Anamnese e Interpretação

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Naturalmente que a cada caso de criança atendida, há uma anamnese. A anamnese não é algo " solto " ou meramente " protocolar " , que vá colocar a criança sob alguma rubrica. Há ecolalias em crianças que nem precisam do rótulo de " autismo moderado " ou " Síndrome de Asperger " : uma qualidade de escuta e de locução dirigida à criança já traz, no seu rastro, a absoluta remissão do sintoma. Por outro lado, há crianças autistas que os pais suspeitam serem " só crianças agitadas " , sendo que estas, verdadeiramente autistas, precisam de ajuda especializada, no estilo Amigos do Autista. Cabe ao profissional discernir. Às vezes, um dado da anamnese faz sentido interpretativo para a mãe e a criança, simultaneamente. E a mãe pode se beneficiar disso tanto ou mais do que a criança, já que estamos lidando com uma " ambiência " [ambiência mãe-criança]. Assistentes Sociais costumam pensar em " técnica " , mas a ênfase de atendimentos em consultas psicológicas, como eu as concebo, implicam numa qualidade de olhar e de escuta, bem como em enquadres que viabilizem a explicitação de " pontos cegos " [o que eu chamo de " sombra do ambiente primário " , podendo tais ambientes se situarem na escola, na igreja, nos hospitais, nos orfanatos, em dependendo de cada caso concreto]. Vamos a um exemplo curtinho. O menino de quatro anos coloca um brinquedo sob a japona. Eu vejo que a mãe o viu agir assim, com perfeita e serena despreocupação. Eu vejo o que ela viu e como agiu ao que viu. Peço um abraço ao menino, antes dele ir embora. E lhe digo: " o tio gosta de abraçar a criança antes dela voltar pra casa, e também de pedir que ela devolva o brinquedo para as próximas crianças que vêm aqui na sala do tio ". Olho pra mãe e lhe digo dados que estiveram lá atrás, na anamnese: " mãe, não é porque o pai da criança a abandonou na gravidez e, depois de nascido, só pagou " meia pensão por um único mês " que a senhora vai achar que ele " possa pegar o que o mundo lhe deve " , como se nem percebesse isso. Na verdade, a senhora está validando isso ". A criança, no caso, encontra apoio suportivo no olhar da mãe que a ela empresta [ou na criança projeta] a " justa reivindicação de direitos por perdas pregressas ". A mãe fica mais ruborizada do que a criança. A interpretação serviu mais pra ela. Uma variável no [ou do] ambiente mãe-criança foi problematizada, pós-explicitação. Isso já trouxe eficácia. O furto, no caso, era uma questão lateral, mas fica aqui o registro.
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