Análise do impacto do aumento do IVA de 13% para a 23% no setor da restauração Realizado por

May 25, 2017 | Autor: Marco Mendes | Categoria: Public Economics, Economic Growth, Taxation, Fiscal policy, Economic performance
Share Embed


Descrição do Produto

Módulo de Políticas Públicas Económicas

Análise do impacto do aumento do IVA de 13% para a 23% no setor da restauração

Realizado por: Guilherme Moura, Marco Mendes, Pedro Moreira, Ricardo Spínola, Vasco Casimiro

Janeiro de 2016

ÍNDICE

1.

ENQUADRAMENTO TEÓRICO ...................................................................................... 3

2.

CARACTERIZAÇÃO DO IMPOSTO SOBRE VALOR ACRESCENTADO (IVA) ............................. 3

3.

DESCRIÇÃO DA POLÍTICA PÚBLICA SELECIONADA ........................................................ 4

4.

IMPLICAÇÕES ECONÓMICAS DA POLÍTICA PÚBLICA SELECIONADA .................................. 5

4.1.

Implicações no equilíbrio de mercado original .............................................................. 5

4.2.

Implicações no bem-estar dos consumidores e dos produtores ....................................... 5

4.3.

Implicações quanto aos ganhos de Receita Fiscal do Estado ........................................... 7

4.4.

Implicações no bem-estar social ................................................................................ 9

5.

CONCLUSÕES ........................................................................................................ 10

6.

BIBLIOGRAFIA ....................................................................................................... 12

1. ENQUADRAMENTO TEÓRICO A intervenção do Estado numa economia de mercado pode alicerçar, do ponto de vista económico, em inúmeros fundamentos. Estes podem ser agrupados, numa perspetiva global, em objetivos de eficiência e objetivos de equidade. Dado um certo sistema de preferências sociais, a prossecução de uns e de outros envolve trade-offs que devem ser cuidadosamente ponderados na conceção das políticas públicas. A atuação do Estado no sentido de promover a equidade pode recorrer a um grande número de instrumentos, com custos, em termos de eficiência, muito diferenciados e com uma eficácia, em termos redistributivos, muito variável. Consequentemente, é desejável seguir uma abordagem abrangente, escolhendo criteriosamente as políticas a utilizar para fazer redistribuição da riqueza, quer do lado da receita, quer do lado da despesa. A teoria económica e a consideração dos requisitos de um bom sistema fiscal sugerem, genericamente, que a tributação do consumo nunca deve envolver taxas diferenciadas com objetivos redistributivos, dados os seus elevados custos em termos de eficiência e de administração fiscal. No entanto, o Imposto sobre o Valor Acrescentado (IVA), o principal imposto sobre o consumo em toda a União Europeia e em vários países industrializados, comporta quase sempre múltiplas taxas, definidas fundamentalmente com objetivos redistributivos, apesar dos seus elevados custos em termos de eficiência e da administração fiscal. 2. CARACTERIZAÇÃO DO IMPOSTO SOBRE VALOR ACRESCENTADO (IVA) Em 1986, no contexto da reforma da tributação sobre os bens e serviços, foi introduzido em Portugal o IVA. Esta alteração surgiu antecipando as obrigações que decorriam da participação de Portugal na Comunidade Europeia. O IVA, tal como requerido pelas diretivas europeias, é um imposto geral sobre o consumo de bens e serviços, aplicado sobre o valor acrescentado em cada uma das fases do processo produtivo, cuja incidência legal é sobre o consumidor final. A incidência económica é, no entanto, repartida entre os produtores e consumidores, consoante as condições de mercado. As exportações não são sujeitas a IVA, sendo apenas tributadas no país de destino. As importações são tributadas pelo seu montante total. O IVA substituiu o Imposto sobre Transações, entre outros impostos indiretos, e a sua introdução permitiu um aumento da receita, por via quer do alargamento da base tributária, quer de uma menor permeabilidade à fraude e evasão fiscais. Inicialmente, o Código do IVA estabeleceu quatro taxas: 0 por cento, 8 por cento (taxa reduzida), 16 por cento (taxa normal) e 30 por cento (taxa agravada). Adicionalmente, determinados bens e serviços estavam

3

isentos de imposto, como era o caso dos serviços médicos. A não adoção de uma taxa única teve em vista evitar eventuais efeitos regressivos da reforma. As taxas do IVA foram alteradas diversas vezes desde a sua introdução, essencialmente com o objetivo de aumentar a coleta, implementar decisões ao nível europeu e melhorar a competitividade de alguns sectores específicos. Atualmente, subsistem apenas três taxas: a taxa reduzida de 6 por cento, a taxa intermédia de 13 por cento e a taxa normal de 23 por cento.

3. DESCRIÇÃO DA POLÍTICA PÚBLICA SELECIONADA A medida de política pública, selecionada como objeto do presente trabalho, decorreu do compromisso de reestruturação das taxas de IVA, no âmbito do Memorando de Entendimento firmado com o Fundo Monetário Internacional, Comissão Europeia e Banco Central Europeu, estabelecido no Programa de Assistência Económica e Financeira (PAEF) a Portugal. Tal como a maior parte das medidas, que têm vindo a ser progressivamente implementadas, procurando salvaguardar, na medida do possível, o princípio da equidade social durante o período de “austeridade”, através da justa repartição dos sacrifícios por todos os sectores de atividade, esta medida visa contribuir para o reforço da arrecadação de receita fiscal. Na versão de maio de 2011, o memorando consubstanciava o aumento das receitas de IVA, tendo como fim o aumento da receita fiscal. Para isso, estabeleceram-se dois vetores de ação: redução das isenções em sede de IVA e transferência de categorias de bens e serviços das taxas de IVA reduzida e intermédia para a taxa normal. Ao aumentar a taxa de IVA no sector da Restauração, da taxa intermédia para a normal, esta reestruturação visou garantir o objetivo de consolidação orçamental, em conformidade com o compromisso assumido no Memorando de Entendimento, através da solicitação de um esforço acrescido aos empresários deste sector. No âmbito do princípio da equidade social, esta decisão visou, assim, promover uma repartição mais equitativa do esforço adicional de consolidação orçamental, aplicando a este sector a taxa normal de IVA em vigor para a generalidade dos sectores de atividade, designadamente, os sectores do comércio a retalho.

4

4. IMPLICAÇÕES ECONÓMICAS DA POLÍTICA PÚBLICA SELECIONADA 4.1. Implicações no equilíbrio de mercado original O IVA é um imposto seletivo sobre as compras, ou seja, é pago no ato da compra pelo consumidor através da aplicação de uma taxa sob a forma de uma percentagem do valor total do bem. Neste caso em particular, da taxa do IVA aplicado ao sector da restauração, verificou-se um aumento do seu valor de 13% para 23% em 2012. Este aumento implicou que um consumidor passou a pagar mais 8,8% (=10%/113%) por cada refeição. Face a uma situação teórica inicial sem imposto (ponto de equilíbrio E indicado na Figura 1), a aplicação de uma taxa implicou uma deslocação da curva da procura para baixo de D1 para D2, pelo montante do imposto, deslocando o ponto de equilíbrio de E para B.

Figura 1 – Implicações no equilíbrio original

4.2. Implicações no bem-estar dos consumidores e dos produtores A introdução de um imposto seletivo introduz uma “cunha” entre o preço recebido pelos produtores e o preço pago pelos consumidores, ou seja, a aplicação da taxa conduz à redução do preço recebido pelos produtores e ao aumento do preço pago pelos consumidores. O valor dessa “cunha” resulta do montante da taxa do imposto. Neste caso, conforme referido, a taxa pré-existente (T1) é de 13% e a nova taxa é de 23% (T2).

5

Verificamos que 

A redução do preço recebido pelos produtores causa uma diminuição do excedente do produtor que corresponde à redução da área do triângulo [A+B+F] para a área do triângulo [A], e que



O aumento do preço pago pelos consumidores causa, igualmente, uma diminuição do excedente do consumidor que corresponde à redução da área do triângulo [C+D+G] para a área do triângulo [D].

Como se constata na Figura 2, tanto os consumidores como os produtores são prejudicados pelo imposto; no entanto a contrapartida é o aumento da receita fiscal arrecadada pelo Estado (como iremos verificar mais adiante na análise da Figura 4).

Figura 2 – Implicações no bem-estar dos consumidores e dos produtores

A atividade do setor da restauração tinha registado uma quebra de 4,5% em 2011 face ao ano de 20101, mas foi em 2012 que se verificou a maior quebra na procura com uma redução da atividade de 12,3% face a 20112. Esta evolução negativa do volume de negócios do setor decorre de fatores verificados anteriormente tais como: a alteração progressiva de padrões de consumo, o aumento da taxa de poupança, a redução do rendimento disponível das famílias. Em 2012, a redução mais acentuada do consumo deve-se ao aumento da taxa de IVA3. 1 Índice de Volume de Negócios – Fonte: INE 2 Ibidem 3 Relatório do Grupo de Trabalho Interministerial - Avaliação da situação económico-financeira específica e dos custos de contexto dos sectores da hotelaria, restauração e similares - agosto de 2013

6

Em termos das implicações económicas nos produtores, constata-se que se verificou uma quebra dos níveis de emprego de 4,8% em 2011 (ou seja, na mesma ordem de grandeza da procura) e de 7,8% em 2012 (ou seja, menos do que da procura), face aos respetivos anos transatos. Esta redução no emprego indicia uma redução da oferta global que se pode comprovar também pela diminuição no número de sujeitos passivos em sede de IVA no setor da restauração e similares4. A redução foi de 1,6% de 2010 para 2011 (antes da alteração da taxa de IVA) e de 2,4% de 2011 para 2012 (no ano de aumento da taxa). Conclui-se, portanto, por uma redução da oferta no setor da restauração, sendo esta, porém, menos acentuada do que na procura. Decorre destes dados que se pode concluir que a procura foi mais elástica à subida dos preços decorrentes do aumento da taxa de IVA do que a oferta (sendo que ambas apresentam elasticidade positiva). Esta conclusão é ilustrada na Figura 3 onde se pode observar que a incidência do imposto é maior sobre os produtores (área azul) do que sobre os consumidores (área verde).

Figura 3 – Distribuição da carga fiscal do imposto entre produtores e consumidores

4.3. Implicações quanto aos ganhos de Receita Fiscal do Estado Antes do aumento da taxa de IVA, de 13% (T1) para 23% (T2), a Receita Fiscal (RF) proveniente desta taxa era igual a [A+B+C+D] e, com o aumento de 10% na taxa, passou para [F+A+B+G] (Figura 4).

4 Fonte: Autoridade Tributária 7

Figura 4 - Receita Fiscal com IVA a 13% e a 23%

Em termos reais, o aumento da receita fiscal associada ao IVA na restauração e similares passou de 259 milhões de euros (média anual entre 2009 e 2011) para 521 milhões de euros em 2012 após aplicação do novo valor da taxa de IVA, o que representa um aumento de 101%. Estes valores são ainda mais expressivos se tivermos em consideração que a receita fiscal com origem no setor da restauração e similares (IVA, IRS e IRC), cresceu em 53% no ano de 2012, para um global de 707 milhões de euros, fruto do impacto da reestruturação da taxa de IVA, potencializada pelo reforço do combate à evasão fiscal e à economia paralela. Em termos orçamentais é importante, não obstante a expressiva contração estrutural do consumo, o facto de o aumento de 272 milhões de euros em receita do IVA (de 249 milhões em 2011 para 521 milhões em 2012), representar 172 milhões em contributo líquido (Figura 5). Isto deve-se aos impactos negativos que a medida teve: nas contribuições para a Segurança Social (Taxa Social Única – TSU), com uma redução de 46 milhões na receita; no aumento de beneficiários de Subsídio de Desemprego, com um acréscimo de 26 milhões na despesa; no “IRS e IRC pago por empresários e empresas, com uma redução da receita de 21 milhões e 7 milhões respetivamente. Ainda assim, numa ótica consolidada de contas públicas, o resultado orçamental do setor apresenta um saldo positivo (o aumento da receita do IVA foi substancialmente superior ao aumento das despesas decorrentes desse aumento).

8

Figura 5 - Contributo Líquido

4.4. Implicações no bem-estar social Relativamente ao bem-estar da sociedade em geral, este é medido pela variação da carga excedentária total (produtores e consumidores) e pela variação do ganho do Estado com a tributação. Como foi referido anteriormente, tanto o excedente do produtor como o excedente do consumidor foram reduzidos, com o aumento da taxa de IVA, mas por outro lado, a receita fiscal arrecadada pelo Estado aumentou. No entanto, verificou-se que existe uma perda de eficiência do sistema, já referida anteriormente, que é denominada de peso morto (deadweight loss) e esta ocorre porque a aplicação de um imposto seletivo impede que um conjunto de transações ocorra naturalmente no mercado. Quanto maior for o número de transações impedidas, maior será a perda por peso morto e menor será a carga excedentária produzida pelo sistema. O que se verifica nesta situação é que, com o aumento da taxa de IVA de 13% para 23%, a carga excedentária reduziu-se, mas que não é totalmente compensada pelos ganhos do Estado com a tributação. Ocorre, portanto, uma redução da eficiência do sistema económico e do bem-estar em geral da sociedade, aumentando o peso morto do sistema (representado pela passagem do triângulo cinzento opaco para o triângulo maior, cinzento e a cinza na Figura 6) que representa o conjunto total das transações impedidas e consequente perda de riqueza.

9

Figura 6 – Variação do deadweight loss

5. CONCLUSÕES O presente exercício de análise teve como objetivo a caraterização da medida governamental de política pública, tomada e implementada pelo XIX Governo Constitucional (2011-2015), sobre o aumento da taxa do IVA - da taxa intermédia de 13% para a taxa normal de 23% - no sector da restauração, no ano de 2012, incidindo o nosso fulcro nas implicações no equilíbrio de mercado original, no bem-estar dos consumidores e dos produtores, no bem-estar social e no impacto nas receitas fiscais do Orçamento de Estado. Como principal implicação no equilíbrio de mercado, podemos destacar que as intervenções/alterações fiscais do Estado, em sede de IVA, influenciam e alteram substancialmente o equilíbrio de mercado original, como ficou patente na demonstração gráfica na Figura 1. Com a intervenção do Estado, aumentando o IVA de 13% para 23%, observamos que existe uma perda de bem-estar para a sociedade, ocorre uma alteração do ponto de equilíbrio original do mercado com aumento de ineficiência e encontramos dois preços distintos do bem, observando uma diminuição da quantidade transacionada. No que concerne ao bem-estar dos consumidores e dos produtores, cabe-nos referir que, com a intervenção do Estado, aumentando o IVA de 13% para 23%, observamos que ocorre uma diminuição no excedente do consumidor e que existe um aumento do preço a pagar pelos consumidores e uma diminuição da quantidade procurada. Por outro lado, constatamos que existe uma queda/diminuição no excedente do produtor. A demonstração gráfica – Figura 2 - demonstra uma diminuição do valor a receber pelos produtores, uma diminuição da quantidade procurada e aumento do IVA a entregar ao Estado. Como se constata graficamente acima, quer os consumidores quer os

10

produtores são prejudicados pela subida do imposto, no entanto, a contrapartida será o aumento da receita fiscal arrecadada pelo Estado. No que respeita ao bem-estar social, como referido anteriormente, com o aumento da taxa de IVA, tanto o excedente do consumidor como o excedente do produtor sofreram uma redução e originaram um aumento de receita fiscal do Estado. Com a intervenção do Estado, aumentando o IVA para 23%, observa-se uma perda de bem-estar para a sociedade, resultado de uma diminuição dos ganhos totais da soma (Produtores + Consumidores + Estado). As demonstrações gráficas mostram o surgimento de um considerável peso morto (deadweight loss), isto é, o aumento da receita fiscal não compensa a diminuição dos excedentes do consumidor e do produtor no cálculo final do benefício social. A um aumento do peso fiscal e da intervenção do Estado corresponde uma diminuição da eficiência do mercado e do bem-estar social. Contudo, o facto de, na globalidade, a sociedade perder com o aumento da intervenção estatal, não significa que esta medida/política pública seja necessariamente negativa. O facto de se aumentar a receita fiscal pode levar a uma utilização benéfica desse aumento de receita em maisvalias e benefícios redistributivos para a sociedade. Quanto ao impacto no Orçamento do Estado, a medida/política pública adotada de aumentar a taxa do IVA no sector da restauração, no ano de 2012, verificou-se que a receita fiscal arrecadada aumentou de 259 milhões de euros (média anual entre 2009 e 2011) para 521 milhões de euros, em 2012, após a aplicação do novo valor da taxa de IVA, o que representou um aumento de 101%. Apesar dos impactos negativos que a medida teve, com várias reduções em contribuições (v.g. Taxa Social Única,), numa ótica consolidada de contas públicas, o resultado orçamental do setor apresentou um saldo positivo, visto que o aumento da receita do IVA foi substancialmente superior ao aumento das despesas decorrentes desse aumento.

11

6. BIBLIOGRAFIA 

Relatório do Grupo de Trabalho Interministerial - Avaliação da situação económicofinanceira específica e dos custos de contexto dos sectores da hotelaria, restauração e similares - agosto de 2013.



Krugman, P. & Wells, R. (2007) Introdução à Economia. Rio de Janeiro; Elsevier.

12

Lihat lebih banyak...

Comentários

Copyright © 2017 DADOSPDF Inc.