Afeto e Performance na cultura da música pop: o caso do Music Bank in Brazil

September 28, 2017 | Autor: Krystal Cortez | Categoria: Festivals and music, Performance, Fan Cultures, Korean popular culture, K-Pop, Mediação, Afeto, Mediação, Afeto
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AFETO E PERFORMANCE NA CULTURA DA MÚSICA POP: O CASO DO MUSIC BANK IN BRAZIL1 Krystal Cortez Luz Urbano 2 RESUMO Partindo da premissa de que as noções de afeto e performance são constituintes da experiência de fruição da música pop em âmbito global, interessa-nos discutir o papel dos shows ao vivo na configuração desta experiência. Para tanto, este trabalho aborda o evento da gravação de um dos programas musicais mais populares na Coréia do Sul - o Music Bank – no Brasil. Para isso, primeiramente, debatemos as noções de afeto e performance na cultura da música, estendendo a discussão para as especificidades do Music Bank e sua World Tour, buscando contemplar a construção do formato e estética do referido programa. A partir daí, discutimos a experiência do show ao vivo, a partir da observação participante realizada em ocasião do Music Bank in Brazil, articulando à discussão em torno das noções teóricas discutidas até então. Palavras-chave: musica pop; afeto; performance; mediações; shows ao vivo.

1 - Introdução

Em 07 de junho de 2014, presenciei um daqueles momentos considerados históricos para o circuito dos fãs da música pop sul-coreana no Brasil. Um dos programas musicais mais populares da Coréia do Sul e bastante conhecido por esse dado circuito – o Music Bank - desembarcava em terras brasileiras para uma edição inédita, na cidade do Rio de Janeiro. Transmitido pela principal emissora de TV coreana, a KBS (Korean Broadcasting System) e, aproximando-se bastante do formato do antigo Globo de Ouro da Rede Globo, o Music Bank consiste num programa musical semanal que reúne diversos artistas da chamada Korean Wave3 (SHIN, 2009; MALIANGKAY, 2006; SIRIYUVASAK & HYUNJOON, 2007; HUANG, 2011; JOO, 2011; SHIM, 2006), tendo como foco os artistas da sua indústria da música pop, conhecida mundialmente como “K-pop4”.

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Trabalho apresentado no GT 5, “Práticas de Entretenimento e Consumo” do VII Congresso de Estudantes de PósGraduação em Comunicação, na categoria pós-graduação. UFRJ, Rio de Janeiro, 15 a 17 de outubro de 2014. 2

Doutoranda em Comunicação pela Universidade Federal Fluminense (PPGCOM-UFF). Linha de pesquisa: Mídia, Cultura e Produção de Sentidos. E-mail: [email protected] 3

O termo "onda coreana" refere-se à popularidade da cultura popular coreana em outros países asiáticos. A onda coreana teve seu ponto de partida com a exportação de Dramas de TV (K-dramas) como Sonata de Inverno e depois com a rápida popularização de sua música popular (K-pop) (JOO, 2011). 4

Abreviação de Korea Pop Music. Termo que designa a música pop produzida na Coréia do Sul. 1 www.conecorio.org

Sendo a principal janela de estréia e/ou apresentação de novos “idols” da Coréia do Sul, o programa é composto por diversas apresentações, solo ou em grupo, como também consiste num espaço de premiação de grupos ou cantores pop mais populares da semana nas paradas de sucesso local. Como resultado da popularidade da música pop sul-coreana em países asiáticos e, para além desses países, a emissora KBS expandiu a proposta do programa em 2011, realizando uma turnê mundial em formato de festival, com vários ídolos da música pop sul-coreana. A primeira edição do Music Bank World Tour aconteceu no Japão, em 2011 e, desde então, a excursão já passou pela França, Hong Kong, Chile, Indonésia e Turquia, reunindo um total de mais de 120 mil fãs pelo mundo5. Os shows da turnê são gravados e transmitidos na Coreia do Sul e mais 114 países, no mesmo formato do programa semanal, sendo também disponibilizados via streaming para reprise após o show, no site e canal do Youtube oficial da emissora. Mais do que a gravação do programa em si, o objetivo da turnê mundial consiste em dialogar presencialmente com os públicos dos países onde a música pop coreana está ganhando cada vez mais força. Além de apresentarem seus hits de maior sucesso, os artistas sempre buscam homenagear a cultura do país que estão visitando e interagir com o público presente. Na edição brasileira do evento, denominada Music Bank in Brazil, não foi diferente. Os diversos quadros que compõem o formato da turnê mundial do programa buscaram exaltar os hábitos, valores e a cultura brasileira, trazendo um imaginário já bastante difundido do Brasil no exterior, composto pela tríade – praia, samba e futebol. Naturalmente, há certas razões para a escolha do Brasil e, em particular, da cidade do Rio de Janeiro para uma das edições do Music Bank em 2014. Em primeiro lugar, neste ano, o Brasil serviu de palco para a maior celebração esportiva do mundo: a Copa do Mundo FIFA de Futebol. Muito mais que uma competição futebolística, o evento é um dos raros momentos em que o mundo se volta para um só lugar para torcer por sua pátria e, ao mesmo tempo, se aproximar de outros países. E é neste ano, em que toda essa atenção se voltou para o Brasil que o Music Bank optou por gravar uma edição especial no país. Em segundo lugar, a cidade escolhida para sediar o festival, o Rio de Janeiro, a "Cidade Maravilhosa", consiste no principal cartão postal do Brasil para o exterior, referência brasileira de turismo, beleza, ícones culturais, musicais e paisagísticos. Em terceiro lugar, nos últimos dois anos, o país entrou efetivamente no mapa de interesses do governo e empresas de entretenimento sul-coreanas, tendo em vista o projeto de expansão do seu soft power

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Release Oficial | Music Bank Brasil. Disponível em: file:///D:/Krystal/FOTOS/MUSIC%20BANK%20BRASIL/Music%20Bank%20Brasil%20-%20Release.pdf.htm 2 www.conecorio.org

(NYE, 1990) em países da América Latina6. Dado esse interesse crescente, associado à consolidação de um sólido circuito de consumo local em torno da cultura pop sul-coreana, era de se esperar que o Brasil figurasse entre os demais países da America Latina – como Chile, Argentina e Peru - enquanto candidato em potencial para a realização de uma das edições da turnê mundial do Music Bank. Interessante pensar que, até pouco tempo atrás, o consumo da experiência (GOMES, 2007; MILLER, 2013; SÁ, 2014) com o pop sul-coreano no Brasil se circunscrevia exclusivamente ao ambiente das redes digitais e, em menor proporção, no circuito dos eventos relacionados à cultura pop japonesa, já bastante consolidado no Brasil. Boa parte das regras e convenções (culturais, estéticas e lingüísticas) do pop coreano foi apreendida por esse público através da mediação promovida pelo circuito do pop japonês mas, sobretudo, pelo consumo sistemático de produtos midiáticos oriundos da indústria cultural sul-coreana, como dramas de TV, programas de variedades, shows musicais, videoclipes, dentre outros materiais disponíveis exclusivamente nas redes digitais. Além disso, pela primeira vez no Brasil, acontecia um espetáculo de musica pop sul-coreana de tamanha proporção e legitimidade para esse circuito em específico. A edição brasileira do Music Bank contou com um time integrado por seis dos maiores nomes da música coreana: os grupos SHINee, B.A.P, MBLAQ, INFINITE, M.I.B, CNBLUE e a cantora Ailee. Além disso, a passagem do Music Bank pelo país consistiu numa oportunidade única para os fãs brasileiros: o festival só realiza uma única edição por país. Com efeito, tratava-se de um momento impar para a experiência de fruição presencial da música pop sul-coreana e de expressão de sentimentos e emoções (DE NORA, 2000, MAUSS, 1979) do público brasileiro direcionados a esses artistas e suas canções. Dada a dimensão corpórea e presenteísta da experiência “ao vivo” (FRITH, 1996), escassa para os consumidores locais de k-pop, a expectativa residia, sobretudo, na performance encenada por esses artistas e também por esse público em ocasião do festival. Tendo essas questões em mente, interessa-nos discutir o papel dos shows ao vivo para o circuito do pop sul-coreano no Brasil, bem como as condições, especificidades e funções dessa experiência nas dinâmicas de sociabilidade para esse dado circuito na atualidade. Para tanto, organizamos o trabalho em três partes. Primeiramente, debatemos as noções de afeto e performance 6

A principal dessas é a KOFICE (Korean Foundation For International Culture Exchange) associado ao Ministério da Cultura, Esporte e Turismo do Governo Sul Coreano, que desde 2011 vem patrocinando diversas iniciativas locais na divulgação mundial do pop sul-coreano. 3 www.conecorio.org

na cultura da música, estendendo a discussão para as especificidades do Music Bank e sua World Tour, buscando contemplar a construção do formato e estética do referido programa. A partir daí, discutimos a experiência do show ao vivo, a partir da observação participante realizada em ocasião do Music Bank in Brazil, articulando à discussão em torno das noções teóricas discutidas até então. Para fins de complemento da observação participante, acompanhei através das redes sociais e, também, presencialmente, ações que foram realizadas antes do show no sentido de aproximar os “k-idols” e público local, promovidas tanto pela promotora local do evento, como aquelas de iniciativa dos próprios fãs. Além disso, banners, vídeos (oficiais e não-oficiais) e postagens realizadas pelos fãs brasileiros e do casting de artistas do festival, nesse mesmo período, em redes sociais como o Facebook, Twitter e Youtube também servirão como material para a análise ora proposta. Não temos intenção de fazer uma análise sistemática e exaustiva dos objetos, mas utilizálos como ponto de partida para discutir as performances encenadas por artistas e públicos na ocasião do festival. Esses dados, articulados aos eixos afeto e performance, se unirão na tentativa de analisar o Music Bank in Brazil. 2 – Da noção de performance musical

Simon Frith (1996), ao explorar a noção de performance musical, afirma que a performance ao vivo é um elemento fundamental de legitimação da música popular massiva e da experiência musical. O comportamento dos músicos no palco, a maneira como cantam e como interagem com a audiência e essa mesma audiência responde a tais estímulos - seja através da dança, canto, uso do voz ou atitude silenciosa de escuta – constrói um contrato comunicacional entre público e artistas. Frith (1996) entende a performance não como algo que emerge espontaneamente, mas como uma negociação que se dá permanentemente entre artista e público, sendo a performance encenada pelo receptor aquela que concede concretude à experiência de fruição musical. Logo, a performance musical, tal como entende o autor, se configura num processo comunicativo ancorado na corporeidade e, ao mesmo tempo, uma experiência de sociabilidade, uma vez que supõe regras, convenções, comportamentos baseados em valores socioculturais historicamente construídos os quais, por sua vez, têm relação com as expectativas de gênero musical e de sua absorção pelo público. 4 www.conecorio.org

Para Frith (1996), a arte da performance se configura numa “forma retórica dos gestos”,

[...] uma retórica dos gestos, na qual, através de sinais (incluindo o uso de voz) e movimentos corporais, dominam outras formas de sinais comunicativos, como a linguagem e iconografia. E um tal uso de o corpo (que é, obviamente, fundamental para o que significa aqui por arte da performance) depende da capacidade do público para compreendê-lo tanto como um objeto (um objeto erótico, um objeto atraente, um objeto repulsivo, um objeto social) e como um assunto, ou seja, como um objeto querido ou em forma, um objeto com significado, retoricamente (FRITH, 1996, pg. 205).

Sendo uma questão de retórica corporal, na qual o uso do corpo constitui o elo para sua compreensão, Frith (1996) apropriadamente observa que a postura do performer diante de um público ao vivo também supõe um elemento de risco, equívoco ou desvio do que é esperado. Sem dúvidas, no caso da música pop, tais aspectos tornam-se mais evidentes: seja no tombo da cantora, o suor no rosto de um baterista ou a respiração ofegante dos dançarinos após uma coreografia elaborada, todos esses são elementos que nos remetem que a performance pop também supõe um elemento de risco por tratar-se de uma situação em que “pensar e fazer estão juntos”, combinando, na mesma cena, o gesto de espontaneidade (para traduzir a emoção daquele dado momento) e de encenação de um papel social (gestos estudados e estilizados, como por exemplo, em coreografias) (HOLZBACH; SÁ, 2010, pg. 148-149). Conforme Frith afirma, a questão do artista em performance – em especial do pop star – é que a persona cuidadosamente produzida está envolvida por um “corpo real” (FRITH, 1996, pg. 206), que executa tanto gestos falsos quanto verdadeiros, revelando assim a dupla dimensão/natureza do músico/performer: por um lado, uma dimensão pública, que é avaliada pelo público a partir de parâmetros tais como qualidade, adequação, autenticidade, técnica e, por outro lado, uma dimensão intima do artista, relacionada à certa espontaneidade, uma vez que apropriados para traduzir a emoção e sentimentos daquele momento (FRITH, 1996, pg. 207). Como Sá e Holzbach bem observam, “todos esses elementos são fonte central de prazer para a audiência de um show “ao vivo” (HOLZBACH; SÁ, 2010, pg. 150). Neste sentido, os gêneros musicais possuem papel central para a decodificação e enquadramento da performance encenada por determinados artistas, mas também aquela encenada por seus públicos específicos. Eles consistem em um campo afetivo, estético e social na qual a comunicação e o circuito de convenções e códigos os quais Frith (1996) assinala, serão postos em prática. Sendo assim, produzem uma espécie de imaginário para os públicos em geral, representando não somente quem são os artistas, ouvintes e/ou fãs daquele dado gênero, mas também o que aquela música e/ou aquele artista significa em suas vidas cotidianas (FRITH, 1996; 5 www.conecorio.org

NORA, 2000). Com isso, pode se afirmar que os gêneros musicais são atravessados por narrativas e representações culturais que revelam “o social no indivíduo e o indivíduo no social, a mente no corpo e o corpo na mente; a identidade, como a música, é assunto ético e estético” (FRITH, 1996, p. 109). [...] o artista performático depende de um público que deve interpretar o seu trabalho através de sua própria experiência de performance, a sua própria compreensão de sedução e pose, gestos e linguagem corporal; um público que entende, no entanto "instintivamente" (sem teorização), o diálogo constante de interior e exterior projetado pelo corpo em movimento. Para a arte da performance para o trabalho que precisa de uma platéia de artistas; ele depende da performance do cotidiano (FRITH, 1996, pg. 205-206).

De fato, um ponto de suma importância para a performance musical “funcionar”, diz respeito à forma como cada um dos fãs articula a encenação pública do músico à sua vida cotidiana privada (FRITH, 1996; DE NORA, 2000). Seja identificando-se com a narrativa e a mensagem de uma canção, seja de maneira mais indireta, a partir da associação de uma performance com um momento marcante da vida ou, numa relação mais intensiva, com a incorporação de um estilo de vida e consumo material associado ao artista/gênero, evidenciando assim que “a negociação entre a encenação pública e a recepção privada estão sempre presentes no processo” (SÁ; HOLZBACH, 2010, pg. 149). De fato, a musica e a performance a ela associadas fazem muito mais do que produzir significado, produzem presença no sentido de Gumbrecht (2010). As idéia de Tia De Nora (2000) também contribuem para essa discussão: Música pode influenciar a forma como as pessoas compõem seus corpos, como se conduzem, como experimentam a passagem do tempo, como se sentem - em termos de energia e emoção - sobre si mesmos, sobre os outros e sobre as situações. A este respeito, musica pode implicar e, em alguns casos, provocar modos de conduta associados. Para estar no controle, então, da trilha sonora do social, a ação fornece um quadro para a organização da ação social, um quadro de como as pessoas percebem (consciente ou inconscientemente) potenciais caminhos de conduta. Esta percepção é muitas vezes convertida em uma conduta per se (DE NORA, 2000, pg. 17)

Acresce a isso, que dado o seu caráter inegavelmente efêmero e imediato, a experiência de fruição musical do “ao vivo” constitui-se numa das principais fontes de fascínio e afetação para os fãs de um determinado gênero musical. Trata-se, pois, de uma ocasião que se revela um momento de “suspensão” do consumo de performances em sua dimensão privada (e idealizada, como no caso do videoclipe)7; momento no qual a performance encenada por artistas e a platéia se unem, num 7

O videoclipe, problematiza a performance dos músicos na medida em que, como afirma Simon Frith (1996), oferece um tipo ideal da performance do artista, considerando que, além da encenação calculadamente elaborada, os erros em potencial de uma performance ao vivo são deliberadamente excluídos no videoclipe. 6 www.conecorio.org

processo de objetificação, conferindo materialidade, concretude à experiência musical. Uma vez que para estar “presente”, no sentido de Gumbrecth (2010), é preciso que possa ser tocado e manipulado, os shows ao vivo representam um momento no qual se intensifica o impacto dos objetos ‘presentes’ sobre corpos humanos (GUMBRECHT, 2010, p. 13), numa perspectiva de medialidades. Sendo a “presença” “uma relação espacial com o mundo e seus objetos” (GUMBRECHT, 2010, p. 13) é possível notar que a experiência de “estar presente” no sentido do autor, engloba ao mesmo tempo, o que se faz presente e o que está fora de alcance; trata-se, pois, de uma experiência eminentemente evanescente; revelando um jogo entre completude e falta, mediados pelo suporte (corpos e meios), ou seja, na maioria das vezes não são “tangíveis por mãos humanas”. Ora, se o que nos fascina em momentos de experiência estética? Se o que nos atrai sem vir acompanhado de uma consciência clara dos motivos para tal atração é sempre algo que nossos mundos cotidianos não conseguem disponibilizar; e se, além do mais, pressupomos que nossos mundos cotidianos são cultural e historicamente específicos, segue-se que também os objetos da experiência estética terão de ser culturalmente específicos (GUMBRECHT, 2010, pg. 129).

Dessa maneira, entendemos que a performance musical é um produto eminentemente cultural e que se constrói na tensão “entre o que se entende (o corpo dirigido a partir do interior) e o que é lido (o corpo interpretado a partir do exterior) e esta lacuna é uma fonte contínua de ansiedade pela evanescencia da sua presença e seu significado” (FRITH, 1996, pg. 214). Para os fins desta discussão, entende-se que os shows ao vivo configuram-se numa ocasião ideal para a expressão, coletiva e presencial, de sentimentos e emoções (MAUSS, 1979; DE NORA, 2000) que ganham concretude através da performance encenada pelos artistas e seu público em ocasião do evento musical. Uma vez que entendemos o afeto musical como produto das circunstancias de apropriação da música (com efeitos incorporados socialmente e emocionalmente) e que sua constituição depende da articulação da música com outras coisas da vida cotidiana, cabenos investigar como afeto e performance musical se articulam na ocasião coletiva de um show ao vivo. Todas as expressões coletivas, simultâneas de valor moral e de força obrigatória dos sentimentos do individuo e do grupo, são mais que meras manifestações, são sinais de expressões entendidas, quer dizer, são linguagem. Os gritos são como fases e palavras. É preciso emití-los, mas é preciso só porque todo o grupo os entende. É mais que uma manifestação dos próprios sentimentos, é um modo de manifestá-los aos outros, pois assim é preciso fazer. Manifesta-se a si, exprimindo aos outros, por conta dos outros. É essencialmente uma ação simbólica (MAUSS, 1979, pg. 153)

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No bojo dessas ideias, as próximas páginas dedicam-se a descrever a experiência do Music Bank in Brazil, a construção do formato e estética do programa e festival, bem como as especificidades das performances encenadas pelos artistas e público presente em ocasião do show ao vivo no Brasil.

3 - O Music Bank: do programa ao festival

O Music Bank estreou na Coréia do Sul em 18 de Junho de 1998 e já teve vários formatos desde seu surgimento. Atualmente, ele é exibido ao vivo durante 80 minutos (6:30pm às 7:50pm) às sextas feiras e os fãs podem interagir através do Twitter do programa @KBSMusicBank, bem como assistir ao vivo o programa via streaming, no canal oficial da emissora. Ao contrário do que se poderia esperar, o Music Bank não é um festival de música originalmente, e sim, um programa musical semanal que é exibido toda sexta feira, ao vivo, pela KBS. Desde 2011, ano que marca a expansão dessa emissora, o programa é transmitido em 72 países diferentes através KBS World e, desde outubro de 2013, ele é apresentado pelo ator Park Seo-Joon e a integrante do grupo Sistar, Yoon Borá, sendo ambos denominados MCs no universo do programa. O formato do Music Bank combina performances ao vivo de grupos e cantores solo do Kpop, organizadas em torno de um sistema de classificação e premiação bastante particular: o KChart. O sistema contempla uma contagem regressiva das músicas que foram destaque na semana na forma de gráficos, que são calculados pela combinação de outros gráficos como música digital (65%), Vendas de álbuns ( 5%), Número de vezes transmitidos pela KBS TV ( 20%), e a escolha dos telespectadores ( 10%). Antes dos K-Charts, outros tipos de gráficos eram usados. De setembro a dezembro de 2007, todas as semanas uma categoria diferente era destacada (Digital Music Charts, Karaoke Charts, Viewers Choice Charts, Album Sales Charts). Era semelhante ao K-Chart, exceto os resultados de cada semana, que só poderiam ser com base em uma tabela específica. De janeiro de 2008 a abril de 2009, dois gráficos eram usados - Digitais Music Charts e Album Sales Charts - e no final do mês eles eram combinados. O grande destaque do programa fica a cargo do Top 50 das canções da semana, exibido em ordem descrescente de classificação. Primeiramente, são mostradas brevemente no telão, as músicas classificadas no ranking do 21 ao 50 lugar, para logo depois, as músicas que ocupam do 20 ao 3 lugar serem anunciadas pelos apresentadores do programa. Em seguida, os MC’s mostram as 8 www.conecorio.org

músicas que fazer parte do “Top Two” e anunciam quem será o vencedor da semana. O artista ou grupo número 1 na parada musical é o vencedor do quadro da semana e recebe um prêmio. Dentre aqueles artistas melhores colocados, sairão as performances que serão encenadas naquela semana no show. Além disso, durante a última semana de junho, o Music Bank dá o prêmio de 1º lugar para a canção mais popular da primeira metade do ano. Já durante a última semana de dezembro, o prêmio é atribuído à canção mais popular do ano todo. Trata-se, pois de um sistema de classificação e organização que se difere de outros programas musicais televisionados, uma vez que um artista pode ganhar um número ilimitado de vezes com a mesma canção (diferente de outros shows que usualmente o removem depois de 3 vitórias)8. As performances musicais televisionadas, como é o caso do que acontece no Music Bank, agregam algumas particularidades, tendo em vista que são mediadas pela televisão e há pelo menos dois públicos que participam da experiência – a platéia posicionada no estúdio ou local de gravação e os telespectadores. Dayan e Katz (1983), a esse respeito, lembram que a performance televisionada ao vivo constitui um espetáculo cuja interação é evidente mas limitada, quando comparada a outras manifestações coletivas que têm a presentificação de todos os envolvidos como elemento intrínseco. Além disso, a televisão concede valores diferenciados à performance especialmente porque a mídia incentiva, do ponto de vista semântico, a criação de um consenso em um evento que, fora da televisão, muitas vezes é carregado de ambiguidades e conflitos. Para a realização do Music Bank World Tour, naturalmente, algumas adaptações no formato e na exibição do show se fizeram indispensáveis para sua realização e gravação fora dos estúdios da KBS na Coréia do Sul. A primeira delas diz respeito justamente ao caráter da turnê mundial, que concedeu novos contornos ao formato do programa que lhe dá origem, tendo em face as especificidades dos países e públicos os quais o festival contemplaria. Em segundo lugar, por motivos logísticos e temporais como fuso horário, negociações com produtoras locais, datas disponíveis na agenda dos artistas, dentre outros motivos, os shows da turnê mundial são gravados e re-transmitidos pela KBS após sua realização, perdendo assim sua dimensão “ao vivo” para o público telespectador da emissora, como na exibição do seu formato semanal. Por fim, a fim de homenagear a cultura do país que estão visitando e interagir com o público presente, os shows da turnê são bastante específicos; sempre buscam contemplar o diálogo cultural com os países que 8

Antes do Music Bank, o ‘Top 10 Songs‘ (GayoTop10) debutou em 1981 e foi ao ar toda sexta-feira às 18h30 (horário coreano) até 1998. Após isso, o programa ‘Bravo New Generation‘ tomou o lugar, mas não obteve o ibope esperado, sendo assim substituído rapidamente pelo Music Bank em 18 de junho de 1998. 9 www.conecorio.org

sediam uma das edições do festival. Para isso, foram criados quadros especiais para compor o formato do festival, além de uma cerimônia de abertura composta por dois artistas da line-up do festival, um ancora da KBS e um artista escolhido do país que está sediando o evento. Todos esse elementos acrescido de performances especiais dos artistas, em solo ou em colaboração, em homenagem aos países da turnê.foram adicionados à experiencia do “festival”, de modo que ele pudesse conter suas especificidades a cada edição. 4 – Performance e afeto no Music Bank in Brazil

O Music Bank World Tour consiste na turnê mundial de shows ao vivo do programa Music Bank, como marco da expansão da KBS em 2011. Desde sua primeira edição, em Tókio, no Japão, a excursão já passou pela França, Hong Kong, Chile, Indonésia, Turquia e, recentemente, Brasil, reunindo um total de mais de 120 mil fãs pelo mundo. Os shows da turnê são gravados e transmitidos na Coreia do Sul e para 114 países, no mesmo formato do programa semanal e também são disponibilizados via streaming para reprise após o show, no canal do Youtube oficial da emissora. Mais do que a gravação do programa em si, o objetivo da turnê mundial consiste em levar um festival de música pop sul-coreana para os países aonde esse gênero vem ganhando cada vez mais novos adeptos, para além da Ásia, como é o caso de países da América Latina, como o Chile e o Brasil, contemplados com uma das edições do festival, em 2013 e 2014, respectivamente. O Music Bank in Brazil aconteceu no HSBC Arena, no Rio de Janeiro, dia 07 de junho. O evento foi retransmitido no dia 19 de junho, às 5:00 da manhã (horário de Brasília), pela KBS World TV, através do seu serviço de streaming on-line9. Em 15 de julho, o show foi disponibilizado (com legendas em inglês) no canal oficial da KBS no Youtube 10. A edição brasileira contou com um time de artistas integrado por seis dos maiores nomes da música pop coreana: os grupos SHINee, B.A.P, MBLAQ, INFINITE, M.I.B, CNBLUE e a cantora Ailee. Dentre esses artistas, apenas o grupo MBLAQ e a cantora Ailee já haviam visitado o país 11, em ocasiões distintas, em 2011 e 2013, respectivamente, ambos tendo realizados showcases nessas ocasiões.

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Disponível em: http://kbsworld.kbs.co.kr/vod.html?mode=live

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Disponível em: https://www.youtube.com/watch?v=FqrKZk4oCxI

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Em 2011, o MBLAQ esteve no país pela primeira vez para julgar o concurso de dança K-pop Cover Dance Festival. Na ocasião, o grupo apresentou apenas duas músicas no evento, mas a presença da banda em solo brasileiro foi o suficiente para movimentar um número estimado de seis mil pessoas para a Av. Paulista, em São Paulo, onde aconteceu o concurso. A repercussão da visita do 10 www.conecorio.org

No entanto, a experiência do Music Bank in Brazil teve seu ponto de partida no circuito dos fãs do pop sul-coreano local bem antes de sua realização. Desde março, já havia um clima de expectativa no fandom brasileiro em torno de qual país da América Latina sediaria as edições do evento em 2014. Tendo em vista que já era esperada que a turnê mundial desembarcasse em terras latinas, alguns sites e fanpages locais relacionadas ao universo do pop sul-coreano como o SarangInGayo12, Kpop Station13, Brazil Korea14, bem como da produtora Mix Jukebox Comunicação e Eventos15, passaram a ser alvo de questionamentos quanto a vinda de possíveis artistas e do referido evento para terras tupiniquins. Aliás, como é de praxe nesse dado circuito de fãs, sempre há uma grande mobilização dos diversos fandoms para a vinda de eventos desse porte, momentos nos quais se suspendem rivalidades e disputas entre grupos de fãs em prol da divulgação do pop coreano no Brasil. O comunicado oficial do festival realizado em 25 de abril pelos canais de comunicação da produtora local escolhida para organizar o evento – a Mix Jukebox – abriu o palco para uma mobilização geral no circuito k-pop brasileiro, que transcendeu o universo das redes sociais, ganhando os espaços urbanos, principalmente, da cidade do Rio de Janeiro, que fora escolhida (em detrimento a cidade de São Paulo) para sediar o festival. Tais ações promocionais não só chamaram a atenção das mídias oficias brasileiras, como fizeram com que o festival virasse pauta de programas de TV16, matérias em jornais17, revistas18 e telejornais nacionais 19. Os artistas da line-up também foram convocados a expressar suas expectativas em torno do evento através de recados gravados em vídeo e disponibilizados no youtube 20, lançados pouco a pouco, na fanpage oficial da produtora local, como também através de suas contas pessoais no

MBLAQ a capital paulista chamou a atenção da mídia brasileira, que destacou a "boyband sul- coreana que atraiu uma multidão de dar inveja a Justin Bieber". 12

Disponível em: http://sarangingayo.com.br/

13

Disponível em: http://www.kpopstation.com.br/

14

Disponível em: http://brazilkorea.com.br/

15

Disponível em: http://www.mixjukebox.com.br/

16

Matéria “Mais Você”. Disponível em: http://gshow.globo.com/programas/mais-voce/O-programa/noticia/2014/06/ja-ouviu-falarem-k-pop-conheca-o-ritmo-que-virou-fenomeno-no-mundo.html 17

Matéria “O Globo”. Disponível em: http://oglobo.globo.com/cultura/musica/o-fenomeno-pop-chega-ao-rio-12734789

18

Nota “Veja Rio”. Disponível em: http://vejario.abril.com.br/edicao-da-semana/historias-cariocas-784672.shtml

19

Jornal da Globo. Disponível em: http://g1.globo.com/jornal-da-globo/noticia/2014/06/musica-pop-coreana-e-nova-febre-entre-osadolescentes-brasileiros.html 20

Recados | Line-up Music Bank. Disponível em: https://www.youtube.com/watch?v=BKUSHfY507c 11 www.conecorio.org

twitter. Em resposta, alguns fãs gravaram vídeos reactions 21 expressando seus sentimentos e expectativas em torno do festival e dos recados de seus artistas favoritos da line-up. Ou seja, a experiênia de sociabilidade entre artistas e fãs, mediada pelo conjunto de tecnologias disponíveis, teve seu inicio bem antes do evento presencial propriamentente dito. Desde a recepção dos artistas no aeroporto, organização de caravanas, coleta de presentes, coletiva de imprensa, Meet&Greet e até mesmo, Flash Mobs realizados por fãs fazia parte do escopo das ações cuidadosamente mobilizadas pela organização do Music Bank junto ao fandom do pop coreano com a mediação da Mix Jukebox e a chilena Noix Producciones. O grupo M.I.B. foi o grande destaque dessas ações, sobretudo, no seu aspecto presencial de interação entre os fãs e os kidols. Também foi o primeiro grupo da line-up do festival a desembarcar em terras basileiras, em 31 de maio. A organização do festival promoveu diversas atividades com o grupo e seus fãs em pontos turísticos do Rio de Janeiro como o Jardim Botânico, Morro do Vidigal, Quinta da Boa Vista e o Mirante do Leblon. Nesse ultimo local, os artistas cumprimentaram, tiraram fotos e distribuíram autógrafos para os seus fãs, além de assistirem ao Flash Mob concebido exclusivamente para a ocasião. Ainda há que se ressaltar que, desde o domingo que antecedeu o festival (01 de junho), já havia um expressivo grupo de fãs acampados nas imediações do HSBC Arena, aguardando o tão esperado evento. Além disso, no dia do show, na extensão da enorme fila que se estabeleceu nos arredores do evento, era possível experenciar as performances encenadas pelos diversos fandons ali presentes, direcionadas aos seus grupos favoritos. Grupos covers, paramentados com um visual bem característico do k-pop – roupas extravagantes, coloridas, com bottons e bandanas – agregaram à experiência do Music Bank Brasil. Embora todas essas manifestações e expressões de sentimentos e emoções materializadas nessas performances encenadas pelo público no pré-show não se configurem na experiência musical propriamente dita, acreditamos que são parte fundamentalmente importante para a construção da experiência contemporânea que antecede a realização de um show ao vivo, sobretudo, quando nos referimos ao pop-sul coreano que, ao mesmo tempo se faz tão próximo quanto distante em suas características culturais (locais e globais) mas, principalmente, em seu aspecto presencial de interação.

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Vídeos reactions | Anúncio Music Bank. Disponível em: https://www.youtube.com/watch?v=4sEVBma7yKs https://www.youtube.com/watch?v=0R7y5-feY8M 12 www.conecorio.org

Nos minutos que antecederam o inicio do show, já com todos os presentes no espaço do HSBC, MV´s passavam nos telões, seguido do coro e gritos dos presentes. A cada MV transmitido era possível perceber os diversos fandoms relacionados aos artistas da line-up que ali se faziam presentes. Além dos fãs brasileiros, que compareceram em grande número no festival, havia também fãs argentinos, chilenos e peruanos prestigiando a grande ocasião. Bandeiras, cartazes, bandanas (na sua maioria, com mensagens escritas em coreano), lightsticks representando as cores de cada fandom, a indumentária dos fãs (estilo k-popper), além do canto em coro e até mesmo, choro dos fãs perante as performances encenadas pelos k-idols durante o festival; todos esses elementos ampliados por dois telões e mais o conjunto de tecnologias disponíveis, foram elementos centrais da construção e experiência de fruição estética do Music Bank no Brasil. Com cenário verde e amarelo, com bandeiras da Coréia do Sul, Brasil e dos demais países por onde a turnê passou, o show começou num clima de muita expectativa e euforia do público presente. A cerimônia de abertura, que teve seu início as 19:15 e seu término as 22:15hs, ficou por conta dos cantores sul coreanos Lee Joon (MBLAQ), Yonghwa (CNBLUE) e a âncora da KBS, Jeong JiWon. Como artista local convidado para MC, o cantor e ator brasileiro Fiuk foi o grande escolhido dentre nomes que foram os mais cotados ao longo do período que antecedeu o show como Lucas Silveira (Fresno), Pyong Lee e Yudi Tamashiro (cantor e apresentador). O primeiro grupo a se apresentar foi B.A.P seguidos pela cantora Ailee e M.I.B. Depois foi a vez do MBLAQ, pela segunda vez, subir ao palco num evento no Brasil. INFINITE foi o quinto grupo a subir ao palco e CNBLUE foi o penúltimo grupo a subir ao palco. Por fim, chegou a apresentação do SHINee. Cada um dos artistas apresentou três hits de maior sucesso para o público presente, enquanto a edição do programa em sua re-transmissão privilegiou apenas duas performances de cada um desses artistas citados. Além disso, alguns momentos de interação entre os apresentadores e o público foram suprimidos de modo que coubessem no formato e tempo de duração do programa em seu formato original de exibição, conforme descrevemos anteriormente. Um dos pontos altos do show e, sobretudo, de maior afetação para o público presente ficou a cargo das performances nas quais as músicas eram cantadas em português. Decerto, as performances elaboradas pelos artistas da line-up especialmente para a ocasião do Music Bank in Brazil buscaram exaltar os hábitos, valores e a cultura brasileira, trazendo um imaginário já bastante difundido do Brasil no exterior, composto pela tríade – praia, samba e futebol, mas também pela sua música pop nacional e a bossa nova. 13 www.conecorio.org

A primeira delas, consistiu numa Opening Performance Special Stage: uma típica Batucada Brasileira composta por um grupo de bailarinas representando a cultura do samba, seguida da apresentação de uma música brasileira - Vou deixar (Skank) - com a presença de todos os k-ídols no palco. Cada grupo cantou um trecho da música acompanhado de um grande coro, com muitos aplausos, gritos e choros emocionados, que foram focalizados pelos telões presentes nos shows e enfatizados na edição do show, em sua transmissão oficial pela KBS. O segundo Special Stage To Heart consistiu na performance do Sub-Unit formado por Key, um dos membros do grupo SHINeee e WooHyun, do grupo INFINITE tendo a mediação do cantor Fiuk, uma vez que envolvia mais ativamente a troca entre público e artistas coreanos que, por sua vez, não dominam o português. Embora a performance do To Heart não englobar uma música em português, sua dinâmica no Music Bank Brasil contemplou uma experiência bastante requerida e imaginada pelos k-poppers brasileiros. Tratava-se de uma performance que seria encenada exclusivamente pela dupla para um dos presentes, no centro do palco, sob os olhos e atenção de todos. Para isso, foi realizado um sorteio ao vivo dentre aqueles fãs que participaram do Meet & Greet (que ocorreu na parte da tarde no dia do show) com os artistas do evento, sendo escolhida uma “Dream Girl”, que foi posicionada estrategicamente no palco, enquanto a dupla encenava “Delicious”, uma das músicas do projeto da dupla. O terceiro momento que merece destaque diz respeito ao Special Stage to World Cup com a participação de todos os artistas. A música “Go West” ficou a cargo dos grupos SHINee, B.A.P. e INFINITE, seguida de “The Cup of life”, cantada pelos grupos MBLAQ CNBLUE E M.I.B. Ailee ficou a cargo da música tema da Copa do Mundo 2014 “We Are One”, encenando o trecho cantado por J. Lo (Jeniffer Lopez) em sua versão original. Nessa ultima performance, todos os artistas subiram ao palco para cantar o refrão, acenando com bandeiras do Brasil enquanto jogavam o mascote da copa (Fuleco) em pelúcia e bolas de futebol para o público que estava mais próximo ao palco. Por fim, para o Special Stage To Brazil, duas performances foram cuidadosamente elaboradas causando uma comoção geral no público presente no momento de sua encenação ao final do show. A primeira delas ficou a cargo da cantora Ailee com “Aquarela do Brasil”. Já a segunda com o trio composto por Taemin (SHINee), Jonghyun (CNBLUE) e Sunggyu (INFINITE) com “Garota de Ipanema”. Ambas as performances foram encenadas / cantadas em português, o que conferiu uma dimensão especial e única no momento de fruição ao vivo das performances 14 www.conecorio.org

desses artistas para o público brasileiro. De fato, um dos pontos altos da experiência de fruição estética e de expressão de sentimentos e emoções no Music Bank diz respeito aquelas performances inéditas, encenadas em português, as quais a dimensão relacional entre afeto e performance musical se tornaram mais evidentes. Parece-me conclusiva a importância de um olhar sobre as performances encenadas por artistas e público nos shows ao vivo de K-pop no Brasil, pois acredito que essas ocasiões são efetivamente propícias para a expressão coletiva de sentimentos e emoções, atualizando o sentido empregado por Mauss. Atualmente, os shows presenciais do gênero consistem o momento no qual esse dado circuito local suspende o consumo cotidiano de performances em sua dimensão privada e suas disputas internas para por em prática uma série de códigos, linguagens e sentimentos em comum, em sua boa parte, alimentados e apreendidos através da mediação possibilitada pelo ambiente virtual e suas ferramentas. Mais do que isso: apostamos que a dimensão performática potencializada na experiência da fruição presencial do público “ao vivo” se faz deveras importante para esse circuito, até então, alimentado pelo consumo sistemático de performances “ideais” e, em boa parte, imaginado por esses fãs. Portanto, tais performances que constituem o escopo da experiência do Music Bank e sua World Tour se materializam e ganham concretude e legitimidade com suas mediações, riscos, equívocos e evanescência do seu significado em ocasião do show ao vivo. Naturalmente, tratando-se de um texto inicial, que se insere dentro de uma pesquisa mais ampla, algumas questões ficam em aberto por requererem maior aprofundamento. São questões a serem averiguadas na continuação da investigação.

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