que não há como se referir a isso sem o reconhecimento dos insumos considerados indispensáveis ao desenvolvimento do processo educacional (CAMARGO et. al., 2005; CARREIRA, PINTO, 2007). Nesse contexto, torna-se relevante a discussão do Custo Aluno-Qualidade Inicial (CAQi). Trata-se de um valor de custo-aluno que garanta um mínimo de qualidade inicial. No cálculo do CAQi, foram considerados os insumos indispensáveis ao desenvolvimento dos processos de ensino-aprendizagem (CAMPANHA NACIONAL PELO DIREITO À EDUCAÇÃO, 2010) que, segundo Carreira e Pinto (2007), podem levar à definição de padrões mínimos de qualidade da educação:

Parece não haver muita dúvida de que uma educação com padrões mínimos de qualidade pressupõe a existência de creches e escolas com infraestrutura e equipamentos adequados aos seus usuários e usuárias, com professoras e professores qualificados (preferencialmente formados em nível superior e atuando na área de sua formação), com remuneração equivalente à de outros profissionais com igual nível de formação no mercado de trabalho e com horas remuneradas destinadas a preparação de atividades, reuniões coletivas de planejamento, visitas às famílias e avaliação do trabalho. [...] Pressupõe também uma razão

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III Seminário Internacional de Gestão Educacional de alunos por docente e de alunos por turma (e, no caso da educação infantil, crianças por educadoras) que não comprometa o processo de aprendizagem, com uma jornada de trabalho escolar do aluno que progressivamente atinja o tempo integral e do professor que gradualmente obtenha dedicação exclusiva a uma escola. (CARREIRA; PINTO, 2007, p. 78).

Em outro momento, Pinto (2008) afirma que, como o que se pretende é uma escola de qualidade para toda a população brasileira e não apenas para uma pequena parcela dela, quantidade se torna a primeira dimensão da qualidade: ―[...] a ideia central é a de que a garantia de insumos adequados é condição necessária (embora possa não ser suficiente) para a qualidade do ensino.‖ (PINTO, 2008, p. 60). Esse mesmo autor ainda discute que, embora possam existir escolas que, somente pelo esforço da equipe escolar, da comunidade e dos alunos, assegurem uma educação de qualidade, elas são, certamente, exceções e na definição de políticas não podemos nos centrar nas exceções, afinal, ―[...] não se pode esperar ou exigir uma educação de qualidade de uma escola à qual faltam recursos físicos e humanos básicos. Por outro lado, é natural que, se esses recursos são assegurados, resultados sejam esperados e cobrados.‖ (PINTO, 2008, p. 61). A garantia de recursos financeiros seria, então, o primeiro passo para se obter uma escola pública de qualidade, pois asseguraria as condições adequadas de oferta dessa educação, dando possibilidades para que o Estado, segundo Pinto (2008), fizesse exigências em relação à equipe escolar ou redes de ensino. Com isso, verifica-se que a melhoria da educação pública passa, necessariamente, pelo aumento dos recursos a ela destinados, nas palavras de Pinto (2000, p. 149), ―um ensino bom custa caro‖. Apesar de isso parecer óbvio para os pesquisadores em educação, não é consenso na sociedade em geral. Há, por exemplo, uma corrente bastante influente de pesquisadores da área da economia que tem afirmado que: ―[...] fatores como maior volume de gastos destinados à educação, melhoria dos salários dos professores e redução do número de alunos por classe, dentre outros, não possuem importância estatisticamente significativa para o desempenho dos estudantes.‖ (NASCIMENTO, 2007, p. 118). Segundo Nascimento (2007), essa corrente de pesquisadores sofre influências do Relatório Coleman, elaborado por diversos pesquisadores do governo americano em 1966, que afirmou, categoricamente, não haver relação positiva entre os recursos 343 Grupo de Estudo e Pesquisas em Política Educacional, Rio Claro, 06, 07 e 08 de julho de 2011 Vol. 3 (2011)

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educacionais e o desempenho dos alunos. Esse posicionamento ficou conhecido como ―Money doesn‟t matter” (GRISSMER; FLANAGAN; WILLIAMSON, 1998). Um dos representantes de maior destaque dessa corrente da economia é, atualmente, Hanushek (1996), que tem afirmado em suas pesquisas ser mais importante a forma de se empregar os recursos do que o montante despendido à educação. Nascimento (2007) ainda afirma que, para essa corrente de pesquisadores, os fatores familiares e de grupos sociais interferem muito mais no desempenho dos alunos que os recursos políticos e financeiros empreendidos na educação. No Brasil, essa corrente, forte nos Estados Unidos, encontra adeptos como, por exemplo, Ioschpe (2004) e Menezes Filho (2007). Em debate realizado em São Paulo pelo Centro de Estudos e Pesquisas em Educação, Cultura e Ação Comunitária (CENPEC) sobre como melhorar o desempenho das escolas, Menezes Filho reforçou a ideia de que mais importante que o volume de recursos gastos em educação é a maneira de usá-los:

[...] é importante ressaltar que não há correlação entre gastos e proficiência. Os estados que gastam mais em educação têm os alunos com proficiência maior. Entretanto, para se atingir uma proficiência de 240, pode-se gastar R$ 400,00 por aluno/ano ou R$ 1000,00 por aluno/ano. O que significa também que é muito importante a maneira como se usam os recursos, assim como a maneira como se motivam os professores, os diretores. Tudo isso é fundamental para explicar o desempenho escolar. (CARVALHO et. al., 2007, p. 29).

Nesse mesmo debate, promovido pelo CENPEC, Gatti questiona o uso dos resultados das pesquisas americanas influenciadas pelo Relatório Coleman no contexto brasileiro ao destacar que: ―Esses estudos foram realizados em um país onde as escolas têm todos os recursos pedagógicos necessários. Não se podem aplicar esses resultados cegamente ao Brasil, onde as carências escolares são tão grandes ainda.‖ (CARVALHO et. al., 2007, p. 23). Mesmo entre os pesquisadores da área da economia, o posicionamento de que os recursos não influenciam na qualidade da educação não é consensual. Nascimento (2007) aponta que essa linha de pensamento, embora seja dominante, está longe de ser unânime. Hedges e Greenwald (1996), por exemplo, destacam que a relação entre recursos investidos na educação e o desempenho dos estudantes é grande o suficiente para ser relevante. Grissmer, Flanagan e Williamson (1998), em outro estudo feito nos 344 Grupo de Estudo e Pesquisas em Política Educacional, Rio Claro, 06, 07 e 08 de julho de 2011 Vol. 3 (2011)

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Estados Unidos, mostram que o aumento dos recursos destinados à educação tem impacto positivo nas escolas que atendem às minorias menos favorecidas. Verifica-se, portanto, que mesmo na área da economia, na qual existem pesquisadores que discordam da relação entre recursos financeiros e qualidade da educação, há ainda pesquisas que apontam para a existência dessa relação. A questão parece ser que, ainda que os recursos não garantam por si só a qualidade da educação, sem eles pouco se consegue. Castro (2007) lembra que a educação, muito frequentemente, é apontada como prioridade pelos governos. No entanto, para esse autor: ―[...] se tal prioridade existe, ela deveria se manifestar em termos de gastos públicos, principalmente em sua representação econômica, o que permite analisar a importância dessa área social no contexto da economia.‖ (CASTRO, 2007, p. 858-859). A questão é que, frequentemente, ouve-se em discursos por parte dos governantes a afirmação de falta de verbas para tal, o que, para o autor citado, não é verdadeiro, já que, ao comparar os gastos em Educação Básica e a Carga Tributária Bruta (CTB) do Brasil no período de 1995 a 2005, constatou que o crescimento da arrecadação foi bastante superior se comparado ao aumento nos gastos com educação, ou seja, os gastos com educação não aumentaram na mesma proporção:

[...] o gasto em educação básica subiu apenas 0,16 p.p. do PIB no período de 1995 a 2005. Esse processo de crescimento foi bastante descontínuo durante o período; variando também a intensidade desse crescimento. Por outro lado, a CTB se ampliou muito mais nesse período, em cerca de 6,5 p.p. do PIB, processo que ocorreu praticamente de forma contínua. O crescimento dos gastos com educação representou apenas 2,5% do crescimento da carga. Ou seja, se a CTB subiu não foi em virtude das necessidades relativas às políticas de educação. (CASTRO, 2007, p. 871).

Alguns estudos, principalmente da área da economia, afirmam não haver no Brasil pouco gasto em educação visto que, de acordo com Ioschpe (2004), por exemplo, o Brasil gastaria o equivalente ao percentual do Produto Interno Bruto (PIB) dos países desenvolvidos com educação. No entanto, ao se considerar o PIB Per Capita de alguns países desenvolvidos e o percentual do PIB gasto com educação, fica evidente que o investimento em educação no Brasil ainda é muito baixo:

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Tabela 1: PIB Per Capita e Gastos em Educação de alguns países desenvolvidos e do Brasil PIB Per Capita – em US$ Porcentagem do PIB gasta País (2007) com educação (2005) Noruega 82465 7,7 Finlândia 46371 6,5 Suíça 56579 6,1 Estados Unidos 45047 5,9 França 40090 5,9 Canadá 43368 5,2 Alemanha 40162 4,7 Brasil 6852 4,1 Fonte: Elaborada pela autora a partir de dados extraídos do endereço: . Acesso em 22/12/2010.

Dados mais recentes, divulgados pela Organização para a Cooperação e o Desenvolvimento Econômico (OCDE), por meio do documento Education at a Glance 2010: OECD Indicators, também evidenciam o baixo investimento brasileiro em educação em comparação aos países desenvolvidos. Segundo esse documento, o Brasil gasta 3,9% do PIB em educação, enquanto os Estados Unidos, por exemplo, gastam 7,4% de seu PIB. (OCDE, 2010). Além do PIB do Brasil ser menor que o desses países, o número de alunos brasileiros em idade escolar é maior. Assim, talvez uma forma mais adequada de se comparar os gastos públicos com educação em percentuais do PIB, seria verificar quanto o gasto por aluno representa do PIB por habitante de cada país. A Campanha Nacional pelo Direito à Educação (2010) apresenta alguns dados nesse sentido:

Ao fazer essa comparação entre os países da OCDE (Organização para a Cooperação e o Desenvolvimento Econômico) e o Brasil, verificamos que, no mesmo ano, eles gastaram em média 21% do PIB/habitante com cada estudante das séries iniciais do ensino fundamental, enquanto o Brasil gastou somente 15%. No ensino médio, eles gastaram 27% do PIB/habitante, enquanto o Brasil gastou 10% do PIB/habitante. Esse fato indica que os países ricos gastam mais, não só em termos absolutos, mas que seu esforço é proporcionalmente maior. (CAMPANHA NACIONAL PELO DIREITO À EDUCAÇÃO, 2010, p. 39).

Sobre isso, Pinto (2008, p. 63) destaca que ―[...] os países ricos, e mesmo aqueles não tão ricos assim, não abrem mão de investir somas significativas por aluno para buscar assegurar um ensino de qualidade.‖ E ainda completa: ―Se mais dinheiro por si só não traz qualidade, sem ele tampouco a teremos.‖ (PINTO, 2008, p. 63). 346 Grupo de Estudo e Pesquisas em Política Educacional, Rio Claro, 06, 07 e 08 de julho de 2011 Vol. 3 (2011)

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Buscando identificar a dimensão da necessidade de aumentar os recursos destinados à educação, a Campanha Nacional pelo Direito à Educação (2010) efetuou o cálculo do CAQi, considerando os insumos necessários para a garantia da qualidade inicial, abaixo da qual nenhuma escola deveria estar. No cálculo foi considerado, por exemplo, o número ideal de alunos por sala de aula de até 12 crianças nas creches, 22 na pré-escola, 24 nos anos iniciais do Ensino Fundamental, 30 nos anos finais do Ensino Fundamental, 30 no Ensino Médio, bem como salários de R$ 1733 reais para os professores com nível superior, dentre outros insumos. Com base nessas necessidades, mostrou-se que, para se obter um padrão mínimo de qualidade inicial da educação pública, seria necessário elevar o gasto por aluno, o que implica aumento da porcentagem do PIB destinado à educação:

Para viabilizar o CAQi em todo o Brasil, seria necessário um aumento do investimento educacional dos atuais 4% do PIB para 5%, ou seja, precisaríamos aumentar 1% para garantir o CAQi para o atual número de matrículas. [...] Se almejamos cumprir o CAQi para atender ao aumento de matrículas previsto na lei do Plano Nacional de Educação (2001), o investimento deveria ser de mais de 4% do PIB. Dessa forma, passaríamos dos 4% atuais para 8% do PIB. (CAMPANHA NACIONAL PELO DIREITO À EDUCAÇÃO, 2010, p. 44).

Ou seja, seria necessário um aumento de 1% do total do PIB para atender à demanda atual e 4% para atender a demandas futuras. Cabe lembrar que o PNE aprovado em 2001 previa, em artigo posteriormente vetado pelo então presidente Fernando Henrique Cardoso, a destinação de 7% do PIB para a educação, e que a Conferência Nacional de Educação (CONAE) realizada em 2010 aprovou a ampliação de 1% do PIB destinado à educação ao ano, de forma que se atinja o patamar de 7% do PIB em 2011 e 10% em 2014. Para a Campanha Nacional pelo Direito à Educação (2010), os recursos para viabilizar a implementação do CAQi poderiam vir da revisão do pagamento dos encargos da dívida pública. De acordo com isso, Pinto (2008, p. 77) assim se posiciona:

[...] de 2000 a 2005 somente a União gastou, em média, 8,4% do PIB ao ano com o pagamento do serviço sobre a dívida pública (juros, encargos e amortização). Portanto, uma ―simples‖ troca entre o que se gasta em educação pelo que se paga de juros já viabilizaria uma mudança sem precedentes no perfil da escola brasileira [...].

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Para o aumento da qualidade da educação, é necessário, portanto, aumentar os recursos a ela destinados, o que, segundo Pinto (2000), implicaria também em melhores salários. Falar em salários dos professores implica, portanto, falar em financiamento da educação. Um dos insumos de maior impacto no CAQi é o referente ao pagamento dos profissionais da educação, correspondendo a cerca de 75% do custo total (CAMPANHA NACIONAL PELO DIREITO A EDUCAÇÃO, 2010). Assim, se para aumentar os salários dos professores é necessário aumentar a destinação de recursos para a educação e se, de acordo com esses estudos, esse aumento é possível, logo, é financeiramente viável o aumento dos salários dos professores, porém isso implicaria ainda mudanças de outra ordem, como afirma Pinto (2009, p. 61-62):

Dar o salto de qualidade no padrão de remuneração de nossos professores é plenamente factível na realidade tributária brasileira atual. Conseguir realizá-lo, contudo, depende essencialmente de mudança política e no campo dos valores, nas relações que se estabelecem no dia a dia da escola entre os professores, seus alunos e pais.

CONSIDERAÇÕES FINAIS De acordo com as pesquisas e documentos analisados, pode-se afirmar que a melhoria da educação pública passa pelo aumento dos recursos a ela destinados e os salários dos professores compõem grande parte desse montante. Assim, maiores salários para os professores implicariam mais recursos financeiros destinados à educação. Nesse aspecto, as pesquisas da área da economia que afirmam não haver relação entre o quanto se investe em educação e a qualidade apresentada têm servido para legitimar os baixos salários recebidos pelos professores brasileiros. Vale lembrar, entretanto que, apesar de essa corrente ser hegemônica entre os economistas, há ainda pesquisadores dessa área que têm questionado esse posicionamento e afirmado existir relação entre investimento e qualidade da educação. Assim, se a melhoria das condições de trabalho e salário dos professores passa pelo aumento de destinação de recursos para a educação, as pesquisas vinculadas ao CAQi , como a de Pinto (2008), destacam que um aumento da ordem de 4% do PIB seria suficiente para garantir os insumos mínimos que servissem para viabilizar uma 348 Grupo de Estudo e Pesquisas em Política Educacional, Rio Claro, 06, 07 e 08 de julho de 2011 Vol. 3 (2011)

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educação pública de qualidade. No caso dos salários dos professores, o valor que integra o cálculo do CAQi atualmente é de R$ 1733 para uma jornada de 40 horas (CAMPANHA NACIONAL PELO DIREITO À EDUCAÇÃO, 2010). Esse valor está bem acima do estabelecido pela lei que instituiu o Piso Salarial Profissional Nacional (PSPN). Porém, conforme ressaltado no documento da Campanha Nacional pelo Direito à Educação, os insumos considerados no cálculo do CAQi devem ser utilizados como referências iniciais, havendo, portanto, a necessidade de atualizá-los e adequá-los à realidade de cada estado, visto que a realidade apresentada pelos estados e municípios brasileiros é muito heterogênea. De qualquer forma, a implementação do CAQi poderia significar uma alternativa inicial e imediata para o processo de valorização dos professores.

REFERÊNCIAS CAMARGO, Rubens B. et. al. A qualidade na educação escolar: dimensões e indicadores em construção. In. FARENZENA, Nalú. (Org.). Custos e condições de qualidade da educação em escolas públicas: aportes de estudos regionais. Brasília: INEP / MEC, 2005. CAMPANHA NACIONAL PELO DIREITO À EDUCAÇÃO. Educação pública de qualidade: quanto custa esse direito? São Paulo: Campanha Nacional pelo Direito à Educação, 2010. CARREIRA, Denise; PINTO, José M. R. Custo Aluno-Qualidade Inicial: rumo à educação pública de qualidade no Brasil. São Paulo: Global, Campanha Nacional pelo Direito à Educação, 2007. CARVALHO, Maria C. B. et. al. Avaliação em Educação – o que a escola pode fazer para melhorar seus resultados?. Cadernos CENPEC, São Paulo, n.3, p. 16-41, 2007. CASTRO, Jorge Abrahão de. Financiamento e gasto público na educação básica: 19952005. Educação & Sociedade, Campinas, v. 28, n. 100, p. 857-876, out. 2007. GRISSMER, David; FLANAGAN, Ann; WILLIAMSON, Stephanie. Does money matter for minority and disadvantaged students? Assessing the new empirical evidence. Washington: NCES, 1998. Disponível em: . Acesso em 29/09/2010.

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A FORMAÇÃO DO GESTOR ESCOLAR

Rosana Cristina Carvalho Fraiz [email protected] Universidade Estadual Paulista- UNESP Faculdade de Ciências e Letras Campus – Araraquara

Resumo: Este texto tem como objetivo apresentar uma reflexão sobre a formação do gestor escolar a partir de estudos sobre a formação do professor indicando algumas semelhanças nos enfrentamentos de início de carreira. Aponta alguns aspectos do trabalho do gestor escolar que demonstram sua complexidade e abrangência. Investigando a formação inicial foi realizada analise das matrizes curriculares dos cursos de Pedagogia oferecidos pelas Instituições de Ensino Superior do município de Araraquara visando identificar quais as áreas de estudo são privilegiadas. O estudo considera também a influência das experiências adquiridas pelo Pedagogo durante a atuação como docente na observação e análise dos modelos de gestão. Palavras-chave: Gestor escolar; formação inicial; curso de Pedagogia

1. Introdução Em meio a complexidade atual que envolve as organizações escolares ganha destaque a atuação do profissional que historicamente tem sido indicado como o principal responsável pela organização das atividades desenvolvidas nas escolas. Muito se discute sobre o papel do gestor escolar na garantia de um trabalho educativo eficaz e na construção do processo de gestão escolar democrático. O estudo da gestão escolar, neste trabalho, propõe-se a considerá-la enquanto componente social e não meramente técnico e conceber os estabelecimentos de ensino como organismos vivos e dinâmicos considerando a influência da cultura organizacional na atuação do gestor. Atualmente há o reconhecimento que a formação dos gestores escolares é elemento potencial para influenciar no avanço da qualidade de ensino e no fortalecimento da gestão democrática da educação pública sendo possível estabelecer relação entre 351 Grupo de Estudo e Pesquisas em Política Educacional, Rio Claro, 06, 07 e 08 de julho de 2011 Vol. 3 (2011)

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desempenho dos alunos e desempenho da equipe escolar, principalmente de suas lideranças. A formação inicial do gestor escolar ocorre nos cursos de graduação em Pedagogia cujo principal objetivo é a formação da competência docente e não a ação gestora de unidades escolares. A Resolução CNE/CP n° 01, de 15 de maio de 2006, que institui as Diretrizes Curriculares Nacionais para o curso de graduação em Pedagogia define claramente, em seu artigo 2º, que o objetivo principal do curso de Pedagogia é a formação do docente.

Art. 2º- As diretrizes curriculares para o curso de Pedagogia aplicam-se à formação inicial para o exercício da docência na Educação Infantil e nos anos iniciais do ensino fundamental, nos cursos de Ensino Médio, na modalidade Normal, e em cursos de Educação profissional na área de serviços e apoio escolar, bem como em outras áreas nas quais sejam previstos conhecimentos pedagógicos. (BRASIL, 1996)

Entretanto, cabe considerar que a preocupação com a possibilidade da atuação do pedagogo na gestão de organizações escolares está presente na normativa legal. No artigo 3° da referida Resolução são elencados os itens considerados centrais na formação do licenciado em Pedagogia entre eles a ―participação na gestão de processos educativos e na organização e funcionamento de sistemas e instituições de ensino‖. A Resolução CNE/CP n° 1 de 2006 estabelece que a Licenciatura em Pedagogia assegura a formação de profissionais da educação para administração, planejamento, inspeção, supervisão e orientação educacional para a educação básica. Outro fator a ser destacado é que durante a formação inicial do pedagogo o interesse e vislumbramento do cargo de gestão configura-se como uma possibilidade remota principalmente, porque o aluno do curso de Pedagogia tem conhecimento que deverá desenvolver inicialmente a experiência docente o que demandará a atuação como professor durante alguns anos, para posterior participação em concursos ou processos seletivos para acesso ao cargo de gestor, conforme estabelece a Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional nº9394, de 20 de dezembro de 1996 - LDB ―a experiência docente é pré-requisito para o exercício profissional de quaisquer outras funções de magistério‖ Devemos considerar que grande parte dos conhecimentos necessários a atuação do gestor serão adquiridos durante o desempenho da docência, momento em que este profissional terá a oportunidade de observar e vivenciar o trabalho do gestor, fazendo 352 Grupo de Estudo e Pesquisas em Política Educacional, Rio Claro, 06, 07 e 08 de julho de 2011 Vol. 3 (2011)

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avaliações inclusive da adequação ou não das atitudes desse profissional comparadas com as orientações recebidas em sua formação inicial e também com a vivência nas organizações educacionais. Podemos afirmar então, que a formação do gestor será fortemente influenciada pelas observações e análises realizadas da atuação de outros gestores das escolas em que atuou como professor, ou seja, os modelos de gestor encontrados na carreira docente. Porém, cabe destacar que a análise do trabalho do gestor a partir do ponto de vista de um professor é diferente da análise a partir do ponto de vista de um gestor, cujo foco ampliar-se-á para todos os setores e âmbitos da unidade escolar. Tal afirmação pode ser facilmente confirmada no contato com gestores iniciantes que após algumas semanas de atuação na gestão costumam ressaltar o quanto a sua visão e entendimento da dinâmica de uma unidade escolar, antes restrita a sala de aula, foi ampliada, passando a observar e vivenciar todas as situações na unidade escolar e no seu entorno. Além da formação inicial proporcionada pelo curso de graduação em Pedagogia, os gestores têm a possibilidade de aprimorar sua formação através de cursos de aperfeiçoamento ou especialização na área de gestão escolar oferecidos pelas instituições de ensino superior públicas ou privadas.

2. As dificuldades do início da carreira de gestor

Em alguns estudos sobre a iniciação na carreira docente como o de Guarnieri (2000) é destacada a importância do exercício profissional na consolidação do processo de tornar-se professor. Nesse estudo, Guarnieri (2000) destaca que o exercício da docência possibilitará ao professor a articulação entre o ―conhecimento teórico acadêmico e o contexto escolar‖. No período de iniciação na carreira o professor poderá enfrentar algumas dificuldades que o levarão a abandonar ou até rejeitar os conhecimentos teórico-acadêmicos e aderir à cultura existente na escola tida como mais adequada à realidade. Outro comportamento possível do professor poderá ser a atribuição de uma conotação negativa à cultura escolar existente aliada a dificuldade de enfrentamento das situações reais, o que poderá causar desânimo e frustração. O estudo de Guarnieri (2000) confirmou que há aspectos do trabalho docente que só são percebidos pelo professor no exercício da profissão, entretanto destaca que isso não 353 Grupo de Estudo e Pesquisas em Política Educacional, Rio Claro, 06, 07 e 08 de julho de 2011 Vol. 3 (2011)

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significa desconsiderar o papel da formação, mas considerar que ocorrerá uma articulação entre conhecimento teórico, a realidade escolar e a prática docente.

O exercício profissional fornece pistas fundamentais para a construção da função docente, para a consolidação do processo de se tornar professor. Tal construção ocorre à medida que o professor articula conhecimento teórico-acadêmico, dados do contexto escolar e da prática docente por meio da reflexão. (GUARNIERI, 2000, p.19)

Semelhante ao que ocorre com os professores, os gestores também serão submetidos a um período de iniciação na carreira e enfrentarão alguns dilemas acrescidos de toda a problemática referente aos conflitos e relações pessoais entre professores, funcionários, pais e alunos, pois as relações interpessoais também constituem um dos grandes desafios de trabalho do gestor escolar. Nos sistemas de ensino onde a seleção para o cargo de gestor ocorre por concurso público, onde há a consideração de pontuação a partir do tempo de trabalho, poderá ocorrer a situação dos gestores iniciantes assumirem unidades escolares tidas como mais problemáticas, distantes, localizadas em bairros periféricos como ocorre com os professores iniciantes que muitas vezes assumem as classes onde se concentram os alunos com maiores dificuldades de aprendizagem. A situação do gestor escolar iniciante é agravada pelo fato de que sua atuação será acompanhada e avaliada por todos os atores do processo educativo, os membros da unidade escolar, da comunidade e do órgão gestor do sistema. Essa avaliação será fortemente influenciada pelo conhecimento da inexperiência do gestor iniciante nas questões administrativas e relacionais. Esse conhecimento poderá inclusive levar alguns membros do coletivo escolar a questionarem a autoridade do gestor desconsiderando suas decisões. Atuando como supervisora de ensino na Rede Municipal de Araraquara tenho tido contato com diretores iniciantes desde 2002. No início a preocupação da maioria detémse as questões burocráticas, dos documentos a serem organizados e encaminhados. Após os primeiros meses de atuação, os gestores percebem que os documentos a serem elaborados não constituem as situações mais desafiadoras para sua atuação, mas sim, as questões e conflitos interpessoais que demandam muita observação, imparcialidade, análise crítica, escuta atenta e bom senso. Além das questões de relação interpessoal, o gestor também será levado a refletir sobre o processo ensino-aprendizagem preocupando-se com a qualidade do ensino oferecido 354 Grupo de Estudo e Pesquisas em Política Educacional, Rio Claro, 06, 07 e 08 de julho de 2011 Vol. 3 (2011)

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em sua unidade escolar e o impacto do trabalho de sua equipe no desenvolvimento dos alunos, além das cobranças de resultados das avaliações em larga escala, como a Prova Brasil, no caso do ensino fundamental. Esses fatores levam o gestor iniciante a depararse com a complexidade do seu trabalho e a grande responsabilidade na condução dos processos. Outro fator importante a ser destacado é que, diferentemente do professor, o gestor constitui um profissional isolado na unidade escolar pois, não dispõe de pares para troca imediata de experiências, isso só ocorrerá se houverem momentos de reuniões dos diretores de escola proporcionadas pelo órgão gestor do sistema, as secretarias ou diretorias de ensino, ou se o gestor mantiver contato informal com gestores de outras unidades escolares. Ao falar em gestão escolar é preciso considerar que novos desafios se apresentam, não se admite mais uma visão reducionista limitada aos aspectos administrativos, o conceito de gestão escolar está ligado às idéias de democratização na tomada de decisões, elaboração conjunta de projetos e compreensão do aspecto dinâmico das relações interpessoais e relações ativas entre a organização e o seu entorno caracterizando uma atuação mais política. O termo ―gestão‖ foi escolhido, pois, reflete melhor a amplitude, complexidade e diversidade das ações a que estão sujeitos os dirigentes das organizações modernas, notadamente das organizações escolares. Historicamente a função de gestor escolar tem sido concebida como ampla e de grande responsabilidade para o sucesso do processo ensino aprendizagem. Já na década de 1960 Lima (1962) apontava que a função de dirigir a escola não é uma tarefa simples, mas de alta complexidade e com um nível de exigência elevado envolvendo funções pedagógicas, administrativas e sociais considerando os aspectos da relação escola-comunidade. Na década de 1970, Dias (1975) aponta que o comportamento do diretor deveria estar calcado em três dimensões: autoridade escolar, educador e administrador. Como autoridade escolar deveria responder por tudo o que ocorre dentro da escola, como educador deveria participar de todas as atividades relacionadas a aprendizagem dos alunos e a dimensão de administrador deveria contemplar os conhecimentos técnicos de administração relacionados aos objetivos da instituição escolar e as ações necessárias para atingir esses objetivos, bem como, a orientação das atividades de toda a equipe. 355 Grupo de Estudo e Pesquisas em Política Educacional, Rio Claro, 06, 07 e 08 de julho de 2011 Vol. 3 (2011)

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No Brasil, na década de 80, busca-se romper com a visão conservadora da administração educacional passando-se a usar o termo gestão com sentido democratizante em sintonia com o movimento de democratização da sociedade. Porém, a partir de segunda metade dos anos 1990 a educação também sofreu o impacto da reforma administrativa para o atendimento dos preceitos neoliberais. Segundo Cóssio (2010) entra em cena a tese da gestão escolar a partir de uma perspectiva gerencialista baseada na eficiência, eficácia, produtividade e resultado, nessa lógica o bom gestor é aquele que consegue garantir bons resultados nos processos de avaliação externa com o mínimo de investimentos. Cria-se um novo cenário descrito por Boaventura Santos (2007) como uma ―acirrada disputa entre regulação e emancipação‖. De acordo com Santos (2007) a democracia participativa pode transformar as relações de poder em relações de autoridade compartilhada e contribuir para a ampliação dos movimentos de emancipação. Nesse ponto destacamos a possibilidade de atuação do gestor escolar observando e aproveitando as oportunidades em que o sistema abre mão de suas prerrogativas decisórias em favor de instâncias coletivas de decisão, permitindo assim, o fortalecimento do plano local em detrimento do global. Portanto, essa construção democrática implicará na coexistência de regulação e emancipação e a atuação do gestor poderá propiciar o afastamento da regulação e a busca de novos caminhos para relações emancipatórias. Não há como negar a influência da mobilização das equipes escolares para a organização do projeto político-pedagógico, o compartilhamento de poder ocasionado pela tomada de decisão coletiva envolvendo tanto as equipes gestoras como os conselhos escolares, a compreensão e consideração da questão dinâmica, conflitiva e contraditória das relações interpessoais presentes nas organizações. Esses fatores demandam a atuação diferenciada do gestor que soma liderança e articulação e envolve a compreensão de que a mudança de processos educacionais envolve mudanças nas relações sociais praticadas na escola e nos sistemas de ensino. Analisando todo esse movimento que ocorre nas escolas atualmente é possível afirmar que o gestor não conseguirá atuar simplesmente como um gerente. A complexidade e dinâmica das instituições escolares acabam exigindo uma atuação que vai além do simples gerenciamento e envolve a liderança, o diálogo, o posicionamento político, a relação com a comunidade, a postura comprometida e muitas vezes a habilidade em 356 Grupo de Estudo e Pesquisas em Política Educacional, Rio Claro, 06, 07 e 08 de julho de 2011 Vol. 3 (2011)

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lidar com essas exigências externas e transformá-las em oportunidades para a democratização das relações no interior da escola. O termo gestão não elimina as ações referentes a administração da instituição escolar, mas vai além delas, abrangendo também a democratização na tomada de decisões, a elaboração coletiva do projeto político pedagógico, a compreensão do aspecto conflitivo das relações interpessoais e a compreensão de que a escola é uma instituição dinâmica que exige a atuação de uma liderança que coordene os esforços de todos os envolvidos. Dentro da perspectiva atual de gestão escolar esse profissional constitui-se um líder cujo papel, entre outros, deve ser o de desenvolver as potencialidades das pessoas que compõem seu grupo de trabalho desempenhando a função de educador e formador. Quanto aos conhecimentos necessários ao desempenho de seu papel, além das questões administrativas e de relações interpessoais, o gestor necessitará também de um pleno domínio dos conhecimentos pedagógicos para que possa coordenar o trabalho de sua equipe de educadores atuando como ―formador de formadores‖. Além disso, o conhecimento de aspectos pertinentes a gestão da sala de aula são essenciais para que a tomada de decisões administrativas priorizem o processo ensino aprendizagem que se efetiva na sala de aula.

3. A formação do gestor escolar Segundo a LDB a formação de profissionais de educação para administração, será realizada em cursos de graduação em pedagogia ou em nível de pós-graduação. Ao observar as matrizes curriculares de cursos de Pedagogia podemos verificar que as mesmas apresentam, em média, uma ou duas disciplinas referentes à gestão escolar e as horas de estágio específico. Esse fato justifica-se pela compreensão de que o objetivo principal da formação inicial do professor é a formação docente. Uma importante publicação da UNESCO, no ano de 2009, coordenada por Bernadete Angelina Gatti e Elba Siqueiro de Sá Ramalho, intitulada ―Professores do Brasil: impasses e desafios‖ apresenta um minucioso levantamento da formação docente no Brasil. Nesse estudo são discutidos os principais resultados da pesquisa ― Formação de professores para o ensino fundamental: instituições formadoras e seus currículos‖ realizada em 2008 pelo Departamento de Pesquisas Educacionais da Fundação Carlos

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Chagas. Essa pesquisa analisou a estrutura curricular e ementas de 165 cursos presenciais de formação inicial de docentes entre eles, 71 cursos de Pedagogia. Para a análise dos dados as disciplinas foram organizadas nas seguintes categorias de análise: fundamentos teóricos da educação; conhecimentos relativos aos sistemas educacionais; conhecimentos relativos às modalidades e níveis de ensino específicos; outros saberes; pesquisa e trabalho de conclusão de curso e atividades complementares. Na categoria fundamentos teóricos da educação foram incluídas as disciplinas que oferecem uma base teórica a partir de diferentes áreas de conhecimento, na categoria conhecimentos relativos aos sistemas educacionais estão as disciplinas relativas à estrutura e funcionamento do ensino, ao currículo, à gestão escolar e ao ofício docente. Na categoria conhecimentos relativos à formação profissional específica são contemplados os conteúdos do currículo da Educação Básica, as didáticas, metodologias e práticas de ensino e na categoria conhecimentos relativos às modalidades e níveis de ensino estão as disciplinas que abordam os níveis (Educação Infantil e Ensino fundamental) e as modalidades (Educação Especial e Educação de Jovens e Adultos). Nessa pesquisa foram analisados 71 cursos de Pedagogia e 3.107 disciplinas obrigatórias. As disciplinas que compunham a categoria de conhecimentos relativos aos sistemas educacionais somaram 15,5 % do total das disciplinas e entre essas apenas 4,5% (140) eram específicas de gestão escolar. A principal preocupação apontada no referido estudo em relação a formação docente em geral foi a presença reduzida, nos currículos, das disciplinas referentes às didáticas, metodologias e práticas de ensino que representam 20,7% do total e também as disciplinas voltadas aos conteúdos a serem ensinados nas séries iniciais do ensino fundamental que constituem 7,5% do conjunto total de disciplinas. A categoria fundamentos teóricos da educação apresentou o maior número de disciplinas, 26 %. Pensando na formação dos Pedagogos do município de Araraquara e microregião considero interessante realizar uma rápida análise das matrizes curriculares dos cursos de Pedagogia oferecidos pelas instituições de ensino superior do município de Araraquara. Essa análise irá pautar-se nas informações e documentos disponíveis nos sites das instituições de ensino superior.

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No município de Araraquara três instituições de ensino superior oferecem cursos de Pedagogia presencial, sendo uma pública, a Universidade Estadual Paulista ―Julio de Mesquita Filho‖ – UNESP e duas particulares, Universidade Paulista – UNIP e Centro Universitário de Araraquara – UNIARA. De acordo com a Resolução UNESP Nº 60, de 28 de agosto de 2007, que estabelece a estrutura curricular do Curso de Licenciatura em Pedagogia da Faculdade de Ciências e Letras do Campus de Araraquara – UNESP, o currículo de Pedagogia será organizado em três núcleos: núcleo de estudos básicos, núcleo de aprofundamento e diversificação de estudos e núcleo de estudos integradores35. O núcleo de estudos básicos contempla a maior parte das disciplinas e totaliza carga horária de 2.630 horas incluindo os estágios supervisionados. O núcleo de aprofundamento e diversificação de estudos contempla uma carga horária de 690 horas incluindo três disciplinas optativas e o núcleo de estudos integradores contempla 100 horas de atividades acadêmico-científico-culturais. A disciplina de Gestão Educacional está incluída no núcleo de estudos básicos com carga horária de 60 horas e deverá ser cursada no segundo semestre do 3° ano, ou seja, no 6° semestre do curso. O estágio curricular supervisionado em gestão educacional totaliza 100 horas. No 5° semestre é oferecida a disciplina Política Educacional Brasileira que constitui um importante fundamento para os estudos de gestão. Na estrutura curricular do curso de Pedagogia da UNIARA a disciplina de gestão escolar é oferecida no último ano juntamente com a realização dos estágios específicos de gestão escolar e Conhecimentos Pedagógicos e contextos não escolares. No site da instituição não há indicação da carga horária de cada disciplina. Na matriz curricular do curso de Pedagogia da Universidade Paulista – UNIP são elencadas duas disciplinas relacionadas à gestão, porém não há a indicação da carga horária, nem do semestre em que deverão ser cursadas: Práticas e Projetos na Formação do Pedagogo: Administração – Gestão Escolar e Pressupostos da Administração – Gestão Escolar e também Estágio Supervisionado em Gestão Educacional: Administração – Gestão Escolar. A matriz curricular do curso de Pedagogia de Araraquara é diferenciada dos outros campi da UNIP em virtude do 35

Esta organização está regulamentada na Resolução CNE/CP nº 1 que institui as Diretrizes Curriculares Nacionais para o curso de graduação em Pedagogia.

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cumprimento de um ―Termo de Saneamento de deficiências‖ assinado em 2009 entre a Universidade e o Ministério da Educação. Abaixo estão relacionadas as disciplinas elencadas nas matrizes do curso de Pedagogia de cada uma das instituições citadas. Tabela 1–Disciplinas obrigatórias das matrizes curriculares dos cursos de Pedagogia oferecidos por instituições públicas e privadas do município de Araraquara- SP Universidade Estadual Paulista “Julio de Mesquita Filho” UNESP Carga horária total : 3.420 Duração: 4 anos Total de disciplinas: 42 Filosofia da Educação I Filosofia da Educação II Filosofia da Educação III História da Educação I História da Educação II História da Educação III Psicologia da Educação I Psicologia da Educação II Psicologia da Educação III Psicologia da Educação IV

Instituições Centro Universitário de Araraquara UNIARA

Carga horária total : 3.200 Duração: 4 anos Total de disciplinas: 44 Fundamentos Filosóficos da Educação Fundamentos sociológicos da educação Didática Psicologia na Educação Teoria e prática pedagógica Laboratório de redação Pesquisa e formação docente História da educação Atividades teórico-práticas I Psicologia do desenvolvimento e ensino: aspectos físicos, cognitivos e psicosociais Língua Portuguesa: cont. e metodologia I Matemática: cont. e metodologia I Ciências Naturais: cont. e metodologia I Geografia: cont. e metodologia I História: cont. e metodologia I

Sociologia da Educação I Sociologia da Educação II Didática I Didática II Política Educacional Brasileira Estrutura e funcionamento da Educação Básica Teoria e Prática do currículo Pedagogias da infância

Processo de alfabetização Artes I: Ciências

Gestão educacional Estágio curricular supervisionado gestão escolar Coordenação Pedagógica Conteúdo, metodologia e Prática ensino de alfabetização Conteúdo, metodologia e prática ensino de Ciências Conteúdo, metodologia e prática ensino de História /Geografia Conteúdo, metodologia e Prática ensino de Língua Portuguesa Conteúdo, metodologia e prática ensino de Matemática Linguagens em educação

de

Atividades teórico-práticas II Língua Portuguesa: cont. e metodologia II Matemática: cont. e metodologia II Ciências Naturais: cont. e metodologia II

de

Geografia: cont. e metodologia II

de

História: cont. e metodologia II

de

Artes II: Plásticas

de

Educação Física: cont. e metodologia

em

Prática de Ensino Estágio supervisionado I

Educação de Jovens e adultos

Educação Infantil: Creches

Educação e inclusão

Estágio curricular supervisionado em Educação Infantil: Creches Educação Infantil: Pré-escolas

Comunicação oral e trabalho docente

Estágio curricular supervisionado em educação infantil: pré-escolas Educação Fundamental: anos iniciais I

Estágio supervisionado II

Estágio curricular supervisionado: anos iniciais do ensino fundamental I

Currículo e Projeto Pedagógico: Educação Infantil e Ensino fundamental

Prática de Ensino II

Atividades Teórico-Práticas III

Universidade PaulistaUNIP

Carga horária total : 3.590 Duração: 3ano e meio Total de disciplinas: 82 Alfabetização e Letramento Atividades complementares Atividades práticas supervisionadas Avaliação do rendimento escolar Avaliação do sistema educacional Ciências sociais Comuniçação e Expressão Correntes Pedagógicas da Educação Infantil Currículos e Programas Desenvolvimento da Educação por meio da Arte Didática aplicada à Educação à distãncia Didática e diversidade na sala de aula Didática: novas mediações Economia e educação Ecopedagogia: Educação, cultura e meio ambiente Educação de Jovens e Adultos Educação e movimentos históricos Educação inclusiva: aspectos teórico-práticos Educação profissional: serviços e apoio escolar Educação: relações de gênero e étnico raciais Estágio supervisionado Estágio supervisionado em educação Infantil Estágio supervisionado em educação profissional: serviços de apoio escolar Estágio supervisionado em Ensino Fundamental Estágio supervisionado em Ensino fundamental e Educação de Jovens e Adultos Estágio supervisionado em Ensino MédioModalidade Normal Estágio supervisionado em Gestão Educacional: supervisão Escolar Estágio Supervisionado em Gestão Educacional: Administração – Gestão escolar Estágio Supervisionado em Gestão Educacional: Ambientes não-escolares Estágio Supervisionado em Gestão Educacional: Orientação Escolar Estágio Supervisionado em Gestão Educacional: Planejamento educacional Estrutura e Funcionamento da Educação Básica Estrutura e organização da escola de educação infantil Estudos disciplinares

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III Seminário Internacional de Gestão Educacional Educação fundamental: anos iniciais II Estágio curricular supervisionado: anos iniciais do Ensino fundamental II Socio-antropologia, cultura e Escola

Gestão Escolar Metodologia Cient. Aplicada (Memorial)

Filosofia Filosofia e educação

Atendimento à saúde da criança

Filosofia: Reflexões sobre Ética,Comunicação e Marketing

Desenvolvimento e Educação Infantil

Conhecimentos Pedagógicos e contextos não escolares

Gestão da Educação em Ambientes não Escolares

Educação Especial

Estrutura e funcionamento da educação básica

Gestão Escolar: Dimensões da Ação Supervisora

Jogos, brinquedos e brincadeiras na Educação da Infância

ArtesIII: Música

Gestão Escolar: Mediação, Escola, Família e Saúde

Filosofia para crianças

Língua brasileira de sinais- LIBRAS

Gestão Escolar: Mediação, Escola, Trabalho e Lazer

Ação Pedagógica Integrada

Prática de Ensino III

Homem e Sociedade

Formação de identidade e escolarização

Estágio supervisionado III

Informática: Tecnologias Aplicadas à Educação

Atividades teórico-práticas IV

Interpretação e Produção de Textos Laboratórios de Brinquedos Pedagógicos Língua Brasileira de Sinais Linguagens: Expressões em Educação Metodologia de Ensino da Língua Portuguesa Metodologia do Ensino da Arte Metodologia do Ensino da Educação Física Metodologia do Ensino da Matemática Metodologia do Ensino de Ciências Metodologia do Ensino de Geografia Metodologia do Ensino de História Metodologia do Ensino Médio (Modalidade Normal) Metodologia do Trabalho Acadêmico Métodos de Pesquisa O Jogo na Construção do Conhecimento Pesquisa Educacional : Uso da Tecnologia da Informação e Comunicação Pesquisa Educacional: Dimensões Internas e Externas da Escola Pesquisa Educacional: Diversificação de Modelos Pedagógicos Planejamento Educacional e Projetos de Ação Pedagógica Políticas Públicas e Legislação de Ensino Prática na Educação Infantil (0 a 3 anos) Prática na Formação do Pedagogo: Orientação Educacional Práticas do Ensino Fundamental Práticas e Projetos na Educação Infantil (4 e 5 anos)

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Práticas e Projetos na Formação do Pedagogo: Administração – Gestão Escolar Práticas e Projetos na Formação do Pedagogo: Gestão da Educação em Ambientes não Escolares Práticas e Projetos na Formação do Pedagogo: Supervisão Escolar Práticas e Projetos no Ensino Fundamental Pressupostos da Administração – Gestão Escolar Projeto Monográfico Psicologia Construtivista e Sóciointeracionista Psicologia do Desenvolvimento e Teorias da Aprendizagem Psicologia do Desenvolvimento: Ciclo Vital Seminários Temáticos em Educação Infantil Seminários Temáticos: Ensino Fundamental Sociologia e Educação Sociologia: Transformações Sociais Trabalho de Curso

Fontes: www.fclar.unesp.br www.uniara.com.br www.unip.br

Buscando fazer uma análise semelhante a que foi feita na pesquisa ―Formação de professores para o ensino fundamental: instituições formadoras e seus currículos‖ foram analisadas as matrizes curriculares das três instituições que oferecem o curso de Pedagogia presencial em Araraquara organizando as disciplinas nas categorias citadas anteriormente, conforme tabela abaixo: Tabela 2- Disciplinas obrigatórias dos cursos de Pedagogia do Município de Araraquara organizadas em categorias.36 Categorias N % Fundamentos teóricos Fundamentos teóricos da educação 29 17,3 da educação Didática Geral 6 3,5 subtotal 35 20,8 Conhecimentos relativos aos Sistemas educacionais 7 4,2 sistemas educacionais Currículo 5 2,9 Gestão escolar 15 8,9 Ofício docente Subtotal 27 16,0

36

A estrutura da tabela foi baseada na tabela 5.1 do livro: Professores do Brasil: impasses e desafios.

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Conhecimentos formação específica

relativos à Conteúdos do currículo da educação profissional básica (infantil e fundamental) Didáticas específicas, metodologias e práticas de ensino Tecnologia Subtotal Conhecimentos relativos às Ed. Especial modalidades e níveis de ensino EJA Ed. Infantil Ens. Fundamental Contextos não escolares Subtotal Outros saberes Pesquisa e TCC Atividades complementares Total

58

34,5

1 59 5 2 6 3 2 18 14 9 1 168

0,6 35,1 2,9 1,2 3,6 1,8 1,2 10,7 8,4 5,3 0,6 100

Foram elencadas um total de 168 disciplinas destas, 16% são referentes aos conhecimentos relativos aos sistemas educacionais e, entre esses, 8,9 são específicos de gestão escolar. Na categoria gestão escolar foram incluídas as disciplinas de supervisão, orientação e gestão escolar e os estágios nessas áreas. As matrizes curriculares da UNESP e da UNIARA apresentam a disciplina Gestão Escolar geral. A UNIP apresenta disciplinas de cada área de gestão: supervisão (Gestão escolar: dimensões da ação supervisora; Práticas e Projetos na formação do Pedagogo: supervisão educacional e Estágio supervisionado de supervisão Escolar), orientação educacional (Gestão escolar: mediação, escola, família e saúde; Gestão escolar: mediação, escola, trabalho e lazer; Práticas e Projetos na formação do pedagogo: Orientação educacional) e Gestão escolar (Práticas e projetos na formação do pedagogo: Administração- gestão escolar e Pressuposto da administração- gestão escolar). Na categoria de conhecimentos relativos a formação profissional específica não foi possível separar as disciplinas de conteúdos e metodologias, pois constam nas matrizes disciplinas tais como: ― Conteúdo, metodologia e prática de ensino de ciências‖ e ―Geografia: conteúdo e metodologia‖ Observa-se que há predominância de disciplinas que abordam os conhecimentos relativos a formação profissional específica (35,1%) e em seguida as disciplinas que trabalham os fundamentos teóricos da educação (20,8%).

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A análise do quadro permite confirmar que os cursos de formação inicial de professores oferecidos no município de Araraquara têm buscado enfatizar os conhecimentos referentes aos conteúdos dos currículos da educação básica, das etapas educação infantil e ensino fundamental e também as metodologias e práticas de ensino específicas diferentemente do que foi apontado nos 71 cursos analisados na pesquisa citada. Ao compararmos o número de disciplinas das três instituições verificamos que a UNIP apresenta por volta de 40 disciplinas a mais que as outras duas instituições, uma carga horária maior porém a duração do curso é de 3 anos e meio. Além disso, a matriz curricular apresenta as outras disciplinas que também compõem uma área maior de gestão: supervisão e orientação educacional. Em relação à contribuição dos estágios específicos realizados no curso de graduação em Pedagogia podemos apontar algumas preocupações. Normalmente, observa-se a dificuldade dos estagiários em aproximar-se de fato da figura do gestor escolar e acompanhar a sua atuação. Frequentemente, esse estágio se resume a uma rápida conversa baseada apenas nas informações verbais do gestor sem um acompanhamento e análise do trabalho nas suas diferentes atividades incluindo o atendimento a comunidade, alunos e professores, reuniões com a equipe escolar, o conselho de escola, reuniões de pais e reuniões no órgão gestor (Secretaria da Educação ou Diretoria de Ensino) que proporcionariam ao aluno uma dimensão mais adequada da competência política deste profissional na atuação em situações diferenciadas e às vezes até conflituosas. A formação de gestores escolares poderá ser realizada também em cursos de pósgraduação. A LDB preconiza que União, os Estados e os Municípios deverão promover a formação continuada dos profissionais do magistério. Nesse sentido, podemos citar alguns programas que tem como foco a formação do gestor escolar como por exemplo, ―Circuito Gestão‖, ―Pró gestão‖ e ―Escola de Gestores‖. O Programa de Educação continuada ―Circuito gestão‖ foi desenvolvido no Sistema de Ensino do Estado de São Paulo, de 2000 a 2002 durante o governo de Mário Covas. O ―Pró gestão‖ foi idealizado e formulado pelo CONSED – Conselho Nacional de Secretários da Educação e destina-se a formação continuada e em serviço dos gestores escolares das Escolas Públicas de Ensino Fundamental e Médio. 364 Grupo de Estudo e Pesquisas em Política Educacional, Rio Claro, 06, 07 e 08 de julho de 2011 Vol. 3 (2011)

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O Programa Nacional Escola de Gestores da Educação Básica Pública integra o Plano de Desenvolvimento da Educação – PDE e tem como principal objetivo ―contribuir com a qualificação do gestor escolar na perspectiva da gestão democrática e da efetivação do direito à educação escolar básica com qualidade social‖. A formação dos gestores é realizada por uma rede de universidades públicas parceiras do MEC. O programa teve início em 2005 com um curso piloto e em 2006 passou a ser coordenado pela SEB/MEC dando início ao curso de pós-graduação (lato sensu) em Gestão Escolar com carga horária de 400 horas. A partir de 2009 o programa passou a oferecer também o Curso de Pós-graduação (lato sensu) em Coordenação Pedagógica e em 2010 o curso de Aperfeiçoamento em Gestão Escolar com carga horária de 200 horas. O princípio norteador do curso de Especialização em Gestão Escolar é a gestão democrática entendida como uma das dimensões que pode contribuir significativamente para viabilizar o direito à educação como direito universal. O curso está estruturado em três eixos: o direito à educação e a função social da escola básica; políticas da educação e gestão democrática da escola; Projeto Político Pedagógico e práticas democráticas na gestão escolar. Segundo o documento ―Projeto Curso de Especialização em Gestão Escolar‖ disponível no site MEC- SEB no eixo direito à educação e a função social da escola básica serão explorados os fundamentos filosóficos, políticos, sociais, culturais e epistemológicos da gestão como expressão da prática social. No eixo políticas e gestão na educação a intenção é proporcionar uma reflexão sobre as políticas educacionais no Brasil, no eixo Planejamento e Práticas na Gestão Escolar é explorado instrumental que permita ao gestor planejar, monitorar e avaliar os processos de execução do Projeto Político Pedagógico. Além dos requisitos básicos para a participação no curso como, por exemplo, ter concluído curso de graduação plena e ser gestor em efetivo exercício em escola pública municipal e/ou estadual, há também os requisitos especiais que consideram a atuação em escolas com baixo Índice de Desenvolvimento da Educação – IDEB. Na descrição do perfil do profissional que se deseja formar estão descritas 12 habilidades a serem desenvolvidas e todas estão relacionadas com a gestão democrática e a compreensão do direito à educação básica. Numa rápida análise dos eixos e ambientes de aprendizagem é possível observar que os temas propostos podem desencadear discussões e reflexões que venham a ampliar a 365 Grupo de Estudo e Pesquisas em Política Educacional, Rio Claro, 06, 07 e 08 de julho de 2011 Vol. 3 (2011)

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compreensão do gestor escolar do seu papel político-pedagógico e das possibilidades de desenvolvimento de um trabalho de busca da gestão democrática no caminho da disputa entre regulação e emancipação.

4- Considerações Este texto buscou destacar alguns elementos da formação dos gestores escolares a partir do estudo da formação de professores, apontando as dificuldades no início da carreira e descrevendo brevemente como se organizam os cursos de formação inicial e continuada. A análise das matrizes curriculares do curso de Pedagogia, bem como dos eixos do curso de formação continuada aponta para a necessidade de um estudo dos planos de ensino das disciplinas para identificar os possíveis impactos da formação na atuação profissional. O trabalho do gestor tem como objetivo organizar, mobilizar e articular os recursos e as condições materiais e humanas necessárias para o avanço dos processos educacionais das escolas. É importante destacar que a gestão escolar não é um fim em si mesma, mas um meio para a garantia da aprendizagem efetiva dos alunos e o enfrentamento das transformações econômicas, sociais, culturais e políticas que os novos tempos demandam. Cabe destacar que a vivência nos espaços escolares acompanhada de uma observação atenta e reflexiva poderá contribuir para a formação de um profissional que busque enfrentar toda a complexidade envolvida na sua atuação tendo plena consciência de sua grande responsabilidade e poder.

Poder no sentido de usar situações

desfavoráveis transformando-as em situações de conquista de autonomia, e a busca do fortalecimento da gestão participativa.

Sabemos que além dos conhecimentos,

habilidades e competências, que serão explorados nos cursos de formação inicial ou continuada, esse profissional precisará ter clareza do seu papel formador: formador de alunos, de professores, da comunidade e de si próprio, compreender a realidade local e trabalhar para construir as mudanças necessárias na busca de uma educação que garanta a aprendizagem e o desenvolvimento dos alunos.

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368 Grupo de Estudo e Pesquisas em Política Educacional, Rio Claro, 06, 07 e 08 de julho de 2011 Vol. 3 (2011)

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O PIBID- PEDAGOGIA COMO POLÍTICA DE FORMAÇÃO DOCENTE: PRÁTICAS E VIVÊNCIAS PEDAGÓGICAS NAS ESCOLAS PÚBLICAS Suzana Luis Barrios Sandra Regina Paz da Silva UFAL

Resumo: Este artigo trata da experiência de formação e intervenção pedagógica que vem sendo realizada em escolas públicas da rede estadual de ensino do Estado de Alagoas, a partir da efetivação do PIBID-UFAL - Subprojeto do Curso de Licenciatura em Pedagogia, financiado pela CAPES. O Subprojeto tem como título ―Melhorando a Qualidade da Educação no Ensino Fundamental em Escolas da Rede Pública‖. Este subprojeto tem como objetivo contribuir com a formação do (a) pedagogo (a), tendo como lócus privilegiado de formação e intervenção a escola, sobretudo a escola pública. Não obstante, pretende ampliar a formação inicial dos bolsistas de Pedagogia, possibilitando uma vivência no ambiente escolar, com ênfase na prática docente de forma sistemática e orientada; dando ênfase aos estudos da Língua Portuguesa e da Matemática, já que os índices dessas disciplinas no estado têm apontado comprometimento nos processos de aprendizagem dos alunos dos anos inicias, e têm apresentado baixíssimos indicadores em avaliações nacionais (Prova Brasil) e internacionais (PISA) e por outro, refletir, incentivar, analisar e atuar, junto com os professores das escolas selecionadas, bem como dos demais bolsistas das licenciaturas (Letras e Matemática) envolvidos no PIBID, no tocante aos processos de avaliação, planejamento e metodologias realizados na escola, de modo que a partir da açãoreflexão-ação, sejam vivenciadas práticas pedagógicas com o aporte dos recursos da tecnologia da comunicação e informação à elaboração de atividades diversificadas que venham a contribuir com o processo de ensino e aprendizagem na escola. Palavras-chave: formação, escola e intervenção pedagógica.

1. INTRODUÇÃO

O Programa Institucional de Bolsa de Iniciação à Docência - PIBID, que vem sendo fomentado pela CAPES desde 2007 e que tem como objetivo a inserção de alunos de licenciaturas em escolas públicas para o desenvolvimento de propostas metodológicas e de projetos didáticos junto aos professores dessas escolas, tem três finalidades básicas, a saber: a) a valorização do magistério pelo futuro docente; b) a valorização da escola pública como futuro campo de trabalho e c) a melhoria das ações pedagógicas nas escolas onde o programa for desenvolvido. A partir dessas finalidades 369 Grupo de Estudo e Pesquisas em Política Educacional, Rio Claro, 06, 07 e 08 de julho de 2011 Vol. 3 (2011)

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e das ações específicas que o projeto do PIBID-UFAL especificamente tem desenvolvido, buscaremos analisar as várias contribuições que tal programa vem trazendo à formação inicial de futuros professores e à formação continuada de professores da educação básica. Este Programa, com o Subprojeto de Licenciatura em Pedagogia, intitulado: “Melhorando a Qualidade da Educação no Ensino Fundamental em Escolas da Rede Pública”, no Curso de Pedagogia-Licenciatura, da Universidade Federal de Alagoas (UFAL), teve início em maio de 2010, com o propósito de contribuir com o processo de formação dos (as) pedagogos (as) através do desenvolvimento de projetos de intervenção nas escolas públicas da cidade de Maceió-AL, pois a escola, sobretudo a escola pública, é considerada o lócus privilegiado de formação e intervenção com vistas ao desenvolvimento de práticas pedagógicas que visem contribuir com a melhoria dos indicadores educacionais do Estado de Alagoas. O Subprojeto contempla vinte bolsistas, graduandos do curso de Pedagogia, distribuídos em quatro escolas da rede estadual de ensino do Estado de Alagoas e quatro supervisoras pedagógicas, professoras das escolas atendidas, que atuam na orientação e acompanhamento do trabalho pedagógico desenvolvido nas escolas. Assim, o PIBID oferece bolsas de iniciação à docência aos alunos de cursos presenciais que se dediquem à docência nas escolas públicas e que, na condição de graduados, se comprometam com o exercício do magistério na rede pública. Não obstante, um dos objetivos gerais do Programa é antecipar o vínculo entre os futuros mestres e as salas de aula, assim como menciona Maria Celeste Silva (1997. p. 53): A entrada de um adulto jovem na carreira docente, numa sociedade em mudança, é difícil, conflituosa e, por vezes, frustrante, podendo provocar uma crise de identidade e pôr em causa as crenças e valores aceites pela sociedade. Quando alguém inicia a profissão docente, teme a falta de adequação dos seus modos de pensar e agir com o dos seus pares, não sabe a quem pedir ajuda, nem como pautar os seus procedimentos. É como se, da noite para o dia, deixasse subitamente de ser estudante e sobre os seus ombros caísse uma responsabilidade profissional, cada vez mais acrescida, para a qual percebe não estar preparado.

Com essa iniciativa, o PIBID vislumbra a escola como um lugar próximo e concreto na vida profissional dos graduandos, como pretende também uma aproximação dos graduandos aos sistemas estaduais e municipais de ensino e a universidade pública, buscando proporcionar uma articulação entre a educação superior (por meio das 370 Grupo de Estudo e Pesquisas em Política Educacional, Rio Claro, 06, 07 e 08 de julho de 2011 Vol. 3 (2011)

III Seminário Internacional de Gestão Educacional

licenciaturas) e as secretarias estaduais e municipais de educação, a favor da melhoria do ensino nas escolas públicas. Isto em virtude dos resultados e

Índices de

Desenvolvimento da Educação Básica (IDEB), visto estarem no Estado abaixo da média nacional, que é de 4,4. O processo de escolha das escolas, campo de atuação, se deu a partir da análise das notas alcançadas na Prova Brasil, e das médias apresentadas pelo o IDEB. Com a implantação do subprojeto no Curso de Pedagogia, neste primeiro ano, a atuação dos bolsistas nas escolas já causa diferenças no que diz respeito às mudanças nas áreas de alfabetização, letramento e alfabetização matemática, já que estas são as áreas centrais do subprojeto.

Seguindo a proposta estabelecida no subprojeto, o Pibid-Pedagogia tem como objetivo principal, por um lado, ampliar a formação inicial dos bolsistas, possibilitando uma vivência no ambiente escolar, sobretudo da prática docente de forma sistemática e orientada, para que desta maneira os futuros professores, aprendam a gerir os dilemas, próprios da sua atividade profissional, sem que se tornem numa fonte de frustrações, ansiedades ou, em última análise, desmotivação profissional, torna-se necessário que os professores principiantes sintam a necessidade de elaborar e desenvolver – em consonância com as características da comunidade escolar em que exercem a sua profissão – o seu próprio projecto de formação continuada que lhes permita, através da transformação do seu sistema de crenças, da melhoria do seu autoconhecimento, da sua auto-estima e autoconceito, tornarem-se mais abertos à mudança e desenvolverem-se pessoal e profissionalmente. (SILVA, 1997. p. 59).

Como também dar ênfase aos estudos da Língua Portuguesa e da Matemática, já que os índices dessas disciplinas têm apontado comprometimento nos processos de aprendizagem dos alunos dos anos inicias, que têm apresentado baixíssimos indicadores em avaliações nacionais (Prova Brasil) e internacionais (PISA37) e por outro lado,

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PISA - Programa Internacional de Avaliação de Alunos – é uma avaliação internacional realizada há cada três anos pela OCDE (Organização para Cooperação e Desenvolvimento Econômico). A avaliação tem por objetivo medir o nível educacional de jovens de 15 anos por meio de provas de Leitura, Matemática e Ciências. O Brasil participa pela, terceira vez consecutiva, por meio do Inep, responsável pela aplicação das provas em todo o País. Apesar dos resultados alcançado em 2006, mostrando aumento no índice dos conhecimentos matemáticos o Brasil só ficou atrás da Indonésia. O documento também revelou acentuada diferença de desempenho por gênero, enquanto meninos são melhores em Matemática e Ciências, as meninas os superam em Leitura. Em Ciências constata-se uma pequena diferença: meninas ficaram com 386 pontos e meninos, com 395. Vantagem, portanto, de nove pontos. Essa diferença aumenta para 19 pontos nas médias de Matemática, onde mulheres tiveram 361 pontos e homens, 380. Mas quando o assunto é Leitura, as as meninas tiveram nada menos que 32 pontos a mais: foram 408

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refletir, incentivar, analisar e atuar, junto com os professores das escolas selecionadas, sobre os processos de avaliação, planejamento e metodologias realizados na escola, para que sejam vivenciadas práticas pedagógicas levando em conta, inclusive os indicadores da qualidade da educação, dessas escolas. Com este intuito pretendemos compartilhar neste artigo as vivências de formação inicial que vem acontecendo na escola pública. Desde modo, o artigo encontra estruturado em duas partes que se complementam. Na primeira discutiremos as dimensões teóricas e conceituais acerca da formação docente e na segunda, discutiremos as práticas e vivências de formação inicial.

2. Formação inicial e continuada articuladas em um processo de ação-reflexãoação Seja na formação inicial, seja na formação continuada, discutir sobre os processos reflexivos e a constituição do saber-fazer do professor não é possível sem que demarquemos os contornos e contextos mais amplos através e em função dos quais tais saberes se fazem. Isso significa, então, discutir, dentre outras questões, a problemática que tem vivido o professorado: o mal-estar docente, que consiste em uma série de "efeitos permanentes, de carácter negativo, que afectam a personalidade do professor como resultado das condições psicológicas e sociais em que exerce a docência, devido à mudança social acelerada" (ESTEVE, 1997, p. 98). Dentre esses elementos que vêm afetando ou tensionam o professor, destacamos alguns que consideramos mais relevantes sobre o desenvolvimento do pensamento e do fazer dos professores, a saber: (a) o aumento das exigências sobre seu trabalho, além da tradicional necessidade de domínio do conteúdo ensinado, responsabilizando-se pela aprendizagem do aluno; (b) o desenvolvimento de fontes de informação alternativas à escola, exigindo de sua parte maior integração às fontes de conhecimento e às tecnologias; (c) o aumento das contradições no exercício da docência, com a coexistência de diferentes abordagens de ensino e da exigência, de um lado, para que seja amigo, para que seja dialógico e, de outro, para que avalie, certifique o aluno; (d) sua desvalorização social, consubstanciada nos baixos salários; (e) o caráter provisório delas a 376 deles. Veja o desempenho por gênero em cada estado. (Fonte: www.inep.gov.br acesso 27/8/2006).

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do

conhecimento

que

impõe

a

necessidade

de

permanente

atualização

e

aprofundamento, aliada às mudanças curriculares; (f) as deficientes condições de trabalho e a fragmentação de seu trabalho, agravadas pelas inúmeras exigências, tanto do ponto de vista burocrático e administrativo quanto do ponto de vista pedagógico, o que lhe dificulta dedicar-se com qualidade ao seu trabalho (ESTEVE, 1997). Santos (2002), por sua vez, alerta que essa problemática é ainda agravada pelo problema da violência, do tráfico de drogas dentro e fora da escola e pelas demandas relativas à melhoria das condições físicas, sociais e emocionais da população atendida pela escola. Nesse mesmo sentido, outras formas de ofensivas à profissão docente são destacadas por Nóvoa (1995), no que se refere ao perfil da formação dos professores em Portugal, pelo menos até a primeira metade do Século XX, ao mostrar, por exemplo, que há uma redução do controle da profissão docente, destacando-se a redução do tempo de formação e a diminuição da exigência intelectual e científica, bem como o controle ideológico de sua formação e da avaliação dos exames de Estado. Esses aspectos podem ser percebidos também na história do magistério no Brasil, marcada por ambiguidades, pela perda de privilégios, pela fragmentação e por inúmeras dicotomias, especialmente as dissociações teoria/prática e pesquisa/ensino, incorrendo na falta de identidade do trabalho pedagógico do professor. Esses problemas resultam na desvalorização social do professor, na diminuição de seu poder em função da passividade cognitiva a que tem sido submetido – fruto da fragmentação do seu saber (KINCHELOE, 1997) – bem como da formação dissociada da pesquisa e da subtração de suas competências de pensar o seu fazer pedagógico. Por outro lado, tem havido uma constante e consistente discussão (NÓVOA, 1997; ZEICHNER, 1997; FREITAS, 2003; TARDIF, 2002; WEBER, 2003; TARDIF & LESSARD, 2005; 2008, entre outros) sobre os rumos da formação e da prática pedagógica do professor no intuito de um fortalecimento tanto intelectual quanto político do mesmo, discussão na qual muitos professores ("práticos") já têm se engajado. Por outro lado, pensar a formação docente remete-nos necessariamente à discussão sobre a qualidade do ensino no país, das condições de escolarização de nossos jovens, adolescentes, crianças e adultos e o desempenho que estes apresentam; enfim, remetenos a refletir se a escola tem possibilitado de fato a democratização do conhecimento, 373 Grupo de Estudo e Pesquisas em Política Educacional, Rio Claro, 06, 07 e 08 de julho de 2011 Vol. 3 (2011)

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concebido como riqueza (BEZERRA, 2009). Em particular, no estado de Alagoas os estudantes têm apresentado os desempenhos mais baixos do país, ao se verificar seus conhecimentos nas diferentes áreas, problemática que vem atingindo especialmente as escolas públicas. São muitas justificativas para esse insucesso: desinteresse dos alunos, falta de recursos que despertem a atenção e possibilitem a problematização, a qualidade da formação inicial e continuada dos professores, dentre outros aspectos. O desafio da melhoria da qualidade da Educação traz para o papel do professor e, consequentemente, para a sua formação, novas funções e responsabilidades, pois não basta apenas conhecer sua área específica para ensinar. Faz-se necessária uma compreensão ampla da Educação, da Escola e de suas finalidades e o desenvolvimento de processos de ensino e de aprendizagem que promovam o desejo de aprender dos alunos, construindo uma relação com o saber (CHARLOT, 2005). Nesse sentido, aos Cursos de Licenciatura coloca-se o desafio de formar futuros professores a fim não só de conhecer a fundo sua disciplina, mas também construir um conhecimento pedagógico consistente e saber dotar as aulas de significado. Mais que isso, um dos maiores desafios da formação e da profissionalização do futuro professor é a construção da identidade docente, materializada no investimento pessoal na formação, no interesse pela Educação e no anseio de dedicação integral/profissional à docência. Assim, o PIBID-UFAL, consubstancia um esforço, de pensar a formação docente, sobretudo da área de Pedagogia,

como uma dimensão que se realiza a partir da

compreensão da prática pedagógica como um espaço de pesquisa-ação, através do desenvolvimento de estudos, reflexões e projetos que efetivamente contribuam para a melhoria da qualidade do ensino nos quais professores da educação básica e futuros professores, articuladamente, protagonizam seus processos formativos. Esse Subprojeto tem como perspectiva metodológica a pesquisa ação, uma estratégia de melhora da prática pedagógica e de desenvolvimento profissional do professor. A pesquisa ação é um meio de produzir conhecimento sobre os problemas vividos pelo profissional para atingir uma melhora da situação, de si mesmo e da coletividade (ELLIOTT, 1998). Essa é uma corrente de pesquisa que implica na compreensão da prática pedagógica a partir da perspectiva do professor da educação básica. Implica também uma relação indissociada entre teoria e prática, pois a teoria se 374 Grupo de Estudo e Pesquisas em Política Educacional, Rio Claro, 06, 07 e 08 de julho de 2011 Vol. 3 (2011)

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deriva da prática e se constitui num conjunto de abstrações efetuadas a partir dela, não havendo, pois, relação de hierarquia entre elas. As características mais relevantes da pesquisa ação (ELLIOTT, 1991 apud PEREIRA, 1998) consistem em: a) buscar a formação das pessoas que nela estão envolvidas; b) centrar-se nas atuações históricas e situações sociais percebidas como problemáticas e passíveis de mudanças pelos professores; c) compreender a realidade sob o ponto de vista dos sujeitos e d) proceder a uma reelaboração discursiva das práticas e das inter-relações entre as mesmas. Especificamente no que diz respeito à formação docente continuada, a pesquisa ação apresenta-se como vantagem, pois colabora para o desenvolvimento do juízo prático do professor em seu processo cotidiano de ensinar e aprender (sabedoria prática); desenvolve/reforça a postura colaborativa dos professores como sujeitos de uma prática social coletiva; valoriza os saberes desenvolvidos pelos professores em sua prática e promove o desenvolvimento profissional do professor como pesquisador, bem como compreende a participação como necessidade ontológica, pois a tradição pedagógica só é compreensível para quem dela participa, para quem a constrói. Por essas razões, particularmente o compromisso com a mudança da realidade e valorização docente, a pesquisa ação melhor responde aos objetivos de melhoria do ensino na educação básica, como pretende o Subprojeto de Pedagogia – PIBID-UFAL. Assim, o futuro professor deverá desenvolver sua habilidade de observação, de análise crítica e de busca de soluções, fundamental para um professor intelectual com sensibilidade suficiente para saber atuar face o cotidiano em que está inserido. Nesse sentido, este projeto torna-se um aliado bastante significativo para a formação docente, à medida que traz condições para que haja mais professores atentos a essa realidade. Algumas dessas condições são a relação teoria-prática, a problematização da realidade, a parceria com professores experientes e a identidade e significado histórico da Escola Pública. Nessa perspectiva, os alunos bolsistas (futuros professores) estão tendo a oportunidade de vivenciar várias ações de acordo com as que estão apresentadas a seguir: apropriação de referencial teórico voltado para o ensino, relacionado as disciplinas dos fundamentos da educação com as disciplinas pedagógicas; pesquisa 375 Grupo de Estudo e Pesquisas em Política Educacional, Rio Claro, 06, 07 e 08 de julho de 2011 Vol. 3 (2011)

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sobre a realidade das escolas participantes do projeto; análise dos dados coletados no diagnóstico; criação e implementação de projetos didáticos; atividades práticas, experimentais, trabalho com grupos de estudos na escola e na universidade. Deste modo, o bolsista da área de Pedagogia tem a oportunidade de exercer sua capacidade criativa em termos de planejamento de ensino, desenvolvimento de práticas avaliativas inovadoras, resolução de situações educativas problemáticas, produção de materiais pedagógicos, dentre outros; competência e conhecimentos necessários e de evidente utilidade para o desempenho de sua profissão. Neste contexto, é de fundamental importância à troca de conhecimentos e experiências com professores da educação básica, na elaboração de planos de ensino, na construção de materiais pedagógicos, jogos etc. tornando os participantes agentes multiplicadores. Todas essas experiências se constituem em elementos que, como destaca Pimenta (1999), buscam construir um pensar/fazer reflexivo: a) a problematização (a prática pedagógica é permeada pelo questionamento permanente do que, do por que, do para que e do como fazer); b) a intencionalidade de encontrar soluções (o professor profissional/intelectual sente-se mobilizado a responder às necessidades postas pelo real); c) a experimentação metodológica (processo permanente, mesmo que apoiado naquilo que já se faz bem); d) enfrentamento de situações de ensino complexas (a todo momento o professor se depara com a necessidade de tomar diversas e complexas decisões, além de questões endêmicas, como fracasso escolar, indisciplina e desinteresse dos alunos etc.); e e) tentativas didáticas inovadoras (superação das práticas que não correspondam às suas expectativas e necessidades). É importante destacar que a defesa de uma prática reflexiva como base para o trabalho e a formação docente inicial e continuada está submetida a duas condições: uma, é a de que se trata de uma prática reflexiva baseada no interesse, ao mesmo tempo pessoal, profissional e institucional, de melhoria da prática pedagógica, com base no tripé do desenvolvimento crítico do professor que Nóvoa (1997) propõe: desenvolvimento pessoal (produzir a vida do professor), desenvolvimento profissional (produzir a profissão docente) e desenvolvimento organizacional (produzir a escola). A outra condição é a de que os próprios professores assumam a autoria das inovações e das experiências pedagógicas de sucesso que ficam guardadas entre as paredes de suas salas de aula, quando muito, das escolas em que atuam. 376 Grupo de Estudo e Pesquisas em Política Educacional, Rio Claro, 06, 07 e 08 de julho de 2011 Vol. 3 (2011)

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Essas preocupações novamente se referem a uma postura epistemológica contrária à fragmentação que a ciência moderna impõe à prática pedagógica, a uma postura que supere a mecanização do processo ensino-aprendizagem e a fragmentação do conhecimento, através de uma prática reflexiva, crítica e transformadora (FREIRE, 1997; ZEICHNER, 1997; NÓVOA, 1997 E PIMENTA, 1999). Entender a prática educativa como possibilidade de reflexão crítica pressupõe a visão da ação pedagógica como uma estrutura complexa, como afirma Sacristán (1999, p. 54): cada tarefa pedagógica não é só uma atividade, mas uma unidade estruturada de pensamento do professor, cuja função relaciona-se com uma atividade prática, proporciona uma análise da situação pedagógica concreta, propõe os objetivos em um determinado contexto de atividade, controla e regula o processo de sua consecução e avalia os resultados [...] [às quais] podem ser associadas múltiplas crenças e valorizações.

É essa estrutura complexa que, ao mesmo tempo em que faz o professor mobilizar diversos conhecimentos e esquemas de ação, traz ao professor as condições de reflexividade. Nesse caso, o professor precisa estar atento ao observável, ao falado, ao dito e aos não-ditos de sua prática, o que exige uma curiosidade permanente, uma capacidade de pensamento ágil e apurado, bem como algum nível de sistematicidade dessa reflexão, num exercício de ação-reflexão-ação (LUIS, 2000). É importante destacar o papel impulsionador que a ação tem, sendo por isso que não se fala em reflexão-ação-reflexão, embora este seja um caminho possível também, dada a relativa independência do pensamento em relação à prática. Nesse sentido de impulsionamento de práticas reflexivas e transformadoras, o PIBID vem se constituindo em um processo de autoformação inicial e continuada. Por que falamos em autoformação? Porque se trata de um processo deliberativo e de um investimento pessoal e profissional do professor, ainda que reivindiquemos as condições institucionais e políticas para tal empreendimento. E porque "abandona-se o conceito obsoleto de que a formação é atualização científica, didática e pedagógica do professor para adotar um conceito de formação que consiste em descobrir, organizar, fundamentar, revisar e construir a teoria" (IMBERNÓN, 2002, p.49). Assim, não há sentido em uma perspectiva de formação continuada dos professores da educação básica 377 Grupo de Estudo e Pesquisas em Política Educacional, Rio Claro, 06, 07 e 08 de julho de 2011 Vol. 3 (2011)

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restrita (―capacitação‖), baseada unicamente no modelo de cursos de atualização fora do ambiente do exercício docente. Ao contrário, não só a escola é o espaço privilegiado desse processo de formação continuada, como os desafios da sala de aula, com suas especificidades, com suas características político pedagógicas são colocadas no centro da reflexão e, portanto, da busca de superação dos problemas e melhoria da qualidade do ensino.

3. O Subprojeto de Pedagogia - PIBID-UFAL: dimensões e contribuições na formação do pedagogo na escola. O Subprojeto de Pedagogia encontra-se pautado em matizes conceituais que leva em consideração a sala de aula como o lócus privilegiado de ensino e o espaço de ―encontro dos sujeitos pedagógicos‖, momento singular de aprendizagens efetivas e significativas. A pesquisa compreendida como componente indispensável do avanço do conhecimento científico-tecnológico desempenha papel relevante como fonte de estudo, reflexão e autocrítica dos conhecimentos acumulados pelo professor/pesquisador, na sua prática educativa. É ela também que, a nosso ver, viabiliza a participação ativa do educando no percurso formativo, quando emerge os objetos de estudo como interesse de pesquisa e investigação (ANDRÉ, 1997). Por sua vez, a extensão universitária, como uma das dimensões deste Subprojeto é um momento de confluência dos estudos e pesquisas. Ela consubstancia-se como instância privilegiada de realização e devolução a sociedade dos conhecimentos produzidos socialmente na universidade, através dos projetos de intervenção na escola pública. Em todas as atividades que compõem o trabalho docente, o professor/pesquisador desempenha um papel fundamental de organizador, facilitador, mediador e estimulador da autonomia dos educandos, frente à sistematização e a reelaboração dos conhecimentos historicamente construídos (FREIRE, 1997; SOUZA, 1999). Entretanto, isto só é possível porque na relação entre docente e discente não há uma relação entre sujeito e objeto. A docência é uma ação de interação humana, como bem menciona Tardif (2002, p. 237) ―é um trabalho cujo objeto não é constituído de uma matéria inerte ou de símbolos, mas de relações humanas com pessoas capazes e dotadas de uma certa capacidade de participar da ação dos professores”.

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Daí se faz necessário em todo percurso formativo que envolve a formação de professores, reconhecer que estes são sujeitos do conhecimento, e como tais, possuem saberes e se mobilizados podem contribuir para formação de novas práticas educativas (TARDIF, 2002, p. 237). Outro aspecto, privilegiado no subprojeto de Pedagogia é o conceito de interdisciplinaridade e sua relação com as atividades de ensino. Concebido de acordo com Fazenda (1999, p. 23), do ponto de vista epistemológico, como um método de ensino e pesquisa voltado para interação em uma, duas ou mais disciplinas, num processo que pode ir da simples comunicação de ideias, até a integração recíproca de finalidades, objetivos, conceitos, conteúdos, metodologia e procedimentos como formas de organizar e sistematizar a elaboração de conhecimentos. Adotar práticas pedagógicas numa perspectiva interdisciplinar implica ter como ponto de partida e chegada o diálogo que se estabelece com as disciplinas e entre os sujeitos da ação, fortalecendo a identidade dos sujeitos e a possibilidade de mudanças na prática pedagógica. De acordo com Fazenda (1999, p. 23): [...] embasa-se no reconhecimento da provisoriedade do conhecimento, no questionamento constante das próprias posições assumidas e dos procedimentos adotados, no respeito a individualidade e na abertura à investigação em busca da totalidade do conhecimento.

Desenvolver a perspectiva interdisciplinar na sala de aula pressupõe superar desafios e provocar mudanças nas estruturas formais de produção do conhecimento. Isto significa adotar posturas e atitudes que supere a rigidez, à sequência lógica e linear dos conteúdos para uma perspectiva integradora, aberta ao novo e ao dinamismo nas formas de aprender e ensinar; implica também, superar o paternalismo do tratamento com os alunos e provocá-los para a autonomia no processo de produção de conhecimento, além de superar a postura de professores reprodutores de conhecimentos para educadores autônomos. Ou seja, partir de “uma perspectiva da certeza e correção para aceitação da incerteza e do erro como condição e possibilidade para construção de novos arranjos, de uma voz única do professor para a multiplicidade de vozes e diálogos acerca da produção do conhecimento, que é sempre coletivo‖ (FAZENDA, 1999, p. 24).

Estas são reflexões que o Subprojeto de Pedagogia – PIBID -UFAL leva em

consideração. 379 Grupo de Estudo e Pesquisas em Política Educacional, Rio Claro, 06, 07 e 08 de julho de 2011 Vol. 3 (2011)

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Embora ainda recente, o Subprojeto já apresenta algumas contribuições significativas e que tendem a se consolidar com a continuidade de suas ações. Uma das dimensões mais significativas tem se constituído são os espaços de estudo e reflexão semanais realizadas de forma coletiva, pelos bolsistas de Pedagogia e os supervisores pedagógicos das escolas. Estes encontros têm se configurado como um momento, oportuno de reflexões sistemáticas acerca dos saberes e conhecimentos docentes e das possibilidades de integração dos conhecimentos estudados na academia com a materialidade das atividades pedagógicas vivenciadas nas escolas. Essas reuniões têm sido fundamentais para o desenvolvimento do projeto, uma vez que, além de representarem momentos de reflexão teórico-prática. Esta cultura da participação coletiva para estudo e planejamento, já tem apresentado repercussões nas escolas, visto que os bolsistas têm mobilizados os professores para os momentos de estudo, assim como tem participado das ações promovidas pelos educadores na escola. As temáticas propostas de estudo visam aproximar os professorandos do processo de investigação e pesquisa. Estes estão tendo acesso desde o início do curso com problemáticas de investigação, leituras e literatura adequada às problemáticas educativas, técnicas e instrumentos de pesquisa acadêmica, bem como estão sendo encorajados a serem pesquisadores de seu trabalho pedagógico na sala de aula, quando estiverem na condição de docente. Esta perspectiva se pauta nos postulados desenvolvidos por Tardif (2002, p. 238-239). Para ele, há três aspectos que precisam ser considerados em relação a produção de pesquisa em relação aos professores: 1) os professores são sujeitos produtores de conhecimentos. Isto significa que a produção de saberes de ensino não podem mais ser privilégio exclusivo dos pesquisadores. É necessário deixar de tratá-los como objetos para reconhecê-los como possuidores de saberes, saberes estes diferentes dos universitários, mas que obedecem outros condicionantes e lógicas de ação;

2) Superada a condição de objeto de pesquisa, há necessidade de elaboração de novas pesquisas que considerem os professores como colaboradores e co-pesquisadores. Isto significa que se deve levar em consideração seus pontos de vistas, interesses, necessidades, linguagem e assumir isso através de discursos e práticas acessíveis, úteis e significativas; 380 Grupo de Estudo e Pesquisas em Política Educacional, Rio Claro, 06, 07 e 08 de julho de 2011 Vol. 3 (2011)

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3) Para tanto, há que encorajar os professores a realizarem um esforço de se apropriarem da pesquisa e de aprenderem a formular seus próprios discursos, perspectivas, interesses e necessidades individuais e coletivas, suscetíveis de se objetivarem na prática escolar.

Reconhecer que os professores são, efetivamente, sujeitos do conhecimento, pressupõe estimulá-los desde a sua formação inicial a empreenderem o esforço de agir como tais, ou seja, o esforço de se tornarem atores capazes de nomear, objetivar e de partilhar sua própria prática e vivência profissional. Baseado nestes pressupostos é que na primeira etapa do Subprojeto realizamos um diagnóstico das escolas envolvidas no projeto, assim como estamos traçando o perfil dos docentes com a participação dos bolsistas de Pedagogia, assim como estamos elaborando e propondo oficinas pedagógicas com vistas ao desenvolvimento de atividades diversificadas que contemplem o currículo do ensino fundamental I, favorecendo a formação continuada dos professores e a própria formação. Neste diagnóstico realizamos o levantamento dos recursos de tecnologia da informação e da comunicação disponíveis nas escolas, e, partir daí estamos articulando, junto com os professores das diversas licenciaturas (sobretudo Letras e Matemática) e demais bolsistas, práticas pedagógicas docentes de caráter inovador visando a superação de problemas identificados no diagnóstico inicial. Com a efetivação do Subprojeto “Melhorando a Qualidade da Educação no Ensino Fundamental em Escolas da Rede Pública”, busca-se levar os bolsistas a perceberem a escola como campo de pesquisa e de prática pedagógica, ampliando sua visão da escola na sua globalidade; assim como contribuir com as formas de atuação do pedagogo em ambiente escolar, de maneira a pensar a escola na sua complexidade, articulando-a um processo de reflexão e mobilização de modo a redimensionar o trabalho de organização pedagógica, bem como a gestão dos processos educacionais do ensino e mobilizador do Projeto Político Pedagógico, especificamente no eixo do Currículo e da avaliação.

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Outra dimensão significativa que o Subprojeto tem contribuído na formação docente é a possibilidade do estudante de Pedagogia realizar uma intervenção na escola através do desenvolvimento de projetos didáticos e de intervenção na área de alfabetização e letramento. Dentre os projetos desenvolvidos destacam-se os projetos intitulados: a) Novos desafios em sala de aula: o trabalho com leitura, escrita e jogos matemáticos nas séries iniciais; b) Navegando no mundo das letras: contribuições da literatura infantil no processo de letramento e alfabetização; c) Alfabetização Lúdica na escola; d) Alfabetizando, letrando e encantando com Quadrinhos, dentre outros projetos. Estes projetos têm mobilizados os estudantes de Pedagogia a perceberem a escola como um espaço por excelência de formação e construção de conhecimentos, além de contribuírem para fomentar junto aos professores das escolas selecionadas práticas pedagógicas diversificadas no que tange as metodologias de ensino, planejamento e avaliação e utilização das tecnologias da informação e comunicação. A experiência do Subprojeto PIBID-UFAL, ao vincular pesquisa e ação, relação indissociada entre teoria e prática, vem tentando romper com esse engessamento da área,

apresentando

propostas

didáticas

significativas

efetivas

construídas

colaborativamente entre universidade e escola. Destaca-se a capacidade de análise crítica e propositiva dos nossos alunos bolsistas que, além de desenvolverem uma identidade com a escola pública, estão empenhados na elaboração de materiais didáticos, na elaboração de projetos de ensino e de situações didáticas. 4. Algumas Considerações Finais Consideramos o propósito do Subprojeto, no tocante a atuação dos bolsistas do Curso Pedagogia nas questões da avaliação, planejamento e metodologias diversificadas com a utilização dos recursos de tecnologia da informação e da comunicação, estamos contribuindo com a formação inicial dos bolsistas de Pedagogia, possibilitando uma vivência no ambiente escolar, sobretudo da prática docente de forma sistemática e orientada, incentivando-os para o exercício do magistério, e por conseguinte, para a melhoria da qualidade do ensino tanto na Educação Básica quanto no Nível Superior. Nesse sentido, os bolsistas da Pedagogia, estão tendo a oportunidade de utilizar os

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instrumentos teóricos aprendido na formação inicial, proporcionando um novo olhar sobre a escola pública, a profissão e os profissionais da educação.

5. Referências ANDRÉ, Marli. A pesquisa na formação do Educador. São Paulo: Cortez, 1997. BEZERRA, C. Conhecimento, Riqueza e Política: um estudo sob a ótica da teoria social de Marx e da Filosofia da Práxis de Gramsci. Maceió/AL: EDUFAL, 2009. ELLIOT, J. Recolocando a pesquisa-ação em seu lugar original e próprio. IN: GERALDI, Corinta M. G.; FIORENTINI, Dario & PEREIRA, E. M. A. (orgs.). Cartografias do Trabalho Docente: professor(a)-pesquisador(a). Campinas/SP: Mercado de Letras: Associação de Leitura do Brasil – ALB, 1998. FREIRE, Paulo. Pedagogia da Autonomia: saberes necessários à prática educativa. 2. ed. São Paulo: Paz e Terra, 1997. FREITAS, H. C. L. Certificação docente e formação do educador: regulação e desprofissionalização. Educ. Soc., Campinas, v. 24, n. 85, Dec. 2003 . Disponível em: . Acesso em: 26 Feb. 2009. doi: 10.1590/S010173302003000400002. IMBERNÓN, F. Formação Docente e Profissional: formar-se para a mudança e a incerteza. 3 ed. São Paulo: Cortez, 2002. KINCHELOE, J. L. A Formação do Professor como Compromisso Político: mapeando o pós-moderno. Trad. Nilze M. C. Pellanda. Porto Alegre: Artes Médicas, 1997. LUIS, S. M. B. Formação Docente e Avaliação: dos processos formativos ao exercício profissional. Dissertação de Mestrado. UFPE: Mestrado em Educação, 2000. NÓVOA, A. Formação de professores e profissão docente. IN: NÓVOA, A. (org.) Os Professores e a sua Formação. Lisboa: Dom Quixote, 1997. NÓVOA, A. (org.). Profissão Professor. 2. ed. Porto: Porto Editora, 1995. PEREIRA, E. M. A. Professor como Pesquisador: o enfoque da pesquisa-ação na prática docente. IN: GERALDI, Corinta M. G.; FIORENTINI, Dario & PEREIRA, E. M. A. (orgs.). Cartografias do Trabalho Docente: professor(a)-pesquisador(a). Campinas/SP: Mercado de Letras: Associação de Leitura do Brasil – ALB, 1998. PIMENTA, S. G. Formação de professores: identidade e saberes da docência. IN: PIMENTA, S. G. (org.). Saberes Pedagógicos e Atividade Docente. São Paulo: Cortez, 1999. SACRISTÁN, J. G. Poderes Instáveis em Educação. Porto Alegre: Artmed, 1999. 383 Grupo de Estudo e Pesquisas em Política Educacional, Rio Claro, 06, 07 e 08 de julho de 2011 Vol. 3 (2011)

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O PLANO DE METAS “COMPROMISSO DE TODOS PELA EDUCAÇÃO”: DESDOBRAMENTOS NO TRABALHO DOCENTE

Vilma Aparecida de Souza [email protected] Faculdade de Ciências Integradas do Pontal da Universidade Federal de Uberlândia Programa de Pós-Graduação em Educação da Universidade Federal de Uberlândia

Resumo: O presente trabalho tem como objetivo analisar a política educacional implementada com o lançamento do Plano de Metas ―Compromisso Todos pela Educação‖, documentos central do Plano de Desenvolvimento da Educação (PDE), e seus desdobramentos no trabalho docente. Os resultados permitem verificar que os programas implementados a partir do Plano de Metas são marcados por um gerencialismo e uma forte cobrança em torno da performatividade, uma política de resultados centrada na responsabilização dos docentes. Palavras-chave: política educacional; trabalho docente; reformas educacionais

1. Introdução A proliferação de documentos referentes à reforma educacional promulgada pelo MEC, nos últimos anos, enseja pesquisadores a se debruçarem sobre o tema. Partindo desse pressuposto, o Brasil assiste desde o início de 2007, quando começou o segundo mandato do presidente Lula, a implementações de ações do chamado PAC: Programa de Aceleração para o Crescimento, lançado como um conjunto de medidas destinadas a aumentar o crescimento da economia brasileira. Nessa esteira, o ministro da educação, Fernando Haddad, anunciou o Plano de Desenvolvimento da Educação (PDE), denominado informalmente de ―PAC da Educação‖. O presente estudo tem como objeto de investigação o Plano de Metas ―Compromisso de Todos pela Educação‖ que se constitui como um dos documentos centrais que fundamentam e organizam o Plano de Desenvolvimento da Educação (PDE), a partir do decreto nº. 6.024 de 24/4 2007. Considerando esse panorama, propõe-se a discutir nesse trabalho os dispositivos legais que compõem o PDE, justificando-se pela relevância de acompanhar a atual

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política do MEC e a implementação do Plano de Metas ―Compromisso Todos pela Educação‖ (Decreto n. 6.094 de 24 DE ABRIL DE 2007). Quanto aos procedimentos metodológicos, primeiramente foi realizada uma pesquisa bibliográfica, com a finalidade de realizar o aprofundamento do referencial teórico. No segundo momento, realizou-se uma pesquisa documental com o intuito buscar nos documentos oficiais do MEC informações sobre o processo de implementação do Plano de Metas Compromisso Todos pela Educação (Decreto n. 6.094 de 24 de abril de 2007) e os desdobramentos na gestão escolar e na reestruturação do trabalho docente. 2. Plano de Desenvolvimento da Educação (PDE) do segundo mandato do Governo Lula: uma “nova onda” de reformas na política educacional brasileira? O referencial teórico em torno de políticas educacionais evidencia que a gestão da educação deve ser compreendida no contexto macro das Políticas Públicas, situada no cenário de redefinição do papel do Estado. Santos e Shiroma (2008, p. 5) afirmam que, por meio uma análise dos principais documentos de políticas educacionais para a América Latina deste início de século, é possível identificar uma atenção maior atribuída à gestão educacional. Para os autores, a década de 1990 é marcada por uma primeira geração de reformas educacionais que, com o foco na gestão educacional, enfocam os currículos, a avaliação e o financiamento, provocando um processo macro de reconfiguração no campo educacional. Após esse período, Santos e Shiroma identificam ―uma segunda onda de reformas teve início adotando uma perspectiva sistêmica‖ (2008, p. 5). Segundo os autores esse segundo momento das reformas é caracterizado por um movimento de ações e programas que têm como foco o ―chão das escolas‖, Após ampla disseminação de indicadores da educação, diagnósticos buscando formar novos consensos em torno da necessidade de reformas, os governos passaram patrocinar programas e ações que efetivamente atingissem as unidades escolares. Era preciso ―aterrisar‖ a reforma no chão das escolas. Assim, no último ano, o MEC promoveu encontros com os Dirigentes da Educação Básica sobre a estratégia de implementação do Plano de Desenvolvimento ao nível das unidades escolares (SANTOS; SHIROMA, 2008, p. 5).

Nessa segunda onda de reformas, caracterizada por um movimento de ações e programas que têm como foco o ―chão das escolas‖, políticas educacionais passam a patrocinar programas e ações que provocam uma reestruturação do trabalho pedagógico, 386 Grupo de Estudo e Pesquisas em Política Educacional, Rio Claro, 06, 07 e 08 de julho de 2011 Vol. 3 (2011)

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dando lugar a uma nova organização escolar, e tais transformações, sem as adequações necessárias, parecem implicar processos de reestruturação e intensificação do trabalho docente (OLIVEIRA, 2004). Considerando esse pressuposto, merece atenção acompanhar os programas e ações implementados no segundo mandato do Governo Lula que, em 24 de abril de 2007, independente do PNE ainda se encontrar em vigor, lança oficialmente o Plano de Desenvolvimento da Educação (PDE) como uma das ações do Programa de Aceleração Econômica (PAC) do Governo Luís Inácio Lula da Silva. O Plano de Desenvolvimento da Educação (PDE) teve recepção favorável pela opinião pública, decorrente de uma forte divulgação pela imprensa. Nessa ampla divulgação, a questão da qualidade do ensino assumiu posição central no discurso político. Para Saviani (2009) o PDE apresenta-se como um ―grande guarda-chuva que abriga praticamente todos os programas em desenvolvimento pelo MEC‖ (2009, p. 5), como um desdobramento do Programa de Aceleração do Crescimento (PAC) do governo federal. Após o lançamento do PAC cada ministério deveria apresentar um conjunto de ações em consonância com o referido programa. Nesse contexto, o MEC lança o Índice de Desenvolvimento da Educação Básica (IDEB) e a ele vincula outras ações abrangendo os níveis e modalidades de ensino. Em relação às ações integrantes do PDE, Saviani tece algumas críticas referentes à desarticulação das ―ações apresentadas como integrantes do PDE aparecem no site do MEC de forma individualizada, encontrando-se justapostas, sem nenhum critério de agrupamento‖ (SAVIANI, 2009, 6). Embora o PDE tenha sido oficialmente apresentado como um plano, BARÃO (2008) questiona o porquê deste novo ―plano‖ se o PNE não viu suas metas realizadas e ainda se encontra em vigor. Sancionado em 2001, o Plano Nacional de Educação (PNE) atende a um preceito constitucional, devendo, assim, ser traduzido obrigatoriamente em ação pelos governos. A partir desta lógica, a autora ressalta a importância de se ―indagar os motivos para a elaboração de um novo plano e o silenciamento quanto ao cumprimento das metas do PNE‖ (BARÃO, 2008, p.2). Por meio de uma comparação entre a estrutura do Plano Nacional de Educação (PNE) com a do Plano de Desenvolvimento da Educação (PDE), Saviani (2009) enfatiza que o segundo não representa um plano, em sentido pleno. Para o autor, o PDE 387 Grupo de Estudo e Pesquisas em Política Educacional, Rio Claro, 06, 07 e 08 de julho de 2011 Vol. 3 (2011)

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deve ser compreendido como uma amálgama de ―ações que, teoricamente, se constituiriam em estratégias para a realização dos objetivos e metas previstos no PNE‖ (2009, p. 27). Segundo essa análise, o PDE resume-se num conjunto de propostas de mecanismos que visam à realização progressiva de metas educacionais. No entanto, o PDE não pode ser definido como uma estratégia para o cumprimento das metas do PNE, uma vez que não toma como ponto de partida o diagnóstico, as diretrizes e os objetivos e metas constitutivos do PNE. Ao contrário, o PDE consiste num documento composto por um conjunto de ações que não se articulam organicamente com o PNE (SAVIANI, 2009, 6). Outra crítica feita refere-se ao processo de formulação do PDE. De acordo com Saviani o MEC não promoveu uma interlocução com a sociedade civil e com os movimentos dos educadores. Segundo a análise do autor, o PDE assumiu um compromisso com a agenda do ―Compromisso Todos pela Educação‖, movimento lançado em 6 de setembro de 2006 no Museu do Ipiranga, em São Paulo. Tal movimento Constituiu-se, de fato, como um aglomerado de grupos empresariais com representantes e patrocínio de entidades como o Grupo Pão de Açúcar, Fundação Itaú-Social, Fundação Bradesco, Instituto Gerdau, Grupo Gerdau, Fundação Roberto Marinho, Fundação EducarDPaschoal, Instituto Itaú Cultural, Faça Parte-Instituto Brasil Voluntário, Instituto Ayrton Senna, Cia. Suzano, Banco ABN-Real, Banco Santander, Instituto Ethos, entre outros (SAVIANI, 2009, p. 32).

. O MEC, através dos meios de comunicação e de uma ampla campanha publicitária, enfatiza a responsabilidade de atuar de forma mais incisiva na indução de uma educação básica de qualidade. A partir dessa premissa, determina mecanismos de controle para a melhora das condições da educação básica. Dentre esses mecanismos, o PDE criou um novo indicador de avaliação de rendimento, o Índice de Desenvolvimento de Educação Básica (IDEB). O IDEB passa a ser o elo de conexão das ações do governo cada estado e/ou município (KRAWCZYK, 2008). Krawczyk (2008, p. 805) afirma que ―sem entrar no mérito da concepção do IDEB, fica clara a valorização exacerbada da interferência de instrumentos de avaliação para a mudança da realidade educacional brasileira‖. Retomando a história da política educacional brasileira, percebe-se que as conexões entre avaliação, gestão e financiamento não são inéditas. Na década de 1990, no contexto de redefinição do 388 Grupo de Estudo e Pesquisas em Política Educacional, Rio Claro, 06, 07 e 08 de julho de 2011 Vol. 3 (2011)

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papel do Estado na educação, a avaliação assume posição central enquanto um instrumento de regulação estatal. Freitas (2007) destaca que o conceito de ―responsabilização‖ presente nos discursos do MEC, materializado nos documentos oficiais do PDE, pressupõe uma focalização nos municípios e na escola, o que poderá levar a toda sorte de armadilhas para se obter recursos. Segundo o autor, o IDEB deve ser instrumento de monitoramento e não instrumento de pressão Há de se reconhecer as falhas nas escolas, mas há de se reconhecer, igualmente, que há falhas nas políticas públicas, no sistema socioeconômico etc. Portanto, esta é uma situação que, à espera de soluções mais abrangentes e profundas, só pode ser resolvida por negociação e responsabilização bilateral: escola e sistema. Os governos não podem ―posar‖ de grandes avaliadores, sem olhar para seus pés de barro, para suas políticas, como se não tivessem nada a ver com a realidade educacional do país de ontem e de hoje (FREITAS, 2007, p, 975).

Nesse contexto, ao optar pelo IDEB como referência de qualidade, o MEC deveria ir além desse indicador, constituindo um sistema avaliativo indicador mais amplo e sensível às desigualdades sociais, que considere as diversas variáveis que são necessárias ao funcionamento adequado de uma escola de qualidade. Ao contrário, as ações do PDE assumem um controle sistemático das políticas nos entes federados. Ao condicionar o repasse dos recursos do MEC aos resultados do IDEB, o MEC estabelece uma interlocução direta com os Estados, os Municípios e com as unidades escolares. Por meio do Decreto n. 6094 de 24 de abril de 2007, que institui o Plano de Ações Articuladas (PAR), o MEC determina que as escolas vinculadas aos Municípios e aos Estados que aderirem ao Plano de Metas Compromisso Todos pela Educação deverão elaborar seu PDE-Escola (BRASIL, 2007c). 3. A implementação do Plano de Metas Compromisso Todos pela Educação (Decreto n. 6.094 de 24 de abril de 2007): os desdobramentos na gestão da escola pública e no trabalho docente Instituído, por decreto, o Plano de Metas ―Compromisso Todos pela Educação‖, decorre de uma ação em consonância com o ―Movimento Todos pela Educação‖, organizado por setores do empresariado nacional.

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Após o lançamento do PDE, em 24 de abril de 2007, foi baixado pelo Presidente da República o Decreto n. 6.094 que dispõe sobre a implementação do Plano de Metas ―Compromisso Todos pela Educação‖. A promulgação desse decreto define que os municípios e os estados devem aderir por uma espécie de contrato territorial entre as diferentes esferas de governo para poder receber transferências voluntárias de recursos financeiros e assistência técnica do governo federal. O termo de adesão, ou contrato territorial, requer a elaboração de um plano de atividades articuladas (PAR) municipal e/ou estadual (KRAWCZYK, 2008, p. 802).

O Plano de Desenvolvimento da Educação (PDE) subordinou o apoio técnico e financeiro do Ministério da Educação à assinatura do Plano de Metas ―Compromisso Todos pela Educação‖. Após a adesão ao Plano de Metas Compromisso Todos pela Educação, os Estados e Municípios têm como incumbência elaborar o Plano de Ações Articuladas (PAR), que consiste num planejamento multidimensional da política de educação municipal. Nesse arcabouço legal, a unidade escolar passa a ser o eixo norteador. A Portaria Normativa Nº 27, de 21 de junho de 2007, determina que as escolas vinculadas aos Municípios e aos Estados que aderirem ao Plano de Metas ―Compromisso Todos pela Educação‖ devem elaborar seu PDE-Escola. De acordo com essa Portaria, o MEC anuncia um conjunto de ações ancoradas pela prerrogativa de ―fortalecer a autonomia de gestão das escolas‖ (BRASIL, 2007c). Em seu Art 2º institui Art. 2ºO PDE-Escola será implementado, em cada escola participante, pela execução de processos gerenciais de: I - auto-avaliação da escola; II - definição de sua visão estratégica; III - elaboração de plano de ação. § 1º Plano de cada escola deverá indicar as metas a serem atingidas, quais as ações necessárias, o prazo para o cumprimento das metas e os recursos necessários. § 2ºO Plano será elaborado pela própria equipe de cada escola (BRASIL, 2007c).

O PDE-Escola deve indicar as metas a serem atingidas para aumentar os indicadores educacionais, o prazo para o cumprimento dessas metas e os recursos necessários. Em 2007, o MEC ofereceu apoio técnico às equipes escolares para elaborar planos de ação, por meio de encontros com secretários estaduais e dirigentes municipais 390 Grupo de Estudo e Pesquisas em Política Educacional, Rio Claro, 06, 07 e 08 de julho de 2011 Vol. 3 (2011)

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de educação. Nesses encontros foram apresentadas estratégias de elaboração do PDEEscola. Além disso, iniciou-se um processo de preparação de ―técnicos‖ das secretarias de Educação e das escolas com a finalidade de serem qualificados para acompanhar a execução dos planos de ação em cada escola. Para Oliveira (2009) a idéia de melhoria da educação básica como compromisso de todos e o apelo ao compromisso social para com as melhorias da educação básica fundamenta-se na noção de que a educação é responsabilidade da sociedade. Esse argumento recorrente e sustentado por um discurso que ―evoca práticas de envolvimento e responsabilização social‖ presente nos documentos oficiais do PDE, não faz referência aos fatores estruturais intra e extra-escolares e sua interferência no baixo desempenho obtido nos exames de aferição da qualidade. Entretanto, verifica-se o caráter ambíguo da política do MEC que, apesar de apresentarem em seu discurso a recuperação do papel de protagonista do Estado Federal como promotor de políticas educacionais, as ações que compõem o PDE expressam uma orientação desarticulada e focadas nos municípios e nas escolas, como pode ser evidenciado no Plano de Metas ―Compromisso Todos pela Educação‖ que determina que as unidades escolares devem elaborar seu PDE-Escola. Segundo o discurso oficial do MEC, o PDE contempla uma ―visão sistêmica‖ da política educacional, que se oporia a uma ―visão fragmentaria‖ do governo de Fernando Henrique Cardoso (KRAWCZYK, 2008). Para isso, o PDE propõe assim uma relação intergovernamental que

interpreta o

regime

de colaboração por

meio do

compartilhamento de [...] competências políticas, técnicas e financeiras para a execução de programas de manutenção e desenvolvimento da educação, de forma a concertar a atuação dos entes federados sem ferir-lhes a autonomia. Essa simples divisão de tarefas, se articulada em grandes eixos (educação básica, superior, profissional e continuada), com regras transparentes e metas precisas, passíveis de acompanhamento público e controle social, pode pôr em marcha um avanço perceptível e sólido (Brasil, 2007a, p.10).

Nesse cenário, a escola passa a ser vista como um lugar onde os diversos sujeitos devem se mobilizar para produzir bons resultados. Por meio de estratégias políticoeducacionais previstas no Plano de Metas ―Compromisso Todos pela Educação‖, dentre elas a elaboração do PDE-Escola, nos últimos anos, presencia-se no cotidiano das escolas públicas, uma rotina de ações com a elaboração de diagnósticos para identificar os principais problemas e a definição de ações institucionais a serem cumpridas como 391 Grupo de Estudo e Pesquisas em Política Educacional, Rio Claro, 06, 07 e 08 de julho de 2011 Vol. 3 (2011)

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condição estipulada para o recebimento de recursos financeiros do poder público. Nessa perspectiva, o PDE mantém ―o espírito de focalização da política educacional‖ (KRAWCZYK, 2008, p. 801). Além disso, o PDE anuncia a possibilidade de se conceber um sistema de educação no Brasil, entretanto ―cumpre verificar se, tal como foi desenhado, o plano possui uma estrutura capaz de garantir a consecução de seus objetivos‖ (SAVIANI, 2009, 34). Segundo Saviani o PDE corre o risco de representar um ―mecanismo protelatório‖ do governo federal para resolver os problemas educacionais, além de trazer consigo uma concepção de "pedagogia de resultados‖ que interfere diretamente na gestão da escola e no trabalho docente. Saviani (2009) alerta que essa "pedagogia de resultados‖ exerce uma forte regulação da gestão da escola e do trabalho docente. A regulação burocrática revela-se a partir das exigências e das responsabilidades dos professores, dos diretores e dos sistemas municipais e estaduais de ensino em produzir resultados do desempenho dos alunos. Nesse movimento de regulação, mecanismos como o ranqueamento das escolas revela que a avaliação ocupa a função de regular o trabalho do professor para que resultados e metas sejam atingidos. Nesse mesmo raciocínio, as políticas educacionais implementadas a partir do PDE têm alterado a realidade escolar e, particularmente, a relação entre trabalhadores docentes e escola. Tais políticas têm chegado até a escola para fins de execução, marcada pelo caráter de regulação e concebida em âmbito nacional, repercutindo na intensificação e condições de trabalho dos docentes. Apple (1995) descreve o fenômeno da intensificação do trabalho docente evidenciando a racionalização do trabalho escolar e docente por meio da implementação programas de ações e da avaliação burocrática do processo de ensino e aprendizagem. Nesse sentido, segundo Apple (1995) a intensificação, em termos gerais, ―representa uma das formas tangíveis pelas quais os privilégios de trabalho dos trabalhadores educacionais são degradados‖ (p. 39), materializando-se pela crescente demanda de novas atribuições, associada pela ausência de condições estruturais de trabalho. A intensificação do trabalho docente concretiza-se pela sobrecarga de tarefas e registros de prestação de contas do trabalho escolar. Ou seja, a intensificação do trabalho docente se dá por meio de um processo de ampliação das responsabilidades e tarefas no cotidiano escolar dos professores considerando o mesmo tempo de trabalho. Tais atribuições 392 Grupo de Estudo e Pesquisas em Política Educacional, Rio Claro, 06, 07 e 08 de julho de 2011 Vol. 3 (2011)

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extrapolam as tarefas instrucionais e pedagógicas, abrangendo as questões de administração e gestão da escola. Os discursos das políticas educacionais são marcados por um gerencialismo que se faz acompanhar de uma forte cobrança em torno da performatividade, uma política de resultados centrada em desempenhos quantificáveis e na responsabilização dos docentes pelo desempenho da escola. Além dos questionamentos quanto aos mecanismos de controle para a melhora das condições da educação básica, outra questão que merece discussão é a ênfase no discurso do MEC, através dos meios de comunicação e de uma ampla campanha publicitária, acerca da questão da ―qualidade da educação básica‖.

A categoria

―qualidade da educação‖ encontra-se presente como dos elementos principais das reformas e das políticas educacionais. Entretanto, Sacristán chama a atenção para os riscos de uma ―avaliação da qualidade do ensino em termos de valores externos ao processo educacional‖ (1996, p. 64-65).

4.Considerações finais

Acompanhando os programas e ações implementados no segundo mandato do Governo Lula é possível apontar alguns aspectos fundamentais para compreensão da política educacional e os desdobramentos na gestão da escola pública e no trabalho docente. Dentre eles, ressalta-se os discursos das políticas educacionais marcados por um gerencialismo que se faz acompanhar de uma forte cobrança em torno da performatividade, uma política de resultados centrada em desempenhos quantificáveis e na responsabilização dos docentes pelo desempenho da escola. As orientações sugeridas no documento PDE-Escola enfatizam a maior participação dos professores e da comunidade torna-se estratégia para mudar o funcionamento da escola. De acordo com essas diretrizes a elaboração do PDE-Escola compromete o trabalho docente e a gestão escolar, atrelando o financiamento à avaliação, por meio do acompanhamento do IDEB e do cumprimento de metas que submetem a escola às periódicas avaliações externas. Além disso, merece destaque o aumento de exigências burocráticas advindas da elaboração do PDE-Escola que passa a exigir no cotidiano do trabalho escolar atividades de preenchimento de relatórios, reuniões de planejamento de ―metas‖, confecções de relatórios de prestação de contas etc. Tais atividades acabam por

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provocar uma sobrecarga de trabalho administrativo, instaurando processos de gestão gerencial conduzida por discursos acerca da questão da ―qualidade da educação básica‖. Além disso, nas entrelinhas dos discursos oficiais há um processo de desqualificação e responsabilização dos professores pelo fracasso e pela inadequação da escola pública. Termos como ―qualidade de ensino‖, ―compromisso social‖ e ―comprometimento docente‖ aparecem no interior dos discursos das políticas educacionais oficiais, mesclando certo caráter missionário e humanitário da docência com argumentos relacionados ao profissionalismo e à profissionalização docente. Por força da própria legislação e dos programas de reforma, os trabalhadores docentes vêem-se forçados a adquirir novas práticas e novos saberes no exercício de suas funções. Sendo apresentadas como novidade ou inovação, os trabalhadores docentes sentem-se obrigados a responder às novas exigências pedagógicas e administrativas. Entretanto, faltam-lhes condições de trabalho adequadas. 5. Referências Bibliográficas: ANTUNES, Ricardo. Os sentidos do trabalho: ensaio sobre a afirmação e a negação do trabalho. São Paulo: Bointempo Editorial, 2002. APPLE, M. W. Trabalho Docente e Textos: economia política das relações de classe e de gênero em educação. Porto Alegre: Artes Médicas, 1995. BARÃO, Gilcilene de Oliveira Damasceno. O plano de desenvolvimento da educação e o plano nacional de educação: interlocuções, ausências e silenciamentos. In: I Simpósio Nacional de Educação e XX Semana de Pedagogia, 2008, CASCAVEL. O PDE e o atual contexto sócio-educacional. Cascavel: Fundação Araucária, 2008. BRASIL. Ministério da Educação e Cultura. O Plano de Desenvolvimento da Educação: razões, princípios e programas. Brasília, 2007a. _____. Decreto nº 6.094 de 24 abril de 2007 que dispõe sobre a implementação do Plano de Metas Compromissos Todos pela educação, 2007b. _____. PORTARIA NORMATIVA Nº 27, DE 21 DE JUNHO DE 2007 - Institui o Plano de Desenvolvimento da Escola – PDE – Escola, 2007c. ENGUITA, M. F. A ambigüidade da docência: entre o profissionalismo e a proletarização. In: Teoria e educação, Porto Alegre, n.4, p.41-61, 1991. FREITAS, Luiz Carlos de. Eliminação adiada: o ocaso das classes populares no interior da escola e a ocultação da (má) qualidade do ensino. In; Educ. Soc..Campinas, v. 28, n. 100, Oct. 2007. 394 Grupo de Estudo e Pesquisas em Política Educacional, Rio Claro, 06, 07 e 08 de julho de 2011 Vol. 3 (2011)

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KRAWCZYK, Nora. O PDE: novo modo de regulação estatal? In: Cad. Pesquisa, São Paulo, v. 38, n. 135, Dec. 2008. OLIVEIRA, Dalila Andrade. A Reestruturação do Trabalho Docente: precarização e flexibilização. In: Educ. Soc., Campinas, vol. 25, n. 89, p. 1127-1144, Set./Dez. 2004. _____. As políticas educacionais no governo Lula: rupturas e permanências. In: Revista Brasileira de Política e Administração da Educação, v. 25, p. 197-210, 2009. PERONI, Vera. Política educacional e papel do Estado: no Brasil dos anos 1990. São Paulo: Xamã, 2003. SACRISTÁN, J. G. Reformas educacionais: utopia, retórica e prática. In: SILVA, T. T. da; GENTILI, P. Escola S.A – quem ganha e quem pede no mercado educacional do neoliberalismo. Brasília: CNTE/Confederação Nacional dos Trabalhadores em Educação, 1996, p. 50 – 74. SANTOS, Fabiano A.; SHIROMA, E. O. Responsabilização e orientação para os resultados: prioridades do PDE Escola. In: I Simpósio Nacional de Educação e XX Semana de Pedagogia, 2008, Cascavel. I Simpósio Nacional de Educação e XX Semana de Pedagogia. O PDE e o atual contexto sócio-educacional. Cascavel: UNIOESTE, 2008. v. 1. SAVIANI, D. O Plano de Desenvolvimento da Educação: análise crítica da política do MEC. Campinas, SP: Autores Associados, 2009.

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AÇÃO DOCENTE NO SÉCULO XXI: O MAL-ESTAR DOCENTE RESULTANTE DA CRISE DE IDENTIDADE FRENTE ÀS NOVAS DEMANDAS SOCIAIS

Vanessa Ananias Malacrida [email protected] Universidade do Oeste Paulista – UNOESTE de Presidente Prudente

Helena Faria de Barros [email protected] Universidade Federal de Santa Maria –RS/ UFSM- RS Universidade do Oeste Paulista – UNOESTE de Presidente Prudente

Resumo: Este artigo apresenta resultado parcial da pesquisa em andamento intitulada ―Ser professor no contexto do século XXI: representações sociais de professores‖ e visa caracterizar o contexto atual e a concepção de trabalho dos docentes frente às transformações sociais e às novas formas de organização social, econômica e política que determinam novas maneiras de ver e agir social. A estrutura escolar, herdada da modernidade, não se encaixa na nossa realidade pós-moderna. A ação docente e o sistema educacional precisam adequar-se ao contexto da nova ordem social, porém, as tentativas de reforma têm fracassado aumentando o sentimento de crise entre os professores, contribuindo para o ―mal-estar docente‖. Os resultados da pesquisa apontam para urgente necessidade de investimento na profissionalização e valorização da profissão docente e aumento do apoio social que é dado aos professores, para combater essa doença social. Palavras-chave: Ação docente, contexto atual, mal estar docente.

INTRODUÇÃO

―A cada dois ou três séculos ocorre na história ocidental uma grande transformação. (...) Em poucas décadas a sociedade se reorganiza (...). Depois de cinqüenta anos existe um novo mundo. E as pessoas nascidas nele não

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III Seminário Internacional de Gestão Educacional conseguem imaginar o mundo em que seus avós viviam e no qual nasceram seus pais.‖ DRUCKER

O presente artigo fundamenta-se na pesquisa intitulada ―Ser professor no contexto do século XXI: representações sociais de professores‖ esta pesquisa, ainda em andamento, tem como sujeitos participantes 12 professores efetivos que atuam na Educação Infantil e Fundamental da rede municipal de uma pequena cidade do interior do Estado de São Paulo da qual optei por não divulgar o nome. A referida pesquisa encontra-se na fase de conclusão da coleta de dados e no início da fase da análise de conteúdo, porém, já é possível, a partir dos dados coletados, suscitar algumas reflexões sobre o tema. Neste artigo tem-se como objetivo levantar algumas considerações iniciais sobre a ação docente na atualidade considerando as transformações sociais ocorridas e a situação dos professores frente essas mudanças. Visa-se ainda refletir sobre o mal-estar docente e sua relação com o papel dos gestores escolares. Ser professor hoje supõe uma ação docente diferente da mesma ação em outra época, uma vez que, várias mudanças ocorreram e vivemos um momento peculiar de transformações. Para melhor entender o que é ser professor nesse contexto é necessário caracterizar o século XXI refletindo sobre suas influências na prática pedagógica do professor e o que se espera dela. O interesse pelo tema pesquisado surgiu durante minha trajetória profissional a partir da observação das preocupações, dificuldades e comportamentos dos professores da escola em que fui coordenadora pedagógica; da observação das falas feitas por eles no curso de formação continuada ―Pró-letramento‖ promovido pelo MEC no qual fui formadora e a partir de observações das falas informais na sala de professores. A variedade de queixas levou-me a perceber um mal estar entre os docentes, o qual também é notado por outros autores que indicam essa situação com a denominação de ―crise de identidade profissional‖. Segundo Nóvoa (1992, p.22):

A crise da profissão docente arrasta-se há longos anos e não se vislumbram perspectivas de superação a longo prazo. As

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III Seminário Internacional de Gestão Educacional consequências da situação de mal estar que atinge o professorado estão à vista de todos: desmotivação pessoal e elevados índices de absenteísmo e de abandono, insatisfação profissional traduzida numa atitude de desinvestimento e de indisposição constante (face ao ministério, aos colegas, aos alunos, etc.) recurso sistemático a discursos – álibi de desculpabilização e ausência de uma reflexão crítica à ação profissional, etc. Esta espécie de auto depreciação é acompanhada por um sentimento generalizado de desconfiança em relação às competências e a qualidade do trabalho dos professores, alimentado por círculos intelectuais e políticos que dispõem de um importante poder simbólico nas atuais culturas da informação.

O mal-estar docente entendido como ―resumo dos sentimentos dos professores‖ (ESTEVE, 2005) causado pela crise de identidade profissional em uma sociedade na qual realizar o trabalho docente tem sido cada vez mais complexo devido à desvalorização do profissional da educação e às mudanças sócio-políticas e econômicoculturais ocorridas no último século que afetam as instituições, principalmente a família e a escola por estarem inseridas num contexto cada vez mais distinto, sendo que o trabalho do professor acontece em meio à incerteza provocada pelas mudanças constantes e profundas.

A situação dos professores perante a mudança social é comparável à de um grupo de actores, vestidos com trajes de determinada época a quem sem prévio aviso se muda o cenário em metade do palco, desenrolando um novo pano de fundo, no cenário anterior. Uma nova encenação pós-moderna, colorida e fluorescente oculta a anterior, clássica e severa. A primeira reacção dos autores seria a surpresa. Depois, tensão e desconcerto, com um forte sentimento de agressividade, desejando acabar o trabalho para procurar os responsáveis, a fim de, pelo menos obter uma explicação. Que fazer? Continuar a recitar verso, arrastando largas roupagens em metade de um cenário pós moderno, cheio de luzes intermitentes? Parar o espetáculo e abandonar o trabalho? Pedir ao público que deixe de rir para que se oiçam os versos? O problema reside em que, independente de quem provocou a mudança, são os actores que dão a cara. São eles, portanto, quem terão de encontrar uma saída airosa, ainda que não sejam os responsáveis. As reações perante esta situação seriam muito variadas: mas, em qualquer caso, a palavra mal-estar, poderia resumir os sentimentos desse grupo de actores, perante uma série de circunstancias imprevistas que os obrigam a fazer um papel ridículo. (ESTEVE, 2005, p. 97)

A citação acima traduz boa parte das mais diversas falas dos professores em diferentes situações. Ao serem questionados sobre os desafios atuais, os 398 Grupo de Estudo e Pesquisas em Política Educacional, Rio Claro, 06, 07 e 08 de julho de 2011 Vol. 3 (2011)

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sujeitos da pesquisa apontaram para questões como a desvalorização da profissão docente, a inclusão, o desinteresse, desmotivação e indisciplina dos alunos, a falta de apoio pedagógico e administrativo, relações políticas e ―politicagens‖, rapidez das inovações tecnológicas, baixa remuneração, salas numerosas, falta de preparo para realidade atual através de cursos de aperfeiçoamento, insatisfação com os resultados do próprio trabalho e por fim ter que fazer o papel da família, conforme podemos observar nos relatos abaixo que, de certa forma, resumem outros:

Nos dias atuais os desafios e dificuldades são diversos como: inclusão, o professor ter que fazer o papel de psicólogo, pai, mãe, e muitas vezes ser tratado como qualquer um. Mas acredito que o maior deles está sendo cumprir nosso objetivo principal que é ―ensinar verdadeiramente‖ isto, porque quando recebemos os alunos, percebemos muitas vezes que o ―aluno finge que aprende e o professor finge que ensina‖. (PROFESSOR 11) Ter que ―educar‖ (educação de berço) para poder alfabetizar, sala numerosa onde o tempo é insuficiente para atender todos os alunos da maneira que necessitam, pois o professor não sabe se desenvolve o planejado ou separa briga, conversa e ensina o que é preciso saber quanto à disciplina e bons modos, e com isso deixa a desejar no conteúdo programado para as crianças que necessitam de atendimento individualizado. (PROFESSOR 7)

Ao desempenhar o papel da família no tocante a educação que deveria vir de casa prejudica-se o tempo que seria dedicado ao conteúdo programático e a aprendizagem do aluno. Relacionando com o apoio pedagógico, um professor relata que o que mais desanima nessa profissão é o fato de que:

A cada dia recebemos alunos de contextos diferentes, dificuldades diversas, e muitas vezes não encontramos estímulos nem preocupação por parte da direção escolar em ajudar buscar formação adequada para cada realidade que há em nossa escola, entra e sai ano e o professor muitas vezes tem que se virar sozinho para tentar desempenhar um trabalho com qualidade para com este aluno que também é responsabilidade da instituição escolar de modo geral, desde o ato da matrícula; e não adianta ficar só no blá, blá, blá, precisamos de ação, de profissionais habilitados para nos orientar de forma a encaminhar melhor nosso trabalho e torná-lo eficaz. (PROFESSOR 10)

Ao tentar realizar seu trabalho e falhar, buscar e não encontrar apoio pedagógico e administrativo satisfatório, provenientes dos gestores em geral, que não o 399 Grupo de Estudo e Pesquisas em Política Educacional, Rio Claro, 06, 07 e 08 de julho de 2011 Vol. 3 (2011)

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fazem, seja por incompetência, despreparo diante as mudanças ou falta de compromisso, gera-se no professor a mesma revolta, (na analogia proposta por Esteve, 2005) supostamente gerada no ator que estava em cena enquanto o cenário estava sendo trocado, conforme podemos observar neste relato de um dos sujeitos da pesquisa:

Ser professor no contexto atual não é fácil, por vezes, ficamos frente a frente com a injustiça e ainda precisamos sorrir para isso, para que o ―caldo negro‖ de nossa indignação, não caia na brancura de nossos alunos. Infelizmente muitos ainda estão no século XV e parecem odiar a necessidade de observar o mundo de hoje, seguem ―feudais‖ em seus postos de confiança, explorando, roubando e assumindo atitudes que prejudicam todo seguimento escolar, pois têm o ―aval administrativo‖. Relato dois fatos: o primeiro ocorreu há poucos dias, quando uma diretora exigiu que a funcionária fosse buscá-la de carro, esta largou sua função escolar para ser motorista particular; o segundo foi com uma professora criticada (duramente) por querer ir além do senso comum e querer dar aos alunos um conhecimento ―extra-planejamento‖. Precisamos entrar no século XXI, porém penso estarmos ainda numa espécie de idade média e infelizmente, seguindo essa analogia, nossos ―iluministas‖ estão cada dia menos crentes no futuro. (PROFESSOR 3)

É verdade que a crise do sistema escolar se arrasta há tempos e nada foi feito até agora para impedir que se chegasse ao que já estava previsto:

Com essa frase se expressava o professor Garcia Hós, em 6 de dezembro de 1975, no jornal ABC. ―Nas situações assinaladas reflete-se a transformação da profissão docente; que, antes de ser uma atividade tranquila, de calma dedicação ao cultivo da ciência e às relações cordiais com aqueles que querem adquiri-la, passou a ser uma profissão marginalizada, pouco compreendida, muito menos reconhecida, em que a dureza penetrou até a entranha mesma da tarefa docente, e das relações pessoais do professor, (...). Com todas essas circunstâncias, não se estará criando uma nova classe esmagada pela inutilidade de seus esforços, sem ilusão em sua tarefa docente, frustrada em sua vocação? O risco de que seja assim é grande‖. (ESTEVE, 1999, p. 41)

Nota-se, portanto, que 36 anos atrás já havia pessoas alertando para o rumo que a educação tomava, porém a crise da profissão docente é real e conforme Esteve (1999: 41), totalmente contraditória com a imagem idílica mostrada nos filmes e séries televisivas, onde ―mais do que como educador, o professor aparece amigo e conselheiro‖ em ambiente tranquilo, fora da sala de aula e individual, o que está muito distante da realidade. Para ilustrar isso Esteve cita o filme ―O despertar de Rita‖. 400 Grupo de Estudo e Pesquisas em Política Educacional, Rio Claro, 06, 07 e 08 de julho de 2011 Vol. 3 (2011)

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Bolivar (2002) compara a situação dos professores conforme o exposto por Esteve, com a de atores representando Hamlet no mesmo cenário de Macbeth, ―representar uma peça de teatro clássico sem se dar conta, no entanto que o cenário foi trocado por um pós-moderno‖ eis o sentimento dos professores em relação a seu papel. Nesse caso não é possível continuar representando o mesmo papel como se fosse plausível representar Hamlet no mesmo contexto de Macbeth, nem os atores podem permanecem com os mesmos hábitos. Quando a demanda de novas funções não se encaixa nas diretrizes de organização tradicionais, a saída da crise passa, em primeiro lugar, por uma paulatina ―mudança de cenário‖ que favoreça as ações desejadas. Os atores, por sua vez, também devem mudar os hábitos. (BOLIVAR: 2002, p.18)

Segundo Bolivar (2002, p.17), dentro do contexto atual da nova realidade social, ―as novas demandas educativas situam os professores em um lugar diferente na cena educativa, que questiona a sua identidade‖ e quando o exercício de uma profissão passa de algo estável transmitido e assentado em algumas práticas, para uma atividade incerta, pouco reconhecida ou problemática, estamos diante de uma crise de identidade.

Nessa situação a aquisição de competências para ensinar não é apenas uma questão de formação permanente (se a entendemos como reciclagem ou reconversão), mas – exige mais amplamente- a reconstrução dessa identidade profissional, (minha auto definição de como sou ou como os outros me reconhecem) são as competências profissionais. (BOLIVAR,

2002, p.17)

Diante a reflexão de Bolivar podemos notar que se trata de um contexto de crise de identidade profissional no campo docente, a escola universal e obrigatória exige uma ―autêntica reconversão profissional‖, no contexto atual é preciso ter professores com uma formação específica e especializada para atender uma grande diversidade social e cultural, porém:

(...) ―ninguém proporcionou a esses professores, mobilizados com uma lógica mais militar que pedagógica, os instrumentos teóricos e metodológicos necessários para desempenhar com mais garantia o perfil profissional que agora lhes é exigido. (...) Diante dessa situação cabe desenvolver uma

401 Grupo de Estudo e Pesquisas em Política Educacional, Rio Claro, 06, 07 e 08 de julho de 2011 Vol. 3 (2011)

III Seminário Internacional de Gestão Educacional ―política de identidade‖ conservadora (agarrar-se na defesa daquilo que se questiona), ao invés de transformação das circunstâncias no sentido inovador desejado. (BOLIVAR, 2002, p. 18)

As estruturas das escolas são herdadas da modernidade e não se encaixam na nossa realidade pós-moderna. Bolivar afirma que para reconstruir a identidade profissional é preciso adquirir novas competências profissionais, transversais ou genéricas a qualquer prática ou professor, adequadas às circunstâncias atuais. Porém, não basta apenas o professor buscar formação e se adequar à nova clientela, é preciso uma mudança de postura da sociedade frente à docência e uma transformação no sistema educacional adequando-se as necessidades atuais. O contexto social é fator determinante para a auto-realização do professor, uma vez que, ESTEVE (1999) ―aponta que o apoio social que se oferece aos professores é fator determinante na aparição de conseqüências psicológicas desagradáveis (tensão, frustração, esgotamento emocional)‖.

CARACTERIZANDO O SÉCULO XXI

"Nunca nos banhamos duas vezes no mesmo rio, pois na segunda vez não somos os mesmos, e também o rio mudou." Heráclito de Éfeso

DRUCKER (1997) revela que a cada dois ou três séculos ocorre uma grande transformação na história ocidental em que em poucas décadas a sociedade se reorganiza ―sua visão de mundo, seus valores básicos, sua estrutura social e política, suas artes, suas instituições mais importantes. Depois de cinqüenta anos existe um novo mundo‖, porém a transformação atual tem uma diferença fundamental, ou melhor, uma ―mudança fundamental‖ é que não existe mais uma história ou civilização ocidental, mas sim uma história ou civilizações mundiais. 402 Grupo de Estudo e Pesquisas em Política Educacional, Rio Claro, 06, 07 e 08 de julho de 2011 Vol. 3 (2011)

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Atualmente estamos atravessando uma transformação que está criando a sociedade pós- capitalista e:

(...) irá usar o livre mercado como mecanismo comprovado de integração econômica. Ela não será uma ―sociedade anticapitalista‖, nem uma sociedade ―não capitalista‖; as instituições do capitalismo sobreviverão, embora algumas, como os bancos, possam vir a desempenhar papéis bastante diferentes. Mas o centro da gravidade da sociedade pós capitalista – sua estrutura sua dinâmica social e econômica, suas classes sociais e seus problemas sociais – é diferente daquele que dominou os últimos duzentos e cinqüenta anos e definiu as questões ao redor das quais se cristalizaram partidos políticos, grupos e sistemas de valores sociais e compromissos pessoais e políticos. (DRUCKER, 1997, p. XVI)

Vivemos um contexto de mudança social no qual não se trata apenas de mais uma crise conjuntural do modelo capitalista e sim do surgimento de novas formas de organização social, econômica e política. Conforme aponta Tedesco (2000, p.11) a crise atual ―es una crisis estructural‖ na qual:

Cuya principal característica radica en que las dificultades de funcionamiento se producen simultaneamente en las instituciones responsables de la cohesión social (El Estado- Providencia), en las relaciones entre economia y sociedad (La crisis del trabajo) y en los modos através de los cuales se forman las identidades individuales y colectivas (crisis del sujeto) (Fitoussi e Rosanvallon, 1996).

Outra característica da sociedade atual é o fato do conhecimento e a informação estarem substituindo os recursos naturais, a força e o dinheiro enquanto fator de geração e distribuição de poder na sociedade, embora o conhecimento sempre tenha sido fonte de poder, nas palavras de Tedesco (2000, p.12) ―ahora sería su fuente principal‖. O autor afirma que um dos fenômenos mais importantes nas transformações sociais atuais é o aumento significativo da desigualdade social. Nas sociedades que fazem maior uso da informação e do conhecimento em suas atividades produtivas a desigualdade social está aumentando, ―Crescimiento económico y aumento de la desigualdad han comenzado a ser concomitantes‖. O aumento da desigualdade está 403 Grupo de Estudo e Pesquisas em Política Educacional, Rio Claro, 06, 07 e 08 de julho de 2011 Vol. 3 (2011)

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associado à transformação na organização do trabalho e ao uso de novas tecnologias no processo produtivo e à respectiva eliminação de vários cargos gerando uma dinâmica onde o emprego diminui nos setores que podem pagar bons salários e aumenta naqueles com menores salários. Além do aumento da desigualdade, as transformações na organização do trabalho têm provocado a aparição de um novo fenômeno social ―la exclusión de la participación en el ciclo reproductivo‖ daqueles que não atendem os requisitos de identificação total com a empresa e evolução permanente, sobrando-lhes apenas condições precárias de trabalho ou até o desemprego. Nesse contexto a exclusão tende a substituir a relação de exploração. Tedesco indica ainda a crise do Estado-Nação em que, devido ao processo de globalização econômica, se tem produzido uma tendência a construir entidades políticas supranacionais e levado o conceito de cidadania associado à Nação a perder significado levando a uma ruptura da ação política tal como era concebida até agora.

La globalización económica, en síntesis, reduce la capacidad del Estado para definir su política monetaria, su presupuesto, su recaudación de impuestos y la satisfacción de las necesidades sociales de su población. Al estar basada fundamentalmente en la lógica económica y en la expansión del mercado, la globalización rompe los compromisos locales y las formas habituales de solidaridad y de cohesión con nuestros semejantes. (...) numerosos diagnósticos de la sociedad actual muestran que la ruptura de los vínculos tradicionales de solidaridad provocada por el proceso de globalización ha generado nuevas formas de exclusión, de soledad y de marginalidad. (TEDESCO, 2000: p.32-33)

As transformações culturais atuais mais evidentes aparecem na família e na forma como esta cumpre sua função socializadora. As mudanças na estrutura familiar têm afetado a função socializadora da família, um aspecto marcante da sociedade atual é a dissociação entre casamento e filhos, na família tradicional os vínculos eram indissolúveis, hoje é comum os filhos viverem com apenas um dos genitores, na maioria dos casos com a mãe, também se observa uma diminuição do número de filhos e ausência da figura paterna. 404 Grupo de Estudo e Pesquisas em Política Educacional, Rio Claro, 06, 07 e 08 de julho de 2011 Vol. 3 (2011)

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Tedesco (2000 p. 44) afirma que tais constatações permitem afirmar que a família contemporânea ―ya no es una institución sino una ‛red de relaciones‘ que, en lugar de ser responsable de transmitir el patrimonio económico y moral de una generación a otra, tiende ahora a privilegiar la construcción de la identidad personal (Thery,1996)‖. As novas tecnologias da informação têm impacto significativo nas transformações culturais da atualidade, o acúmulo de informação, a velocidade na transmissão, a superação das limitações espaciais, a utilização de multimídia, leva a modificação de conceitos básicos de tempo e espaço, onde até a noção de realidade começa a ser repensada diante da possibilidade da realidade virtual, influenciando os padrões de conduta. Tedesco (2000, p.51) descreve a ordem social atual como sendo de natureza reflexiva onde pensamento e ação são refratados um sobre o outro. O aumento da ―reflexividade‖ social implica em maiores níveis de incertezas e o maior conhecimento da vida social ―no implica mayor control sobre ella sino, al contrario, mayores niveles de incertidumbre que, a diferencia del pasado, son incertidumbres producidas por causas naturales‖ ocasionadas pelos problemas ecológicos. No esquema Fordista, a educação era vista como instrumento de mobilidade social em que a escolarização de alguns deixaria livres cargos menos qualificados a outros. No esquema pós-fordista quem não se qualifica, além das dificuldades de conseguir emprego ainda pode ser excluído do qual já está, ser relegado a cargos inferiores, ou perder o emprego. Assim há uma constante necessidade de formação continuada, mais pela necessidade de não ficar para traz do que pelo interesse em se qualificar para o trabalho, o que torna esse mercado de trabalho mais competitivo que antes. Em suma, conforme podemos observar através das citações acima, o século atual é um contexto de crise estrutural em que surgem novas formas de organização social, econômica e política. O conhecimento tornou-se a fonte principal de poder substituindo, junto com a informação, os recursos naturais. O aumento significativo da desigualdade social nas sociedades que fazem maior uso da informação e do conhecimento em suas atividades produtivas é um dos fenômenos mais importantes. A relação de exploração tende a ser substituída pela 405 Grupo de Estudo e Pesquisas em Política Educacional, Rio Claro, 06, 07 e 08 de julho de 2011 Vol. 3 (2011)

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exclusão provocada pelas transformações na organização do trabalho. Considerando este contexto de reflexividade, Tedesco aponta para necessidade da democratização do acesso ao conhecimento e do desenvolvimento das capacidades de produzi-lo que é fundamental para a coesão social, e para tanto, a necessidade de transformação da educação, dos modelos de gestão e de seus conteúdos.

A AÇÃO DOCENTE E O PROCESSO FORMATIVO

Diante de tantas vicissitudes na sociedade, a ação docente também sofre a necessidade de alterações para se adequar ao contexto em que está inserida. Sabe-se que há essa necessidade, porém não se sabe se isso ocorre de fato, uma vez que o sistema escolar não parece ter mudado muito. Segundo Roldão (2007), o que caracteriza e distingue o professor de outros atores sociais e agentes profissionais, é a ação de ensinar, ―o que se entende por ensinar,‖ conceito que não é consensual nem estático e o reconhecimento da função existiu em muitos formatos e com diversos estatutos ao longo da história, mas a emergência de um grupo profissional estruturado em torno dessa função é característico da modernidade. No tocante ao conceito de ensinar há controvérsias entre ―professar um saber‖ e ―fazer os outros se apropriarem de um saber‖. A dialética do ensino transmissivo versus o ativo faz parte de uma história relevante, mas passada e remete, na sua origem, para momentos e situações contextuais e sócio-históricas específicas. A função específica de ensinar não pode hoje ser definida como passagem do saber por razões sócio-historicas – o ensinar como transmissão de saber deixou de ser socialmente útil e distintivo da função docente no contexto atual de acesso à informação e de estruturação da sociedade em torno do conhecimento enquanto capital global. A concepção de ensinar enquanto transmissão pertence ao passado mais distante quando esse significado era socialmente pertinente num contexto onde o 406 Grupo de Estudo e Pesquisas em Política Educacional, Rio Claro, 06, 07 e 08 de julho de 2011 Vol. 3 (2011)

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saber disponível era menor, pouco acessível e seu domínio limitado a um número restrito de grupos e indivíduos, caracterizado até meados do século XX. Ensinar enquanto transmissão era aceitável nesse contexto como forma de tornar público o conhecimento aos que não o possuíam. Na atualidade, segundo Roldão, a função de ensinar é caracterizada pela figura da dupla transitividade e pelo lugar de mediação. Assim, ensinar é a especialidade de fazer aprender alguma coisa (currículo), a alguém (destinatário da ação). A influência de correntes teóricas diversas (personalista e Behaviorista) empurra a função de ensinar, ora para indefinição, ora para tecnicização. O ato de ensinar era praticado muito antes de sobre ele se produzir conhecimento sistematizado, porém a progressiva teorização do ato de ensinar foi gerando novos conhecimentos que passam a alimentar e transformar a forma de agir dos profissionais. No plano da clarificação da natureza do conhecimento profissional docente se configuram duas tendências interpretativas predominantes: uma centrada na análise de seus componentes, valorizando o conhecimento prévio necessário; outra na valorização da prática profissional refletida como fonte primeira, valorizando o conhecimento emergente da prática e da reflexão sobre ela. Em vez de prática docente a autora prefere falar em ação de ensinar, enquanto ação inteligente fundada num domínio de saber. Torna-se saber profissional docente quando e se o professor o recria mediante um processo mobilizador e transformativo em cada ato pedagógico, contextual, prático e singular, transformando-o em fundamento do agir informado, arte e técnica fundamentada na ciência. Saber ensinar é ser especialista dessa complexa capacidade de mediar e transformar o saber conteudinal e curricular. Saber produzir essa mediação é ser um profissional de ensino legitimado por um conhecimento específico, exigente e complexo. Para Roldão (2007), a ênfase praticista predominante na cultura profissional dos professores não contribui para o crescimento da profissão, num mundo em que conhecer é poder, um salto na profissionalização dos professores depende da 407 Grupo de Estudo e Pesquisas em Política Educacional, Rio Claro, 06, 07 e 08 de julho de 2011 Vol. 3 (2011)

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afirmação e reforço de um saber mais analítico, consistente e em permanente atualização, claro em sua especificidade e sólido em seus fundamentos. A ação docente está vinculada ao processo formativo do professor. Tornar-se professor, segundo Pacheco (1995), ―é um processo dinâmico e evolutivo que compreende um conjunto variado de aprendizagens e de experiências ao longo das diferentes etapas formativas‖, em um processo de transformação e reconstrução e de aprendizagem contínua de caráter formal ou não formal, que vai além da aquisição de conhecimentos e destrezas, constituindo uma questão de individualidade. Conforme Pacheco (1995), processo de aprender a ensinar resulta da articulação teoria e prática, destacando-se quatro componentes processuais: *A metacognição, que envolve mudanças de natureza, cognitiva, afetiva, condutivas, resultantes da articulação teoria e prática.

O professor

reconceitualiza aquilo que aprende numa instituição, orientado pela necessidade de um conhecimento prático e útil. *A descontinuidade, marca passagem do aluno a professor. Choque de transição, no confronto ideal x realidade. Nesse processo descontínuo o professor passa por diferentes etapas evolutivas de preocupações que marcam o seu percurso profissional; fase de impacto nos alunos, preocupação com a aprendizagem dos alunos e sua relação interpessoal com eles. *A

individualização

embasada

na

teoria

cognitivo-

desenvolvimentalista, considera o professor um adulto aprendente. Aprender a ensinar é um processo que envolve mudanças cognitivas sendo que altos níveis de desenvolvimento psicológico se associam a maior capacidade do professor de resolver problemas conferindo-lhe mais segurança e auto-imagem positiva com práticas mais reflexivas, inovadoras, flexíveis, etc. Baixos níveis de desenvolvimento levam a dificuldade de resolver problemas. *A socialização ocorre em vários níveis, frutos de influências que contribuem para a construção de identidades profissionais, formando olhares, saberes e significados.

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SER PROFESSOR NESTE CONTEXTO

―Agravando ainda mais a situação, as soluções fragmentadas, os modismos e outras mudanças passageiras, as reformas em massa e multifacetadas – tudo isso deixa o professor ainda mais desanimado, a solução passa a ser o problema‖. FULLAN

Ser professor hoje é estar em crise com sua identidade profissional em um contexto em que várias reformas têm fracassado e, conforme Fullan (2002), os especialistas estão se dando conta do que tem sido óbvio, ―a pesada carga de responsabilidades pela mudança e pelo aperfeiçoamento nas escolas repousa, em última análise, nos ombros dos professores, (...) a derrubada de paredes não é suficiente para ocasionar mudanças‖ e:

Uma mudança educacional que não envolva os professores e que não tenha seu apoio costuma terminar como uma mudança para pior ou para nada. Basicamente, é o professor em sua sala de aula quem deve identificar e promover o aperfeiçoamento. O professor é o elemento chave da mudança, sem dúvida alguma. Uma liderança que não compreende nem envolve o professor está fadada ao fracasso. (FULLAN, 2002 p.30)

Ao responder o questionário que tinha como uma das perguntas: ―O que precisa ser mudado urgentemente nessa profissão?‖ a valorização profissional e a autonomia, entre outros itens, apareceram entre as respostas da maioria dos professores pesquisados. Os sujeitos de pesquisa ilustraram perfeitamente a situação:

O que precisa ser mudado urgentemente é a valorização profissional do professor, respeitando a autonomia na escolha do material didático e do método de trabalho, por exemplo, foi implantado no município o Programa ler e escrever e os professores não foram envolvidos nesse processo de implantação, (não foram consultados). (PROFESSOR 8) Precisa começar mudando pela valorização do professor, está aos poucos, acabando o respeito pelos profissionais da educação. (PROFESSOR 9) É necessário mudar a forma como são conduzidas as políticas educacionais, o professor deve ter mais autonomia, sendo importante mudar a concepção que o aluno tem hoje, fazer com que este perceba que tem obrigações no âmbito

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III Seminário Internacional de Gestão Educacional escolar e que não é apenas um detentor de direitos e garantias. (PROFESSOR 12) A valorização profissional, social e financeira (...). (PROFESSOR 1) O profissional deve ser valorizado, não só em salário, mas, sim ser compreendido, questionado (se necessário) e ouvido. Saber que cumpre uma função digna e que todos percebam o quanto isto é valioso. A sociedade precisa entender que ser professor não é apenas um emprego, é muito mais que isso. A ressaltar, infelizmente alguns professores também precisam dessa nova visão, pois é esta minoria que cria a generalizada negativa. (PROFESSOR 3) O que precisa ser mudado urgentemente seria o fato dos profissionais da educação ―não serem ouvidos‖. A maioria dos atos da educação são criados de ―cima para baixo‖, ou seja, com os governantes impondo regras e conceitos a comunidade escolar, sem consultar quem diariamente está na sala de aula. A realidade do nosso país varia de região para região, estado para estado e até de cidade para cidade, mas somente quem convive na escola vê essas diferenças e podem com certeza dizer o que é melhor para a educação do país. (PROFESSOR 5) (...) a valorização para podermos dizer de boca cheia ―sou professor‖. (PROFESSOR 7)

Podemos observar através dos relatos descritos acima que a desvalorização profissional do professor é real e parte de vários segmentos da sociedade, sejam governantes, gestores, pais, alunos e até mesmo dos próprios professores, conforme aponta o professor n°3. A ingênua idéia de promover ―caderninhos prontos‖, ou seja, materiais elaborados e conteúdos definidos, sem a participação do professor no processo decisório, produzidos em grande escala, por exemplo, para todas as escolas de um Estado, ainda sem considerar as diversidades regionais pode ser um caminho fadado ao fracasso por que:

Independente de quão nobres, sofisticadas ou brilhantes possam ser as propostas de mudança e de aperfeiçoamento, elas nada representam se os professores não as adotam em suas próprias salas de aula e não as traduzem em uma prática profissional efetiva. (FULLAN, 2002 p.29)

FULLAN, (2002, p.29), discorre e aponta algumas razões além do fato citado acima, sobre o problema da reforma fracassada, na qual estratégia alguma parece funcionar e ―as várias estratégias que não apenas fracassam em motivar os 410 Grupo de Estudo e Pesquisas em Política Educacional, Rio Claro, 06, 07 e 08 de julho de 2011 Vol. 3 (2011)

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professores a implementar melhorias, mas também os alienam ainda mais de sua participação nas reformas‖. São elas: Os problemas em si são complexos, de difícil solução, considerandose os recursos disponíveis; Os prazos estão fora da realidade, porque os que elaboram as políticas querem resultados imediatos; As tendências a modismos e a soluções rápidas são frequentes; As soluções estruturais (por exemplo, a redefinição do currículo, o aumento das avaliações e dos testes) costumam ser as preferidas, embora não envolvam questões subjacentes de instrução e de desenvolvimento dos professores; Os programas de apoio subsequentes para a implementação das iniciativas políticas não são oferecidos. Por fim, as inovações como soluções, ironicamente, exacerbam o problema da sobrecarga. (...) as novidades não estão tornando mais fácil o trabalho do professor, elas o estão tornando pior. A sobrecarga de expectativas e de soluções fragmentadas permanece sendo o problema principal. (FULLAN, 2002, p19)

Ilustrando o disposto nas citações acima o professor n° 11 relata que o que precisa ser mudado urgentemente é: O modismo. Acredito que as tendências educacionais estão mudando muito rapidamente, e os professores nem conseguiram absorver a anterior, por exemplo: em um ano Letra e Vida, já no outro Pró- Letramento, no outro Ler e Escrever... A educação evolui aos poucos, estamos lidando com pessoas e não com máquinas, acredito que as tendências educacionais deveriam acontecer com menos velocidade. (PROFESSOR 11)

É preciso que os professores sejam vistos como seres totais e não como meros executores, do mesmo modo, como as escolas também precisam ser vistas na sua totalidade. Analisando o conteúdo da coleta de dados do grupo pesquisado, alguns relatos chamaram minha atenção pelo fato de tornar evidente o mal-estar sentido pelo docente em relação à forma como a escola está instituída e em relação ao próprio trabalho: 411 Grupo de Estudo e Pesquisas em Política Educacional, Rio Claro, 06, 07 e 08 de julho de 2011 Vol. 3 (2011)

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Para ser sincero, acredito que a única coisa que deve ser mantida no atual sistema são as crianças, de resto, a escola precisa mudar completamente o foco, pois estamos decretando falência e ninguém percebe. (PROFESSOR 3) É difícil falar o que deve ser mantido, uma vez que, o nosso ensino deve passar (precisa urgentemente) por uma reestruturação de maneira geral, em todos os aspectos. (PROFESSOR N°2) Ser professor é um desafio constante que, às vezes vencemos, e às vezes também perdemos. Ser professor é luta, tristezas, alegrias, ânimo, desânimo, saber ou não saber, persistência e tolerância, tudo isso são desafios que encontramos nesta profissão (...) não há como conseguir tudo que queremos e aí aparecem os pontos negativos, na alfabetização nem todos os alunos conseguem atingir os objetivos propostos e isso me preocupa, porque não sei se a falha é minha como professora ou se todo o sistema escolar é falho diante desses alunos que apresentam maiores dificuldades. Vivemos hoje em um contexto de inclusão, mas onde está a inclusão para os alunos que não conseguiram aprender ler e escrever?! (PROFESSOR 8) O desânimo é maior ainda quando buscamos ajuda e essa ajuda não vem, penso que a responsabilidade e o compromisso devem ser de todos envolvidos com os alunos e não somente do professor. (PROFESSOR 8)

O sentimento de insatisfação com o próprio trabalho, o sentimento de não saber o que fazer e o sentimento de estar sozinho devido à falta de suporte pedagógico, administrativo e apoio dos órgãos competentes diante às dificuldades, são evidenciados nas palavras transcritas acima. O professor n°8 levanta uma questão importante que é o fato de estarmos em um contexto de inclusão dos alunos portadores de necessidades especiais quando, ―por ironia do destino‖ a escola não está dando conta de atingir plenamente os objetivos, nem com os alunos ―ditos normais‖ o que se esperar da inclusão? Sabemos que não basta a inclusão física é preciso pensar também nessa necessidade atual e o que deve ser feito para que realmente tenha um trabalho em equipe e este aluno seja responsabilidade de todos os envolvidos. Os resultados da pesquisa apontam para a urgência de novas relações entre gestores e docentes, no trabalho em equipe, na formação de professores e gestores em geral e na relação da sociedade com a escola. É preciso investir na valorização da profissão docente, evoluir no sentido da profissionalização e da autonomia, porque nenhuma formação universitária pode resolver a doença social que é o mal-estar docente se não se aumentar o apoio social que é dado aos professores.

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III Seminário Internacional de Gestão Educacional O mal-estar docente é uma doença social produzida pela falta de apoio da sociedade aos professores, tanto no terreno dos objetivos do ensino como das recompensas materiais e no reconhecimento do status que lhes atribui. E não se detenha atuando num plano individual. O desafio e a resposta se incluem no título do estudo de Wangberg; deve-se melhorar o ensino como posto de trabalho e como profissão. (ESTEVE, 1999, p.144)

Os professores hoje são (conforme analogia do teatro, proposta por Esteve), atores sociais atuando em um cenário diferente da peça que ensaiaram, na qual estão vestidos com trajes que não combinam com o cenário no qual estão, onde ―diretores e atores‖ não sabem quais são nem onde estão os trajes adequados, uma vez que o cenário (contexto no qual estão inseridos) que ali está não dá para mudar, e o roteiro para aquele cenário, ainda é desconhecido. Simplesmente mudar de roupa (trocar o método) seria a solução? Parece que não. Em um contexto onde tudo precisa se adequar ao novo cenário social que ali se apresenta, a crise é sentida principalmente pelo professor, afinal: Quem está no palco?!

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O Pensamento e a ação do professor. Porto: Porto

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USO DE UM AMBIENTE VIRTUAL DE APRENDIZAGEM NO APOIO AO ENSINO PRESENCIAL EM UM CURSO SUPERIOR

Sérgio Luis Antonello [email protected] UNIARARAS

Jeovani Thomazini, [email protected] UNIARARAS

Alessandra Virgínia Montagner [email protected]

Resumo: O Moodle é um Ambiente Virtual de Aprendizagem (AVA) e vem se consolidando como recurso pedagógico, no gerenciamento de conteúdos e na administração de cursos em universidades. Seu uso foi avaliado sob a ótica dos alunos de um curso presencial, possibilitando ver que o desafio é usar adequadamente as ferramentas deste ambiente como recurso pedagógico. Este ambiente mostrou-se importante quando disponibilizou ferramentas que permitiram aos alunos externar seus pontos de vista, entender, compreender, debater, aprender e colaborar no processo de construção do conhecimento. Palavras-chave: Moodle; AVA; Recurso pedagógico.

INTRODUÇÃO A sociedade da era da globalização testemunha inovações tecnológicas que surgem com muita rapidez e que contribuem com uma geração de alunos que crescem em ambientes ricos de multimídia, com expectativas de mundo diferente de gerações anteriores (SANTOS et al., 2001). Inseridos neste contexto alunos de ensino superior anseiam por utilização de novos instrumentos pedagógicos que propiciem melhorias na aprendizagem. Estes alunos sabem da importância que a educação exerce sobre o futuro profissional e pessoal e de que a qualidade da mesma influi diretamente na entrada para 415 Grupo de Estudo e Pesquisas em Política Educacional, Rio Claro, 06, 07 e 08 de julho de 2011 Vol. 3 (2011)

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o mercado de trabalho e principalmente para a permanência com sucesso no mesmo (ANTONELLO, 2003). Alunos que possuem o perfil de mudar rapidamente a forma de lidar com as informações e mesmo seus relacionamentos têm cada dia mais dificuldade ao se depararem com os métodos ortodoxos encontrados em muitos dos ambientes de ensino (LUCCHESI et al., 2007). A figura do professor hoje é diferente de tempos atrás. Ele não é mais o detentor do conhecimento, aquele que sabe tudo, sendo seus alunos meros receptores do conhecimento. Com a quantidade imensurável de informações que estão ao alcance de todos, principalmente na Internet, o trabalho isolado do professor não se complementa com a necessidade dos alunos na busca pela construção do conhecimento. Trabalhar em conjunto e em cooperação passou a ser uma necessidade dos alunos e o professor entra como mediador, orientador, aquele que mostra os caminhos para os alunos em conjunto buscarem de forma interativa o saber e a construção de novos saberes (MOURA et al., 2001). Esta mudança de paradigma é sentida na sala de aula, onde professor e aluno se encontram na linha de frente do processo ensino/aprendizagem. Para Magalhães (2004) as tecnologias de informação e de comunicação em ambientes educacionais fazem parte de uma realidade inquestionável, favorecendo a renovação das técnicas de aprendizagem e fornecendo novos desafios para os professores, permitindo reativar-lhes o papel de agentes fundamentais da mudança. Dentre as vantagens do uso de tecnologia computacional pode-se citar a colaboração no desenvolvimento do indivíduo contribuindo na construção do conhecimento por meio de sua exploração autônoma e independente (MARTINS et al., 1999). Assim, os recursos computacionais passam a serem vistos como ferramentas educacionais, que quando bem utilizadas, podem facilitar, estimular e consolidar o aprendizado. Os recursos computacionais na sala de aula podem ser utilizados como ferramentas cognitivas, criando um ambiente que possibilite aprendizagem facilitada. Neste contexto os Ambientes Virtuais de Aprendizagem (AVA) vêm se consolidando como recurso pedagógico. Um AVA ajuda os professores no gerenciamento

de

conteúdos

e

na

administração

do

curso,

permitindo

acompanhamento constantemente do progresso dos estudantes.

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o

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Segundo Okada (2003), os Ambientes Virtuais são definidos como ―novos espaços de aprendizagem interativos e flexíveis, possibilitados pelas tecnologias digitais da comunicação e informação‖. O Modular Object Oriented Dynamic Learning Environment (Moodle) é uma plataforma de e-learning de código aberto que possibilita customização do ambiente. Atualmente é um dos mais populares AVAs disponíveis, e é usado como ferramenta de ensino e aprendizagem em escolas e universidades (GADSDON, 2010). Buscar entender a visão dos alunos em relação ao ambiente Moodle pode contribuir com os professores no melhor uso pedagógico deste recurso virtual e assim conseguir melhores resultados no processo ensino/aprendizagem.

OBJETIVO Este trabalho teve como objetivo avaliar, segundo a visão dos alunos, o uso do AVA Moodle no curso presencial de Bacharelado em Sistemas de Informação do Centro Universitário Hermínio Ometto - UNIARARAS.

REVISÃO DA LITERATURA Freire (1997) acredita na educação por meio da qual o aluno constrói o seu conhecimento em vez de somente reproduzi-los ou memorizá-los. A construção de conhecimento não pode ser uma questão de transferência, pois segundo o autor, ‖no processo de aprendizagem, só aprende verdadeiramente aquele que se apropria do aprendido, transformando-o em apreendido‖. Os alunos constroem sua própria aprendizagem. A comunicação e a interação fazem parte de nossos comportamentos como seres humanos que vivem em sociedade, onde desde muito cedo aprendemos formas diferentes de nos comunicar e interagir para apontar e resolver as necessidades (ANTONELLO, 2003).

Assim, através de ferramentas mentais ou cognitivas, o

aprendiz dentro de um contexto real constrói seu conhecimento de uma forma intelectual e social (MAGALHÃES, 2004). O

uso

de

tecnologia

em

um

processo

educacional

possibilita

o

desenvolvimento de atividades educativas, individuais ou coletivas, bem como o desenvolvimento e aprimoramento dos processos cognitivos através de softwares ou hardwares (VERMELHO, et al., 1998). Porém, a inclusão de tecnologias no processo de 417 Grupo de Estudo e Pesquisas em Política Educacional, Rio Claro, 06, 07 e 08 de julho de 2011 Vol. 3 (2011)

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ensino/aprendizagem não deve ser entendida apenas como equipar as instituições de ensino com computadores, deve sim, ser utilizada como ferramentas cognitivas em atividades de ensino e aprendizagem (ANTONELLO, 2003). È importante, por meio da tecnologia, disponibilizar recursos pedagógicos ao professor, para que seja explorado no aluno a vontade em entender, compreender, aprender e colaborar no processo de construção do conhecimento. A interatividade presente nos ambientes virtuais de aprendizagem e a possibilidade de desenvolver práticas mais colaborativas marcam de forma significativa o ensino on-line. Uma instituição que se proponha a formar profissionais para o mercado deve estar à frente na valorização da construção coletiva, da criatividade, da aprendizagem através da imagem, do audiovisual, das trocas, da constante interação, privilegiando além do cognitivo, o afetivo e o intuitivo. Todas estas possibilidades estão potencializadas nas tecnologias de comunicação e informação presentes nos ambientes de ensino on-line (ALVES, 2005). Práticas pedagógicas devem ser empregadas de maneira a permitir aos alunos vivenciarem seus próprios processos de construção de conhecimento, o que só se torna possível trazendo-se o aluno para o centro do processo de ensino/aprendizagem, o que inclui ser ele um ator participante na própria autoria do material instrucional do curso (SILVEIRA et al., 2007). Neste caso, pode ser destacada a característica de recursos como fóruns, wiki e chat existentes em alguns AVAs. Alves (2005) afirma que os alunos apresentam dificuldades em relação à autoria, a colaboração e a autonomia. Isto se deve pelos modelos educacionais a que os alunos foram submetidos que não primavam pelo desenvolvimento destas competências que passam a ser exigidas nos espaços on-line. Já os professores não podem simplesmente transportar suas práticas presenciais para os espaços on-line, sem atentar para a peculiaridade desses recursos de aprendizagem. Alguns ambientes virtuais de aprendizagem têm sido utilizados não só para disponibilizar conteúdos, mas também para promover e gerenciar processos de ensino/aprendizagem. Esses ambientes são também conhecidos como Learning Management Systems (LMS). O Moodle está inserido neste tipo de AVA tendo o diferencial de ser baseado em software livre. Alves (2005) descreve o Moodle como um ambiente que dispõe de ferramentas que podem ser selecionadas pelo professor de acordo com seus objetivos 418 Grupo de Estudo e Pesquisas em Política Educacional, Rio Claro, 06, 07 e 08 de julho de 2011 Vol. 3 (2011)

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pedagógicos, tais como fóruns, diários, chats, questionários, textos wiki, objetos de aprendizagem sob o padrão SCORM, publicação de materiais de quaisquer tipos de arquivos, dentre outras. O autor mostra a simplicidade de sua interface e o modelo com que um curso/disciplina pode ser montado no ambiente, com páginas divididas em três colunas que podem ser personalizadas pelo professor, inserindo elementos em formato de caixas como calendário, usuários online, lista de atividades etc. Também podem ser utilizados, por exemplo: área de convivência, para o registro de notícias relacionadas ao curso, um bate papo e fórum para discussão; área de conteúdo, para inserir os textos, imagens e apresentações relativos à temática em foco; área de atividades, para orientar as atividades a serem realizadas e/ou entregues ao professor; e área de interações, para dispor os mecanismos de interações que o professor achar conveniente para realizar a mediação pedagógica do curso

MATERIAIS E MÉTODOS O Centro Universitário Hermínio Ometto, Uniararas, com sede na cidade de Araras, SP, escolheu o Curso presencial de Bacharelado em Sistemas de Informação como projeto piloto no uso de AVA em seus cursos presenciais. A duração deste curso é de quatro anos, tendo ingresso de alunos no início de cada ano letivo. Porém, suas componentes curriculares são distribuídas em períodos semestrais, de tal modo que o primeiro ano do curso é dividido em primeiro e segundo períodos, o segundo ano em terceiro e quarto períodos, o terceiro ano em quinto e sexto períodos, e o quarto e último ano em sétimo e oitavo períodos. Dentre as várias opções estudadas, o AVA escolhido como ambiente de apoio ao curso presencial de Bacharelado em Sistemas de Informação foi o Moodle. Os primeiros contatos dos professores e alunos com o Moodle deu-se no segundo semestre de 2009. No período em que esta pesquisa foi realizada, o curso contava com 175 alunos matriculados, dos quais 120 se voluntariaram em fornecer dados de pesquisa para este trabalho. Desta forma, foi realizado estudo de caso a partir da aplicação de um questionário comum aos alunos do curso. O questionário foi composto por 12 questões optativas e teve finalidade de obter dados sobre o quanto e como o Moodle é utilizado pelos alunos, bem como o interesse dos mesmos para com este AVA.

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A aplicação do questionário ocorreu separadamente no mês de abril de 2011, em todas as turmas do curso, sendo elas do primeiro, terceiro, quinto e sétimo períodos. Para cada turma foram apresentadas orientações sobre o preenchimento do questionário, enfatizando que o preenchimento do mesmo era voluntário e que cada aluno poderia ou não se identificar. Os dados dos questionários foram tabulados e quantificados em planilha eletrônica, e a partir destes, foram realizadas análises quantitativas que possibilitaram gerar gráficos que facilitaram a interpretação dos mesmos.

RESULTADOS E DISCUSSÃO A aplicação dos questionários deu-se em dias de aula e o preenchimento e entrega foi opcional. Do total de alunos que receberam o questionário 120 entregaramno respondido. Alguns alunos optaram por não devolver a folha de questionário enquanto outros alunos da turma estavam ausentes no momento em que o mesmo foi aplicado. Baseado na tabulação dos dados foi observado que a idade média dos alunos do curso é de 22 anos e que 89% são do sexo masculino enquanto 11% são do sexo feminino. Os alunos estavam distribuídos da seguinte forma: 39% no primeiro ano (1º período), 29% no segundo ano (3º período), 14% no terceiro ano (5º período) e 18% no quarto ano (7º período). Embora seja utilizada como ferramenta de apoio ao ensino presencial no curso, 2,5% (dois e meio por cento) dos alunos disseram desconhecer o que é um AVA, sendo estes, alunos do primeiro ano do curso. No gráfico 1 pode ser observado que 90% dos alunos disseram ter conhecido o Moodle na UNIARARAS. Foi constatado, também, por meio de outra pergunta, que o Moodle é de fácil utilização já 55% dos alunos responderam que aprenderam a usar o ambiente sozinhos enquanto os outros 45% aprenderam com o auxilio de um docente.

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Gráfico 1. Onde você conheceu o Moodle?

Diferente do curso de Sistemas de Informação em que os alunos possuem massiva carga horária em laboratórios computacionais, desde o primeiro dia de aula, o que acarreta maior facilidade de uso de softwares aplicativos, outros cursos não dispõem desta forma de uso laboratorial. Isto associado ao fato de que noventa por cento dos alunos só vieram a conhecer um AVA durante seu curso, evidencia a necessidade de que os alunos sejam treinados neste ambiente logo no início de duas atividades discentes. Os professores devem estar atentos para não reduzir a tecnologia ao uso de instrumentos tecnológicos, mas sim, para explorá-la como objeto de ensino. O desafio para os professores é transformar as novas tecnologias de informação em ferramentas pedagogicamente apropriadas, atendendo a demanda dos alunos no contexto ensino/aprendizagem. Dentro do ambiente Moodle uma variedade de ferramentas está disponível, tendo cada uma uso pedagógico específico. Dentre elas podem ser citadas: chat, comunicação por mensagens, disponibilização de materiais, enquete, fórum de discussão, fórum de dúvidas, glossário, questionário/avaliação, recebimento de trabalhos, repositório de documentos e wiki. Então, quando indagado sobre quais ferramentas do Moodle o aluno considera importante (gráfico 2), as mais lembradas foram ―Disponibilização de materiais‖, que é onde os professores depositam materiais de apoio em cada aula ministrada e a ―Tarefas (Entrega de trabalhos)‖, além do meio de comunicação por mensagem que o ambiente disponibiliza. Fóruns de discussão e de dúvida também se destacam entre as ferramentas preferidas dos alunos, pois são os locais onde o aluno pode discutir o andamento e seu aproveitamento na disciplina, bem como suas dúvidas e opiniões. Pode-se observar que o aluno não apresenta muito interesse pelo uso do chat, o que demonstra sua preferência pelo uso de ferramentas assíncronas como os fóruns em detrimento de atividades síncronas, como o chat.

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Gráfico 2. Quais ferramentas você acha importante?

Quando perguntado sobre a frequência e tipo de uso, 77% dos alunos disseram usar o Moodle regularmente, 20% às vezes e 3% responderam quase nunca. O principal uso do ambiente, com 95%, é para estudos, porém, muitos alunos (36%) também fazem uso do Moodle como meio de comunicação/relacionamento do tipo aluno/professor e aluno/aluno. Para Moran (2000) aprendemos pelo pensamento, pelo encontro com o significado, quando interagimos com o mundo, pelo interesse, necessidade, pelo desejo de conhecer, de interagir com o meio social e cultural diversos. Ferramentas como fóruns de discussão, chat e questionários possibilitam a busca e construção do conhecimento pelo aluno, que sentem-se seguros no uso do AVA, como pode ser observado no gráfico 3, onde 63% dos alunos acreditam que o Moodle pode auxiliar em relação aos estudos, 36% acreditam que pode auxiliar parcialmente e apenas 1% acredita que o Moodle não contribui em nada em relação aos seus estudos.

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Gráfico 3. Você acredita que o Moodle pode lhe auxiliar em relação aos estudos?

O ambiente Moodle customizado para o curso de Sistemas de Informação foi planejado e dividido em áreas. Algumas áreas são de acesso exclusivo dos professores do curso, das quais pode ser citada a "Sala dos professores" onde são encontrados fóruns de discussão, bibliotecas de arquivos, repositórios de provas, subárea de planejamento, subárea de Projeto Interdisciplinar, e subárea do Conselho do Curso. Outras áreas, no entanto, são de acesso a todos os alunos matriculados no curso, onde podem ser encontradas as disciplinas em que o aluno está matriculado e uma área chamada de "Nosso Curso". O gráfico 4 mostra que 108 (90%) alunos acessam "Nosso Curso" juntamente com o acessa as disciplinas que estão matriculados, enquanto 3 (2,5%) alunos acessam exclusivamente o "Nosso Curso".

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Gráfico 4. Que área você acessa no ambiente Moodle?

A área "Nosso Curso" foi instituída para possibilitar ao aluno acesso direto à coordenação do curso além de outras finalidades e tem se mostrado de importância relevante para os alunos. Nela pode-se encontrar documentos do curso, informativos da coordenação, recado do dia, avisos importantes, dica da coordenação, sala de bate-papo, fóruns diversos, subárea de Projeto Interdisciplinar (PI) e subárea de Trabalho de Conclusão de Curso (TCC).

CONSIDERAÇÕES FINAIS Por meio dos resultados obtidos conclui-se que um Ambiente Virtual de Aprendizagem, neste caso o Moodle, pode ser usado como recurso pedagógico em apoio ao ensino em curso superior presencial. Foi observado que o Moodle tem um papel importante no curso de Bacharelado em Sistemas de Informação da UNIARARAS, sendo usado por alunos, principalmente, na busca e uso de material, discussões nos fóruns e entrega de trabalhos. Ensino e aprendizagem são processos dinâmicos que se alternam entre seus participantes, principalmente quando a tecnologia eletrônica é utilizada como recurso de ensino. No entanto, para que o ambiente possa ser bem explorado pelos alunos, um treinamento deve ser ministrado aos mesmos, preferencialmente logo no início de suas atividades discentes no curso. Sugere-se que este treinamento aborde conceitos de 424 Grupo de Estudo e Pesquisas em Política Educacional, Rio Claro, 06, 07 e 08 de julho de 2011 Vol. 3 (2011)

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AVA, a estrutura do Moodle e explore suas ferramentas e métodos de uso. De acordo com Kenski (2003), para realizar um ensino de qualidade, é necessário muito mais do que possuir avançados recursos tecnológicos disponíveis, é necessário, sobretudo, que os professores se sintam confortáveis para utilizar esses recursos como materiais de apoio didático, para criar novas possibilidades pedagógicas, partindo da integração desses meios com o processo de ensino. Pensando assim, os professores também devem receber treinamento, explorando metodologias para ensino/aprendizagem em ambientes virtuais e atividades práticas de uso correto e incorreto de todas as ferramentas do ambiente Moodle. Um bom treinamento aos docentes e discentes torna-se ponto fundamental para o uso adequado do AVA, porém, a ausência de treinamento ou mesmo um treinamento de qualidade duvidosa pode comprometer o uso do ambiente, transformando-se em fator de comprometimento negativo na qualidade do curso. Usar o ambiente como simples repositório de material não deve propiciar bons resultados. É importante explorar adequadamente as ferramentas assíncronas, pois estas permitem ao aluno adequar seus horários de estudo fora da sala de aula a outras atividades profissionais e pessoais. Como mostrado por Silveira et al. (2007) é importante que o aluno tome lugar no centro do processo ensino/aprendizagem para construção do próprio conhecimento bem como se transforme em ator na construção de material instrucional do curso. Desta forma é muito importante explorar as ferramentas que permitam aos alunos externar seus pontos de vista, debater e chegar a conclusões, principalmente por meio de recursos pedagógicos como fóruns de discussão. Assim como em todo processo de ensino/aprendizagem, o uso de AVA tem no aluno papel fundamental. Cabe ao professor explorar adequadamente as ferramentas do AVA de tal forma a manter os alunos estimulados a aprender e construir o conhecimento. Para finalizar, também deve ser destacada a importância de uma área diferenciada no ambiente, em que os alunos possam trabalhar assuntos que não são exclusivos das disciplinas do curso. Tornar esta área atrativa aos alunos, por meio de assuntos de interesse do curso e dos alunos, é papel da coordenação do curso bem como da administração pedagógica do AVA. No piloto do curso de Sistemas de Informação esta área é chamada de "Nosso Curso" e é usada por 95,5% dos alunos pesquisados. 425 Grupo de Estudo e Pesquisas em Política Educacional, Rio Claro, 06, 07 e 08 de julho de 2011 Vol. 3 (2011)

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MUDANÇAS LEGAIS E COTIDIANO ESCOLAR: formação de professores em políticas de atendimento à crianças e adolescentes38 Débora Cristina Fonseca Depto. de Educação/IB/UNESP- Rio Claro

Maria Bernadete S. da S. Carvalho Depto. de Educação/IB/UNESP-Rio Claro

Resumo: Neste trabalho pretende-se apresentar as reflexões desenvolvidas a partir dos dados coletados em uma experiência de formação de professores de ensino fundamental na temática ―Política de Atendimento à Criança e ao Adolescente‖. A proposta considera a LEI Nº 11.525 de 2007, tornando obrigatório o trabalho com Estatuto da Criança e do Adolescente, cabendo aos professores incluir a discussão sobre esses direitos. A experiência relatada indica que os professores podem construir novos modos de fazer, comprometidos com o desenvolvimento integral de crianças e adolescentes e não apenas com a escolarização desses sujeitos. Os resultados apontam a produção de novas formas de pensar a escola, entendendo-a como lugar onde todos podem e devem ser acolhidos, num fazer mais equânime e não apenas na perspectiva do igualitário. Palavras-chave: Formação; ECA; Criança e Adolescente

Introdução

Os direitos legais de crianças e adolescentes brasileiros foram elencados no artigo 227 da Constituição Federal (Brasil,1988) e posteriormente regulamentados pelo Estatuto da Criança e do Adolescente – ECA (1990) -, o qual, em seu livro I traz a declaração detalhada destes direitos e em seu livro II, trata dos mecanismos de viabilização dos mesmos, isto é, a maneira como podem ser garantidos. O Estatuto da Criança e do Adolescente adotou a doutrina da proteção integral que tem como alicerce a convicção de que crianças e adolescentes são credores de direitos 38

O trabalho é desenvolvido com apoio da equipe: Silvia Helena Tomazella (Psicóloga); Aline Juca de Araujo, Fernanda Soares e Tatiana Novaes de Oliveira (alunas de cursos de Licenciatura da Unesp-Rio Claro/IB)

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próprios e especiais e que, em razão de sua condição peculiar de pessoas em desenvolvimento, estão a necessitar de uma proteção especializada, diferenciada, integral. Sob a vigência do ECA, as crianças e adolescentes brasileiros passam a ter na lei uma salvaguarda de seus direitos, uma vez que a doutrina da proteção integral parte do entendimento de que todas as crianças e adolescentes - e não apenas aqueles em ‗situação irregular‘ - são sujeitos de direitos, em condições especiais de desenvolvimento e, consequentemente, merecedores de atenção integral. (Eca, 1990; Cury e Mendes, 1996) Esta nova forma de compreender o lugar social das crianças e dos adolescentes, por sua vez, tem demandado da sociedade a institucionalização de novas formas de sociabilidade, caracterizadas pela mudança na orientação da conduta social em face à criança e ao adolescente; conduta esta pautada no reconhecimento dos mesmos como sujeitos de direitos aos quais a sociedade deve proteger e promover em toda e qualquer situação. Isto porque, a existência do direito em si não é garantia de sua efetivação, o que só se dá, segundo Telles (1999), por meio da construção de práticas relacionais mutuamente acordadas entre os indivíduos. No caso dos direitos das crianças e dos adolescentes, é possível perceber que toda a sociedade é chamada à construção de um entendimento mútuo, capaz de orientar o agir coletivo em uma mesma direção, conforme se pode depreender do próprio ECA (1990) onde se institui que: ―É dever da família, da comunidade, da sociedade em geral e do poder público assegurar, com absoluta prioridade, a efetivação dos direitos referentes à vida, à saúde, à alimentação, à educação, ao esporte, ao lazer, à profissionalização, à cultura, à dignidade, ao respeito, à liberdade e à convivência familiar e comunitária‖. (Título I, art. 4º)

Estudos produzidos na área da infância e da adolescência (Andrade, 2000; Frizzo, 2006; Nascimento, 2005; Nascimento 2007; Suguihiro,1999; Liberatti e Públio, 1993; CEPAM, 1999) demonstram que a organização e funcionamento dos serviços de atendimento à criança e ao adolescente no território brasileiro tem se dado paulatinamente, sendo muitos, ainda, os desafios a serem enfrentados para que eles 429 Grupo de Estudo e Pesquisas em Política Educacional, Rio Claro, 06, 07 e 08 de julho de 2011 Vol. 3 (2011)

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sejam, efetivamente, instituições promotoras de políticas públicas de proteção e promoção do desenvolvimento de crianças e adolescentes, assegurando, a esse público, a efetivação dos direitos preconizados pelo Estatuto. Muitas são as razões apontadas para esta realidade e, dentre elas, a falta de compreensão da importância do papel do educador, somando-se, muitas vezes, ao desconhecimento da legislação que ampara sua ação protetiva e promotora, bem como de toda a dinâmica que esta implica e na qual está implicada. Por estas e outras tantas razões, inúmeros serviços e escolas, espalhados pelo país apresentam um funcionamento muito aquém do necessário para garantir, minimamente, a efetivação dos direitos previstos no ECA. Contrariamente, muitas vezes, a inação ou ação inadequada destas instituições acabam dando ensejo para que estes sujeitos vivenciem ou sigam vivenciando situações dos mais variados tipos de violação de seus direitos. O desconhecimento ou entendimento equivocado do ECA por parte dos educadores e, consequentemente, dos alunos (crianças e adolescentes) tem levado à manutenção do status quo. Diante das dificuldades de implementação desses direitos, decorridos quase vinte anos de sua aprovação legal, os segmentos sociais e entidades de defesa dos direitos das crianças e adolescentes, passaram ao debate sobre a necessidade de formação da população para compreensão do ECA e, principalmente, pela necessidade de que crianças e adolescentes conheçam seus direitos, tornando-se protagonistas neste processo. Neste sentido, a formação do educador-professor também aparece como necessidade, considerando ser este um dos principais atores no processo de formação e desenvolvimento integral de crianças e adolescentes. Nesse movimento, através do Ministério da Educação se encaminhou proposta de adequação da Lei no 9.394/96 ao Congresso Nacional. Através desta proposta, conseguiu-se a aprovação da LEI Nº 11.525, DE 25 DE SETEMBRO DE 2007, prevendo em seu art. 32, parágrafo 5: § 5o O currículo do ensino fundamental incluirá, obrigatoriamente, conteúdo que trate dos direitos das crianças e dos adolescentes, tendo como diretriz a Lei no 8.069, de 13 de julho de 1990, que institui o Estatuto da Criança e do Adolescente, observada a produção e distribuição de material didático adequado.

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Portanto, a partir de 2007 tornou-se obrigatória a inclusão de conteúdos que tratem de direitos de crianças e adolescentes no cotidiano das salas de aula de ensino fundamental. Entretanto, mais uma lei sem garantia de efetivação. Esta inclusão dos direitos significa, de forma mais ampla, a inclusão dos sujeitos crianças e adolescentes de todas as origens sociais, culturas e econômicas no contexto da educação com qualidade.

1.

Formação do educador e a efetivação de direitos

O papel da escola vem sofrendo grandes modificações, principalmente após a aprovação da Constituição de 1988, ao tornar a educação um direito de todos. Esta prerrogativa levou para dentro da escola muitos sujeitos e, consequentemnete, os problemas sociais por estes vivenciados. Antes da Constituição e do ECA (1990), muitos desses sujeitos ficavam à margem, não tinham acesso à educação através da escola pública, pois a escola não era para todos e sim para aqueles considerados devidamente adequados ao sistema. Portanto, este processo de inclusão de todas as crianças e adolescentes na escola (ainda que só legalmente), criou a necessidade de se repensar a escola como lugar que acolhe as diferenças entendendo que todos são sujeitos de direitos, devendo professores/educadores rever práticas, produzindo novos fazeres. Decorridos vinte anos de aprovação da lei, esta realidade ainda não se modificou totalmente, existindo muitos mecanismos de inclusão perversa, incluindo-se

o

indivíduo aluno mas não o sujeito de direitos (se garante o acesso à escola mas não sua permanência com a garantia de todos os seus direitos, com a condição peculiar de desenvolvimento integral). Entendemos que grande parte das dificuldades de transformação desta realidade, sem desconsiderar os aspectos culturais, sociais, históricos e econômicos, são decorrentes do fato de que o interesse e compromisso dos professores e profissionais não se fazem acompanhar por uma formação – tanto geral, quanto específica – que oriente sua ação na defesa e promoção dos direitos do público infanto-juvenil (Nascimento, 2007). O reconhecimento desta realidade alerta para a necessidade de as instituições formadoras de nossa sociedade, principalmente as universidades públicas, envidarem 431 Grupo de Estudo e Pesquisas em Política Educacional, Rio Claro, 06, 07 e 08 de julho de 2011 Vol. 3 (2011)

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esforços no sentido de contribuir para que ao interesse e compromisso desses professores e profissionais se somem a competência técnica e humana (Freire, 1998) tão fundamentais para o adequado exercício da função por eles assumida. Neste contexto, entendemos que os conhecimentos críticos e propositivos construídos nas pesquisas da área de educação, possibilitam ampliar a visão crítica das políticas públicas, enquanto instrumento de redução da desigualdade social e principalmente da afirmação de identidades, e do processo educativo, como um dos principais mediadores na constituição do sujeito em busca de sua emancipação. Neste contexto, construiu-se a proposta, ora em desenvolvimento, do projeto de extensão em interface com a pesquisa ―Formação de agentes sociais e professores em políticas de atendimento a crianças e adolescentes‖, com o objetivo de contribuir para que os professores, por meio de um processo de formação reflexiva, compreendam o ECA, participem da construção de propostas de efetivação dos direitos de crianças e adolescentes no cotidiano da escola e, da mesma forma , compreendam o papel que lhes cabe na rede de atendimento e no Sistema de Garantia de Direitos (indicar legislação). Neste artigo nos deteremos a discutir o trabalho de formação dos professores, lembrando, entretanto, que o projeto de extensão tem trabalhado também com a formação de agentes sociais (profissionais que atuam nas entidades de atendimento às crianças e adolescentes de Rio Claro e região). O projeto de extensão foi proposto, em sua concepção, na perspectiva da interface com a pesquisa, portanto, todo o processo está sendo registrado e analisado de forma a produzir-se um conhecimento avaliativo da proposta formativa, sobre a metodologia de trabalho e necessidades de formação complementar aos participantes.

1.1.

Proposta formativa e o processo de formação

Esta proposta de trabalho está ancorada no entendimento de que:

(...) o processo de aprendizagem, entendida enquanto (re)construção do conhecimento se dá por meio do diálogo entre concepções préexistentes e

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novas possibilidades de „compreender „ e „fazer‟ apresentadas no processo formativo. (SANTOS, 2009, p. 57).

Tal compreensão, que se assenta nos fundamentos teórico filosóficos da educação freiriana (1994) leva-nos a propor um processo formativo que tenha como base o diálogo por meio do qual emergem os saberes, concepções e experiências dos sujeitos participantes a fim de que os mesmos possam, diante dos conteúdos trabalhados, rever as bases que fundamentam sua atuação e avançar no sentido de construir uma compreensão mais aprofundada e compartilhada de aspectos importantes para a adequação de seu fazer cotidiano na interação com crianças e adolescentes no contexto da escola. A proposta de formação objetiva: -Refletir sobre o princípio da Proteção Integral presente no Estatuto da Criança e do Adolescente e sobre suas implicações no contexto da educação; -Construir coletivamente o sentido do Sistema de Garantia de Direitos na prática pedagógica, apontando os desafios impostos pelo cotidiano do trabalho em ambientes educativos; - Identificar os atores sociais responsáveis pela efetivação do Estatuto da Criança e do Adolescente; - Discutir as possíveis soluções para as questões cotidianas da escola e a atuação conjunta dos vários atores sociais da rede de atendimento à criança e ao adolescente em cada município; - Contextualizar a história pessoal de cada participante em sua aproximação com a educação. A formação dos educadores tem como base a Resolução 113/206 (Conanda) que institui o Sistema de Garantias de Direitos (COSTA, 1990; Costa,2007). O curso foi oferecido prioritariamente aos professores do ensino fundamental e sua adesão foi voluntária, partindo-se do interesse de cada professor. Também foram incluídos alunos de cursos de licenciaturas da Unesp (IB-Rio Claro) que demonstraram, através de carta de interesse, vontade de compreender melhor a política de atendimento à criança e ao adolescente, buscando complementar sua formação como futuros professores. Na divulgação do projeto e no primeiro encontro com os interessados foi esclarecido sobre sua interface com a pesquisa, considerando-se a novidade da proposta 433 Grupo de Estudo e Pesquisas em Política Educacional, Rio Claro, 06, 07 e 08 de julho de 2011 Vol. 3 (2011)

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e sua metodologia. Portanto, os participantes foram esclarecidos sobre sua inclusão em um trabalho de pesquisa. O projeto também foi submetido ao Comitê de Ética em Pesquisas com Seres Humanos, atendendo à resolução 196/96. A proposta está sendo desenvolvida em encontros mensais de três horas, com uma proposta inicial de dez encontros. Cada encontro constitui-se em um módulo. A metodologia de trabalho tem como base o processo grupal (Lane, 1984) e no entendimento de que as pessoas se constroem coletivamente, na relação com o outro de forma dialética, a proposta busca, portanto, construir o entendimento dos direitos de crianças e adolescentes e suas possibilidades de efetivação na reflexão coletiva. Os módulos do curso são organizados de forma a se articular a abordagem teóricoconceitual e a normativo-legal das temáticas propostas a uma abordagem mais dialógica e dinâmica por meio qual os participantes são estimulados a expor e pôr em discussão os saberes, conhecimentos e concepções que subjazem sua prática cotidiana na educação de crianças e adolescentes. Estes saberes, conhecimentos e concepções, por sua vez, são confrontados entre si e com a produção teórica e normativo-legal, de modo que todos têm a oportunidade de construir formas mais elaboradas de compreender, esperando-se que se convertam em renovadas formas de fazer. Os conteúdos programáticos se baseiam no que está previsto na Resolução 113/2006 (Conanda) e no Estatuto da Criança e do Adolescente. A estes conteúdos foram acrescidas temáticas identificadas como demandas locais de formação por meio da análise dos questionários respondidos no primeiro encontro. Entre alguns temas propostos para a formação estão:1- Compreensão do processo de elaboração do ECA; 2-Significado do Sistema de Garantias de Direitos; 3-Papel e atribuições dos Conselhos Tutelares e de Direitos; 4-Atendimento em Rede; 5-Relações Institucionais; 6-Família, Sociedade e Estado; 7-Educação e Escola; 8- Outros definidos com o levantamento com os educadores. Ao final do curso de formação, os participantes serão orientados a produzir, individualmente, um texto que contemple os seguintes objetivos: 1) Avaliar a proposta de formação propriamente dita, no que se referem aos conteúdos abordados, formas de abordagem (trabalho dos formadores), condições de realização – infra-estrutura, material didático, duração etc.

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2) Expressar o significado e os impactos do curso no que se refere aos seus conhecimentos, saberes, percepções e formas de fazer o trabalho social e educativo junto a crianças e adolescentes. 3) Apresentar uma proposta que aponte o funcionamento em rede em seu município, demonstrando a capacidade de articulação teórico-prática do conteúdo trabalhado na formação.

Entretanto, considerando-se que a avaliação deva ser processual, a cada encontro os participantes tem avaliado seu processo de formação. Com base nestes elementos, considerados fontes de dados da pesquisa, passaremos à reflexão sobre o processo de formação ainda em desenvolvimento.

2.

Elementos para reflexão

Considerando que o processo de formação em análise, ainda não foi concluído, apresentaremos alguns elementos já evidenciados e importantes para a reflexão sobre a necessidade de formação de educadores/professores do ensino fundamental na perspectiva dos direitos de crianças e adolescentes. Entendemos que a avaliação final poderá trazer novos elementos que enriqueçam esta análise, mas não modificá-la em sua essência. Neste sentido, entendemos que partilhar estes conhecimentos, ainda que inconclusos, podem potencializar o diálogo entre os formadores e educadores, ajudando-os na reflexão e avaliação de suas práticas inclusivas e na proposição de ações em rede, que possibilitem colocar em prática o Sistema de Garantia de Direitos e consequentemnete, as reformas legais instituídas na década de 1990. A experiência tem indicado um grande desconhecimento dos educadores sobre estas questões, sendo sua prática muito mediada por valores e preconceitos construídos com base no senso comum. A fala dos professores é sempre muito atravessada de elementos do senso comum, tais como: ―o ECA parece só dar direitos e as crianças usam isso para ameaçar pais e professores‖. Diante desses elementos, o processo de leitura e reflexão sobre o ECA, de forma coletiva, em pequenos grupos, norteados pelo histórico social da criança e da família no Brasil, tem possibilitado evidenciar, na discussão com todo o grupo, alguns professores revendo suas posições e dizendo frases 435 Grupo de Estudo e Pesquisas em Política Educacional, Rio Claro, 06, 07 e 08 de julho de 2011 Vol. 3 (2011)

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como: ―nunca me ensinaram a ler a história assim‖, ―nos ensinaram a ver a história só por uma perspectiva‖; ―nunca tinha lido o ECA desta maneira, entendendo que direitos subjazem quais práticas‖. Esse movimento de reflexão produzido pelo trabalho em grupo, parece desencadear entre os educadores um movimento no sentido da ampliação do seu modo de entender os direitos previstos no ECA, contextualizando histórica e socialmente a lei. Também tem possibilitado aos educadores a ―escuta do outro‖, ou seja, perceber que os demais educadores também trazem conhecimentos a serem partilhados e que conjuntamente podem avançar em suas reflexões e propostas de modificação de suas vivências cotidianas. Portanto, podem construir novos modos de fazer, mais comprometidos com o desenvolvimento integral de crianças e adolescentes e não apenas com a escolarização desses sujeitos. Assim, parecem pensar em uma escola onde todos podem e devem ser acolhidos, construindo um fazer mais equânime e não apenas na perspectiva do igualitário. Passam a discutir, por exemplo, que na garantia de direitos, muitas vezes alguns precisam de uma atenção maior para que possa se desenvolver tanto quanto outros. Em outras palavras, precisamos de práticas mais equânimes para que, de fato, o atendimento seja democrático. O trabalho também tem apontado a existência de muitas dificuldades e limites para a prática, pela falta de conhecimento e/ou entendimento equivocado dos vários atores sociais envolvidos (família, professores, gestores) e a ausência de mecanismos sociais para a efetivação dos direitos (ausência de políticas públicas e desconhecimento das atribuições dos atores sociais constituintes do Sistema de Garantia de Direitos). A formação da sociedade civil e de todos os atores sociais deve ser uma prioridade da escola, como uma condição para que de fato todos possam exercer sua cidadania. Outro elemento evidenciado com o trabalho desenvolvido é que a formação do educador deve incluir, necessariamente, uma formação política, embasada em concepções e visões de mundo ideologicamente compartilhadas. No caso desses professores, esta formação subsidia uma prática que solicita sempre um posicionamento diante das situações cotidianas no que se refere às políticas públicas, seja no questionamento da realidade ou na implementação de ações que visem à melhoria da qualidade de vida e de garantia de direitos de crianças, adolescentes e suas famílias, bem como da comunidade onde se insere. A prática pode, dialeticamente, provocar mudanças nos sentidos produzidos pelos professores, mas a formação pode ter papel 436 Grupo de Estudo e Pesquisas em Política Educacional, Rio Claro, 06, 07 e 08 de julho de 2011 Vol. 3 (2011)

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fundamental nesta construção de significados e sentidos sobre o mundo e, no caso específico desse trabalho, produzir novos sentidos sobre a atuação destes mesmos professores como agentes sociais e formadores. Uma formação capaz de levar à reflexão, a partir dos sentidos produzidos historicamente (Aguiar e Ozella, 2008: 2006) sobre a constituição e desenvolvimento do indivíduo, respaldada em referenciais históricos, culturais e sociais, e uma discussão sobre políticas públicas, que leve a repensar as concepções naturalizadas e assistencialistas predominantes (Fonseca, 2008), podendo tornar a prática desses sujeitos mais efetiva junto às escolas e à rede de atendimento, promovendo um olhar mais preparado e menos naturalizado sobre a realidade do município. A metodologia utilizada tem sido discutida a cada encontro, podendo já ser indicativo de uma construção coletiva, quando os particioantes avaliam o momento atual e indicam caminhos mais construtivos e reflexivos para a equipe coordenadora. Na fala dos sujeitos evidencia-se que a participação e reflexão tem sido mais formativo que as experiências de palestras e oficinas normalmente utilizadas como estratégias de formação em políticas de atendimento e execução de políticas publicas. O projeto tem como referencial teórico de base a perspectiva histórico cultural, tendo os autores Vigotski, Luria e Leontiev como fundantes, e autores da Psicologia Social e da Pedagogia da Educação como referência. Esses referenciais teóricos têm possibilitado compreender o indivíduo e a condição humana como socialmente produzidos. Estas mesmas bases epistemológicas indicam que as pessoas podem se desenvolver em busca de ações mais autônomas e que os processos educativos podem e devem contribuir com mudanças qualitativas (Bock, 2007; Duarte, 2001; Gonzalez Rey, 2004; Molon; 2003).

Considerações Finais

Os encontros com os sujeitos da ação educativa têm possibilitado à equipe coordenadora uma compreensão maior sobre os processos psíquicos e sociais, além da elaboração teórica sobre como organizar estas categoriais. Principalmente, parece contribuir para uma mudança na compreensão da realidade pelos educadores, levandoos a refletir sobre o processo de elaboração e execução das políticas públicas em seu

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campo de atuação, destacando-se a necessidade de foco no público com o qual eles trabalham: a criança, o adolescente e seus familiares. Os educadores, nos momentos de diálogo aberto e mesmo em conversas informais, têm relatado como a formação, embora ainda em sua etapa inicial, tem provocado a auto-reflexão sobre as formas de fazer no cotidiano e o questionamento sobre as tomadas de decisão, interferindo de forma positiva na relação com seus alunos e familiares. O processo ainda não está concluso, mas já apresenta indícios de que o conhecimento, construído de forma reflexiva e participativa, leva os sujeitos educadores ao comprometimento com a transformação da realidade, tendo como foco os sujeitos de sua ação cotidiana no contexto escolar.

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TRABALHO DOCENTE NA EaD E AS POLÍTICAS PÚBLICAS

Érika Kroll Rezende [email protected]

Profa. Dra. Joyce Mary Adam de P. e Silva [email protected]

Resumo: O sistema de educação à distância (EaD) tem se expandido e se tornado presente nas políticas públicas em todos os âmbitos do ensino superior no Brasil. Portanto, o presente trabalho inicialmente discorre sobre a evolução do sistema de EaD em adesão as políticas públicas que empenham um esforço nacional de democratizar e expandir o ensino superior nessa modalidade. Em complemento, discute a implantação de políticas públicas que enquandram o papel do docente como tutores, não possibilitando novas concepções que ofereçam a oportunidade do reconhecimento da atividade profissional desempenhada pelo docente no ensino superior à distância. Palavras-chave: EaD, ensino superior, políticas públicas.

A modalidade de educação à distância (EaD) foi inserida na Lei de Diretrizes e Bases da Educação em 1996 (LDB/96), em função da proposta da diversificação do sistema de ensino superior, pelo governo do presidente Fernando Henrique Cardoso, objetivando introduzir a EaD como um forma alternativa de formação a LDB/80, em particular nos artigos 80 e 87, sendo que o primeiro apresenta aspectos relativamente importantes nas políticas governamentais. Incentivos no caput: ―O poder público incentivará o desenvolvimento a veiculação de programas de ensino à distância, em todos os níveis e modalidades de ensino (...)‖. Espaço delimitado, ao final do caput: ―(...) educação continuada‖. Controle e regulamentação: ―A educação à distância, organizada com abertura e regime especiais, será oferecidas por instituições especificamente credenciadas pela União (§1º)‖. 441 Grupo de Estudo e Pesquisas em Política Educacional, Rio Claro, 06, 07 e 08 de julho de 2011 Vol. 3 (2011)

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O artigo 87 coloca a EaD como parte da estratégia do Plano Nacional de Educação 1996/2006 encaminhado ao Congresso Nacional. ―Prover cursos presenciais e à distância aos jovens e adultos insuficientemente escolarizados‖ (§3º II). Apresentam-se também diversas regulamentações que tentam clarear os aspectos da implementação do sistema de EaD. Credenciamento das instituições de ensino superior para oferecer cursos de EaD; Autorização e reconhecimento dos cursos de graduação; Autorização, reconhecimento e renovação de reconhecimento nos cursos stricto sensu dependentes da Câmara de Educação Superior do Conselho Nacional de Educação e da Avaliação da Coordenação de Avaliação e Aperfeiçoamento do Pessoal de Ensino Superior (CAPES/MEC). Dispensa de processo de autorização e reconhecimento nos cursos latu sensu somente para instituições de ensino previamente credenciadas para EaD; Aproveitamento de estudos e transferência entre as modalidades; Exames presenciais obrigatórios nos cursos de graduação, stricto e latu sensu. Apesar da LDB/96 ser o primeiro texto legal oficialmente divulgado, o avanço desse sistema de ensino aconteceu em toda a década de 90, com várias iniciativas governamentais: em 1994 foi criado o Sistema Nacional de Educação à Distância e em 1995 a Secretaria de Educação à Distância (SEED) no Ministério da Educação (MEC). Por conseguinte, as universidades começaram a criar projetos educacionais à distância, organizando laboratórios e coordenadorias de EaD em suas estruturas. Abriu-se então caminhos para a iniciativa privada, visto que o ensino superior apresentou-se como uma vertente muito lucrativa, formando profissionais colaboradores do capital (PEREIRA, 2009). Tais dados são ratificados pelo Censo da Educação de 2007 que apresentam a existência de 2.281 instituições de ensino superior (IES), sendo 89% privadas, sendo 86,7% registradas como faculdades, ou seja, instituições que não são 442 Grupo de Estudo e Pesquisas em Política Educacional, Rio Claro, 06, 07 e 08 de julho de 2011 Vol. 3 (2011)

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obrigadas a realizar pesquisas, mas apenas transmitir conhecimento, contra 5,3% de centros universitários (que também não precisam realizar pesquisas) e 8% de universidades (BRASIL, 2009). Das 2.281 IES, 97 oferecem (segundo dados do Censo) 408 cursos de graduação através da EaD, sendo 206 (63,7%) da iniciativa privada. O Censo indica ainda que 74,6% das matrículas foram realizadas no ensino superior privado, sendo 12,6% nas federais, 9,9% nas estaduais e 2,9% nas municipais (BRASIL, 2009). Do total dessas matrículas, 7% são na modalidade EaD. Apesar de aparentemente pequena essa porcentagem vem se ampliando. Todo esse crescimento do ensino superior privado tem contado diretamente com o apoio governamental que defende a expansão e democratização da educação superior através de diversas iniciativas, entre elas o fortalecimento da lógica da mercantilização através de parcerias público/privada no sistema de EaD. E por esse ser um mercado que tem se apresentado de forma lucrativa com investimento de baixo custo, as empresas educacionais tem investido e explorado a criação de novos cursos, especialmente na área de Humanas. Todos esses dados apontam um inexorável crescimento da demanda de novos cursos, novos investimentos e, por consequência, a necessidade de mais e mais contratações de profissionais para atuar no sistema da EaD. E o docente ao migrar para essa modalidade depara-se com diversos desafios além dos que já são encontrados no sistema de ensino tradicional. Ou seja, o docente expõem-se a um sistema educacional totalmente mediado e interligado ao uso das tecnologias da informação e comunicação (TIC), mantendo o referencial da educação presencial.

O Docente da Modalidade EaD de acordo com a UAB

A Universidade Aberta do Brasil (UAB) foi fundada em 2005, no Governo Lula, com o objetivo inicial de formar docentes através das licenciaturas, através do sistema de EaD. Tal projeto foi instituído em parceria com o Fórum das Estatais, integralizando instituições (federais, estaduais e municipais), ofertando vagas públicas.

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De acordo com PEREIRA, diversas modalidades já são oferecidas, sendo 94 licenciaturas, 44 especializacoes e 23 bacharelados. A UAB conta atualmente com 291 pólos e oferece aproximadamente 46 mil vagas de ensino superio (BRASIL, 2009). Tornando-se um referencial na modalidade da EaD, a UAB passou a consolidar um padrão na compreensão do modelo de educação e por conseguinte, do papel do docente na EaD para todo o país. Essa intencionalidade de manter um modelo padronizado pode ser compreendido em falas dos líderes da EaD A análise das tentativas de se implementar programas de educação a distância de grande alcance no Brasil revela grande dificuldade institucional na busca de consenso, seja no Executivo, no Congresso Nacional e mesmo na sociedade, sobre o modelo ideal de um programa com capacidade para atender a complexa realidade de um país continental. (Costa, Pimentel, 2009, p. 81). Ou seja, fica claro que há um interesse para que o sistema de EaD trabalhe de acordo com um único modelo, buscando uma adesão coletiva. Ao invés de se buscar uma organização dos diversos modelos, foca-se na formação de um sistema único, que denota uma incapacidade de envolver toda a diversidade. Analisando a compreensão da UAB acerca do trabalho docente, foco dessa discussão, nota-se que há um modelo prescrito em todo o país e em todo sistema a distância. Os profissionais da UAB são compostos de forma mesclada por docentes e tutores, sendo que os docentes desempenham diferentes papéis, e os tutores são divididos entre tutores à distância e tutores presenciais. Os tutores à distância atuam longe dos alunos e em parceria com os docentes, atuando nas instituições de ensino, já os presenciais estão próximos aos alunos, longe dos docentes, atuando nos polos regionais. A resolução CD/FNDE 26 discorre sobre quais são as atribuições do docente e tutor: Professor-pesquisador: a) atribuições: elaborar e entregar os conteúdos dos módulos desenvolvidos ao longo do curso no prazo determinado;

444 Grupo de Estudo e Pesquisas em Política Educacional, Rio Claro, 06, 07 e 08 de julho de 2011 Vol. 3 (2011)

III Seminário Internacional de Gestão Educacional

adequar conteúdos, materiais didáticos, mídias e bibliografia utilizados para o desenvolvimento do curso à linguagem da modalidade a distância; realizar

a

revisão

de

linguagem

do

material

didático

desenvolvido para a modalidade a distância; adequar e disponibilizar, para o coordenador de curso, o material didático nas diversas mídias; participar

e/ou

atuar

nas

atividades

de

capacitação

desenvolvidas na Instituição de Ensino; desenvolver as atividades docentes da disciplina em oferta na modalidade a distância mediante o uso dos recursos e metodologia previstos no projeto acadêmico do curso; coordenar as atividades acadêmicas dos tutores atuantes em disciplinas ou conteúdos sob sua coordenação; desenvolver

as

atividades

docentes

na

capacitação

de

coordenadores, professores e tutores mediante o uso dos recursos e metodologia previstos no plano de capacitação; desenvolver o sistema de avaliação de alunos, mediante o uso dos recursos e metodologia previstos no plano de curso; apresentar ao coordenador de curso, ao final da disciplina ofertada, relatório do desempenho dos estudantes e do desenvolvimento da disciplina; participar de grupo de trabalho para o desenvolvimento de metodologia e materiais didáticos para a modalidade a distância; realizar

a

revisão

de

linguagem

do

material

didático

desenvolvido para a modalidade a distância; participar das atividades de docência das disciplinas curriculares do curso; desenvolver, em colaboração com o coordenador de curso, a metodologia de avaliação do aluno; desenvolver pesquisa de acompanhamento das atividades de ensino desenvolvidas nos cursos na modalidade a distância; 445 Grupo de Estudo e Pesquisas em Política Educacional, Rio Claro, 06, 07 e 08 de julho de 2011 Vol. 3 (2011)

III Seminário Internacional de Gestão Educacional

elaborar relatórios semestrais sobre as atividades de ensino no âmbito

de

suas

atribuições,

para

encaminhamento

à

DED/Capes/MEC, ou quando solicitado. Tutor: a) atribuições: mediar a comunicação de conteúdos entre o professor e os cursistas; acompanhar as atividades discentes, conforme o cronograma do curso; apoiar o professor da disciplina no desenvolvimento das atividades docentes; manter regularidade de acesso ao AVA e dar retorno às solicitações do cursista no prazo máximo de 24 horas; estabelecer contato permanente com os alunos e mediar as atividades discentes; colaborar com a coordenação do curso na avaliação dos estudantes; participar

das

atividades

de

capacitação

e

atualização

promovidas pela Instituição de Ensino; elaborar relatórios mensais de acompanhamento dos alunos e encaminhar à coordenação de tutoria; participar do processo de avaliação da disciplina sob orientação do professor responsável; apoiar operacionalmente a coordenação do curso nas atividades presenciais nos pólos, em especial na aplicação de avaliações. (BRASIL, 2009, p. 3-4). Com base nesse detalhamento, podemos analisar quais são as perspectivas e os limites no sistema de EaD dentro da concepção defendida pelas políticas públicas brasileiras. Inicialmente, faz-se primordial salientar que o detalhamento da resolução quanto as atividades docentes na EaD, sendo uma política pública com o objetivo de se tornar permanente, implementada nacionalmente, apresenta riscos de contrariar as 446 Grupo de Estudo e Pesquisas em Política Educacional, Rio Claro, 06, 07 e 08 de julho de 2011 Vol. 3 (2011)

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principais discussões do campo educacional que sempre visou valorizar a realidade dos alunos e fortalecer o docente como um intelectual. Um aspecto relevante em toda essa implementação no sistema público da EaD, trata-se da não institucionalização em relação ao trabalho docente, já que o docente tem uma complementação em sua remuneração associado a atividades de extensão , não devido as práticas de ensino. Há um acúmulo de carga horária e as atividades no sistema de EaD configuram-se como extra, descaracterizando o trabalho docente e denominando-o apenas como uma bonificação salarial. Outro aspecto relevante configura-se na definição tanto do papel quanto da identidade do profissional denominado Tutor. Fica claro que esse profissional não tem o reconhecimento devido e que, selecionado internamente e contratados por contratos de gestão, não apresentam grandes comprometimentos com a qualidade e desenvolvimento do aprendizado, visto que não se apresentam condições para que haja esse aprofundamento. Em síntese, o que se apresenta nas políticas públicas são docentes distribuídos em diferentes papéis dentro do sistema da EaD, visto estarem enquadrados, de acordo com as resoluções mencionadas, a profissionais como bolsistas, sem terem o direito de vincular-se através da função docente. Essas condições denotam um forte precarização do trabalho docente, que desdobra-se entre a baixa remuneração, a exclusão de profissionais gabaritados e também pela falta do reconhecimento profissional. Tendo esse breve panorama da situação das políticas públicas quanto ao trabalho docente no sistema de EaD, pode-se então analisar quais as verdadeiras condições apresentadas atualmente e o que se permite ou não avançar de forma qualitativa no campo educacional a partir dessas políticas.

Considerações e conclusões

Para que o sistema de EaD não seja entendido apenas como um plano de governo inteiramente ligado a interesses de ordem política faz-se necessário transcender todas as dimensões instituídas, preocupando-se com um foco multidimensional além da tecnologia, visando o dimensionamento político e cultural, tendo a clara visão de que para o sucesso amplo e total de um projeto dessa natureza é de crucial importância que 447 Grupo de Estudo e Pesquisas em Política Educacional, Rio Claro, 06, 07 e 08 de julho de 2011 Vol. 3 (2011)

III Seminário Internacional de Gestão Educacional

haja uma institucionalização do sistema de EaD dentro das instituições do ensino superior. Para isso, é importante que haja um resgate da autonomia das instituições de ensino buscando a inclusão da diversidade de acordo com as diversas propostas na montagem de um projeto maior da UAB. Mais crucial ainda é tomar ciência de quanto a discussão do tema é importante e profunda, principalmente no que concerne a valorização e ao respeito às características específicas e ao tempo do trabalho dos docentes na modalidade de ensino de EaD que, geralmente, estão interligadas as mudanças culturais e não unicamente nas metodológicas. Faz-se necessário também trabalhar a estimulação dos docentes quanto a apropriação da inovação, vencendo o grande desafio de que a implantação das políticas públicas para a educação dependente das TIC não são apenas meras ferramentas de uma nova forma de ensino, mas também de um conteúdo estético de uma educação totalmente transformadora. Haveria, porventura, uma possibilidade de se construir um projeto nas instituições de ensino que integram a UAB com autonomia e liberdade, construindo um formato e modelo diferente, mesmo assim contando com os recursos fornecidos pelo MEC? Essa possibilidade teria limites? As instituições de ensino superior no Brasil está preparado para trabalhar com a diversidade de possibilidades e propostas ou não? Portanto, o argumento final é de que a padronização sufoca a ampliação e aproveitamento da diversidade e que promove uma padronização que se engessa frente a obtenção dos recursos necessários para a manutenção das políticas públicas. Espera-se que o sistema de EaD conjuntamente ao projeto da Universidade Aberta do Brasil possa apresentar novas possibilidades de escutar e receber a diversidade, não representada no engessamento da concepção de trabalho docente na EaD e promova a inovação tecnológica e paralelamente promova uma forte sinergia entre o sistema de educação a distancia e a educação presencial.

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III Seminário Internacional de Gestão Educacional

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III Seminário Internacional de Gestão Educacional

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A POLÍTICA DE AVALIAÇÃO DOS PROFESSORES NO ESTADO DE SP: SISTEMATIZANDO OS MECANISMOS DE CONTROLE SOBRE O TRABALHO DOCENTE Jean Douglas Zeferino Rodrigues [email protected] UNESP Campus de Araraquara

Resumo: O artigo sistematiza o processo de implantação de ínumeros mecanismos de controle sobre o trabalho docente na rede estadual de ensino do estado de São Paulo. Entre as iniciativas da SEE (Secretaria de Estado da Educação) que focalizam a gestão dos professores (as) destacam-se o Programa de Qualidade da Escola – PQE; a Bonificação por Resultados – BR e o Sistema de Promoção para os Integrantes do Quadro do Magistério. Demonstra-se ao longo do artigo que a perspectiva gerencial e performativa são os eixos que norteiam tais medidas e que articuladas tem como objetivo sedimentar novas relações no ambiente escolar, relações estas pautadas na meritocracia e na competitividade. Palavras-chave: gerencialismo, performatividade e trabalho docente.

Introdução O artigo39 se propõe a identificar e sistematizar os mecanismos atuais de gestão e avaliação do trabalho docente utilizados pela Secretaria da Educação (SEE) do estado de São Paulo. Para tanto se realizou uma pesquisa documental40 identificando e analisando as iniciativas da SEE de modo que se pode observar que as medidas apontam para um movimento de sistematização de políticas que, apesar de organizadas em frentes distintas, articulam a gestão dos professores aos processos pedagógicos, sendo ambos permeados por inúmeros mecanismos de controle cujo objetivo central é a busca de uma relativa qualidade da educação. 39

O referido artigo baseia-se a partir da dissertação de mestrado denominada ―Implicações do projeto ‗São Paulo faz escola‘ no trabalho de professores do ciclo I do ensino fundamental‖ (RODRIGUES, 2010). A dissertação completa está disponível em http://master.fclar.unesp.br/index.php?CodigoMenu=576&CodigoOpcao=616 . 40

Exemplos: Proposta Curricular do Estado de São Paulo, Bonificação por Resultados; Avaliação por Desempenho, Acompanhamento da aula pelo professor coordenador, Programa de Qualidade da Escola – IDESP.

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A atual política educacional desenvolvida pelo governo do estado de São Paulo apresenta fortes indícios de continuidade de uma concepção educacional iniciada em gestões anteriores que através de uma série de projetos41, resoluções, decretos e leis complementares, sedimentaram, ainda que de maneira inicial, novas condições de trabalho, remuneração e plano de carreira aos professores. Pelos estudos efetuados pode-se verificar que as perspectivas gerencial e performativa são eixos centrais na concepção das políticas de gestão e avaliação dos professores da rede pública estadual. Desse modo, esclarecer, ainda que brevemente, as principais formulações de tais perspectivas, possibilitará ao leitor tecer relações para além do plano teórico, ou seja, associar de fato os princípios às ações empreendidas pelo governo do Estado de São Paulo.

Aspectos gerenciais e performativos na educação O gerencialismo caracteriza-se por uma série de fatores extremamente articulados em seus objetivos e especificamente voltados para a função precípua da maior produtividade com o menor custo. Para tanto, lança mão de uma série de iniciativas congregando aspectos objetivos e subjetivos de modo a transformar o ambiente segundo as suas finalidades. Segundo Shiroma (2006) o gerencialismo pode ser compreendido como uma fórmula racional para a melhor utilização dos recursos públicos tendo como objetivo o aumento da produtividade e a máxima eficiência dos processos. Para Ball (2005) o gerencialismo tem se constituído no principal meio condutor das reformas que objetivam modificar a estrutura e a cultura dos serviços públicos introduzindo novas orientações e remodelando relações de poder. Portanto, não cabem no ambiente gerido pelo princípio gerencial espaços para ações democráticas de qualquer natureza uma vez que o gerencialismo

(...) oferece representações particulares da relação entre problemas sociais e soluções. É linear e orientado para um ―pensamento único‖. Preocupa-se com metas e planos mais que com intenções e julgamentos. Refere-se à ação mais que à reflexão. Concentra-se em análises mais que em sínteses. Estabelece fronteiras entre políticas e 41

Paulo Renato de Souza, o então Secretário da Educação do estado de São Paulo destaca os seguites programas: Programa Qualidade na Escola, Programa Ler e Escrever e o Projeto São Paulo faz escola. Disponível em: http://www.educacao.sp.gov.br/noticias_2009/2009_06_08_d.asp - Acesso em: 19/10/2009.

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III Seminário Internacional de Gestão Educacional fornecimento, ―estratégia‖ e ―implementação‖, pensamento e ação. Oferece um discurso tecnicista que priva o debate sobre suas bases políticas, de modo que o debate sobre os meios suplanta o debate sobre os fins. (CLARKE e NEWMAN apud SHIROMA e EVANGELISTA, 2007, p.6)

O novo discurso também faz uso de acordo com Shiroma (2006) de alterações orientadas pelo planejamento estratégico, pela missão e pelas metas. A intenção de tais ações aloca-se no objetivo de transformar o servidor com características do modelo burocrático em um ―líder dinâmico‖ promovendo mudanças na subjetividade dos educadores. Ao mesmo tempo utiliza inovações lingüísticas com o intento de inserir não apenas novos modismos, mas influenciar e transformar a prática, assim como estimula certo entusiasmo individual ou coletivo na superação das dificuldades. Estes instrumentos são articulados a dinâmicas que transformam os desafios gerais da organização em metas individuais alocadas por um lado, a um pretenso ambiente solidário e, ao mesmo tempo, acirrado contraditoriamente por avaliações de desempenho individual. Em consonância e similitude aos princípios, características de ação e consequências do gerencialismo as políticas performativas constituem um nível mais específico, mas não menos eficiente de controle. Conforme Ball (2005, p.543) a performatividade se apresenta como ―(...) uma tecnologia, uma cultura e um método de regulamentação que emprega julgamentos, comparações e demonstrações como meios de controle, atrito e mudança.‖ Enquanto o gerencialismo relaciona-se em maior grau às questões relativas à reforma da gestão do setor público imprimindo orientações administrativas sob novos parâmetros, a performatividade, como uma ferramenta imprescindível das gestões gerenciais, direciona-se com maior vigor aos aspectos subjetivos, de controle e atrito entre os indivíduos. Este sistema envolve de maneira articulada alvos e incentivos cujo objetivo se estabelece na produção de novos perfis institucionais utilizando recompensas e punições fundadas na competitividade (BALL, 2005). A partir da reorientação da função do Estado, que no Brasil ocorre principalmente a patir da Reforma de 1990, observa-se a criação de mecanismos de gestão que permitem a constituição hegemônica dos parâmetros mercadológicos voltados para o seu próprio interior. É nessa conjuntura que as políticas performativas ganham visibilidade, pois 453 Grupo de Estudo e Pesquisas em Política Educacional, Rio Claro, 06, 07 e 08 de julho de 2011 Vol. 3 (2011)

III Seminário Internacional de Gestão Educacional

A performatividade desempenha um papel crucial nesse conjunto de políticas. Ela funciona de diversas maneiras para ―atar as coisas‖ e reelaborá-las. Ela facilita o papel de monitoramento do Estado, ―que governa a distância‖ – ―governando sem governo‖. Ela permite que o Estado se insira profundamente nas culturas, práticas e subjetividades das instituições do setor público e de seus trabalhadores, sem parecer fazê-lo. Ela (performatividade) muda o que ele ―indica‖, muda significados, produz novos perfis e garante o ―alinhamento‖. Ela objetifica e mercantiliza o trabalho do setor público, e o trabalho com o conhecimento (knowledge-work) das instituições educativas transforma-se em ―resultados‖, ―níveis de desempenho‖, ―formas de qualidade‖. (BALL, 2004, p.1116)

Entre a miríade de iniciativas postas em prática no intuito de se estabelecer uma perspectiva calcada nos parâmetros performativos destaca-se a elaboração e divulgação de informações e indicadores que tem como objetivo o estímulo ao julgamento, a comparação, a classificação a partir dos resultados (BALL, 2005). Para Lopes e Lopez (2006) entre as novas medidas relacionadas à cultura da performatividade está a adoção de critérios de avaliação dos professores como parte de um conjunto de princípios pautados pela responsabilização (accountability) e competição, visando a eficiência, a racionalidade e a transmissão da cultura do desempenho através da constituição de sujeitos mais produtivos, polivalentes, pró-ativos, assertivos e flexíveis. Nas escolas o processo de remodelação do professor implica na materialização de várias ações entre as quais os processos que incluem a visibilidade dos indivíduos entre seus pares se destacam. Desse modo ―A base de dados, a reunião de avaliação, a análise anual, a elaboração de relatório, a publicação periódica dos resultados e das candidaturas à promoção, as inspeções e a análise dos pares são mecanismos da performatividade.‖ (BALL, 2005, p.549). Sob a égide desses princípios os professores acabam direcionando a prática docente segundo as exigências externas abandonando o desenvolvimento das atividades e conteúdos que não se relacionam diretamente aos indicadores de desempenho (SANTOS, 2004). Afonso (2009) diz que o novo modelo de Estado reforçou o seu poder de regulação (na elaboração e avaliação de políticas educacionais) acionando a avaliação como um suporte no processo de responsabilização relacionado aos resultados educacionais, passando estes a serem mais importantes que os próprios processos pedagógicos. 454 Grupo de Estudo e Pesquisas em Política Educacional, Rio Claro, 06, 07 e 08 de julho de 2011 Vol. 3 (2011)

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Após identificar a origem e a trajetória das medidas relativas à nova concepção de gestão da educação e dos profissionais pretende-se logo abaixo caracterizar algumas iniciativas promovidas pelo governo do estado de São Paulo que correspondem à nova forma de gestão dos professores. De modo geral, estas medidas têm sua utilização justificada na suposta busca pela qualidade da educação42 sendo que os mecanismos em questão mesmo apresentando diversos níveis de articulação constituem eficientes meios de controle do trabalho docente. Sistematizando os mecanismos de controle do trabalho docente na rede estadual de ensino do estado de São Paulo Pode-se observar um número razoável de decretos, leis e resoluções que tecem a rede de sustentação da política educacional desses últimos anos, sobretudo as medidas relativas à gestão dos professores da SEE. As iniciativas ao serem analisadas conjuntamente acabam se apresentando como peças de um quebra-cabeça cuja figura a ser desenhada ao fim da montagem estranhamente será identificada. Isso porque a junção das diversas medidas implementadas se traduzem tanto por objetivos mais evidentes, como a mensuração dos resultados obtidos através de avaliações externas, como por iniciativas de caráter mais subjetivo, como, por exemplo, à conformação docente aos parâmetros pré-estabelecidos pela Secretaria de Estado da Educação (SEE). Contudo, entre as diversas ações três podem ser consideradas a coluna vertebral para a consecução dos objetivos da gestão atual da SEE, são eles: o Programa de Qualidade da Escola – PQE; a Bonificação por Resultados – BR para a Secretaria da Educação e a instituição do Sistema de Promoção para os Integrantes do Quadro do Magistério. Entretanto, implementações secundárias, mas que articuladas influem na vida profissional dos professores também foram observadas. Como por exemplo, a alteração do Estágio Probatório; fixação de metas para os indicadores da SEE e a criação do Comitê Central de Informação, Monitoramento e Avaliação Educacional. A partir do estudo da base legal (decretos, leis e resoluções) da implantação das diversas iniciativas permite-se elaborar o Quadro 1 com a finalidade de demonstrar a

42

O conceito de qualidade promovido pelas reformas diz respeito a uma visão meramente econômica, técnica, pragmática, gerencial e administrativa (SILVA, 1996). Para Souza (1999, p.118) ―A qualidade, nesta perspectiva, encontra-se subordinada à concepção de produtividade do sistema educacional, de redução das perdas (evasão e repetência), de tempo de trabalho, de custos e de força de trabalho.‖

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legislação correspondendente à introdução de mecanismos gerenciais e performativos na gestão pública estadual. Quadro 1 - Introdução de mecanismos gerenciais e performativos na rede de ensino da Secretaria de Estado da Educação de São Paulo - Legislação relacionada. INTRODUÇÃO DE MECANISMOS GERENCIAIS E PERFORMATIVOS Rede de Ensino da Secretaria de Estado da Educação de São Paulo Legislação relacionada PERÍODO

LEIS COMPLEMENTARES

2007

LEI COMPLEMENTAR 1.078, DE 17 DE DEZEMBRO DE 2008. Institui Bonificação por Resultados – BR, no âmbito da Secretaria da Educação, e dá providências correlatas.

LEI COMPLEMENTAR 1.097, DE 27 DE OUTUBRO DE 2009. Institui o sistema de promoção para os integrantes do Quadro do Magistério da SEE e dá outras providências.

2009

RESOLUÇÕES

DECRETO 40.999, DE 8 DE JULHO DE 1996. Institui o Programa Permanente de Avaliação de Desempenho do servidor público. DECRETO 52.344, DE 9 DE NOVEMBRO DE 2007. Dispõe sobre o Estágio Probatório dos integrantes do Quadro do Magistério da Secretaria da Educação e dá providências correlatas.

Anos anteriores

2008

DECRETOS

RESOLUÇÃO SE – 66, DE 2 DE SETEMBRO DE 2008. Dispõe sobre as normas complementares do Decreto 52.344, de 09 de novembro de 2007 que disciplina o Estágio Probatório dos integrantes do Quadro do Magistério da SEE. RESOLUÇÃO SE – 79, DE 2 DE NOVEMBRO DE 2008. Altera a Resolução SE – 66, de 2 de setembro de 2008. RESOLUÇÃO SE – 74, DE 6 DE NOVEMBRO DE 2008. Institui o Programa de Qualidade da Escola – PQE E O Índice de Desenvolvimento da Educação do Estado de São Paulo – IDESP. RESOLUÇÃO CONJUNTA CC/SF/SEP/SGP1, DE 10 DE MARÇO DE 2009. Dispõe sobre a definição dos indicadores globais da Secretaria da Educação, para fins de pagamento da Bonificação por Resultados – BR, instituída pela Lei complementar nº 1078, de 17 de dezembro de 2008, seus critérios de apuração e avaliação. RESOLUÇÃO CONJUNTA CC/SF/SEP/SGP2, DE 10 DE MARÇO DE 2009. Dispõe sobre a fixação das metas para indicadores globais da Secretaria da Educação, para fins de pagamento da Bonificação por Resultados – BR, instituída pela Lei complementar nº 1078, de 17 de dezembro de 2008, para o exercício de 2008.

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III Seminário Internacional de Gestão Educacional RESOLUÇÃO SE – 22, DE 27 DE MARÇO DE 2009. Dispõe sobre a definição dos indicadores específicos da SEE para fins de pagamento da Bonificação por Resultados – BR, instituída pela Lei Complementar 1.078, de 17 de dezembro de 2008, seus critérios de apuração e avaliação. RESOLUÇÃO SE – 23, DE 27 DE MARÇO DE 2009. Estabelece normas relativas à Bonificação por Resultados – BR, instituída pela Lei Complementar 1.078, de 17 de dezembro de 2008. RESOLUÇÃO SE – 42, DE 14 DE JULHO DE 2009.

Não é intenção deste artigo analisar todos os pormenores de cada medida, mas caracterizar as ações que, gradativamente, apontam para a constituição de um sistema de controle sobre o trabalho docente. Desse modo, as três vértebras, ou seja, o Programa de Qualidade da Escola, a Bonificação por Resultados e o Programa de Promoção, em conjunto com outros dispositivos secundários, integram cada qual uma função muito específica no quebra-cabeça da reforma em questão. Portanto, em um primeiro momento será muito importante caracterizar individualmente cada programa para que dessa forma se possa compreender sobre um prisma mais amplo como cada elemento atua e se integra às demais iniciativas.

O Programa de Qualidade da Escola - PQE Lançado em maio de 2008 ―(...) tem como objetivo promover a melhoria da qualidade e a equidade do sistema de ensino na rede estadual paulista, com ênfase no direito que todos os alunos da rede pública têm: o direito de aprender com qualidade.‖ (SÃO PAULO, 2009). O programa avalia as escolas anualmente com intuito de verificar a qualidade do serviço oferecido ao mesmo tempo em que propõe metas anuais no sentido de se aprimorar a qualificação do ensino. Eixo central do programa o IDESP - Índice de Desenvolvimento da Educação do Estado de São Paulo é um indicador que mede a qualidade da escola e sua função reside em ―(...) apoiar o trabalho das equipes escolares no esforço da melhoria da educação e de permitir que os pais de alunos e a comunidade possam acompanhar a evolução da escola pública paulista.‖ (IBIDEM, p.1). Como o IDESP constitui um dos parâmetros para a determinação da remuneração variável que 457 Grupo de Estudo e Pesquisas em Política Educacional, Rio Claro, 06, 07 e 08 de julho de 2011 Vol. 3 (2011)

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os professores recebem, ou seja, a Bonificação por Resultados (BR), considerou-se oportuno detalhar um pouco mais o programa. Acima de tudo, o IDESP é um indicador que avalia a qualidade do ensino oferecido pela escola. Segundo o documento é considerada uma boa escola aquela em que grande parte dos alunos apresentam o domínio das competências e habilidades solicitadas pela sua série e/ou ano. O índice se compõe por dois critérios: o Índice de Desempenho (ID) dos alunos em avaliações externas, no caso o SARESP, que verifica o quanto aprenderam, e o fluxo escolar, também compreendido como Indicador de Fluxo (IF), que representa em quanto tempo aprenderam. O IDESP resulta na multiplicação desses indicadores segundo cada Etapa de Escolarização (S). É importante ressaltar que as ―metas de qualidade‖, dentro de programas como PQE, se pautam por princípios da gestão gerencial e perfazem um horizonte em longo prazo dos objetivos propostos. Entretanto, o processo de estabelecimento e formulação das metas e dos indicadores não contou em nenhum momento com discussão junto ao corpo docente e a comunidade escolar. Paralelamente, os indicadores estabelecidos e utilizados para definir e medir o desempenho adotam abrangências distintas: o indicador global direciona-se à SEE como um todo e o indicador específico se volta às unidades escolares ou administrativas. O que chamou a atenção é que a definição e fixação das metas para os indicadores globais de desempenho não ficaram a cargo da SEE, mas sob a responsabilidade direta de técnicos ligados a Casa Civil, Secretaria da Fazenda, Secretaria da Economia e Planejamento e Secretaria de Gestão Pública, sem participação direta da SEE nas resoluções43 que dispõem e normatizam tais fatores. A SEE apenas elaborou, em consonância com os indicadores globais, as metas para os indicadores de desempenho referentes às unidades escolares. Em nenhum momento da Nota Técnica do PQE se menciona os problemas estruturais que marcam a educação pública e a sociedade brasileira como um todo. Não são citados, por exemplo, as diferentes localizações geográficas das escolas, ou a condição socioeconômica da população atendida, o que certamente influi nos resultados. Para efeito demonstrativo, uma das escolas selecionadas para fins desta pesquisa,

43

Resoluções: Conjunta da CC/SF/SEP/SGP-1, e Resolução Conjunta da CC/SF/SEP/SGP-2, ambas de 10 de março de 2009. Apenas a Resolução SE – 22, de 27 de março de 2009 se origina da SEE.

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representante do IDESP mais alto das três pesquisadas, fica em uma região de nível econômico elevado, muito contrário daquela que obteve o IDESP mais baixo, que ―coincidentemente‖ se encontra em um bairro com precária condição social e econômica44. Portanto, se observa que a política educacional vigente desloca para níveis inferiores responsabilidades que deveriam ser executadas pelo Estado, fazendo com que cada vez mais sejam atribuídos aos profissionais da educação funções que fogem de sua alçada gerando, por sua vez, uma carga extra de ações.45

A Bonificação por Resultados - BR Além das muitas e ―novas‖ responsabilidades que os professores têm que dar conta uma os preocupa e se destaca nas discussões formais e informais que percorrem seus ambientes de trabalho: é o atendimento à meta anual da escola seguido pela recompensa ou pela punição do recebimento ou não do bônus (Bonificação por Resultados). Para evidenciar tal preocupação o Quadro 2 traz os dados de um Boletim da Escola referente a uma das unidades pesquisadas informando o desempenho alcançado e a próxima meta a ser cumprida:

EVOLUÇÃO E CUMPRIMENTO DAS METAS DE 2008 DA ESCOLA IDESP 2007

IDESP 2008

METAS 2008

4ª SÉRIE EF 1,33 1,54 8ª SÉRIE EF 1,19 1,68 3ª SÉRIE EM 0,32 1,51 Quadro 2 - Evolução e cumprimento das metas de 2008 da escola.

1,47 1,30 0,37

PARCELA DE CUMPRIMENTO DA META 120,00 120,00 120,00

44

A pesquisa não se preocupou em estabelecer as relações entre níveis de desempenho por escola, localização e condição sócio-econômica. Por este motivo não temos elementos empíricos que comprovam tal hipótese. 45

Shiroma e Evangelista (2007, p. 537) destacam: (...) atender mais alunos na mesma classe, por vezes com necessidades especiais; exercer funções de psicólogo, assistente social e enfermeiro; participar nos mutirões escolares; participar em atividades com pais; atuar na elaboração do projeto político-pedagógico da escola; procurar controlar as situações de violência escolar; educar para o empreendedorismo, a paz e a diversidade; envolver-se na elaboração de estratégias para captação de recursos para escola.

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Verifica-se no quadro 2 que a escola não só atingiu a meta proposta para 2008 como a superou. Nesse caso, seja qual for o percentual, os professores receberão a mais 20% do valor da BR como adicional estímulo, o que explica os 120% do Índice de Cumprimento de Metas (100 + 20). A partir do resultado da unidade escolar os professores se credenciam ao recebimento da Bonificação por Resultado, o conhecido bônus, normatizado e instituído através da Lei Complementar de nº 1078, de 17 de dezembro de 2008. A Lei Complementar - LC, seguindo sua lógica baseada na competitividade foi instituída visando a melhoria contínua e o aprimoramento da qualidade do ensino público do Estado de São Paulo. Segundo ela, para efeito da aplicação da BR, são considerados dois fatores: as metas, que sugerem o valor a ser alcançado em cada um dos indicadores, sejam globais ou os específicos; e o índice de cumprimento de metas, que se referencia como a relação percentual estabelecida entre o valor que foi alcançado no processo de avaliação e a meta fixada previamente. A BR será paga segundo a proporção direta entre o índice cumprido pelo professor ao longo do ano letivo e a meta estabelecida pela SEE durante o período de avaliação dos resultados46. O período a que se refere a SEE diz respeito aos ―dias de efetivo exercício‖, período de avaliação na qual o professor exerceu regularmente suas funções descontando todas as ausências, com exceção das falta originadas por férias, licença à gestante, licença-paternidade e licença por adoção (LC 1078). Outra exigência para o pagamento do BR é que o professor tenha participado de pelo menos 2/3 (dois terços) do período de avaliação. A avaliação dos resultados de cada unidade escolar terá como base ―(...) indicadores que deverão refletir o desempenho institucional no sentido da melhoria da qualidade do ensino e da aprendizagem, podendo considerar, quando for o caso, indicadores de desenvolvimento gerencial e de absenteísmo.‖ (LC 1078, 2008). Nota-se claramente que estão presentes ao conteúdo da LC 1078 características da gestão gerencial e de princípios performativos. O primeiro deles é o pagamento por desempenho individual, outro é a responsabilização docente. Afirma-se isso uma vez que a condução de tal mecanismo leva o professor a receber estímulo ou punição individual pelas suas ações através do recebimento ou não do BR; estabelece processos 46

Conforme a LC 1078 é a relação percentual estabelecida entre os dias de efetivo exercício e o total de dias do período de avaliação em que o servidor deveria ter exercido regularmente suas funções.

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comparativos intra e extraescolares como forma de se atingir a qualidade do ensino; ou ainda por publicar os resultados de cada unidade através do Boletim da Escola (PQE)47. Fruto da gestão empresarial o modelo de BR utilizado pela SEE tem seu fundamento em políticas que, segundo Marras (2000), vinculam o desempenho do indivíduo à produtividade e à qualidade dos resultados sendo que o trabalhador é estimulado a otimizar seu trabalho tendo como foco a busca das metas propostas pela empresa. Entre as ―vantagens‖ apresentadas pelo modelo de remuneração variável pode-se destacar 5 fatores: o incentivo a qualidade total; a otimização da produtividade; estímulo a redução geométrica dos custos; reforço dos valores culturais dos grupos; e incentivo a participação tanto do indivíduo quanto do grupo (IBIDEM). Os termos usados tanto na descrição da BR utilizada pela SEE como pelo autor supracitado não diferem entre si. Todavia, a BR diz respeito à gestão de processos associados à educação, à formação de pessoas e as relações humanas. Já o autor em questão refere-se a modelos de remuneração direcionados para empresas, fábricas, cujos objetivos se estabelecem na fabricação de mercadorias e no oferecimento de serviços. Estamos diante de um largo processo de reificação de processos humanos cujas barreiras que distinguem entre o que é uma coisa e um ser humano estão sendo diluidas. Reina a racionalidade mercantil para a qual tanto a coisa quanto o ser humano podem ser úteis para a conquista de um objetivo maior, a sedimentação de um tipo de sociedade pautada pela competitividade que elege como fator precipual a busca incessante do lucro.

O Sistema de Promoção por Mérito aos Integrantes do Quadro do Magistério da SEE. Destaca-se a seguir os pressupostos centrais do projeto que institui o Sistema de Promoção por Mérito aos Integrantes do Quadro do Magistério da SEE. O Projeto de Lei Complementar 29/09 convertido em Lei Complementar nº 1097 de 27 de outubro de 2009, que institui o sistema de promoção por mérito para os integrantes do quadro do magistério paulista, foi aprovado pela base governista da Assembleia Legislativa embora a APEOESP48 tenha se movimentado no sentido de ampliar apoio para a não 47

O desempenho de cada unidade escolar está disponível no sítio da SEE, www.educacao.sp.gov.br, no link do Programa de Qualidade da Educação. 48

Associação dos Professores do Ensino Oficial do Estado de São Paulo.

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aprovação do projeto. A contrariedade à medida pelo sindicato dos professores da rede estadual paulista procede pelo fato de que o projeto atrela a evolução salarial do professor ao desempenho em exames aplicados anualmente criando um sistema de diferenciação por mérito. Em outras palavras, o servidor terá sua evolução funcional desde que comprove, através de exame, as ―novas competências‖ adquiridas. O pano de fundo deste e dos demais projetos que se orientam na mesma direção consiste na instalação da meritocracia nas relações profissionais que permeiam o magistério confeccionando o alinhamento do setor público, principalmente a educação, aos princípios liberais que ora tentam ser sedimentados na sociedade. Através de uma prova de conhecimentos a SEE tem como objetivo verificar a competência do professor com relação aos conteúdos associados ao seu campo de atuação premiando com evolução pecuniária os 20% mais bem classificados. O professor, além de estar no seleto ―grupo dos 20‖, terá que estar classificado na escola há pelo menos 80% do tempo fixado como período para a promoção e somar no mínimo 80% dos pontos possíveis da tabela de frequência de assiduidade.49 A questão da remuneração salarial é componente central na atual política de gestão dos professores, nesse sentido, podemos inferir que em longo prazo muito dos recursos destinados a futuros reajustes salariais poderão ser alocados para o pagamento da Bonificação por Resultados e para o novo programa de valorização pelo mérito, uma vez que tais iniciativas representam, do ponto de vista da SEE, projeto de valorização da carreira do magistério. A partir de uma concepção pautada pelo acirramento do individualismo entre os professores o projeto aspira em médio prazo o delineamento de duas classes de profissionais: a ―elite‖, legitimada por uma certificação de competência docente oriunda da SEE, e a grande maioria dos professores pertencentes a uma suposta ―segunda linha‖ de profissionais. Segundo o Secretário da Educação:

"Com o novo sistema de promoção estaremos premiando os professores que apresentam melhor desempenho e assiduidade em sala de aula. É uma forma de reconhecer e incentivar professores mais bem preparados e dedicados. Assim ganham os alunos, pois terão uma melhor qualidade de ensino, e também os professores, que agora passam a contar com um plano de promoção salarial anual, até então inédito no magistério público, que tornará a carreira muito mais 49

Interstício mínimo de quatro anos ou 1.460 dias, por período contínuo ou não no exercício do cargo/ função da promoção.

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III Seminário Internacional de Gestão Educacional atrativa e valorizada", disse o secretário de Estado da Educação, Paulo Renato Souza.50 (grifos meus)

Cabe destacar que a opção do governo estadual em premiar apenas os 20% dos professores da rede51 parece ser uma questão exclusivamente política, ao contrário do que vem sendo anunciado como limite estabelecido pela ―responsabilidade com as contas públicas‖. A política se insere na própria opção estratégica elaborada pelo governo do estado na qual ao se premiar uma parcela mínima estaria se criando, além da competição interna entre os membros do magistério, comportamentos suscetíveis a enquadramentos e adaptações aos desígnios pré-estabelecidos, manipulando a esperança dos professores ao almejarem uma remuneração melhor. Tal política poderá promover e aprofundar, com maior ênfase, a desmotivação docente com sérias consequências para o desenvolvimento profissional e paralelamente, o pedagógico. A SEE enaltece o projeto afirmando que o mesmo trará benefícios extraordinários aos professores no que tange a valorização do magistério. A iniciativa que numa esfera mais ampla é política de Estado, na pasta da SEE é parte da 2ª etapa do PQE52. A partir de um processo de propagandas oficiais o governo paulista divulga à população que os professores poderão atingir aumentos reais que poderão chegar a 242%, criando uma imagem de que este profissional desfruta de ótima remuneração e de condições de trabalho excelentes. Trata-se de um processo nítido de responsabilização docente, pois de posse de mecanismos que proliferam fragmentos informacionais e pretensas imagens da realidade escolar o professor acaba sendo culpabilizado pelos resultados educacionais a partir de um movimento de desqualificação e menoridade política desse profissional (SHIROMA E EVANGELISTA, 2007).

Considerações finais

50

Disponível em: http://www.educacao.sp.gov.br – Acesso em 31/12/2009.

51

Esse número desconsidera os professores temporários com ingresso na rede após junho de 2007, os celetistas, estáveis e efetivos que não atendam às exigências mínimas. 52

Resolvi analisar o programa de valorização por mérito como item separado do PQE pelo fato de ser uma iniciativa recente e que somente a partir de 2010 começou a se efetivar. Outro fator preponderante é que o PQE-IDESP e a BR apresenta, a nível imediato, uma complementaridade procedimental maior que o programa de valorização pelo mérito.

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Tentou-se demonstrar o processo de transformação das últimas décadas do século XX incentivado pela necessidade de reestruturação do capital, e que acabou eclodindo numa série de adaptações e reformas tanto das economias mundiais quanto dos próprios Estados nacionais. Consequentemente, novos padrões de gestão foram implementados com base em valores que tradicionalmente orbitam a esfera produtiva. A incorporação de tais valores pelo Estado acabou provocando sua conversão deixando de ser um Estado executor, providenciário, para um Estado regulador, avaliador de processos que gradativamente foram transportados para a iniciativa privada, ou como gostam de denominar os defensores desse modelo, de iniciativa pública não estatal. Esse conjunto de fatores somados a reforma do Estado que no Brasil teve início em 1995, teve um caráter fortemente ideológico no sentido que impingiu a amplos setores da esfera pública um modus operandis e um sistema de valores totalmente vinculados a uma perspectiva neoliberal, centrando na competitividade o grande eixo propulsor dos mais variados objetivos. À educação coube a importância central de formar os futuros cidadãos para os novos tempos que marcam as sociedades inseridas no mundo das economias globalizadas e competitivas sendo que o fator diferencial entre uma economia e outra será a qualidade da formação dos indivíduos que se voltam às exigências modernas num processo de incorporação de necessidades básicas de aprendizagens articuladas à habilidades de adaptação, flexibilização, enfim, uma educação coerente aos novos códigos da modernidade53. Nessa lógica exige-se que os professores, uma profissão extremante estratégica para os novos tempos, pela condição de responsáveis pela formação dos futuros trabalhadores e, portanto, consumidores, adaptem sua conduta, seu comportamento dentro da sala de aula e sua relação com os alunos aos objetivos mais gerais da sociedade e das exigências econômicas. Prevendo-se a dificuldade que a categoria tem para incorporar passivamente novos métodos e novos conteúdos, a implementação de mecanismos de controle sobre o trabalho docente e os resultados de cada escola e professor foi a saída adotada para que os objetivos fossem perseguidos.

53

Segundo o documeto da CEPAL códigos da modernidade são representados pelo conjunto de conhecimentos, habilidades e aptidões imprescindíveis para que o indivíduo participe da vida pública e colabore no desenvolvimento produtivo na sociedade moderna. (BIELSCHOWSKY, 2000)

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Através de reformas, objetiva-se a predominância da competição e racionalidade como eixos alinhados na busca da qualidade educacional, de modo que os professores, considerados executores ou técnicos em pedagogia, tivessem seu trabalho percorrido por uma constante avaliação e mensuração, uma inconsequente comparação e publicitação de seus resultados e, por um profundo processo de responsabilização, culminando na premiação através de pagamento pelo desempenho individual para aqueles que atingissem as metas e os propósitos estabelecidos. Para Torres (1995) a lógica de planejamento educacional está intimamente associada ao paradigma epistemológico do positivismo pois é latente a utilização de métodos que focalizam o objetivismo, na busca de controle e manipulação das variáveis e no racionalismo, pois esse modelo permite medir, quantificar, estudar suas correlações e causalidade e manipular comportamentos futuros. Observa-se uma visão positivista aliada a pressupostos neoliberais nas relações que circulam o planejamento e desenvolvimento da educação. Para tanto, este não é o caminho que se deve percorrer para a construção de uma perspectiva educacional que atenda a ampla maioria da sociedade.

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NEGOCIAÇÃO: INDISPENSÁVEL NO FAZER E PENSAR A ESCOLA DO SÉCULO XXI

Vera Neves [email protected] UNIG/UMINHO

Ilda M. B. N. Duarte [email protected] UNIG/UMINHO

Ana V. de F. da Costa [email protected] UNIG/UNESA

Resumo: O estudo objetiva levantar possibilidades de participação dos alunos na definição dos conteúdos e matrizes curriculares. Para a consecução, escolhemos duas escolas de Ensino Médio na Baixada Fluminense, entrevistando professores e alunos com base em uma possível negociação. Os instrumentos utilizados foram observações, entrevistas e questionários semi-estruturados, viabilizando a análise qualitativa dos dados. Constatou-se na pesquisa a falha na formação de docentes e, consequentemente, do discente. É preciso que esta seja revista e que o futuro professor possa participar do planejamento do curso e avaliação. Por meio da negociação acreditamos ser possível transformar a escola e reverter o quadro hierarquizado. Palavras-chave: Participação. Negociação. Emancipação.

Introdução Este estudo tem por objetivo levantar possibilidades de uma proposta de participação dos alunos na definição dos conteúdos curriculares. Para atingir este fim escolhemos duas escolas de Ensino Médio, situado na Baixada Fluminense, onde foram entrevistados professores, na tentativa de se verificar espaços de participação e, sobretudo a ação democrática para planejar currículos, a partir de uma possível negociação entre professores e alunos. 467 Grupo de Estudo e Pesquisas em Política Educacional, Rio Claro, 06, 07 e 08 de julho de 2011 Vol. 3 (2011)

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Desde o início dos anos 1980, com a redemocratização da sociedade brasileira, foram iniciadas avaliações sobre a situação do ensino no Brasil. Nesta década, alguns estados nos quais governos populares venceram as eleições, os profissionais de ensino foram convocados para que analisassem o sistema e apresentassem sugestões que visassem sua melhoria. Ensaiavam-se as primeiras medidas de ―participação‖ de ordem política. Sabemos que a participação é o inicio dos primeiros passos para o exercício da democracia e, consequentemente, da cidadania. No entanto, não é só com a participação que se transforma um ser em cidadão, mas na sua verdadeira atuação nas etapas do planejamento, do desenvolvimento e da avaliação, em cada unidade escolar responsável pelo ensino de seus alunos. Dessa forma, cada unidade escolar necessita responsabilizar-se pela elaboração de seu projeto pedagógico e para tanto é necessário que cada professor precise ter seu próprio projeto pedagógico, conforme aponta Demo (2004, p. 69), no sentido de ensinar a seus alunos procurar viver em uma sociedade como a que se vive hoje, com tantos desafios, perplexidades e incertezas. Há muito já se enfatizava que ―a participação é um direito e uma necessidade, em princípio inquestionável que atravessa todo o processo educativo, o desejável dinamismo das instituições escolares‖ (SANCHES TORRADO, 1998, p.28) Para ensinar ou aplicar a metodologia da participação, o professor também precisa atuar em escolas democráticas, ser participativo e se sentir respeitado quando emitir suas sugestões e com ela se comprometer no alcance do objetivo definido. O professor necessita desenvolver autocrítica, ser reflexivo (SCHÖN, 2000). Esta autocrítica, esta reflexão dão suporte ao reconhecimento das tendências tradicionais (autoritárias) da educação brasileira e a subserviência do aluno, numa relação dominador-dominado, e a partir deste conhecimento, estabelece a necessidade de abrir caminhos que possam reduzir ou até, se possível, extinguir esta dominação para favorecer a participação do aluno numa parceria na busca de soluções dos problemas de aprendizagem, embora seja obrigatório seguir as Diretrizes Curriculares Nacionais: ―Linguagem, códigos e suas tecnologias; ciências da natureza; matemática e suas tecnologias; ciências humanas e suas tecnologias. As três áreas devem estar presentes na base nacional comum dos currículos das escolas do Ensino Médio‖ (DCNs, 1998, p.51).

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Apesar das escolas terem sua identidade de acordo com o seu meio social e clientela há um eixo comum que são as Diretrizes Nacionais, agregando diferentes saberes que são avaliados através de mecanismos nacionais como o Sistema de Avaliação da Educação Básica – SAEB, Exame Nacional do Ensino Médio – ENEM, com a função de diagnosticar e otimizar ou não do processo ensino-aprendizagem, ou seja, o nível de conhecimento de alunos. Nossa proposta de abrir espaços para a participação dos discentes na definição de matrizes curriculares, juntamente com os principais conteúdos a ser ministrados, ajudaria a desenvolver a análise do contexto e com isto, também a auxiliar no desenvolvimento da formação de educandos reflexivos, vivendo e convivendo em uma escola reflexiva definida como: ―uma organização escolar que continuadamente se pensa a si própria, na sua missão social e na sua organização, e se confronta com o desenrolar de sua atividade em um processo heurístico simultaneamente avaliativo e formativo‖ (ALARCÃO, 2002, p. 25), nesse sentido, aptos a viverem em sociedade e a colaborar com as suas transformações. Para que tais propostas sejam alcançadas é necessário estabelecer parcerias com os discentes e, desta forma, compartilhar a definição dos conteúdos de acordo com os interesses, relacionados aos problemas de sua realidade social, bem como identificar suas necessidades futuras, como por exemplo, na hora de se escolher sua profissão, motivo de muitas idas e vindas no ensino. Alunos optam por profissões e não sabem das exigências específicas e dos conhecimentos básicos necessários a seu exercício, causando muitas frustrações na vida acadêmica e evasões de cursos. Educação e Desenvolvimento Humano Educação, sem dúvida, contribui para o desenvolvimento humano, sendo que sua maior importância está em ser instrumento de desenvolvimento tanto para o indivíduo como para o país, conforme vem sendo destacado em todas as entrevistas que tratam do assunto, em várias mídias, pois diversos sociólogos e economistas declaram que um dos maiores problemas do Brasil é a educação, além da segurança, obviamente. No entanto, além de ser necessário tratar a educação como prioridade da vontade política dos governantes, é preciso salientar que o espírito da democracia também necessita ser praticado para ajustar-se aos novos paradigmas da globalização. De um modo geral, o professor passa a ter papel fundamental no momento do exercício profissional. É este que detém a fórmula de pôr em prática, na sala de aula, 469 Grupo de Estudo e Pesquisas em Política Educacional, Rio Claro, 06, 07 e 08 de julho de 2011 Vol. 3 (2011)

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por meio de oportunidades de participação de seus alunos, o aprendizado, do respeito às diferenças, o saber ouvir os contrários. No entanto, sabemos que o professor, ao longo do curso de nossa história, vem desempenhando um papel centralizador das decisões administrativas pedagógicas, principalmente no que se referem ao planejamento escolar, quando estabelece os conteúdos, as metodologias e as avaliações. Precisamos dividir estas responsabilidades, incluindo a participação do aluno nas etapas anteriores e também no desenvolvimento das atividades da sala de aula. Para definir participação como metodologia importante no encaminhamento das diretrizes das ações, utilizamos a seguinte assertiva: ―na verdade, educação que não leva à participação já nisto visto é deseducação, porque consagre estruturas impositivas e imperialistas, transformando o educador manipulador em figura central do fenômeno, em vez de elevar o educando ao centro de referência‖ (DEMO, 1996, p.77). É este o professor necessário, aquele que tenta desequilibrar as estruturas impositivas, dando oportunidades de participação para seus alunos, num diálogo franco, apresentando conteúdos definidos a priori que podem vir, como sabemos, estabelecidos por órgãos superiores ou selecionados a critério do professor com base no diagnóstico dos conteúdos adquiridos pelos alunos, nos anos anteriores e por meio do diálogo: ―quem dialoga, dialoga com alguém sobre alguma coisa. Esta alguma coisa deveria ser o novo conteúdos programático da educação‖ (Freire, 1983, p.108), tente negociar o que ensinar, ou seja, o que é mais importante a ser ensinado, conforme a afirmação: ―capazes de se tornarem os processos de ensino-aprendizagem mais significativos e atraentes para os alunos, de garantirem a promoção das especificidades locais e de estimularem uma autêntica vivência democrática‖ (MORGADO e FERREIRA, 2006, p.69). Ressaltamos que, considerando ser objeto deste estudo o educador democrático para planejar com a participação dos alunos, este levaria em conta o diagnóstico dos conhecimentos adquiridos anteriormente, para negociar os conteúdos mais necessários, em parceria com os alunos. ―negociação entre professores e alunos é importante porque acarreta o compromisso mútuo, dentro do qual a participação passa a ser metodologia fundamental‖ (DEMO, 1993, p.77). Desta forma, participação como metodologia dentro do espaço da sala-de-aula, favorecendo viver e formar o futuro cidadão a partir do exercício da democracia, 470 Grupo de Estudo e Pesquisas em Política Educacional, Rio Claro, 06, 07 e 08 de julho de 2011 Vol. 3 (2011)

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ressaltando [..]as questões essenciais da igualdade, da liberdade e da democracia, ela acaba por ser um outro nome da educação, de uma boa educação. (Estevão, 2009:8). Deste modo, a sala de aula passa a ser um espaço onde a participação se faz presente em toda tomada de decisão, e também facilita experimentar a emoção que a democracia traz. O Cenário da pesquisa Foram entrevistados quarenta docentes de turmas do Ensino Médio, sendo 20 de cada unidade escolar da Baixada Fluminense. Uma dessas unidades pertence à rede particular e outra, faz parte da rede pública estadual. Ambas foram escolhidas como objeto de estudo porque refletem a priori realidades distintas: a primeira, além de reunir docentes contratados sob a égide da CLT, os docentes estão sempre na expectativa de perder o emprego, submetidos à cobrança instituída na rede particular, pois sabemos das pressões para atualização, aperfeiçoamento e resultados positivos. Na segunda, predominam docentes estatutários, com estabilidade, onde em princípio não se observa nenhum mecanismo determinante de pressão para a busca de novas experiências, seja por incentivo financeiro, material ou profissional, a não ser o compromisso assumido quando da formação e da vida na profissão, incluindo valores. Os referidos professores das duas unidades distintas atuam em cursos diferentes para se observar a diferença entre os que professoram e um curso técnico profissionalizante e os de um curso pedagógico, no que se refere à própria influência da formação dos docentes. A direção da escola particular era empossada por indicação e possui unidade particular possui organização curricular com os respectivos programas, por disciplinas planejadas por professores sob a supervisão de uma orientadora pedagógica. Tentaram implantar a interdisciplinaridade por meio de projetos organizados em reuniões mensais. Nesta oportunidade, era possível trocar experiências que auxiliavam o processo ensinoaprendizagem. A avaliação era bimestral, entretanto não se detinha única e exclusivamente nas provas. Havia testes, trabalhos individuais e em grupos, todos considerados no resultado final, após o Conselho de Classe quando havia espaço para alunos, num determinado horário da agenda, o aluno apresentava as questões relevantes da turma que representava, logo após se retirava para que os professores pudessem tecer as 471 Grupo de Estudo e Pesquisas em Política Educacional, Rio Claro, 06, 07 e 08 de julho de 2011 Vol. 3 (2011)

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considerações e buscassem as possíveis soluções, no coletivo, para os problemas apresentados. A administração da unidade pública é eleita pela comunidade escolar de acordo com as diretrizes emanadas pela SEEDUC/RJ Resolução nº 2659 de 19 de abril de 2004, onde estabelece os procedimentos de consulta para indicação de diretores de Unidades Escolares da Rede Pública Estadual, tendo em vista a necessidade da efetiva transparência dos mecanismos administrativos, financeiros e pedagógicos das unidades escolares inclusive a gestão participativa da respectiva Comunidade Escolar nos mencionado mecanismo. A organização curricular é feita por disciplinas, obedecendo também as Diretrizes Curriculares Nacionais para o Ensino Médio, mas nesta unidade os professores procuravam trabalhar em conjunto, segundo orientações superiores por meio de projetos interdisciplinares e o diálogo entre as disciplinas, facilitando a tarefa de planejar, desenvolver e avaliar. A avaliação do rendimento dos alunos era efetuada bimestralmente, considerando todas as atividades realizadas pelos alunos diariamente, como testes, trabalhos de grupos e individuais, participação no desenvolvimento do processo ensinoaprendizagem etc. Os conselhos de classe bimestrais também incluíam o aluno representante de turma, orientado e acompanhado pelo professor representante que também é eleito do mesmo modo que o aluno. O aluno representante apresentava as observações e sugestões da turma para posterior comentário e soluções do coletivo de professores, feitas após a retirada dos alunos.

Análise e interpretação das entrevistas realizadas com os professores No processo de diagnose da seleção de conteúdos e de delineamento da percepção do professor, no quotidiano escolar, a respeito da participação do aluno no processo de seleção de conteúdos, foram realizadas entrevistas semi-estruturadas com questões abertas para que os docentes respondessem e, desse modo, viabilizasse a análise qualitativa dos dados. Após, realizar as entrevistas transcrevê-las para analisálas, utilizamos como referência a análise de conteúdos de Bardin (2007), possibilitando destacar ―unidades de sentido‖ das respostas obtidas, e apresentá-las em ordem decrescentes de freqüência. Ressaltamos, porém, que muitas respostas foram longas, 472 Grupo de Estudo e Pesquisas em Política Educacional, Rio Claro, 06, 07 e 08 de julho de 2011 Vol. 3 (2011)

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pois os professores faziam questão de descrever conteúdos ministrados e metodologias utilizadas, além de no presente artigo citarmos somente as mais citadas ou as que mesmo sendo minoria foi considerada como expressiva. Para levantar a metodologia utilizada na seleção de conteúdos, a maioria dos professores da escola particular (A) respondeu que seleciona o conteúdo a ser ministrado (6) e na rede pública, informaram que era pela especialista da área (6), ou pela equipe pedagógica (6), porém queremos chamar a atenção para entrevistados da Escola particular que respondeu: - A seleção de conteúdos na nossa escola é feita da seguinte maneira: nos pegamos o livro e fazemos o planejamento de acordo com a série que trabalhamos. Da escola pública (B), outro respondeu: - É a equipe pedagógica, agora e eu não sei o critério que ela usa para fazer a seleção de conteúdos (sic). Nestas duas exposições, fica clara a falta de participação dos alunos numa decisão de suma importância no processo ensino-aprendizagem, e que possibilitaria o comprometimento tanto do professor quanto do aluno na aprendizagem. Para detectar como o professor vê a contribuição do aluno na seleção de conteúdos, na escola (A) a maioria respondeu que desde que parta da sua realidade (8) ou o aluno não tem condições de participar (8) e na escola (B), a maioria respondeu que deve ser feita pelo professor sem contribuição do aluno (10); outros criticaram os planejamentos que são feitos e as seleções de conteúdos sem conhecimento da realidade do aluno (4). Uma professora da escola particular reforça o uso do sumário do livro didático para a seleção dos conteúdos: - Em minha opinião o aluno não contribui na seleção de conteúdos, ele aceita como uma coisa imposta, como o professor também passa os conteúdos e não seleciona esse conteúdo. Ele vem com o livro, segue-se um livro adotado, um livro didático e daí o conteúdo é o livro.

E para esta questão, na escola pública um professor disse o seguinte: - Eu não vejo porque não existe, os alunos não têm, como vou dizer, não têm, não sabem o que vão estudar [..] nosso aluno

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hoje está tão deficiente de conteúdos que ele não sabe o que vai estudar.(sic)

Para a questão da possibilidade de se prever a participação do aluno no processo, na escola (A) os professores informaram que os alunos participaram na sala desenvolvendo as atividades (6) ou nunca pensaram nesta participação (6). Na escola (B), muitos responderam que não há condições de contribuições por parte do aluno, consequentemente não há condição de previsão (6), mas houve (2) que destacaram que seria necessário para a formação da cidadania, (2) que disseram que facilitaria formar profissionais competentes e (2) que destacaram que poderia resolver dificuldades pedagógicas anteriores. Para a questão, quais as oportunidades que os alunos teriam para fazer críticas aos conteúdos definidos e as metodologias utilizadas, os professores da escola (A) responderam o seguinte: não há oportunidade devido ao conteúdo extenso a ser dado pela falta de tempo (6); ao final de cada capitulo de livro (4) e nunca é dado, mas ele cria o espaço (4), no entanto (2) informaram que todas as oportunidades por ser a sala de aula um espaço democrático. Na escola (B), reinformaram que ao final do bimestre (6) e todo o tempo (6). Na escola (A) o número de ―unidade de sentido‖ de não dar oportunidades é superior mesmo quando se pode destacar o seguinte depoimento favorável: - Todas as oportunidades porque eu tenho a sala de aula como uma casa democrática, sabia? Eu acho que o espaço mais democrático que, como é que se diria que eu convivo, é justamente a sala de aula..

Por outro lado, nesta mesma escola, destacamos o seguinte depoimento: - Eu não dou oportunidade nenhuma. Assim como eu não tenho oportunidade nenhuma de decidir a seleção de conteúdos. Na escola (B), permanecem as oportunidades todo o tempo ou ao final do bimestre, mas podemos destacar uma preocupação que aparece na seguinte resposta: - Todas, desde que ele queria falar. Agora , o problema é fazer o aluno falar. O aluno em princípio, ele tem medo de fazer críticas, ele tem medo de fazer sugestões, mesmo quando o 474 Grupo de Estudo e Pesquisas em Política Educacional, Rio Claro, 06, 07 e 08 de julho de 2011 Vol. 3 (2011)

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professor senta diante dele e diga: - fala, faça sua crítica, faça sua sugestão. Como é que podemos caminhar melhor, que podemos modificar o que podemos transformar? Ele se cala, porque ele aprendeu a se calar, não é? Durante toda a sua vida, o processo foi este: - Senta! Cala a boca! Atenção! Ouve! E assim sucessivamente, então...

Para a questão proposta por este estudo, diante das divergências entre professor/aluno é possível utilizar uma negociação? De que forma? Na escola (A) os professores responderam ser possível por meio da realidade do aluno e da necessidade do contexto (6) e é possível usando-se o diálogo (4). Na escola (B), informaram ser possível com o diálogo (10) e sempre é possível (6). Observamos que a maioria dos professores respondeu que é possível desde que se leve em conta a realidade do aluno e a necessidade do contexto para resolver a divergência entre professor e aluno, que a melhor forma de se começar a trabalhar a negociação seria por meio do diálogo, conforme os seguintes depoimentos da escola (A): - É possível, aí no caso é questão de nos dialogarmos. É a questão do diálogo. - É possível, não sei ainda, tá? A gente pode começar a estudar isso, mas eu creio que sim, não totalmente cem por cento mas eu acho que pelo menos cinquenta por cento a gente pode negociar, tá? Destacamos nas falas, acima, a necessidade de atualização e receio de negociar todo o conteúdo proposto no desenvolvimento curricular, embora a escola (B) tenha apresentado um encaminhamento mais democrático no relacionamento professor, aluno, um professor apresentou o seguinte depoimento para esta questão: - Sim, acho que se surgir uma divergência, eu acho que a gente sempre negocia se surgir. De uma forma geral, a divergência, eu sinto muito, mas a divergências é resolvida no “cala boca!” Eu acho que sim, é duro dizer isso, ainda mais gravando. Eu não sei o professor, ele hoje, se sente muito ameaçado. O 475 Grupo de Estudo e Pesquisas em Política Educacional, Rio Claro, 06, 07 e 08 de julho de 2011 Vol. 3 (2011)

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professor hoje tem tão pouco conteúdo para passar para o aluno, que ele escolhe o conteúdo mais difícil e dá, e aí o aluno fica assustado com aquilo e não pergunta nada. O cala a boca citado na fala pode ser entendido como insegurança do professor em resolver conflitos e até problemas do domínio de conteúdos. Acreditamos que seja por falta de preparo durante a sua formação. Os cursos não estão adequados às novas necessidades da situação educacional, na atualidade. Não preparam o docente para enfrentar os jovens de uma sociedade em permanente mudança, num quadro de avanço científico e tecnológico desenfreado. É preciso que os cursos de formação de professores apresentem um modelo mais flexível, visando incluir a participação desse futuro professor nas decisões acadêmicas e pedagógicas, propiciando um espaço de diálogo aberto para que ele possa emancipar-se e no exercício da docência, abrindo espaços para desenvolver a responsabilidade de avaliar, de aprender, e de trabalhar em grupo e também de dialogar com seus pais.

Considerações Finais A sociedade passa por um processo de transformação, a escola precisa estar atenta para tentar acompanhar. Para que elas mudem, há necessidade da contribuição dos cidadãos conscientes que participem da solução de seus desafios. Para tanto, a escola precisa mudar. Esta mudança exige a participação de todos os interessados e que sofrem com as decisões arbitrárias. Não há como se trabalhar com decisões autoritárias porque ―mais do que nunca somente é aceitável o que é discutível‖ (DEMO, 1998, p.102). Neste estudo, pode-se considerar que na seleção de conteúdos, o professor muitas vezes não participa ou define sozinho, quando não segue rigorosamente o sumário do livro didático adotado, que embora seja escolhido por ele não deve ser a única alternativa de conteúdos e de ações para o desenvolvimento do processo ensinoaprendizagem. Se o professor não participa, como incluir o aluno?. Quanto a aceitar que os alunos façam críticas aos conteúdos, a maioria informa que não pode dar oportunidades devido ao extenso conteúdo a ser dado e a falta de tempo para fazê-lo, só no final do bimestre, quando os problemas do quotidiano já foram esquecidos, a não ser os mais marcantes, na resposta: 476 Grupo de Estudo e Pesquisas em Política Educacional, Rio Claro, 06, 07 e 08 de julho de 2011 Vol. 3 (2011)

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Todo tempo (grifo nosso), significa na realidade perguntar após exposição oral se os alunos entenderam ou não o conteúdo, ninguém se manifesta, como é comum, (por medo ou inibição), continua-se o assunto e não se sabe realmente o que foi aprendido. Percebemos, durante as entrevistas, a falha na formação de docentes. Ela precisa ser revista, e que nela, o futuro professor possa participar do planejamento do curso, desenvolvimento e avaliação, por meio da negociação, só assim será possível transformar a escola, experimentado uma prática vivida. A negociação favorecerá o diálogo aberto. Com o diálogo será possível reverter este quadro hierarquizado e uma prática tradicional, somente esta mudança poderá favorecer o alcance dos objetivos pois contará com o esforço de cada um. Outro aspecto importante é a atualização permanente dos docentes. É necessário voltar a estudar, para aqueles que estão distantes dos bancos escolares e continuar a estudar para aqueles que não se esquecem que a ciência e a tecnologia avançam assustadoramente. Se a escola for aprazível, com conteúdos significativos, definidos com a participação dos alunos, provavelmente o compromisso mútuo facilitará o processo ensino-aprendizagem. Incluímos na afirmativa que a participação efetiva do aluno, do maior número possível de representantes da comunidade escolar, para negociar uma melhor qualidade de ensino contribuirá para a formação de um cidadão mais humano e menos violento dentro da sociedade em que vivemos. Para finalizar, citamos a afirmação de um professor da escola B – pública – que ratifica a Pedagogia da Esperança de Paulo Freire (1998), quando lhe fora perguntado qual a previsão da participação do aluno no processo de definição dos conteúdos curriculares, disse: - não digo nem previsão, eu trocaria previsão por esperança. Esperança por uma escola melhor, pelo respeito mútuo entre professores e alunos. Esperança por um mundo melhor, mais feliz que é o sonho da humanidade: a paz e a felicidade.

Referências bibliográficas ALARCÃO, I. (Org.). Escola reflexiva e nova racionalidade. Porto Alegre: Artmed, 2001. BARDIN, L. Análise de conteúdo. Lisboa/Portugal: Edições 70, 2009. 477 Grupo de Estudo e Pesquisas em Política Educacional, Rio Claro, 06, 07 e 08 de julho de 2011 Vol. 3 (2011)

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Eixo 3 – Reformas educacionais e controle social da educação

CONSELHOS MUNICIPAIS DE EDUCAÇÃO E O DESAFIO DA CONSTRUÇÃO DEMOCRÁTICA: UM ESTUDO SOBRE CASTANHAL-PA

Lindomal dos Santos Ferreira [email protected] UNISINOS-RS

Resumo: Este texto propõe uma análise sobre a participação política do Conselho Municipal de Educação/CME de Castanhal-PA, tendo como universo o depoimento de 6 conselheiros. Buscou-se identificar dimensões conexas à participação: a dimensão da participação política; da participação no CME e; da cultura política. Um conjunto de fontes primárias originais levantadas possibilitou o entendimento do seu papel. O objetivo é entender como esses conselheiros vivenciam e percebem a participação política. Palavras-chave: Conselhos Municipais de Educação; Participação e; Cultura Política.

A situação que gerou esta investigação No Brasil, a história dos conselhos de educação está na origem do Estado quando ainda se conformava como Império (TEIXEIRA, 2004, p. 693), mas é na década de 1980 que seu papel vai se associar à ideia da participação social, reconhecida constitucionalmente como base para a soberania e a cidadania (SANTOS JR, 2000, p. 206). De fato, a constituição de 1988 coroa um processo histórico de constantes lutas em torno da descentralização das estruturas de poder da sociedade brasileira. A saída do regime de exceção, construída pela intensa mobilização social e traduzida pela ação dos movimentos sociais redundou no fortalecimento da instância estadual e municipal como dimensões autônomas da administração estatal e, dessa forma, encontrou nos conselhos de controle social a principal estratégia para a participação na administração pública.

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Os CME´s foram instituídos no conjunto de medidas que visam estruturar o sistema educacional brasileiro, especificamente os sistemas municipais de ensino, o que se deu absorvendo a experiência das estratégias de participação social advinda da própria sociedade, como é o caso da União dos Conselhos Municipais de Educação/UNCME. Com as diretrizes da educação nacional (LEI, 1996) aumentam as possibilidades para a consolidação dos Sistemas Municipais de Ensino, para os quais esses conselhos têm importância fundamental como instrumento de ligação entre a sociedade civil e o Estado para a gestão da política educacional. Alguns autores que se dedicam à compreensão do papel desses conselhos têm enfatizado sua importância no êxito da política educacional local, o que se tem confundido com a própria gestão (FERREIRA, 2001, p. 306; BORDIGNON; GRACINDO, 2001, p. 165), por representarem inovação institucional nas políticas sociais (SANTOS JR, 2000: 209-10) e de sua importância na organização dos sistemas de ensino locais (TEIXEIRA, 2004, p. 693). Essa virtualidade54 dos CME`s constitui problemática na medida em que não se tem um exaustivo estudo sobre os condicionantes da participação social em suas variadas dimensões: dos conselhos para a sociedade e vice versa; sobre os conselheiros, dos conselhos na política municipal, etc. Tomando-se como referência a Emenda Constitucional 14/96 (BRASIL, 1996), o Fundo de Manutenção e Desenvolvimento do Ensino Fundamental e Valorização do Magistério/FUNDEF (Idem), as diretrizes orçamentárias para a educação nos Estados, Distrito Federal e Municípios bem como das condições de sua administração e controle social previstas, os municípios brasileiros passaram a dispor das condições institucionais necessárias para o gerenciamento da política educacional. Do caráter representativo e reivindicativo que tinham no interior da UNCME em 1992, a partir de 2003, com a criação do Pró-Conselho (Programa Nacional de Capacitação de Conselheiros Municipais de Educação) os CME`s passaram a ter papéis novos, com funções institucionais para o conjunto da política educacional: caráter normativo, deliberativo, consultivo e fiscalizador. Contrastam, porém, declarações dos professores bem como das entidades que fazem o controle social, como sindicatos, conselhos 54

S.f. Qualidade ou caráter de virtual; Virtual. [Do lat. Escolástico virtuale.] Adj. 2 g. 1. que existe como faculdade, porém sem exercício ou efeito atual. 2. Suscetível de se realizar; potencial. 3. Filos. Diz-se do que está predeterminado e contém todas as condições essenciais à sua realização. [Opõe-se potencial e atual] ~ V. imagem – e trabalho -. (FERREIRA, 1975).

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escolares e mesmo os próprios administradores quanto as dificuldades de sua implementação. Esta contradição, protagonizada pela sociedade e o próprio Estado em disputa se evidencia na crise institucional dos mecanismos normativos e políticos de fortalecimento do sistema educacional e dos processos de descentralização estatal instituídos constitucionalmente. Na contemporaneidade, embora predominem as formas institucionais da democracia representativa, a correlata ideia de participação é o que tem validado de fato as experiências democráticas. Neste texto a pergunta orientadora segue a seguinte indagação. Como a participação nos/dos CME‘s está relacionada com as respectivas culturas políticas locais e de que formas podem contribuir para o a democratização da sociedade através de sua atuação nos sistemas municipais de ensino? A participação popular é um aspecto que qualifica os CME‘s, e, tem-se acreditado guardar relações com o grau de democracia dos municípios. Contudo, se pode indagar: Municípios mais democráticos e participativos tendem a ter CME´s? Pode um CME apresentar um perfil participativo num cenário de práticas autoritárias e mandonistas? O caráter democrático e participativo pode ser caracterizado tão somente pelos contornos de sua composição e representação? Pode-se questionar também se a adoção desses CME‘s contribui para maiores níveis de participação ou se a tendência seja a de que possa estar subsumido ao poder do executivo local ou, ainda, se sua ação constitui possibilidade real de qualidade para as políticas públicas educacionais, normatizando uma democracia deliberativa? O reconhecimento da participação social mediante a existência dos CME‘s pode não estar completa até que se tenha acesso à dinâmica das relações nem sempre perceptíveis pela observação desprevenida e que exprimam o que é próprio ao seu cotidiano; do governo local e dos vários setores da sociedade (gestores escolares, famílias, instituições civis públicas governamentais ou não, setor produtivo, igrejas, entre outros) bem como das relações sociais estabelecidas. Dessa forma, a participação social pode assumir traços e/ou perfis próprios, resultado das condições culturais e políticas preexistentes.

Participação e CME`s: construindo um entendimento Em um cenário em que a participação social vem sendo promovida pelo Estado, movimentos sociais e pelos meios de comunicação, como um componente importante 481 Grupo de Estudo e Pesquisas em Política Educacional, Rio Claro, 06, 07 e 08 de julho de 2011 Vol. 3 (2011)

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para o sucesso das políticas públicas, especialmente das estatais, fica evidente a necessidade da construção de uma esfera pública na qual haja equilíbrio entre as demandas da sociedade civil e a ação estatal e governamental. Nesse contexto, a comum realidade é que a mesma tem se afeiçoado às variações do sistema socioeconômico refletindo uma histórica tradição política voltada mais para excluir do que incluir. O projeto colonial português para o Brasil fundou-se com uma base excluída de europeus e negros escravos e avançou com a exclusão progressiva da população índia nativa. As formas de poder resultantes das relações políticas, econômicas e sociais estabelecidas no Brasil-colônia até a primeira República, descritas nos estudos de Gilberto Freyre (FREYRE, 1973), Sérgio Buarque de Holanda (HOLANDA, 1984) e Teresa Sales (SALES, 1994, p. 01), nos levam a refletir sobre a permanência das relações de mando e subserviência na democracia brasileira, influenciando nas formas atuais da cidadania. Conceitos como ―Democracia racial‖ e ―homem cordial‖ de Freyre e Holanda fundem-se e dão origem ao que Teresa Sales nomina de ―Cidadania concedida‖. De acordo com esta autora, cultura política diferencia-se do enfoque em geral adotado nos estudos sobre cultura política e democracia, uma vez que a mesma está como ―uma espécie de cimento das relações de mando e subserviência, base que fornece as condições para a continuidade de tais relações, por sua vez associadas à cultura da dádiva”, o que sugere, neste caso, que a construção democrática deve estar associada à cultura e à política local. Traços de participação política popular só apareceram por volta do período republicano no final do século XIX como subsidiária de um processo de construção de nação no qual à educação caberia elevar a ―qualidade‖ do povo, ―tornando-o mais cordial”. Esta tensão entre Estado e Sociedade tem atravessado a história política brasileira, em que a esfera pública assemelha-se a uma arena, onde grupos em disputa lutam pelos seus interesses, muitas vezes burlando as regras e instrumentos de mediação. Este debate remonta ao segundo após guerra, onde Arendt (BACH, 2006) problematiza o papel do Estado Nação como provedor da democracia. Para ela, a condição dos direitos estabelecidos até então pelas grandes revoluções bem como pelos acordos de paz entre as nações se demonstraram ineficazes quando não vinculados a uma condição de cidadania. Os apátridas, como refere a mesma autora, ou sem nacionalidade, fora da filiação a um Estado, eram tidos como sem direitos. Em meio a 482 Grupo de Estudo e Pesquisas em Política Educacional, Rio Claro, 06, 07 e 08 de julho de 2011 Vol. 3 (2011)

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essa fundamental constatação de que a sociedade deveria resgatar a dimensão pública, Arendt propõe o conselho como uma modalidade de organização popular para enfrentar o governo, gestor por excelência do espaço público (ARATO; COHEN, 2002), como forma de garantir a participação, o direito de assembleia, base sobre a qual todos os direitos se assentam, portanto, de um direito fundamental. Na contemporaneidade, a vitalidade das gestões governamentais tem importado maior participação social. Contudo, apesar da disponibilidade dos mecanismos institucionais destinados à inclusão social, não há, na ação dos governos, predomínio de um perfil democrático-participativo. Essa necessidade de se pensar a democracia moderna tem evidenciado a crise de legitimidade do Estado bem como do papel do indivíduo, do cidadão. Aspecto que, em Rousseau (Idem, 2002, p. 47) torna-se importante, sobretudo porque traduz arquetipicamente a crise da democracia moderna, ou seja, reúne o aspecto coletivo e individual numa dialética em que o bom Estado depende da ação do cidadão, da boa relação que estabelecem entre si. Dessa forma, a participação beneficia não só o Estado, mas o próprio indivíduo, o qual, ao tempo em que constrói para si o bom Estado, obtém, no processo, como enfatiza Gohn (2001), uma visão ampla e objetiva do sistema social do qual faz parte No Brasil, no presente, permanecem fortes traços da exclusão política perpetuando velhas e novas elites que governam e/ou atuam em oposição aos setores organizados da sociedade. Estes, por sua vez, continuamente redefinem suas identidades na conquista de uma esfera pública mais ampliada. Nesse sentido, a ideia de que a gestão dos instrumentos da participação seja compatível com um controle político em última instância exercido pelo Estado, pode estar representando a alienação da participação de seus atores originais, o que pode ser evidenciado não apenas pelo fosso presente entre o discurso e a prática das políticas públicas, mas, pela parcialidade com que esses CME‘s tem operado face aos governos e grupos de interesse. Embora o discurso institucional indique os CME‘s como promotores da participação popular, seria essa a expectativa dos conselhos? Quais os traços participativo-democráticos que os diferenciam de seus governos locais e em últimas instancia do próprio Estado brasileiro?

Local de Pesquisa: Castanhal e o CME.

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A ideia de que as formas de organização política presentes nos CME‘s podem ter sua origem nas formas de organização política e cultural onde emergem, demandou o rebuscamento das origens de Castanhal no século XVII quando a região norte do Brasil fora ocupada por grandes levas de migrantes. Seja pela procura voluntária de terras ou pelo estímulo quase compulsório das políticas de colonização e ocupação da Amazônia, sua origem está associada ao processo de colonização da região Bragantina no nordeste do Pará e da construção da Estrada de Ferro de Bragança, empreendimentos que tinham como objetivos a consolidação da produção agrícola, bem como do seu correspondente escoamento para a capital Belém, situada a 60 km de Castanhal. O processo de municipalização da região de Castanhal surge por volta de 1920 com a emergência do Movimento Municipalista e foi marcado pelos recorrentes expedientes políticos do então governo que tinha como objetivo o controle da receita financeira advinda da produção agrícola local. Aliás, fazia parte da estratégia populista do governo Magalhães Barata nos anos 1940, a criação/extinção de municípios como forma de angariar colaboração de grupos políticos na forma de apoio eleitoral (MENEZES, 2006, p. 28). Contudo, com o passar do tempo, sua privilegiada localização (SIQUEIRA, 2008, p. 99), concorreu para sua consolidação como expressivo polo comercial regional. As referências à existência do CME (n.c., 2010) remontam à década de 1990. Nesse período as discussões relativas à educação municipal se faziam na Associação dos Professores de Castanhal/APC, e giravam em torno da associação dos professores, processo que deu origem ao sindicato docente local: o Sintepp, pois nessa década a carreira do magistério municipal estava se estruturando, inclusive com o planejamento dos primeiros concursos públicos. A trajetória desse CME compreende duas fases: a primeira: da sua criação legal, caracterizada pela homologação da legislação bem como da indicação da primeira diretoria e; a segunda: do seu funcionamento prioritariamente dito. Na primeira fase, este CME permanece apenas como expediente legal, vindo a funcionar após uma reforma legal e a posse da diretoria, a mesma indicada ainda na primeira fase. Criado em 1992 (LEI MUNICIPAL, 1992), este CME passou a funcionar em 1998 na gestão do prefeito Paulo Titan, o qual nomeou (DECRETO MUNICIPAL, 1998) os conselheiros para sua primeira gestão. Nesse processo, foi constituída sua estruturação e funcionamento: a criação das Câmaras de Legislação e Normas, 484 Grupo de Estudo e Pesquisas em Política Educacional, Rio Claro, 06, 07 e 08 de julho de 2011 Vol. 3 (2011)

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Planejamento e Avaliação e, de Educação (RESOLUÇÃO, 1998) bem como a definição e composição das funções do Presidente e dos seus membros. Deliberou-se ainda sobre a eleição dos conselheiros, que passaram a ser escolhidos na própria categoria representada (LEI MUNICIPAL, 1999), à época, redes de escolas estaduais e municipais, ensino público federal (Campus universitário local) e escolas particulares; suas atribuições e competências. Com essas mudanças, a competência do CME passou a ser mais técnica ―autorizar, credenciar e supervisionar os estabelecimentos de ensino do seu sistema de ensino‖, e a sua composição passou para oito membros titulares/suplentes: três indicados pelo Executivo, sendo um deles membro nato (Secretário de Educação) e cinco das demais categorias: rede municipal (um docente); rede estadual (um docente); rede particular (um docente); conselho da Criança e do Adolescente (um) e; representante de pais de alunos (um). Estes dois, dispensados de comprovação da experiência mínima de três anos em educação exigida legalmente. Uma média de 25 conselheiros tem se mantido nas sucessivas gestões desse CME, numa estratégia de revezamento político que tem garantido a permanência das tendências políticas partidárias locais nas representações das categorias que o compõem. A primeira fase de sua trajetória não previa a participação da sociedade, uma vez que todos os seus membros eram indicados pelo executivo, já, na segunda fase, há uma abertura à participação entendida como representação das escolas da rede municipal de ensino. As eleições, no interior das categorias, possibilitaram a inclusão de novos conselheiros, embora os mesmos setores políticos (Executivo, partidos de oposição e entidades representativas) se articulem na conquista desses espaços.

Identidade, ação e representação do/no CME: Esta sessão resulta dos dados colhidos em campo. Sintetiza aspectos relativos à origem dos conselheiros, da forma de sua participação bem como da percepção que alimentam em relação ao CME. O uso dessas informações está associado a pseudônimos (Medéia, Leucipo, Lisístrata, Antígona, Teodósio, Zenão) com o intuito de preservar a identidade dos entrevistados.

Conselheiros, quem são.

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A origem dos conselheiros assemelha-se à história do próprio município. Suas trajetórias familiares e pessoais revelam vidas que se fundam num passado remoto e comum da promissora região bragantina bem como do surgimento da cidade de Castanhal, lugar onde esses conselheiros viveram sua infância e adolescência e, na fase adulta, se realizam profissionalmente. Este perfil relativamente comum exibe o casamento como traço de quase todos os membros, na atualidade com filhos e idades entre 52 a 73 anos. Invariavelmente a origem étnica e cultural está associada ao povo nordestino dos estados do Ceará e Bahia, ou do norte, do Pará ou Amazonas. Figura como traço produtivo dos ascendentes familiares, o exercício da pequena produção rural, o funcionalismo público, a prática de vendas, ou de prestação de serviços em pequenas indústrias de serviços, como o beneficiamento do arroz. Destacam-se ainda profissões e ofícios como: costureira, sapateiro, barbeiro, enfermagem, autônomo, doméstica ou ―do lar‖ como referem alguns conselheiros à ocupação das esposas. Invariavelmente o Catolicismo predomina como religião, sendo comum a participação militante em pastorais religiosas de temas variados, grupos de casais e, o exercício do diaconato, atividades comuns da Igreja Católica Apostólica Romana. A formação de nível superior em cursos de licenciatura ofertados por universidades particulares e estatais públicas é outro aspecto da formação acadêmica desses conselheiros, para a qual se destacam a ação da Universidade Federal do Pará/UFPA e a Universidade do Vale do Acaraú/UVA. Atualmente, a situação funcional desses conselheiros destaca o exercício na função de secretários de governo, técnicos em educação e na docência. Em alguns casos seus primeiros empregos ou ocupações revelam funções outras como: operariado, funções de apoio em serviços gerais, sindicalismo e feirante, sendo que o início da carreira escolar, em um caso, iniciou-se aos 20 anos, o qual curiosamente exerce função de secretario do governo municipal. Em outros casos, após aprovação em cursos supletivos iniciaram a carreira acadêmica.

Conselheiros: sobre sua participação política A compreensão de que as experiências pretéritas de participação política influenciam na prática cotidiana das pessoas é uma das ideias mestras neste trabalho na reflexão sobre a participação dos conselheiros no CME. Nesse sentido considerando que a dimensão da vida social é um aspecto da personalidade que está aberto à construção, é 486 Grupo de Estudo e Pesquisas em Política Educacional, Rio Claro, 06, 07 e 08 de julho de 2011 Vol. 3 (2011)

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possível compreender a experiência do CME como um espaço de encontros onde deságuam experiências diversas. Nesse sentido, desse cenário aparentemente ―caótico‖ podem emergir novas sínteses de experiências de participação. A fala dos conselheiros sobre participação, curiosamente revelou aspectos controvertidos sobre o tema. Os entrevistados se mostraram favoráveis à participação popular, contudo o desdobramento das respostas demonstrou que a mesma ―ta muito acanhada‖, que ―não é só importante mas, indispensável‖, outros destacaram a importância da ―família‖, que é importante para o ―crescimento do município‖ mas que ―tem que ser qualitativa‖ ou seja, como explica o entrevistado ―a participação popular não deve prescindir do conhecimento científico‖, que ―a gestão democrática tem desaguado num sistema de manipulação por parte dos grupos políticos (...) é uma retórica que esconde uma realidade‖ e ainda, que ―a participação para o controle social tá ficando no discurso e a prática não é apropriada e condizente com o que deveria ser”. Quando indagados sobre a participação popular no CME a questão se demonstrou ainda mais complexa. Antígona revela o lado positivo da participação, sem a qual não há andamento de nada, que ―o povo é quem constrói‖, que ―se a gente fosse consciente (...) nós poderíamos revolucionar‖, que o CME é um órgão ―fechado‖, que funciona só com representantes. Zenão questiona o popular referindo-se à formação por representação, que o CME deveria ter uma atuação maior, situação que é agravada porque a maioria dos conselheiros tem outra atividade profissional. Teodósio relata que a participação no CME é discutível e o insucesso da experiência de outros conselhos tá demonstrando essa realidade. Lisístrata, por outro lado, lembra que os conselheiros têm que dar satisfação do trabalho aos representados. Medéia relata que a participação traz a ―visão de fora‖, mas que há o lado positivo e negativo, que ―o popular só quer brigar e não ajuda quando necessário‖. Quanto às eleições do conselho, quando consideradas as alternativas Excelente, Bom e Insuficiente, um classificou o processo como insuficiente e, os demais, como bom ―Bom, ruim não é não, mas excelente também não é‖, que há pontos positivos e negativos, ―falhas e melhores‖ e, concluem que a mesma é insuficiente, se dá num ―espaço delimitado, e por um tempo muito curto e com horário definido‖ e, que poucos decidem, ―só os professores votam‖.

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Indagados sobre a administração municipal que mais aprovaram, todos afirmaram que a do mandato atual é a melhor e, justificaram referindo-se ao apoio dado pelo prefeito ao secretário de educação. Lisístrata considera que há diferença entre as vantagens da atual gestão municipal, dependendo da condição como servidora ou conselheira. Embora reconheça o trabalho do atual governo, Medéia destaca a importância de prefeitos anteriores, como Pedro Coelho da Mota e Almir Tavares Lima, contemporâneos seus da época em que atuava na gestão municipal, antes de se aposentar.

Conselheiros: o que pensam os conselheiros sobre o CME de Castanhal Esta sessão sintetiza o que pensam os conselheiros sobre o CME de Castanhal. Nela, estão as opiniões para as realizações mais significativas; os aspectos a melhorar; sobre sua autonomia, inclusive em relação ao executivo; o processo de construção das pautas bem como suas expectativas sobre elas. Dois aspectos sobressaem como realizações mais significativas do CME, quais sejam: a autorização das escolas municipais e o Plano Municipal de Educação em construção na atualidade. Aspectos como o ―desmembramento‖ do Conselho Estadual de Educação e o ―acatamento‖ do prefeito em relação às decisões desse mesmo conselho, sua atuação na realização dos primeiros concursos públicos municipais e o progressivo envolvimento da categoria dos professores a partir da ação do CME revela um cenário da participação em que o poder executivo tem papel decisivo. Leucipo argumenta que a autorização das escolas foi um passo importante para a democratização da educação no município, uma vez que resolveu problemas recorrentes dos alunos concluintes ―porque o aluno chega a se formar e às vezes, não tem o certificado”, daí a avaliação positiva da política de certificação escolar. Quanto ao aspecto a melhorar nesse CME ressalta-se a maior dedicação dos conselheiros, uma vez que os funcionários técnicos arcam com a maior parte do trabalho, o que vai ao encontro da opinião de Lisístrata, a qual argumenta que o conselheiro dispõe de pouco tempo para trabalhar. Como se pode concluir dessas opiniões o CME pode estar distante da sua base social como reafirma Leucipo quando diz que o conselho deve estar mais presente nas escolas do município. Para Teodósio, a autonomia financeira é o que dificulta sua autogestão.

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Quando se indagou sobre a autonomia do CME, os entrevistados se mostraram muito favoráveis, mas ao detalhar o processo de autonomização vivenciado, deixaram em aberto vários aspectos que, se analisados separadamente do contexto da fala destes conselheiros, podem levar a conclusões equivocadas, senão vejamos; a autonomia do CME foi compreendida por Zenão como a não interferência do governo nas ações do conselho, ou seja, que a autonomia pressupõe boa relação entre o conselho e o poder executivo, mas, ao mesmo tempo, que não haja interferência deste, ideia similar a de Lisístrata ao referir-se ao papel do executivo, ―Secretário não manda aqui não ...‖. Tanto Teodósio como Antígona consideram boa e positiva a autonomia do conselho, mas que a falta de orçamento é um aspecto limitante, o que corrobora o pensamento de Antígona quando diz que o CME ―tem autonomia de fala, de mando. De fato e de direito ainda não tem‖. Nesse aspecto, Leucipo tem mantido uma posição diferenciada dos demais conselheiros quando diz que ―É difícil até o cidadão dizer que é autônomo. Totalmente, a autonomia não existe‖. Com esta frase este depoente quer dizer que a autonomia do CME é boa e seu funcionamento é satisfatório advogando certo limite a ação do Conselho em relação ao executivo/governo. Medéia, conselheira com forte presença no CME desde a sua fundação, relata que houve muita dificuldade na relação entre o CME e o poder executivo ―no princípio nós tivemos muita dificuldade porque alguns achavam que deviam mandar mais do que o poder‖ e, conclui pela importância de uma postura menos conflituosa do conselho em relação ao executivo, mostrando-se pouco favorável à presença partidária, ―por isso que não é bom infiltrar política partidária dentro do conselho‖. Embora esses depoimentos pareçam meras opiniões individuais, de fato revelam tensões de posicionamentos políticos entre o governo local, partidos políticos e organizações tidas como populares. Nesse caso, o conjunto dos dados, aparentemente expressa um conflito de conteúdos sobre a democratização do/no conselho, mas que indica posições estratégicas que, em última instância recaem nas formas representativas da democracia como os partidos políticos, sindicatos e o executivo, revelando certo descrédito nas possibilidades da construção da participação política via CME.

Cultura Política e Participação Política dos Conselheiros Teoricamente, a cultura política pode ser compreendida pelo grau de interesse que o indivíduo apresenta em relação aos processos políticos na sociedade. Saber se o 489 Grupo de Estudo e Pesquisas em Política Educacional, Rio Claro, 06, 07 e 08 de julho de 2011 Vol. 3 (2011)

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interesse por política está associado à presença de trajetória política do conselheiro e, portanto, a uma maior participação no CME de Castanhal é uma questão a ser compreendida. Assim, nesta sessão o interesse por política, o engajamento eleitoral e a cultura política dos conselheiros se conjugam para revelar do seu desempenho político no interior do CME. Dos seis entrevistados, três dizem ter muito interesse por política, dois dizem não ter interesse e, um, pouco interesse; de maneira geral, as justificativas para essas posições revelam uma tendência de rejeição à forma político-partidária. Dos que apresentam muito interesse por política, um argumentou: ―Muitas vezes o que tem de ruim são os políticos‖, já os que se disseram não interessados em política, enfatizaram certo repúdio à forma partidária: ―dessa política partidária, dessa política, não me interesso‖, que estão céticos, ―desacreditada politicamente‖, como enfatiza Lisístrata. O conselheiro que manifestou pouco interesse diz que só ―acompanha o processo político‖. Quanto ao engajamento eleitoral e a ocorrência de participação política na última eleição para prefeito, todos os conselheiros expressaram interesse e até certo entusiasmo para a prática do voto, porém quanto à participação política (partidária), embora admitindo certo envolvimento, as críticas se mantiveram. Constata-se dessa forma que, dos que disseram ter muito interesse por política, dois tem larga experiência partidária, embora mantenham críticas ―que os partidos são todos iguais, que o que se escolhe é o candidato‖ e que ―quando os partidos entram no processo político a sua ideologia se perde‖. Com exceção de Medéia, Teodósio e Leucipo, os demais entrevistados admitem ter militância na política partidária, na prática de propaganda eleitoral em época de campanha, na frequência a comícios e, na prática de boca de urna. A prática política dos não interessados em política pode ser traduzida pela posição de espectador, ou seja, apenas acompanham o processo (assistindo propaganda eleitoral e, não participando como antes). A cultura política foi outro aspecto abordado e objetivou saber onde os conselheiros mais se deparam com discussões sobre política. Procurou-se identificar a opção de regime político para o país, os instrumentos que utilizam para alimentar sua cultura política, a capacidade de identificar o cenário político local, bem como a avaliação da sua atuação como conselheiro.

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Medéia, já aposentada, diz que as questões partidárias eram presentes na época em que estava no CME, mas que, hoje, não tem mais se deparado com essa situação. Leucipo declara que ―em todos os momentos‖ se defronta com a política, na escola, no bairro, Igreja e, até na relação com as pessoas. Lisístrata declara o CME como o espaço político mais importante porque lá se discute de tudo e cada um tem seu partido. Antígona relata que a escola é o espaço político fundamental, o meio em que se trabalha. Teodósio, por sua vez, diz que a época das campanhas e o cotidiano do trabalho são os espaços comuns da discussão política. Quanto ao regime político do país, todos se declararam de acordo com o regime democrático, mas que a democracia deve ser aperfeiçoada ―porque democracia demais prejudica‖ ou ―que ela não deve ser aberta demais, como estamos vendo hoje. O Brasil está bem economicamente, mas mal moralmente‖. Quanto aos instrumentos de estímulo à cultura política, embora nem todos os conselheiros tenham dado resposta à questão, foram citadas: televisão e propaganda eleitoral, jornais, revistas, horários políticos e o programa de rádio A Voz do Brasil como recursos usuais para se manterem informados sobre política. Um conselheiro apenas falou sobre as lideranças e tendências políticas, ressaltando que antes havia mais lideranças, hoje, porém, não há tantas. Lisístrata identifica que há muitos partidos, mas que isso não resulta em benefício ―o Democratas, o DEM, PMDB, PSDB, PR. Mas não entendo, porque quando vejo tá todo mundo junto (risos)‖ e critica os critérios meramente partidários de indicação para investidura em cargos públicos. Quanto à avaliação de sua atuação no CME apenas dois conselheiros fizeram comentários: um avaliou que fez um bom trabalho e outro o considera como um aprendizado muito forte.

CONCLUSÃO O que se apurou dessa observação preliminar revelou um tipo específico de participação na qual a cultura política resulta da mediação de características individuais, socioeconômicas, culturais e políticas, o qual conflui para uma performance bem singular desse conselho: boa produção técnica, ambiente extremamente politizado e compensador profissionalmente. Os depoimentos revelaram uma insatisfação ao tipo representativo de democracia que se organiza na forma partidária e que, embora o CME se destine à política no seu sentido mais amplo, não tem prescindido da forma 491 Grupo de Estudo e Pesquisas em Política Educacional, Rio Claro, 06, 07 e 08 de julho de 2011 Vol. 3 (2011)

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representativa em seu funcionamento, nem da influencia partidária local. Pelo contrário, o conselho tem se tornado espaço de disputa dessas tendências políticas, ao nível local hegemônicas. Esse conflito não se esgota nos conteúdos relativos à política educacional municipal, pois muitas posturas e decisões dos conselheiros resultam de contextos alheios às próprias pautas encaminhadas no âmbito do conselho. Em certa medida o conselho funciona como ―correia de transmissão‖ das tendências políticas que disputam os espaços de representação, teoricamente destinados às categorias que o compõem. As principais tendências políticas dominantes resumem-se às representações do governo local e à sua respectiva oposição. Dessa forma, essa fração do conjunto dos dados observados sobre esse CME revela conflitos e consensos mediados pela democracia representativa de base partidária e das formas gestoras do governo local, contexto em que nem sempre os interesses da sociedade são os principais objetivos.

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ANÁLISE DE PROJETOS, PROGRAMAS E POLÍTICAS PÚBLICAS NA INVESTIGAÇÃO DA RELAÇÃO ENTRE ESCOLA E ENTORNO

Luana Costa Almeida [email protected] UNICAMP

Geraldo Antonio Betini UNICAMP

FAPESP

Resumo: Este trabalho propõe-se a examinar estudos cuja temática se refere a análise de projetos, programas e políticas públicas relacionadas à relação escola-entorno, sendo recorte de uma pesquisa maior cujo objetivo é proceder a um levantamento bibliográfico da produção científica nacional referente à relação entre a escola e seu entorno. Tendo como material de estudo os resumos de teses, dissertações e artigos localizados temporalmente em duas décadas (1990 – 2010), sendo seu meio de busca os bancos de dados da CAPES e SCIELO. Apresenta as discussões anunciadas pelos autores, adentrando à discussão dos limites e possibilidades apontadas por eles, assim como seus próprios limites de cobertura. Palavras-chave: escola, entorno-escolar, participação.

APRESENTAÇÃO

A investigação acerca da relação entre a escola e seu entorno, entendido aqui como família e comunidade, vem se constituindo como importante campo para a compreensão dos fatores que influenciam a instituição escolar, sendo os estudos voltados para esta temática importantes por permitirem a elucidação de questões que podem mobilizar novas abordagens teóricas e práticas da questão, incluindo as políticas públicas pertinentes. Segundo Nogueira (2006), temos assistido na maioria dos países ocidentais desenvolvidos a criação e ampliação de políticas públicas educacionais voltadas à estimulação da relação entre família e escola, ilustrando esta percepção a autora menciona os exemplos dos Estados Unidos da América, Inglaterra e França. 494 Grupo de Estudo e Pesquisas em Política Educacional, Rio Claro, 06, 07 e 08 de julho de 2011 Vol. 3 (2011)

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No caso dos Estados Unidos da América, em 1994, o governo de Bill Clinton colocou como oitava meta da educação a colaboração família-escola. Na Inglaterra, nos anos 1990, o governo trabalhista de Tony Blair propôs um ―contrato casa-escola‖ (home-school contracts) em que os pais britânicos se comprometiam a assumir responsabilidades no plano da assiduidade, da disciplina e da realização dos deveres de casa de seus filhos. Na França, em 1998, o Ministério da Educação lançou uma campanha nacional pela parceria família-escola (Campagne nationale sur le nouveaupartenariat école-famille: confiance et ouverture) que criava, entre outros, a ―Semana dos pais na escola‖. Em 2002, a Comunidade Européia estabelece o dia 8 de outubro como o Dia Europeu dos Pais e da Escola. Seguindo esta tendência mundial o Brasil também adotou as iniciativas de aproximação entre a esfera familiar e a esfera escolar a partir de iniciativa do Governo Federal.

Reporto-me aqui às duas que maior repercussão tiveram junto à população, a saber: a) em 24 de abril de 2001, o Ministério da Educação (MEC) lançou, pela televisão e com o auxílio de artistas famosos, o ―Dia Nacional da Família na Escola‖, que deveria realizar-se, a cada semestre, nos estabelecimentos públicos de ensino. [...] b) entre dezembro de 2004 e janeiro-fevereiro de 2005, o mesmo Ministério da Educação veiculou, em todo o território nacional e também através da mídia eletrônica, uma campanha publicitária conclamando as famílias brasileiras, usuárias da escola pública, a receber em seus domicílios os pesquisadores do Instituto Nacional de Estudos Pedagógicos (INEP) e a responder suas perguntas acerca da opinião e do grau de satisfação com relação ao serviço público escolar que recebem no Ensino Fundamental e Médio (NOGUEIRA, 2006, p.156). Em linha com o apresentado por Nogueira (2006), temos presenciado no Brasil o surgimento de projetos, programas e políticas públicas, seja em nível federal, estadual ou municipal, cujo objetivo principal é o incentivo à ampliação da participação de agentes externos na escola. Neste sentido, vimos emergir tanto ações voltadas à mobilização das famílias, como de organizações da sociedade civil e da comunidade próxima à escola, como é o caso da atuação e parceria com as Organizações não Governamentais, programas governamentais como ―Escola da Família‖ do Estado de São Paulo e campanhas como 495 Grupo de Estudo e Pesquisas em Política Educacional, Rio Claro, 06, 07 e 08 de julho de 2011 Vol. 3 (2011)

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―Amigos da Escola‖, que tenta mobilizar pessoas do bairro para auxiliar na escola, e ―Todos pela Educação‖, que incentiva, dentre outros, a parceria das escolas com instituições e empresas para a melhoria da qualidade da educação. Preocupado com a influência dos fatores internos e externos à escola e a fim de contribuir com suas pesquisas para o aprimoramento da compreensão e intervenção na realidade, objetivando possibilitar maior qualidade educacional, o grupo de pesquisa LOED (Laboratório de Observação e Estudos Descritivos) da FE/UNICAMP tem como um de seus eixos de pesquisa a análise da relação família-comunidade, o qual conta com trabalhos de mestrado, doutorado e dentro do qual se encontram os projetos mais amplos dos quais este trabalho procede. A partir de nossa temática específica de investigação que procura compreender como o entorno escolar afeta a qualidade de ensino nas escolas de Ensino Fundamental, mostrou-se essencial buscarmos na produção nacional como a temática vem sendo abordada e a partir de quais recortes. Em função disso, e estando contido neste projeto maior, o presente estudo tem como objetivo identificar e analisar os trabalhos que analisam projetos, programas e políticas públicas acerca da relação escola e seu entorno, a fim de conhecer como a temática vem sendo estudada pelas pesquisas acadêmicas nacionais em termos da abordagem dada à questão e dos principais resultados apontados por seus autores.

PERCURSO METODOLÓGICO

Este trabalho tem como critério de execução os moldes da pesquisa bibliográfica, a qual é uma especificidade da pesquisa documental em que os dados analisados provêm exclusivamente de suporte ―bibliográfico‖. Segundo Luna (1999) a pesquisa bibliográfica é um apanhado sobre os principais trabalhos científicos já realizados sobre um determinado tema que, em nosso caso, está voltado ao trabalhos que analisam projetos, programas e políticas públicas acerca da relação escola e seu entorno. Embora esta modalidade de pesquisa possa abranger publicações avulsas, livros, jornais, revistas, vídeos, internet, etc. o presente trabalho se restringiu à análise de artigos, dissertações e teses disponíveis em bases de dados específicas e de grande impacto nacional para a coleta de dados. 496 Grupo de Estudo e Pesquisas em Política Educacional, Rio Claro, 06, 07 e 08 de julho de 2011 Vol. 3 (2011)

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A partir da delimitação de nossa problemática de pesquisa para o projeto maior, a identificação de nosso universo para coleta de dados se baseou em quatro aspectos:

Período: produção acerca da temática nas últimas duas décadas (de 1990 a setembro de 201055) no Brasil. Idioma: Estudos nacionais em Língua Portuguesa. Formato da Publicação: Restringiu-se à busca de artigos, dissertações e teses. Parte dos trabalhos a ser consultada: Resumos.

Como base de consulta para extração dos dados optamos por fazer buscas através da Internet em sites institucionais e de fomento à pesquisa, sendo que os bancos de dados utilizados foram: Capes – Coordenação de Aperfeiçoamento de Pessoal de Nível Superior (acessolivre.capes.gov.br/); relativo a teses e dissertações defendidas a partir de 1987, sendo as informações fornecidas diretamente à Capes pelos programas de pós-graduação. SCIELO - Scientific Electronic Library Online (www.scielo.org); relativo a artigos científicos, cujo objetivo é o de implementar uma biblioteca eletrônica que possa proporcionar um amplo acesso a coleções de periódicos, aos fascículos de cada título, assim como aos textos completos dos artigos.

Nossa procura orientou-se por oito descritores de busca: 1) Entorno Escolar; 2) Escola e Comunidade, 3) Comunidade, 4) Efeito-vizinhança; 5) Vizinhança; 6) Escola e Família; 7) Família e escola; 8) Família e Educação. Nesse levantamento conseguimos um total de 236 trabalhos nacionais. Entretanto após o exame do conteúdo dos resumos pudemos perceber que alguns trabalhos não permitiam a análise de seu conteúdo e temática de investigação e outros não tratavam especificamente de assuntos voltados ao entorno escolar em relação com a escola, havendo aqueles que remetiam a esta questão mas se voltavam à análises da 55

Como a busca foi iniciada em setembro de 2010 os artigos, teses e dissertações inseridos nas fontes consultadas a partir deste mês podem não ter sido incorporadas ao banco de dados da pesquisa.

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gestão democrática, Conselho escolar, etc., sem tratar de forma mais específica da participação, papel ou relação do entorno escolar com a escola nestas discussões. Dentre os trabalhos que selecionamos conseguimos um total de 171 sobre o entorno escolar, sendo 25 artigos, 120 dissertações de mestrado e 26 teses de doutorado. Desses, e para a presente análise, temos um total de 12 produções, sendo 4 artigos, 6 dissertações e 2 teses, distribuídos entre os anos de 2001 a 2009.

ANÁLISE DE PROJETOS, PROGRAMAS E POLÍTICAS PÚBLICAS NOS ESTUDOS ACERCA DA RELAÇÃO ESCOLA E ENTORNO Os trabalhos voltados à análise de projetos, programas e políticas públicas na relação escola e seu entorno discutem como se implementa a participação das famílias e comunidade ou relação família/comunidade e escola a partir da proposição de políticas públicas em forma de Lei, Programas ou Projetos educacionais específicos, sendo que alguns deles analisam programas e outros a reação dos sujeitos às proposições legais. Entre os trabalhos que abordam esta temática estão ABREU, 2002; ANJOS, 2005; BRAGA, 2007; FERREIRA, 2009; FRANCISCHINI & SOUZA NETO, 2007; LAGES, 2001; MARTINS, 2002; MARTINS, 2005; MENDES et al., 2009; POWER & WHITTY, 2003; SANTOS, 2005; VALENTE, 2003 e WUNDER, 2002. A partir da análise dos resultados apresentados por esses trabalhos percebemos que uma constatação importante é a de que a relação escola, família e comunidade é fundamental para a melhoria da qualidade social da educação ofertada aos alunos. Entretanto, fica evidente a complexidade do processo, pois envolve uma cultura de participação democrática para além das propostas e regulamentações legais. Várias são as conclusões que emergem dos trabalhos analisados. Dentre elas nos chama a atenção a observação de que o relacionamento entre escola e família pode influenciar positivamente mudanças políticas e pedagógicas, assim como proposições deste âmbito podem aumentar a participação das famílias e comunidade na escola. Em relação às políticas públicas de educação e a participação das famílias e comunidade nas escolas, Santos (2005) analisa o sentido atribuído ao conceito de participação da família na escola nos anos 1990, nas políticas públicas daquela década. A autora parte do âmbito federal, para compreender as medidas das esferas estadual e municipal em São Paulo. 498 Grupo de Estudo e Pesquisas em Política Educacional, Rio Claro, 06, 07 e 08 de julho de 2011 Vol. 3 (2011)

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Em relação à análise de projetos, Braga (2007), analisando o projeto ―Comunidade de Aprendizagens‖ (Brasil-Espanha), concluiu que a partir dele houve mudanças ―[...] significativas de aprendizagem e participação de todas as pessoas, fazendo da escola um espaço mais diverso, democrático e dialógico‖. Ao analisar o ―Projeto Escola que Protege‖, Francischini e Souza Neto (2007), afirmam que ―uma política eficiente no enfretamento da violência passa pelo envolvimento de diversos e estratégicos atores sociais, dentre eles, a comunidade escolar‖, o que nos remete à importância de projetos que envolvam estes segmentos. Já Martins (2002) ao analisar o ― Projeto Amigos da Escola‖ enquanto possibilidade de participação da sociedade civil na gestão da escola pública, tomando como território de análise o estado do Paraná, mais especificamente seis escolas públicas na cidade de Ponta Grossa, conlui que se pode inferir que ―as ações do Projeto nas escolas pesquisadas foram marcadas pela descontinuidade e por um caráter meramente assistencial. Pela falta de amadurecimento das escolas em relação à proposta do voluntariado na educação e, consequentemente, pela desarticulação desta com a proposta pedagógica das escolas‖ o que, segundo o autor, levou a ações ―pontuais, fragmentadas e desarticuladas‖, todavia o autor evidencia também que ―a presença do voluntário na escola pode facilitar a articulação desta com os movimentos populares existentes na comunidade‖ o que poderia gerar a participação da comunidade na escola. Outro projeto analisado foi o ―Projeto Escola Aberta‖, especificamente na rede estadual de ensino do Rio Grande do Sul. A partir desta investigação os autores identificaram que ―há o desejo, por parte das populações que vivem no entorno das escolas, pela realização de atividades nos finais de semana, configurando a instituição como espaço de lazer que serve, ao mesmo tempo, para o divertimento e para a formação‖ (MENDES et al., 2009). Acerca da análise de programas, Lages (2001) estudou o ―Programa de Aceleração de Aprendizagem de Minas Gerais‖, a autora concluiu que embora não haja uma relação linear entre as estratégias educativas familiares e as situações de sucesso ou dificuldade de êxito escolar dos alunos acelerados, o "bom desempenho" escolar ―pode estar vinculado a aprendizagens construídas a partir de novas relações que os alunos estabelecem com o saber com o mundo escolar‖. Analisando o ―Programa Escola da Família‖ do estado de São Paulo, Ferreira (2009) indica que o referido programa possibilita a ―[...] manutenção de atividades extracurriculares direcionadas ao 499 Grupo de Estudo e Pesquisas em Política Educacional, Rio Claro, 06, 07 e 08 de julho de 2011 Vol. 3 (2011)

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movimento de construção de uma sociedade auto-sustentável‖. Em relação à análise do ―Programa Nacional de Bolsa Escola‖, entre agosto de 2001 e novembro de 2002, Valente (2003) indica que em pelo menos três níveis essa proposta se realiza: 1) ―[...] empreende ações afirmativas de cunho universalista‖; 2) promove ―[...] atividades que valorizem a diversidade cultural das populações locais‖ e 3) ―[...] encaminha um processo de construção da cidadania‖. Outra análise interessante é feita por Power e Whitty (2003) acerca das abordagens baseadas no mercado denominadas de "empoderamento" (empowerment) das comunidades nas tomadas de decisão educacionais como meios para se justificar a reforma dos sistemas educacionais públicos convencionais. Segundo os autores ―[...] o papel e o impacto do envolvimento das comunidades nas escolas nada têm de simples‖ sendo que ―[...] se o envolvimento das comunidades quer ter efeitos progressistas, ele deve ser articulado com uma política de educação democrática mais ampla‖. Conforme as considerações acima, os trabalhos indicam tanto que as estratégias de políticas, projetos e programas podem se constituir como impulsionadores da participação da escola e comunidade na escola, quanto que este processo em decorrência da sociedade em que vivemos não é fácil ou certo, havendo limites e possibilidades nas ações as quais devem ser cada vez mais estudadas e colocadas em perspectiva para que o debate possa fluir, amadurecer e permitir novos avanços.

CONSIDERAÇÕES FINAIS

Muito se tem falado sobre a questão da participação da família e da comunidade junto às escolas. Várias iniciativas, partindo do setor privado ou por imposição do Estado, por meio da legislação, programas ou projetos específicos, têm tentado aproximar a escola da família e comunidade e vice-versa. O presente trabalho, teve por objetivo apresentar um pequeno recorte da pesquisa bibliográfica maior acerca das investigações voltadas à análise dessa relação (escola e seu entorno). Os trabalhos analisados nos permitem perceber que estudar o envolvimento entre escola-família/comunidade a partir de implementações legais pode ser um campo promissor para a investigação de meios propícios para o aumento da participação nas escolas, assim como para percebermos os limites que as tornam, em determinada 500 Grupo de Estudo e Pesquisas em Política Educacional, Rio Claro, 06, 07 e 08 de julho de 2011 Vol. 3 (2011)

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medida, inócuas à ampliação dessa participação mais aberta e democrática. Isso porque há limites tanto no âmbito do desenho da própria política/programa/projeto, quanto do modelo de Estado e política pública aos quais se vinculam. O presente trabalho nos dá uma visão da produção acadêmica, mostrando as preocupações perseguidas pelos pesquisadores da área, sendo notável a recorrência de pesquisas cujo objeto de análise se volta à programas e projetos específicos e de forma geral sendo analisados a partir de territórios e instituições específicas. Faz-se necessário evidenciar, todavia, que em decorrência do recorte posto ao trabalho maior do qual este é parte, tendo em vista os limites dos descritores utilizados, muito provavelmente deixamos de analisar outros trabalhos que também se voltam à análise

de

políticas,

programas

e

projetos

vinculados

à

relação

escola-

família/comunidade, mas cujo recorte específico não dava ênfase, nem nas palavraschave, nem no resumo, a esta dimensão. Um aspecto que não se evidencia a partir da análise do resumo dos trabalhos estudados, mas que consideramos importante discutir é o papel que a família vem tomando na educação a partir das políticas neoliberais, dentro das quais este segmento vai progressivamente se configurando como ator importante, se não essencial, para o sucesso do empreendimento educacional de seus filhos. Neste sentido, Carvalho e Burity (2005, p. 2) explicitam que […] desde a década de 1990 a política educacional neoliberal vem incentivando a participação dos pais na escola, com ênfase no acompanhamento ao dever de casa. A lógica de elevação da produtividade escolar, no contexto mundial de competitividade econômica, baseia-se na valorização do capital escolar para o desenvolvimento social e a empregabilidade; a avaliação educacional, de forte ênfase quantitativa, via testes padronizados aplicados em massa, permite comparações de desempenho, inclusive internacionais. Intensifica-se, assim, a mobilização em torno do dever de casa, típica das classes médias. A partir da análise feita pelas autoras podemos discutir qual a repercussão dessa ―valorização‖ da família na relação com a escola e suas atividades dentro da agenda política de nossos governos, já que dependendo a que modelo de Estado estejam ancorados seus princípios políticos (se, por exemplo e como vêm se configurando, os neoliberais) podem levar a discussão ao âmbito do individualismo e da culpabilização 501 Grupo de Estudo e Pesquisas em Política Educacional, Rio Claro, 06, 07 e 08 de julho de 2011 Vol. 3 (2011)

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dos indivíduos pelos seus sucessos e fracassos, já que, em última instância, seria a família a responsável pelo insucesso educacional de suas crianças. Entretanto, não se considera que as famílias das camadas que frequentam as escolas públicas sejam, geralmente, desprovidas de capital social, familiar, cultural como consequencia do baixo nível socioeconômico em que se encontram. A escola, por outro lado, espera um aluno ideal para educar, mas recebe um aluno real carente das mínimas ―condições sociais para o aprendizado‖ (LÓPEZ, 2008, p. 329). O autor chama de ―educabilidade‖ os pré-requisitos sociais para uma aprendizagem de qualidade, realidade distante das crianças das camadas populares que freqüentam as escolas públicas brasileiras. Os trabalhos aqui analisados embora contribuam para compreendermos a questão em diversos ângulos, não esgotam a discussão, sendo necessária uma busca mais abrangente e aprofundada para que a temática seja abordada de forma mais produtiva a fim de mapear a área de estudo. Entretanto, entendemos que a relevância do estudo aqui apresentado está em discutir conceitos e categorias que podem transformar a realidade das escolas públicas brasileiras, oferecendo às crianças das camadas populares uma educação de qualidade social que as habilite a viver como cidadãos conscientes com o controle de suas próprias vidas.

REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS

ABREU, Ramon Correa. Famílias de camadas populares e Escola-Plural: as lógicas de uma relação. 211p. Mestrado. UFMG, 2002. ANJOS, Letícia Merentina. A participação das famílias no cotidiano escolar: significados e práticas de pais e professores. 118p. Mestrado. UNIVERSIDADE FEDERAL DE SANTA CATARINA, 2005. BRAGA, Fabiana Marini. Comunidades de aprendizagem: uma única experiência em dois países (Brasil e Espanha) em favor da participação da comunidade na escola e da melhoria da qualidade do ensino. 237p. Doutorado. UFSCAr, 2007. CARVALHO, Maria Eulina Pessoa; BURITY,Marta Helena Dever de casa: visões de mães e professoras. 28ª Reunião da ANPED. 2005. Disponível em: http://www.anped.org.br/reunioes/28/textos/gt14/gt141575int.rtf. Acesso em: 31/05/2011.

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FERREIRA, Maria Lúcia. Análise da política de integração escola-comunidade: um estudo de caso do Programa Escola da família do Estado de São Paulo. 200p. Mestrado. UNICAMP, 2009. FRANCISCHINI, Rosângela; SOUZA NETO, Manoel Onofre. Enfrentamento à violência contra crianças e adolescentes: Projeto Escola que Protege. Rev. Dep. Psicol. UFF 19(1): 243-251, 2007. LAGES, Elizabeth Dias Munaier. Família e escola na configuração de percursos escolares de alunos de turmas de aceleração de aprendizagem. 181p. Mestrado. PUC-MG, 2001. LÓPEZ, Néstor. A escola e o bairro. Reflexões sobre o caráter territorial dos processos educacionais nas cidades. In RIBEIRO, Luiz Cesar de Queiroz; KAZTMAN, Ruben (orgs.). A cidade contra a escola: Segregação urbana e desigualdades educacionais em grandes cidades da América Latina. Rio de Janeiro: Letra Capital: FAPERJ; Montevidéu, Uruguai: IPPES, 2008. LUNA, Sérgio Vasconcelos. Planejamento de pesquisa: uma introdução. São Paulo: EDUC, 1999. MARTINS, Clícia Büher. Amigos da Escola: os sentidos das articulações possíveis entre escola e comunidade. 67p. Mestrado. UNIVERSIDADE ESTADUAL DE PONTA GROSSA, 2002. MARTINS, Maria Silvinha Cararo. A parceria família-escola: uma proposta dos higienistas. 106p. Mestrado. UNIVERSIDADE ESTADUAL DE MARINGÁ, 2005. MENDES, Valdelaine et al. A participação da comunidade no Projeto Escola Aberta no Rio Grande do Sul: o uso da escola pública nos finais de semana. Ensaio: aval.pol.públ. 17(64), p. 549-570, 2009. NOGUEIRA, Maria Alice Nogueira. Família e escola na contemporaneidade: os meandros de uma relação. Educação e Realidade. Porto Alegre, 31(2), p. 155-170, jul./dez. de 2006. POWER, Sally; Whitty, Geoff. Mercados educacionais e a comunidade. Educ. Soc. 24(84), p. 791-815, 2003. SANTOS, Maria Lucia Salgado Cordeiro. O conceito de participação da família no cenário político-educacional em São Paulo na década de 90 e o olhar de pais atores dos movimentos populares de São Mateus. 107p. Mestrado. PUC-SP, 2005. VALENTE, Ana Lúcia. O Programa Nacional de Bolsa Escola e as ações afirmativas no campo educacional. Rev. Bras. Educ. (24), p. 165-182, 2003. WUNDER, Alik. 'Encontro de águas' na barra do Ribeira: imagens entre experiências e identidades na escola. 200p. Mestrado. UNICAMP, 2002.

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O ASSOCIATIVISMO EM VALINHOS SP

Paula Renata Bassan Morais [email protected] Universidade Nove de Julho – São Paulo

Resumo: Este trabalho tem por objetivo realizar um estudo sobre o associativismo. Estudamos a temática na cidade de Valinhos-SP. Iniciamos realizando um breve mapeamento das instituições que atuam nesta cidade e as atividades desenvolvidas na área de assistência social. Ao analisar a cidade de Valinhos constatamos que existem 82 instituições que atendem a população de baixa renda. A escolha da temática desta pesquisa ocorreu porque o associativismo ocupa hoje um lugar de destaque no cenário das práticas e políticas educativas no Brasil e também teve uma influencia muito forte na minha vivência como aluna de projeto social desde os 12 anos de idade, monitora aos 15 anos, estagiaria e atualmente uma educadora social. Palavras-chave: associativismo e projetos sociais.

INTRODUÇÃO

O interesse comum justifica a formação dos grupos, a própria palavra interesse, segundo o dicionário Aurélio, aponta para o sentido da associação de pessoas que é ―estar entre, no meio, participar‖. Assim, as associações acontecem pela necessidade de satisfazer interesses, em qualquer área, sejam eles comerciais, científicos, de lazer, esportivos, e outros. Os diferentes interesses podem gerar uma necessidade de união, compreendidos pela participação do indivíduo em associações. Há diferentes exemplos de associativismo que podem ser citados, como os Sindicatos, onde há um interesse sobre a qualidade das condições de trabalho e salário do trabalhador; existem as cooperativas populares, em que há a agregação de forças e distribuição de tarefas para alcançar um interesse comum, há as associações de bairro, que reivindicam melhorias das condições de moradia de determinada região, os partidos ou grupos políticos, em que o interesse está em manter atividades ideológicas, geralmente visando o poder, e

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ainda outros, como grupos de estudo, entidades filantrópicas, grêmios, irmandades ou confrarias, grupos de trabalho ou comissões, etc. O termo associativismo deriva de associações, pois remete ao sentimento que os associados devem compartilhar, de repartir os dividendos e ajudar-se nas dificuldades. O associativismo permite que seus associados atinjam objetivos maiores e de forma mais rápida do que se estivessem trabalhando sozinhos, já que as pessoas desenvolvem o seu trabalho em equipe. Segundo o IDS (Instituto para o Desenvolvimento Social), no livro Guia Para o Associativismo (2001, Pag.5), ―O Associativismo é a expressão organizada da sociedade, apelando à responsabilização e intervenção dos cidadãos em várias esferas da vida social e constituiu um importante meio de exercer a cidadania‖.

A importância e o valor do associativismo decorrem do fato de constituir uma criação e realização viva e independente, uma expressão da ação social das populações nas mais variadas áreas. Partindo do entendimento do associativismo como ação presente e importante para a democracia, percebe-se também sua importância do ponto de vista político, pois no interior das associações são estabelecidas relações de poder. Percebe-se que as associações envolvem a democracia, o civismo e o convívio coletivo. Dentro dessa perspectiva, as associações seriam estruturas que agregam interesses, educando o indivíduo para o convívio social. O ato de associar-se induz a pessoa a tomar consciência de seu papel social e o leva a perceber seus direitos reivindicando-os quando necessário, mas também de seus deveres, aceitando-os de maneira crítica, muitas vezes contestando as regras estabelecidas no sentido de participar de novas determinações condizentes com os interesses do grupo no momento. O Homem enquanto ser social sempre se associou. Em um contexto geral as formas associativas sempre foram desestimuladas, e as poucas associações surgiram baseadas na necessidade de reorganização. Percebe-se que um marco decisivo e indispensável para a existência do associativismo em nossa sociedade foi a instauração dos regimes democráticos. A Declaração Universal dos Direitos do Homem, aprovada em 10 de Dezembro de 1948 estipula na alínea 1 do Artigo 20 que "Toda a pessoa tem direito à liberdade de reunião e de associação pacíficas.".

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Para entendermos a questão da categoria de analise associativismo na atualidade precisamos entender o que se passou, onde vários movimentos sociais se formaram e fizeram parte desta evolução histórica. No Brasil, o desenvolvimento da sociedade civil em relação a sua participação nas questões sociais foi um passo importante para a posterior atuação do setor empresarial. Vários segmentos, como a Igreja Católica, o associativismo desenvolvido nos anos 1950, o sindicalismo e os movimentos sociais nos anos 1970 e 1980, tiveram importante participação para a criação de uma cultura de atuação social paralela ou em conjunto com a atuação do Estado. Muitas das organizações e dos movimentos sociais que lutaram contra a ditadura militar no Brasil (1964-1985), Gohn (2008) relata a evolução histórica dos movimentos sociais, onde nos anos 1980, houve um grande avanço do associativismo, de afirmação da postura autônoma perante o Estado, de uma sociedade civil autônoma e democrática e de oposição ao regime militar. Alguns movimentos sociais contribuíram para a expansão do associativismo. Um exemplo importante que temos é em 1984, as DiretasJá trouxeram a luta pela democracia, outro fato importante foi a luta das Comunidades Eclesiais de Base (CEB) que reuniam fieis ao lado de movimentos sociais e movimentos populares. Já em 1990 ―surge as crises econômicas internas em movimentos populares e ONGs cidadãs que os levaram a repensar seus planos, planejamentos e ação, estratégias, etç.‖ (Gohn, 2008, p.134) Foram os embriões das Organizações Não Governamentais (ONGS) que proliferaram a partir dos anos 1990, algumas buscando recursos junto ao Estado ou ainda junto a ONGS internacionais para continuar com seus projetos, outras se aliando com empresas privadas. Temos ainda, nesse período, o surgimento de importantes institutos, fundações e organizações da sociedade civil que se formalizam para atuar de maneira relativamente orgânica e institucionalizada, atuando diretamente com o Estado, em parceria com este ou apenas usufruindo dos incentivos fiscais que o Estado oferece à sua substituição nas questões sociais. Pensando neste mundo globalizado, o avanço tecnológico desenvolve contradições, pois embora surja na perspectiva de beneficiar o ser humano que o cria, dificulta o próprio convívio do homem com seus semelhantes e destes com a natureza. 506 Grupo de Estudo e Pesquisas em Política Educacional, Rio Claro, 06, 07 e 08 de julho de 2011 Vol. 3 (2011)

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Nesse contexto, torna-se necessário buscar alternativas para direcionar a questão sendo cada vez mais urgente realizar articulações na sociedade, visando uma maior harmonia entre a sociedade e a natureza, privilegiando o ser humano dentro de um processo de desenvolvimento. O resultado é que parcelas consideráveis da população são lançadas na marginalidade e excluídas da economia de mercado. Este processo afeta os índices de desemprego, força a precarização das condições de trabalho e amplia o número dos socialmente excluídos, que sobrevivem no mercado informal de trabalho. Diante desta realidade, se faz necessário buscar alternativas para direcionar a questão do trabalho e renda. Segundo Gohn (2008, p.134), Nos anos 1990 houve todo um replanejamento da estrutura dos movimentos sociais onde a nova política de distribuição e gestão dos fundos públicos em parceria com a sociedade organizada, focalizados não em áreas sociais (como moradia, saúde, educação, etç), mas em projetos temáticos focalizados (como crianças, jovens, mulheres etç) contribuíram para desorganizar as antigas formas dos movimentos no que se referem as suas demandas e suas reivindicações. A palavra de ordem destes projetos e programas passou a ser: ser propositivo e não apenas reivindicativo, ser ativo e não apenas um passivo reivindicante.

Desse modo, são inúmeros os desafios a serem vencidos e o maior deles é a formação e reeducação para o associativismo e especificamente, para o modo de vida cooperativo. O associativismo consiste na união de pessoas em prol das mesmas metas e de forma organizada. Para Demo (2001, p.13), O associativismo pode apresentar-se como um incentivo à capacidade de controle democrático, ou seja, a capacidade da população de manter sob controle o Estado e o mercado, de tal sorte que prevaleça o bem comum.

Este controle significa que a parcela menos destituída de direitos da população pode executar táticas de controle de poder, através de estratégias para o gerenciamento do bem comum. Um bem comum que poderia ser conquistado por meio do associativismo é o direito a uma educação de qualidade. A educação pode capacitar um sujeito para lutar pela própria história. O papel da educação está na capacidade de reconstruir fatos fundamentais da história humana e estimular a fundamentação política de um processo associativo. A educação pode transformar a vida de cidadãos. Segundo Demo (2001, p. 76), ―a cidadania anda de

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mãos dadas com a associatividade, sendo necessário para promover essa cidadania associativa, o incentivo à educação e a comunicação‖. A associatividade pode ser importante para a superação da pobreza e para o desenvolvimento humano, na medida em que potencializa as pessoas para o convívio social. Gohn (2008, p. 133), afirma que ―os anos 1980 são fundamentais para a compreensão de como se dá a construção da cidadania dos pobres no Brasil, dentro de novos parâmetros, agora como sujeitos dotados de direitos‖ O conceito de pobreza é historicamente construído, portanto relativo. Qualquer sociedade, no seu tempo histórico, define a forma de pensar a pobreza e de reconhecê-la de acordo com o seu desenvolvimento. Atualmente, o mais freqüente é colocar a pobreza como simplesmente o resultado de um cálculo, em que se evidencia apenas com a falta de salário ou renda obtida no mercado de trabalho. É o que se costuma chamar de determinação da linha da pobreza. A ―linha da pobreza‖, instrumentalizada por estudos internacionais, define a categoria pobre como aqueles que recebem valor insuficiente para satisfazer suas necessidades consideradas básicas. E define como indigentes aqueles que recebem quantidade insuficiente para a aquisição da cesta básica de alimentos. Segundo pesquisa do IPEA (Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada), em 1999 havia 14,5% da população brasileira vivendo em famílias com renda inferior à linha de indigência e 34,1%, com renda inferior à linha da pobreza. Isso corresponde a 22 e 53 milhões de pessoas respectivamente. Comparado ao ano anterior, houve um pequeno aumento: em 1998 havia 21,7 milhões de indigentes e 50,3 milhões de pobres. O associativismo, enquanto ação coletiva movida em prol de objetivos comuns a um grupo pode ser importante para a superação da condição social restritiva em que a pobreza está inserida. A formação de associações impulsiona o crescimento social, a criação de vínculos para a formação de sociabilidade mínima e capacita cidadãos para as reivindicações de políticas sociais diante do poder público. A categoria associativismo pode ocorrer de diferentes formas. Abordaremos mais detalhadamente uma área do associativismo que é o terceiro setor. Segundo Gohn (2010, p.75), ―o associativismo é impulsionado por organizações do chamado terceiro setor e atua via projetos sociais específicos‖

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No ano de 1999, foi publicada a Lei 9.790/99, denominada Marco Legal do Terceiro Setor, criada graças ao empenho e à experiência acumulada pelo Conselho da Comunidade Solidária. Esta lei disciplina, entre outros aspectos, os requisitos para que uma entidade sem fins lucrativos (associação ou fundação) possa receber do Governo Federal a qualificação de Organização da Sociedade Civil de Interesse Público (Oscip). Instituiu também a possibilidade dessas organizações celebrarem "termos de parceria" com o poder público para a execução de determinados projetos. O termo terceiro setor é, portanto, relativamente novo em nossa sociedade, contudo, suas bases e princípios são seculares. Segundo Gohn (2005, p. 76), No Brasil, nos anos 70-80, as ONGs cidadãs e militantes estiveram por detrás da maioria dos movimentos sociais populares urbanos que delinearam um cenário de participação na sociedade civil, trazendo para a cena pública novos personagens, contribuindo decisivamente para a queda do regime militar e para a transição democrática do país. As ONGs contribuíram para a reconstrução do conceito ‗sociedade civil‘, termo originário do liberalismo, que adquire novos significados, menos centrados na questão do indivíduo e mais direcionados para os direitos de grupos.

A definição adotada por Fernandes (1994, p.27) mostra muito bem a influência dos tempos. Nas palavras do autor, Pode-se dizer que o terceiro setor é composto de organizações sem fins lucrativos, criadas e mantidas pela ênfase na participação voluntária, num âmbito não governamental, dando continuidade às práticas tradicionais da caridade, da filantropia e do mecenato e expandindo o seu sentido para outros domínios, graças, sobretudo, à incorporação do conceito de cidadania e de suas múltiplas manifestações na sociedade civil.

O autor Fernandes (1994) define o Terceiro Setor conforme mostra a figura 1. Figura 1 Combinações resultantes da conjunção entre o público e o privado AGENTES FINS SETOR Privados Para privados = Mercado Públicos Para públicos = Estado Privados Para públicos = Terceiro Setor Públicos Para privados = (corrupção)

Fonte: Fernandes (1994)

Segundo Gohn (2010, p. 76), 509 Grupo de Estudo e Pesquisas em Política Educacional, Rio Claro, 06, 07 e 08 de julho de 2011 Vol. 3 (2011)

III Seminário Internacional de Gestão Educacional O terceiro setor brasileiro é composto por inúmeras associações e entidades com perfis variados. Essas associações e entidades sobrevivem graças ao apoio financeiro e institucional que recebem de empresas, nacionais e internacionais, fundações também empresariais, bancos e outras entidades da sociedade civil. Este conjunto de entidades patrocina inúmeros projetos sociais, projetos formulados com premissas associativas destinados a clientelas carentes, num universo multifacetado das experiências associativas, inscrevendo suas atuações no universo de responsabilidade social.

O termo Terceiro Setor têm sido empregado com ênfase crescente nos últimos vinte e cinco anos por organismos internacionais (ONU – Organização das Nações Unidas, FMI e Banco Mundial) e pela mídia de modo geral, que começam a voltar sua atenção para os países subdesenvolvidos a fim de influenciar principalmente nas políticas sociais. De acordo com Dowbor (2001, p. 49), consideramos que O papel do Terceiro Setor não é realizar ações próprias do Estado substituindo-o, mas agir como articulador e organizador das forças sociais no sentido de ampliar as possibilidades das comunidades locais influenciarem as políticas públicas.

Esse espaço foi sendo conquistado durante o processo de luta pela ampliação da cidadania social que fomentou o aparecimento, como refere Gohn (1997, 301), de uma nova concepção de sociedade civil, Resultado das lutas sociais empreendidas por movimentos e organizações sociais nas décadas anteriores, que reivindicaram direitos e espaços de participação social. Essa nova concepção construiu uma visão ampliada da relação Estado-sociedade, que reconhece como legítima a existência de um espaço ocupado por uma série de instituições situadas entre o mercado e o Estado, exercendo o papel de mediação entre coletivos de indivíduos organizados e as instituições do sistema governamental.

Temos encontrado, em diversos segmentos sociais, uma preocupação crescente com os direitos do cidadão. Tal preocupação com os direitos nos remete à ampliação da relevância e visibilidade das organizações da sociedade civil, das formas de cooperativismo e associações. Para Gohn (1999), na pratica, o Terceiro Setor caminha para uma articulação conjunta, de caratê mais propositivo que reivindicativo, entre movimentos sociais e as modernas ONGs, determinadas associações comunitárias, fundações sem fins lucrativos e entidades filantrópicas, de forma que o Terceiro setor assuma o papel de

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intermediador entre estado e sociedade para a construção de espaços de execução de políticas sociais. Coelho (2000, p. 40) cita a diferença entre interesse público e coletivo. Os interesses coletivos referem-se a um determinado grupo, enquanto os interesses públicos necessariamente dizem respeito a toda sociedade. Esses conceitos são importantes para a compreensão da diferença de escopo entre o Governo e o Terceiro Setor. Enquanto o primeiro representa os interesses de toda a sociedade, uma organização do Terceiro Setor pode buscar atender às necessidades de um pequeno grupo, dentro de uma região restrita.

Essas organizações são amplamente diversificadas em tamanho, missão institucional, captação de recursos, população atendida, atuação e formalização. Deve ficar claro que existem programas que não são de cunho filantrópico, ou seja, um simples ato de caridade com o próximo, realizado por empresários bem sucedidos retribuindo a sociedade parte dos ganhos que obtinham em suas empresas, mas sim um ato de responsabilidade social, cujas ações não são individuais, mas refletem a integração e o acompanhamento de uma empresa em programas em prol da cidadania. Szazi (2001, p. 98) relata que A filantropia também está presente no Terceiro Setor através de Entidades Filantrópicas, porém a empresa que colabora com essas entidades contribui para aspectos sociais de maneira superficial e não deve ser titulada como uma empresa socialmente responsável, pois a responsabilidade social é o compromisso social em empresas privadas e sua relação com o terceiro setor. Essas empresas podem desenvolver programas sociais próprios, esses podem ser realizados através de fundações, que é um tipo especial de pessoa jurídica, pois pode ser constituída a partir da decisão de um só indivíduo

Elas participam da elaboração de projetos de políticas públicas, conseguindo absorver as necessidades reais da sociedade por estarem em contato mais direto com os movimentos sociais do que o próprio Estado. Salamon e Anheier (1997) tentaram preencher a lacuna teórica, estudando como o setor filantrópico, ou não lucrativo, funcionava em 13 países, inclusive no Brasil. Os resultados desta pesquisa foram publicadas no clássico livro "The Emerging Sector - An Overview" (MEREGE, 2005). Essas informações tornaram-se uma referência mundial para estimular pesquisas idênticas em outros países. Um intenso trabalho dos técnicos da Johns Hopkins, junto ao departamento de Estatística da ONU, ao qual se juntaram especialistas de diversos países, resultou na Classificação Internacional das Organizações Não-Lucrativas (ICNPO – International Classification of Nonprofit Organizations). Desde março de 2002, a ICNPO esta disponível no site da 511 Grupo de Estudo e Pesquisas em Política Educacional, Rio Claro, 06, 07 e 08 de julho de 2011 Vol. 3 (2011)

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Johns Hopkins. O IBGE adota a ICNPO como referência para o levantamento de informações sobre o terceiro setor, nas pesquisas censitárias realizadas pelo instituto. A partir deste estudo, ele propõe uma definição ―estrutural-operacional‖, que enfatiza a estrutura básica das organizações. Com isso, as instituições inseridas no Terceiro Setor compartilhariam as seguintes características: organizadas, privadas, não distribuidora de lucros, auto governadas e voluntarias. Para Salomon e Anheier (1997, p. 33), As organizadas foram institucionalizadas de alguma forma. Segundo os autores, a realidade institucional não precisa ser necessariamente formal, mas pode ser demonstrada por reuniões periódicas, representantes reconhecidos, regras de atuação etc. As privadas são as instituições devem ser formalmente separadas do setor governamental, não fazendo parte nem sendo governadas ou geridas pelo governo. Isto não significa que as instituições não possam receber recursos públicos, nem que nenhum membro do governo possa fazer parte do corpo de diretores. As de não distribuidoras de lucros são os eventuais superávits produzidos pela instituição que não podem ser repartidos entre os diretores, devendo ser reinvestidos no cumprimento de seus objetivos estabelecidos. Com isso, se diferencia o Terceiro Setor do mercado. Também tem a auto governadas que são as organizações que devem ser geridas independentemente de outras organizações, com procedimentos e forma de atuação definidos internamente. E a voluntárias que são as organizações que devem envolver algum grau de participação voluntária, em funções gerenciais ou operacionais. Uma instituição com um corpo de diretores voluntário pode ser classificada como ―voluntária‖.

Esta definição do que é e não é considerada organização sem fins lucrativos torna o setor um objeto de estudo passível de ser analisado, o que não acontecia quando se levava em conta apenas a definição do privado com objetivo público. Segue o gráfico da INCPO para demonstração, como referência para o levantamento de informações sobre o terceiro setor. A Figura 2 apresenta as 12 áreas de atividades. Figura 2 International Classification of Nonprofit Organizations – ICNPO Classificação Internacional de Organizações Não-Lucrativas

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Fonte: (Salamon e Anheier, 1997, p.92-94)

A tabela das atividades é detalhada em cada subgrupo, sem a definição de um padrão comum, por entender que esse nível de detalhamento deve ser modelado para acomodar as particularidades do terceiro setor dentro de cada país ou cidade. Cada uma destas áreas possui características interessantes e serão utilizadas para a divisão das organizações e entidades existentes em Valinhos SP.

Mapeamento do associativismo em Valinhos SP

Segundo dados do IBGE de 2010, Valinhos foi fundada em 1896 como distrito de Campinas no estado de São Paulo. Elevado à categoria de Município em 1960 tem como base econômica a atividade agrícola, voltada para a fruticultura. Localizado próximo a cidades de grande e médio portes, Valinhos revela oportunidades de negócios em função da base produtiva, e a situação privilegiada de sua localização permite forte comércio e serviços local. Essa localização privilegiada chamou a atenção de moradores da RMC e até da capital paulista com o desejo de morarem em Valinhos. Isso gerou um movimento imobiliário recente onde muitas 513 Grupo de Estudo e Pesquisas em Política Educacional, Rio Claro, 06, 07 e 08 de julho de 2011 Vol. 3 (2011)

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fazendas e sítios de figo roxo, goiaba, caju e vinhedos que antes estavam na zona rural, vêm sendo transformadas em condomínios fechados horizontais. Para muitas pessoas a cidade é apenas dormitório, pois trabalham em outras cidades e moram em Valinhos que tem características interioranas. Segundo o site da Prefeitura do Municipio de Valinhos, o Município de Valinhos distingue-se no panorama paulista por seu parque manufatureiro e pela produção de figos em grande escala. A produção brasileira de figos é de cerca de 4 milhões de centos, dos quais 1 milhão é proveniente de Valinhos. A cidade conta com 505 industrias, 823 empresas comerciais e 642 empresas prestadoras de serviços. Algumas grandes empresas se instalaram na cidade, por exemplo, a Unilever que fabrica sabonetes e margarinas e tem mais de mil funcionários; a empresa Rigesa (Divisão de Embalagens de Papelão Ondulado) com cerca de setecentos funcionários e Eaton que fabrica transmissões mecânicas para veículos de passageiros, picapes, caminhões leves, médios e pesados, conta com cerca de dois mil e trezentos funcionários. Segundo o site da prefeitura de Valinhos (2010), ―as doze maiores empresas da cidade em Valor Adicionado - Ano/Base-2004 são: EATON Ltda; Rigesa, Celulose Papel e Embalagens Ltda;

IGL Industrial Ltda; Val Impress Indústria Gráfica Ltda;

Onça Industrias Metalúrgicas S/A; Chem Tren Indústria Inc & Cia; CHR Hansen Indústria e Comércio Ltda; Unilever Bestfoods Brasil Ltda; Tampas Cli Par Veí. Indústria e Comércio Ltda; A Ray Bollhoff Indústria e Comércio Ltda; Rigesa Celulose Papel e Embalagens Ltda; Cartonificio Valinhos‖. Os empregos neste municipio giram em torno destes dois polos. Este dado é importante pois mostra onde os adolescentes que participam do associativismo podem ser inseridos. Em relação a população, segundo site do IBGE, em 2010 ―a cidade de Valinhos possue 107.481 mil habitantes. A população jovem da cidade esta divida em 15.902 educandos matriculados no ensino fundamental (07 a 14 anos de idade) e 4.891 matriculados no ensino médio (com idade de 15 a 17 anos)‖. Alem da educação formal os educandos participam de projetos de educação não formal. No site COOVER (Comunidade dos Vereadores Brasileiros) 2010, em uma matéria divulgada em 20 de janeiro de 2010, diz que a ―Câmara de Valinhos recebeu da Prefeitura o projeto de lei que estima a receita e fixa a despesa do município para o 514 Grupo de Estudo e Pesquisas em Política Educacional, Rio Claro, 06, 07 e 08 de julho de 2011 Vol. 3 (2011)

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exercício de 2010. Na propositura, o prefeito Marcos José da Silva projeta o orçamento geral em R$ 239. 450.000,00. Do total das despesas fixadas, 4,50% fica para a Câmara Municipal (R$ 9.450.000,00); 0,70% para a Secretaria de Negócios Jurídicos e Institucionais (R$ 1.470.000,00); 15,98 % para a Administração (R$ 33.516.000,00)- o que inclui 9 secretarias e o gabinete do prefeito; 2,51% para Segurança Pública (R$ 5.271.000,00), vinculados à Secretaria de Defesa do Cidadão; 4,16% destinados a Assistência Social (R$ R$ 8.734.000,00); 2,96% para Previdência Social (R$ 6.220.000,00), vinculados à Secretaria de Assuntos Internos; 16,75% para a Saúde (R$ 35.175.000,00); 3,94% para o Trabalho (destinados principalmente à concessão de vale transporte, cesta básica, auxílio doença/funeral/seguro acidente aos servidores, contribuição compulsória do PASEP e convênio de assistência médico-hospitalar aos servidores e seus dependentes), o que corresponde a ordem de R$ 8.288.000,00, também alocados na Secretaria de Assuntos Internos. Para a Cultura, a receita está projetada em 1,16% (R$ 2.430.000,00). A maior porcentagem ficará para a Educação, com 29,01% do orçamento e equivalente a R$ 60.938.000,00‖. A importância do conhecimento da história e do compromisso social da assistência social, vem no sentido de ajudar a compreender o lugar social dos chamados Projetos sócio educativos, Casas de Passagem, Projetos Educacionais para crianças e jovens "carentes" etc., pois, no discurso de muitos deles encontramos tanto valores da assistência compreendida como direito, como do assistencialismo praticado como benesse e como controle das camadas pobres da população. Dessa maneira, a hipótese que se levanta aqui é a de que, na construção da trajetória dessa área de intersecção da educação não-formal, o campo da assistência social vem caminhando concomitantemente, trazendo elementos que lhe são próprios, em alguns momentos contribuindo para a construção desse "novo" espaço institucional, e em outros, amarrando e fortalecendo as posturas características do assistencialismo. A Secretaria de Assistência Social e Habitacional atua por meio de programas e projetos que são: Recriança, Centro Municipal de Orientação ao Adolescente (Cemoa), Resgate de Direitos e Conselho Municipal dos Direitos da Criança e do Adolescente; pessoa portadora de deficiência física - Passe Transporte Coletivo, Prestação Continuada e Comissão Técnica de Estudos; idoso - Passe idoso, Passe aposentado, Benefício de Prestação Continuada, Centro de convivência do Idoso, Programa da Terceira Idade e Conselho dos Grupos de Terceira Idade; família - Plantão de Casos 515 Grupo de Estudo e Pesquisas em Política Educacional, Rio Claro, 06, 07 e 08 de julho de 2011 Vol. 3 (2011)

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Sociais, Atendimento Emergencial, Atendimento ao Morador de Rua e Itinerante, Benefício de Prestação Continuada, Projeto de Geração e Complementação de Renda, Serviço de Reintegração Social, Programa de Profissionalização e Programa da Mulher. A Secretaria de Assistência Social e Habitacional também tem um projeto de assessoria e de auxílio subvenção às entidades assistenciais do município. Com a pesquisa de campo observamos e relatamos as principais ações da prefeitura de Valinhos em relação ao programas e ações de caráter associativista. Recriança - atende 350 crianças de ambos os sexos na faixa etária de 6 a 11 anos em 18 núcleos instalados nos Centros Comunitários dos bairros. O programa tem por objetivo ocupar o tempo ocioso da criança no período em que ela não está na escola, para atender principalmente as mães que trabalham fora e não têm com quem deixar os filhos. O programa desenvolve atividades de incentivo ao estudo, recreação e lazer, educação ambiental, trabalhos manuais e jogos educativos. Centro Municipal de orientação ao Adolescente (Cemoa) - atende 690 adolescentes de ambos os sexos na faixa etária de 12 a 18 anos em uma sede instalada na rua João Moletta, 140 - Bairro Lenheiro. No Cemoa eles participam de atividades de educação não formal, de oficinas de arte em madeira, estímulo e incentivo ao estudo e educação para o trabalho. Serviço de Reintegração Social - Este programa é coordenado por uma Comissão Especial, que desenvolve um trabalho com sentenciados por delitos leves. Esses sentenciados cumprem suas penas através da prestação de serviços à comunidade. Transporte Coletivo - Através da Secretaria de Assistência Social e Habitacional, idosos, deficientes físicos, aposentados e pensionistas (de acordo com as leis específicas de cada caso), recebem passes para o transporte coletivo. Resgate de Direito - Trabalho desenvolvido com crianças e adolescentes em situação de riscos domésticos (violência e abuso), na faixa etária de 8 a 16 anos. Benefícios - Os idosos acima de 70 anos e portadores de deficiência, com renda per capita inferior a 1/4 do salário mínimo (lei municipal 8.742), recebem o Benefício de Prestação Continuada. 516 Grupo de Estudo e Pesquisas em Política Educacional, Rio Claro, 06, 07 e 08 de julho de 2011 Vol. 3 (2011)

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Moradores de Ruas - Através de um programa específico, mendigos e moradores de rua recebem atendimento social e ajuda para retornar à sua cidade de origem. Atendimento à Família - De acordo com a Lei Estadual 4.467, as famílias carentes recebem complementação de renda através do Instituto dos Assuntos da Família (IAFAM). Atendimento ao Trabalhador - Através do programa de Atendimento ao trabalhador, técnicos da área social auxiliam os desempregados na busca de um novo emprego através de um contato direto com empresas que precisem de mão-de-obra. Apoio às Entidades - Através do Programa de Apoio às Entidades Assistenciais do Município, as entidades instaladas no município recebem auxílio financeiro e técnico para realização de suas atividades. Terceira Idade - Atualmente existem na cidade 11 Grupos de Terceira Idade, que atendem à aproximadamente 600 pessoas com idade acima de 50 anos. Neste programa são desenvolvidas atividades de ginástica, relaxamento, dança, teatro, coral, cursos, viagens, supletivo adaptado, hidroginástica, natação, bocha e pesca. Todas essas atividades são realizadas através da integração das secretarias da Educação, Cultura e Turismo e Esporte e Lazer. Programa de Ação Comunitária - Assistência aos grupos já existentes (associação de moradores, comissão de moradores, comissão de centros comunitários) que atuam na área, através de técnicos e assistentes sociais. São realizados plantões nos bairros: Jardim São Marcos, Morada do Sol e Jardim Universo (periferia da cidade) Habitação - Assessoria núcleos habitacionais através de plantões e atendimento direto na Secretaria de Assistência Social. Atendimento às famílias residentes em bolsões de pobreza através do projeto Ação Solidária. Clube de Mães - Fundado no início dos anos 70, hoje o Clube de Mães conta com 18 grupos espalhados pela cidade, atingindo aproximadamente 400 mulheres que se reúnem semanalmente nos centros comunitários. O objetivo principal é o fortalecimento do associativismo, a convivência grupal, o desenvolvimento de trabalhos artesanais e a 517 Grupo de Estudo e Pesquisas em Política Educacional, Rio Claro, 06, 07 e 08 de julho de 2011 Vol. 3 (2011)

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educação de base, visando a participação ativa da mulher na vida em comunidade. Em 1993 foi criada a Associação dos Clubes de Mães de Valinhos que veio solidificar o sucesso do movimento social. Recanto dos Velinhos Estrada dos Ortizes, 1921 - Bairro dos Ortizes. Atende a 120 idosos que moram na entidade e recebem acompanhamento de psicólogos, enfermeiros, assistentes sociais e médicos. Realizam passeios, oficinas de musica e canto, visitas das escolas da cidade. Alguns salões de beleza da cidade oferecem cortes de cabelos, manicure e pedicure gratuitamente e voluntariamente em um mutirão que realizam uma vez por mês dentro do Recanto. Instituto Esperança I - Creche Rua F. Menegaldo, 210 - Santa Cruz Instituto Esperança II - Creche Rua Rio de Janeiro, 24 - Vila Santana - Fone: 3871 3154 Instituto Esperança III - Creche Rua Emídio Olívio Pavan, s/n. As três unidades atendem a 340 crianças de 4 meses a 5 anos gratuitamente. São mantidas pela prefeitura da cidade e algumas grandes empresas como Unilever e Rigesa. Creche Tia Nair Rua Antônio Nicolau, 84 - Bom Retiro - Fone: 3871 4893. Atende a 60 crianças de 3 a 5 anos. São mantidas pela prefeitura e grupos religiosos. Associação dos Pais e Amigos dos Excepcionais - APAE Rua Itália, 267. Atende a 50 pessoas, de todas as idades, moradoras da cidade e região, com acompanhamento medico, psicológico, assistente social, professores de educação física, musica, artes, fisioterapia. Desenvolvem muitos trabalhos artesanais que são vendidos no próprio local. Com boa infra estrutura também auxilia os pais e irmãos dos alunos para uma maior integração da família. Casa da Criança Rua Campos Salles, 2188 - Jd. América. Atende a crianças e adolescentes com risco de violência e abuso domestico. Ficam alojadas nesta casa para adoção ou retorno a sua própria casa conforme determinações da justiça. Tem capacidade para atender a trinta crianças. Em 2010, 11 crianças e adolescentes estão alojadas. Recebem tratamento odontológico, psicológico e muitas atividades 518 Grupo de Estudo e Pesquisas em Política Educacional, Rio Claro, 06, 07 e 08 de julho de 2011 Vol. 3 (2011)

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desportivas, artísticas e profissionalizantes. Existe uma condução própria que os acompanham em todos os trajetos de atividades escolares e de educação não formal. Círculo de Amigos dos Patrulheiros de Valinhos Rua Aníbal Lelis de Miranda, 86 Vila Embaré. Atende a 150 adolescentes com cursos profissionalizantes. A cidade de Valinhos dispõe de uma série de recursos públicos e particulares de formação de mão-de-obra para o mercado de trabalho local e da região. Os programas e cursos profissionalizantes mantidos pela Prefeitura são coordenados pela Secretaria de Assistência Social e Habitacional, que nos mostra os principais parceiros que oferecem cursos e programas na cidade: Serviço Nacional de Aprendizagem Industrial – SENAI Rua Americana, 498 .Início das atividades 1976, área de atuação: mecânica (ajustador mecânico e torneiro mecânico) e elétrica (instalador, enrolador de motores e comandos elétricos). Número de pessoas capacitadas: 27.000 Serviço Social da Indústria e Centro de Aprendizado Doméstico - SESI/CAD Avenida Independência, 314. Início das atividades 1973 - área de atuação: educação doméstica e artesanato, educação alimentar, educação em saúde e orientação em costura. Número de pessoas capacitadas: 35.000 Sindicato das Indústrias de Construção – Sinduscon Carteiro Escola de Profissionalização. Rua Piratininga, s/n. Início das atividades 1995 - áreas de atuação: construção civil (assentador de tijolos e blocos, revestidor de parede, assentador de azulejos e pisos cerâmicos) e eletricista instalador predial e residencial. Número de pessoas capacitadas: 2.000 Centro Municipal de Orientação ao Adolescente – CEMOA. Parceria com o Senac Campinas Rua João Moletta, s/n - bairro Lenheiro. Início das atividades 1984 - áreas de atuação: área social, pedagógica e profissionalizante. Número de adolescentes atendidos: 11.000 Programa Municipal de Profissionalização Nos centros Comunitários dos bairros - área de atuação: artesanato em geral, corte e costura,

higiene

e

beleza,

pintura

em

tecido,

tela

cerâmica

e

outros.

Número de pessoas capacitadas: 11.000 519 Grupo de Estudo e Pesquisas em Política Educacional, Rio Claro, 06, 07 e 08 de julho de 2011 Vol. 3 (2011)

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Curso de ensino da língua italiana desenvolvido em parceria com o Consulado Geral da Itália, atende 240 alunos da rede estadual de ensino em 3 núcleos. Projeto da Semana da Água desenvolvido anualmente em parceria com o Consórcio Municipal das Bacias dos rios Piracicaba e Capivari. Este ano será promovido em 11 escolas e atingirá 600 alunos, que receberão informações sobre os problemas e soluções dos recursos hídricos da cidade e região. No contexto do associativismo, realizamos um mapeamento na cidade de Valinhos-SP. Este mapeamento foi realizado por meio de pesquisas em sites da cidade, telefonemas e visitas aos locais indicados pela população. Foram identificados 82 entidades e instituições de associativismo. A divisão do associativismo foi realizada de acordo com a tabela de Salomon e Anheir (1997). Para a cidade, seguindo a classificação do INCPO, o destaque é na área de assistência e promoção social, como mostra a figura 3. Figura 3

Fonte: autora

Na cidade de Valinhos a Secretaria de Assistência e Promoção Social tem um destaque significativo. Elas são constituídas pelas associações de bairros e das cooperativas de agricultores. Segue um gráfico para demonstrar esta constatação. Os 31% de associações são classificados na figura 4.

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Figura 4

A Secretaria de Assistência Social e Habitacional incentiva a população e as empresas a participarem das atividades sociais. Assim, esta pesquisa é importante, pois poderá servir de apoio para os pesquisadores da categoria associativismo.

Referências Bibliográficas

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PLANO NACIONAL DE EDUCAÇÃO: POLÍTICA DE ESTADO OU DE GOVERNO?

Elisangela Maria Pereira Schimonek [email protected] Universidade Estadual Paulista ―Júlio de Mesquita Filho‖- Rio Claro

Maria Aparecida Segatto Muranaka [email protected] Universidade Estadual Paulista ―Júlio de Mesquita Filho‖- Rio Claro

Resumo: O presente trabalho objetiva apresentar as contradições e descontinuidades dos Planejamentos Educacionais no Brasil em virtude de mudanças governamentais, evidenciando uma concepção de Plano Nacional de Educação que se traduz enquanto política de governo e não como política de Estado. Considerando que um Planejamento Educacional constitui-se em um importante mecanismo de intervenção do Estado na educação, buscaremos evidenciar a relevância da mobilização e participação da sociedade civil na construção de um PNE assim como a necessidade do estabelecimento de processos de acompanhamento, avaliação e controle social na implantação do mesmo. Palavras-chave: PNE, Política de Governo, Política de Estado.

Introdução

O Planejamento Educacional, ao delinear diretrizes, finalidades, prioridades, metas e ações a serem cumpridas em um determinado período, constitui-se em um importante instrumento de organização e direcionamento das medidas a serem implantadas, sejam estas no âmbito dos sistemas ou das unidades escolares. Há de se reconhecer a importância do planejamento considerando-o não apenas sob o ponto de vista lógico-racional, mas nas suas relações com o contexto social, sob a ótica histórica, política, econômica e cultural. Assim, a elaboração de planos implica em disputas político-ideológicas por grupos com intencionalidades divergentes e conflitantes. Considere-se, ainda, que a mera existência de um plano não garante a sua 523 Grupo de Estudo e Pesquisas em Política Educacional, Rio Claro, 06, 07 e 08 de julho de 2011 Vol. 3 (2011)

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efetivação, pois por uma multiplicidade de fatores pode-se abrir um grande fosso entre o planejado e o concretizado. O foco deste trabalho foi posto no Plano Nacional de Educação. Embora aqui não sejam retomadas, consideramos a importância de se apreender as relações entre Lei de Diretrizes e Bases da Educação, Sistema Nacional de Educação e Plano Nacional de Educação explicitadas por Saviani (2008, 2010). No Brasil, dada a procrastinação em se constituir um sistema nacional de ensino (SAVIANI, 2011), somente na Constituição Federal de 1934 é que aparece pela primeira vez a determinação de que cabe à União fixar o plano nacional de educação, (art.150, a). Desde então, nesse campo foram tantas outras iniciativas, embora muitas interrompidas a cada troca de equipe de governo. O campo educacional historicamente tem mostrado a existência de grande descontinuidade de políticas em virtude de mudanças de governos e sendo o planejamento educacional um exercício de controle do Estado sobre a educação, este, via de regra, passa por modificações, quer sejam no plano de elaboração ou no da implantação, pois cada equipe quer consubstanciar suas próprias marcas, movidas pelos interesses de grupos que em um dado momento histórico mantém sua hegemonia. Recorrentes são as impressões de fracasso e de um recomeçar sem fim.

A descontinuidade das políticas, ofensiva à idéia de plano e o distanciamento da burocracia governamental das práticas escolares tornam as famílias e os docentes céticos e cansados quanto a promessas e proposições que não se cumprem e que recomeçam ao sabor do último gestor. (CURY, 2011, p.2).

Assim, ao longo da História da Educação Brasileira percebemos a prevalência de políticas de governo em detrimento de políticas de Estado, pois as políticas educacionais são radicalmente influenciadas pela hegemonia de interesses partidários e raramente por demandas coletivas concebidas a partir da participação democrática da sociedade civil. Para compreendermos o panorama de embates, disputas de interesses, contradições, continuidades e descontinuidades que permeiam o processo de construção de um PNE, traçamos uma breve retrospectiva histórica dos Planejamentos Educacionais no Brasil, com ênfase no PNE/2001 (Lei nº 10.172/2001), no Plano de Desenvolvimento da Educação e no PL nº 8035/2010, tendo como norte a questão: esses planos se caracterizam enquanto política de governo ou de Estado? 524 Grupo de Estudo e Pesquisas em Política Educacional, Rio Claro, 06, 07 e 08 de julho de 2011 Vol. 3 (2011)

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1. Planejamentos Educacionais do Brasil: aspectos históricos e políticos.

O Planejamento Educacional constitui-se em um instrumento político de grande relevância para a organização da educação de um país, sendo fruto de embates, disputas, e interesses que permeiam o seu processo de elaboração.

O Planejamento Educacional constitui uma forma específica de intervenção do Estado em educação, que se relaciona, de diferentes maneiras, historicamente condicionadas, com outras formas de intervenção do Estado em educação (legislação e educação pública) visando a implantação de uma determinada política educacional do estado estabelecida com a finalidade de levar o sistema educacional a cumprir as funções que lhe são atribuídas enquanto instrumento deste mesmo Estado. (HORTA, 1987, p. 195).

Dourado (2011, p17), destaca que a História da Educação Brasileira é marcada por disputas de projetos com concepções distintas de Estado e de planejamento, da relação entre os entes federados, da lógica de gestão e organização. Evidenciam-se embates entre os defensores do ensino público e os defensores do ensino privado, distintas visões de planejamento, bem como as discussões sobre proposição e materialização de planos nacionais e/ou setoriais de educação. Assim, a descontinuidade dos planejamentos educacionais em função de mudanças governamentais, imprimindo a sobreposição de políticas de governo em detrimento de políticas de Estado é recorrente. A primeira idéia de Plano de Educação surgiu em 1932, no Manifesto dos Pioneiros da Educação Nova, que definiu e traçou diretrizes gerais para a educação brasileira a partir do ―Plano de Reconstrução Educacional‖. Assim se expressaram os pioneiros:

[...] procuramos, antes de tudo, corrigir o erro capital que apresenta o atual sistema (se é que se pode chamar sistema), caracterizado pela falta de continuidade e articulação do ensino, em seus diversos graus, como se não fossem etapas de um mesmo processo, e cada um dos quais deve ter o seu ―fim particular‖, próprio, dentro da ―unidade do fim geral da educação‖ e dos princípios e métodos comuns a todos os graus e instituições educativas. (MANIFESTO, 2006, p.197).

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A primeira Constituição Brasileira a mencionar a necessidade da construção de um PNE foi a de 1934, influenciada pelos militares positivistas, desejosos de se construir uma nação ordeira e progressista pautada pelo conhecimento científico, apoiados pelos Pioneiros da Educação Nova de 1932 (CURY, 2011). Assim estabelece a Constituição Federal de 34:

Art. 150 - Compete a União: a) fixar o plano nacional de educação, compreensivo do ensino de todos os graus e ramos, comuns e especializados; e coordenar e fiscalizar a sua execução, em todo o território do País; [...] Art. 152 – Compete precipuamente ao Conselho Nacional de Educação, organizado na forma da lei, elaborar o plano nacional de educação para ser aprovado pelo Poder Legislativo e sugerir ao Governo as medidas que julgar necessárias para a melhor solução dos problemas educativos bem como a distribuição adequada dos fundos especiais. (BRASIL, 1934).

Desta forma, o CNE sob orientação do ministro Gustavo Capanema elaborou o PNE que foi denominado de ―Código da Educação Nacional‖, o qual, segundo Saviani (2000, p. 74), acabou sendo deixado de lado em razão do advento ―Estado Novo‖ em 1937, que manteve Getúlio Vargas no poder até 1945.

A intenção de Gustavo Capanema, ministro da Educação no governo Vargas, era elaborar inicialmente uma lei geral de ensino, para depois propor um plano de educação com o objetivo de orientar e controlar (racionalidade de controle político-ideológico) as ações educativas no país. Contudo, nenhum dos dois foi concretizado. (LIBÂNEO, OLIVEIRA, TOSCHI, 2005, p. 155).

Segundo Dourado (2011, p. 19), com o processo de redemocratização do Estado Brasileiro e a promulgação da Constituição Federal de 1946 retomam-se as discussões e ações na área de planejamento educacional. Horta (1997, p.158) destaca que a Constituição de 1946 ao atribuir à União a competência para legislar sobre as ―Diretrizes e Bases da Educação Nacional‖ secundariza a idéia de PNE, mas insere o país ―lentamente por etapas‖, na sistemática de planejamento setorial e global. Assim, a partir do Governo Juscelino Kubistchek com a implantação do Plano Nacional de Desenvolvimento (Programa de Metas) pela primeira vez afirma-se a vinculação educação-desenvolvimento.

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O período de 1946 a 1964 é marcado por duas tendências conflituosas: a do nacionalismo desenvolvimentista que definia como papel do Estado a responsabilidade de planejar o desenvolvimento do país, libertando-o da dependência externa e a dos privatistas que contrários à primeira tendência no que diz respeito à intervenção do Estado na economia e ao monopólio estatal do ensino, defendiam a liberdade da educação. Tais tendências influenciaram a elaboração da LDB de 1961, que sob a égide da Constituição Federal de 1946, contemplou em seus dispositivos a vinculação constitucional de recursos56. Assim, a LDB 4024/61 enfatizou a questão da distribuição de recursos públicos à educação, ao estabelecer a criação do Fundo Nacional do Ensino Primário, do Fundo Nacional do Ensino Médio e do Fundo Nacional do Ensino Superior, constituídos por nove décimos dos recursos federais destinados à educação. Assinale-se que pela LDB 4.024/61 a União deveria aplicar anualmente nunca menos de 12% da receita de impostos para a manutenção e desenvolvimento do ensino (art. 92). Coube ao Conselho Federal de Educação a responsabilidade de elaborar o Plano de Educação referente a cada fundo (art.92, § 2º). Um PNE foi elaborado em 1962, respeitando as diretrizes da LDB 4024/61. Tal plano foi constituído por um conjunto de metas qualitativas e quantitativas a serem atingidas em 8 anos e também definiu normas e critérios para a aplicação de recursos destinados à educação. Os planos que sucederam o de 1962 mostraram-se mais tentativas frustradas do que planos efetivos de educação, uma vez que as coordenadas de ação do setor eram obstaculizadas pela falta de integração entre os diferentes ministérios, especialmente em razão de a educação nunca ter sido prioridade governamental, a não ser nos discursos, e da descontinuidade administrativa que tem caracterizado os sucessivos governos. (LIBÂNEO, OLIVEIRA, TOSCHI, 2005, p. 156).

Com o Golpe Militar de 1964, inicia-se o período de ditadura militar, através do qual os militares passaram a governar o Brasil (1964 a 1985). Neste período imperou 56

A vinculação constitucional de recursos aparece pela primeira vez na Carta de 1934, suprimida na de 1937 e restabelecida na de 1946, embora com alíquotas diferentes daquelas constantes no texto de 1934. A CF/46 vinculava para a União 10% e para os Estados, Municípios e Distrito Federal 20% da receita de impostos.

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uma concepção tecnicista de educação e a responsabilidade da elaboração do Planejamento Educacional foi transferida dos educadores aos tecnocratas, ficando o Ministério da Educação subordinado ao Ministério do Planejamento. A Constituição Federal de 1967 aborda superficialmente o assunto PNE, mencionado somente no artigo 8º XIV que determina: ―Compete a União: [...] estabelecer Planos Nacionais de Educação e de saúde‖, não mencionando a que órgão competiria tal elaboração. A Lei 5692/71 consolida a subordinação citada anteriormente quando afirma:

Art. 53 O Governo Federal estabelecerá e executará planos nacionais de educação [...] Parágrafo único. O planejamento setorial da educação deverá atender às diretrizes e normas do Plano-Geral do Governo, de modo que a programação a cargo dos órgãos da direção superior do Ministério da Educação e Cultura se integre harmonicamente nesse Plano-Geral.

Diante do exposto, Saviani (2000, p.76) destaca que ―os planos para a área de educação decorriam diretamente dos Planos Nacionais de Desenvolvimento (PNDs) recebendo, por isso mesmo, a denominação de Planos Setoriais de Educação e Cultura (PSECs)‖. Com o fim da Ditadura Militar, inicia-se a Nova República (1986-1989), período caracterizado pela ―redemocratização‖ política do Brasil e a busca da estabilidade econômica. São elaborados, o I Plano Nacional de Desenvolvimento da Nova República e o Plano ―Educação para Todos‖ que expressavam as metas do Governo José Sarney para a educação, sendo ainda, definida a estratégia de repasses de recursos aos Estados e Municípios. De acordo com Adrião e Camargo (2007, p. 63) a década de 80 é marcada por relações mais democráticas: grandes movimentos grevistas, movimento das ―Diretas Já‖ pelo retorno de eleições para governantes, luta pelas liberdades democráticas, entre outras ações que configuraram um ―clima‖ de maior participação e democratização das várias esferas da sociedade brasileira, incluindo-se a organização do próprio Estado. Neste contexto é promulgada em 1988, a atual Constituição Federal do Brasil, que estabelece: Art. 214. A lei estabelecerá o plano nacional de educação, de duração decenal, com o objetivo de articular o sistema nacional de educação em regime de colaboração e definir diretrizes, objetivos, metas e

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III Seminário Internacional de Gestão Educacional estratégias de implementação para assegurar a manutenção e desenvolvimento do ensino em seus diversos níveis, etapas e modalidades por meio de ações integradas dos poderes públicos das diferentes esferas federativas que conduzam a: I - erradicação do analfabetismo; II - universalização do atendimento escolar; III melhoria da qualidade do ensino; IV - formação para o trabalho; V promoção humanística, científica e tecnológica do País. VI estabelecimento de meta de aplicação de recursos públicos em educação como proporção do produto interno bruto. (BRASIL, 1988).

Esta foi a Constituição Brasileira que mais aprofundou a idéia de PNE, traçando até algumas diretrizes para culminar na elaboração do mesmo. Em 1990, no Governo Fernando Collor, o Brasil participa da Conferência Mundial Sobre Educação Para Todos, em Jomtien (Tailândia), que propôs maior eqüidade social nos países mais pobres e populosos do mundo. Desta forma, de acordo com Oliveira (2001, p. 73) ―o Brasil, sendo signatário desta conferência, procurou implementar reformas nos seus sistemas públicos de educação básica em consonância com princípios da mesma‖. Assim, em virtude dos compromissos assumidos pelo Brasil nesta Conferência, no governo Itamar Franco é elaborado o Plano Decenal de Educação para Todos (19932003), objetivando traçar um diagnóstico do Ensino Fundamental, esboçar perspectivas, elencar as dificuldades a serem superadas, delinear estratégias adequadas para a universalização da educação fundamental e a erradicação do analfabetismo, indicando medidas e formas para a implementação. É importante destacar que como muitos dos planejamentos educacionais do Brasil, este Plano praticamente não saiu do papel, sendo abandonado com a posse de FHC, em 1995. Para Saviani (2000, p.78), ―o mencionado Plano foi formulado mais em função do objetivo pragmático de atender a condições internacionais de obtenção de financiamento para a educação, em especial aquele de algum modo ligado ao Banco Mundial‖. Convém ressaltar que o Plano Decenal de Educação não pode ser considerado um PNE, pois sua ênfase é posta no ―ensino fundamental‖, desconsiderando outros níveis e modalidades de ensino. A LDB 9394/96, aprovada no Governo FHC, aborda o PNE e assim estabelece:

I.

Art. 9º- A União incumbir-se-á de: elaborar o Plano Nacional de Educação, em colaboração com os Estados, o Distrito Federal e os Municípios; [...]

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III Seminário Internacional de Gestão Educacional Art. 87- É instituída a Década da Educação, a iniciar um ano a partir da publicação desta lei. §1º. A União, no prazo de um ano a partir da publicação desta Lei, encaminhará, ao Congresso Nacional, o Plano Nacional de Educação, com diretrizes e metas para os dez anos seguintes, em sintonia com a Declaração Mundial sobre Educação para Todos.

Segundo a LDB, o papel da União alinhada à política de governo em vigência, é o de regulação e coordenação da política nacional de educação, cabendo aos Estados e Municípios a função executora. Uma determinação muito instigante trazida à luz desta LDB, diz respeito ao §1º do Art. 87 que reforça a incumbência da União na elaboração de um PNE com diretrizes e metas em sintonia com a ―Declaração Mundial sobre Educação para Todos‖. Assim, assistimos as prescrições de organismos internacionais como a UNESCO e Banco Mundial, garantidos na Legislação Brasileira. O PNE/2001, O Plano de Desenvolvimento da Educação e o PL nº 8035/2010.

A atual LDB, no inciso I do art. 9º, determina como atribuição da União a elaboração do PNE em regime de colaboração com Estados, Distrito Federal e Municípios e no § 1º do art. 87 das Disposições Transitórias estabelece o prazo de um ano, a contar da data da publicação da lei, para que a União encaminhasse ao Congresso Nacional o PNE. O embate entre dois projetos em disputa marcaram a tramitação do PNE: o encaminhado pelo Executivo Federal e o PNE da Sociedade Brasileira subscrito por alguns deputados federais. O primeiro elaborado pelo Instituto Nacional de Estudos e Pesquisas (INEP) com a participação de alguns interlocutores como o Conselho Nacional de Educação e os presidentes do Conselho Nacional de Secretários de Educação (CONSED) e da União Nacional dos Dirigentes Municipais de Educação (UNDIME), coerente com as políticas educacionais e formas de gestão efetivadas no governo FHC. Assim, essa Proposta do PNE objetivava assegurar a continuidade das políticas educacionais em vigência e promover a articulação da União, Estados e Municípios para a sua implantação. O segundo projeto em disputa, o PNE da Sociedade Brasileira, protocolado na Câmara Federal antes mesmo do projeto do Executivo, foi elaborado com a participação da sociedade civil e consolidado na plenária de encerramento do Congresso Nacional da 530 Grupo de Estudo e Pesquisas em Política Educacional, Rio Claro, 06, 07 e 08 de julho de 2011 Vol. 3 (2011)

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Educação. Com isso, em defesa do caráter social da educação vinculada às reais necessidades da população, almejava-se resgatar a participação democrática da sociedade na elaboração das leis em colaboração com os seus representantes parlamentares. Os projetos apresentavam diferenças entre si e expressavam alguns interesses controversos, tanto na forma de elaboração quanto nas metas a serem cumpridas. De um lado tínhamos um projeto mais democrático e popular, de outro um projeto que melhor correspondia às diretrizes que norteavam o governo. Em 9 de janeiro de 2001, o Presidente FHC sancionou, com 9 vetos, a Lei 10.172/01, que aprovou o PNE. O texto aprovado evidenciou a grande distância entre o que a sociedade almejava para a educação e o que o Congresso de fato aprovou, confirmando a hegemonia do governo no Congresso Nacional. Assim se expressa Ivan Valente, um dos deputados que subscreveu o PNE da sociedade brasileira: O PNE, como lei, de conjunto não contempla as propostas e reivindicações dos setores democráticos e populares da sociedade. Ele é uma espécie de salvo-conduto para que o governo continue implementando a política que já vinha praticando. Vimos, também, que, como foi aprovado no parlamento este PNE já estava claramente comprometido, em sua validade, pelo traço de carta de intenções. Os vetos que FHC impôs à lei, além de radicalizarem tal característica, retiraram do PNE precisamente alguns dispositivos que a pressão popular havia forçado a que fossem inseridos. (VALENTE, 2001, p.7).

Os citados vetos referiam-se à ampliação de recursos destinados ao financiamento da educação prevalecendo desta maneira, uma política de racionalização de gastos do Estado, alinhada à lógica neoliberal em detrimento de uma lógica social. Assim, apesar da participação da sociedade civil na construção de um dos projetos do PNE, o Plano aprovado evidencia uma política de governo em detrimento de uma política de Estado, pois não considerou a ―vontade nacional‖, ou seja, as discussões tecidas e os anseios da sociedade por uma educação de qualidade. O PNE aprovado realiza um diagnóstico dos déficits educacionais do país e estabelece uma série de objetivos e metas para os diversos níveis e modalidades de ensino. Desta forma investimentos significativos deveriam ser realizados objetivando a melhoria da qualidade do ensino, mas o que assistimos foi uma política de contenção de gastos e de desresponsabilização do Estado, haja vista os 9 vetos de FHC referentes à aplicação de mais recursos na educação. Vetos que o governo Lula, em dois mandatos não derrubou. 531 Grupo de Estudo e Pesquisas em Política Educacional, Rio Claro, 06, 07 e 08 de julho de 2011 Vol. 3 (2011)

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O PNE/2001 previa no item 11.3.2 Gestão, meta 25. ―Elaborar e executar planos estaduais e municipais de educação, em consonância com este PNE‖,

A aprovação de planos estaduais e municipais, previstos no PNE como base para a sua organicidade, não se realizou como política concreta na maior parte dos estados e municípios e, desse modo, não contribuiu para o avanço da dinâmica de democratização do planejamento e da gestão da educação no país e para sua ratificação como política de Estado. (DOURADO, 2011, p. 30).

Assim, ao promover uma avaliação do PNE/2001, Dourado (2011, p. 37) enfatiza que o plano se configurou na qualidade de proposição como política de Estado, mas na prática, não se traduziu como mecanismo de regulação de Estado, capaz de nortear as diretrizes de planejamento, gestão e efetivação das políticas educacionais, como se espera de um plano nacional que contribua para o pacto federativo. Para evidenciarmos mais uma vez a descontinuidade de políticas educacionais em virtude de mudanças de governo, destacamos que recentemente, em plena vigência do PNE/2001, mais precisamente em março de 2007, o MEC divulga as linhas gerais do Plano de Desenvolvimento da Educação- PDE. Em abril do mesmo ano, o Ministro da Educação Fernando Haddad, lança o PDE como um programa articulado para a educação, com estratégias e um conjunto de atos normativos, que apesar de centrar no Ensino Básico, traz ações para outros níveis e modalidades. Dourado (2001, p. 37) destaca que no Governo Lula, não é considerada a base e a diretriz política central no planejamento e na implementação das ações educacionais. O PDE como um conjunto de programas traduziu as prioridades da política governamental e, nesse sentido, não se definiu como estratégia instrumental para o cumprimento das metas do PNE. A partir de seu lançamento, o PDE é alvo de elogios por priorizar uma educação de qualidade, mas também de muitas críticas pelo fato de não se constituir em um plano de fato, mas um programa de metas que traz consigo um aglomerado de ações distintas e desconexas, desconsiderando o diagnóstico da situação educacional brasileira e a fundamentação teórica, presente no PNE. Em junho do mesmo ano, o MEC publica o documento Plano de Desenvolvimento da Educação- razões, princípios e programas que enfatiza: O PDE oferece uma concepção de educação alinhada aos objetivos constitucionalmente determinados à República Federativa do Brasil [...] A

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III Seminário Internacional de Gestão Educacional razão de ser do PDE está precisamente na necessidade de enfrentar estruturalmente a desigualdade de oportunidades educacionais. Reduzir desigualdades sociais e regionais na educação exige pensá-la no plano do país. (BRASIL, 2007, p.6).

Entretanto, diferentemente dos processos de discussões desencadeados no âmbito da elaboração do PNE, com o envolvimento dos profissionais da educação, entidades sindicais e acadêmicas, o PDE não priorizou a participação da sociedade civil, fato este que vai contra os princípios do Partido dos Trabalhadores. O interlocutor privilegiado neste processo foi o grupo Compromisso Todos Pela Educação, constituído por empresários e representantes de fundações empresariais (Fundação Ayrton Senna, Grupo Pão de Açúcar, Fundação Bradesco, Instituto Gerdau, Fundação Roberto Marinho, etc.), que trazem para a educação uma concepção de gestão empresarial. Simultaneamente ao lançamento do PDE, é publicado o Decreto nº 6094 de 24 de abril de 2007, que dispõe sobre a implementação do Plano de Metas Compromisso Todos pela Educação. A lógica que embasa a proposta do ―Compromisso Todos pela Educação‖ pode ser traduzida como uma espécie de ―pedagogia de resultados‖: o governo se equipa com instrumentos de avaliação dos produtos, forçando, com isso, que o processo se ajuste às exigências postas pelas demandas das empresas. É pois, uma lógica do mercado, que se guia, nas atuais circunstâncias pelos mecanismos das chamadas ―pedagogia das competências‖ e ―qualidade total‖. Esta, assim como nas empresas, visa obter a satisfação dos clientes e interpreta que, nas escolas, aqueles que ensinam são prestadores de serviço; os que aprendem são os clientes e a educação é um produto que pode ser produzido com qualidade variável. (SAVIANI, 2007, p. 10).

Conforme Saviani (2007, p. 1233) o referido Plano surge como um grande ―guarda-chuva‖ que abriga todos os programas e ações em desenvolvimento pelo MEC. Na ocasião em que o Governo Federal lançava o PAC (Programa de Aceleração do Crescimento), cada ministério deveria apresentar as ações que fariam parte deste Programa. O MEC, então, aproveitou a oportunidade e lançou o IDEB (Índice de Desenvolvimento da Educação), agregando a ele as diversas ações que já estavam em andamento, ajustando e atualizando algumas delas. São ações que contemplam todos os níveis e modalidades de ensino, além de medidas de apoio e de infra- estrutura. O aspecto exaltado do PDE refere-se ao fato de sua singularidade e preocupação em atacar o problema qualitativo da educação brasileira, uma vez que até então, 533 Grupo de Estudo e Pesquisas em Política Educacional, Rio Claro, 06, 07 e 08 de julho de 2011 Vol. 3 (2011)

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mormente no Ensino Fundamental, a ênfase dada pelas políticas educacionais foi posta na questão quantitativa. Entretanto, tal qualidade é aferida por meio do IDEB. Outro ponto importante que o concebeu como um avanço deve-se ao fato do caráter pioneiro do MEC que assumiu o papel de executor de políticas educacionais, dialogando diretamente com os municípios, estabelecendo metas, firmando convênios e repassando recursos de forma a atender os municípios considerados prioritários pelo governo federal, em virtude de fragilidades socioeconômicas que refletem nas educacionais. Apesar disso, podemos afirmar que o PDE não é um Plano de Educação e sim um Programa de Metas e Ações, que desconsiderou o PNE em vigência; que foi concebido sem a participação da sociedade civil e teve como interlocutor privilegiado os empresários do Compromisso Todos pela Educação; não há clareza e informações sobre as fontes de recursos disponíveis para financiá-lo; prioriza a Educação Básica, desconsiderando outros níveis e modalidades de ensino; há grande ênfase às avaliações institucionais e ao controle dos resultados educacionais, responsabilizando as escolas quando não alcançam os índices desejados; os resultados das metas implementadas serão avaliadas somente em 2022. Desta forma, o MEC está perdendo a oportunidade de estimular a avaliação sobre a adequação das políticas e ações implementadas, protelando para o futuro a responsabilidade de avaliar a eficiência das políticas educacionais.

Historicamente, a ação governamental tem tido centralidade nas políticas educacionais, sobretudo as ações e os programas sem articulação com políticas mais amplas, que considerem a participação da sociedade como base constitutiva para a ação política de Estado. (DOURADO, 2011, p. 38).

Em 2008, tendo em vista a proximidade do término de vigência do PNE/2001, o MEC assume na Conferência Nacional de Educação Básica o compromisso de realizar a Conferência Nacional de Educação (CONAE), no período de 28 de março a 1º de abril de 2010. (BRASIL, 2010, p. 7). Para tanto, em 2009 é desencadeado um importante processo de mobilização social, a partir de Conferências Municipais ou Intermunicipais realizadas no 1º semestre e Conferências Estaduais e do Distrito Federal ocorridas no 2º semestre. Tais conferências contaram com a participação efetiva da sociedade civil: profissionais da 534 Grupo de Estudo e Pesquisas em Política Educacional, Rio Claro, 06, 07 e 08 de julho de 2011 Vol. 3 (2011)

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educação, associações, sindicatos, pais de alunos, alunos, comunidade em geral que debateram sobre as prioridades educacionais em cada esfera federativa. As propostas e prioridades oriundas de tais Conferências foram encaminhadas para a discussão na CONAE, realizada em 2010 no período supracitado, cujo tema central foi ―CONAE: Construindo o Sistema Nacional Articulado: O Plano Nacional de Educação, Diretrizes e Estratégias de Ação‖.

A CONAE cumpriu importante papel para a construção de políticas de Estado e assumiu a análise do PNE e das políticas educacionais em curso como objeto de discussão e de deliberação, para contribuir com a organização, a gestão e o planejamento na área educacional, pautando o PNE como política de Estado a ser construída. (DOURADO, 2011, p. 38).

O resultado final dos debates e do processo de mobilização social sobre a educação brasileira está compilado no Documento Final da CONAE, que apresenta as diretrizes, metas e ação para a política educacional nacional em todos os níveis, etapas e modalidades de ensino, constituindo-se em um importante marco histórico para a educação do país e conseqüentemente para a construção de políticas de Estado.

O Documento Final resultou de um rico processo de construção coletiva, desencadeado pela decisão política de submeter ao debate social as idéias e proposições em torno da construção do Sistema Nacional de Educação, que assegurasse a articulação entre os entes federados e os setores da sociedade civil. (BRASIL, 2010, p.7).

Tal documento deveria nortear o processo de elaboração do novo PNE para o Decênio 2011-2020, pois representava os anseios da sociedade civil que participou ativamente da elaboração coletiva de políticas de Estado, objetivando garantir o direito a uma educação de qualidade para todos. Assim, uma proposta de PNE (PL 8.035/2010) é elaborada e encaminhada pelo Executivo Federal ao Congresso Nacional e encontra-se em tramitação desde dezembro de 2010. Tal proposta está em consonância com o art. 214 da CF/1988 no que tange às diretrizes apresentadas e em seu anexo verificamos uma estrutura organizada em 20 metas e 150 estratégias.

O PL 8.035/2010 apresenta alguns avanços, sobretudo no estabelecimento de diretrizes e metas de universalização (dos 04 aos 17 anos), como requer a Constituição Federal, por meio da emenda constitucional n. 59/2009. Mas considera, por outro lado, que a proposta de plano não traduz o conjunto das

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III Seminário Internacional de Gestão Educacional deliberações aprovadas pela Conferência Nacional de Educação (CONAE), apresentando limites na organização, concepção de metas, articulação entre metas e estratégias, etc. (ANPED, 2011, p.17).

Diante do exposto observa-se, mais uma vez, que as proposições e expectativas da sociedade brasileira são desconsideradas em função do estabelecimento de políticas de governo. Além disso, diferentemente do PNE/2001, o PL nº 8035/2010 é omisso com relação ao diagnóstico da educação brasileira, não apresentando a análise acerca da situação educacional do país constante do Documento Final da CONAE. A CONAE oportunizou o debate social e elaboração de propostas em torno da construção do SNE, que assegurasse a articulação entre os entes federados e os setores da sociedade civil. Conforme enfatizado, o SNE foi o tema central da referida Conferência, entretanto ao retomarmos o PL nº 8035/2010 constatamos o tratamento superficial do assunto, não explicitando o objetivo maior do PNE como articulador do SNE em regime de colaboração, conforme determina o artigo 214 da EC nº59/214. Outro aspecto que merece destaque diz respeito ao financiamento da educação:

(...) o financiamento da educação é elemento central para se obter o cumprimento das metas quantitativas e qualitativas de qualquer plano de educação que se pretenda efetivo. Neste sentido, causa surpresa que os 10% do PIB de investimento público em educação, aprovados pela CONAE, tenham se transformado em 7% do PIB no Projeto de Lei. Mais do que isso, o Projeto não define o ritmo da ampliação dos investimentos, deixando para o remoto 2020 a meta que, no PNE 2001-2010, o país já deveria ter atingido nos idos de 2005, se não houvesse ocorrido o veto do então presidente (...) (CEDES, 2011, p. 2).

Observa-se ainda, a inclusão de metas e estratégias contrárias às deliberações da CONAE, como é o caso do incremento à ampliação do atendimento em creches por entidades beneficentes subsidiadas por recursos públicos e a presença velada de uma concepção meritocrática e tecnicista de avaliação curricular. Além disso, o Projeto confere uma concepção de educação não como direito, mas antes, comprometida com o mercado do trabalho. (CEDES, 2011). O referido PL apresenta em seu artigo 11 a continuidade do IDEB enquanto mecanismo de controle dos resultados.

O IDEB será utilizado para avaliar a qualidade do ensino a partir dos dados de rendimento escolar apurados pelo censo escolar da educação básica,

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III Seminário Internacional de Gestão Educacional combinados com os dados relativos ao desempenho dos estudantes apurados na avaliação nacional do rendimento escolar. (BRASIL, 2010)

Assim, constatamos que o IDEB continuará a ser utilizado como ―medida‖ para aferir a qualidade do ensino, inclusive são apresentadas a projeção das médias nacionais do IDEB no período de 2011 a 2021, sendo que a média ao final deste período para o ensino fundamental, deverá ser 6.0, conforme propõe o PDE. Ainda são previstos mecanismos de acompanhamento e publicização dos resultados do IDEB das escolas, das redes públicas de educação básica. Enfim, no que tange a implantação de sistemáticas de avaliação, assistimos a uma continuidade das diretrizes e procedimentos propostos pelo PDE. Logo, de acordo com Dourado (2011, p. 45) ―trata-se de um caso típico de garantia, no texto legal, de política governamental, centrada em exames e índices‖. Desta forma, o PL privilegia, ainda que subliminarmente, o modelo sóciopolítico hoje hegemônico e assim não atende às principais expectativas do processo da CONAE, levado a termo com enorme empenho para subsidiar a elaboração do PNE, a partir da concepção dos desejos da sociedade civil. (CEDES, 2011, p. 3).

Tudo isso mostra a importância de avançarmos na construção do PNE 20112010, de modo a garantir que ele seja expressão de políticas de Estado, balizadas pelo pacto federativo e pela regulamentação do regime de colaboração e cooperação entre os entes federados , como preconiza a CF de 1988. Faz-se necessário avançar, ainda, na instituição e consolidação de um sistema nacional de educação contribuindo para a garantia de educação pública, gratuita, laica, democrática, inclusiva e de qualidade social para todos/as e, desse modo, para a universalização do acesso, ampliação da jornada escolar e a garantia da permanência bem sucedida para crianças, jovens e adultos/as, em todas as etapas e modalidades. (ANPED, 2011, p. 17).

Daí a necessidade de reorganização da sociedade civil na luta para fazer valer as deliberações tecidas na CONAE, objetivando a concretização de um PNE como política de Estado, sem reduzi-lo à mera política de governo. Atualmente estamos vivenciando um importante processo de mobilização social como a rearticulação do Fórum Nacional em Defesa da Escola Pública e o envolvimento de várias entidades do campo educacional como a ANPED, ANFOPE, ANPAE, CNTE, CEDES, etc. que tem se dedicado à elaboração e proposições de emendas ao PL nº 8035/2010. 537 Grupo de Estudo e Pesquisas em Política Educacional, Rio Claro, 06, 07 e 08 de julho de 2011 Vol. 3 (2011)

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Considerações Finais

A História da Educação brasileira mostra que os Planejamentos e as políticas educacionais sofrem, ao longo dos anos, grande descontinuidade e não ganham concretude em virtude de mudanças governamentais. Desta forma, concluímos que estes são marcados e influenciados por políticas de governo em detrimento de políticas de Estado. Além disso, podemos afirmar que os Planos de Educação têm se constituído como ―letra morta‖ tendo em vista a inexistência de mecanismos de controle social: acompanhamento, fiscalização e avaliação das metas, diretrizes e estratégias.

Nesse

sentido, ressaltamos a importância e necessidade da mobilização social tanto no processo de elaboração quanto no monitoramento da implantação de um PNE.

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Eixo 4 – Reformas educativas e relações públicas e privadas na educação básica

ESTUDOS DE CASOS EM MUNICÍPIOS PAULISTAS COM SISTEMAS APOSTILADOS PARA O ENSINO FUNDAMENTAL I

Alessandra Aparecida Cain [email protected] Universidade Estadual Paulista

Resumo: Este trabalho investigou e analisou a implantação e as conseqüências das parcerias público-privadas em dois municípios paulistas na aquisição de sistemas apostilados. Partiu-se do pressuposto que, a política do governo estadual de Covas, ratificada nacionalmente pelo Fundo de Manutenção e Desenvolvimento do Ensino Fundamental e Valorização do Magistério, induziu a municipalização do ensino fundamental e em decorrência ampliou-se as parcerias público-privadas. Verificou-se que houve alterações nas políticas educacionais municipais, alterou-se o „loco‟ decisório quanto à seleção e organização dos conteúdos curriculares e quanto à formação docente. Palavras-chave: Municipalização, Parceria Público-Privada, Sistema Apostilado.

Introdução Este trabalho decorreu das reflexões produzidas na dissertação de mestrado em educação pela Unesp/Rio Claro, o qual partiu das hipóteses que a reforma da educação pública ocorrida no Estado de São Paulo, a partir da política do governo estadual introduzido no primeiro governo de Mário Covas (1995-1998) e ratificada nacionalmente pelo Fundo de Manutenção e Desenvolvimento do Ensino Fundamental e Valorização do Magistério (Fundef), induziu a municipalização da oferta educacional do ensino fundamental nos municípios paulistas e estimulou a ampliação de parcerias público-privadas entre a administração local e o setor privado na aquisição de sistemas apostilados (CAIN, 2009). A pesquisa teve por objetivo investigar e analisar a implantação e as consequências das parcerias público-privadas estabelecidas entre a administração pública municipal e a iniciativa privada, no estudo de dois casos intencionalmente selecionados: dois municípios, no Estado de São Paulo, na aquisição de sistemas apostilados, com adoção de um modelo pedagógico único para o conjunto de escolas que constituem suas redes de ensino. O período selecionado para a investigação correspondeu a série histórica 19972006, período em que no Brasil, e especificamente no estado de São Paulo, houve o 541 Grupo de Estudo e Pesquisas em Política Educacional, Rio Claro, 06, 07 e 08 de julho de 2011 Vol. 3 (2011)

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processo de descentralização da educação com a implementação do Fundef que redimensionou recursos para o atendimento do ensino fundamental. O estudo considerou um ano anterior e um ano posterior à implantação das parcerias público-privadas até o ano de 2006. No Município 1, a investigação se concentrou sobre o período de 2004 a 2006, nos anos de 2005 e 2006 houve a vigência da parceria entre a esfera pública e a instituição privada Sistema Objetivo Municipal de Ensino (Some) na aquisição de sistema apostilado; enquanto no município 2 a investigação se concentrou sobre o período de 2003 a 2006, nos anos de 2004 e 2005 a administração local firmou parceria também, com o setor privado Some, para aquisição de sistema apostilado, sob a forma de material didático apostilado. O procedimento teórico-metodológico compreendeu a análise bibliográfica referente à temática da pesquisa; a identificação do perfil dos municípios estudados, via levantamento de dados, informações e documentos oficiais sobre a população e o atendimento educacional; entrevistas semi-estruturadas com representantes das Secretarias Municipais de Educação, da direção e da coordenação pedagógica de escolas de ensino fundamental I (séries iniciais) e da empresa privada; análise da composição das despesas municipais em Manutenção e Desenvolvimento do Ensino - MDE. No trabalho, utilizou-se o termo parceria para representar a relação entre administração pública e setor privado que vai além de um simples ―contrato‖ de compra e venda, visto que se trata da transferência para o setor privado da função de elaboração e operacionalização de política pública até então oferecida pelo Estado, com vistas à concretização de objetivos de interesse público, e pelo conjunto de ações oferecidas pela iniciativa privada, a qual passa a manter uma relação constante com a administração pública parceira (BEZERRA, 2008). A pesquisa de mestrado foi parte constituinte do Projeto Interinstitucional intitulado ―Estratégias municipais para a oferta da educação básica: análise de parcerias público-privado no Estado de São Paulo, elaborado pelo Grupo de Estudos e Pesquisas em Política Educacional (Greppe), que integra pesquisadores da Unesp/Rio Claro, Usp/São Paulo e Usp/Ribeirão Preto, cujo pressuposto encontra-se na hipótese de que a implementação de parcerias é uma das conseqüências das medidas visando à reforma do Estado implantadas no país a partir dos anos de 1990, as quais propõe tanto a adoção da administração gerencial, quanto a transferência da oferta de serviços públicos para as esferas administrativas locais, e que o processo de municipalização do ensino fundamental no estado de São Paulo funcionou como forte indutor na ampliação de parcerias entre o setor público e privado nas etapas e modalidades de ensino sob responsabilidade municipal (ADRIÃO, 2007). Quanto a modalidade sistema apostilado foi encontrado um número considerável de municípios paulistas com parceria públicoprivada na compra de sistema apostilado para o conjunto de suas redes de ensino na série histórica 1997-2006, no estado de São Paulo, dos 645 municípios existentes, 127 municípios declararam ter firmado parcerias para aquisição de sistema apostilado para o ensino fundamental I, dois destes municípios aqui apresentados (CAIN, 2009).

Descentralização e municipalização do ensino brasileiro – debate pós 1988 A Constituição Federal de 1988 tornou os municípios entes federados, favorecendo que exercessem maior autonomia financeira e ratificando a competência 542 Grupo de Estudo e Pesquisas em Política Educacional, Rio Claro, 06, 07 e 08 de julho de 2011 Vol. 3 (2011)

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dos mesmos para elaborar leis de acordo com os interesses locais. E, após a Emenda Constitucional (EC) n.º 14/1996, que alterou alguns pontos na Constituição, quanto à educação, foi reconhecida a competência dos municípios para desempenharem funções compartilhadas com outras instâncias do poder público, prevalecendo o regime de colaboração para organizar os sistemas e os serviços educacionais públicos, fato que culminou na municipalização do ensino. Ainda, elevaram-se os percentuais dos recursos públicos destinados ao financiamento da educação pelas três esferas de governo (CAIN, 2009). No artigo 211, no parágrafo 1.º, ficou definido que a União organizará o sistema federal de ensino e dos Territórios, financiará as instituições de ensino públicas federais e exercerá, em matéria educacional, função redistributiva e supletiva, de forma a garantir equalização de oportunidades educacionais e padrão mínimo de qualidade do ensino mediante assistência técnica e financeira aos Estados, ao Distrito Federal e aos Municípios; no parágrafo 2.º ficou estabelecido que os municípios devem assumir, prioritariamente, o ensino fundamental e a educação infantil (BRASIL,1996). No âmbito federal, em 1995, foi criado o Ministério de Administração e Reforma do Estado (Mare) que elaborou o Plano Diretor da Reforma do Aparelho do Estado (PDRAE), houve a reforma administrativa, promovendo-se a mudança de uma administração pública burocrática para uma administração pública gerencial, instituindo conceitos de eficácia e eficiência, qualidade gerencial nos serviços públicos, a lógica passa a ser a do cidadão como cliente dos serviços prestados pelo Estado (ADRIÃO, 2006a; PERONI, 2003). Como decorrência dessa reforma do aparelho do Estado, foi instituído uma esfera pública não-estatal, onde público significou que se deve servir ao interesse público, não visando lucro, e não-estatal porque não necessariamente fazia parte do aparelho do Estado (ADRIÃO; PERONI, 2005). Nesse mesmo ano, no Estado de São Paulo, assumiu como governador o senhor Mário Covas (Partido da Social Democracia Brasileira – PSDB), cuja plataforma governamental estava centrada na modernização da gestão do Estado. Quanto às políticas públicas para a área da educação, houve ênfase no processo de municipalização do ensino fundamental. Foi na da primeira gestão do governador Covas que o processo de municipalização do ensino fundamental passou a ter uma curva ascendente significativa (ADRIÃO, 2006b; ARELARO, 1999; MARTINS, 2001). A Secretaria de Estado da Educação (SEE), ao tornar públicas as principais diretrizes educacionais para o estado de São Paulo, argumentava que a rede estadual constituía-se no grande provedor do ensino fundamental e médio, respondendo por 80% das matrículas; portanto, recaia basicamente sobre o estado os custos e encargos de proporcionar à população ensino fundamental obrigatório de oito anos, além da responsabilidade de manter e ampliar o ensino de 2.º grau. Ainda, segundo a SEE, os municípios atendiam prioritariamente à educação infantil, assumindo uma responsabilidade muito menor na manutenção do ensino paulista; ou seja, apresentavam o mais baixo índice de participação municipal no ensino fundamental em relação ao país como um todo. Enquanto nos demais estados os municípios arcavam em média com 35% desse grau de ensino, em São Paulo esse índice perfazia apenas 9,7% (CORTINA, 2000). Entre as ações desencadeadas pela SEE, na gestão Covas, podemos citar: cadastramento e informatização de dados sobre os alunos de todas as redes de ensino do estado de São Paulo, controlando matrículas, evitando duplicidade e racionalizando equipamentos; reorganização da rede de ensino estadual em nome da melhoria das 543 Grupo de Estudo e Pesquisas em Política Educacional, Rio Claro, 06, 07 e 08 de julho de 2011 Vol. 3 (2011)

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condições de trabalho e do ensino, da utilização do espaço físico e de materiais didáticopedagógicos de acordo com as diferentes faixas etárias atendidas; extinção de escolas rurais, transportando os alunos das áreas rurais até as escolas mais próximas; reforma administrativa da própria SEE, racionalização e informatização da mesma; reestruturação das Delegacias de Ensino (DEs) com o fechamento das unidades menores e a reunião de várias numa só, funcionando como centro de uma região; envio de recursos diretamente às Associações de Pais e Mestres (APMs) das escolas para compra de material escolar e didático; matrículas de alunos na 1.ª série a partir dos seis anos e seis meses; criação das classes de aceleração de estudos para correção de fluxo (idadesérie) como medida de combate ao atraso escolar; organização das séries em ciclos de quatro anos para o 1.º grau e instituição do Regime de Progressão Continuada na tentativa de reverter o quadro de evasão e repetência (CORTINA, 2000; MARTINS, 2001). Houve sintonia entre o governo estadual e o governo federal, desde 1995, no sentido de preparar o terreno para a municipalização do ensino fundamental, especialmente as matrículas de 1.ª a 4.ª séries; ao mesmo tempo em que o Ministério da Educação (Mec) aprontava a sua proposta de emenda constitucional que daria origem ao Fundef, a SEE lançava o projeto de reorganização da rede estadual. E acrescentam que, se o processo de municipalização em vários municípios ocorreu por indução ou adaptação à legislação, num movimento lento e gradual, em outros, a absorção de matrículas, em grandes proporções, deve ter sido motivada por concordância com a política educacional dos governos federal e estadual (BASSI; GIL, 1999). Em São Paulo, uma das medidas implementadas pelo governo estadual, com impacto direto na municipalização foi o Programa de Reorganização das Escolas da Rede Pública Estadual - instituído pelo Decreto n.º 40.473/1995 que reorganizou o ensino fundamental, reagrupando-o em dois ciclos de quatro anos cada um; o primeiro ciclo correspondendo aos quatro anos iniciais (ensino fundamental I) e o segundo aos quatro anos finais (ensino fundamental II). Cada ciclo funcionava em prédios diferentes, para cada um dos dois ciclos, sob a justificativa de que se deveria pensar em escolas para crianças e adolescentes (ADRIÃO, 2006a; 2007; MARTINS, 2001). Em 1996, o governo estadual paulista estimulou a transferência do ensino fundamental para os municípios através do Decreto n.º 40.673/1996 que instituiu o Programa de Ação de Parceria Educacional Estado-Município para Atendimento do Ensino Fundamental – Municipalização. Alegava-se que a parceria consistia numa ação conjunta entre estado e município no atendimento do ensino fundamental e sua implantação seria gradativa na assunção parcial ou integral da rede pública estadual e da gestão educacional (ADRIÃO, 2006a). Ainda em 1996, o governo federal instituiu a EC n.º 14/1996 (EC) e a Lei n.º 9.424/1996, que criou e regulamentou o Fundef, gerando um forte estímulo à municipalização do ensino fundamental, pois os recursos eram distribuídos entre os estados e seus respectivos municípios proporcionalmente ao número de alunos matriculados no ensino fundamental regular nas redes de ensino, considerando a diferenciação de custo por aluno, segundo os níveis de ensino e tipos de estabelecimentos: ensino fundamental I (1.ª a 4.ª séries) e II (5.ª a 8.ª séries), estabelecimentos de ensino especial e escolas rurais. O Fundef induziu as prefeituras a assumirem a responsabilidade pelo atendimento da oferta do ensino fundamental; o Fundo vigorou no âmbito de cada estado e do Distrito Federal, a partir de 1.º de janeiro de 1998, com duração de dez anos, perdurando até 31 de dezembro de 2006 (BORGHI, 2007). 544 Grupo de Estudo e Pesquisas em Política Educacional, Rio Claro, 06, 07 e 08 de julho de 2011 Vol. 3 (2011)

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À vista de priorizar a municipalização do ensino fundamental – texto da Constituição Federal (1988) e nova redação da EC n.º 14/1996 - o governo paulista iniciou um programa gradativo de municipalização, apoiado na adesão dos municípios; no qual os municípios assumiam, de forma parcial ou total, o ensino público da rede estadual e a gestão educacional. A SEE se comprometia a manter um processo contínuo de avaliação do sistema de ensino, visando apontar correções em tempo real; propunha, também, colocar pessoal à disposição, por tempo determinado, e transferir bens e imóveis. Em contrapartida, os municípios parceiros obrigatoriamente deveriam criar o Conselho Municipal de Educação (CME), previsto na Lei n.º 9.143/1995, elaborar o Plano Municipal de Educação (PME) e seguir as determinações da EC n.º 14/1996 (ADRIÃO, 2006a). Foi evidente o acelerado processo de municipalização da oferta educacional no ensino fundamental no Estado de São Paulo no período compreendido de 1995 a 2006, houve significativo aumento nas matrículas iniciais no ensino fundamental na rede municipal, apresentando, em 1995, o percentual de 10,9% e, em 2006, de 43,3; uma ampliação de 32,4% para o período apresentado (CAIN, 2009). Assim, pode-se inferir que o estímulo à municipalização do ensino fundamental no Estado de São Paulo vinculou-se a dois fatores preponderantes: no âmbito estadual, às medidas tomadas pela SEE, principalmente através do Programa de Municipalização, no âmbito nacional, à instalação do Fundef, que induziu a transferência da oferta obrigatória, inicialmente dos anos iniciais do ensino fundamental, para os municípios (OLIVEIRA, 2004). Um novo desenho institucional se formou na política educacional paulista em decorrência do convênio que transferiu professores, alunos, prédios escolares e funcionários da esfera estadual para os municípios. Considerando-se as enormes desigualdades regionais no tamanho, formas de atendimento, desempenho e capacidade fiscal dos municípios paulistas, originou-se não apenas um processo de municipalização, mas vários, pois cada município é um caso. A cultura institucional, sistema de crenças, valores e interação dos atores entre si e entre eles e a própria organização é instada a se modificar, incorporando o velho no novo desenho que se forma como estratégia de sobrevivência (MARTINS, 2003). Com a municipalização do ensino, os municípios passaram a assumir novas competências de gestão inéditas e a inventar formas de desempenho nas políticas educacionais, visando adquirir uma cultura burocrático-administrativa, financeira e pedagógica de acordo com as novas funções (ADRIÃO, 2007; MARTINS, 2003). Nesse sentido, o processo de descentralização da educação pública parece ter induzido a consolidação de parcerias entre os municípios paulistas e a iniciativa privada para a oferta educacional, como alternativa no atendimento da nova demanda assumida com a municipalização do ensino fundamental (ADRIÃO, 2007). Como exemplo, apresenta-se a aquisição de sistemas apostilados pelos municípios paulistas, visto nos casos estudados nesse trabalho. Estudos de casos em dois municípios paulistas com sistemas apostilados Nos estudos de casos realizados com dois municípios paulistas, observamos que as parcerias público-privadas foram firmadas através de contratos entre as prefeituras municipais e a iniciativa privada. Em ambos os casos, a parceria foi efetivada com o Sistema Objetivo Municipal de Ensino (Some) para aquisição de sistema apostilado para o atendimento do ensino fundamental I (1.ª a 4.ª séries). No 545 Grupo de Estudo e Pesquisas em Política Educacional, Rio Claro, 06, 07 e 08 de julho de 2011 Vol. 3 (2011)

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contrato os participantes têm interesses diversos e opostos; de um lado, está a administração pública que deseja um objeto de acordo (produto) com menor preço; de outro, a iniciativa privada que deseja o melhor preço possível – o contrato é celebrado entre administração pública e pessoas físicas ou jurídicas (SILVEIRA, 2008). Procedemos a uma breve análise referente às similaridades e diferenças nos estudos de casos (CAIN, 2009); destacamos que os dois municípios localizam-se na região centro-oeste do Estado de São Paulo e foram fundados em meados do século XX, ambos possuem Índice de Desenvolvimento Humano Municipal (IDHM) próximos: Município 1 0,786 e Município 2 0,782; entretanto, estão abaixo da média do estado de São Paulo que perfaz 0,814. O Município 1 é considerado um município de porte muito pequeno (até 10.000 habitantes) e o Município 2 de porte pequeno (10.001 a 50.000 habitantes) (IBGE, 2008). Os dois municípios não possuem Plano Municipal de Educação. Durante o período analisado, observou-se que o Município 1 possuía em sua rede municipal de ensino atendimento na educação infantil (duas escolas, uma creche e uma pré-escola) e no ensino fundamental I (uma escola - 1.ª a 4.ª séries) até o ano de 2007 estava organizada atendendo o ensino fundamental de oito anos. O ensino fundamental II (5.ª a 8.ª séries) e ensino médio pertencem à rede estadual de ensino (uma escola). Este município não possuía escola privada. Quanto ao Município 2, este possuía em sua rede municipal de ensino atendimento na educação infantil (sete, duas creches e cinco pré-escolas) e no ensino fundamental I e II (seis escolas, duas de ensino fundamental I - 1.ª a 4.ª séries, duas de ensino fundamental II - 5.ª a 8.ª séries e duas de ensino fundamental I e II - 1.ª a 8.ª séries). O ensino médio ficou a cargo do governo estadual. Neste município havia uma única escola privada que oferece educação infantil, ensino fundamental e médio. No Município 1 a Secretaria Municipal de Educação Cultura, Esporte, Turismo e Meio Ambiente foi criada em agosto de 2005, posteriormente à municipalização do ensino fundamental I. No Município 2 a Secretaria Municipal de Educação foi instituída em 1997, e não por coincidência, concomitante à municipalização das séries iniciais do ensino fundamental. Concebemos que esse evento esteja vinculado às novas funções assumidas pelos municípios e, consequentemente exigiu a reestruturação de departamentos visando atender às novas competências. Ambos não tiveram alterações em suas estruturas após a implementação das parcerias público-privadas na aquisição de sistemas apostilados. O Município 1 possui Sistema Municipal de Ensino, criado em 2005, ao contrário, o Município 2 não possui o Sistema próprio. Ressaltamos que a Constituição Federal de 1988, considerou o município como ente federado e estabeleceu em seu artigo 211 que a União, os Estados, o Distrito Federal e os Municípios deveriam organizar em regime de colaboração seus sistemas de ensino. Em ambos os municípios, não houve a elaboração do Plano Municipal de Educação. Ressaltamos que, a elaboração do Plano Municipal de Educação era tida pelo Programa de Municipalização como uma das ações compartilhadas entre as esferas estadual e municipal na implementação do mesmo; no convênio caberia à SEE prover assistência técnica para a consecução do programa, contudo, tal ação compartilhada não ocorreu. Nos dois casos, a criação do Conselho Municipal de Educação (CME) antecedeu ao processo de municipalização da oferta do ensino fundamental e a parceria públicoprivada estabelecida entre o poder público municipal e o Sistema Objetivo Municipal de Ensino (Some). No Município 1 o CME foi criado em 1998, e, no Município 2, o CME 546 Grupo de Estudo e Pesquisas em Política Educacional, Rio Claro, 06, 07 e 08 de julho de 2011 Vol. 3 (2011)

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foi criado em 1997, em cumprimento à legislação federal – Lei n.º 9.394/1996 (Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional - LDB). Tanto no Município 1 como no Município 2, a instalação do Conselho Municipal de Acompanhamento e Controle Social do Fundef ocorreu no mesmo ano, em 1998. No Município 1 a criação do Conselho do Fundef antecedeu à municipalização do ensino fundamental; no Município 2 a criação do Conselho do Fundef foi posterior ao processo de municipalização. A instalação do Conselho do Fundef visava atender as legislações federais: EC n.º 14/1996 e Lei n.º 9.424/1996. Em ambos, o Conselho do Fundef foi criado anteriormente à parceria entre a Prefeitura Municipal e o Some, concernente à aquisição de sistema apostilado. Acreditamos que tal medida legal contribuiu para a descentralização da política educacional para as esferas municipais, estimulando e induzindo os municípios ao processo de municipalização do ensino fundamental I. A municipalização do atendimento ao ensino fundamental aconteceu em anos distintos nos dois municípios; porém em ambos, os convênios foram firmados no mês de agosto, em meio ao ano letivo dos alunos, após o recesso escolar do mês de julho. No Município 1, o processo de municipalização do ensino fundamental I ocorreu em 1.º de agosto de 1999, a Prefeitura Municipal aderiu ao Programa de Ação de Parceria Educacional Estado-Município para Atendimento do Ensino Fundamental Municipalização, da SEE. Após o que, a oferta educacional neste município ampliou-se, pois a escola estadual com atendimento ao ensino fundamental I foi incorporada à rede municipal de ensino. No Município 2, a municipalização do ensino fundamental I aconteceu em 7 de agosto de 1997, com a adesão ao Programa de Municipalização o município assumiu as matrículas da única escola estadual que atendia o ensino fundamental I. Anteriormente, o município atendia somente a educação infantil e não possuía nenhuma matrícula no ensino fundamental I; passou então, a atender a educação infantil e o ensino fundamental I através de sua rede municipal de ensino. Em 2003, este município municipalizou o ensino fundamental II, extinguindo-se as matrículas estaduais para esta etapa de atendimento. Na municipalização houve a divisão das instalações da única escola estadual que atendia ao ensino fundamental II e o ensino médio. Um muro foi construído, dividindo a escola em duas; a escola estadual, que já existia, teve o seu espaço físico reduzido, e criou-se a escola municipal. A partir disso, o ensino fundamental neste município tornou-se totalmente municipalizado. Nos dois municípios, observamos que no processo de municipalização do ensino fundamental houve incorporação dos professores efetivos estaduais; estes professores passaram a atuar no ensino fundamental municipal através do convênio ao Programa de Municipalização, porém permaneceram como professores pertencentes ao Quadro do Magistério Público Estadual, a prefeitura municipal de cada município repassa ao governo estadual o pagamento destes professores que se vinculam à SEE. Posteriormente, para completar seus quadros de professores que foram ampliados devido ao aumento de matrículas, foram admitidos professores para cargo efetivo, através de concurso público municipal; e, no caso de substituições, foi realizado processo seletivo para contratação anual pelo Regime de Consolidação das Leis do Trabalho - CLT. Nos dois municípios, a direção da escola e a coordenação pedagógica das escolas municipais sempre foram ocupadas por indivíduos em cargos comissionados, nomeados pelos respectivos prefeitos, envolvendo pessoas pertencentes ou não ao Quadro do Magistério Público Municipal de cada município. 547 Grupo de Estudo e Pesquisas em Política Educacional, Rio Claro, 06, 07 e 08 de julho de 2011 Vol. 3 (2011)

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Ainda, em ambos, a municipalização do ensino fundamental precedeu a consolidação das parcerias público-privadas estabelecidas entre as administrações municipais e o Some. Os municípios se diferenciam quanto ao processo de elaboração de seus respectivos Planos de Carreira. No Município 1, o Plano foi elaborado a partir da mobilização de um grupo de professores efetivos municipais, que se reuniram periodicamente ao longo de um ano de discussões; em dezembro de 2003, foi aprovado e passou a vigorar o Plano de Carreira do Magistério. No Município 2, a discussão e elaboração do Plano foram coordenadas pela Secretaria Municipal de Educação, não houve a participação dos professores na elaboração deste, o Plano de Carreira e Remuneração do Magistério Público passou a vigorar em junho de 1998. Quanto às semelhanças, destacamos os seguintes aspectos: a elaboração dos Planos de Carreira foi posterior à municipalização das séries iniciais do ensino fundamental, no Município 1 o Plano foi elaborado após quatro anos; e no Município 2, após quase um ano; os Planos adotaram o regime celetista; as parcerias público-privadas foram implementadas posteriormente à aprovação dos Planos de Carreira, não houve interferência da instituição privada Some junto às administrações locais quanto a alterações nos mesmos. Podemos dizer que os Municípios 1 e 2 ao elaborarem seus Planos de Carreira do Magistério Público atenderam aos preceitos legais. Nos dois municípios a decisão de adotar o sistema apostilado partiu da administração pública municipal, no Município 1 a decisão partiu do prefeito municipal, porém houve consulta à equipe gestora e professores da rede municipal de ensino. No Município 2 a decisão partiu da Secretaria Municipal de Educação, de comum acordo com o prefeito municipal. As justificativas para tal medida, presentes nos depoimentos dos representantes do poder público foram: a necessidade de estabelecer uma diretriz pedagógica para o ensino fundamental, de organização sequencial de conteúdos para cada série e de melhorar a qualidade do ensino. Constatamos que, na municipalização, uma nova incumbência foi colocada para os municípios: o atendimento do ensino fundamental, trazendo para as mãos dos gestores locais a responsabilização pela oferta do ensino público nesta etapa; vimos, nos casos estudados, que as administrações locais buscaram o apoio da iniciativa privada como alternativa para responder às novas funções e demandas assumidas. Na descentralização da educação pública, via municipalização do ensino e implantação do Fundef, ocorreu a redistribuição de responsabilidades, delegando-se aos municípios novas funções e induzindo parcerias entre municípios paulistas e o setor privado (ADRIÃO, 2007; ADRIÃO; BORGHI, 2007; ADRIÃO; BORGHI; GARCIA, 2008). Nos dois municípios o material didático apostilado, a formação e os serviços prestados pelo Some seguiram um mesmo padrão. Ou seja, o material apostilado fornecido constava de um ‗kit‟ por aluno contendo duas apostilas organizadas por disciplinas (a disciplina de inglês vem em apostila separada), bimestralmente, e um caderno de orientação ao professor, também bimestral; ainda, traz cds, encartes e jogos de acordo com os conteúdos trabalhados nas apostilas. Os serviços prestados se referiram à formação pedagógica periódica voltada aos docentes e gestores; visita técnica pedagógica na escola – duas vezes ao ano: ao início do ano letivo e após recesso de julho; consulta pedagógica on line e atendimento 0800, e-mail ou contato telefônico. Observamos unanimidade nos relatos dos entrevistados quanto ao fato de que a assessoria pedagógica do Some teve por finalidade orientar os professores para o uso do material didático apostilado; também, que a adoção do sistema apostilado padronizou todo o ensino fundamental municipal I (conteúdos organizados em seqüência 548 Grupo de Estudo e Pesquisas em Política Educacional, Rio Claro, 06, 07 e 08 de julho de 2011 Vol. 3 (2011)

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programática e cronograma bimestral). No relato da representante da instituição privada o sistema apostilado foi definido como moderno e atualizado, com material apostilado de qualidade e elaborado por pessoal ―altamente‖ especializado, legitimando o privado como ‗melhor‘. Os depoimentos dos entrevistados se assemelham, também, quanto ao fato dos municípios optarem pelo sistema de ensino em detrimento ao livro didático, fornecido gratuitamente pelo Programa Nacional do Livro Didático (PNLD) do Mec. As justificativas são: a primeira opção solicitada na escolha dos títulos no PNLD não era contemplada; o livro didático do PNLD não era consumível; o sistema apostilado oferece uma educação de ―melhor‖ qualidade; a escola particular adota o sistema apostilado e ―deu certo‖; as escolas municipais seguem o mesmo ―caminho‖. Aparentemente, o discurso dos entrevistados pode levar-nos à depreensão de que a qualidade do ensino atrela-se à aquisição do sistema apostilado, somente. Sugerindo que esse material por si só bastasse, porém sabemos que é necessário considerar a formação do professor, a dinâmica das aulas, a infra-estrutura oferecida, entre outros aspectos que favorecem o processo ensino-aprendizagem. Nos dois casos, de acordo com os relatos dos entrevistados, as vantagens apontadas na aquisição do sistema apostilado mostraram-se semelhantes. No Município 1, os argumentos radicam na melhoria da qualidade da educação municipal, organização sequencial do trabalho em sala de aula, formação continuada aos professores e o fato de o material apostilado ser consumível. No Município 2, foram elencados os argumentos: ‗sistema‘ único para o conjunto de escolas municipais de ensino fundamental I, material gratuito aos alunos e sem custos aos pais, padronização de conteúdos curriculares para cada série. Como desvantagens apareceram, no Município 1 apenas um relato citando que alguns professores faziam da apostila uma ―bíblia escolar‖; no Município 2 foram apontados: o compromisso de cumprir a apostila até o final do bimestre, o fato de que nenhum sistema ser totalmente eficiente, o material não trazer atividades diversificadas para se trabalhar com alunos com dificuldades de aprendizagem. Constatamos nos casos, que as vantagens estavam diretamente relacionadas à possibilidade de uniformizar os conteúdos trabalhados nas escolas municipais. Pareceunos, nas entrevistas, que o discurso legitimado pelo setor privado foi incorporado pela gestão municipal, atribuindo à parceria com a instituição privada e ao material apostilado, ‗a responsabilidade pelo êxito no ensino público‘. Nos dois municípios a sistemática de avaliação do processo e dos resultados da parceria entre a administração pública e o Some foi realizada pelas equipes técnicas das secretarias de educação, através de acompanhamento contínuo da implantação do sistema apostilado junto às escolas de ensino fundamental I. Entretanto, verificamos que não houve uma sistemática formal de avaliação; os depoimentos revelam que as equipes técnicas estiveram presentes com regularidade nas escolas, acompanhando o trabalho dos professores com o sistema apostilado, e que observaram melhora no desempenho escolar dos alunos e na organização do trabalho docente. Para a representante da instituição privada do Some, a avaliação esteve centrada na boa aceitação do material apostilado por parte dos municípios conveniados, através de avaliações bimestrais do material apostilado, e das formações continuadas semestrais com os professores. Em ambos, os contratos de compra de sistemas apostilados tiveram como objetivos a oferta de material didático impresso e capacitação dos profissionais da educação. Nos documentos, as prefeituras municipais são representadas pelos respectivos prefeitos, a empresa pela mesma representante. Todos os contratos foram 549 Grupo de Estudo e Pesquisas em Política Educacional, Rio Claro, 06, 07 e 08 de julho de 2011 Vol. 3 (2011)

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realizados por meio de processo licitatório, as modalidades foram estabelecidas de acordo com o valor de cada contrato. No Município 1, no ano de 2005, na modalidade carta-convite; em 2006, na modalidade tomada de preços. No Município 2, em 2004, na modalidade tomada de preços; em 2006 foi prorrogado o contrato original. Os contratos se diferenciaram em dois aspectos: no Município 1, o preço do material didático anual por aluno/ano foi estabelecido em R$110,00 (2005 e 2006); no Município 2, em R$150,00 (2004 e 2005). Destacamos que, em 2005, os dois municípios eram atendidos pelo Some, com preços diferenciados no fornecimento do sistema apostilado. Ainda, no Município 1, previu-se que os custos referentes aos fretes pela entrega do material seriam custeados pela prefeitura, o que significou um custo adicional àquele previsto nos contratos (2005 e 2006); no Município 2 o frete de entrega do material estava incluso (2004 e 2005). Quanto à despesa total em Manutenção e Desenvolvimento do Ensino (MDE), no Município 1 constatou-se que esta foi gradativamente crescendo no período estudado, houve uma ampliação de 49,3%; com relação aos contratos de compra de sistema apostilado para o ensino fundamental I, em 2005, o valor deste correspondeu a 1,7% do total de despesa em MDE, e, em 2006, correspondeu a 2,6%, pode-se considerar baixos percentuais destinados à aquisição de sistema apostilado. No Município 2, a despesa total em MDE foi crescente, houve uma ampliação de 149% para o período, nos dois anos de vigência do contrato para aquisição de sistema apostilado para o ensino fundamental I e II manteve-se o mesmo número de alunos, em 2004, o valor do contrato correspondeu a 9,3% do total de despesa em MDE, e, em 2005, correspondeu a 7%, podendo-se considerar um percentual significativo. Algumas considerações Nos casos estudados, verificamos que houve alterações nas políticas educacionais municipais, em consequência das parcerias público-privadas firmadas entre as prefeituras municipais e o Sistema Objetivo Municipal de Ensino (Some) na aquisição de sistema apostilado sob a forma de material didático apostilado para o ensino fundamental I. Em ambos os casos, alterou-se o ‗loco‟ decisório quanto à seleção e organização dos conteúdos curriculares e quanto à formação docente, transferindo-os para a instituição privada; anteriormente à parceria, as decisões centravam-se no interior das escolas e nas respectivas secretarias municipais de educação. Podemos considerar que a municipalização da oferta educacional no ensino fundamental, levou os Municípios 1 e 2 à assunção de novas responsabilidades referentes ao ensino fundamental. Ainda, como alternativa para atender à demanda ocasionada por essas responsabilidades, os gestores locais buscaram o apoio na iniciativa privada. Assim, parece-nos pertinente apontar que o processo de municipalização do ensino induziu parcerias entre municípios paulistas e o setor privado na aquisição de sistemas de ensino apostilados, e, consequentemente houve alterações nas políticas educacionais municipais. Ainda, um aspecto importante que inferimos apontar é a necessidade de fortalecimento das equipes técnicas das secretarias municipais de educação no sentido de definir, articular, implementar e acompanhar as diretrizes educacionais para o conjunto de escolas de suas respectivas redes de ensino fundamental I. Referências bibliográficas 550 Grupo de Estudo e Pesquisas em Política Educacional, Rio Claro, 06, 07 e 08 de julho de 2011 Vol. 3 (2011)

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CAIN, Alessandra Aparecida. O atendimento ao ensino fundamental: análise de parcerias de dois municípios paulistas e o setor privado na aquisição de „sistema de ensino‟. 2009. 271 f. Dissertação (Mestrado em Educação). Universidade Estadual Paulista, Rio Claro, 2009. CORTINA. Roseana Leite. Política educacional paulista no governo Covas (19951998): uma avaliação política sob a perspectiva da modernização. 2000. Tese (Doutorado em Educação), Faculdade de Educação, Universidade de São Paulo, São Paulo, 2000. MARTINS, Ângela Maria. Autonomia e gestão da escola pública: entre a teoria e a prática. 2001 306 f. Tese (Doutorado em Educação). Faculdade de Educação, Universidade Estadual de Campinas, 2001. ______. Uma análise da municipalização do ensino no Estado de São Paulo. Cadernos de Pesquisa, São Paulo, n. 120, p. 221-238, nov. 2003. OLIVEIRA, Romualdo Portela. FUNDEF: uma análise preliminar. In Educação: Teoria e Prática. Vol. 12, nº 22, jan.-jun.-2004 e nº 23, p. 5-11, jul.-dez-2004. PERONI, Vera Maria Vidal. Breves considerações sobre a redefinição do papel do Estado. In: PERONI, V. M. V. Política educacional e o papel do Estado na Brasil dos anos 90. São Paulo: Editora Xamã, 2003, p. 21-71. ______. Educação pública e privada na Constituição Federal de 1988. In: ADRIÃO, T. ; PERONI, V. (Org.). O público e o privado na educação: interfaces entre estado e sociedade. São Paulo: Xamã, 2005, p.155-166. SILVEIRA, Adriana Aparecida Dragone. Algumas considerações sobre as normas do processo de licitação pública, contratos e convênios. In: Relatório técnico parcial. Projeto de pesquisa: Estratégias municipais para a oferta da educação básica: uma análise de parcerias público–privado no Estado de São Paulo. Processo nº 07/54207-4 (FAPESP). 2008. Mimeografado. Site consultado http://www. ibge.gov.br

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O PROJETO REALFABETIZAÇÃO NO MUNICÍPIO DO RIO DE JANEIRO: ANÁLISE DA RELAÇÃO PÚBLICO - PRIVADA NA EDUCAÇÃO Carla da Mota Souza [email protected] Universidade Federal Fluminense Antonio de Cistolo Ribeiro [email protected] USP- Universidade de São Paulo Lucy Teixeira [email protected] Universidade Federal Fluminense

Resumo: O objetivo da pesquisa é analisar a relação público-privada na educação, por

meio da política Municipal do Rio de Janeiro - Projeto Realfabetização. O Projeto é uma política pública fundada na parceria entre a Secretaria Municipal de Educação (SME) e o Instituto Ayrton Senna (IAS), com vistas à inclusão social de alunos não alfabetizados dos 4º e 5º anos do Ensino Fundamental. A metodologia usada será a análise documental e bibliográfica. O corpo conceitual da pesquisa se apóia nas concepções de Pierre Bourdieu, quanto aos conceitos de campo, habitus, ethos e capital. Palavras-Chave: Política Pública; Projeto Realfabetização; Relação público-privada.

INTRODUÇÃO Para se compreender a crescente atuação de instituições privadas com ou sem fins lucrativos na área educacional brasileira, deve-se remontar a história da educação através das constituições. Segundo Cury (2005) apud Lombardi et al (2005 p.4), o imbricamento entre os setores público e privado desde a Regência do Reino Português, na figura de D. João VI, através de um decreto assinado em 28 de julho de 1821. As Cortes Gerais Extraordinárias e Constituintes da Nação Portuguesa, considerando a necessidade de facilitar por todos os modos a instrução da mocidade no indispensável estudo das primeiras letras; atendendo a que não é possível desde já estabelecer, como convêm, escolas em todos os lugares deste Reino por conta da Fazenda pública; [.] da publicação deste em diante seja livre a qualquer cidadão o ensino e a abertura de Escolas de primeiras letras, em qualquer parte deste Reino, quer seja gratuitamente, quer por ajuste dos interessados, sem dependência de exame ou de alguma licença. Cury (2005) apud (LOMBARDI, et al, 2005, p. 4)

Nesse aspecto, fica notório que as políticas públicas educacionais no Brasil, em sua origem, mesmo ainda sob o domínio português, já nasceram entrelaçadas com o 553 Grupo de Estudo e Pesquisas em Política Educacional, Rio Claro, 06, 07 e 08 de julho de 2011 Vol. 3 (2011)

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setor privado. Outra reminiscência do passado, ainda vivenciada atualmente pelos brasileiros, é a ausência da definição da educação como setor prioritário no país. Somente na Constituição de 1934, já no governo de Getúlio Vargas, foi compreendido que a competência para traçar as diretrizes e bases da educação nacional seria exclusiva da União. Contudo, a lógica da parceria era amplamente alargada no mercado educacional, chegando o ensino, nos anos 1940, ministrado em estabelecimentos secundários, sendo considerado de caráter público, como exposto na lei orgânica n. 4244 de 19/04/42, no artigo 70, conforme destaca Cury (2005) apud Lombardi et al (2005 p. 19): As pessoas naturais e as pessoas jurídicas de direito privado, que mantenham estabelecimentos de ensino secundário, são consideradas como no desempenho de função de caráter público. Cabem-lhes, em matérias educativas, os deveres e as responsabilidades inerentes ao serviço público.

Por sua vez, a Constituição de 1946 foi o marco da ―redemocratização‖ do país, estabelecendo, em bases legais, o funcionamento das instituições privadas. Ressalta Cury (2005), entre outras palavras, que há uma retomada de responsabilidades por parte do Estado e uma regulamentação nos parâmetros legais a serem observados. Porém, com a LDB nº 4.024/61, onde era firmada a liberdade do ensino, (com a inspeção do sistema particular de ensino superior pela União) houve equiparação de prestígios legais. Dizia o artigo 19 da referida Lei: ―Não haverá distinção de direitos, entre os estudos realizados em estabelecimentos oficiais e os realizados em estabelecimentos particulares reconhecidos.‖ Com a Constituição de 1988, grandes avanços na área educacional foram conseguidos, embora entre questionamentos diversos. Todavia, é importante ressaltar o artigo 6º como o primeiro direito social listado; o artigo 205º que, afirma ser a educação dever do Estado, família e da sociedade; o artigo 206º, que entre outras palavras aceita o pluralismo de idéias e concepções pedagógicas e a coexistência entre as instituições públicas e privadas. Essa ―coexistência‖, segundo Cury (2005 apud Lombardi et al 2005 s.p.), significa compartilhar o espaço educacional com direitos iguais, buscado por pessoas diferentes. Portanto, tais interesses são conflitantes entre estes entes – Estados (governo) e Mercado (iniciativa privada) – evidenciando naturezas muito distintas. Observa-se na LDB de 9.394/96 uma desvinculação do termo ―concessão‖ para ―autorização e avaliação de qualidade‖, e nos artigos 3º e 7º explicitados verifica-se que a instituição privada pode auto-financiar-se. O estudo do Projeto Realfabetização se propõe neste sentido, a analisar as contribuições desta política de parceria entre SME e o IAS trazendo contribuições analíticas para o campo educacional. A temática ―Analfabetismo‖, enquanto campo de estudo e reflexões, não se constitui questão nova no Brasil. Dados atuais mostram que ainda se tem muito a fazer, já que uma parcela expressiva da população permanece analfabeta. Segundo a Pesquisa Nacional de Amostras por Domicílio (PNAD, 2009) houve uma queda pouco significativa no número de pessoas capazes de ler e escrever. O Brasil ainda tem 14,1 milhões de analfabetos entre a população com 15 anos ou mais, que representa 9,7% da população e 20,7% de analfabetos funcionais, ou seja, aqueles com até quatro (4) anos de estudos. A educação emancipadora, cidadã e democrática, só faz sentido com indivíduos capazes de mudar o próprio curso de suas histórias, como já dizia Freire (2000, p. 10): ―Talvez seja este o sentido mais exato da alfabetização: aprender a escrever a sua vida, 554 Grupo de Estudo e Pesquisas em Política Educacional, Rio Claro, 06, 07 e 08 de julho de 2011 Vol. 3 (2011)

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como autor e testemunha de sua história, isto é, biografar-se, existenciar-se, historicizarse‖. OBJETIVOS DA INVESTIGAÇÃO Objetivo Geral: Analisar a relação público-privada da política pública no Município do Rio de Janeiro, entre a Secretaria Municipal de Educação e o Instituto Ayrton Senna, mediante o Projeto Realfabetização. Objetivos Específicos i) Analisar a lógica da escolha do Instituto Ayrton Senna como parceiro público. ii) Investigar a parceria entre os setores públicos e privados, de acordo com os objetivos do Projeto Realfabetização. REFERENCIAL TEÓRICO Na história da educação brasileira, muitos projetos em parcerias público-privadas foram lançados como propostas de políticas de erradicação do analfabetismo. Entretanto, os resultados são malogros perante a atual realidade de 30 % da população analfabeta e/ou analfabeta funcional (PNAD) 2009. No caso específico desta pesquisa, usarei os conceitos de campo, habitus e capital cultural, aplicados na Teoria de Pierre Bourdieu, para mediar às análises investigativas e compreender como se fundam as parcerias entre os setores públicos e privados num país com bases capitalistas de produção. O autor afirma que, as relações sociais não se dão no vazio. Portanto, neste jogo de poder, conforme afirma Bourdieu, os agentes agem mediante regras fixadas para se jogar o jogo. Por certo em função do habitus, a Secretaria de Educação encontra respaldo para delegar a educação à gestão privada, isto porque as pessoas não podem ser reduzidas a meros objetos, visto agirem em função de suas crenças, percepções, sentimentos, valores e das regras que constituem o campo social. Assim sendo, Bourdieu ressalta que, Os campos são resultados de processos de diferenciação social, da forma de ser e do conhecimento do mundo e o que dá suporte são as relações de força entre os agentes (indivíduos e grupos) e as instituições que lutam pela hegemonia, isto é, o monopólio da autoridade, que concede o poder de ditar as regras e de repartir o capital específico de cada campo. (BOURDIEU, 1984, p. 114).

Verificamos, então, que as condutas dos sujeitos são orientadas de acordo com suas convicções e valores pessoais, sem que este processo seja consciente. Assim, não existe obediência cega às regras pré-estabelecidas e sim um jogo, onde o agente ―joga‖ conhecendo as regras, improvisando e recriando-as. Bourdieu (1990) ressalta o ―lado ativo do agente, que, apesar de internalizar as representações sociais, age sobre elas, não sendo apenas seu reflexo ou respondendo mecanicamente aos condicionamentos sociais‖. Afinal, os agentes constroem seu habitus nas diferentes experiências de socialização que vivenciam. Desta forma, para compreender as relações de parcerias entre a esfera pública e privada, faz-se necessário identificar as concepções ideológicas dos gestores públicos que estão à frente das decisões executivas. Portanto, torna-se 555 Grupo de Estudo e Pesquisas em Política Educacional, Rio Claro, 06, 07 e 08 de julho de 2011 Vol. 3 (2011)

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imprescindível analisar o campo político onde surgem as prioridades da agenda política, ou seja, o meio social circulante dos agentes, o capital cultural e simbólico dos atores públicos e privados envolvidos na gestão educacional. METODOLOGIA A metodologia a ser usada segue o viés qualitativo. A análise da relação públicoprivada está teoricamente fundamentada no corpo conceitual formulado por Pierre Bourdieu, notadamente nos conceitos de campo, habitus, ethos e capital. Campo da pesquisa Município do Rio de Janeiro Agentes da Pesquisa Secretária de Educação: Dra. Claudia Costin Presidenta do Instituto Ayrton Senna: Sra. Viviane Senna Instrumentos da produção de dados Entrevistas analisadas em sites, revistas, jornais, artigos, livros, legislação, documentos (fichas em arquivos e reportagens); banco de dados secundários da SME e observações. Análise dos dados Os dados em campo serão examinados por meio de triangulação proveniente da análise das entrevistas diversas nos diferentes meios de comunicação e análise documental, com a mediação da Teoria de Pierre Bourdieu. DESENVOLVIMENTO Para se analisar uma política pública, deve-se abarcar um conjunto de conceitos, lembrando que os mesmos estão em permanente (re) significação. Höfling define políticas públicas como sendo aquelas sobre as quais o Estado tem total responsabilidade quanto à implementação e manutenção a partir de um processo de tomadas de decisões que envolvem órgãos públicos e diferentes organismos e agentes da sociedade relacionados à política implementada. (HÖFLING 2001 s.p.) A autora ainda chama atenção, para as concepções que nortearão as ações do Estado, chamado por ela de ―questões de fundo‖. Estas são decisões, escolhas feitas, caminhos percorridos, modelos utilizados em relação a qualquer política pública. Por sua vez, Leher diz que: há necessidade de compreender o sentido operatório, por um lado, ele diz respeito às ―sociedades capitalistas‖, ou seja, às condições de vida materiais, ao sistema privado de produção. Por outro lado, implica os aparelhos ideológico-culturais da hegemonia, o aspecto educador do Estado. Finalmente, não pode haver sociedade civil sem determinação daquilo que constitui o seu fundamento: relações de produção.(LEHER 2008, p. 157)

Nesse sentido, Leher (2008) afirma que ao longo dos anos 1990, estas dimensões levaram a novos movimentos da sociedade civil, pregando o fim da centralidade do 556 Grupo de Estudo e Pesquisas em Política Educacional, Rio Claro, 06, 07 e 08 de julho de 2011 Vol. 3 (2011)

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trabalho na vida social, desvinculando o locus da dimensão econômico-social, propondo a ―terceira via‖ como opção de auto-ajuda para solucionar problemas sociais. Outro aspecto que surge na ótica dominante é a condição de ―parceria‖ entre o Estado e as Organizações Não-Governamentais – ONGs, ou ―terceira via‖, que passam a agir como empresas capitalistas, com flexibilidade, competitividade e todas as suas diretrizes voltadas ao mercado. Desta forma, torna-se importante compreender o terreno social em que as políticas públicas são concebidas, e com que propósito os governantes a elas se associam. O Instituto Ayrton Senna (IAS) é uma ONG e dela se originou o Projeto Realfabetização, que é uma adaptação do projeto ―Se Liga‖. Segundo o sítio do próprio (IAS), consultado no dia 28/11/2010, somente o Programa ―Se liga‖ já teria atendido 58.692 crianças e formado 4.784 educadores. O projeto encontra-se em todos os 26 estados, além do DF, sendo um total de 472 municípios contemplados até 2008. Os dados de 2009, no Município do Rio de Janeiro, foram publicados pela Secretaria de Educação. A Secretária de Educação, Dra. Claudia Costin afirma, entre outras palavras, que os 10.679 alunos foram alfabetizados e reenturmados em 2009, passando do Projeto Realfabetização para o Projeto Acelera Serva (1997) e Tenório (2002) afirmam (ambos os projetos do IAS), dando continuidade a sua alfabetização. Ainda segundo a Secretária cerca de 4.165 alunos dos 3º, 4º e 5º anos com defasagem idade/série, que não foram inseridos no Realfabetização de 2009, passaram a integrar uma nova turma de Realfabetização em 2010 57. Observase que no ano de 2010 o 3º ano do ciclo do Ensino Fundamental passou a integrar o Projeto Realfabetização. O IAS se enquadra na definição de ―terceiro setor‖. O termo é polissêmico, necessitando contextualizá-lo no tempo e espaço. Para a OAB, o ―Terceiro Setor‖ é o conjunto de organizações privadas, sem fins lucrativos, que realiza atividades complementares às públicas, buscando contribuir com a solução de problemas sociais (OAB, 2005). Dourado (2005), prefaciando Peroni e Adrião dize que, público, privado, estatal, comunitário, público não-estatal, terceiro setor, quase mercado, privado, porém público, dentre outras, que por vezes, objetivam apresentar tal embate por meio de simulacros, adjetivações, sem contribuir para avanços no tocante à apreensão de novos conteúdos políticoideológicos desse processo de complexificação e de disputas sociais.

Dourado (2008), apud (PERONI e ADRIÃO 2005 p.10 )

Tenório (2002 e Serva (1997) dizem que inicialmente, as organizações não governamentais tinham um caráter assistencialista, uma vez que estavam inteiramente ligadas a grupos religiosos. Atualmente, atende diversos ramos de atividades, como educação, saúde, defesa de minorias, cultura, meio ambiente, esportes, entre outros,

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Disponível em: (www.iepecdg.com.br/uploads/seminario/100520educacao_riodejaneiro.ppt. Acesso em 22.04.2011

557 Grupo de Estudo e Pesquisas em Política Educacional, Rio Claro, 06, 07 e 08 de julho de 2011 Vol. 3 (2011)

III Seminário Internacional de Gestão Educacional trazendo diversas inovações à configuração da sociedade civil. (TENÓRIO, 2002; SERVA, 1997).

A legislação reguladora das organizações do ―terceiro setor‖ propicia subvenções e isenção de taxas e impostos, pois elas atuam onde o governo deveria atuar, provendo as necessidades sociais (COELHO, 2000). Este pode ser um dos fatores que ajudam a compreender o porquê da expansão das ONGs no Brasil. Juridicamente, as organizações de Terceiro Setor são regidas pelo Código Civil (Lei n° 10.402/02) e constituídas sob a forma de associações e fundações. A expressão ―ONGs‖ é apenas uma das denominações utilizadas para designar essas instituições. Montaño (2008), entre, outras palavras, ressalta quatro contradições capitalistas do terceiro setor na relação público-privado. A primeira se refere à contradição da socialização da produção e a apropriação privada do seu produto. Nesta contradição o autor mostra que a produção se torna coletiva e pública e cada vez mais nas mãos dos capitalistas. A segunda é a falsa liberdade, igualdade e a justiça social, que pressupõe a desigualdade entre os indivíduos para os liberais, e propulsora do desenvolvimento social, ou seja, o livre mercado levaria as pessoas a se superarem em suas atividades profissionais e pessoais. A terceira diz respeito ao papel do Estado como instrumento de reprodução da ordem e garantidor da propriedade privada, assim como da acumulação capitalista e propulsor de desenvolvimento, contribuindo desta forma como alavancador da diminuição das diferenças uma vez que possibilita políticas sociais que reduzem as desigualdades sociais e ainda garantem a ordem social através de leis, decretos, entre outros meios institucionais, estabelecendo, desta maneira, a paz do sistema capitalista de produção. O que se percebe é uma precarização na qualidade de serviços públicos, considerada natural e motor do Estado. Esta desigualdade é considerada necessária e garante a prestação de serviço oferecido de forma direta ou indireta pelo Estado à população. Uma irresponsabilidade com o nome de descentralização das obrigações públicas; um mascaramento de direitos constitucionais sendo ofertados como benefícios para os trabalhadores. A quarta, por sua vez, diz respeito à setorização do Estado, do mercado e da transmutação da sociedade civil em terceiro setor. O autor sinaliza que a solidariedade individual- voluntária passa a ser usada em substituição da solidariedade sistêmica, ou seja, responsabilidades do Estado com as necessidades sociais. O altruísmo, solidariedade, participação, colaboração cidadã, são estimuladas e desta forma se estabelece o censo comum de que o terceiro setor é a solução.. No sistema de produção capitalista, onde as estratégias de superação se transmutam de tempos em tempos para se manter reinante, surgem novos tipos de relações entre os setores públicos e privados. São fenômenos mundiais que utilizam a educação para alavancar a lucratividade do capital. Segundo Peroni (2005), as estratégias de superação desta crise foram, principalmente, a estruturação produtiva, a globalização, o neoliberalismo e a ―terceira via‖. Analisando a estrutura produtiva – o toyotismo ou capitalismo flexível - se constitui de uma prática capitalista mascarada. São interesses metamorfoseados em forma de conceitos e práticas em prol da falácia da unificação do mundo do trabalho à educação, como redentora do fim dos conflitos de classes. Esta nova forma de organização e gestão aparece com um falso discurso socialista, que segundo Kuenzer 558 Grupo de Estudo e Pesquisas em Política Educacional, Rio Claro, 06, 07 e 08 de julho de 2011 Vol. 3 (2011)

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(2005) consiste numa concepção de indivíduo ―multi‖ para atender ao mercado de trabalho e na educação com a pedagogia das competências, tentando unir os conteúdos fragmentados ao mundo tecnológico automatizado entre teorias e práticas interdisciplinaridade. Mas o que de fato consegue é uma precarização maior do trabalhador, que se esvazia em suas tarefas simples, já que agora precisa apenas ―apertar botões‖ e mais complexas, porque exige conhecimentos múltiplos, além de um disciplinamento do indivíduo para que seja produtivo, colaborativo, que incremente a produção com criatividade e traga maiores lucratividade. O embate entre público e privado na educação passa ser mais acirrado. Com a onda de um mundo globalizado, a questão público-privada ganha uma nova dimensão, com termos genuínos para classificar e conceituar relações antigas, porém com novos contornos. Há um deslocamento no setor produtivo para o setor financeiro, agravando o desemprego e crises econômicas. A estratégia neoliberal é ―esclarecer‖ que não é o capitalismo que está em crise, mas sim o Estado, que gasta mais que arrecada, gerando inflação e, portanto, crise fiscal. Esta corrente neoliberal sugere a reforma do Estado com uma participação mínima nos gastos sociais e apresenta o mercado como alternativa para superação da crise. No campo educacional, a solução vem com a ―terceira via‖, que auxiliará ao Estado através de uma nova administração gerencial, para que se torne mais eficiente e produtivo. Vale apena ressaltar que o neoliberalismo propõe a privatização como solução à crise econômica. Os defensores neoliberais entendem que quando os cidadãos reivindicam políticas públicas e são atendidos, promovem crises fiscais, porque oneram o Estado, que se apresenta com recursos limitados para atendê-los. Então, propõe que o Estado seja o coordenador, fiscalizador das atividades praticadas pelo mercado. Nesta lógica, acabam restringindo os direitos democráticos dos cidadãos. Já a chamada ―terceira via‖, apesar de ratificar a crise por culpa do Estado ineficiente como os neoliberais, não comunga com o ataque à democracia, pelo contrário, sugere a participação ativa da sociedade civil no gerenciamento da ―coisa pública‖. O que propõe é o repasse de responsabilidades administrativas com o financiamento do Estado. Para ser mais claro: o Estado paga a conta e as ONGs gerenciam. Frigotto, 1984, em seu artigo ―Os delírios da razão: crise do capital e metamorfose conceitual no campo educacional,‖ entre outras palavras, vai dizer que no plano ideológico o neoliberalismo cria a falsa ilusão que, a crise do capitalismo é passageira e conjuntural. Crença que a relação capitalista é a única forma de relação historicamente possível. Hayek (1987), diz em sua tese, que o princípio e a busca da igualdade social leva à servidão. Esta tese é hoje a base teórico-ideológica do neoliberalismo, modelo amplamente utilizado pelo Estado brasileiro. Com a avaliação arbitraria influenciada pelos órgãos internacionais, o Brasil passou a adotar o padrão ―Qualidade Total‖ nas escolas. Essas passam a ser gerenciadas com visão empresarial, como aponta Peroni (2008), em trabalho realizado no Rio Grande do Sul. A autora mostra às bases conceituais que balizam o ―trabalho pedagógico‖ do Instituto Ayrton Senna – Pedagogia do Sucesso -, de autoria de João B. de Oliveira. Segundo este autor, o problema da administração pública no Brasil se concentra no gerencialismo, principalmente na área educacional. Portanto o foco a ser perseguido para o sucesso educacional, segundo Oliveira (2000 p.66) apud Peroni e Adrião, 2008) Ainda segundo Peroni (2008, p. 115) 559 Grupo de Estudo e Pesquisas em Política Educacional, Rio Claro, 06, 07 e 08 de julho de 2011 Vol. 3 (2011)

III Seminário Internacional de Gestão Educacional a gestão educacional é fortemente influenciada pela ideologia de que o mercado é parâmetro de qualidade, o que leva muitos sistemas públicos a buscarem parceria com instituições que vendem produtos com promessa da qualidade. .

De outra maneira, a autora quer afirmar que na década de 1990 corroborando os estudos até aqui apresentados-, que o papel do Estado e sua materialização nas políticas públicas de educação têm mostrado o repasse das obrigações do Estado à sociedade, esvaziando-se de seu poder no que tange aos Parâmetros Curriculares Nacionais (PCN), assim como os projetos avaliativos, que passaram ser terceirizados. Num primeiro momento poderia se pensar num Estado mínimo; mas ao contrário o que se observa é um Estado atuante, porque ao mesmo tempo em que se descentraliza, cria espaço para a ―terceira via‖. A autora faz a seguinte citação: Constatamos aqui, mais uma vez, a contradição centralização/descentralização, já que os PCN e a avaliação foram centralizados, como já mencionamos, como uma forma de controle, mas ao mesmo tempo eles foram descentralizados, entendendo descentralização como terceirização e não como participação e controle social dos setores representativos da área da educação. Apontamos, ainda para os riscos de que os próximos estágios sejam a publicização e a privatização no sentido estrito. (PERONI, 2003, pp. 179; 116).

Segundo Peroni (2008), a história do IAS está ligada ao Centro de Ensino Tecnológico de Brasília (CETEB), uma instituição jurídica de direito privado, assistencial e filantrópica, sem fins lucrativos. Ainda segundo a autora o Programa Aceleração da Aprendizagem, instituído pelo CETEB em 1985, teve seu material didático desenvolvido pelo convênio com a Fundação Desenvolvimento de São Paulo e financiada pelo MEC, e foi amplamente utilizado no país. Como nenhuma relação se constitui no vazio, há de se pesquisar o meio onde as pessoas públicas circulam, pois o entendimento de parcerias poderá ser explicado, em parte, pelo conhecimento prévio deste caminhar profissional. Claudia Costin, a atual Secretária de Educação do Municipio do Rio de Janeiro, implantou o Projeto Realfabetização na Rede de Ensino do Município para corrigir distorções educacionais dos alunos do 4º e 5º anos não alfabetizados. O Projeto é uma parceria com o Instituto Ayrton Senna, que foi nomeado como Projeto Realafabetização, mas que segue a cartilha e toda a metodologia do Programa ―Se Liga‖de autoria do próprio Instituto. Algumas pequenas adaptações foram feitas para poderem atender as especificidades do Município. A Secretária de Educação, através de uma avaliação (Prova), detectou quais alunos deveriam participar do Projeto e os conduziu para uma nova turma, onde os alunos foram submetidos a uma ―nova metodologia‖ e os professores capacitados pelo IAS afim de prepará-los e alfabetizá-los para seguir a turma de origem após dois anos de estudos entre os projetos do IAS: ―Se Liga‖ e ―Acelera‖. Entre os cargos assumidos durante sua vida profissional, a Secretária de Educação foi vice-presidente da Fundação Vitor Civita, que abrange a Editora Abril. Entre seus produtos, se encontra a revista Nova Escola publicada desde março de 1986. 560 Grupo de Estudo e Pesquisas em Política Educacional, Rio Claro, 06, 07 e 08 de julho de 2011 Vol. 3 (2011)

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A revista conta com apoio institucional do governo federal, que permite sua venda a baixo preço e distribuição para a rede escolar. Até o ano de 1996, a revista publicava nove exemplares ao ano. No entanto, partir de 1997, passou à tiragem de dez edições anuais. A revista instituiu o Prêmio Victor Civita ―Professor Nota 10‖, que agracia trabalhos pedagógicos anualmente58. A Secretária também foi gerente de políticas públicas do Banco Mundial e Ministra da Administração Pública e Reforma do Estado do governo de Fernando Henrique Cardoso, dentre outros cargos políticos. Com isto queremos enfatizar que nenhuma relação se dá no vazio, e sendo assim, este Projeto encontra na mulher pública seu habitus, ou seja, a justificativa de suas ações públicas e suas convicções ideológicas e práticas, lembrando que: o número de práticas fenomenalmente muito diferentes organizam-se objetivamente, sem ter sido explicitamente concebidas e postas com relação a este fim, de tal modo que essas práticas contribuem para a reprodução do capital possuído. Isto porque essas ações têm por princípio o habitus, que tende a reproduzir as condições de sua própria produção, gerando, nos domínios mais diferentes da prática, as estratégias objetivamente coerentes e as características sistemáticas de um modo de reprodução (Disponível em http://www.espacoacademico.com.br/024/24cneves.htm. Acesso em

03/2011) Viviane Senna, por sua vez, é a presidenta do IAS e os professores que integram seu Instituto, foram orientados pela Pitágoras TEC, empresa de educação do Grupo Pitágoras, por meio de programa de treinamento à distância, denominado ―Capacitar,‖ seguindo a lógica de gestão empresarial. O IAS exerce influência na educação em todos os estados brasileiros e no DF, onde já atendeu cerca de 11.640.930 crianças e jovens, já formou 553.512 educadores e já investiu R$ 203.000.000,0059. O IAS aponta como problema central a qualidade educacional por ineficiência na gestão. Este problema é assim descrito no site da instituição: Dados da realidade educacional brasileira, no entanto, nos mostram o freqüente insucesso do processo de alfabetização, sobretudo nas primeiras séries, [..] a idade dos alunos e a série que deveriam cursar. Além disso, os sistemas educacionais não operam suas redes com foco nos resultados dos alunos, o que configura um problema de gestão 60.

O IAS possui um sistema de informações sobre os dados educacionais, o Sistema Instituto Ayrton Senna de Informações (Siasi). Peroni, (2008) esclarece que para os municípios manterem seus dados cadastrais no Siasi, pagam por este serviço. A 58

Disponível em (http://www.claudiacostin.com.br/interna.php?cat=10&artigo=47). Acesso em Abril/2011

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Dados disponíveis em http://senna.globo.com/institutoayrtonsenna/ . Acesso em 21/04/2011.

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Dados disponíveis em http://senna.globo.com/institutoayrtonsenna/ . Acesso em 21/04/2011.

561 Grupo de Estudo e Pesquisas em Política Educacional, Rio Claro, 06, 07 e 08 de julho de 2011 Vol. 3 (2011)

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autora questiona que não faz sentido os municípios pagarem para atualizarem seus dados escolares. Ela ainda comenta que o banco de dados desta instituição é invejável. A autora ainda esclarece que o Instituto vive de doações de empresas, que muita das vezes são isentadas de impostos fiscais (34%), que passariam para educação, e dos royalities do licenciamento das marcas Senna, Seninha e Seninha Baby, e da imagem do Ayrton Senna, doados pela família do piloto. Outro questionamento muito pertinente que Peroni (2008) levanta diz respeito ao ―Programa Nota 10‖, onde o Instituto elenca e acompanha as responsabilidades gerenciais de governadores, prefeitos, secretário de educação, diretor e superintendente escolar, além do coordenador ―gestão nota 10‖. Num país dito democrático, como pode uma instituição pública, (onde os homens públicos, foram eleitos pelo povo), submeter-se a regras privadas? Uma gestão democrática não se constitui com imposições do setor privado ao público. Onde está a participação dos atores interessados neste setor? Para Dale (1994, p.112 apud PERONI, 2008 p.122) ―... é a lógica do privado redefinindo o público.‖ CONCLUSÃO Como a pesquisa não está totalmente concluída, apresentamos neste tópico os resultados parciais já encontrados. A presente pesquisa não pretende esvaziar o assunto, mas problematizá-lo mostrando as relações corporativas e suas práticas hegemônicas na sociedade civil ativa. O Estado, ao mesmo tempo em que cria condições, através de sua ineficiência política, administrativa e econômica, para gerir o bem público, cria também condições para que ONGs circulem ovacionadas dentre os setores estatais. O IAS é uma delas, que na educação tem sido visto como ―tábua de salvação‖ para erradicar o analfabetismo brasileiro. A pesquisa mostra a relação favorável que o Instituto goza junto à sociedade civil e os benefícios lucrativos que coleciona com o marketing social. Desta forma, é vista como uma instituição que tem responsabilidade social, mas que lucra com a venda de produtos/serviços, vinculadas à marca Senna. Por exemplo, a marca Senninha vende bonés, camisetas, chinelos, perfumes, dentre outros produtos para o Brasil e o mundo. Caso o IAS fosse uma empresa comercial, pagaria impostos que poderiam ser revertidos à educação, sem contar os impostos que deixam de ser cobrados de empresários que apóiam o Instituto, ―doando‖ vultosas quantias. Legalmente o IAS é isento de pagar impostos por estar atuando numa área de obrigação do Estado. A atuação é marcante, pois se encontra nos 26 estados da Federação. Estas ONGs geram inúmeros empregos no sistema de terceirização. Desta forma, garantem a empregabilidade de inúmeros trabalhadores que se encontravam ociosos no mercado de trabalho, porém precarizam determinados direitos já adquiridos em outros regimes. Esta situação faz com que os trabalhadores apóiem as ONGs como uma saída para a empregabilidade. Analisando o setor público na figura do Município do Rio de Janeiro quanto aos direitos do professor que realiza a chamada ―Dupla Jornada‖, observamos que os mesmos trabalham muitas vezes doentes, pois sabem que neste regime não têm seus direitos garantidos de forma remunerada. Este sistema é lucrativo para o governo, que prefere ―contratar‖ profissionais da própria rede, porque deixa de recolher impostos previstos por lei. Em contrapartida os professores por receberem salários baixos, optam por trabalharem de forma precarizada e manter um acréscimo em seus ordenados no 562 Grupo de Estudo e Pesquisas em Política Educacional, Rio Claro, 06, 07 e 08 de julho de 2011 Vol. 3 (2011)

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final do mês. Percebemos que neste sistema a qualidade educacional só tende a piorar, porque não existe tempo para o docente se qualificarem e nem condições financeiras para tal. Trata-se, portanto, de uma precarização contundente do trabalhador, que refletirá diretamente nos educandos de hoje e trabalhadores do futuro. Tanto o Estado quanto os agentes da ―terceira via‖ se beneficiam de uma estrutura ineficiente na educação, porque os interesses se coadunam entre responsabilidades repassadas e lucratividade garantida. A concepção liberal de Estado se concentra na fragmentação dos poderes públicos. O Estado ora se apresenta como mediador de conflitos entre classes, mas na ótica neoliberal se estabelece como facilitador da ordem do grande capital. Um papel mascarado, como diz Leher (2008), com caráter educador ideológico-cultural de determinados grupos hegemônicos no poder. O que existe na rede municipal de educação do Rio de Janeiro é uma grande cesta de projetos que se desdobram dificultando o entendimento de qualquer pessoa. Os alunos que participaram em 2009 do Projeto Realfabetização foram conduzidos para o Projeto Acelera 1 ou reenturmados nas suas salas de origem. Os que não retornaram às turmas originais, foram conduzidos para o Projeto Acelera 2, que é o―Autonomia Carioca‖ desta vez ligado a Fundação Roberto Marinho, não mais do Instituto Ayrton Senna. O importante é ressaltar que estes alunos agora estão cursando o correspondente aos 7º e 8º anos com uma estrutura totalmente diferenciada até aqui, no Sistema Educacional do Município do Rio de Janeiro. Estes alunos numa lógica de inclusãoexcludente estão freqüentando vários projetos e diminuindo a estatística do analfabetismo, mas o que ocorre de fato é uma irresponsabilidade com a educação destes jovens adolescentes, que permanecem excluídos do mundo letrado, uma vez que não consolidaram conhecimentos pertinentes ao seu desenvolvimento enquanto educandos. Dados estatísticos mascaram esta realidade fundada em parcerias. A parceria entre a SME e o IAS se configura como uma união cínica, onde a lógica de premiação fica patente e instiga o rankiamento entre as escolas. Esta é uma questão preocupante que pode levar à educação a resultados mascarados estatisticamente e fundamentalmente permanecer de péssima qualidade. O IDEB escolar foi atrelado a metas para cada unidade de ensino e aquelas escolas que atingiram o percentual estabelecido, foram contempladas com premiações entre o corpo docente. O prêmio é o 14º salário. Tal fato pode ter gerado maiores distorções à Educação, tendo em vista que professores antiéticos que gerenciaram os resultados das provas dos discentes garantiram notas melhores no IDEB e desta forma ganharam o 14º salário também61. Neste sentido, a educação, como legitimação compensatória, é levada a atender a demanda do capitalismo, que cada vez mais utiliza um discurso social e cada vez mais precariza o aluno de hoje e trabalhador do futuro, na lógica de uma ―inclusão excludente‖, onde a escola cria e propaga as bases para garantir o funcionamento do sistema de produção com reserva de mão-de-obra barata. Portanto, esta relação, que chamo de―comensalista‖ entre a terceira via e o Município, deve ser revista constitucionalmente, pois a educação é um bem prioritário à formação humana, que ajuda garantir bases democráticas, porque desmascara falsas 61

Vide http://odia.terra.com.br/portal/educacao/html/2009/7/14_salario_so_para_os_assiduos_21026.html.

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ideologias e portanto não pode ficar a mercê de interesses capitalistas como aqui bem fundamentados. Esta análise projetada, conclui que o aluno de hoje e trabalhador do futuro, neste sistema educacional vigente, dará continuidade ao sistema exploratório nos marcos das concepções neoliberais.

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RELAÇÕES ENTRE MUNICIPALIZAÇÃO DO ENSINO FUNDAMENTAL E ADOÇÃO DO SISTEMA PRIVADO DE ENSINO: ANÁLISE DE DOIS MUNICÍPIOS PAULISTAS Rosilene Rodrigues da Silva Souza [email protected] Unicamp

Resumo: Este trabalho apresenta resultados parciais da pesquisa de mestrado intitulada ―Relações entre municipalização do Ensino Fundamental e adoção do sistema privado de ensino: análise de dois municípios paulistas‖, sob orientação da Profª. Drª. Theresa Maria de Freitas Adrião e financiada pela Capes. Objetiva-se analisar os fatores do processo de municipalização do Ensino Fundamental que condicionaram maior ou menor presença do setor privado via adoção do sistema de ensino nos municípios de Porto Feliz e Salto. Nos estudos de dois casos intencionalmente selecionados utiliza-se a metodologia qualitativa constituída pela pesquisa documental e entrevistas semiestruturadas. Palavras-chave: descentralização, municipalização e parceria público-privada.

Introdução O presente trabalho apresenta resultados parciais da pesquisa de mestrado intitulada ―Relações entre municipalização do Ensino Fundamental e adoção do sistema privado de ensino: análise de dois municípios paulistas‖, iniciada em 2011, sob orientação da professora doutora Theresa Maria de Freitas Adrião, financiada pela Coordenação de Aperfeiçoamento de Pessoal de Nível Superior (Capes), vinculada ao Grupo de Estudos e Pesquisas Educacionais (Greppe) e ao Laboratório de Gestão Educacional (Lage) da Universidade Estadual de Campinas (Unicamp). A pesquisa tem por objetivo analisar os fatores do processo de municipalização do Ensino Fundamental que condicionaram maior ou menor presença do setor privado via adoção do sistema de ensino nos municípios de Porto Feliz e Salto, compreendendo o período de 1997 a 2011. A escolha intencional dos dois municípios justifica-se porque apesar da proximidade entre as cidades de Salto e Porto Feliz, e a similaridade socioeconômica e educacional, ambas adotaram estratégias distintas tanto no processo de municipalização do Ensino Fundamental como na oferta educativa local. Em Porto Feliz o processo de municipalização iniciou-se em 1997, mediante ao convênio com o Governo do Estado de São Paulo. Para garantir a educação sob sua responsabilidade (Educação Infantil e Ensino Fundamental) o município firmou parceria com o Colégio Oswaldo Cruz/Núcleo de Apoio à Municipalização do Ensino (COC/NAME) desde 2004, responsável por fornecer o sistema de ensino apostilado, e em 2011 firmou parceria com a empresa Planeta Educação que proporciona assessoria para a gestão política educacional.107 107

Informações obtidas na pesquisa exploratória com a Secretaria Municipal de Educação de Porto Feliz.

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O processo de municipalização de Salto iniciou-se em 1999, o qual optou pela criação de uma rede própria, responsabilizando-se pela garantia do Ensino Fundamental, além da Educação Infantil que já era de sua competência, porém sem parceria com instituição privada lucrativa no que se refere ao sistema de ensino. 108 Para este estudo foram definidos como objetivos específicos: caracterizar o perfil dos municípios; analisar o processo de municipalização do Ensino Fundamental da educação em cada município; comparar semelhanças e diferenças entre os municípios estudados no que se refere às políticas educacionais adotadas para a garantia da Educação Infantil e do Ensino Fundamental e identificar os fatores que contribuíram para Porto Feliz a optar pelo setor privado para assessorias na gestão educacional local e as estratégias adotadas por Salto para responder as demandas originárias da municipalização. Este texto está organizado em quatro partes. Na primeira parte discute-se a metodologia adotada. Na seqüência, será abordado brevemente o referencial teórico. Na terceira parte, apresenta-se a caracterização do perfil dos municípios, a partir dos aspectos: geográfico, histórico, socioeconômico, político e educacional. Por fim, buscase apresentar alguns apontamentos sobre a temática. Procedimentos Metodológicos A pesquisa é pautada nos estudos de dois casos intencionalmente selecionados. Segundo Lüdke e André (1986), o estudo de caso qualitativo ―[...] se desenvolve numa situação natural, é rico em dados descritivos, tem plano aberto e flexível e focaliza a realidade e forma complexa e contextualizada.‖ (LÜDKE, ANDRÉ, 1986, p.18) Para investigar os elementos decorrentes do processo de municipalização do Ensino Fundamental que condicionam maior ou menor presença do setor privado via aquisição do sistema de ensino nos municípios de Salto e Porto Feliz, a discussão teórica é um processo de extrema importância. Esse esforço de elaboração teórica é essencial, pois o quadro referencial clarifica o racional da pesquisa, orienta a definição de categorias e constructos relevantes e dá suporte às relações antecipadas nas hipóteses, além de construir o principal instrumento para a interpretação dos resultados da pesquisa. (ALVES, 1992, p.55)

Neste sentido, para a dissertação será elaborado um capítulo voltado para a discussão bibliográfica apoiada em autores que debatem profundamente conceitos como descentralização, municipalização e parceria público-privada. Não descartando a possível necessidade de retomar essas discussões no capítulo de análise dos dados obtidos na pesquisa de campo. O levantamento documental será outro instrumento relevante. De acordo com Antônio Gil (1999), a pesquisa documental pode constituir-se tanto de materiais que ainda não receberam nenhum tratamento analítico, por exemplo: reportagens de jornais, cartas, contratos, diários, fotografias, filmes e gravações, como de materiais que já foram analisados: relatórios de pesquisa, relatórios de empresas e tabelas estatísticas. A pesquisa documental juntamente à Secretaria Municipal da Educação de Salto e Porto Feliz será muito importante para a análise de leis, resoluções e outros documentos oficiais que informem sobre o processo de municipalização do Ensino Fundamental em cada município, além de propiciar a comparação entre ambos no que 108

Informações obtidas na pesquisa exploratória com a Secretaria Municipal de Educação de Salto.

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se refere às políticas educacionais adotadas para a garantia da Educação Infantil e do Ensino Fundamental. Para a identificação do perfil de Salto e Porto Feliz, a partir dos aspectos geográfico, histórico, socioeconômico, político e educacional, analisamos dados oficiais disponíveis no site dos municípios, da Fundação Sistema Estaduais de Análise de Dados (Seade), do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE) e do Instituto Nacional de Estudos e Pesquisas Educacionais Anísio Teixeira (INEP), além de livros sobre a história das cidades. As entrevistas semi-estruturadas com representantes da Secretaria Municipal de Educação de Salto e Porto Feliz permitirão maior enriquecimento da pesquisa empírica. Para Michel Thiollent (1982), os questionários e as entrevistas são considerados como técnica de observação direta, uma vez que estabelecem um contato ativo com as pessoas envolvidas no problema investigado. A pesquisa semi-estruturada consiste na aplicação de um pequeno questionário com perguntas abertas. Segundo Valdete Boni e Silvia Jurema Quaresma (2005), uma das vantagens deste tipo de entrevista está na sua ―[...] elasticidade quanto à duração, permitindo uma cobertura mais profunda sobre determinados assuntos. Além disso, a interação entre entrevistador e entrevistado favorece as respostas espontâneas.‖ (BONI & QUARESMA, 2005, p. 75) Com as entrevistas pretende-se compreender os fatores que levaram Porto Feliz a optar pelo setor privado para assessorias na gestão educacional local e as estratégias adotadas por Salto para responder às demandas originárias da municipalização. Discussão bibliográfica: notas introdutórias A descentralização do Ensino Fundamental tem sido objeto de discussão de diversos estudiosos que procuram, mais do que apreender a dinâmica da implementação do processo de municipalização, analisar suas conseqüências para a política pública educacional. De acordo com Marta Arretche (1996), o processo de descentralização ganhou mais abertura nos anos de 1980, quando um número significativo de países em desenvolvimento aderiu às reformas descentralizadoras com o argumento que os serviços públicos seriam mais ―[...] satisfatórios, ampliando os níveis reais de bem estar social.‖ (ARRETCHE, 1996, p. 44) O conceito de descentralização passou a ser associado à noção de distribuição e desconcentração do poder, assim como à ideia de liberdade e democracia (FREY, 2000). Enquanto que a centralização passou a ser relacionada ―[...] às práticas não democráticas de decisões, à impossibilidade de controle sobre as ações de governo e a ineficácia das políticas públicas.‖ (ARRETCHE, 1996, p. 44) No Brasil, desde meados da década de 1980, a agenda de redemocratização abarcou – entre um conjunto de outras ações – um projeto de reformas setoriais do Sistema de Proteção Social Brasileiro, no qual propôs: A descentralização e regionalização dos programas nacionais de saneamento e habitação; a descentralização, universalização e democratização dos programas de educação básica; o abandono das práticas clientelistas e a municipalização da assistência social como forma de que a prestação de serviços assistenciais equivalesse a um direito de cidadania; a unificação e descentralização de um sistema nacional de saúde capaz de universalizar o atendimento à população. (ARRETCHE, 1996, p. 46).

No que concerne à descentralização da educação, segundo Cleiton de Oliveira (1999), em quase todos os países da América Latina foi implantado esta política, 691 Grupo de Estudo e Pesquisas em Política Educacional, Rio Claro, 06, 07 e 08 de julho de 2011 Vol. 3 (2011)

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estimulada e recomendada por organismos internacionais, como: Banco Mundial (BM), Organização das Nações Unidas (ONU) e Organização dos Estados Americanos (OEA). No caso brasileiro, em 1986 criou-se a União Nacional dos Dirigentes Municipais de Educação (UNDIME), esta instituição responsabilizou-se por incentivar uma maior participação dos municípios no que se refere às questões educacionais, determinando maior descentralização. (OLIVEIRA, 1999) Para Oliveira (1999), a Constituição de 1988 também foi importante na ampliação da autonomia dos Estados, dos Municípios e do Distrito Federal. O artigo 211 institui que a União, os Estados, o Distrito Federal e os Municípios organizarão em regime de colaboração seus sistemas de ensino, ficando sob responsabilidade dos municípios, prioritariamente, o ensino fundamental e a pré-escola. Contudo, a municipalização intensificou-se com a legislação de 1996, trazendo significativas transformações na organização do sistema educacional brasileiro. A Emenda Constitucional (14/96), dentre algumas alterações, determinou a criação de um Fundo de Manutenção e Desenvolvimento do Ensino Fundamental e de Valorização do Magistério, o FUNDEF. A Lei 9.424/96 regulamentou o fundo e o convênio entre os Estados e Municípios, para transferência de alunos, sendo repassados automaticamente os recursos do Fundo, de acordo com o número de matrículas. E a nova Lei de Diretrizes e Base (LDB), também regulamentada no ano de 1996, estabelece nos artigos 70 e 71 as despesas que podem ser consideradas como manutenção e desenvolvimento do ensino. (OLIVEIRA, 1999) As transformações educacionais no Brasil, a partir dos anos de 1980, foram motivadas principalmente: [...] pelo neoliberalismo, pela globalização, pela recessão econômica, por influência das agências externas de financiamento, pelas mudanças no processo produtivo, pela correlação de forças no legislativo e pela aquiescência e / ou iniciativa do executivo levaram a uma proposta de Reforma do Estado e, em conseqüência, à normatização na área educacional. (OLIVEIRA, 1999, p. 32).

Segundo Theresa Maria de Freitas Adrião (2006), no estado de São Paulo, mais especificamente, o processo de municipalização intensificou-se a partir das reformas estabelecidas para o âmbito educacional durante a primeira gestão de Mário Covas (1995-1998). O resultado das intervenções do governo estadual expressou-se, assim, no redesenho da rede estadual de ensino. Ao criticado ―gigantismo‖ da máquina administrativa, contrapôs-se a diminuição da rede estadual pela racionalização – por meio da adoção de medidas como a reorganização da rede e o aumento do numero mínimo de alunos por classe – e pela municipalização, principalmente de 1ª a 4ª série, ainda que se presenciasse um paralelo aumento no atendimento à demanda do ensino médio. (ADRIÃO, 2006, p. 175 – grifo da autora).

Para Oliveira (1999) a política de municipalização vem se efetivando, entretanto, ―[...] a prática tem mostrado que nem todos os Municípios, que aderiam ao processo, têm condições de gerir/redes sistemas de ensino.‖ (OLIVEIRA, 1999, p. 34) De acordo com Adrião (2007), a municipalização educacional em São Paulo refletiu numa maior parceria entre o setor público e privado. [...] em que pese a vigência do contingenciamento de recursos vinculados constitucionalmente para o ensino fundamental, a maioria dos municípios, por razões técnicas, orçamentárias ou políticas, parece incapaz de responder às demandas decorrentes da ampliação de suas redes de ensino e à variação de etapas de escolaridade que passaram a assumir. Conseqüentemente o que

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III Seminário Internacional de Gestão Educacional se tem observado é a generalização de diferentes formatos de parcerias entre municípios e instituições privadas com decorrências ainda a serem analisadas para o âmbito de sistemas e de unidades escolares. (ADRIÃO, 2009, p.64)

O relatório de pesquisa109, coordenado pelas pesquisadoras Theresa Adrião, Teise Garcia, Raquel Borchi e Lisete Arelaro (2008), apresenta três tipos de modalidades na parceria público-privada no estado de São Paulo. A primeira modalidade se refere ao estudo de parcerias com instituições privadas para oferta de vagas na educação infantil, tendo em vista os convênios firmados para a garantia de vagas em creches de sete municípios paulistas (Altinópolis, Itirapina, Pirassununga, Hortolândia, Piracicaba, Ribeirão Preto e São Paulo). A segunda modalidade discute a aquisição de ―sistema privado de ensino‖. De acordo com o relatório, dos 645 municípios de São Paulo 274 adotaram esta modalidade, sendo mais assíduo entre os municípios com até 50 mil habitantes. A terceira modalidade debruça-se na análise da contratação de assessorias para gestão educacional, ressaltando o estudo de caso de cinco municípios: Cosmorama e Guariba, que possuem parceria com o Instituto Protagonistés, Limeira, que mantém contrato com a Fundação Limeira, São José do Rio Preto, que tem parceria com o Instituto Ayrton Senna e São José dos Campos, que possui contrato com o Instituto Embraer e Pesquisa e a Fundação Pitágoras. Para as pesquisadoras, os municípios ao se renderem à lógica privada propiciam a intervenção de instituições privadas não somente no que se refere aos recursos materiais, mas também à autonomia pedagógica e ao cotidiano escolar. Além disso, ―[...] trata-se da transferência para a esfera privada da função de elaboração e operacionalização de política pública até então exercida pela esfera pública estatal.‖ (ADRIÃO (coord.), 2009a, p. 130). Para a elaboração da dissertação esta discussão será ampliada, a partir da contribuição dos autores mencionados e outros que abordam intensamente os temas descentralização, municipalização do Ensino Fundamental e parceria entre o setor público e o setor privado. Breve caracterização dos municípios de Salto e Porto Feliz Nesta seção é apresentado brevemente o perfil de Porto Feliz e Salto da perspectiva histórica, geográfica, socioeconômica, política e educacional, desenvolvido com base em informações adquiridas no site dos municípios, da fundação Seade, do INEP e do banco de dados ―Parceria Público-Privadas‖ desenvolvido pelo Greppe, além de livros que descrevem a história das cidades. Salto e Porto Feliz são municípios do interior paulista, ambos localizados na região sudoeste do estado, pertencem à Região Administrativa de Sorocaba e fazem parte da Diretoria de Ensino da Região de Itu. A distância entre os dois municípios é de aproximadamente 30 quilômetros. Porto Feliz O registro mais antigo sobre o início do povoamento da cidade de Porto Feliz é de 1693, com a habitação da fazenda de Antônio Cardoso Pimentel, num período em que vários sertanistas abandonavam o Bandeirismo pela Agricultura. O desenvolvido 109

Estratégias municipais para a oferta da educação básica: análise de parcerias público-privado no estado de São Paulo. Processo nº 2007/54207-4 (Fapesp). 2009.

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em torno de um estratégico porto natural à margem esquerda do rio Tietê se tornou um local que servia de ponto de partida de inúmeros bandeirantes em busca das riquezas anunciadas. O porto de Araritaguaba logo se tornou importante para as expedições dos bandeirantes, passando a ser conhecido também como o ―porto feliz‖, na qual os moradores despertavam a atenção por sua alegria e hospitalidade. Um decreto de 13 de outubro de 1797 elevou o povoado à categoria de vila e alterou o nome para Porto Feliz (PREFEITURA MUNICIPAL DE PORTO FELIZ, 2011). Entretanto, somente com a Lei nº 8, de 07 de fevereiro de 1885, criou-se a comarca de Porto Feliz. A cidade, porém, continuou sem autonomia jurídica por mais cinco anos, período em que pertenceu à comarca de Capivari. Somente em 1890 ganhou sua autonomia com a nomeação do primeiro Juiz de Direito de Porto Feliz. No século seguinte, pela Lei n º 2.456, de 31 de dezembro de 1.953, que instituiu o quadro territorial, administrativo e judiciário do Estado de São Paulo, o município ficou constituído por apenas um Distrito: o Distrito de Porto Feliz. Quanto à Comarca portofelicense, era formada pelos municípios de Porto Feliz, Boituva e Iperó, respondendo também pelo Distrito de Bacaetava (PREFEITURA MUNICIPAL DE PORTO FELIZ, 2011). Porto Feliz encontra-se a 112 Km de distância da capital, têm 49.225 habitantes, segundo dados da fundação Seade, numa área total de 557,9 km², os municípios limítrofes são Itu, Sorocaba, Elias Fausto, Capivari, Rafard, Tietê, Boituva e Iperó. A fonte de renda provém principalmente da agricultura, pecuária, indústria e comércio. Aproximadamente 110 indústrias estão instaladas no município. As que mais se destacam são: as metalúrgicas, as químicas, as de papel e papelão e as têxteis. A agricultura é diversificada, destacando-se a cana-de-açúcar. O município também possui tradição na pecuária, principalmente a de gado de corte, além da produção de leite. A avicultura participa da economia do município através das granjas onde a produção de ovos é o principal produto. (PREFEITURA MUNICIPAL DE PORTO FELIZ, 2011). A tabela 1 traduz alguns dados importantes sobre o município a partir dos aspectos geográfico, socioeconômico e educacional. Tabela 1 - Indicadores gerais do município de Porto Feliz em relação ao Estado de São Paulo Indicador População total (2011) Densidade demográfica - Habitante / Km2 (2011) Índice de Desenvolvimento Humano Municipal - IDHM (2000) Índice Paulista de Responsabilidade Social - IPRS (Riqueza) 2008 Índice Paulista de Responsabilidade Social - IPRS (Longevidade) 2008 Índice Paulista de Responsabilidade Social - IPRS (Escolaridade) 2008 Renda per Capita em salários mínimos (2000)

Porto Estado de São Feliz Paulo 49.225 41.674.409 88,45 167,9 0,800 0,814 50

58

74

73

68 1,92

68 2,92

Fonte: Fundação Sistema Estadual de Análise de Dados - Seade

A partir desta tabela verifica-se que o Índice de Desenvolvimento Humano Municipal (IDHM) de Porto Feliz apresenta 0,800, abaixo da média do Estado de São Paulo que apresenta 0,814. A Renda per Capita em salários mínimos também se 694 Grupo de Estudo e Pesquisas em Política Educacional, Rio Claro, 06, 07 e 08 de julho de 2011 Vol. 3 (2011)

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apresenta abaixo média estadual, com 1,92, e o estado 2,92. No entanto o IPRS (Longevidade) que apresenta 74 está um pouco acima da média estadual que é 73. E o índice escolaridade iguala-se à média do Estado. Para uma breve compreensão da dinâmica da política local também elaboramos uma tabela. Tabela 2 – Gestões municipais em Porto Feliz – 1977 a 2011 Período

Prefeito

01/02/1977 a 31/01/1983 Genésio Leandro Vieira 01/02/1983 a 31/12/1988 Genésio Leandro Vieira 01/01/1989 a 31/12/1992 Erval Steiner Luiz Antônio de Carvalho 01/01/1993 a 31/12/1996 Netto Luiz Antônio de Carvalho 01/01/1997 a 31/12/2000 Netto 01/01/2001 a 31/12/2004 Erval Steiner 01/01/2005 a 31/12/2008 Claúdio Maffei 01/01/2009 a 31/12/2012 Claúdio Maffei

Partido Político Movimento Democrático Brasileiro (MDB) Partido do Movimento Democrático Brasileiro (PMDB) Partido Liberal (PL) Partido Liberal (PL) Partido do Movimento Democrático Brasileiro (PMDB) Partido Liberal (PL) Partido dos Trabalhadores (PT) Partido dos Trabalhadores (PT)

Fonte: Fundação Sistema Estadual de Análise de Dados (Seade) e Tribunal Superior Eleitoral (TSE).

De acordo com as informações da tabela, observa-se que em oito gestões políticas, Porto Feliz teve somente quatro prefeitos, uma vez que todos foram reeleitos, pertencentes à apenas três legendas partidárias: PMDB, PL e PT. No que concerne à apresentação educacional, destacamos a municipalização que se iniciou em 1997, o município assumiu escolas que eram do estado, mediante o convênio firmado com o Governo do Estado de São Paulo, segundo a lei municipal nº 3.552/1997. Atualmente são 29 escolas de competência do município, na qual contemplam alunos da Educação Infantil e do Ensino Fundamental (regular e Educação para Jovens e Adultos - EJA).

Tabela 3: Matrículas no ensino fundamental no município de Porto Feliz 1997-2010 Anos Iniciais

1997 1998 1999 2000 2001

Anos Finais

Rede Rede Rede Rede Rede Rede Municipal Estadual Privada Municipal Estadual Privada 971 2392 431 0 3994 418 982 2244 415 0 3879 450 1142 1998 368 0 3657 470

Ensino Fundamental (total) Total RM 1161 1164 971 982 1142

Total RE 6519 6419 6386 6123 5655

Total RP 886 879 849 865 838

695 Grupo de Estudo e Pesquisas em Política Educacional, Rio Claro, 06, 07 e 08 de julho de 2011 Vol. 3 (2011)

III Seminário Internacional de Gestão Educacional 2002 2003 2004 2005 2006 2007 2008 2009 2010

1464 2351 2355 2346 2738 3427 3636 3460 3359

1647 690 758 717 706 316 0 0 0

322 312 322 345 316 344 357 360 368

0 0 399 649 909 1599 1977 2311 2536

3343 3106 2630 2297 2014 1328 928 731 479

418 389 345 318 306 275 310 303 311

1464 2351 2754 2995 3647 5026 5613 5771 5895

4990 3796 3388 3014 2720 1644 928 731 479

740 701 667 663 622 619 667 663 679

Fonte: Banco de dados do Grupo de Estudos e Pesquisas Educacionais (GREPPE).

A tabela 3 revela um aumento relevante nas matrículas da rede municipal do ano de 1999 a 2010 em relação aos anos iniciais do Ensino Fundamental, de 971 matriculas para 3359, um aumento de 246%. Nos anos finais o aumento também foi acentuado, tendo início em 2004 com 399 alunos matriculados e em 2010 este número aumentou para 2536. Em 2008, a tabela mostra a consolidação da municipalização para os anos iniciais, a partir deste ano verificam-se matrículas somente na rede municipal e na rede privada. Analisando o ano de 2010, observa-se que nos anos iniciais do Ensino Fundamental Porto Feliz apresenta um percentual expressivo de alunos na rede municipal, 90,1%, enquanto que na rede privada 9,9% e na estadual 0%. Nos anos finais verifica-se que 14,4% dos alunos se encontram na rede estadual, enquanto que 76,2% são de competência do município e 9,4 da rede particular. A próxima tabela apresenta o Índice de Desenvolvimento da Educação (Ideb) de Porto Feliz, no qual considera o fluxo escolar e médias de desempenho nas avaliações externas (Prova Brasil e Sistema Nacional de Avaliação da Educação Básica – SAEB). Tabela 4: Ideb para o Ensino Fundamental e metas projetadas 2005-2021 – Anos Iniciais – Porto Feliz Ensino Fundamental Anos Iniciais

Ideb Observado

Metas Projetadas

2005

2007

2009

2007

2009

2011

2013

2015

2017

2019

2021

4.8

5.0

5.8

4.8

5.2

5.5

5.8

6.0

6.3

6.5

6.8

Fonte: Instituto Nacional de Estudos e Pesquisas Educacionais (INEP).

A tabela sobre o Ideb de Porto Feliz no que se refere aos anos iniciais do Ensino Fundamental da rede municipal mostra que as metas projetas para os anos de 2007 e 2009 foram alcançadas. O Ideb de 2009, 5.8, representa a meta projetada para 2013 e está acima da média nacional que é 4.6. Tabela 5: Ideb para o Ensino Fundamental e metas projetadas 2005-2021 – Anos Finais – Porto Feliz Ensino Fundamental

Ideb Observado 2005

Anos Finais

2007

2009

4.3

4.9

Metas Projetadas 2007

2009

2011

2013

2015

2017

2019

2021

4.4

4.6

5.0

5.3

5.5

5.8

6.0

Fonte: Instituto Nacional de Estudos e Pesquisas Educacionais (INEP).

696 Grupo de Estudo e Pesquisas em Política Educacional, Rio Claro, 06, 07 e 08 de julho de 2011 Vol. 3 (2011)

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O Ideb para os anos finais do Ensino Fundamental também atingiu a meta projetada para 2009 com 4.9, está acima da média nacional que é 4.0 e aproxima-se da meta projetada para 2013. Conforme as informações concedidas pela assessora da Secretaria Municipal de Educação, para a garantia do Ensino Fundamental Porto Feliz trabalha com o sistema apostilado elaborado pelo COC/NAME desde 2004 e em 2011 firmou parceria com a empresa Planeta Educação que proporciona assessoria para a gestão política educacional.

Salto No final do século XVII, Salto era propriedade particular, sítio Cachoeira, parte de sesmaria da Capitania de São Vicente, adquirido pelo capitão Antônio Vieira Tavares, que obteve a permissão para construir e mandar benzer uma capela. A benção do templo e a primeira missa ocorreram em 16 de junho de 1698, data que é considerada a fundação da cidade (PREFEITURA MUNICIPAL DE SALTO, 2011). No entanto, Salto ficou na condição de bairro rural da vila de Itu até 1989, ano em que a cidade conseguiu a autonomia administrativa, período em que já havia diversas casas, empresas comerciais, estrada de ferro e duas fábricas de tecido, que empregavam mais de 100 pessoas. (PREFEITURA MUNICIPAL DE SALTO, 2011). Em 1906, através da Lei Estadual nº 1906, o município é elevado à categoria de cidade, porém ainda continua a ser chamado de ―Salto de Itu‖. Em 1917 por meio da Lei Estadual nº 1593, passou a chamar-se apenas Salto. (PREFEITURA MUNICIPAL DE SALTO, 2011). A primeira década do século XX foi marcada por importantes conquistas, que colaboraram para a reafirmação do título de cidade, tais como: a chegada da luz elétrica, a instalação de redes de água e esgotos, a criação do primeiro grupo escolar e da primeira delegacia. (LIBERALESSO, 2000) Para Zequini, esse processo de urbanização estava vinculado à chegada das fábricas na cidade. [...] Salto – como certamente muitas outras cidades do interior paulista – tem uma gênese no núcleo urbano que surge e se desenvolve para e pela fábrica, a partir de suas necessidades e estritamente controladas pelos seus desígnios. [...] A fábrica exerceu uma influência decisiva sobre a estrutura urbana de Salto e sua própria emergência enquanto cidade industrial fundamentou-se na estreita relação existente entre ela e a construção de suas primeiras fábricas (ZEQUINI, 2004, p. 20).

Devido alguns pontos turísticos de natureza histórica, artística, religiosa e paisagística em 1999 a cidade adquiriu o título de Estância Turística. Entretanto, apesar do perfil turístico, a fonte de renda advém principalmente do setor comercial e industrial, concentrando dezenas de empresas de vários segmentos, como o metalúrgico, de mineração, cerâmico, químico, têxtil, de papel, moveleiro, entre outros, nos seus distritos industriais. De acordo com as informações da fundação Seade, o município conta com 106.765 habitantes, numa área total de 133 km2. Os municípios limítrofes são Itu, Indaiatuba e Elias Fausto. A cidade se encontra a 100 km da capital de São Paulo.

Tabela 6 - Indicadores gerais do município de Salto em relação ao Estado de São Paulo 697 Grupo de Estudo e Pesquisas em Política Educacional, Rio Claro, 06, 07 e 08 de julho de 2011 Vol. 3 (2011)

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Indicador População total (2011) Densidade demográfica - Habitante / Km2 (2011) Índice de Desenvolvimento Humano Municipal - IDHM (2000) Índice Paulista de Responsabilidade Social - IPRS (Riqueza) 2008 Índice Paulista de Responsabilidade Social - IPRS (Longevidade) 2008 Índice Paulista de Responsabilidade Social - IPRS (Escolaridade) 2008 Renda per Capita em salários mínimos (2000)

Salto 106.765 795,21 0,809

Estado de São Paulo 41.674.409 167,9 0,814

54

58

74

73

72 2,27

68 2,92

Fonte: Fundação Sistema Estadual de Análise de Dados - Seade

De acordo com a tabela 6, verifica-se que o Índice de Desenvolvimento Humano Municipal (IDHM) de Salto 0,809 está abaixo da média estadual que apresenta 0,814. O IPRS no que se refere à riqueza também se apresenta abaixo da média do estado de São Paulo. No entanto, o IPRS em relação à longevidade com 74 e à escolaridade com 72, estão acima da média estadual. As últimas gestões políticas do município de Salto são apresentadas na próxima tabela. Tabela 7 – Gestões municipais em Salto – 1977 a 2011 Período Prefeito 01/02/1977 a 31/01/1983 José Jesuíno Ruy 01/02/1983 a 31/12/1988 01/01/1989 a 31/12/1992 01/01/1993 a 31/12/1996 01/01/1997 a 31/12/2000 01/01/2001 a 31/12/2004 01/01/2005 a 31/12/2008 01/01/2009 a 31/12/2012

Partido Político Movimento Democrático Brasileiro (MDB) Partido do Movimento Democrático Brasileiro Pilzio Anunciatto Di Lelli (PMDB) Eugênio Coltro Partido Democrático Trabalhista (PDT) Partido do Movimento Democrático Brasileiro José Jesuíno Ruy (PMDB) João Guido Conti Partido Democrático Trabalhista (PDT) Pilzio Anunciatto Di Lelli Partido Popular Socialista (PPS) José Geraldo Garcia Partido Democrático Trabalhista (PDT) José Geraldo Garcia Partido Democrático Trabalhista (PDT)

Fonte: Fundação Sistema Estadual de Análise de Dados (Seade) e Tribunal Superior Eleitoral (TSE).

Segundo as informações da tabela, os prefeitos eleitos pertencem a três legendas partidárias PMDB, PPS e PDT. E em oito gestões políticas, Salto teve cinco prefeitos, uma vez que três deles foram reeleitos. No que se refere à educação saltense, enfatiza-se o processo de municipalização do Ensino Fundamental de Salto se iniciou em 1999, segundo a chefa de gabinete da Secretaria Municipal de Educação, o município criou uma rede própria e hoje possui dez Centros de Educação Municipal de Salto (CEMUS) voltados para o Ensino Fundamental (regular e EJA), esses centros mantêm vínculo com mais 21 escolas de Educação Infantil da rede municipal. Tabela 8: Matrículas no ensino fundamental no município de Salto 19992010 Anos Iniciais

Anos Finais

Total Ensino Fundamental

698 Grupo de Estudo e Pesquisas em Política Educacional, Rio Claro, 06, 07 e 08 de julho de 2011 Vol. 3 (2011)

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1999 2000 2001 2002 2003 2004 2005 2006 2007 2008 2009 2010

Rede Rede Rede Rede Rede Rede Municipal Estadual Privada Municipal Estadual Privada 453 6271 748 0 7.833 805 643 6236 752 0 7.162 836 937 5913 784 0 6.799 824 1388 5299 769 0 6.554 822 1915 4596 822 0 6.491 777 2480 4010 810 36 6.553 772 4691 3865 834 104 6.434 804 5004 3144 900 168 6.148 793 4798 3013 889 232 6.088 849 4249 2729 938 239 6.106 838 3676 2179 901 247 6.665 849

Total RM 262 453 643 937 1388 1915 2516 4795 5172 5030 4488 3923

Total RE 14936 14104 13398 12712 11853 11087 10563 10299 9292 9101 8835 8844

Total RP 1532 1553 1588 1608 1591 1599 1582 1638 1693 1738 1776 1750

Fonte: Instituto Nacional de Estudos e Pesquisas Educacionais (INEP).

A tabela revela que o processo de municipalização em Salto ocorre de forma gradativa e lenta. Em 2000 nos anos iniciais do Ensino Fundamenta 6271 alunos estavam matriculados na rede estadual, em 2010 esse número declinou para 2179. No ano de 2005, 2480 alunos estavam matriculados na rede municipal e em 2006 este número aumentou para 4691, um acréscimo de 89%. Nos anos finais do Ensino Fundamental, observa-se que em 2005 a rede municipal passou a oferecer vagas. Analisando mais especificamente o ano de 2010, nota-se que nos anos iniciais 32,3% dos alunos estão matriculados em escolas estaduais, 54,4% em escolas municipais e 13,3 na rede privada. Nos anos finais verifica-se que 85,9% dos alunos estudam em escolas estaduais, 3,2% em escolas municipais e 10,9% em dependências privadas.

Tabela 9: Ideb para o Ensino Fundamental e metas projetadas 2005-2021 – Anos Iniciais – Salto Ensino Fundamental

Anos Iniciais

Ideb Observado

Metas Projetadas

2005

2007

2009

2007

2009

2011

2013

2015

2017

2019

2021

5.2

5.6

5.5

5.3

5.6

5.9

6.2

6.4

6.6

6.9

7.1

Fonte: Instituto Nacional de Estudos e Pesquisas Educacionais (INEP).

De acordo com a tabela sobre o Ideb de Salto em relação aos anos iniciais do Ensino Fundamental, a meta projetada para 2007 foi alcançada, porém, o Ideb de 2009, 5.5, não foi atingiu a meta projetada, 5.6. Mas ainda assim, o Ideb do município está acima da média nacional que é 4.6. Tabela 10: Ideb para o Ensino Fundamental e metas projetadas 2005-2021 – Anos Finais – Salto Ensino Fundamental

Ideb Observado 2005

2007

2009

Metas Projetadas 2007

2009

2011

2013

2015

2017

2019

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2021

III Seminário Internacional de Gestão Educacional Anos Finais

-

-

4.9

-

-

5.1

5.3

5.6

5.9

6.1

Fonte: Instituto Nacional de Estudos e Pesquisas Educacionais (INEP).

O Ideb de 2009, 4.9, para os anos finais do Ensino Fundamental está acima da média nacional que é 4.0. Segundo a chefa de gabinete, apesar de o município receber diversas propostas, a Secretaria Municipal de Educação de Salto não firmou nenhuma parceria com instituição privada no que se refere ao sistema de ensino, a rede municipal pretende a partir do ano de 2011 elaborar um material próprio enfatizando a história e a cultura do município. Alguns apontamentos A pesquisa em andamento mostra que além da proximidade entre os dois municípios, Porto Feliz e Salto apresentam algumas semelhanças no aspecto socioeconômico e educacional, principalmente em relação ao IDHM, ao número de alunos matriculados nos anos iniciais do Ensino Fundamental da rede municipal e ao IDEB. Porém, ambas adotaram estratégias distintas tanto no processo de municipalização do Ensino Fundamental, bem como na oferta educativa local. Desta forma, a pesquisa tem por hipótese que a dinâmica instituída para o processo de municipalização do Ensino Fundamental em cada município condicionou a inexistência do setor privado via adoção do sistema de ensino em Salto, e a contratação de assessorias para a gestão educacional em Porto Feliz. A dissertação encontra-se em fase de levantamento bibliográfico e análise do perfil dos municípios. No segundo semestre de 2011 pretende-se iniciar a pesquisa de campo que abarcará a pesquisa documental e as entrevistas semi-estruturadas.

Referências ADRIÃO, T. Educação e produtividade: a reforma do ensino paulista e a desobrigação do Estado. São Paulo: Xamã, 2006a. ADRIÃO, T. (coord.) et al. Estratégias municipais para a oferta da educação básica: uma análise das parcerias público-privado no estado de São Paulo. 2009a. 366p. Relatório de Pesquisa – Instituto de Biociências da Universidade Estadual Paulista Julio de Mesquita Filho, Rio Claro. ALVES, A. A “revisão da bibliografia” em teses e dissertações: meus tipos inesquecíveis. Cad. Pesq. São Paulo, n. 81, p. 53-60, maio 1992. ARRETCHE, M. "Mitos da Descentralização: Maior Democracia e Eficiência nas Políticas Públicas", in: Revista Brasileira de Ciências Sociais, 11(31), 1996: 44-66. BONI, V; Quaresma, S. Aprendendo a entrevistar: como fazer entrevistas em Ciências Sociais. In: Revista Eletrônica dos Pós-Graduandos em Sociologia Política da UFSC. Vol. 2 nº 1 (3), Janeiro-Julho/2005, p. 68-80. Disponível em www.emtese.ufsc.br. FREY, K. Descentralização: lições atuais de Tocqueville. Lua Nova, São Paulo, n. 51, 2000 . Available from . access on 30 Apr. 2011. doi: 10.1590/S010264452000000300007. GIL, A. C. Métodos e Técnicas de Pesquisa Social. São Paulo: Atlas. 1999. LIBERALESSO, E. Salto: história, vida e tradição. São Paulo: Imprensa Oficial. 2000. LÜDKE, M; ANDRÉ, M. Pesquisa em educação: abordagens qualitativas em educação. São Paulo: Editora Pedagógica e Universitária (EPU),1986. OLIVEIRA, C. A municipalização do ensino brasileiro. In: OLIVEIRA, C. et al. Municipalização do Ensino no Brasil. Belo Horizonte: Ed. Autêntica, 1999, p. 11-36. PREFEITURA MUNICIPAL DE - acesso em junho/2011.

SALTO.

PREFEITURA MUNICIPAL DE PORTO FELIZ. acesso em junho/2011. THIOLLENT, M.. Definição das Técnicas de Pesquisa. In: Crítica metodológica, investigação social e enquete operária. São Paulo: Ed. Polis.1982. p.31- 39. ZEQUINI, A. O quintal da fábrica: a industrialização pioneira do interior paulista Salto-SP, séculos XIX e XX, dissertação de mestrado, Unicamp, 1991.

701 Grupo de Estudo e Pesquisas em Política Educacional, Rio Claro, 06, 07 e 08 de julho de 2011 Vol. 3 (2011)

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DEFININDO AS FORMAS DE PARCERIAS PÚBLICO-PRIVADAS: IMPLICAÇÕES PARA A EDUCAÇÃO PÚBLICA

Egle Pessoa Bezerra [email protected]

Resumo: O objetivo deste trabalho é apresentar as formas de parcerias públicoprivadas, por meio das suas terminologias e modalidades, contextualizando-as no aparato jurídico que as viabilizou, ressaltando os reflexos destas, para a educação pública. O termo parceria adotado neste trabalho para análise das relações públicoprivadas na educação, indica a relação estabelecida entre o poder público e a iniciativa privada, implicando na capacidade de intervenção que o setor privado passa a dispor junto à administração pública, por meio da assunção total ou parcial de responsabilidades até então atribuídas ao poder público em sua totalidade. Palavras-chave: Público-privado; política educacional; financiamento da educação

Introdução O objetivo deste trabalho é apresentar as formas de parcerias público-privadas, por meio das suas terminologias e modalidades, contextualizando-as no aparato jurídico que as viabilizou, ressaltando os reflexos destas, para a educação pública. O termo parceria adotado neste trabalho, para análise das relações público-privadas na educação, indica a relação estabelecida entre o poder público e a iniciativa privada, implicando na capacidade de intervenção que o setor privado passa a dispor junto à administração pública, por meio da assunção total ou parcial de responsabilidades até então atribuídas ao poder público em sua totalidade. As parcerias público-privadas sempre atendeu demandas de diversos setores da administração pública, entretanto, nos últimos anos, as mesmas se ampliaram em função de uma permissividade legal, e estão cada vez mais presentes na área educacional. Este trabalho busca apresentar elementos que possibilitem a diferenciação entre as parcerias público-privadas ―tradicionais‖ e o percurso das mesmas em direção às ―inovações‖ jurídicas que permitiram o avanço desse mecanismo no campo da educação. Para tanto, a definição das terminologias e modalidades apoiadas na literatura jurídica, e as respectivas legislações, faz-se necessário, para que se amplie a contextualização deste fenômeno. Destaca-se ainda, que tais parcerias resultam da inserção da lógica mercantil na administração pública brasileira, observada a partir da proposta da reforma do Estado, empreendida nos anos 1990. A reforma tinha como metas centrais, o ajuste fiscal e a eficiência da administração pública, introduzidas por estratégias que promovessem a flexibilização desta e a transferência para o setor privado, das atividades que pudessem ser controladas pelo mercado, dentro de um processo de descentralização. Essa transferência cria e amplia uma estreita relação entre o setor público e o privado, viabilizada por estratégias jurídico-administrativas, tais como o Contrato de Gestão, que ampliou o alcance de instrumentos como Concessões, Convênios, Parcerias e Terceirizações. 702 Grupo de Estudo e Pesquisas em Política Educacional, Rio Claro, 06, 07 e 08 de julho de 2011 Vol. 3 (2011)

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Frente a todo o aparato jurídico voltado para a constituição de parcerias entre o poder público e a iniciativa privada, observa-se um grande número de municípios que tem adotado estes instrumentos como opção para o atendimento de suas demandas. A educação tem sido objeto dessas parcerias em vários municípios, para atendimento de demandas de oferta de vagas ou compra de sistemas de ensino – situação esta que vem sendo pesquisada por autores como Adrião, Garcia, Borghi e Arelaro (2009); Adrião e Peroni (2009); Cain (2009); Rossi (2009); Domiciano (2009); Adrião e Borghi (2008); Peroni (2008); Bezerra (2008) para citar alguns exemplos. Terminologia e modalidades das parcerias público-privadas Segundo Luís Eduardo Patrone Regules (2006) o termo parceria responde a uma nomenclatura ainda nova para o Direito Público. Para o autor, o termo tem origem no Direito Privado e ―remonta à noção de participação nos lucros auferidos pelas partes, portanto sem o mínimo de afinidade com o regime jurídico administrativo e o universo das organizações não-governamentais‖ que por definição, não perseguem fins lucrativos (REGULES 2006, p.112-113). Para Regules o termoa parceria ―passou a designar a reunião de esforços entre o Poder Público e o setor privado para a concretização de objetivos de interesse público, a partir de iniciativas legislativas (termo de parceria), bem como da sua aceitação pela doutrina no âmbito do Direito Público‖ (REGULES, 2006, p. 113). Para Maria Sylvia Zanella Di Pietro (2006), o termo parceria traz em si a idéia de lucro, o que gera a resistência de sua utilização no âmbito do direito público. Para Moreira Neto, o termo rebatiza a colaboração econômica entre o setor público e o setor privado ―hipótese em que entidades não estatais participam de atividades estatais de índole econômica, com o objetivo de lucro‖ como ocorre com a concessão e a permissão de serviço público (DI PIETRO, 2006, p.40). Nesses termos, a parceria pode servir a variados objetivos e formalizar-se por diferentes instrumentos jurídicos. Pode ser utilizada como forma de delegação, fomento, cooperação ou desburocratização, e serão melhor detalhadas a seguir. Delegação De acordo com Di Pietro (2006), a delegação consiste na transferência da execução de serviços públicos a particulares, pelo instrumento da concessão que pode se apresentar dentro das seguintes modalidades: a) Concessão e permissão de serviço público ordinária, comum ou tradicional b) Concessão de obra pública c) Concessão patrocinada, concessão administrativa d) Concessão de uso de bem público A concessão de serviço público ordinária, comum ou tradicional está definida na Lei Federal nº. 8.987/95 como a delegação a um particular ou a uma empresa privada da execução de um serviço público, para que o execute em seu próprio nome, mediante processo licitatório (concorrência), por sua conta e risco, dentro de um prazo estipulado. Essa modalidade será formalizada mediante contrato e deverá observar as normas do edital de licitação (BRASIL, 1995). No que diz respeito à permissão de serviço público, conjugadas às leis 8.666/93 e à lei 8.987/95, pode-se apontar como características da permissão: ―(a) a precariedade no ato de delegação; (b) natureza de contrato de adesão; (c) revogabilidade unilateral pelo poder concedente; (d) possibilidade da permissão ser feita a pessoa física‖ (DI PIETRO, 2006, p. 149) e seria formalizada por meio de contrato, no qual o prazo seria indeterminado ou apenas um limite para a sua duração, sem, contudo, investir o 703 Grupo de Estudo e Pesquisas em Política Educacional, Rio Claro, 06, 07 e 08 de julho de 2011 Vol. 3 (2011)

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permissionário em direito subjetivo à compensação tributária em caso de interrupção (DI PIETRO, 2006, p. 150). A concessão de obra pública é formalizada pela Administração Pública por meio de contrato administrativo, no qual delega a outrem (o concessionário ou parceiro privado) a execução de obra pública, para que a mesma seja executada por sua inteira responsabilidade. Nessa modalidade a remuneração é paga pelos beneficiários da obra ou obtida a partir da exploração dos serviços ou utilidades que a obra proporciona, uma vez que, se fosse paga pelo Poder Público, não seria configurada concessão de obra pública e sim como um contrato de empreitada (DI PIETRO, 2006, p. 145). A concessão patrocinada é a modalidade de parceria em que a Administração Pública delega a outrem a ―execução de um serviço público, precedida ou não de obra pública, para que o execute, em seu próprio nome, mediante tarifa paga pelo usuário, acrescida de contraprestação pecuniária paga pelo parceiro público ao parceiro privado‖ (DI PIETRO, 2006, p. 162). Esta forma de parceria é formalizada por meio de contrato administrativo é regida pela lei nº. 8.987/95 em tudo o que não for derrogado pela lei nº. 11.079/04. A concessão administrativa é a modalidade de parceria de prestação de serviços de que a Administração Pública seja a usuária direta ou indireta, ainda que envolva a execução de obra ou fornecimento e instalação de bens. De modo sucinto, pode-se dizer que a concessão administrativa pode ter eventualmente, por objeto, a execução material de atividade, como a gestão de serviço público, levando ao entendimento de que esta modalidade se constitui em um misto de empreitada e de concessão de serviço público (DI PIETRO, 2006; 2007). Por fim, a concessão de uso de bem público é a modalidade de parceria que ―faculta ao particular a utilização privativa de bem público, para que a exerça conforme a sua destinação‖. A concessão de uso tem caráter contratual estável, para que o concessionário explore o bem mediante destinação legal e dentro das condições estabelecidas junto à Administração concedente (DI PIETRO, 2007, p. 640). Fomento O fomento diz respeito à "atividade administrativa de incentivo à iniciativa privada de utilidade pública" e, segundo Maria Silvia Zanella Di Pietro (2007), se constitui nas seguintes atividades: a) Auxílios financeiros ou subvenções por conta dos orçamentos públicos b) Financiamento sob condições especiais, para a construção de hotéis e outras obras ligadas ao desenvolvimento do turismo, para a organização e o funcionamento de indústrias relacionadas com a construção civil, e que tenham por fim a produção em larga escala de materiais aplicáveis na edificação de residências populares concorrendo para seu barateamento; c) Favores fiscais que estimulem atividades consideradas particularmente benéficas ao progresso material do país; d) Desapropriações que favoreçam entidades privadas sem fins lucrativos, que realizem atividades úteis à coletividade, como os clubes desportivos e as instituições beneficentes. O convênio constitui-se em uma das modalidades assumidas pela forma de fomento como um instrumento utilizado pelo Poder Público para se associar com entidades públicas ou privadas e distingue-se do contrato por ser concernente a interesses recíprocos, no qual os entes conveniados apresentam objetivos institucionais comuns, efetivados através de mútua colaboração por meio de diversas formas, tais como repasse de verbas, uso de equipamentos, uso de recursos humanos e materiais, uso 704 Grupo de Estudo e Pesquisas em Política Educacional, Rio Claro, 06, 07 e 08 de julho de 2011 Vol. 3 (2011)

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de imóveis, dentre outras. Pode ser celebrado entre entidades públicas ou entre estas e entidades particulares e, para as finalidades deste trabalho, vamos nos deter à celebração de convênios entre entidades públicas e entidades particulares. O contrato de gestão tem sido utilizado para formalizar acordos entre as entidades da administração indireta e com entidades privadas tais como as Organizações Sociais. No caso de acordos entre o Poder Público e as Organizações da Sociedade Civil de Interesse Público, as OSCIPS, o instrumento utilizado é o Termo de Parceria, o qual se assemelha ao contrato de gestão, pois também se volta para o desenvolvimento de objetivos pautados em interesses comuns entre os partícipes, e, nesse sentido, diz respeito muito mais a uma diferença de terminologia do que jurídica. O contrato de gestão e o termo de parceria apresentam características muito semelhantes e ambas têm por finalidade a instituição de parceria entre o poder público e entidades privadas. O contrato de gestão é o instrumento para formalizar a parceria entre a Administração Pública e as Organizações Sociais (OS), enquanto que o termo de parceria é o instrumento que concretiza a parceria entre o Poder Público e as Organizações da Sociedade Civil de Interesse Público (OSCIP). As Organizações Sociais (OS) inicialmente foram previstas pela Medida Provisória 1.591 de 1997, e posteriormente disciplinadas pela Lei Federal 9.637 de 1998. É importante chamar atenção para o fato de que a referência do Plano Diretor da Reforma do Estado (PDRAE) às Organizações Sociais, como meio para descentralização da ação estatal, indicava a transferência de atividades para o setor privado, entretanto, no texto da lei 9.637/98, consta que o contrato de gestão com tais entidades se constitui em instrumento de fomento, incentivando a iniciativa privada, e não uma forma de descentralização. Nesse sentido, a idéia de descentralização é descartada, pois a entidade não prestará o serviço como serviço público e sim como atividade privada de interesse público (DI PIETRO, 2006, p. 267). No que se refere ao contrato de gestão, o mesmo deve constar de especificações referentes ao programa de trabalho da entidade, metas a serem alcançadas, prazos e avaliação de desempenho sendo que sua supervisão será responsabilidade do órgão ou entidade supervisora da área de atuação correspondente à atividade fomentada, exercendo um controle de resultados e, no caso de irregularidade, será dada ciência ao Tribunal de Contas (BRASIL, 1998). Quanto ao fomento às atividades sociais o Poder Público pode destinar bens e recursos financeiros para o cumprimento do contrato, com dispensa de licitação e mediante permissão de uso, além da cessão especial de servidores públicos e dispensa de licitação nos contratos de prestação de serviços celebrados entre a Administração Pública e a Organização Social. A desqualificação da entidade ocorrerá no caso de descumprimento das normas do contrato de gestão (BRASIL, 1997;1998). As Organizações da Sociedade Civil de Interesse Público (OCIPs) foram definidas pela Lei Federal 9.790 de 1999, e regulamentadas pelo Decreto Federal 3.100/99. A qualificação dessas entidades se refere às pessoas jurídicas de direito privado, sem fins lucrativos com a finalidade de "desempenhar serviços sociais não exclusivos do Estado com incentivo e fiscalização pelo Poder Público, mediante vinculo jurídico instituído por meio de termo de parceria" (DI PIETRO, 2007, p. 465). O vínculo da OSCIP com a Administração Pública é estabelecido por meio de Termo de Parceria, o qual deve conter a especificação do objeto, programa de trabalho, metas, resultado, prazos bem como avaliação, previsão de receitas e despesas e apresentação de relatório anual. O Termo de Parceria deverá ser supervisionado pelo órgão do Poder Público cuja área seja correspondente à atividade fomentada bem como 705 Grupo de Estudo e Pesquisas em Política Educacional, Rio Claro, 06, 07 e 08 de julho de 2011 Vol. 3 (2011)

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pelos Conselhos de Políticas Públicas das áreas correlatas ao trabalho em andamento, dentro de cada nível governamental. A OSCIP perderá a sua qualificação a pedido ou mediante decisão proferida em processo administrativo ou judicial, de iniciativa popular ou do Ministério Público, assegurados defesa e contraditório (BRASIL, 1999). A semelhança entre OS e OSCIP está pautada no fato de se referirem a entidades privadas, sem fins lucrativos, que, uma vez preenchidos os requisitos legais, recebem uma qualificação pelo Poder Público. Quanto às diferenças, as mesmas se baseiam em que a OS pode assumir serviços públicos desempenhados pelos órgãos da Administração Pública, resultando na extinção destes, enquanto que na OSCIP, que exerce atividade de natureza privada, com a ajuda do Estado, a sua qualificação não interfere na existência ou nas atribuições de entidades ou órgãos integrantes do Poder Público (DI PIETRO, 2007). O quadro abaixo apresenta uma síntese comparativa das características das Organizações Sociais (OS) e Organizações da Sociedade Civil e de Interesse Público (OSCIP). Quadro 1 – Síntese comparativa das características das OS e OSCIP Aspectos

OS

OSCIP

Vínculo

Contrato de gestão

Termo de Parceria

Natureza Jurídica

Objetivo social

Pessoa jurídica de direito privado, sem fins lucrativos. Criada por particulares deve habilitar-se perante a Administração Pública para obter a qualificação social. Atuação nas áreas de ensino, pesquisa científica, desenvolvimento tecnológico, proteção e preservação do meio ambiente, cultura e saúde.

Pessoa jurídica de direito privado, sem fins lucrativos. Criada por particulares deve habilitar-se perante o Ministério da Justiça para obter a qualificação. Atuação em áreas voltadas para a promoção da assistência social; promoção da cultura, defesa e conservação do patrimônio histórico e artístico; promoção gratuita da educação, observando-se a forma complementar de participação das organizações de que trata esta Lei; promoção gratuita da saúde, observando-se a forma complementar de participação das organizações de que trata esta Lei; promoção da segurança alimentar e nutricional; defesa, preservação e conservação do meio ambiente e promoção do desenvolvimento sustentável; promoção do voluntariado; promoção do desenvolvimento econômico e social e combate à pobreza; experimentação, não lucrativa, de novos modelos sócio-produtivos e de sistemas alternativos de produção, comércio, emprego e crédito; promoção de direitos estabelecidos, construção de novos direitos e assessoria jurídica gratuita de interesse suplementar; promoção da ética, da paz, da cidadania, dos direitos

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Conselho de Administração cuja composição é de 20% a 40% do Poder Público

Presença do poder público

humanos, da democracia e de outros valores universais; estudos e pesquisas, desenvolvimento de tecnologias alternativas, produção e divulgação de informações e conhecimentos técnicos e científicos. A execução do objeto do Termo de Parceria será acompanhada e fiscalizada por órgão do Poder Público da área de atuação correspondente à atividade fomentada, e pelos Conselhos de Políticas Públicas das áreas correspondentes de atuação existentes, em cada nível de governo. Não são especificadas na lei as modalidades de fomento ou cooperação, há apenas algumas referências a bens ou recursos de origem pública.

Destinação de recursos orçamentários e bens necessários ao cumprimento do contrato de gestão, mediante permissão de uso, com dispensa de licitação, cessão especial de servidores públicos, Fomento com ônus para a origem, dispensa de licitação nos contratos de prestação de serviços celebrados entre a Administração Pública e a Organização Social. Em caso de descumprimento das Ocorre a pedido ou mediante decisão normas do contrato de gestão. proferida em processo administrativo, no Desqualificação qual serão assegurados a ampla defesa e o contraditório. BEZERRA, E.P.; 2008 [org.] com base em DI PIETRO (2006)

Cooperação A forma de cooperação abrange a modalidade de parceria empreendida pela terceirização a qual pode ser caracterizada como terceirização do trabalho pela empresa privada; terceirização no âmbito da administração Pública; terceirização dos serviços públicos. A terceirização do trabalho pela empresa privada consiste na "contratação, por determinada empresa, de serviços de terceiro para o desempenho de atividades-meio" cujas vantagens seriam A especialização da empresa contratada, a possibilidade de a empresa tomadora do serviço concentrar-se na execução de suas atividades-fim, a diminuição dos encargos trabalhistas e previdenciários, com a conseqüente redução do preço do produto ou serviço, a simplificação da estrutura empresarial (DI PIETRO, 2006, p. 229).

A terceirização assume formas tais como a empreitada de obra e de serviço e a franquia. A terceirização sob a forma de empreitada tem por objetivo a "realização de certa atividade pela empreiteira, visando a determinado resultado, que pode ser uma obra, um serviço ou mesmo o fornecimento de bens" e pode ser tradicional, de risco e com parceria. (DI PIETRO 2006, p. 230) A terceirização tradicional prioriza os menores custos na execução do seu objeto, decorrendo muitas vezes na precarização do serviço prestado. A terceirização de risco, assim é chamada por operar com mão-de-obra ilegal, uma vez que envolve a "transferência de obrigações trabalhistas através da concentração intermediada por terceiros visando mascarar a relação de emprego", e, por fim, a terceirização com 707 Grupo de Estudo e Pesquisas em Política Educacional, Rio Claro, 06, 07 e 08 de julho de 2011 Vol. 3 (2011)

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parceria acontece com a "transferência das atividades acessórias a parceiros especializados, objetivando tornar a empresa mais ágil e competitiva na sua atividade principal" (DI PIETRO, 2006, P. 230). No âmbito da Administração Pública, a terceirização, enquanto contrato de fornecimento de mão-de-obra, não tem amparo legal, porque a exigência constitucional é de que a investidura em cargos, empregos ou funções ocorra sempre por concurso público. A única possibilidade seria a "contratação por tempo determinado para atender a necessidade temporária de excepcional interesse público"; porém, tal definição, dada pelo Art. 37 da Constituição Federal, não é auto-aplicável, e só pode ser aplicada mediante lei de cada ente governamental. Visando apresentar uma aparente legalidade, esses contratos têm sido celebrados como prestação de serviços, embora não haja a prestação de serviços pela empresa contratada, pois esta se limita ao fornecimento de mão-de-obra para o Estado, contratando pessoal sem concurso público e, portanto, sem quaisquer vínculos. Por essas características, essa forma de terceirização se caracteriza como ‗tradicional‘ ou ‗com risco‘, porque "mascara a relação de emprego que seria própria da administração pública; não protege o interesse público, mas, ao contrário, favorece o apadrinhamento político, burla a exigência constitucional de concurso público" dentre outras irregularidades (DI PIETRO, 2006, p. 234). Contudo ressalva-se que a terceirização, enquanto contrato de prestação de serviços é possível no âmbito da administração pública. O inciso XXI do Art. 37 da Constituição Federal, dá o fundamento para a contratação de serviços, ao incluí-los entre os contratos dependentes de licitação. Atualmente a Lei Federal 8.666/93 permite que as obras e serviços ―sejam prestados por execução direta ou indireta, esta última sob o regime de empreitada ou tarefa‖ (DI PIETRO, 2006, p. 236-237). Além disso, o Art. 6º, inciso II, da Lei Federal 8.666/93 define serviço como: toda atividade destinada a obter determinada utilidade de interesse para a Administração, tais como: demolição, conserto, instalação, montagem, operação, conservação, reparação, adaptação, manutenção, transporte, locação de bens, publicidade, segurou ou trabalhos técnico-profissionais (BRASIL, 1993).

Acrescente-se ainda que os serviços técnico-profissionais especializados foram alcançados pela mesma lei sendo definidos como: Estudos técnicos, planejamentos e projetos básicos ou executivos; pareceres, perícias e avaliações em geral; assessorias ou consultorias técnicas e auditorias financeiras ou tributárias; fiscalização, supervisão ou gerenciamento de obras ou serviços; patrocínio ou defesa de causas judiciais ou administrativas; treinamento e aperfeiçoamento de pessoal; restauração de obras de arte e bens de valor histórico (BRASIL, 1993)

A terceirização do serviço público como um todo, não tem fundamento jurídico no Brasil, uma vez que a legislação prevê que os mesmos sejam prestados diretamente pela Administração Pública, através de seus órgãos, sendo permitida a prestação de serviços por terceiros apenas por meio de concessão ou permissão, conforme já apresentado anteriormente (DI PIETRO, 2006, p. 239). Desburocratização A forma de desburocratização diz respeito ao processo de que tem por objetivo agilizar as ações do Estado, no sentido de implementar a sua eficiência, no que diz 708 Grupo de Estudo e Pesquisas em Política Educacional, Rio Claro, 06, 07 e 08 de julho de 2011 Vol. 3 (2011)

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respeito à diminuição da burocracia e introdução de medidas que facilitem a formalização de acordos entre o poder público e a iniciativa privada. Nesse sentido se refere àquelas medidas tais como o contrato de gestão, cujo conteúdo já foi abordado. O quadro, na próxima página, apresenta uma síntese das formas de parceria (Delegação, Fomento, Cooperação e Desburocratização) e suas modalidades (Concessão, Convênio, Contrato de Gestão, Termo de Parceria e Terceirização) tendo em vista o exposto neste item.

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Quadro 2 - Síntese das modalidades de parceria entre o setor público e privado em vigor a partir da EC-19/98

Forma

Instrumento

Modalidade Concessão e permissão de serviço público ordinária, comum ou tradicional

Legislação Lei nº. 8.987/95 Lei nº. 9.074/95 Alterada pela lei nº. 9.648/98. A lei 11.079/04 se refere a essa modalidade como concessão comum.

Delegação

Lei nº.8.987/95. Concessão de obra pública

Concessão

A Lei nº. 11.079/04 também a regulamenta, porém como Concessão patrocinada.

Concessão patrocinada (PARCERIA PÚBLICOPRIVADA) Concessão administrativa (PARCERIA PÚBLICOPRIVADA)

Lei nº. 11.079/04

Lei nº. 11.079/04

Característica Concede a realização de serviço público de natureza comercial ou industrial que admita a cobrança de tarifa do usuário.

Formalização

Contrato administrativo

Parceiros Administração Pública/Parceiro Privado

Nesta modalidade o Poder Público transfere a outrem a execução de obra pública, para que a execute por sua conta e risco, mediante remuneração paga pelos beneficiários da obra ou obtida em decorrência da exploração dos serviços ou utilidades que a obra proporciona.

Contrato administrativo

Administração Pública/Parceiro Privado

Concede a realização de serviço público de natureza comercial ou industrial que admita a cobrança de tarifa do usuário.

Contrato administrativo

Administração Pública/Parceiro Privado

Contrato administrativo

Administração Pública/Parceiro Privado

Concede a realização de serviço público de natureza comercial ou industrial que não admita cobrança de tarifa do usuário.

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Concessão de uso de bem público

Legislação esparsa

Nesta modalidade a Administração Pública faculta ao particular a utilização privativa de bem público, para que a exerça conforme a sua destinação.

Contrato administrativo

Administração Pública/Parceiro Privado

Convênio

Fomento

Convênio

Lei nº. 8.666/93

Convênio Parceria

Parceria

Parceria

Instrumento utilizado pelo Poder Público para associar-se com outras entidades públicas ou privadas com a finalidade de obter um resultado comum.

Emenda Constitucional nº. 19

Firmado para estabelecer determinadas metas a serem alcançadas pela entidade em troca de algum benefício outorgado pelo Poder Público.

Lei nº. 9.079/91

Celebrado na instituição de parceria para prestar atividade de interesse público mediante formas de fomento pelo Estado.

Protocolo de Intenções Termo de Compromisso e outras denominações

Contrato de gestão

Termo de Parceira

Administração Pública/ Entidades Públicas ou Entidades Privadas

Administração Pública Direta/ Entidades da Administração Pública Indireta ou Entidades Privadas Administração Pública Direta/ Entidades da Administração Pública Indireta ou Entidades Privadas

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Cooperação

Terceirização do trabalho pela empresa privada

Terceirização Terceirização prestação de serviços

Terceirização dos serviços públicos

Lei nº. 6.019/74 Lei nº. 7.102/83

Contratação, por determinada empresa, de serviço de terceiro para o desempenho de atividades-meio. Assume várias formas, dentre as quais a empreitada de obra e de serviço, fornecimento de mãode-obra e pode ser tradicional, de risco, e com parceria.

Contrato

Art. 37, inciso IX da Constituição Federal, disciplinado em lei de cada esfera governamental e Lei 8.666/93.

Prestação de obras e serviços executados direta ou indiretamente sob a forma de empreitada ou tarefa, além de alcançar toda atividade destinada a obter determinada utilidade de interesse para a administração pública.

Contrato

Não tem fundamento jurídico, no direito brasileiro. A terceirização que tenha por objeto determinado serviço público como um todo.

Nos termos do dispositivo constitucional, os serviços públicos ou são prestado diretamente pelo Poder Público, por meio dos órgãos da Administração Direta ou entidades da Administração Indireta, ou são prestados por permissão ou concessão (patrocinada e administrativa).

Como não tem fundamento jurídico, não existe um modo de formalização previsto na legislação

712 Grupo de Estudo e Pesquisas em Política Educacional, Rio Claro, 06, 07 e 08 de julho de 2011 Vol. 3 (2011)

Parceiros Privados/ Parceiros Privados e Administração Pública

Parceiros Privados/ Administração Pública

A legislação que rege esse tema não prevê parceiros para este tipo de parceria pos a mesma não tem embasamento legal.

Desburocratização

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Contrato de gestão

Contrato de gestão

Emenda Constitucional nº. 19

Firmado para estabelecer determinadas metas a serem alcançadas pela entidade em troca de algum benefício outorgado pelo Poder Público

Contrato de gestão

Administração Pública Direta/ Entidades da Administração Pública Indireta ou Entidades Privadas

BEZERRA, E.P., 2008 [org] com base em DI PIETRO (2006)

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Considerações sobre as parcerias público-privadas e a educação pública O estabelecimento de parcerias entre a administração pública e a iniciativa privada tem sido objeto de discussão no meio jurídico em virtude da projeção que este instrumento vem alcançando no Brasil, em diversas áreas, ainda que seja recente na legislação brasileira e que exija um refinamento de suas fundamentações jurídicas. A parceria serve a diversas finalidades e pode ser utilizado nas formas de Delegação, Fomento, Cooperação ou Desburocratização, as quais se desdobram em diferentes modalidades cuja formalização ocorre por meio de instrumentos jurídicos específicos, como o contrato administrativo, o contrato de gestão, o termo de convênio, o termo de parceria, dentre outros. Estes instrumentos resultam da introdução de estratégias voltadas para promover a flexibilização da administração pública, em referência às propostas da reforma do Estado empreendida nos governos do presidente Fernando Henrique Cardoso (1995-1998; 19992002). Tais propostas, ideologicamente defendidas pelos proponentes da reforma como uma das condições para o aumento da eficácia e da eficiência dos serviços públicos, previam que o Estado transferisse para o setor privado as atividades que pudessem ser controladas pelo mercado (ADRIÃO, PERONI, 2005). O estreitamento de relações entre a administração pública e o setor privado pôde ser traduzido pela aprovação de uma série de dispositivos legais que asseguraram e ampliaram as possibilidades de parceria entre o poder público e a iniciativa privada. Dentre esses dispositivos, o mais significativo foi a Emenda Constitucional nº. 19 de 04/06/98 (EC-19/98), pois, por meio desta, ficou instituído o principio da eficiência e determinado que o Poder Executivo, por meio da lei, autorizasse a criação de entidades de direito privado (empresa pública, sociedade de economia mista, autarquia ou fundação), o que facilitaria esse processo, uma vez que, a sua iniciativa para a criação direta dessas entidades não seria mais necessária. A EC-19/98 também trouxe para o texto constitucional, através da introdução do § 8º ao Art. 37, o contrato de gestão, dispositivo que passou a indicar a possibilidade de ampliação da autonomia gerencial, orçamentária e financeira dos órgãos e entidades da administração direta e indireta. Frente a todo o aparato jurídico voltado para a constituição de parcerias entre o poder público e a iniciativa privada, observa-se um grande número de municípios que tem adotado este instrumento como opção para o atendimento de suas demandas. A educação tem sido objeto dessas parcerias em vários municípios, situação para a qual, este trabalho destaca produções recentes a respeito de parcerias firmadas entre administrações públicas e setores da iniciativa privada para a oferta de vagas da educação infantil, aquisição de sistemas de ensino e contratação de assessoria para gestão educacional, conforme pesquisas realizadas por Adrião, Garcia, Borghi e Arelaro (2009); Peroni (2008); Domiciano (2009); Cain (2009); Rossi (2009); Bezerra (2008) dentre outros estudos que foram empreendidos por demais pesquisadores, e pesquisas que ainda estão em andamento e que tratam das relações públicoprivadas na educação pública. Os casos em que o setor privado passa a atuar no interior da esfera pública, especialmente no campo educacional, não se configuram como parcerias público-privadas no que tangem aos aspectos jurídicos que esta expressão encerra, pois, tal expressão se refere às modalidades de Concessão Patrocinada e Concessão Administrativa, ambas regulamentadas pela Lei Federal nº. 11.079 de 30/12/04, que instituiu normas gerais para licitação e contratação de parceria público-privada no âmbito da administração pública. Entretanto, a expressão ‗parceria público-privada‘ que intitula este trabalho indica a relação estabelecida entre o poder público e a iniciativa privada, tal como designada por Regules (2006) em que o termo parceria ―passou a designar a reunião de esforços entre o Poder Público e o setor privado para a concretização de objetivos de interesse público, a partir de iniciativas legislativas (termo de parceria), bem como da sua aceitação pela doutrina no âmbito do 714 Grupo de Estudo e Pesquisas em Política Educacional, Rio Claro, 06, 07 e 08 de julho de 2011 Vol. 3 (2011)

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Direito Público. Cabe ainda, nesta perspectiva, a designação de todas as formas de sociedade que, apesar de não formarem uma nova pessoa jurídica, se organizam entre os setores público e privado, para a consecução dos interesses públicos (DI PIETRO, 2006). Nesse sentido, a expressão parceria púbico-privada adotada neste trabalho implica também na capacidade de intervenção que o setor privado passa a dispor junto à administração pública, por meio da assunção total ou parcial de responsabilidades até então atribuídas ao poder público em sua totalidade. Referências ADRIÃO, T.; PERONI, V. Público não-estatal: estratégias para o setor educacional brasileiro. In: ADRIÃO, T.; PERONI, V. (Orgs). O público e o privado na educação: interfaces entre Estado e Sociedade. São Paulo: Xamã, 2005, p. 137-166. ADRIÃO,T; et al. Estratégias municipais para a oferta da educação básica: análises de parcerias público privadas em São Paulo. Relatório final do projeto de pesquisa FAPESP 2007/54207-4. BEZERRA,E.P. As parcerias público privadas nos municípios paulistas de Brotas e Pirassununga: estratégias para a oferta do ensino? Dissertação de mestrado, Unesp, Rio Claro, SP, 2008. BRASIL. Ministério da Administração e Reforma do Estado. Plano diretor da reforma do aparelho do Estado. Brasília, 1995. __________.Lei nº 11.079 de 30/12/2004 que Institui normas gerais para licitação e contratação de parceria público-privada no âmbito da administração pública. __________.Lei nº 8.666 de 21/06/93 que Regulamenta o art. 37, inciso XXI, da Constituição Federal, institui normas para licitações e contratos da Administração Pública e dá outras providências. __________.Lei nº 8.987 de 13/02/95 que Dispõe sobre o regime de concessão e permissão da prestação de serviços públicos previsto no art. 175 da Constituição Federal, e dá outras providências. __________. Lei nº 9637 de 15/05/98 que dispõe sobre a qualificação de entidades como organizações sociais, a criação do Programa Nacional de Publicização, a extinção dos órgãos e entidades que menciona e a absorção de suas atividades por organizações sociais, e dá outras providências. __________.Lei nº 9.790, de 23/03/1999. Dispõe sobre a qualificação de pessoas jurídicas de direito privado, sem fins lucrativos, como Organização da Sociedade Civil de Interesse Público, institui e disciplina o Termo de Parceria, e dá outras providências. __________.Medida Provisória nº 1591 de 9/10/97 que dispõe sobre a qualificação de entidades como organizações sociais, a criação do Programa Nacional de Publicização, a extinção do Laboratório Nacional de Luz Síncrotron e da Fundação Roquette Pinto e a absorção de atividades por organizações sociais, e dá outras providências. __________.Decreto Federal nº 3.100 de 30/06/99 que regulamenta a Lei no 9.790, de 23 de março de 1999, que dispõe sobre a qualificação de pessoas jurídicas de direito privado, sem 715 Grupo de Estudo e Pesquisas em Política Educacional, Rio Claro, 06, 07 e 08 de julho de 2011 Vol. 3 (2011)

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fins lucrativos, como Organizações da Sociedade Civil de Interesse Público, institui e disciplina o Termo de Parceria, e dá outras providências. CAIN A.A. O Atendimento ao Ensino Fundamental: Análise de Parcerias de dois municípios paulistas e o setor Privado na aquisição de "Sistema de Ensino". Dissertação de mestrado, Unesp, Rio Claro, SP, 2009. DI PIETRO, M.S.Z. Parcerias na administração pública – concessão, permissão, franquia, terceirização, parceria público-privada e outras formas. São Paulo: Atlas, 2006. DOMICIANO, C.A. O Programa „Bolsa Creche‟ nos municípios paulistas de Piracicaba e Hortolândia: uma proposta para alocação de recursos estatais à educação privada? Dissertação de mestrado, Unesp, Rio Claro, SP, 2009. GIDDENS, Anthony. A terceira via: reflexões sobre o impasse político atual e o futuro da socialdemocracia. Rio de Janeiro: Record, 2005. HARVEY, D. Condição Pós-Moderna. São Paulo: Edições Loyola, 1989. HOBSBAWN, E. Era dos Extremos: o breve século XX: 1914-1991. São Paulo: Companhia das Letras, 1995 MONTAÑO, C. Características do embate dominante sobre o (conceito) ―terceiro setor‖. In: MONTAÑO, C. Terceiro Setor e questão social: crítica ao padrão emergente de intervenção social, São Paulo: Cortez, 2002, p. 51-87 MORAES, A Reforma administrativa – emenda constitucional nº19/98. São Paulo: Atlas, 2001. OLIVEIRA, R. P. O financiamento da educação. In: OLIVEIRA, R. P. & ADRIÃO, T. M. F. (orgs). Gestão, financiamento e direito à educação. Análise da LDB e da Constituição Federal São Paulo, Xamã, 2001.p.89-118. PEREIRA, B; SPINK, P. (Orgs.) Reforma do estado e administração pública gerencial. Rio De Janeiro: Fundação Getúlio Vargas, 1998. PERONI, V.M.V. A redefinição do papel do estado e a política educacional no Brasil dos anos 90. Tese (Doutorado em Educação) – Pontifícia Universidade Católica de São Paulo, PUC/SP, Brasil. REGULES, L.E.P. Terceiro Setor: regime jurídico das OSCIPS. Método, 2006 ROSSI, L. Oferta educacional e parcerias com os setores privados: um perfil dos municípios paulistas com até 10.000 habitantes. Dissertação de mestrado. Unesp, Rio Claro, SP, 2009. SZAZI, E. Terceiro setor. Regulação no Brasil. São Paulo: Peirópolis, 2003. . 716 Grupo de Estudo e Pesquisas em Política Educacional, Rio Claro, 06, 07 e 08 de julho de 2011 Vol. 3 (2011)

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ATUAÇÃO DO GRUPO POSITIVO JUNTO AOS MUNICÍPIOS PAULISTAS: CONSIDERAÇÕES

Kátia Tamara Luiz [email protected] UNICAMP Theresa Maria de Freitas Adrião UNICAMP

Resumo: O presente trabalho resulta de pesquisa de Iniciação Científica em andamento denominada ―A presença do Grupo Positivo na educação de municípios paulistas‖, financiada pelo Programa Institucional de Bolsas de Iniciação Científica (PIBIC/UNICAMP) sob orientação da Profª. Drª. Theresa Maria de Freitas Adrião. Pretende-se apresentar apontamentos acerca da atuação do Grupo Positivo na educação pública de municípios paulistas por meio da adoção de seu ―Sistema Aprende Brasil de Ensino‖. Os dados foram levantados a partir dos sites da instituição, de notícias da imprensa escrita de abrangência nacional, do Banco de Dados Parcerias Público-Privadas desenvolvido pelo Grupo de Estudos e Pesquisas em Políticas Educacionais e da visita à Editora Positivo.

Apresentação Este trabalho resulta da pesquisa intitulada ―A presença do Grupo Positivo na educação de municípios paulistas‖, financiada pelo Programa Institucional de Bolsas de Iniciação Científica (PIBIC/UNICAMP), e integra-se ao projeto "Sistemas apostilados de ensino e municípios paulistas: o avanço do setor privado sobre a política educacional local" sob orientação da professora Dra. Theresa Maria de Freitas Adrião, sendo este financiado pela Fundação de Amparo a Pesquisa do Estado de São Paulo (FAPESP) e desenvolvido no âmbito do Grupo de Estudos e Pesquisa em Política Educacional (Greppe/ Unicamp). A presente pesquisa possui por objetivo geral caracterizar o grupo empresarial Positivo bem como sua atuação junto aos municípios paulistas, efetuada por meio de parcerias entre administrações municipais e o Grupo empresarial para a adoção do "Sistema Aprende Brasil" no período de 2001 a 2010 que corresponde às duas gestões municipais com início no primeiro ano de aplicação da Lei de Responsabilidade Fiscal. (BRASIL, 2000) Para a consecução deste objetivo, recorreu-se à pesquisa nos endereços eletrônicos110 do Grupo, em material impresso concedido pela Editora Positivo, em notícias sobre o Grupo na imprensa escrita de âmbito nacional, visita à Editora Positivo e informações disponíveis no Banco de Dados Parceria Público-Privadas111 desenvolvido pelo Greppe. 110

http://www.positivoinformatica.com.br/www/pessoal/; http://www.editorapositivo.com.br/editorapositivo/home.html; http://www.colegiopositivo.com.br/; http://www.posigraf.com.br/home/; http://www.educacional.com.br/home.asp; http://www.aprendebrasil.com.br/; http://www.portaluniversitario.com.br/; http://www.portalpositivo.com.br/. 111

Acesso está disponível em: http://www.fe.unicamp.br/greppe/bd/pesquisas/pesqdados.php

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A pesquisa ainda em andamento finaliza a coleta de informações sobre parcerias realizadas no ano de 2010 com o Grupo Positivo. O presente trabalho pretende apresentar apontamentos a respeito do Grupo Positivo e sobre sua atuação junto a educação de municípios paulistas. Os resultados finais estarão prontos para divulgação do período da apresentação do pôster. Apontamentos sobre a constituição do Grupo empresarial até 2010 Este item busca apresentar um histórico sobre o Grupo Positivo destacando sua origem e seus mecanismos de expansão. Para tanto foram utilizados os endereços eletrônicos do grupo, imprensa escrita e informações do campo112. Como verificado em pesquisa anterior Adrião (2009a) a maioria dos grandes grupos que trabalham com sistemas de ensino o Grupo Positivo teve sua origem a partir dos cursos preparatórios para o vestibular em Curitiba – Paraná em 1972. (GRUPO POSITIVO, 2011a): As empresas com maior presença junto aos municípios [...] são conhecidas como Positivo, COC e Objetivo. Estas três empresas têm trajetórias semelhantes: originaram-se de cursinhos pré-vestibulares bem sucedidos, no sentido de conseguirem aprovar parte de seus alunos em cursos superiores de alta disputa no país, depois criaram escolas próprias que foram ampliadas em vários estados brasileiros por meio de franquias para redes privadas e, mais recentemente, para as redes públicas. (ADRIÃO (coord), 2009a, p. 136).

Em 1972, segundo o site institucional, Oriovisto Guimarães e outros professores criaram o primeiro curso pré-vestibular de Curitiba. Estes fundadores escreveram, organizaram e imprimiram o material apostilado com ―metodologia própria‖ e para sua impressão inauguraram ―uma pequena gráfica‖ situada em uma garagem também na ―capital paranaense‖. Em seu primeiro ano, o Curso Positivo contava com mais de 3.000 alunos. Em 1975, inaugurou-se a segunda unidade do Curso Positivo e a gráfica foi transferida para uma nova sede e três anos após este ano foi inaugurada sua terceira unidade. (GRUPO POSITIVO, 2011a). O Colégio Positivo Ângelo Sampaio, criado em 1976, foi destinado aos alunos do ensino médio. O ensino fundamental e a educação infantil foram contemplados com a inauguração do Colégio Positivo Junior em 1977. As demais escolas particulares receberam material próprio quando criou-se o Sistema Positivo de Ensino (SPE) em 1979. Neste mesmo ano foi inaugurada a Distribuidora Positivo que, em 2004, passou a integrar a Editora Positivo. (GRUPO POSITIVO, 2011a). O Grupo expandiu sua atuação para o ensino superior com a criação das Faculdades Positivo em 1988, cujos cursos oferecidos eram: Comércio Exterior, Informática, Pedagogia, Administração Rural e Administração de Empresas e, segundo o site institucional do Grupo, foi identificada a possibilidade do Grupo iniciar a montagem de microcomputadores para o mercado, em 1989, a partir do curso de Informática da Faculdade Positivo. Fundou-se, neste mesmo ano, a Positivo Informática a fim de se comercializar computadores para Escolas Positivo e demais escolas conveniadas. (GRUPO POSITIVO, 2011a). Para além dessa negociação com escolas a Positivo começou a vender serviços de informática e equipamentos eletrônicos ―para empresas e instituições do poder público‖ em 1990. No ano seguinte o número de alunos do SPE dobrou com relação a quatro anos anteriores: ―em 1987 eram 100 mil e em 1991 já são 200 mil alunos‖. (GRUPO POSITIVO, 2011a). 112

Vale ressaltar que a Editora Positivo não concedeu entrevista gravada. A visita à editora ocorreu informalmente.

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No ano de 1998 o Grupo abriu o Centro de Línguas Positivo (CLP), as Faculdades Positivo se transformam no Centro Universitário Positivo (Unicemp) e o SPE foi adotado por escolas do Japão. (GRUPO POSITIVO, 2011a). Em 1999, inaugurou-se o Colégio Positivo Jardim Ambiental para atender desde a Educação Infantil ao Ensino Médio em Curitiba. Neste mesmo ano, 400 mil alunos estudavam em escolas conveniadas ao SPE no Brasil e no exterior. (GRUPO POSITIVO, 2011a). O Unicemp foi transferido para uma área de 415 mil m², em 2000, e a divisão de Tecnologia e Informática da Positivo lançou o Portal Educacional, cujo objetivo seria ―complementar o Sistema Positivo de Ensino‖ (GRUPO POSITIVO, 2011a). Em 2001, a Escola Internacional das Nações Unidas em Nova York113 adotou o SPE da língua portuguesa para filhos de diplomatas e colaboradores da ONU. Registram-se, neste mesmo ano, 500 mil alunos vinculados ao SPE em 2.200 escolas conveniadas no Brasil e exterior. (GRUPO POSITIVO, 2011a). No ano seguinte, o SPE ―ganhou‖ o Portal Positivo114 direcionado aos alunos das unidades próprias e aos alunos de escolas conveniadas ao SPE, cuja função seria a mesma do Portal Educacional115: ―complementar o Sistema Positivo de Ensino‖. O Portal Universitário116, lançado em 2003, destinou-se ao ensino superior e o Grupo passou a deter ―os direitos de edição, distribuição e comercialização‖ do Dicionário Aurélio. Em 2004, a Positivo Informática iniciou a venda de seus computadores em ―grandes redes de varejo‖ e a exportação de mesas E-Blocks117 e Alfabeto para Portugal e Estados Unidos. (GRUPO POSITIVO, 2011a). O Sistema Aprende Brasil de Ensino, o qual é objeto desta investigação, foi criado em 2005 destinando-se à rede pública brasileira de ensino. Em 2008, o Colégio Positivo Jardim Ambiental e o Colégio Positivo Junior passaram a atender crianças de quatro a cinco anos de idade. Ainda neste ano, ocorreu o credenciamento do Unicemp junto ao MEC como universidade transformando-se na Universidade Positivo. Dando continuidade a essa ampliação do oferecimento da educação infantil o Colégio Positivo ofereceu o Maternal II para crianças a partir de três anos de idade, em 2009. (GRUPO POSITIVO, 2011a; COLÉGIO POSITIVO, 2011a). Segundo a notícia ―Escolas abrem „filiais‟ no Japão”, publicada em 14 de janeiro de 2002 na Folha de São Paulo on line, o principal cliente do Grupo no exterior é o Japão. O Grupo possui ―parcerias com escolas [...] que atendem a filhos de brasileiros residentes no Japão‖. Na maioria dos casos, são filhos de imigrantes japoneses que foram para aquele país com seus filhos nascidos no Brasil, mas com planos de voltar no futuro. (DA FOLHA DE SÃO PAULO, 2002) Em 2010, pode-se dizer que o Grupo Positivo se auto-intitula a maior corporação do país quando se trata de educação e tecnologia possuindo a maior gráfica editorial do Brasil e 113

A Escola Internacional das Nações Unidas (UNIS) foi criada em 1947 por um grupo de pais das Nações Unidas para proporcionar uma educação internacional para seus filhos, preservando suas diversas heranças culturais. O que começou como uma creche para 20 crianças cresceu rapidamente, adicionando graus, alunos e professores. 114

www.portalpositivo.com.br

115

http://www.educacional.com.br/

116

www.portaluniversitario.com.br

117

A Mesa Educacional E-Blocks é composta por blocos codificados com letras, palavras, números e figuras, os quais são encaixados em um módulo eletrônico interagindo com um software especialmente desenvolvido para as Mesas Educacionais. Contem animações, vídeos e recursos sonoros.

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uma das maiores da América Latina, segundo o site da própria gráfica Posigraf. (POSIGRAF, 2011). O Grupo expandiu-se para todos os níveis educacionais, do maternal II até a Universidade contando com centros de línguas e cursos pré-vestibulares. (COLÉGIO POSITIVO, 2011a;). Em 2011, entretanto, perde seu lugar no mercado nacional de venda de computadores para a empresa americana HP segundo notícia divulgada em 20 de maio deste mesmo ano na Revista ISTOÉ on line. (GALO, B. 2011). Atuação Junto ao Setor Privado Objetiva-se aqui apresentar a atuação do Grupo no setor privado por meio do Sistema Positivo de Ensino (SPE) destinado às escolas privadas ―parceiras‖ e às unidades próprias do Grupo Positivo. O Grupo se expandiu para quase todos os níveis educacionais, desde o maternal II até a Universidade, contando ainda com centros de línguas e cursos pré-vestibulares. Possui escolas próprias e mantém parcerias com escolas privadas que levam seu ―logo”. A respeito disto a notícia ―Redes de Ensino crescem até 35% com ‗franquias‘‖, de 2002, da Folha.com afirmava que: ―Na maioria dos casos, essas escolas aproveitam as campanhas de marketing veiculadas pelos grupos e podem ostentar a marca dos parceiros, desde que não deixem de divulgar o nome do colégio, para deixar claro que se trata de uma parceria. Além da venda do material didático para as escolas, os grandes grupos prometem ajudar, por meio de cursos para professores e visitas às instituições, a melhorar a didática e o projeto pedagógico dessas instituições.‖ (GOIS, A. 2002).

O SPE é destinado à rede privada de ensino e às Escolas Positivo de Curitiba. Quando a escola adquire este sistema passa a ter acesso ao Livro Didático Integrado, ao CD-ROM que possui conteúdo complementar e ao portal educacional. O Portal Educacional é totalmente restrito para conveniados, condição que nos veta o acesso. (GRUPO POSITIVO, 2011c). Segundo o Portal Positivo, ―a escola que adquire o material didático do Sistema Positivo de Ensino tem vantagens como: apresentação do material contendo, para cada área do conhecimento, um projeto pedagógico, estruturado em unidades; atividades propostas, acompanhadas de comentários e, conforme a situação, com soluções e respostas; cursos regionais de atualização e aperfeiçoamento; cursos de atualização, por área de conhecimento, para professores.‖. (PORTAL POSITIVO, 2011b). Acessando a página inicial deste portal encontra-se um espaço para preencher nome de usuário e senha. (PORTAL POSITIVO, 2011a). Assim como o Portal Aprende Brasil este também é dividido em seções: Educação Infantil, Ensino Fundamental I, Ensino Fundamental II, Ensino Médio e Educadores. Essas senhas, segundo o material impresso, "são fornecidas a todos os alunos, professores e equipes técnicas das secretarias que utilizam os Livros Didáticos Integrados." (EDITORA POSITIVO, 2010ª, p.21). Os links encontrados no portal são: ―pesquisa‖, ―acontece no portal‖, ―conteúdo‖ e ―referência‖, ―atualidades‖, ―colunistas‖, ―seções mirins‖, ―almanaque‖, ―jogos educativos‖, ―para ensino médio‖, ―para educadores‖, ―para sua escola‖, ―acessórios‖, ―administrador‖, ―quem somos‖ e ―contatos‖. (PORTAL POSITIVO, 2011a). Atuação Junto ao Setor Público Busca-se apresentar neste item a atuação do Grupo na educação de municípios paulistas e indicar os produtos oferecidos nesta parceria. Vale ressaltar que o termo ―parceria‖ é utilizado e compreendido aqui conforme Bezerra quando afirma que: 721 Grupo de Estudo e Pesquisas em Política Educacional, Rio Claro, 06, 07 e 08 de julho de 2011 Vol. 3 (2011)

III Seminário Internacional de Gestão Educacional A expressão parceria público-privada (...) implica também na capacidade de intervenção que o setor privado passa a dispor junto à administração pública, por meio da assunção total ou parcial de responsabilidades até então atribuídas ao poder público em sua totalidade. (BEZERRA, 2008, p. 62 – 63).

O Grupo atua com a venda de sistemas apostilados para os municípios e além do ―Livro Integrado‖ 118 traz em sua cesta outros serviços como cursos preparatórios para os professores, serviços de monitoramento do trabalho realizado nas escolas e o portal Aprende Brasil119 o qual, segundo o site institucional do Grupo, tem por finalidade complementar os conteúdos das apostilas. (GRUPO POSITIVO, 2011b). A atuação do Grupo junto aos governos não termina com a venda de apostilas acrescentando-se a isto a venda de microcomputadores para o MEC. No próprio site institucional da Positivo Informática existe uma seção direcionada para ―Governo‖ 120, que dispõe uma lista de produtos vendidos para o Governo. Acerca dessa parceria com o Governo, em relatório anual disponível no endereço eletrônico da Positivo Informática121, encontra-se o seguinte: No passado recente, a empresa conquistou os pregões do Ministério da Educação (MEC) em 2006 e 2007, para o fornecimento de computadores para as escolas públicas, e a licitação do Ministério das Comunicações (Minicom) em 2007, para entrega de computadores para centros de inclusão digital. No final de 2008, foi vencedora da maior licitação de computadores já realizada no país, de 214 mil máquinas e 404 mil monitores para o MEC, com a concentração de entregas no ano de 2010. Ao longo do ano, diversos estados realizaram programas de subsídio à aquisição de computadores por parte dos professores, com o objetivo de ampliar o acesso à tecnologia desses educadores, de forma a contribuir no aprimoramento da qualidade do ensino público. A Positivo Informática teve participação destacada nestes editais, valendo citar aqueles promovidos pelos estados de Pernambuco e São Paulo, bem como pelo Distrito Federal. Espera-se que o setor público continue firmemente em seus programas de informatização de escolas, disponibilização de centros de inclusão digital e projetos de capacitação de professores. A Positivo Informática está unicamente posicionada para capturar o crescimento do mercado de governo e de educação, dada sua experiência e origem de um grupo educacional, o que proporciona uma expertise diferenciada para projetos deste segmento. (POSITIVO INFORMÁTICA, 2011b) 118

Segundo a funcionária ―A‖ da Editora Positivo as apostilas são apenas para os cursos pré-vestibulares, pois o termo ―apostila‖ traz a idéia de padronização e revisão de conteúdos já vistos. No caso da educação básica o Grupo utiliza o termo ―livro integrado‖. Não se identifica a funcionária por pedido da mesma. A funcionária ―A‖ foi quem apresentou a editora. As funcionárias ―B‖ e ―C‖ foram quem entregou o material impresso institucional. 119

http://www.aprendebrasil.com.br/

120

http://www.positivoinformatica.com.br/www/governo/

121

http://ri.positivoinformatica.com.br/positivo/web/arquivos/POSITIVO_RA2009.pdf

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Com relação a estas vendas para o setor público, em uma notícia da Folha.com de maio de 2010, a Positivo Informática anunciou lucro líquido de 37,8 milhões no primeiro trimestre do mesmo ano e a respeito disso: (POSITIVO INFORMÁTICA, 2011a). Segundo a Positivo Informática, essa performance de vendas "foi influenciada pelo maior ritmo de entregas a clientes de governo, que registrou crescimento de 109,7% em relação ao 1º trimestre de 2009, bem como pelo desempenho das vendas ao varejo, cujo crescimento foi de 25,9% na comparação anual. (DA REPORTAGEM LOCAL, 2010)

Sistema Aprende Brasil de Ensino (SABE) Visto que um dos objetivos deste trabalho é conhecer a atuação do Grupo Positivo junto aos municípios paulistas se faz pertinente apresentar o sistema de ensino oferecido às redes públicas de ensino. Pretende-se neste item realizar uma breve apresentação do Sistema Aprende Brasil de Ensino e dos produtos e serviços oferecidos por este sistema privado de ensino. Vale ressaltar que o termo ―sistema‖ é utilizado aqui segundo o verbete do Dicionário: Trabalho, Profissão e Condição Docente que afirma: O termo sistema pressupõe uma opção coordenada e integrada de partes em ―um todo que articula uma variedade de elementos que, ao se integrarem ao todo, nem por isso perdem a própria identidade‖ (SAVIANI, 197, p.206). No mesmo sentido, para Carlos Roberto Jamil Cury, um sistema de educação supõe uma rede que agrega órgãos, instituições escolares, ordenamento jurídico, finalidades e bases comuns. Esses quatro elementos devem coexistir como ―conjunto organizado sob um ordenamento com finalidade comum (valor) sob a figura de um direito‖. (CURY, 2008, p.1204). Para Cury, no Brasil, não há sistemas privados de ensino, mas sistemas públicos de ensino que incluem redes privadas, tendo em vista principalmente a exclusividade do Estado para validar certificados e diplomas; autorizar o funcionamento de instituições e estabelecimentos escolares e estabelecer as diretrizes e bases da educação nacional (CURY, 2008, p.1196). Ainda que a expressão ―sistema de ensino‖ seja teórica e juridicamente inapropriada para nomear o fenômeno aqui destacado, seu uso tem sido recorrente para designar uma ―cesta de produtos e serviços‖ voltados para a educação básica e ofertados aos gestores públicos. (ADRIÃO, T.; GARCIA, T. 2010)

Segundo notícia da Folha Notícias on line de 15 de setembro de 2010, a qual traz por título: "Sistema de Ensino 'Aprende Brasil', que atende a rede pública, está no Saber 2010” o Sistema Aprende Brasil, neste mesmo ano, estava presente em 1.900 escolas públicas brasileiras e em mais de 160 municípios, atendendo 285 mil alunos da rede pública de ensino, os quais fazem parte dos mais de 10 milhões de alunos atendidos pelo Grupo Positivo (SANTO ANTÔNIO DE POSSE, 2010). Segundo a funcionária ―A‖ o Sistema Aprende Brasil de Ensino atende 18 estados da federação. No entanto, no site da Editora Positivo, visitado em 14 de outubro de 2010, afirma-se que ―21 das 27 Unidades Federativas brasileiras utilizam o Sistema de Ensino Aprende Brasil‖. (EDITORA POSITIVO, 2011a) Este sistema foi criado a partir da metodologia dos professores da Positivo para atender a rede pública de ensino. Em questionário enviado por e-mail à Editora Positivo questionou-se que tipo de carências do Poder Público essa iniciativa do Grupo teria ajudado a suprir. A resposta foi: 723 Grupo de Estudo e Pesquisas em Política Educacional, Rio Claro, 06, 07 e 08 de julho de 2011 Vol. 3 (2011)

III Seminário Internacional de Gestão Educacional ―O Sistema de Ensino Aprende Brasil surgiu para atuar com o poder público, no propósito de efetivar o direito de todas as crianças e jovens à educação pública de qualidade até 2022, bicentenário da Independência do Brasil, como proposto pelo Governo Federal e sociedade civil no pacto Compromisso Todos pela Educação122.‖ (Editora Positivo, 2011b, grifo da Editora).

Acerca da constituição do Departamento Aprende Brasil a funcionária ―A‖ contou que a montagem do quadro de trabalho deste setor em 2004, ano anterior ao lançamento desse sistema de ensino, foi praticamente voluntária, pois os funcionários que tiveram contato com escola pública (fosse dando aulas fosse gerenciando) optaram pela migração para o SABE identificando-se com o trabalho. Com o lançamento do Sistema Aprende Brasil de Ensino, as secretarias municipais que adquiriram tal sistema tiveram acesso aos ―Livros Integrados‖ que tem seu conteúdo complementado no Portal Aprende Brasil; à Assessoria Pedagógica que reúne cursos para a equipe docente e técnico-pedagógica das escolas municipais e da Secretaria de Educação e atendimento pedagógico (0800); ao Sistema de Monitoramento Educacional do Brasil (SIMEB), ―uma ferramenta que permite aos gestores [da cidade] acompanharem os resultados e o desempenho do município nas questões educacionais [...] ajudando o prefeito e o secretario de educação [da cidade] a traçarem planos de ação e estratégias para melhoras cada vez mais o ensino da rede pública‖. Este último serviço é disponibilizado ao município para monitoramento dos resultados obtidos com o material apostilado. (EDITORA POSITIVO, 2010b) Para melhor visualização segue tabela com tais informações sintetizadas: TABELA 1 – Produtos e Serviços Oferecidos Produtos e Serviço Material didático professores (Livro Integrado)

para

Descrição

estudantes

e O material é designado como Livro Didático Integrado. Oferecido para a Educação Infantil, Ensino Fundamental e Ensino Médio. Segundo a empresa, de acordo com todas as orientações curriculares do MEC. Formação continuada (Assessoria Oferece assessoria pedagógica a docentes e Pedagógica) equipes técnicas das secretarias de educação. Avaliação monitoramento (SIMEB) Anuncia uma ferramenta - o Sistema de Gestão de Informações Educacionais, e monitoramento da qualidade do ensino, sem esclarecer como é realizada a avaliação. Portal para acesso a conteúdos, propostas de Portal Aprende Brasil-disponível para atividades, vídeos e outras formas de estudantes e professores cadastrados no apoio.(Portal Aprende Brasil) sistema 122

Criado em 2006 o Compromisso Todos Pela Educação é financiado exclusivamente pela iniciativa privada e visa alcançar que todas as crianças e jovens tenham direito a educação básica de qualidade até 2022, ano do Bicentenário da Independência do Brasil. Para tanto se instituiu cinco metas, as quais são: toda criança e jovem de quatro a 17 anos na escola,toda criança plenamente alfabetizada até os 8 anos,todo aluno com aprendizado adequado à sua série, todo jovem com o Ensino Médio concluído até os 19 anos e investimento em Educação ampliado e bem gerido

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III Seminário Internacional de Gestão Educacional Fonte: A autora com base em BERTAGNA, BORGHI, 2011, p.11.

Tais informações confirmam resultado de pesquisas anteriores: A ―cesta‖ que compõe os contratos firmados entre as prefeituras municipais e a iniciativa privada é integrada por atividades tradicionalmente desenvolvidas pelas equipes pedagógicas dos órgãos da administração pública e das escolas: formação continuada de educadores, efetivo acompanhamento das atividades docentes; investimento na produção e distribuição de materiais didáticos aos alunos; processos de avaliação externa e interna, entre as principais encontradas. Por essa razão, para além dos problemas pedagógicos derivados da adoção de material instrucional, em alguns casos desde a pré-escola, o que é importante destacar é o fato de que as empresas privadas passam, ao vender os chamados ―sistemas de ensino‖, a interferir na gestão do próprio sistema escolar público local. (ADRIÃO et al, 2009, p. 806).

A respeito do início das parcerias com os municípios a funcionária ―A‖ informou que inicialmente o contato foi dos municípios, mas em 2010 são os Departamentos: Comercial e o Jurídico da Editora Positivo que contatam os municípios quando estes abrem processo de licitação. A funcionária foi evasiva não respondendo mais nada a respeito e dizendo que estas informações poderiam ser adquiridas por telefone com os departamentos Jurídico e Comercial. Tais informações não foram coletadas, pois os departamentos: Comercial e Jurídico sequer atenderam aos telefonemas. Toda ligação feita era encaminhada diretamente para o Departamento de Marketing, no qual era negado qualquer contato com os demais departamentos. A tabela a seguir apresenta o início da parceria entre os municípios paulistas e o Grupo Positivo nos anos de 2001, 2005 e 2010. Tabela 2 – Municípios que iniciaram suas “parcerias” em anos previamente determinados: Ano de início da “parceria”

Municípios Paulistas

2001

-

2005

Bocaína Buritizal Cajobi Catiguá Itapuí Jarinú Jaú 725

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Lorena Macatuba Monte Alegre do Sul Murutinga Ribeira Uchoa 2010123 Fonte: A autora com base GREPPE, 2011.

A escolha dos anos conforme indicado na apresentação deste trabalho corresponde ao período de duas gestões municipais com início em 2001, primeiro ano de aplicação da Lei de Responsabilidade Fiscal, até o ano de 2010 que foi o ano de início desta pesquisa. Apesar da tabela ainda não apresentar os dados referentes a 2010 é possível observar um crescimento no oferecimento do Sistema Aprende Brasil de Ensino nos municípios paulistas comparando os anos de 2001 e 2005. Enquanto no ano de 2001 não havia nenhuma parceria entre os municípios de São Paulo e o Grupo Positivo, quatro anos depois se pode observar a presença do Grupo em 13 municípios. Considerações Finais Segundo funcionária ―A‖ da Editora Positivo não existem grandes diferenças entre o Livro Integrado do Aprende Brasil e o Livro Integrado do SPE. A única diferença é que os autores do Sistema Positivo de Ensino não são os mesmos do Sistema Aprende Brasil de Ensino e isso pode causar uma diferença no resultado final dos materiais. Mas na opinião da funcionária, nada que prejudique ou desqualifique o material do SABE. A questão aqui levantada é como é possível se afirmar que essa diferença de autoria não diferencia totalmente os materiais sendo estes dois sistemas privados de ensino produzidos inclusive em departamentos distintos? Em pesquisa anterior foi suposto que: ―Trata-se de ofertar às escolas públicas um material de menor custo e que não faça frente àqueles existentes nas escolas privadas do município, uma vez que, se assim fosse, poderia haver um relativo êxodo das matrículas para o setor público, estabelecendo-se, ineditamente, uma concorrência intraserviços oferecidos pela mesma empresa‖. (ADRIÃO et al 2009, p. 808).

Retomando a questão da assessoria pedagógica prestada aos municípios questiona-se a viabilidade de uma intervenção pedagógica na escola através de ligações (0800). Se, mesmo estando no interior da escola conhecendo e vivenciando a complexidade desta, a compreensão das relações que se travam em seu interior e as possíveis intervenções se apresentam de forma

123

Os municípios que adotaram o Sistema Aprende Brasil de Ensino em 2010 estarão presentes no pôster que será apresentado neste evento em julho de 2011 conforme indicado na apresentação deste trabalho.

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extremamente complicada, como, por telefone, um sujeito distante daquela realidade escolar/social poderá contribuir? Pensando na estrutura e condições do trabalho docente, no questionário enviado por email à Editora Positivo perguntou-se se a editora considerava haver necessidade de alteração das condições de trabalho dos profissionais da educação das redes públicas. A editora respondeu que: ―A educação, pública ou privada, deve oferecer aos seus profissionais condições adequadas para o exercício de suas atividades. No caso da educação pública no Brasil, percebe-se uma transformação nos últimos anos. Sabe-se que ainda não é possível compará-la a países de 1º mundo e nem com aqueles que investiram fortemente nesse setor, como o Chile, por exemplo. O que se pode dizer é que o caminho certo é o do investimento constante, tanto para melhorar as condições de trabalho dos profissionais da área quanto à infraestrutura das instituições de ensino.‖ (Editora Positivo, 2011b)

Concorda-se com a editora quando afirma que o setor da educação necessita de investimento constante. No entanto tal investimento, em se tratando de ―oferecer aos seus profissionais condições adequadas para o exercício de suas atividades‖ (EDITORA POSITIVO, 2011b), deveria direcionar-se para a formação inicial e continuada de professores e à infra-estrutura para execução do trabalho docente como salas com menor número de alunos e equipadas com materiais necessários para a aula. Mas o governo se esquiva de sua responsabilidade permitindo que a direção e organização do sistema escolar sejam transferidas para o setor privado curso objetivo principal é o lucro. Quando a editora foi questionada sobre sua avaliação sobre o PNLD (Programa Nacional do Livro Didático) ela respondeu que: ―A Editora Positivo considera o Programa Nacional do Livro Didático (PNLD) – voltado à distribuição de obras didáticas aos estudantes da rede pública de ensino brasileira – muito importante. Por meio dele, as escolas têm autonomia para escolher as obras mais adequadas, de acordo com a necessidade de seus alunos.‖ (Editora Positivo, 2011b, grifo nosso).

O sistema privado de ensino comprado pelas redes públicas priva o professor desta mesma autonomia citada pela Editora Positivo. De acordo com relatos de profissionais da área há escolas, embora seja exceções, em que o sistema de ensino é apenas consultado de forma complementar. No entanto, na maioria delas o sistema de ensino adotado é seguido rigorosamente e sempre com a fiscalização da secretaria de educação e do próprio Grupo com o uso do SIMEB por exemplo. O professor não é mais um profissional que escolhe seu material de trabalho segundo suas orientações pedagógico-teóricas. Mas mero cumpridor de tarefas e reprodutor de um ensino do qual desconhece seus reais objetivos e consequências. Os sistemas de ensino em geral colocam-se, portanto, contra o inciso III do art. 206 da Constituição Federal de 1988 que afirma que o ensino será ministrado com base, dentre outros princípios, no ―pluralismo de idéias e de concepções pedagógicas, e coexistência de instituições públicas e privadas de ensino‖. (BRASIL, 1988). Além de ferir essa autonomia o sistema privado de ensino traz a idéia de que os professores são mal preparados e precisam de uma ―muleta‖ para conseguirem exercer sua profissão, como tenta demonstrar uma pesquisa realizada pela Fundação Lemann publicada em uma matérias de O Globo em junho de 2010. Tal pesquisa: ―foi feita comparando os resultados da Prova Brasil de 2005 e 2007 e revelou, ainda, que quando os professores têm um sistema estruturado de

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III Seminário Internacional de Gestão Educacional ensino à disposição, aprendem matérias que não sabiam direito, apesar de ter que ensiná-las. Eles também passam a não deixar de dar certos conteúdos na sala de aula. A pesquisadora Paula Louzano notou que o nível de formação dos professores é muito baixo.‖ (RIBEIRO, 2010, Grifo nosso)

Ao invés de se propor políticas de formação inicial e continuada para professores, buscam-se mecanismos de garantir esse ensino. A profissão docente já tão depreciada por diversos fatores como baixos salários e atribuições de responsabilidade pelos fracassos escolares torna-se cada vez mais desvalorizada. Parece que a tendência é negar a necessidade de um professor formado em sala de aula. As apostilas fazem todo o trabalho. O professor só precisa reproduzir sem sequer conhecer o conteúdo. A pesquisadora Paula Louzano rebate a análise sobre a autonomia do professor afirmando numa entrevista concedida à Revista Educação, em sua edição de nº 160 que "A autonomia do professor não, necessariamente, se traduz em melhoria de aprendizagem. É preciso ter um currículo". No entanto, não se nega aqui a necessidade de um currículo mínimo, mas se afirma outra necessidade básica que é a formação inicial e continuada de professores: ―A suposta incapacidade docente de elaborar um plano de aula próprio esconde uma questão conhecida para quem pensa políticas públicas em educação no país: a precária formação docente. Romualdo Portela, da Feusp, diz que, ao colocarmos os sistemas de ensino como solução à falta de preparo do professor, esquecemos de resolver uma tríade famosa: a atratividade, a reforma e a retenção nos cursos de formação docente.‖ (REY, 2010)

Para além do problema de formação inicial e continuada de professores, percebe-se uma tentativa de homogeneização e de padronização proposta por esses materiais desconsiderando as particularidades e necessidades de cada região e as diversas situações sociais vivenciadas pelas unidades de ensino. Com a compra de sistemas privados de ensino por parte dos municípios outro problema evidente é a entrega da gestão escolar e da produção de políticas educacionais locais à iniciativa privada. ―A educação, direito de todos e dever do estado e da família‖ conforme propõe a constituição brasileira em seu Art. 205 se transforma em mera mercadoria e a qualidade do ensino passa a ser regida pela lógica do lucro. (BRASIL, 1988, grifo nosso).

Referências ADRIÃO, T. (coord). Relatório Final da Pesquisa: Estratégias municipais para a oferta da educação básica: uma análise de parcerias público privado no estado de São Paulo. 2009a ADRIÃO, T. et al, Uma Modalidade Peculiar de Privatização da Educação Pública: A Aquisição de “Sistemas de Ensino” por Municípios Paulistas.Educ. Soc., Campinas, vol. 30, n. 108, p. 799-818, out. 2009b ADRIÃO, T; GARCIA, T. Sistema Apostilado de ensino. In: OLIVEIRA, D.A.; DUARTE, A.C.; VIEIRA, L.F. (orgs.). Dicionário: trabalho, profissão e condição docente. Belo Horizonte, UFMG: 2010. CD ROM.

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III Seminário Internacional de Gestão Educacional

BEZERRA, E. P. Parceria público-privada nos municípios paulistas de Brotas e Pirassununga: estratégias para a oferta do ensino? 2008. 205p. Dissertação de mestrado – Instituto de Biociências da Universidade Estadual Paulista Julio de Mesquita Filho, Rio Claro. BORGHI, R. F.; BERTAGNA, R. H. Sistemas apostilados de ensino: caracterização de três empresas privadas com inserção em redes municipais paulistas. 2011. Mimeo BRASIL. Constituição (1988). Constituição da República Federativa do Brasil de 1988. Disponível em: http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/constituicao/constitui%C3%A7ao.htm Último Acesso em: 09 jun. 2011 BRASIL. Lei complementar nº 101, de 4 de maio de 2000. Estabelece normas de finanças públicas voltadas para a responsabilidade na gestão fiscal e dá outras providências. Disponível em: http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/Leis/LCP/Lcp101.htm Acesso em: 08 jun. 2011 COLÉGIO POSITIVO. História. Disponível em: http://www.colegiopositivo.com.br/colegio_historia.asp Último Acesso em 06/05/2011a DA FOLHA DE SÃO PAULO. Escolas abrem "filiais" no Japão. Folha de São Paulo online. São Paulo. 14 de janeiro de 2002. Disponível em: http://www1.folha.uol.com.br/folha/educacao/ult305u7933.shtml Último Acesso em: 06/05/2011 DA REPORTAGEM LOCAL. Positivo Informática tem lucro de R$ 37,8 mi no 1º tri, alta de 344%. Folha.com. São Paulo. 11 de maio de 2010. Disponível em: http://www1.folha.uol.com.br/folha/dinheiro/ult91u733668.shtml Último Acesso em: 06/05/2011 EDITORA POSITIVO. Um mundo mais positivo começa pela sua cidade. Curitiba: Editora Positivo 2010a. Panfleto. EDITORA POSITIVO. Um mundo mais positivo começa pela educação de seu filho. Sistema Brasil de Ensino. Curitiba: Editora Positivo. 2010b. Panfleto EDITORA POSITIVO. Sistema de Ensino Aprende Brasil. Disponível em: http://www.editorapositivo.com.br/editora-positivo/sistemas-de-ensino/aprende-brasil.html Último Acesso em: 06/05/2011a EDITORA POSITIVO. Entrevista - RESPOSTA [mensagem pessoal]. Mensagem recebida por
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