A VONTADE EM DUNS ESCOTO

May 22, 2017 | Autor: Ana Ferreira | Categoria: Medieval Philosophy, Duns Scotus, Free Will, Vontade. Filosofia
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Ana Ferreira (nº de aluno:120712072) Unidade Curricular de Filosofia Medieval II Maio de 2014

A VONTADE EM DUNS ESCOTO “Nada será desejado se antes não for conhecido” (Nihil volitum quir praecognitum1)

1.INTRODUÇÃO Este trabalho pretende estudar muito brevemente e de um modo geral o conceito de vontade em Duns Escoto. Começará com uma explicação acerca daquilo que é entendido por vontade num sentido geral e numa fase seguinte far-se-á um pequeno e muito breve estudo da vontade no ser humano. Para tal, utilizar-se-á um dos textos do Doutor Subtil, nomeadamente, o Comentário à Metafísica de Aristóteles, Livro IX, questão 15, sendo esta versão da tradução de Gonçalo Figueiredo para o Grupo de Filosofia Medieval da Faculdade de Letras da Universidade do Porto. Foi também útil nesta pesquisa a tese de mestrado – Liberdade e Vontade Em João Duns Escoto – Leitura da Quodlibética XVI- apresentada à Faculdade de Letras da Universidade de Coimbra para obtenção de grau mestre em Filosofia por Gonçalo Figueiredo. Duns Escoto aborda esta questão da vontade de um ponto de vista voluntarista, isto é, dá primazia à vontade relativamente ao intelecto. A vontade é superior ao intelecto porque se move a si mesmo, ainda que necessite do intelecto para conhecer o objeto querido. O intelecto é então uma condição necessária, e por isso natural, para que a vontade conheça aquilo que deseja, contudo ele não determina a vontade. A vontade é autodeterminada e isto implica liberdade que por sua vez implica contingência. Aqui Escoto encontra dois caminhos para a contingência: a diacrónica e a sincrónica. A primeira não serve para a sua tese porque limita a liberdade da vontade, por isso só a contingência sincrónica resolve esta questão. Quanto ás afeições que dirigem a vontade para o Bem, temos a affectio commodi e a affectio iustititae. A afeição cómoda é aquela que leva a vontade a agir de forma a que eu tenha um bem para mim, isto é, do qual eu tiro alguma vantagem, alguma comodidade, enquanto que a afeição justa diz que eu amo o objeto por aquilo que ele é, sem que isso me beneficie. A primeira relacionase com um apetite intelectual, com a natureza, e a segunda leva a vontade a querer aquilo que realmente é bom em si, permitindo á vontade ser livre.

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Adágio escolástico

Quanto à vontade do ser humano, podemos dizer que é capaz de objetos e efeitos opostos, é indeterminada e contingente e também possui a afeição cómoda e justa. Desta forma, será apresentada uma breve explicação acerca desta tese voluntarista mas sempre racional, tal como Duns Escoto defendeu.

2. CONCEITO DE VONTADE Visto que o assunto que aqui se trata é da vontade, penso que, antes de mais devemos apresentar o conceito geral de vontade de Duns Escoto. Para este autor a vontade equivale-se a um apetite, “Digo que a vontade pode entender-se em sentido próprio ou também em sentido lato como apetite.”(n.10) 2

contudo este apetite não é desprovido da inteligência, pois para que haja uma vontade/apetite é

necessário conhecer aquilo que se quer. Então, assim o querer está intrinsecamente ligado aquilo que é conhecido. Mas como? Através das potências percetivas que nos dão a conhecer o objeto, isto é, “[…] houve tantos apetites como existem em nós as distintas potências percetivas. Os das potências percetivas distintas. E assim, como é distinta a perceção do gosto, da vista, do tato, do olfato, assim é próprio do apetite de cada caso, assim há também um deleite próprio derivado de cada uma das distintas faculdades percetivas.”(n.10) 3 , e depois através da imaginação que ao abstrair o objeto material o transforma numa imagem de forma a que, com a ajuda do intelecto, a vontade possa escolher o objeto que é ou não agradável4. Desta forma, temos a razão que nos dá a conhecer aquilo que é querido por nós. Poderíamos então pensar que a vontade estaria determinada pois estava regida por aquilo que era conhecido, contudo não é o objeto captado pela razão que move a vontade, mas sim a vontade que se move a si mesma, é algo que lhe é inerente, ainda que o objeto seja algo natural5 e necessário. Por exemplo, eu vejo um chocolate, necessariamente porque os meus sentidos mo permitem, ainda que eu não queira vê-lo, acontece que o vejo, no entanto a minha vontade é que determina se eu irei pegar nele e consumi-lo, ou seja, ainda que precise dos meus olhos para ver o chocolate, não é por tê-lo visto que vou consumi-lo necessariamente. Tanto pode acontecer como não e até pode suceder-se que ao ver o chocolate me apeteça comer outra coisa. Isto acontece porque a vontade “não está por si mesma determinada, mas pode fazer este ato ou o ato oposto, agir ou não agir.”(n.24)6Assim, se fosse o objeto 7conhecido a agitar a vontade ou mesmo o fantasma da ideia que eu tenho do objeto, então a vontade estaria determinada pelo objeto, e portanto não seria livre. O intelecto é, desta forma, uma condição necessária (sine qua non) da

Cf. Escoto, João Duns. Ord.III,d.17,q.un. (IX,563-571).(distinção XVII – se cristo teve duas vontades), p.119. Cf. Escoto, João Duns. Ord.III,d.17,q.un. (IX,563-571).(distinção XVII – se cristo teve duas vontades), p.119. 4 Cf. Escoto, João Duns. Ord.III,d.17,q.un. (IX,563-571).(distinção XVII – se cristo teve duas vontades), p.120. 5 Isto é, ser determinado. 6 Escoto, João Duns. Comentário à Metafisica de Aristóteles, Livro IX, questão 15 (QQSM,IX,q.15).Versão de Gonçalo Figueiredo para o Grupo de Filosofia Medieval da Faculdade de Letras da Universidade do Porto. 7 se fosse o objeto/ideia/fantasma, pretendo com isto dizer que qualquer um destes é válido para a afirmação acima. 2 3

própria vontade, porque para se querer algo tem de se conhecer aquilo que se quer, contudo este conhecimento não vai determinar a vontade. Ficamos então a perceber que a vontade para ser vontade tem de ser livre, “porque a vontade é senhora dos seus atos”(n.2)8 isto é, a vontade abarca tanto a potência como o ato e por isso a vontade dá-se inteiramente quando engloba os planos do conhecimento e da ação. Utilizando o exemplo de cima, um só tenho um apetite por chocolate quando de facto conheço o que é chocolate e depois quando a minha vontade decide que eu realmente vou querer consumir o chocolate ou não ou então querer outra coisa diferente. Assim, a ação resulta da deliberação racional realizando a vontade plenamente, pois se uma vontade quisesse algo e escolhesse por escolher sem que isso se transforma-se em ato, então não era na realidade vontade, porque estaria a ser irracional e por isso a ser levada a agir pelo objeto, não sendo livre. Assim, a vontade declara-se como agente e autodetermina-se na medida em que a determinação do agir na altura em que se atua, bem como o domínio dos seus atos, que acontece porque antes houve uma escolha livre, causando o ato imediatamente, dando à vontade a superioridade do agir.9 Assim, a vontade controla-se a si e pode controlar o seu próprio ato, mostrando que não é determinada pelo objeto (conhecido) e desta maneira pode agir ou não agir, tal como não acontece com a natureza10. Como nos diz Duns Escoto no Comentário à Metafisica de Aristóteles, Livro IX, q.15.n.43, “uma forma natural, se é ilimitada e princípio de efeitos opostos nas matérias convenientemente dispostas a respeito deles, está determinada como aquela forma natural que é o princípio de um só efeito e de um modo determinado. Pois não está em seu poder gerar uma alternativa da forma que produz quando está presente o sujeito recetivo desta ou daquela forma, como tão pouco estaria em seu poder se fosse princípio somente de um efeito. A vontade, por outro lado, não é princípio de por si determinado a respeito da sua ação, seja a respeito de um ou de outro dos opostos, mas pode determinar-se a qualquer deles. […] porque a vontade é um princípio ativo distinto dos outros princípios ativos, que não são vontade, pelo modo oposto de agir.”(n.43)11. A vontade caracteriza-se então pela liberdade e por isso implica autodeterminação. Isto é, a possibilidade de agir de modo oposto àquele em se age, e portanto vai implicar também a noção de contingência. É daqui que o Doutor Subtil parte dizendo que não se existisse uma causa contingente, não teria havido também nenhum efeito contingente, visto que existem efeitos contingentes devem existir algumas causas

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Escoto, João Duns. Comentário à Metafisica de Aristóteles, Livro IX, questão 15 (QQSM,IX,q.15).Versão de Gonçalo Figueiredo para o Grupo de Filosofia Medieval da Faculdade de Letras da Universidade do Porto. 9 Cf. Figueiredo, Gonçalo José Gomes. Liberdade e Vontade Em João Duns Escoto – Leitura da Quodlibética XVI. Coimbra, 2009.p.48 10 Isto significa“ a potência está por si mesma determinada a agir de tal maneira que, por si mesma, não pode agir, se não está impedida extrinsecamente”. Escoto, João Duns. Comentário à Metafisica de Aristóteles, Livro IX, questão 15 (QQSM,IX,q.15).Versão de Gonçalo Figueiredo para o Grupo de Filosofia Medieval da Faculdade de Letras da Universidade do Porto. De outra forma, podemos dizer que aquilo que é natural é aquilo que é necessário e como tal está determinada não podendo ser de outra forma. 11 Escoto, João Duns. Comentário à Metafisica de Aristóteles, Livro IX, questão 15 (QQSM,IX,q.15).Versão de Gonçalo Figueiredo para o Grupo de Filosofia Medieval da Faculdade de Letras da Universidade do Porto.

contingentes, esta causa é a vontade porque ela tem o poder (por ser autodeterminada) dos opostos. “Além disso, se não for capaz dos opostos quando está determinada em ato, isto é, naquele preciso instante e durante ele, nenhum efeito atual seria ente no ato contingente. O consequente é falso, logo, também o antecedente. A falsidade do consequente é evidente pelo que diz o Filósofo no livro I do Perihermeneias12, onde ele quer que esta proposição seja necessária: «tudo o que é, quando é, é necessário que seja», porque algo existe de modo contingente. Prova do consequente: um efeito não se diz contingente em potência a não ser em razão da sua causa ser capaz de opostos; logo, tampouco o efeito se diz contingente em ato, a não ser que a causa, no primeiro ato de causar, não fosse capaz do contrário naquele instante em que causa esse efeito. Mas, para ti, nesse momento não é capaz, já que nesse momento está determinada, logo [nenhum efeito atual seria contingente em ato].”13 Aqui, Escoto fala acerca dos dois caminhos da contingência, isto é daquilo que é potencialmente contingente (diacronia) e daquilo que é atualmente contingente (sincronia). Se considerarmos a primeira temos que a vontade é capaz de efeitos opostos antes de agir e, portanto a vontade quer A no instante t1 e não quer A no instante t2, se considerarmos a segunda então a vontade é capaz de opostos no instante em que está a agir (presente), isto é, a vontade quer A no instante t1 e pode não quer A nesse mesmo instante.14 Todavia, a contingência diacrónica não é suficiente para explicar a liberdade porque no mesmo instante a vontade não seria capaz de atos opostos e portanto não seria livre. Temos então de recorrer á contingência sincrónica, como capacidade de no mesmo momento em que se escolhe se poder escolher algo diferente, para dizer que a vontade é contingente não só antes de exercer o ato, mas também no momento em que o está a exercer. Mais, podemos separar a vontade, que se liga ao bem, em affectio commodi e affectio iustitiae, ou seja a vontade pode ser cómoda /vantajosa ou vontade justa15. A primeira diz o homem age de forma a querer um bem para si, quer o melhor das possibilidades para si e age de acordo com esta afeição.16 A segunda afeição conduz a vontade no sentido do bem das coisas, sem que este bem seja em beneficio de um agente, é o bem das coisas em si. Assim a vontade tem dois caminhos para ir de encontro ao bem, por vontade livre ou por vontade natural17. A afeição cómoda liga-se com a natureza na medida em que corresponde a um apetite intelectual, tendendo o homem á felicidade. É uma vontade seguida enquanto desejo de amar algo que quero para o meu próprio bem. A afeição

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Aristot., Perihermeneias, I, 9, 19 a 23-24. Escoto, João Duns. Comentário à Metafisica de Aristóteles, Livro IX, questão 15 (QQSM,IX,q.15).Versão de Gonçalo Figueiredo para o Grupo de Filosofia Medieval da Faculdade de Letras da Universidade do Porto. 14 Cf.ITINERARIUM, A paradox in Scotu’s account of freedom of the will, Braga, Editorial Franciscana, SetembroDezembro 2009 / Nº.195. p.460.Número Especial comemorativo do VII Centenário da morte do Doutor Subtil. 15 Vemos aqui a herança Anselmiana na tese de Duns Escoto. 16 Cf.Barbosa, Diogo Morais. Natura sempre in se curva:a vinculação a si e a possibilidade de desvinculação segundo Duns Escoto.2012. Dissertação apresentada à Universidade Nova de Lisboa para obtenção do grau de Mestre em Filosofia Geral. 17 Vontade natural ou instintiva. 13

justa, leva o agente a ser justo na medida em que ama as coisas pela sua essência e não pelo beneficio que podem tirar delas, sendo por isso a mais nobre tendência da vontade.18 É esta última afeição que regula a afeição vantajosa porque é capaz de controlar a inclinação vantajosa na medida em que “se obriga a agir de acordo com a regra da justiça que recebe de uma vontade superior”19 e, portanto para que o homem seja livre é preciso que haja vontade livre e justa senão o homem iria ser levado pelo apetite intelectual a agir e isso levá-lo-ia a não poder pecar. Esta vontade com afeição justa permite-nos querer livremente algo sem termos de considerar a felicidade. Concluindo, Duns Escoto defende que a vontade é essencialmente livre, porque só ela pode causar o ato da vontade. O conhecimento ainda que intervenha como uma causa parcial, permitindo à vontade conhecer os objetos possíveis da vontade não a determina. Isto é, o conhecimento apresenta e julga o objeto dando opções de escolha à vontade permitindo à vontade ser racional20, mas é a vontade que decide, porque é movida por si mesma e por isso é livre e racional.21 A supremacia da vontade encontra-se no poder que tem em si mesma de poder continuar o ato do conhecimento que é considerado como fim, podendo também conduzir o conhecimento a outro objeto. A vontade é vontade e atua como tal, se a vontade e o seu objeto foram finitos então ela vai agir contingentemente. Sendo a liberdade uma característica da vontade, a vontade para realmente o ser tem de ser livre. Por fim, dentro da vontade temos a afeição cómoda e a justa que permitem à vontade agir segundo o bem. A primeira relaciona-se com o bem que eu retiro de algo para mim, ou seja, para o meu próprio bem e a segunda com a capacidade que tenho de amar as coisas por aquilo que elas são.

3. A VONTADE HUMANA É capaz de atos, objetos e efeitos opostos, sendo que esta capacidade de efeitos deriva dos objetos e dos atos. A liberdade que está na forma como agimos é imperfeita porque a passividade e a mutabilidade são necessárias para os atos opostos, contudo, a liberdade que consiste na capacidade da vontade querer objetos opostos é perfeição. Mas, uma vez que a vontade humana é limitada, é preciso que nos envolvamos em atos diferentes e opostos para alcançar objetos opostos. Isto é, quanto ao homem a vontade não está antes do objeto amável, mas sim a visão do objeto no entendimento, daí que a vontade seja superior ao intelecto: “Além disso, a potência que atua necessariamente acerca do objeto continua necessariamente enquanto pode tal ato. Mas a vontade, ao menos a vontade do viandante (viatoris), não continua necessariamente, enquanto pode, o ato Figueiredo, Gonçalo José Gomes. Liberdade e Vontade Em João Duns Escoto – Leitura da Quodlibética XVI. Coimbra, 2009.p.84 19 Figueiredo, Gonçalo José Gomes. Liberdade e Vontade Em João Duns Escoto – Leitura da Quodlibética XVI. Coimbra, 2009.p.85 20 É racional porque não quer nada necessariamente, basta que queira contingentemente para querer as outras coisas do modo que as quer. 21 É racional porque é capaz de decidir por si qual o objeto que quer. Se assim não fosse não era vontade. 18

acerca do fim apreendido em geral. Logo não atua necessariamente respeito a ele.” (n.16)22 E mais, “[…] Ainda que em algum objeto se dê toda a perfeição, todavia, para a necessidade do ato requerse que a potência tenda necessariamente para ele. Seja o que for da vontade criada bemaventuradamente e da sua perfeição sobrenatural, pela que tenda a tal objeto, contudo, se diria que a vontade do viandante tende só contingentemente a ele, inclusive quando a apreende na sua universalidade. Pois esta apreensão não determina a vontade a quere-lo necessariamente nem, posta a apreensão, se determina necessariamente a vontade bem contínua necessariamente querendo-o […].”(n.22)23 A vontade humana é indeterminada e por isso não permite em si realizar atos de vontade opostos, contudo ela tende livremente para objetos imediatamente ou então é movida por outras potências exteriores. Falamos aqui também da liberdade da vontade na medida em que a sua indeterminação lhe permite autodeterminar-se e desta forma poder quer um objeto, o seu contrário e o não o querer. É pela indeterminação da vontade humana que é possível os seres serem livres, mas como tudo o que é humano e criado, existem imperfeições nela24. Esta vontade está condicionada por atos concretos que executa e também por objetos a que o ato se incline. Assim pelo agir da vontade, os objetos são ordenados contingentemente, ou seja, aquilo que a vontade quer neste momento, pode no momento seguinte já não querer , ou então querer o contrário. Vemos então aqui a abertura de possibilidades que a vontade humana oferece e daí a sua indeterminação. A vontade é por si mesma autodeterminação para opostos, pois é uma potência que não está exaustivamente constituída por qualquer tendência, ou tendências em função de um objeto, é esta a caraterística da sua indeterminação.25 Assim, sendo a vontade uma potência voluntária e autodeterminada a capacidade de opostos deve afetar cada afeição separadamente. Este poder da vontade para opostos contraditórios deveria incluir também o poder de querer ou não algo vantajoso, não quer ou não não querer algo vantajoso e também o poder de querer ou não querer justiça e o não querer ou não não querer qualquer justiça.26 A estas duas afeições chamamos de affectio commodi e affectio iustititae.27

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Scotus, Johannes Duns. Opera Omnia, Quodl.q.XVI,n.16.Georg Olms Hildesheim,1969. Scotus, Johannes Duns. Opera Omnia, Quodl.q.XVI,n.16.Georg Olms Hildesheim,1969. 24 É assim porque só Deus é perfeito. 25 Figueiredo, Gonçalo José Gomes. Liberdade e Vontade Em João Duns Escoto – Leitura da Quodlibética XVI. Coimbra, 2009.p.81,82. 26 Figueiredo, Gonçalo José Gomes. Liberdade e Vontade Em João Duns Escoto – Leitura da Quodlibética XVI. Coimbra, 2009.p.82. 27 já referidas anteriormente. 23

4. CONCLUSÃO Podemos então concluir que para João Duns Escoto a vontade é superior ao intelecto na medida em que ela é capaz de se mover a ela mesma, precisando, contudo do intelecto para a ajudar na altura da captação do objeto querido e na deliberação mas, não determinando a escolha do objeto querido. Isto acontece assim porque só podemos querer algo que conhecemos. Verificamos então que o intelecto é uma condição necessária mas não determinante da vontade. É por esta capacidade que a vontade se diz autodeterminada e tal não acontece ao intelecto porque ele conhece necessariamente e por esse motivo liga-se áquilo que é natural e portanto não tem nenhum meio para se controlar a si mesmo tendendo ao objeto necessariamente. Desta forma, a ação da deliberação racional realiza a vontade plenamente e declara-a autodeterminada, visto que se controla a si mesma e pode controlar também o seu próprio ato, mostrando que não é determinada pelo objeto, e assim agir ou não agir. Tal não acontece com a natureza, pois esta é determinada e é princípio de um só efeito e de um modo determinado. A vontade caracteriza-se então pela liberdade que implica autodeterminação, ou seja agir de modo oposto ao qual se age e isto implica contingência. Esta contingência pode dar-se diacrónica ou sincronicamente, sendo que a primeira, por ser de efeitos opostos antes de agir, não é suficiente para explicar a liberdade porque no mesmo instante a vontade não seria capaz de atos opostos e por isso não seria livre. Contudo a contingência sincrónica permite que no mesmo instante em que se escolhe se possa escolher de modo diferente conferindo assim liberdade à vontade. Falamos ainda das afeições da vontade, na medida em que ela se relaciona com o bem e, por isso através das afeições commodi e iustititae vemos como a vontade age relativamente a um bem para mim – affectio commodi – e como age relativamente a um bem intrínseco a algo sem que tenha algum beneficio para mim – affectio iustititae. Estas são as duas formas que a vontade tem de se dirigir para o bem. A primeira é uma afeição por aquilo que nos é conveniente tendendo a vontade a querer o bem ligado ao agente, ou seja o bem para si próprio e relaciona-se com o apetite intelectual ou natureza. Ela é vista como que um desejo, algo que eu desejo para mim, e a afeição justa leva a vontade ás coisas que são realmente boas por elas mesmas, sem que sejam um beneficio para nós, esta afeção é capacidade de amar as coisas por aquilo que elas são. Para Duns Escoto nenhuma destas afeições é superior á vontade, no entanto fazem parte dela, na medida em que estas duas afeições permitem ao homem querer algo bom, assim como a desvantagem e a injustiça o permitem não querer algo. Portanto, a affectio commodi refere-se ao apetite intelectual e a affectio iustititae dá-nos a possibilidade da vontade ser livre, algo que não aconteceria se fosse um apetite intelectual.

Este autor dá portanto primazia á vontade relativamente ao intelecto, sendo este o servo da vontade pois é condição necessária para que a vontade aconteça porque para existir uma vontade, tem de ser a vontade de algo que é conhecido. Quanto à vontade humana ela é capaz de objetos e efeitos opostos. A liberdade do agir, contudo é imperfeita porque a passividade e a mutabilidade são condições necessárias para os atos opostos. A vontade humana é assim indeterminada e, por isso em si não permite atos de vontade opostos mas tende livremente para objetos imediatamente. Está condicionada por atos concretos aos quais se inclina e é uma vontade contingente, ou seja, o objeto que quero neste momento posso também não o querer ou querer outra coisa completamente diferente. Assim a vontade para opostos no caso do homem afeta também as afeições e por isso deve incluir a afeção cómoda e a afeição justa. Por tudo aquilo que já foi visto anteriormente conclui-se que o Duns Escoto se empenhou ao máximo por defender a sua tese voluntarista, contudo o seu voluntarismo será sempre racional.

5.BIBLIOGRAFIA •

Barbosa, Diogo Morais. Natura Semper In Se Curva – A Vinculação a Si e a Possibilidade De Desvinculação Segundo Duns Escoto. Lisboa, Março de 2012. Dissertação apresentada para cumprimento de requisitos necessários à obtenção do grau Mestre em Filosofia Geral, na Universidade Nova de Lisboa.



Figueiredo, Gonçalo José Gomes. Liberdade e Vontade Em João Duns Escoto – Leitura da Quodlibética XVI. Coimbra, 2009. Dissertação apresentada à Faculdade de Letras da Universidade de Coimbra para obtenção do grau de Mestre em Filosofia.



Honnefelder, Ludger. João Duns Scotus. Edições Loyola,2010.



Kenny, Anthony. Filosofia Medieval. Gradiva,2010.



Merino, José António. João Duns Escoto-Introdução ao seu pensamento filosóficoteológico. Editorial Franciscana,2008.



Williams, Thomas. Duns Scotus. Editora Ideias & Letras,2013



Scotus, Johannes Duns. Opera Omnia. Georg Olms Hildesheim, 1969



.ITINERARIUM, A paradox in Scotu’s account of freedom of the will, Braga, Editorial Franciscana, Setembro-Dezembro 2009 / Nº.195. p.460.Número Especial comemorativo do VII Centenário da morte do Doutor Subtil.



VERITAS, A Questão 15 do Livro IX das Quaestiones Super Libros Metaphysicorum Aristotelis de Duns Scotus: Introdução, Estrutura e Tradução, Porto Alegre-Brasil, ediPUCRS, Julho-Setembro 2008/ Nº3/ Vol.53.



Williams, Thomas, "John Duns Scotus", The Stanford Encyclopedia of Philosophy (Summer 2013 Edition), Edward N. Zalta (ed.), URL = .

ÍNDICE 1 1.INTRODUÇÃO ................................................................................................................................................................... 1 2 2. CONCEITO DE VONTADE ................................................................................................................................................. 2 3 3. A VONTADE HUMANA .................................................................................................................................................... 5 4 4. CONCLUSÃO .................................................................................................................................................................... 7 5 5.BIBLIOGRAFIA .................................................................................................................................................................. 9

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