A posição da arquitetura e do urbanismo frente às questões de segurança

October 10, 2017 | Autor: Larissa Camargo | Categoria: Violence, Arquitetura e Urbanismo, Revitalização Urbana
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A posição da arquitetura e do urbanismo frente às questões de segurança

Universidade Federal de Ouro Preto
Larissa da Fonseca Camargo
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Resumo: Neste trabalho analisaremos como a sensação de insegurança e o medo influenciam no espaço urbano e arquitetônico. Veremos também como a arquitetura e o urbanismo podem intervir de forma a amenizar a violência, sem fazer uso de recursos que intensificam a chamada "arquitetura do medo".
Palavras-chave: Arquitetura; urbanismo; violência; segurança; revitalização.

Introdução

Com a violência urbana presente em grande parte das cidades torna-se cada vez mais comum uma "arquitetura do medo" caracterizada por condomínios fechados e casas que se assemelham a fortalezas, com muros altos, cercas elétricas, câmeras de vigilância e alarmes. O medo de ser vítima de um ato violento leva as pessoas ao isolamento ocorrendo uma proliferação de "casas-fortificadas" e desses condomínios fechados, que vêm se tornando cada vez mais auto suficientes com áreas para lazer, compras e até mesmo trabalho, cada vez mais diminuindo a necessidade do morador de ir até a cidade. Essa "arquitetura do medo" tem sido vista por muitos como uma solução de segurança, porém, profissionais da área de arquitetura e urbanismo chegam a um consenso de que esses e outros recursos espaciais usados para segurança, ainda que bem intencionados, acabam por perpetuar ainda mais o problema. (Revista Arquitetura e Urbanismo, 2007).


Barra da Tijuca: um exemplo de "arquitetura do medo".

O bairro Barra da Tijuca está localizado na Zona Oeste da cidade do Rio de Janeiro e é constituído por shoppings, avenidas e condomínios fechados de vários tipos. Em seu estudo sobre a Barra da Tijuca, a mestre em comunicação Mônica Sousa coloca que a região da Barra da Tijuca surge com a proposta de se tornar um lugar dos sonhos que seria constituído de elementos determinantes e falíveis do Rio de Janeiro, como meio ambiente e segurança e de que se tornaria uma "catedral do consumo" devido aos seus shoppings, teatros, cinemas e parques aquáticos. Ainda segundo Mônica Sousa, há uma prática de comunidade apresentada como uma experiência diferente no bairro da Barra, onde há um reagrupamento burguês, de interesses sociais e privados no qual as pessoas se unem por compartilharem um espaço comum, mas não deixem de lado o individualismo em certos aspectos, não há um senso ideal de fraternidade. Esse refúgio dos condomínios fechados seriam uma tentativa de hierarquizar sócio econômica e espacialmente a cidade, o bairro e a rua. (Silva, 2010). Sair do condomínio seria estar suscetível à violência, as grades, os muros e as cercas elétricas asseguram que os moradores não só não vejam mas também não participem do espaço urbano considerado violento. Esses refúgios acabam gerando uma situação de não encontro, e, para Cláudio Cruz, esses tipos de recursos de segurança acabam intensificando uma segregação social e acabam por extinguir as interações comunitárias, geram desconfiança e isolamento.

"A barreira física e a vigilância eletrônica temperadas de impessoalidade desestimulam a vida coletiva que julgamos ser o mais eficaz antídoto contra a violência. É a falta de integração entre os cidadãos o que acaba por servir de estímulo à geração de mais violência." (Cruz, 2002)





Como a arquitetura e o urbanismo podem contribuir para a diminuição da violência?
A arquitetura pode contribuir para a restauração da integração entre os cidadãos e os espaços urbanos através de projetos de intervenção social e revitalização de áreas inseguras amenizando, então, a violência. Ao resgatar a identidade cultural de espaços públicos de lazer e cultura e promover sua ocupação e preservação eleva-se a sensação de segurança. (Charifker, 2002).
Atuando junto com políticas públicas esses projetos podem alcançar resultados ainda maiores como podemos ver em exemplos como o programa "Certificado de Casas Seguras" na Holanda.
A polícia holandesa, visando uma prevenção nos delitos através do desenho ambiental, desenvolveu o certificado de casas seguras centrado principalmente na planificação urbana e do entorno, dano flexibilidade para e resolução de problemas e soluções específicas de cada local. (Fórum de Segurança Pública, 2013). O certificado fora pensando incialmente para novas construções mas posteriormente fora desenvolvida uma versão adaptada para construções existentes. Integrando o trabalho de arquitetos, urbanistas e agentes da polícia cada projeto era analisado, junto aos clientes, para se obter a diretriz ideal para a diminuição de delitos e aumento da percepção de segurança.
De acordo com o estudo conceitual de espaços urbanos seguros feito pelo Fórum Brasileiro de Segurança Pública, as principais estratégias deste certificado baseavam-se na análise dos espaços urbanos e na certificação de segurança desses locais a partir de um manual de certificação que estabelecia padrões de casas seguras como, por exemplo, na escala urbana eram analisado se o desenho e o planejamento garantiam acesso a transportes públicos, de veículos e pedestres; se espaços públicos continham a participação da vizinhança, construção de parquinhos, estacionamentos ao ar livre, parada para transporte público, iluminação e etc.; se a distribuição espacial é assegurada pela existência de pátios e jardins traseiros, caminhos secundários. Também eram certificadas, na escala da edificação, características como a altura, a orientação dos cômodos, o tipo de telhado, o controle de acesso e a visibilidade e a resistência de portas e janelas.
Através destas estratégias o programa obteve conhecimento do entorno, estabeleceu acordos sobre prioridades e possíveis soluções, eram oferecidos descontos de 10% a 30% pelas companhias de seguro residencial e, principalmente, a ocorrência de roubos residenciais diminui 98% em imóveis de bairros novos e 80% em imóveis de bairros existentes.



Figura 1- Uma Casa Segura do Certificado de Casas Seguras

Fonte: Diseño Urbano En Entornos De Convivencia A Través Del
"Certificado Policial De Casas Seguras"
Figura 2- Iluminação pública, caminhos bem delineados e requerimento de pátios em bairro de Casas Seguras.

Fonte: Diseño Urbano En Entornos De Convivencia A Través Del
"Certificado Policial De Casas Seguras"
Figura 3- Casas seguras atualmente


Fonte: Politiekeurmerk Veilig Wonen. Disponível em: http://www.politiekeurmerk.nl/fileadmin/w/politiekeurmerk_nl/headerfoto/nieuwbouw.jpg

Como vimos com o projeto "Certificado de Casas Seguras", a requalificação dos espaços, com o auxílio de políticas públicas, pode amenizar a violência em áreas consideradas inseguras. Porém essa revitalização deve ser acompanhada de planejamento e do envolvimento dos moradores das áreas a serem requalificadas para que não ocorram fenômenos como a gentrificação, onde a melhora da qualidade do espaço gera uma especulação imobiliária que acaba expulsando moradores originais do bairro por não terem condições financeiras de lá se estabelecerem. Após a gentrificação o bairro passa a ser visto como mais qualificado do que outros, ocorrendo uma troca dos antigos moradores para grupos com maior poder aquisitivo.

Conclusão
O medo e a sensação de insegurança causada pela violência urbana têm influência direta nos espaços urbanos e arquitetônicos mas a posição da arquitetura deve ser de oposição aos métodos atuais de isolamento (muros, cercas elétricas, condomínios fechados). A arquitetura do medo gera uma perda da integração cidadão-espaço urbano a qual a arquitetura deve combater através de projetos que restaurem a convivência urbana, sempre mantendo os moradores das áreas inseguras envolvidos. Portanto, a revitalização de uma área insegura deve ser feita com cautela, baseando-se na análise do local, garantindo o envolvimento de seus moradores e sendo planejada através do trabalho integrado de arquitetos, urbanistas e poder público, garantindo, assim, um espaço que promove a integração comunitária e a segurança, sem gerar a expulsão ou reclusão dos cidadãos.



Referências Bibliográficas:

SOUSA. M. C. P. A arquitetura do medo: um estudo sobre a Barrada Tijuca e a prática do não encontro. Contemporânea Ed.14. Vol.8. 2010.

FÓRUM BRASILEIRO DE SEGURANÇA PÚBLICA. Estudo conceitual sobre os espaços urbanos seguros. Gestão e disseminação de dados na Política Nacional de Segurança Pública. 2013.

CRUZ. C. Violência e Arquitetura. Portal Arquitetura Brasil. 2002. Disponível em: http://www.uff.br/arqviol/textos_repercussoes/090902_arqbr_violencia%20e%20arquitetura.html Acessado em: 26 nov. 2014.

REVISTA ARQUITETURA E URBANISMO. A arquitetura e o urbanismo podem contribuir para a diminuir a violência? AU nº159. Págs. 18 e 19. 2007.
Disponível em: http://www.uff.br/arqviol/textos_repercussoes/0607_AU_Arquitetura%20e%20urbanismo%20podem%20contribuir%20para%20diminuir%20a%20violencia.html Acessado em: 26 nov. 2014.

MARTINS. A. Gentrificação: o que e de que maneira altera os espaços urbanos. Uol Vestibulares. 2014. Disponível em: http://vestibular.uol.com.br/resumo-das-disciplinas/atualidades/gentrificacao-o-que-e-e-de-que-maneira-altera-os-espacos-urbanos.htm Acessado em: 02 dez. 2014.

JONGEJAN. A. Diseño urbano en entornos de convivencia a través del "certificado policial de casas seguras". Holanda. 2007. Disponível em: http://www.veilig-ontwerp-beheer.nl/publicaties/certificado-policial-de-casas-seguras Acessado em: 02 dez. 2014.





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