ANAIS - MARIANA Trabalho Completo Anais Da Solidão em Rawet Anna CS Chaves.pdf

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Da solidão em Samuel Rawet: um olhar sobre a velhice e a infância. Trabalho publicado nos "Anais da IX Semana de... Dataset · November 2006

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1 author: Anna Cecília Santos Chaves University of São Paulo 19 PUBLICATIONS 1 CITATION SEE PROFILE

Available from: Anna Cecília Santos Chaves Retrieved on: 09 November 2016

As Letras e o seu Ensino – Anais da IX Semana de Letras da UFOP - ISBN: 978-85-89269-28-5

As letras e o seu ensino anais da IX Semana de Letras Departamento de Letras - UFOP 19 a 21 de novembro de 2006

José Luiz Foureaux de Souza Júnior José Benedito Donadon-Leal Alexandra Santos Irene Ruth Hirsh William Augusto Menezes (Organizadores)

2008 Editora Aldrava Letras e Artes

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As Letras e o seu Ensino – Anais da IX Semana de Letras da UFOP - ISBN: 978-85-89269-28-5

Copyright @ José Luiz Foureaux de Souza Júnior e J. B. Donadon-Leal – 2008 Direitos reservados à autora. Reprodução autorizada desta obra, desde que citada a fonte.

Revisão: sob responsabilidade dos autores dos textos Projeto gráfico: Aldrava Letras e Artes. ____________________________________________________________ SOUZA JÚNIOR, José Luiz Foureaux; DONADON-LEAL, J. B.; MENEZES, William Augusto; RIRSH, Irene Ruth e SANTOS, Alexandra (Orgs.)

As letras e o seu ensino – anais da IX Semana de Letras Mariana: Aldrava Letras e Artes, 2008. 1a Edição. ISBN: 978-85-89269-28-5 1. Educação 2. Ensino de Língua Portuguesa 3. Lingüística 4 Literatura 981

CDU904(091) CDD 410 _______________________________________________________ Tiragem: 800 Exemplares em CDRom

Aldrava Letras e Artes Cx. Postal 36 35420-000, Mariana, MG

www.jornalaldrava.com.br

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UNIVERSIDADE FEDERAL DE OURO PRETO INSTITUTO DE CIÊNCIAS HUMANAS E SOCIAIS DEPARTAMENTO DE LETRAS CENTRO DE ESTUDOS LINGÜÍSTICOS E LITERÁRIOS

as Letras e o seu ensino anais da ix semana de letras Departamento de Letras - UFOP 19 a 21 de novembro de 2006

Reitor da UFOP: João Luiz Martins Diretor do ICHS: Ivan Antônio de Almeida Filho Chefe do DELET: William Augusto Menezes Comissão Organizadora da IX Semana de Letras: José Kuiz Foureaux de Souza Júnior – Presidente Alexandra Santos Irene Ruth Hirsh José Benedito Donadon-Leal William Menezes

Este livro acabou de ser organizado em Setembro de 2008

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Da solidão em Samuel Rawet: um olhar sobre a velhice e a infância51 Anna Cecília Santos Chaves52 Para Salomon “(...) enquanto isso a própria coisa rara tinha no coração algo mais raro ainda, assim como o segredo do próprio segredo (...)” Clarice Lispector, Laços de Família “Na verdade me sinto um solitário caminhante do mundo”. Com essa frase, que integra a entrevista concedida a Danilo Gomes, em 1979 (apud BAZZO, 1997, p. 16), Samuel Rawet sintetiza o traço mais marcante de sua personalidade descrito por aqueles que o conheceram. Reputado como um homem de personalidade arredia, taciturna e solitária, tanto em vida quanto na morte – quando foi encontrado em sua residência quatro dias após o seu falecimento, sentado numa poltrona, cercado de livros e com um prato de sopa no colo –, Rawet transformou em primorosas obras literárias e ensaios de filosofia suas angústias, dificuldade de integração, solidão e desilusão com a humanidade e seus padrões sociais. Nascido em Klimontow, em 1929, uma pequena cidade rural da Polônia, fortemente marcada pelo tradicionalismo da comunidade Hassídica 53, Rawet imigrou para o Brasil em 1936, aos 7 anos de idade. Os cenários de sua infância e juventude são os subúrbios de Leopoldina, no estado do Rio de Janeiro, onde já se encontravam instalados alguns familiares que haviam imigrado anteriormente. Sua primeira língua foi o ídiche 54, e o aprendizado do português, em depoimento do escritor (apud KIRSCHBAUM, 2000, p. 29), se deu “na rua, apanhando, falando errado”. Segundo ele, “este é o melhor método pedagógico, em todos os sentidos”. Melhor, porque segue a didática imposta pela experienciação da própria vida, mas, certamente, não desacompanhado de algum sofrimento. Em seu primeiro livro, Contos do imigrante, escrito durante o período em que estudava na Escola Nacional de Engenharia da Universidade do Brasil (atual Universidade Federal do Rio de Janeiro) e publicado em 1956, ao qual pertencem os dois contos que figurarão como objeto de análise no presente trabalho, Rawet assume como temática principal de seus contos as dificuldades de integração e de adaptação daqueles que, por razões diversas que irão caracterizar cada uma de suas personagens centrais, não se inserem no padrão socialmente aceito no meio em que se encontram. Em primorosa análise, com respeito ao título da obra, complementa KIRSCHBAUM 55, “podemos pensar que Rawet utiliza a denominação imigrante num sentido ampliado, de forma a abarcar todo aquele que é considerado pelo grupo social homogêneo como o outro, aquele que remete a outro contexto, o inassimilável.” Observa-se, pois, que a literatura de Rawet é permeada por sua própria experiência da condição de eterno deslocado no mundo. 51

Este ensaio é resultado de pesquisas desenvolvidas no Núcleo de Estudos Judaicos da UFMG, sob a orientação da Profa. Lyslei Nascimento. 52 Bacharelanda em Direito/UFMG. Pesquisadora do Núcleo de Estudos Judaicos da UFMG. E-mail: [email protected]. 53

O Judaísmo chassídico ou hassídico (do hebraico ‫ חסידים‬piedosos ou devotos) é um movimento pietista dentro do Judaísmo que existiu praticamente em todas as eras da longa história judaica. Hoje, no entanto, este termo é aplicado para denominar a tendência que se desenvolveu com Baal Shem Tov (1698-1760), na primeira metade do século XVIII, na Polônia e Europa Central. Essa corrente judaica inclui grande quantidade de misticismo cabalístico e a idéia de fazer a santificação presente na vida cotidiana de forma intelectual e alegre ajudou a aumentar sua popularidade entre os judeus. (Verbete adaptado das informações disponíveis nos sites: e )

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Idioma falado pelos judeus da Europa Central e Oriental, os Ashkenazim, consiste numa mistura de alemão, hebraico, aramaico, francês, italiano arcaicos e línguas eslavas, escrita em caracteres hebraicos. 55 KIRSCHBAUM, 2000, p. 38.

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Imigrante, judeu, homossexual, depressivo, solitário, louco. São vários os rótulos apontados em suas descrições bibliográficas que impingem ao escritor a marca da alteridade. Dono de incomum profundidade reflexiva, transita com espantável desenvoltura pelos terrenos abissais da alma humana, onde encontram-se, recônditos, seus desencantos, angústias, tristezas e a mais aguda solidão. Na obra de BAZZO, Rapsódia a Samuel Rawet 56, é citado um interessantíssimo trecho extraído de uma entrevista com a Profa. Maria Lúcia Ferreira Verdi, cuja dissertação de mestrado versa sobre o escritor 57. Segundo ela: O que me fascina é a coragem intelectual deste homem extremamente inteligente, em fazer esta exposição visceral, sem se preocupar com os cânones estéticos. Ele fazia literatura como profissão de fé na transparência do humano em crise, em dor, em uma angústia impressionante. Ele sabia de sua estruturação psicótica. Era contra a psicanálise, mas se auto-analisou através da sua escrita. A página branca foi seu espaço salvador... Encarar a ficção de Samuel Rawet é descer aos infernos. Rawet colocou o psicótico nas veias da literatura, falando de dentro, através de um fluxo delirante, associações intermináveis, subversão das noções de tempo e espaço, escrita-limite. Neste trabalho, busca-se penetrar essa “crise, dor e angústia impressionante”, mostrando a similaridade de suas manifestações nos dois extremos da vida, a velhice e a infância. Esse caminho será percorrido através da dimensão psicológica dada pelo narrador aos protagonistas que dão título aos contos “O Profeta” e “Gringuinho”, integrantes da coleção Contos do Imigrante. Os dois contos são caracterizados pela presença de poucos e extensos parágrafos, demonstrando justamente a confluência entre a narrativa da situação presente e as memórias, sentimentos e experiências passadas de suas personagens. A semelhante técnica narrativa de que são dotados, é descrita por Berta Waldman (apud OLIVEIRA, 2003, p. 115) como aquela em que “um narrador em terceira pessoa dirige a cena literária e assume a palavra, ao mesmo tempo em que os protagonistas permanecem em silêncio, armando-se assim um emaranhado de relações cujos sentidos têm que ser buscados no jogo entre o contar e o calar.” Não obstante a descrença de Rawet na Psicologia, como informa a Profa. Maria Lúcia Verdi, aqui será útil uma definição dessa área do conhecimento para o estado de solidão, entendido como conjunção de um ou mais dos seguintes aspectos: falta de significado e objetivo de vida, visto que o alheamento do indivíduo em relação aos demais seres humanos, leva-o a um questionamento sobre as origens e o sentimento da existência; reação emocional, entendida como o sentimento psicológico de isolamento que caracteriza a solidão; sentimento indesejado e desagradável, vez que, geralmente, vem acompanhada da sensação de angústia, produzindo um sofrimento a mais naquele que está privado de relacionamentos íntimos duradouros; sentimento de isolamento e separação, que atua como sendo a constatação psicológica do estado de solidão; deficiência nos relacionamentos, característica de grande parte dos solitários, que culmina por produzir uma espécie de feedback em todo o processo de solidão, realimentando-o 58. Não são indissociáveis, portanto, solidão e isolamento social, em seu sentido físico. Mais dolorida e angustiante se revela a solidão que se manifesta mesmo quando existe uma inserção, ainda que aparente, em um determinado grupo. A convivência não se consolida efetivamente, mesmo na companhia daqueles com quem se guarda características comuns. O indivíduo permanece à margem, ainda que rodeado de pessoas. Daí aflui a sensação adicional de derrota, de incapacidade pessoal de integração, de total impossibilidade de pertencimento e de deslocamento no mundo. É dessa solidão, avassaladora, agravada ainda pela constante projeção, no presente, de uma traumática e inenarrável experiência do passado, que trata “O profeta”. Nesse conto, o ancião, sobrevivente da Shoah 59, é recebido pela família do irmão, já instalada na cidade do Rio de Janeiro. Tomado pela emoção em que culminou seu profundo sentimento de gratidão à família que o recebia afetuosamente, após a dura e solitária experiência da Guerra, mal conseguia transformar em palavra, nesse primeiro contato, “o que lhe ia por dentro” 60. Às indagações acerca do que vivera, respondia com meiaspalavras ou silêncios, evitando reavivar, diante do abismo que se punha entre o cenário de horror do passado e o conforto que se lhe apresentava no presente, as lembranças que ainda lhe doíam e perturbavam a alma: 56

BAZZO, 1997, p. 49. A dissertação da Profa. Maria Lúcia Ferreira Verdi data de 1989. Foi apresentada na Universidade de Brasília e recebe o título Obsessões temáticas: uma leitura de Samuel Rawet. Infelizmente, não consegui ter acesso a esse trabalho, pois não parece haver cópia do mesmo disponível na internet. 58 GOMES, Antônio Máspoli de Araújo. Solidão: uma abordagem disciplinar pela ótica da teologia bíblica reformada. São Paulo, 2001. Disponível em:
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