ACESSO A MEDICAMENTOS E PROPRIEDADE INTELECTUAL: PARTICIPAÇÃO DA SOCIEDADE CIVIL NA FORMULAÇÃO DA POLÍTIDA EXTERNA BRASILEIRA

July 22, 2017 | Autor: Luciana Borges | Categoria: Intellectual Property, Foreign Policy Analysis, Patents, Civil Society, Propriedade Intelectual
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Graduanda dos cursos de Relações Internacionais (UFPB) e Direito (UNIPÊ).
Esse debate e a pressão dos países em desenvolvimento acarretou no avanço para os que defendem a maior flexibilização do TRIPS através da Declaração sobre o Acordo TRIPS e Saúde Pública (Declaração de Doha) OMC e, posteriormente, da implementação da emenda adotada pelo Conselho-Geral da Organização Mundial do Comércio, em 6 de dezembro de 2005, que consiste em incluir no texto do Acordo TRIPS o teor da Decisão do Conselho-Geral da OMC, adotada em 30 de agosto de 2003 (a qual regulamenta o Parágrafo 6 da Declaração Ministerial de Doha sobre TRIPS e Saúde Pública), mediante a flexibilização das normas constantes no artigo 31 do TRIPS; e do acréscimo de um anexo ao Acordo TRIPS relativo ao licenciamento compulsório de patentes. O Acordo TRIPS e a Declaração sobre o Acordo TRIPS e Saúde Pública (Declaração de Doha) OMC serão discutidos posteriormente, na seção destinada ao tema.
O direito à saúde é interesse público constitucionalmente protegido e parte do rol dos direitos humanos, através da Declaração Universal dos Direitos Humanos (1948), que estabelece um vasto campo de dispositivos referentes aos direitos sociais, em especial à saúde. Tendo grande influência desse documento, a Constituição Federal de 1988 designou uma seção exclusiva para tratar dos direitos sociais, sendo esses qualificados como direitos fundamentais, dentre eles à saúde. Em destaque, temos o artigo 5º, 6º, 196 (CF88); que exigem a ação do Estado na prestação e eficácia desse direito, tendo aplicabilidade imediata e eficácia plena, uma vez que se consubstancia como direito subjetivo público.
Faz-se uma ressalva que esses países não são um grupo homogêneo e tem visões diferentes sobre algumas matérias. Entretanto, no que se refere ao acesso a medicamentos, temos forte atuação do Brasil, Índia e África do Sul, representando esse grupo frente às Organizações e Regime que disciplinam a temática.
O orçamento total do Ministério da Saúde p ara a compra de medicamentos antirretrovirais em 2007 foi de R$ 984.000.000,00. Estima-se que mais de 80% desse valor é utilizado para a aquisição de 11 medicamentos patenteados e 20% para a compra de 7 medicamentos fabricados por laboratórios nacionais (BRASIL, 2009).

A Tailândia mudou a sua legislação em 1994-1995, o Brasil no início de 1996, mas a lei só entrou em vigor em 1997; e a Índia somente no final de 2005, o que lhe garantiu exercer um papel importante como fornecedor de medicamentos genéricos a custos baixos.
Em 2005, quatro medicamentos importados nelfinavir, efavirenz, lopinavir/r e tenofovir foram responsáveis por mais de 50% do orçamento do PN DST Aids.
Nos anos de 2005 e 2006, os gastos somente com a compra de efavirenz 600mg representaram cerca de 11% dos gastos totais do ministério com medicamentos antirretrovirais (BRASIL, 2009).
Para mais informações ver .
ABIA, Patentes farmacêuticas: por que dificultam o acesso a medicamentos?, 2006. Disponível em: . Acessado em: 17/02/14.

Apresentado por NYE (2008), o conceito de soft power contrasta com o hard power pelo qual a coerção (sustentada por poderio militar e econômico) é usada para influenciar os outros a agir de maneiras pelas quais eles não fariam normalmente. Desse modo, o soft power é definido pelo autor como a capacidade de persuadir ou atrair os outros a fazerem o que se quer através da força de ideias, conhecimentos e valores.
Os Objetivos de Desenvolvimento do Milênio - ODM (UN, 2000) constituem um pacto global entre as nações do mundo para diminuir a pobreza e as barreiras relacionadas com a saúde para o desenvolvimento, com metas e objetivos definidos. Enquanto todas as ODM têm influência importante sobre a saúde, vários são consideradas como específicas da saúde. O Brasil se engajou consideravelmente com os ODM, atingindo, antes mesmo no prazo preestabelecido, as metas almejadas, inclusive nas questões de saúde e combate à AIDS. Entretanto, é primordial que se estabeleça um laço mais sólido de diálogo com a sociedade civil nacional e internacional, de forma que a relevância da participação social no cumprimento de tais metas se consolide (LOPES, 2013).
Relatório disponível em: http://www.unric.org/html/portuguese/mdg/MDG-PT-2013.pdf Acesso em 22/02/2014.
Relatório disponível em: http://www.paho.org/hq/index.php?option=com_docman&task=doc_view&gid=23710&Itemid= Acesso em 22/02/2014.
Saiba mais em: https://portal.fiocruz.br/pt-br/content/instituto-de-tencologia-em-farmacos-produzira-sulfato-de-atazanavir Acessado em 23/02/2014.
Saiba mais em: http://www2.far.fiocruz.br/farmanguinhos/index.php?option=com_content&view=article&id=742&catid=53&Itemid=94 Acessado em 23/02/2014.
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ACESSO A MEDICAMENTOS E PROPRIEDADE INTELECTUAL: PARTICIPAÇÃO DA SOCIEDADE CIVIL NA FORMULAÇÃO DA POLÍTIDA EXTERNA BRASILEIRA
Borges, Luciana Correia

RESUMO
O presente artigo toma em conta a efetiva participação da sociedade civil nas decisões do governo brasileiro concernentes à saúde pública, tanto no âmbito interno quanto internacional, configurando uma postura de política externa baseada no processo bottom up; e discute possíveis caminhos para combater as doenças epidêmicas que tanto afetam os menos favorecidos, trabalhando o papel da diplomacia da saúde global. A revisão da literatura, incluindo fontes primárias e documentos que tratam da questão, foi utilizada como metodologia para uma análise qualitativa da conjuntura que permeia o Regime de Propriedade Intelectual e a atuação dos diversos atores diante do mesmo. Como resultado, percebemos que o preço elevado de medicamentos patenteados e as barreiras de acesso a medicamentos essenciais intensificaram o debate em torno do impacto desse Regime sobre a saúde pública, merecendo destaque os casos das doenças epidêmicas. O Brasil, juntamente com a Índia e a África do Sul, por meio do soft power diplomático, atuou com esforços na luta pela primazia do direito à saúde em detrimento dos interesses econômicos potencializados pela indústria farmacêutica e os países desenvolvidos, se configurando como grande responsável pelo avanço obtido no contexto internacional a respeito da saúde global, com destaque à política de acesso a medicamentos retrovirais.

Palavras-chave: Patentes. Medicamentos Essenciais. Sociedade Civil. Relações Internacionais. Saúde Pública. Diplomacia da Saúde Global.

ABSTRACT
This article takes into account the effective participation of civil society in decisions concerning public health by the Brazilian government, in the domestic and international field, setting up a foreign policy posture based on the bottom up process; and discusses possible ways to better combat epidemic diseases that affect the world's poorest people, regarding the role of the global health diplomacy. A review of the literature, including primary sources and documents dealing with the subject, was used as a methodology for a qualitative analysis of the situation that permeates the Intellectual Property Regime and the role of various actors before it. As a result, we realized that the high price of patented drugs and barriers to access essential medicines intensified the debate that surrounds the impact of this Regime on public health, with emphasis on cases of epidemic diseases. Brazil, along with India and South Africa, through soft power diplomacy, has employed a strong stance in favor of the primacy of the right to health at the expense of economic issues magnified by the pharmaceutical industry and developed countries, shaping up as largely responsible for the progress made in the international context regarding the global health, with emphasis on the policy for access to anti-retroviral drugs.

Keywords: Patents. Essential Drugs. Civil Society. International Relations. Public Health. Global Health Diplomacy.

INTRODUÇÃO
O objetivo deste artigo é analisar o engajamento da sociedade civil na formulação da política externa brasileira no que tange a saúde pública e o acesso a medicamentos. Para tanto, optou-se por focar na problemática em torno das doenças epidêmicas, principalmente a HIV/AIDS; tratando das discordâncias que permeiam as flexibilidades do sistema internacional de proteção à propriedade intelectual e da participação do Brasil nas discussões e negociações que envolvem direitos de propriedade intelectual e saúde pública, ao longo da Rodada Doha da Organização Mundial do Comércio (OMC).
A batalha sobre o acesso a medicamentos essenciais gira em torno, além de outras questões, da fabricação e exportação de medicamentos, o que esbarra nas normas internacionais de proteção a propriedade intelectual, que regulam a possibilidade dos Estados emitirem licença compulsória e fazerem uso da importação para paralela para ampliar a capacidade de produção de genéricos e ampliar o acesso a fármacos essenciais.
Em contrapartida, o Brasil, junto às organizações não governamentais (ONGs) e outros países em desenvolvimento, tem procurado esclarecer interpretações e aplicar normas que permitam maiores acesso a conhecimento protegido, por um lado, evitando a produção de normas específicas que aumentem os períodos de proteção; assim como, por outro, através da utilização de prerrogativas existentes no sistema internacional como a emissão de licenças compulsórias, da importação paralela e da fabricação e exportação de medicamentos genéricos.
Voltando-se especificamente para o Regime Internacional de Propriedade Intelectual, temos como padrão mínimo de regimento o Acordo sobre Aspectos dos Direitos de Propriedade Intelectual Relacionados ao Comércio – TRIPS, na sua silha em inglês – acordo da OMC que foi negociado na Rodada Uruguai de negociações, entre 1986-1994, por parte dos membros da OMC. Esse estabelece certas regras relativas aos direitos de propriedade intelectual com o objetivo de estabelecer um conjunto uniforme de regras em todo o mundo, visando certa padronização, previsibilidade e estabilidade nas relações econômicas internacionais. Nesse cenário de padronização das normas, os Direitos de Propriedade Intelectual (DPIs) passaram a ser contestados, posto que o conhecimento é, ao mesmo tempo, uma forma de capital e um bem público, mas as discussões tornaram-se mais agudas desde a entrada do Acordo TRIPS da OMC, em 1995. Desde então, essa estrutura internacional de DPIs tem sido quase exclusivamente dominada por interesses privados, especialmente os da indústria farmacêutica, originários, na sua grande maioria, em países desenvolvidos. Isso sugere que a política de propriedade intelectual é mais voltada para os interesses comerciais dos produtores do que para uma concepção imparcial de interesse público (MUZAKA, 2011; SELL, 2007).
Entretanto, no que concerne o acesso a medicamentos, as ONGs e os países em desenvolvimento alcançaram um considerável avanço através da Declaração de Doha e Saúde Pública, de novembro de 2001. Por meio dessa, países membros da OMC asseguraram direitos para implementar o TRIPS de forma a proteger a saúde pública e promover o acesso a medicamentos para todos, configurando a Declaração como um importante mecanismo legal que consolidou um valioso policy space para o governo tratar das questões de interesse público (GALLAGHER, 2005; MUZAKA, 2011; SELL,2007).
Historicamente, movimentos sociais e coletivos de ONGs têm lutado para garantir a sustentabilidade de políticas públicas de saúde; o acesso universal a medicamentos utilizados no tratamento de doenças epidêmicas e o fortalecimento do Sistema Único de Saúde (SUS). A projeção desse engajamento da sociedade civil na conformação do direito à saúde se fez presente, de forma eficaz, na luta pelo acesso universal ao tratamento antirretroviral, marcada pela confluência de esforços das ONGs, as quais apresentaram diversas ações judiciais exigindo o acesso gratuito e universal ao tratamento necessário; e pelos setores do governo, responsivos às exigências de tais organizações.
No que se refere especificamente à proteção à propriedade intelectual e a atuação dos movimentos sociais para "sensibilizar" o governo, um caso que reflete essa atuação de ONGs e sociedade civil é a licença compulsória emitida pelo Brasil para o antirretroviral Efavirenz, em 2007. Esse caso se tornou emblemático para a questão, uma vez que contou com um abaixo-assinado em apoio à licença, caracterizando a pressão das ONGs e grupos de ativismo domésticos que já advogavam pelo licenciamento compulsório de antirretrovirais no Brasil há cerca de dez anos.
Desse modo, no que tange a saúde pública, a formulação da política externa brasileira no se aproxima da formulação proposta por Andrew Cooper (2005) como um processo bottom up, tendo em vista que a participação da sociedade tem sido cada vez mais importante para garantir que a promoção e proteção do direito a saúde recebesse tratamento prioritário, exigindo, também, que o governo assumisse a responsabilidade pelas decisões e posições adotadas no plano internacional. Assim, podemos inferir que a sociedade civil é importante para criação de uma cultura de accountability na política externa, além de contribuir com o fortalecimento da democracia no nível nacional.
É importante ressaltar que, recentemente, a tensão e contradição associadas à proteção da propriedade intelectual e saúde pública se tornaram mais latentes devido ao maior escopo de fóruns e regimes que tratam da questão, expandindo a discussão para além da OMC e por meio de regras TRIPS-plus - que transcendem os ditames do Acordo TRIPS - causando um impacto direto na sustentabilidade do acesso universal ao tratamento retroviral oferecido pelo Brasil.
Destarte, a meta desse estudo é deixar particularmente claro que as novas demandas exigem repensar a participação da sociedade civil organizada e a redefinição de suas lutas frente ao contexto e a complexidade que permeiam o atual sistema de proteção de propriedade intelectual e acesso a medicamentos, principalmente por meio da diplomacia da saúde global.

REGIME DE PROPRIEDADE INTELECTUAL E O INTERESSE PÚBLICO

ASPECTOS GERAIS

Ao longo das discussões sobre a proteção dos DPIs e saúde pública, duas vertentes merecem destaque. De um lado, há o argumento de que todos os direitos de propriedade intelectual são valiosos para os negócios e beneficiam o público em geral, posto que abrem as portas para o progesso técnico. Argumento normalmente encampado pelos países desenvolvidos. Esses defensores destacam os altos custos de desenvolvimento de novas drogas, a importância dos direitos de propriedade fortes como incentivos para a inovação, e a necessidade de uma compensação substancial para o desenvolvimento de medicamentos que salvam vidas. A indústria farmacêutica global, enquanto instituição privada, juntamente com os Estados Unidos, União Europeia e Japão promovem essa perspectiva. Ela também tem sido influente na OMC e na Organização Mundial da Propriedade Intelectual (OMPI) (MUZAKA, 2011; SELL, 2007).
De outro lado, temos os representantes de países em desenvolvimento, impulsionados por determinadas ONGs, os quais advogam que os direitos de propriedade intelectual são susceptíveis de prejudicar o desenvolvimento da indústria local e a tecnologia; além de causarem relevante impacto no acesso a medicamentos. Eles defendem o acesso ao conhecimento, em geral, inclusive por meio do licenciamento compulsório, da indústria de medicamentos genéricos e da importação paralela. Desse modo, esta visão aponta que a forte proteção à propriedade intelectual pode trazer resultados adversos para economias em desenvolvimento e para setores de interesse público.
Entretanto, os argumentos utilizados pelos países desenvolvidos não corresponderam à situação concreta após a assinatura do TRIPS, ao passo que, como mostram as evidências, essas promessas de benefícios ao público em geral não estão se materializando. O que ocorre, de fato, por meio das novas disciplinas multilaterais, é o aumento das exportações dos países desenvolvidos, seguidos pelas perdas de bem-estar e visíveis crises no âmbito da saúde pública nos países em desenvolvimento. Como consequência, tivemos o fortalecimento de críticas a respeito dos Direitos de Propriedade Intelectual, por parte das ONGs e países em desenvolvimento, assim como a consolidação das cooperações na área de saúde pública (CORREA, 2000).
Até a consolidação do acordo TRIPS, em 1995, os acordos internacionais de propriedade intelectual permitiam que os governos nacionais tivessem uma maior liberdade política para projetar suas próprias leis de propriedade intelectual. Entretanto, o TRIPS interferiu abertamente nesse processo através da imposição de uma maior proteção da propriedade intelectual, que excluiu a possibilidade das normas jurídicas serem contestadas e desenvolvidas internamente. Em outras palavras, o acordo TRIPS transformou o tradicional paradigma nacional; pautando as políticas em função das obrigações do Acordo ao invés de atender as exigências domésticas.
Nesse contexto, a exacerbada proteção dos direitos à propriedade afetaram diretamente as liberdades importantes para que países optassem por definir, de forma autônoma, políticas públicas destinadas a garantir a provisão devida de políticas sociais aos seus cidadãos, principalmente no tocante à saúde pública.
Essa questão nos remete ao tema trabalhado por Gallagher (2005), qual seja: a questão concernente ao policy space. Segundo o referido autor, o que antes era tido como um instrumento majoritariamente de política nacional, agora se configura cada vez mais sujeito a disciplinas internacionais, ao passo que o mundo se move para uma harmonização no gerenciamento na área de Propriedade Intelectual. Entretanto, o movimento em direção à harmonização diverge de alcançar uma harmonização, além de ser essencial ter em mente que o primeiro e não o último descreve os arranjos contemporâneos. Nesse sentido, a tendência é de uma redução no policy space, um recurso que para muitos estudiosos merece relevante preocupação (Gallagher, 2005).
A maior forma de limitação do policy space no âmbito da saúde pública e acesso a medicamentos é através das peculiaridades contidas no TRIPS. Dentre as normativas do Acordo, podemos destacar que ele estende os direitos de patente por, no mínimo, 20 anos; obriga a concessão de patentes para todos os setores tecnológicos, incluindo os produtos farmacêuticos; e, de grande impacto, circunscreve as liberdades que os Estados possuem ao definir critérios para exaustão de direitos, como a emissão de licenças compulsórias e importação paralela. No geral, o TRIPS reflete e promove os interesses das corporações globais que buscam ampliar seu controle sobre sua propriedade intelectual. Essas empresas, por intermédio do governo dos Estados Unidos (e com o apoio da Europa e Japão), capturaram o processo da OMC e conseguiram fazer com que a lei pública internacional se adequasse aos seus interesses particulares (SELL, 2007; MUZAKA, 2011).
Como consequência desse cenário, ou seja, do aumento do controle sobre o conhecimento, exercício mais forte do monopólio e aumento dos preços; a aquisição dos medicamentos essenciais se tornou cada vez mais custosa, principalmente para aqueles que mais precisam deles, impactando negativamente na garantia do direito à saúde. Ao passo que as patentes afetam a promoção da saúde pública, principalmente através do impacto no acesso a medicamentos, a concessão de direitos exclusivos aos titulares das mesmas permite a cobrança de preços exacerbados em relação aos custos marginais de produção, tornando os medicamentos patenteados mais caros e acessíveis a menos clientes; o que seria diferente se tivessem produtos similares produzidos em ambiente competitivo.
Um caso específico demonstra claramente a disparidade de preços em um ambiente competitivo – sem proteção patentearia –e não competitivo, a saber: 150 mg do medicamento para HIV fluconazola custa 55 dólares na Índia, onde não é protegido por patente, e 697 dólares na Malásia, 703 dólares na Indonésia e 817 dólares nas Filipinas, onde existe a proteção por patente (NWOBIKE, 2006).
A proteção ao direito à propriedade intelectual não pode inviabilizar nem comprometer o dever dos Estados de garantir o respeito, a proteção e a implementação do direito ao acesso a medicamentos, pelo fato de ser a propriedade intelectual um produto social que possui uma função social,
Que não pode ser obstada em virtude de uma concepção privatista deste direito que eleja a preponderância incondicional dos direitos do autor em detrimento da implementação dos direitos sociais, como o são, por exemplo, à saúde, à educação e à alimentação (PIOVESAN, 2007, p. 22).

Nesse sentido, se consolidou dentre os países em desenvolvimento uma concepção a respeito do Sistema de Propriedade Intelectual e o direito à saúde pautada no fato de que o acesso a medicamentos deve ser o objetivo principal na determinação do regime. Portanto, tais direitos devem ser monitorados de perto, para assegurar que, de fato, promovam objetivos de assistência à saúde e, acima de tudo, não sejam uma barreira na formulação de políticas públicas em prol da efetivação do acesso à saúde. Dessa forma, o Acordo TRIPS e suas limitadas flexibilidades não deveriam mais se configurar como um mecanismo impeditivo do direito à saúde; afetando diretamente as populações pobres dos países em desenvolvimento pelo mero fato de ser um direito constitucionalmente resguardado e, inclusive, parte do rol dos Direitos Humanos.
De um modo geral, esse debate trouxe um avanço para os que defendem a maior flexibilização do TRIPS através da Declaração da Rodada Doha (OMC). Em 14 de novembro de 2001, a Conferência Ministerial da Organização Mundial do Comércio, reunidos em Doha, no Catar, adotou a Declaração sobre o Acordo TRIPS e Saúde Pública (Declaração de Doha), que ressalta que o Acordo sobre os Aspectos dos Direitos de Propriedade Intelectual Relacionados com o Comércio "pode e deve ser interpretado e implementado de forma a apoiar o direito dos membros da OMC de proteger a saúde pública e, em particular, promover o acesso a medicamentos para todos". Outro ponto a ser enfatizado é que a Declaração "reafirma que o Acordo fornece flexibilidade(s) para essa finalidade" (ABBOTT, 2005).
Os atores da sociedade civil tinham estado ausentes durante as negociações do TRIPS, mas eles surgiram como os principais intervenientes no debate da saúde pública e propriedade intelectual. Na verdade, foram esses que estabeleceram a ligação, em primeiro lugar. A declaração foi uma vitória para os países em desenvolvimento e os atores da sociedade civil, na medida em que, sendo aprovada por todos os membros do regime de comércio, ela reconheceu explicitamente as flexibilidades oferecidas no TRIPS e do direito desses membros para usá-las para resolver problemas de saúde pública, como exposto anteriormente. Entretanto, assim como o TRIPS, a Declaração não foi a última palavra sobre o assunto, permanecendo aberta à interpretação (MUZAKA, 2011; SELL, 2007).
De fato, assim como o TRIPS trouxe consigo as sementes para futuras contestações dentro do regime de comércio e fora dele, a declaração continuou a ser contestada, desafiada e negada. A maior forma de negação se dá através da utilização de regras TRIPS-plus, no âmbito de Acordos Preferenciais de Comércio, seja de forma bilateral ou regional; e na utilização de outros fóruns que não o multilateral para negociação de novos compromissos internacionais sobre a matéria. Essa estratégia sugere que os poderes econômicos e políticos se configuram como fator chave nas negociações comerciais (ABBOTT, 2005).
Nesse contexto, a margem de manobra que os Estados mais pobres/fracos têm na utilização de abordagens regulatórias que são mais adequadas às suas necessidades individuais e estágios de desenvolvimento é reduzida. Os EUA e a EU perseguem agressivamente os esforços empregados pelos países em desenvolvimento na utilização das flexibilizações do TRIPS por meio da assimetria de poder, através do jogo de governança aplicado aos acordos bilaterais e regionais.
Assim, a Declaração de Doha não contestou a ligação da propriedade intelectual com o comércio contida no TRIPS, ao contrário, ela reafirmou o compromisso dos governos, por meio do Acordo, na proteção do papel da propriedade intelectual em pesquisa e inovação; e apenas consolidou uma pequena brecha na utilização de conhecimento protegido.
A vitória da rede de atores representantes dos países em desenvolvimento reside apenas no fato de que a Declaração esclareceu as flexibilidades do TRIPS, oferecendo aos governos que enfrentam desafios de saúde pública (licença compulsória e importação paralela), flexibilidades que até então tinham sido ativamente restritas e mal interpretadas. Dada a expansão dos direitos de propriedade intelectual e distribuição desigual de poder político e econômico em todo o mundo, os países em desenvolvimento enfrentam desafios substanciais para guiar o sistema em seu benefício (MUZAKA, 2011; SELL, 2007).
Assim, o cenário internacional frente ao caso da HIV/AIDS, e demais problemas de saúde pública que atingem, em especial, os países em desenvolvimento, é permeado por contradições e disputas de interesse econômico em detrimento do interesse público. Desse modo, a resposta global para essas questões continua ineficaz, o que acarreta em bilhões de pessoas sem acesso ao básico necessário no que toca a saúde pública.


A INDÚSTRIA FARMACÊUTICA E AS DOENÇAS EPIDÊMICAS

Apesar do inquestionável avanço na prevenção e tratamento em muitas regiões do mundo, doenças como a HIV/AIDS, a tuberculose (TB) e a malária continuam a flagelar os mais pobres e mais vulneráveis da população mundial. É constatado que a grande maioria das pessoas que sofre dessas doenças vive em países menos desenvolvidos, onde prevalecem baixos salários, falta de condições sanitárias e limitado acesso a serviços médicos básicos. Essas condições, atreladas aos altos preços dos medicamentos praticados no mercado, produzem uma grande dificuldade no acesso a muitos dos medicamentos que salvam vidas e que, por sua vez, são normalmente de fácil acesso em países desenvolvidos (PNUD, 2013; PORTALODM, 2014).
Dados comprovam que cerca de um terço da população mundial não tem acesso a medicamentos essenciais; e os 80% da população mundial que vive em países em desenvolvimento e menos desenvolvidos consomem menos de 20% de todos os produtos farmacêuticos (PNUD, 2013). No Brasil, dados do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE) constataram que 40% dos brasileiros não têm acesso efetivo a medicamentos essenciais. Segundo Basso e Polido (2005), a respeito do balanço das despesas familiares, os gastos com saúde aparecem em quarto lugar, perdendo, apenas, para os gastos com habitação, alimentação e transporte. Nesse cenário, grande parte dos gastos decorre da compra de medicamentos essenciais que, na sua maioria, apresentam preços elevados e desproporcionais à renda efetiva da população brasileira.
O problema do acesso a medicamentos essenciais para o mundo em desenvolvimento é pautado em duas razões primordiais. Em primeiro lugar, a Pesquisa e Desenvolvimento (P&D) para produção de novos medicamentos têm sido impulsionados principalmente pelas forças de mercado, em detrimento da necessidade médica. Problemas típicos do mundo industrializado – como impotência sexual, obesidade, calvície e outros problemas estéticos – são prioridade nos esforços inovadores dos grandes laboratórios farmacêuticos, negligenciando doenças que afetam desproporcionalmente os pobres, como a AIDS, a tuberculose e a malária. De fato, 90% da carga de doenças no mundo pertencem a uma população para quem apenas 5% das despesas com P&D são dirigidas. Um recente estudo, em que foram realizadas entrevistas com dirigente das onze maiores empresas farmacêuticas do mundo, descobriu que dos 1.393 medicamentos introduzidos nos últimos 25 anos, apenas 13 trataram dessas doenças supracitadas (menos de 1%), que são as principais causas de morte no mundo em desenvolvimento (MUZAKA, 2011).
Em segundo lugar, os preços elevados das marcas e produtos farmacêuticos patenteados muitas vezes criam uma barreira ao acesso dos países em desenvolvimento. O monopólio da patente de novas drogas oferece tempo mais que suficiente para que a empresa recupere seu custo na P&D do medicamento, custo esse com estimativa bastante controversa. Além disso, investidores, muitas vezes, procuram recompensar o gasto com a patente através de uma série de lacunas existentes. Nesse sentido, os acordos comerciais internacionais tornaram-se uma questão extremamente importante para o acesso a medicamentos essenciais e serviços de saúde.
Vale ressaltar que a lógica que move as empresas farmacêuticas é a lógica do mercado, levando à concentração de seus esforços em P&D para setores em que há um mercado potencial que lhes permita recuperar o investimento e obter lucros. O que não coincide necessariamente com as necessidades de saúde humana. Isto posto, na indústria farmacêutica, os investimentos em P&D têm como objetivo primordial ganhos de competitividade face a produtos estabelecidos no mercado.
O argumento utilizado pelas empresas farmacêuticas para justificar tal postura é, como coloca a Pharmaceutical Research and Manufacturers of America (PhRMA; Estados Unidos), que o custo médio para o lançamento de um novo medicamento pode atingir 800 milhões de dólares americanos, sendo que todo o processo, desde a descoberta da molécula, a realização de testes pré-clínicos e clínicos à entrada de um medicamento no mercado, pode levar entre 10 e 15 anos; somado ao fato de que o índice de perda entre projetos iniciados e medicamentos aprovados para comercialização é alto. Substantivamente, os defensores da PhRMA são contra qualquer enfraquecimento da proteção da propriedade intelectual por meio de exceções à saúde pública. Eles rejeitam a licença compulsória como instrumento de política para reduzir os custos de medicamentos essenciais e rejeitam a importação paralela, através da qual Estados podem tirar proveito de políticas de preços diferenciados e importar a versão mais barata da marca de produtos farmacêuticos patenteados (SELL, 2007).
Do outro lado do debate, temos a aliança de governos de PEDs com o forte auxílio das ONGs e sociedade civil organizada, que luta pelo acesso a medicamentos essenciais. Eles argumentam que a proteção de patentes é uma barreira para o acesso e que as exceções voltadas a resguardar a saúde pública seriam essenciais para garantir direitos fundamentais e até mesmo evitar mortes desnecessárias. Eles defendem o licenciamento compulsório, a concorrência dos genéricos, a importação paralela e as taxas fixas de compensação para as empresas farmacêuticas.
Dentre os PEDs, Brasil, Índia e África do Sul formam o grupo de países líderes nos esforços intergovernamentais para enfrentar suas emergências de saúde pública. Tais países, com o apoio das ONGs, estabeleceram um intercâmbio de informações e, assim, aumentaram o poder de barganha dos três governos. Inclusive, o trabalho conjunto das ONGs dos referidos países, que lutam pelos direitos de pessoas portadoras do HIV e doenças negligenciadas, rendeu uma impactante mobilização que, junto com a Fundação Oswaldo Cruz (Fiocruz), colocou em pauta a discussão em busca da melhor maneira para cooperar no desenvolver de medicamentos destinados ao combate dessas doenças. A importância da relação PEDs e ONGs está exatamente na crescente problemática entre os DPIs e monopólio farmacêutico; e o acesso a medicamentos, uma vez que surge a necessidade da criação de soluções em comum entre os PEDs para enfrentar as questões advindas, também, das disparidades econômicas que permeiam as nações. O lucro demasiado das companhias farmacêuticas, assim como o foco voltado para doenças mais rentáveis, que comercializa a saúde pública e assola as comunidades mais carentes; e as rigorosas leis de propriedade intelectual que se sobrepõem aos interesses públicos, atingem ferreamente países onde a população ainda sofre com doenças epidêmicas. Desse modo, a atuação desses atores é cabal para a implementação de políticas que se enquadrem nesse cenário, assim como para maior esclarecimento quanto às flexibilidades parte do Acordo TRIPS, principalmente no que tange a quebra de patentes de medicamentos essenciais.


OS ATORES DA SOCIEDADE CIVIL E A EVOLUÇÃO DO ASSISTENCIALISMO BRASILEIRO NAS QUESTÕES DE SAÚDE PÚBLICA

Por meio de um amplo movimento pela reforma do sistema de saúde e pela redemocratização, conhecido como movimento sanitarista, princípios como o acesso universal, equitativo e integral a serviços de saúde passaram a fazer parte do regulamento maior da legislação brasileira. Esse movimento foi liderado essencialmente por organizações da sociedade civil, movimentos sociais e ONGs. Com tais conquistas, esses princípios passaram a ser resguardados pela Constituição Federal de 1988, no seu Art. 196, a qual estabeleceu ainda o novo Sistema Único de Saúde (SUS), regulamentado por meio das Leis 8.080/90 e 8.142/90. Ressalta-se que entre os campos de atuação do SUS está a assistência terapêutica integral, incluindo a farmacêutica, o que implica a obrigação de o Estado fornecer medicamentos para todos aqueles que deles necessitem.
Cumpre ressaltar que o conceito de sociedade civil utilizado para fins desse artigo se insere na formulação proposta por Habermas (1997), o qual a considera como uma composição de movimentos, organizações e associações às quais captam os ecos dos problemas sociais que, por sua vez, ressoam nas esferas privadas, e os transmitem para a esfera pública política. "O núcleo da Sociedade Civil forma uma espécie de associação que institucionaliza os discursos capazes de solucionar problemas, transformando-os em questões de interesse geral no quadro de esferas públicas" (HABERMAS, 1997, p. 99).
Ao considerarmos tal formulação, é possível depreender a relevância exercida pela sociedade civil ao pressionar as entidades públicas internacionais e instituições domésticas responsáveis por formular propostas e metas que, de fato, atendam as demandas e anseios da sociedade. A participação da sociedade civil no âmbito da saúde publica, especificamente, foi intensificada pela ascensão das ONGs principalmente na década de 90. Essas são entidades privadas sem fins lucrativos, que contam com participação voluntária e são identificados com a sociedade civil – distintas do Estado ou governo, e também do mercado ou empresas (SCHERER; WARREN, 1994). Diante do processo de redemocratização, as ONGs passaram a reivindicar diretamente os seus interesses, modificando o seu caráter tão somente acessório, assumindo um papel mais proativo.
Nesse novo contexto de reabertura democrática, as unidades subnacionais e as antigas e novas formas de organização da sociedade civil encontram espaço para fortalecer a si e às instituições democráticas; promovendo a descentralização e criando novos canais de inter-relação entre os entes federados e os atores sociais.
Voltando-se para a questão do assistencialismo no que concernem as doenças epidêmicas, no Brasil, dois casos retratam bem essa dinâmica entre a sociedade civil e os entes federados, inicialmente movidos pelos movimentos sociais e, posteriormente, fortalecidos pelo engajamento das ONGs, quais sejam: as políticas em torno da TB e a política pública de acesso universal aos medicamentos antirretrovirais (HIV/AIDS). Para melhor ilustrar o caráter conceitual da questão, temos que uma política pública é uma ação gerencial que se desenvolve por meio da interação negociada entre o setor público e a sociedade civil. Tal negociação é mediada por grupos de interesse, tendo em vista a impossibilidade de o Estado negociar com cada um dos cidadãos interessados, de forma individual (TENÓRIO, F. G. & ROZENBERG, 1997).
De acordo com os dados fornecidos pelo Relatório das atividades de Pesquisa do Instituto do Milênio Rede TB (2005), o surgimento de iniciativas compostas por organizações comunitárias concernentes à TB é bastante recente. Até 2003, a presença da sociedade civil na luta contra a TB era pautada, basicamente, pelas iniciativas de pesquisadores, profissionais de saúde e estudantes de medicina, respectivamente da Sociedade Brasileira de Pneumologia e Tisiologia, da Rede TB, e da Liga Científica contra a Tuberculose. Nesse caso, tais entidades são compostas por pessoas comprometidas com o controle da TB, todavia, carecem de um escopo comunitário, principalmente das pessoas afetadas e vivendo com a doença.
Nesse diapasão, três aspectos contribuíram para que diferentes níveis de governo tomassem a decisão de fomentar a inclusão da sociedade civil nos esforços para o controle da TB, em particular de caráter comunitário. O primeiro aspecto é a legitimidade e o amparo legal dessa participação. O segundo aspecto que coadunou com tal postura foi o acordo firmado por vários países, incluindo o Brasil, na Declaração de Amsterdã para Combater a Tuberculose, em 2000. Nesse acordo, os governos se comprometeram a "monitorar e avaliar seus programas nacionais de TB de acordo com os padrões estabelecidos pela Organização Mundial de Saúde (OMS) e a apoiar as parcerias com as ONGs e a comunidade" (The Amsterdam Declaration to Stop TBO, 2000). Por fim, o terceiro e mais significativo aspecto para essa iniciativa foi a conscientização dos gestores estaduais de que a ausência de monitoramento das políticas públicas em TB, advindas da sociedade civil, resultavam na morosidade, falta de transparência e ineficiência das ações e políticas governamentais (SANTOS, 2006).
Considerando as características da população afetada pela TB atualmente, em grande parte, de baixa renda; que enfrentam estigma pela doença e acesso restrito à assistência em saúde, não se pode esperar reações espontâneas e politicamente articuladas como as vistas no caso da AIDS, desde o início. A epidemia de HIV/AIDS acometeu em grande número pessoas de classe média; com bom nível educacional e habilitada a articular com diversos setores da sociedade. Assim, o avanço das políticas voltadas para o controle da TB é mais restrito, devido à limitada pressão por parte da sociedade civil, divergindo do que ocorreu na luta contra a AIDS (SANTOS, 2006).
Fazendo um sucinto apanhado sobre o processo que resultou na política pública de acesso universal aos medicamentos antirretrovirais (HIV/AIDS); que fornece terapias contra a AIDS gratuitamente para todos os pacientes para os quais tais terapias foram receitadas, destaca-se, de início, o surgimento dos movimentos homossexuais, pioneiros na reivindicação de respostas governamentais voltadas ao enfretamento da epidemia. Os movimentos homossexuais atuavam de forma a aumentar a visibilidade do problema, utilizando-se de ferramentas como a publicação de manuais explicativos sobre as peculiaridades da doença. Outras formas de organização se pautaram no assistencialismo às vítimas, através do fornecimento de moradias às pessoas que sofriam violência e preconceito decorrentes do fato de serem portadoras do vírus.
Fortificando a luta contra o preconceito e enfrentamento da AIDS, diante do cenário mais democrático que resultou na abertura de espaços de participação da sociedade, tivemos a ascensão das ONGs. Dentre elas, destacam-se quatro que apresentaram importante inserção política na luta nacional contra a AIDS: o Grupo de apoio à Prevenção da AIDS (GAPA); Associação Brasileira Interdisciplinar de AIDS (ABIA); o Grupo Pela Valorização, Integração e Dignidade do Doente de AIDS (Pela Vidda) e o Apoio Religioso Contra AIDS/Instituto de Estudos da Religião (ARCA/ISER).
Até a década de 90, principalmente pelo fato da política brasileira ser pautada pela conjuntura neoliberal, a experiência brasileira na questão da AIDS se limitava à lógica defendida e financiada pelo Banco Mundial, unicamente baseada nos aspectos preventivos, voltados à população carente. Ao invés de fornecer o tratamento antirretroviral, era recomendado que os países em desenvolvimento concentrassem seus recursos escassos em estratégias de prevenção que, para essa instituição, era supostamente mais custo-efetivas. Entretanto, mesmo contrariando tais premissas do Banco Mundial, o PN DST/AIDS (Programa Nacional de DST/AIDS), articulado com os demais atores interessados pela causa, pressionaram para, em 1996, conquistarem a distribuição gratuita e universal da medicação necessária ao tratamento da doença, através da política pública de acesso universal a antirretrovirais. Desse modo, o Brasil provou que o tratamento antirretroviral seria não apenas viável, mas também altamente bem sucedido, mesmo em países em desenvolvimento.
O Brasil foi o primeiro país a fornecer terapias contra a AIDS gratuitamente para todos os pacientes para os quais tais terapias foram receitadas. Em 2010, cerca de 200 mil pacientes se beneficiaram delas no país. No entanto, o tratamento da AIDS no Brasil tem sido desafiado pelos altos custos dos medicamentos antirretrovirais patenteados e pela falta de capacitação tecnológica na produção desses medicamentos, em especial dos seus princípios ativos (MELLO e SOUZA, 2007).

LICENÇA COMPULSÓRIA E O CASO HIV/AIDS

Segundo dados do Ministério da Saúde - MS, entre 1996 e 2002, com a introdução da política de acesso universal do tratamento antirretroviral combinando drogas de diferentes formas de ação, houve redução de 50% na mortalidade, 70% na morbidade, redução das internações em 80%, bem como aumento de cinco anos na sobrevida dos pacientes que vivem com AIDS (BRASIL, 2005a). Assim, mais de 60.000 novos casos de AIDS; 90.000 mortes e 633.200 admissões hospitalares relacionadas com a doença foram evitados, o que resultou em economia para o governo de mais de US$ 1,8 bilhão entre 1997 e 2003. Ao somarmos a esse montante o adicional de US$ 1,2 bilhão proveniente da economia com atendimento ambulatorial e procedimentos terapêuticos evitados; incluindo medicamentos para infecções oportunistas, o total aumenta para mais de US$ 2 bilhões (TEIXEIRA; VITORIA; BARCAROLO, 2004).
Desse modo, o caso brasileiro comprova que o tratamento antirretroviral é viável em locais com poucos recursos, abrindo o caminho para um novo consenso de políticas de saúde. Assim sendo, a estratégia de prevenção impulsionada pelo Branco Mundial; e o tratamento da AIDS, que tem o Brasil como pioneiro no acesso universal aos antirretrovirais, podem ser ambas implementadas e se reforçam mutuamente.
Um dos fatores que ajudam a explicar o sucesso do programa brasileiro é a capacidade que o país possui na produção de medicamentos, seja através de empresas e laboratórios governamentais, mas também por empresas privadas do setor de fármacos genéricos. Vale destacar que a maior parte dos medicamentos que compõem o coquetel é formada por drogas patenteadas, de alta efetividade, produzidas por laboratórios transnacionais e com preços extremamente altos. Desta feita, em termos de custo, as drogas patenteadas representam o maior peso orçamentário do coquetel. Para que haja atendimento à lei de distribuição gratuita dos antirretrovirais, uma das estratégias do governo foi investir nos laboratórios e recursos humanos nacionais, almejando a produção de versões genéricas de medicamentos cujas patentes já expiraram.
Entretanto, com a necessidade de introdução crescente de antirretrovirais patenteados no programa; somado ao fato de a Índia ter deixado de ser fonte de genéricos de medicamentos novos ou de segunda escolha, em 2005 - momento em que o país passou a reconhecer patentes farmacêuticas, o que impactou fortemente na produção de genéricos - a política de acesso universal e gratuito dos antirretrovirais poderia estar fortemente comprometida. Desse modo, tivemos o fim da possibilidade de importar insumos baratos da Índia para a produção de genéricos e, por conseguinte, tanto o Brasil quanto os demais países em desenvolvimento ficaram altamente dependentes das empresas farmacêuticas; assim como da licença compulsória, como medida de exceção.
A licença compulsória é um mecanismo de defesa contra possíveis abusos cometidos pelo detentor de uma patente. Consiste na autorização concedida pelo Estado para o uso da invenção patenteada sem o consentimento do detentor da patente (CHAVES, 2006). O Brasil utilizou da ameaça de decretar o licenciamento compulsório algumas vezes e, na última, efetivou o decreto. Em 2001, o processo de licenciamento foi interrompido pelo governo brasileiro, pois o laboratório Roche aceitou reduzir o preço do nelfinavir em 40%, desde que o governo brasileiro não emitisse uma licença compulsória. No ano de 2005, na segunda negociação para a redução de preço do lopinavir/r, o governo brasileiro aceitou o preço fixo de US$ 1.380,00 por paciente/ano até 2011, se comprometendo em não emitir uma licença compulsória para esse medicamento (CHAVES; VIEIRA; REIS, 2008).
Nesse contexto, tivemos a pressão de grupos da sociedade civil, sobretudo os grupos ligados à saúde e aos direitos humanos, ao passo que esses entraram na Justiça Federal para obrigar o Poder Executivo a licenciar compulsoriamente o medicamento Kaletra® (CORIAT; ORSI; ALMEIDA, 2006).
Entretanto, o Estado só se posicionou diante da intransigência do laboratório Merck, nas várias negociações iniciadas pelo governo brasileiro na tentativa de redução do preço do medicamento efavirenz. No dia 25 de abril de 2007, foi publicada a Portaria 886 de 24/04/2007 (BRASIL, 2007) que declarou o efavirenz de interesse público para fins de concessão de licença compulsória. A Merck foi notificada em 24 de abril de 2007 e teve um prazo de sete dias para que apresentasse uma proposta que atendesse tal interesse. Em 27 de abril, a Merck Sharp & Dohme (MSD) ofereceu desconto de 30% sobre o preço de US$ 1,5920/comprimido, mas a proposta mostrou-se insatisfatória, já que o Brasil pleiteava o mesmo preço cobrado pela Merck na Tailândia, de US$ 0,65 (BRASIL, 2008). Em maio de 2007, o governo decretou a licença compulsória do antirretroviral efavirenz, começando a produção nacional em 2009.
A versão genérica chegou ao Brasil em julho de 2007, entregue pelos laboratórios indianos via organismos internacionais a um custo de US$[0,4270 - 0,4430] para o comprimido de efavirenz 600 mg, um terço do preço cobrado pela MSD (BRASIL, 2008; BRASIL, 2009).
A produção nacional do efavirenz se deu através da Farmanguinhos (Fiocruz)/MS e Lafepe. O consórcio formado pelas empresas privadas Cristália (SP), Nortec (RJ) e Globequímica (SP) ficou responsável pelo fornecimento da matéria-prima ou insumo farmacêutico ativo (IFA) para os laboratórios públicos. O primeiro lote do medicamento nacional foi produzido em fevereiro de 2009. Pelo contrato firmado com a Fiocruz, o Ministério da Saúde pagará R$ 1,35 (US$ 0,675) por comprimido de 600 mg produzido localmente (BRASIL, 2009). Dados comprovam que a produção local impactou positivamente nos custos com o programa.
Segundo os especialistas que tratam da questão, a licença compulsória é inevitável para a sustentabilidade do Programa DST/AIDS, devendo o Brasil defender a autonomia nacional e a ampliação do acesso à prevenção e ao tratamento no país. Vale destacar que um importante componente impulsionador para a utilização desse mecanismo no Brasil foi a mobilização da sociedade civil, inclusive através de denuncias na esfera judicial e abaixo-assinados, visando superar ameaças à sustentabilidade do acesso universal pelo fato dos altos custos dos medicamentos. Prepondera o entendimento que a decisão do governo brasileiro em proceder com a licença compulsória do efavirenz, bem como de outros medicamentos antirretrovirais, tem perfeita base legal e não contraria o direito à propriedade intelectual. Todavia, não obstante o amparo normativo e respectivo pagamento de royalties ao laboratório detentor da patente, o Brasil não está livre de enfrentar novas polêmicas. As discussões e embates levantados no âmbito da OMC, principalmente pelos EUA, na defesa dos seus interesses econômicos, podem levar o Brasil a sofrer retaliações da indústria farmacêutica, em especial do laboratório Merck. Desse modo, as novas demandas exigem repensar a participação da sociedade civil organizada e a redefinição das suas lutas frente ao complexo contexto que regula a propriedade intelectual atualmente.


A PARTICIPAÇÃO DA SOCIEDADE CIVIL SOB A ÓTICA DA ANÁLISE DE POLÍTICA EXTERNA

O PROCESSO BOTTOM UP

Os movimentos retratados nos tópicos antecedentes, principalmente os referentes ao acesso universal a medicamentos antirretrovirais, tiveram repercussão nacional e internacional graças à pressão social e conquistas no âmbito da saúde pública. Desse modo, podemos inferir, de logo, que questões primordialmente à margem das prioridades do Estado podem configurar-se como mandatórias, desde que tenham como força propulsora uma relevante legitimidade e credibilidade por parte da sociedade civil. Assim, o alcance e sucesso que o programa de acesso a antirretrovirais obteve, em especial no cenário internacional, retrata o quão eficiente é uma política pública munida da credibilidade e legitimidade interna; o que, nesse caminho, pode ter cominado na projeção restringida da política referente à TB que, como tratado anteriormente, não compartilhava do mesmo engajamento por parte da sociedade civil, primordialmente por carência de articulação política dos diretamente afetados.
A teoria democrática apresenta dois modelos que avaliam o impacto dos atores sociais nos processos políticos: o modelo bottom up, originário da tradição pluralista; e o modelo top down. O caso em análise, sobre o processo de participação da sociedade civil na formulação e implementação das políticas públicas de saúde pública, que o conferiu maior legitimidade e credibilidade no trato de doenças marginalizadas, se enquadra como um caso típico de processo bottom up.
Desse modo, temos a hipótese de que a sociedade brasileira e o Estado, na questão da politica externa; desde o seu processo de redemocratização e descentralização política, passaram por um momento de transição de uma relação inteiramente top down para uma bottom up. Segundo Cooper (2005), a dinâmica bottom up se caracteriza por ser uma abordagem diplomática "voluntária, com atores mistos"; divergindo da primeira que, por sua vez, é pautada no modelo centrado no Estado, de forma estratégica "coercitiva e oportunista".
Tendo em conta os obstáculos impostos pelas novas regras patentearias e a necessidade da manutenção de políticas públicas como a de acesso universal a tratamentos antirretrovirais, o engajamento da sociedade civil se dividiu, de forma estratégica, em três etapas: o arrebatamento do apoio interno; a parceria com as ONGs (nacionais e internacionais) e, por fim, o desenvolvimento do processo de negociação entre os governos através do soft power diplomático. Desse modo, é viável o enquadramento da participação da sociedade civil no processo acima disposto, ao passo que sua projeção se deu, inicialmente, nos grupos de interesses envolvidos na causa, e, no seu ápice, na pauta das demandas governamentais no âmbito interno e internacional.
Para melhor visualização dessas etapas, vale apresentar algumas características peculiares de cada momento, no intuito de deixar claro como eles se interligam e, mais que isso, coadunam para a inserção do tema na agenda central da política externa do governo. No que tange o arrebatamento do apoio interno, a luta contra o HIV/AIDS teve início com a mobilização dos movimentos homossexuais e, em sequencia, de todos os atingidos diretamente pela epidemia que, através de programas de conscientização da população a respeito do preconceito e assistencialismo às vítimas foram, aos poucos, chamando a atenção da sociedade em geral para o caso; ganhando a amplitude necessária para liderar as pautas das discussões sobre políticas públicas. Desse modo, a luta contra o preconceito e enfrentamento da AIDS resultou na abertura de espaços de participação da sociedade, o que proporcionou a ascensão das ONGs.
Em seguida, já partindo para a segunda etapa do processo, tais grupos da sociedade civil, juntamente com as primeiras ONGs que surgiram, uniram esforços no enfrentamento do tema. Como consequência, diante da crescente discussão sobre propriedade intelectual no âmbito internacional e o impacto causado pelos acordos internacionais no âmbito nacional, surgiu, em 2001, o Grupo de Trabalho sobre Propriedade Intelectual da Rede Brasileira pela Integração dos Povos (GTPI/REBRIP). A Associação Brasileira Interdisciplinar de AIDS – ABIA - coordena o Grupo de Trabalho sobre Propriedade Intelectual (GTPI) da Rede Brasileira pela Integração dos Povos (REBRIP). O GTPI reúne entidades da sociedade civil que buscam discutir temas e propor ações sobre recursos genéticos e, sobretudo, buscam alternativas para minimizar o impacto das patentes farmacêuticas no acesso aos medicamentos essenciais.
A REBRIP, por sua vez, reúne organizações da sociedade civil brasileira para acompanhar e monitorar os acordos comerciais nos quais o governo brasileiro está envolvido, com o propósito de discutir e delimitar o seu impacto direto na sociedade (ABIA, 2009). Um dos temas em destaque é a questão das patentes e acesso a medicamentos, o que justifica a REBRIP criar um grupo de trabalho para encaminhar as reivindicações da sociedade civil sobre essa questão (GTPI). De acordo com as informações dispostas no site da ABIA (2009), o GTPI atua com o objetivo de minimizar o evidente impacto negativo do sistema de patentes no Brasil em algumas frentes, principalmente: 1) Identificação de alternativas que permitam ampliar o acesso a medicamentos; 2) Fortalecimento da cooperação Sul-Sul para a troca de experiências no tema e possível ação conjunta entre organizações da sociedade civil; 3) Formação e mobilização da opinião pública quanto ao impacto social dos acordos comerciais de propriedade intelectual; 4) Acompanhamento de fóruns internacionais que discutam o tema da propriedade intelectual e acesso a medicamentos.
Ademais, o GTPI promove ações positivas com relação à manutenção do acesso universal ao tratamento antirretroviral, através da redação de cartilhas que explanam a legislação internacional e nacional; e também de fatos importantes, como a emissão da licença compulsória no Brasil. Outro ponto que demostra a importante participação do grupo é a organização de oficinas e exercícios temáticos que visam conscientizar a população em geral de como a propriedade intelectual afeta suas vidas e os seus trabalhos. A atuação desse grupo foi de extrema importância para a efetivação do programa universal de antirretrovirais e a magnitude da sua projeção internacional.
Em um terceiro momento, a conjuntura entre esses grupos e as ONGs internacionais proporcionou uma repercussão internacional da demanda, o que resultou em uma aliança entre governos munidos dos mesmos interesses em prol da flexibilização do Acordo TRIPS e sobreposição do interesse público em detrimento dos fatores econômicos que permeiam o Regime Internacional de Propriedade Intelectual. A atuação desses grupos junto às ONGs é pautada no fortalecimento da sociedade civil e do aprofundamento de suas redes para que possa ser aprimorada a troca de experiências, o apoio aos problemas nacionais, e a busca por alternativas conjuntas contra os impactos negativos causados pelas patentes no acesso à saúde.
Dessa maneira, o Brasil, como outros países em desenvolvimento, passou a utilizar a via da Diplomacia da Saúde Global nas suas ações internacionais, tendo as questões de saúde pública como um mecanismo de soft power na seara internacional. Desse modo, podemos destacar dois aspectos inter-relacionados, como ressalta Lopes (2013; p.8): "a participação de atores não estatais em fóruns e instituições internacionais e uma relação mais dinâmica entre política internacional e doméstica, conhecida como interméstica". A mesma autoria ainda ressalta que teorias como a dos jogos de dois níveis, de Putnam (1988), permitiram visualizar o impacto do âmbito doméstico na política externa do Estado, além de mostrar os jogos de coalizão, alinhamentos e alianças.
A UTILIZAÇÃO DO SOFT POWER NA POLÍTICA EXTERNA BRASILEIRAS ATRAVÉS DA DIPLOMACIA DA SAÚDE GLOBAL E O PAPEL DA SOCIEDADE CIVIL NO SUPORTE DESSA POLÍTICA

Nas relações internacionais, os estudos sobre opinião pública e política externa remetem à correlação entre questões domésticas e internacionais, tratando do impacto dos atores domésticos na formulação da política externa. De acordo com o pressuposto liberal, as instituições; ideias e interesses influenciam a postura do Estado. Assim, as demandas sociais passam a figurar no sistema político, e, por conseguinte, influenciam nas ações de política externa. Nesse viés, a política externa não se restringe aos estímulos internacionais, sendo, também, reflexo das demandas domésticas advindas de forças sociais que direcionam o comportamento do Estado (ROSENAU, 1967).
Como descrito nos tópicos anteriores, são perceptíveis as mudanças da participação da sociedade civil na produção da política externa brasileira, principalmente no que toca a questão de políticas públicas na área da saúde. O engajamento da sociedade civil no combate à HIV/AIDS, em especial, elevou a questão da saúde para o centro da política externa brasileira. Vale ressaltar que essa ascensão da participação da sociedade civil, primeiramente no âmbito interno e, posteriormente, na formulação da política externa brasileira; junto à fática participação do governo na cooperação Sul-Sul, legitimou e deu o suporte necessário para que o governo tivesse força pra manter uma política controversa, ao passo que essa era contra interesses privados muito fortes.
Outra questão que pode ter coadunado para obtenção desse resultado foi a reação do Itamaraty às pressões e demandas que partiram principalmente da sociedade civil, visando a superação do seu tradicional insulamento, como apontam Faria e Mesquita (2012). Ambos ressaltam que a partir do governo FHC, que proporcionou uma maior abertura para entidades da sociedade civil, tivemos o aceleramento da aproximação do Itamaraty com a sociedade civil organizada, o que acabou por trazer credibilidade para a diplomacia brasileira, em especial no relacionamento com a ONU. Nesse cenário, configurou-se o que foi classificado como diplomacia pública que, segundo Lima (2009) tinha o ponto central na inclusão dos diversos atores da sociedade civil no processo de formulação da política externa nacional.
Ponto crucial no tocante ao maior alcance das questões de saúde na política externa diz respeito à correlação entre saúde e desenvolvimento. Até recentemente, as melhorias em saúde eram vistas como algo positivo apenas para o crescimento econômico. Entretanto, à medida que esse tema passou a vigorar como parte das prioridades em questões de política externa, evidências mostram que melhorias na saúde (e outros determinantes sociais da saúde, tais como educação, saneamento e capacitação de gênero) estão associados com o desenvolvimento, posto que o custo com a saúde é mais um investimento do que puramente um gasto, sendo um bem público intrínseco.
Focando diretamente na política externa no âmbito da saúde pública, entre as economias emergentes, o Brasil tem sido particularmente hábil em utilizar o que é descrito como soft power, principalmente através do alcance internacional que a política a favor do acesso aos medicamentos antirretrovirais proporcionou; como, também, na busca pela execução dos Objetivos do Milênio ODM. É perceptível que o Brasil tem desempenhado um papel central nos debates concernentes à política pública do HIV/AIDS, posto que seu programa nacional de HIV/AIDS, amplamente reconhecido pela ONU como o melhor de seu tipo no mundo em desenvolvimento, funciona como modelo para os demais países em desenvolvimento, assim como para a política global de HIV/AIDS adotada pela Organização Mundial de Saúde (OMS) desde 2003.
Assim, o Brasil vem fazendo uma combinação eficaz de poder econômico e perspicácia diplomática em questões de saúde pública, servindo de modelo para outros países em busca de desempenhar um papel de liderança mais proeminente na ordem mundial emergente. É o que vem sendo caracterizado como soft power diplomático, ou seja, a utilização de recursos que não militares ou políticos clássicos nas relações internacionais (NYE, 2008). O principal viés utilizado pelo governo brasileiro de soft power diplomático é a diplomacia da saúde global, que parte da premissa de que a saúde da população precisa ser o centro das atenções da diplomacia.
Como exposto anteriormente, um dos melhores exemplos da estreita cooperação entre o Ministério das Relações Exteriores e do Ministério da Saúde no Brasil é política global contra a HIV/AIDS, em particular, o acesso aos antirretrovirais, ilustrando que a boa governação da saúde global começa no nível nacional. Alguns defensores da saúde global como Kickbusch I, Silberschmidt G, Buss P (2007) têm argumentado que as implicações políticas, sociais e econômicas dos problemas de saúde estão acima da hierarquia de interesses da política externa tradicional, por conseguinte, questões como âmbito doméstico e internacional e low and high politics, não se aplicam mais, ao passo que melhorar a saúde global se tornou objetivo mais importante da política externa, por si só; sendo a diplomacia de saúde uma forma de gerenciar o ambiente de política global para a saúde.
A conjuntura de atores na luta contra a HIV/AIDS é bastante heterogênea, com diferentes atores, não só no que diz respeito ao seu caráter (público, privado), a sua estrutura institucional (formalizada, informal) ou o seu nível de atividade (global, nacional, local); mas também no que diz respeito aos seus interesses, a sua lógica de ação e seus recursos de poder. Segundo Kickbusch I, Silberschmidt G, Buss P (2007) a diplomacia da saúde global tem como objetivo capturar esses processos multi- nível e multi- ator de negociação e gerenciar o ambiente de política global para a saúde.
O Relatório dos Objetivos de Desenvolvimento do Milênio ODM (2013), mencionado anteriormente, retrata esse processo multi - nível e multi - ator de forma clara, ao mostrar que as ações conjuntas dos governos nacionais, da comunidade internacional, da sociedade civil e do setor privado estão tornando realidade o cumprimento dos ODM. Um relatório da Organização Panamericana de Saúde (OPAS) (2013) indica que os países da América Latina e do Caribe devem reforçar o sistema de saúde para avançar no acesso universal ao tratamento antirretroviral (TAR) contra o HIV/AIDS. De acordo com o texto intitulado "Tratamento antirretroviral sobre a Lupa: uma Análise da Saúde Pública", que estuda as vulnerabilidades existentes, a América Latina e o Caribe têm os índices mais altos de cobertura de tratamentos antirretrovirais, mas o desabastecimento de medicamentos pode impedir a sustentabilidade do programa.
Como exposto no decorrer do artigo, a sociedade civil tem desempenhado um papel fundamental na luta pela sustentabilidade do programa de acesso universal aos antirretrovirais. De acordo com o relatório da OPAS supracitado, na reunião de Tratamento 2.0 na América Latina, realizada em Buenos Aires, em 2012, a sociedade civil definiu a sua função em três áreas fundamentais: (a) o protesto social, (b) a supervisão e (c) aconselhamento voluntário, especialmente no que diz respeito à adesão do tratamento e o alcance das comunidades mais expostas. Determinou-se que essas funções devem ser colocadas dentro de um quadro de cooperação que inclui a coordenação e sustentabilidade financeira.
Outro ponto importante destacado no relatório é que vários países já estabeleceram normas que incluem a participação da comunidade na prestação de cuidados de saúde e serviços de tratamento. No entanto, merece destaque o fato de que quando existem esses serviços, a cobertura é limitada, ao passo que o financiamento vem principalmente de fundos externos (principalmente o Fundo Global para a AIDS, tuberculose e malária). Entretanto, a saída de recursos internacionais e o enfraquecimento da relação entre o governo e a sociedade civil têm colocado a eficácia e a sustentabilidade desse trabalho em risco. Como exposto nesse artigo, o programa de AIDS brasileiro se consolidou da conexão forte com as ONGs. Desse modo, as mesmas não podem ficar sem recursos e motivação.
Apesar do evidente interesse e capacidade das ONGs e dos movimentos da sociedade civil do Brasil para assegurar a manutenção das políticas públicas de saúde, o diálogo com o governo ainda parece insuficiente. É primordial destacar que o engajamento das organizações e dos movimentos da sociedade civil do Brasil com temas de política internacional, dentre eles a questão das patentes e saúde pública - e seus impactos sobre a realidade nacional – é um tanto peculiar, por ser um campo carente de regulamentação e apoio no país. Ademais, o marco regulatório das Organizações da Sociedade Civil, parte das demandas da sociedade civil organizada, ainda não se consolidou, o que dificulta o acesso a recursos e a prestação de contas transparente (LOPES, 2013).
Ponto crucial na sustentabilidade e sucesso do programa e que torna clara a participação da sociedade civil são as denúncias a respeito da falta de médicos, leitos e exames para os pacientes; de medicamentos para tratar doenças causadas pelos antirretrovirais; bem como episódios de desabastecimento do coquetel em postos de saúde, obrigando os pacientes a interromper o tratamento. Ao passo que o tratamento com antirretrovirais acabam acarretando no surgimento de outras doenças, a defasagem da saúde pública do Brasil compromete diretamente os resultados. De acordo com O Ministério da Saúde, 250 mil brasileiros são portadores do vírus sem que saibam, o que torna relevante a ampliação dos diagnósticos e monitoramento da eficácia do programa. O fato de o programa ter sido descentralizado em 2003, dependendo dos estados e municípios para a devida execução, acaba dificultando ainda mais sua consecução, inclusive na questão do repasse do investimento direcionado pela união às ONGs.
É de extrema relevância destacar que outro desafio para prosseguimento do programa é o custo dos novos medicamentos adotados pelo consenso terapêutico, assim como as crescentes barreiras patentearias para o acesso dos mesmos. Nesse sentido, tivemos um grande avanço, de acordo com o Portal Fiocruz (2014). Segundo o Portal, o Instituto de Tecnologia em Fármacos (Farmanguinhos/Fiocruz) será o responsável pela produção do medicamento Sulfato de Atazanavir, nas concentrações 150 mg, 200 mg e 300mg. Assim, o Brasil terá a garantia do abastecimento para o Sistema Único de Saúde (SUS). A produção nacional do antirretroviral partiu da Parceria de Desenvolvimento Produtivo (PDP) firmada entre o Ministério da Saúde – por meio de Farmanguinhos – e o laboratório internacional Bristol-Myers Squibb. A produção será realizada em território nacional, e terá início em 2015. A parceria prevê ainda a transferência da tecnologia do Insumo Farmacêutico Ativo (IFA) a uma indústria farmoquímica privada nacional, garantindo toda a cadeia produtiva do medicamento em território brasileiro.
Segundo o site do Farmaguinhos (2014), O Ministério da Saúde disponibiliza gratuitamente 20 antirretrovirais, que representam investimentos de R$ 850 milhões por ano na aquisição dos medicamentos. Desses 20, oito são objeto de PDP. Além do Atazanavir, o país terá Tenofovir, Raltegravir, Ritonavir Termoestável, Lopinavir + Ritonavir, Ritonavir Cápsula Gel. Mole, Tenofovir + Lamivudina (2 em 1) e Tenofovir + Lamivudina + Efavirenz (3 em 1), anunciados em 2012, o que comprova o relevante avanço no desenvolvimento da indústria farmacêutica nacional.
Tendo em vista que o Brasil está cada vez mais presente na esfera internacional e na cooperação Sul-Sul em saúde, por desenvolver um modelo de cooperação participativo, democrático, inclusivo e amplo; capaz de abrigar não apenas a dimensão da saúde, mas também seus determinantes sociais e políticas intersetoriais (MRE, 2008; ALMEIDA, 2009) o desenvolvimento da indústria farmacêutica nacional irá refletir de forma positiva nos países parceiros. Já é fato que o país se configurou como um dos maiores doadores através do envolvimento em diplomacia da saúde global. A ajuda bilateral tem sido menos focada em assistência financeira, sendo pautada na transferência de ideias, técnicas e conhecimento científico. Nesse sentido, o Programa Nacional de AIDS, especificamente o Centro de Cooperação Técnica em HIV/AIDS (CICT), enviou equipes de médicos e especialistas de laboratório farmacêutico para treinar funcionários em Moçambique, Nigéria e Angola. Ademais, o CICT convidou as autoridades de saúde da África para receberem o conhecimento técnico e treinamento na construção e manutenção da capacidade de produção doméstica (CEPIK; SOUSA, 2011) No geral, essa exportação de políticas de saúde pública, especialização técnica e capacitação aumentaram ainda mais a capacidade do país para alavancar influência por meio do soft power diplomático.
Entretanto, devido à assimetria entre os países desenvolvidos e em desenvolvimento a respeito da capacidade tecnológica e domínio de conhecimento necessário para competir na esfera das patentes farmacêuticas; o que implica diretamente na aptidão da população ter acesso a medicamentos essenciais, a cooperação entre países do sul, seja no âmbito da sociedade civil organizada, seja no campo governamental, é fator essencial para a projeção do trabalho da sociedade civil brasileira. Por meio dessa cooperação, foram alcançadas inúmeras parcerias que, por sua vez, ampliaram a colaboração e troca de informações e tecnologias; e, de forma a ser destacada, legitimou a participação efetiva da sociedade civil nacional e internacional na concretude dos acordos entre os governos dos seus países.





















CONCLUSÃO

Foi o suporte doméstico, resultado da sinergia entre governo e sociedade civil; e o soft power diplomático do Brasil, junto aos demais países em desenvolvimento, que assegurou que a pressão para maior flexibilização do acordo TRIPS viesse como resultado das negociações que levaram à Declaração de Doha e Saúde Pública. O que emergiu foi uma coesão de governos com interesses comuns; ONGs e organizações da sociedade civil chaves, através das quais houve uma atuação efetiva na arena doméstica e internacional, na busca pela garantia do acesso a medicamentos e proteção do direito fundamental a saúde.
Mesmo diante desse avanço, a problemática que envolve a sustentabilidade de políticas públicas na área da saúde tem, como cerne, o contexto em que se inserem os Direitos de Propriedade Intelectual, seja pelo maior escopo atingido através dos diversos fóruns que, agora, discutem a temática; pela inquestionável disparidade de poder político e econômico presente entre os Estados membros da OMC; ou, ainda, pelo latente monopólio da indústria farmacêutica que tanto assola os países em desenvolvimento, com maior presença das doenças epidêmicas. Por conseguinte, os PEDs enfrentam desafios substanciais para guiar o sistema em seu benefício, sendo primordial a cooperação entre eles, agindo em conjunto na defesa de políticas públicas favoráveis às suas necessidades, que sobreponham o interesse público ao lucro privado.
A respeito da sustentabilidade do acesso aos antirretrovirais, ponto chave desse artigo, tanto os PEDs quanto as ONGs precisam atuar no sentido de alcançar um maior esclarecimento quanto às flexibilidades parte do Acordo TRIPS, principalmente no que tange a quebra de patentes de medicamentos essenciais. Concomitantemente, torna-se cabal pensar em políticas públicas na área de ciência e tecnologia que facilitem a P&D de novos produtos, inclusive através de pesquisas financiadas com recursos públicos no âmbito das universidades. A sociedade civil tem que pressionar de maneira a desenvolver capacidade de produção, gerando maior competência para a indústria local e maior concorrência de mercado. Essa medida é aplicável justamente pelo fato do Brasil possuir uma indústria farmacêutica nacional com relativa capacidade de produção, sendo um dos poucos países em desenvolvimento, ao lado de Índia e China, com capacidade de produzir diversos medicamentos que atualmente estão protegidos por patentes. O resultado desse investimento será positivo tanto no âmbito interno, quanto no cenário internacional, visto que o Brasil poderá contribuir para solucionar problemas de saúde pública que são comuns em países mais pobres, principalmente através da continuidade do viés de cooperação Sul-Sul.
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