Arlequim: Servidor de Dois Amos (Contextualização Histórica e Resenha-Resumo)

July 22, 2017 | Autor: Andrew T. Silva | Categoria: Commedia dell'arte, Carlo Goldoni, Teatro
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ARLEQUIM, SERVIDOR DE DOIS AMOS: comédia em três atos
GOLDONI, Carlo. Arlequim, servidor de dois amos: comédia em três atos. Tradução: Elvira Rina Malerbi Ricci. São Paulo: Abril S.A. Cultural, 1983. 203 p.
De um dos maiores comediógrafos italianos, "Arlequim, Servidor de Dois Amos" (Il Servitore di Due Padroni) é considerada um dos ícones da commedia dell'arte, sendo a peça, além de divertida repleta de um humor que ainda não envelheceu. Carlo Goldoni (1707-1793) nasceu em Veneza, em meio à um período de florescimento e popularização cultural, onde se percebia arte por todas as partes, sendo a população italiana uma grande entusiasta dos espetáculos, essa se reunia sempre em seus sete principais teatros ou em carros ambulantes para assisti-los, porém, permanecendo como uma exigente crítica – chegando a lançar tomates nos atores que desagradassem o gosto do público. Goldoni, nascido de uma família próxima a artistas, acabou por conviver com muitos destes, chegando a haver um episódio em que ao dramatizar uma cena, este acaba se apaixonando pelo ofício de ator e decide segui-lo, contrariamente àquilo que seu pai visava à carreira do filho; seu pai chega a matriculá-lo em um colégio de dominicanos para estudar filosofia, onde Carlo acaba tendo contato com a peça A Mandrágora de Nicolau Maquiavel e se encanta pela crítica humorística que posteriormente marcaria seu teatro. O futuro comediógrafo também tem contato com um grupo de comediantes e chega a integrar este, porém seu pai convence-o a abandonar a trupe. Carlo se forma em direito e ao mesmo tempo funda um grupo de teatro amador em Milão, escreve peças para atores profissionais, porém é obrigado a ir para Verona onde entra em uma companhia profissional.
Goldoni começa a escrever melodramas e textos para commedia dell'arte, a qual era interpretada usualmente por cerca de doze atores com tipos fixos os quais deveriam saber cantar, dançar, tocar algum instrumento, fazer acrobacias, contorções, piruetas, cambalhotas, saltos mortais, mímica e ter grande domínio do improviso já que os textos não era completamente redigidos mas sim apresentavam apenas certos comandos e sendo "improvisados na hora" desse modo podendo fugir da censura e impedindo o roubo de ideias; Goldoni, porém, cansado dessa forma teatral que já se encontrava decadente, resolve reforma-la introduzindo textos completamente redigidos, além de tornar a dramaturgia mais próxima da realidade e dos costumes, valorizando temas como o amor (ou sexo), comida, trabalho e a condição social, devido a contratempos volta a trabalhar como advogado e a pedido de Antonio Sacchi, escreve "Arlequim, Servidor de Dois Amos"; Carlo chegou a ser influenciado por Molière e apreciado por Voltaire.
"Arlequim, Servidor de Dois Amos" foi escrita no início das reformas de Goldoni e já apresenta uma retirada dos excessos da commedia dell'arte, também se nota nessa peça o uso de várias máscaras-tipo já conhecidas, como o Pantaleão, o Doutor, os enamorados (Beatriz e Florindo / Clarisse e Sílvio) e os Zanni (criados) Arlequim, Esmeraldina e Brighela – estes personagens, porém, também tem suas personalidades alteradas. De acordo com a revista Trans/form/ação (2001, p. 15):
Os pontos principais da "reforma" goldoniana podem ser assim arrolados: 1. Elaboração dos argumentos das comédias a partir de situações tiradas da realidade; 2. Aprofundamento psicológico das personagens; 3.redação integral de todos os diálogos desenvolvidos entre as personagens, com a consequente eliminação do caráter de improvisação inerente aos antigos roteiros; 4. Eliminação do caráter pornográfico que vinha marcando os espetáculos da commedia dell'arte, recuperando-se a ética e a função educadora do teatro; 5. Valorização do ator, por meio da escrita dramatúrgica que lhe é mais adequada; 6.Registro artístico de uma nova classe social emergente, a burguesia; 7. Aproveitamento do significado social das máscaras, utilizadas como síntese dos eixos principais em que se subdivide a sociedade; 8. Recusa da commedia dell'arte como tal e – ao mesmo tempo – fixação de suas características por meio das inúmeras peças que escreveu, utilizando-se de seus elementos mais importantes.
"Arlequim, servidor de dois amos", ao mesmo tempo que retoma à imagem carnavalesca – bastante presente na commedia dell'arte – tem um fundo crítico em relação à mensagem que passa dos pobres lutando para sobreviver (chegando a utilizar para tal artifícios como trapaça e mentira) em um mundo onde os ricos vivem uma vida de lazer e conforto. Na França, Goldoni teve que adaptar a sua comedia de um texto completamente redigido para um aberto às improvisações já que o público francês exigia a commedia dell'arte pura como esta nasceu.
O Primeiro Ato se inicia na casa de Pantaleão, Veneza, com o consentimento da união de sua filha, Clarisse, com o filho do Doutor, Sílvio, na presença do hoteleiro Brighela; A filha de Pantaleão inicialmente iria se casar com Frederico, pois seu pai tinha uma dívida com a família deste, porém durante uma batalha Frederico acaba morto e Clarisse, para a sua felicidade, toma a liberdade de se casar com seu verdadeiro amor, Sílvio. Após a apresentação de tais fatos, surge a figura do Arlequim em cena, o qual se apresenta como criado de Frederico e diz que o mesmo se encontra vivo à espera de Pantaleão, há um abalo geral. Logo descobre-se que o suposto Frederico (agora vivo) é, na verdade, sua irmã Beatriz vestida como se fosse o mesmo, todos, porém não a reconhecem – inclusive Arlequim – exceto Brighela que decide não a acusar, o suposto Frederico-Beatriz¹ então reclama novamente a mão de Clarisse em casamento, Pantaleão cede, porém, Clarisse, Sílvio e o Doutor resistem contra tal atitude. Mais tarde Florindo-Beatriz confessa para Brighela que está se disfarçando pois após seu amado Florindo matar seu irmão e fugir, ela resolve ir encontrá-lo, sem dinheiro porém, Beatriz resolve se disfarçar como Frederico e retomar a herança de seu irmão, afirmando que se apresentando como mulher, provavelmente, ninguém lhe garantiria direito sobre o dinheiro, Brighela então concorda em acobertá-la. Arlequim, empobrecido e longe do(a) amo(a) encontra Florindo e lhe presta seus serviços como carregador, Frederico se deixa agradar pelo trabalho de Arlequim e o chama para ser seu servidor, este mente dizendo que está sem amo e aceita a proposta, passando a ter dois patrões e acabando por descobrir em seguida que ambos se instalaram no mesmo hotel – o de Brighela. Após uma série de desentendimentos entre Sílvio, Arlequim e seus dois amos, Florindo acaba por "descobrir que Frederico está vivo" e que sua amada Beatriz está também em Veneza vestida em trajes masculinos a sua procura, ele então põe-se a encontrar sua amada. Arlequim acaba se confundindo novamente ao entregar à Florindo um pacote com cem ducados de Pantaleão que deveriam ser entregues então à Frederico-Beatriz. Enquanto isso, Frederico-Beatriz, vendo o desespero e hesitação de Clarisse por seu pai tentar força-la a se casar com este (a), acaba por confessar sua verdadeira identidade em troca desta manter tal em segredo e diz que ajudará a amiga a reverter toda a situação podendo ficar com seu amado Silvio, Pantaleão ao ver as agora amigas abraçadas, mal-entende e resolve marcar imediatamente o casamento de Frederico-Beatriz com Clarisse para o desespero de ambas.
O segundo ato se inicia com Sílvio indo "tirar satisfação" com Pantaleão, seu pai o impede e vai por conta conversar com Pantaleão, este, porém mantém sua palavra de casamento com Frederico; Sílvio em um ato insano quase assassina Pantaleão, porém é impedido por Frederico-Beatriz, além disso se revolta e desentende com Clarisse, a qual ameaça se matar na frente do amado – sendo impedida por Esmeraldina. Arlequim entrega à Frederico-Beatriz a bolsa com os cem ducados (que deveriam ser entregues a esta, porém por engano havia sido entregue à Florindo) e em mais um ato desastrado, rasga uma folha bancária que Frederico-Beatriz havia lhe entregue, já este segundo convida Pantaleão para um almoço no hotel de Brighela; durante o almoço surge também Florindo e Arlequim acaba precisando fazer uma série de "malabarismos" para conseguir servir os dois amos ao mesmo tempo – e consecutivamente comer escondido da comida de ambos. Esmeraldina (criada de Pantaleão) chega com uma carta de Clarisse à Frederico-Beatriz que relata as crises de ciúmes de Sílvio, esta ao mesmo tempo em que é demasiado galanteada por Arlequim, o qual diz estar apaixonado pela criada, entrega a carta a este, ambos então decidem abri-la – inutilmente, já que nenhum dos dois sabe ler – Frederico-Beatriz e Pantaleão chegam e se deparam com a carta aberta e enquanto Pantaleão persegue Esmeraldina para esbofeteá-la por tal ato, o amo de Arlequim o espanca; já Florindo, ao ver seu criado ser espancado e não se defender, o espanca também.
No terceiro ato, em outra de suas inúmeras confusões, Arlequim ao colocar na sala do hotel os baús de seus dois amos para que as roupas arejassem, acaba trocando um livro e uma foto de baús, e ao abrirem, Florindo e Frederico-Beatriz descobrem pertences que um enviou ao outro e se confundem de como foram parar ali, Arlequim inventa uma estória e justifica à Florindo que Beatriz o entregou aquele pertence quando esta era sua ama e que acabara de falecer, a estória se repetiu quando contada à Beatriz a qual, desesperada, revela sua verdadeira identidade perante seu criado e Pantaleão, este segundo ao descobrir parte para avisar Sílvio do ocorrido e permitir a mão de Clarisse à este, ambos vão em busca desta; Já os enamorados Beatriz e Florindo, loucos e desesperados, tentam suicídio na mesma sala porém ao saírem para cometer tal ato acabam se encontrando e voltando um para os braços do outro, já Arlequim tenta justificar a evidência de sua mentira culpando o suposto "segundo criado" Pascoal – o qual era apenas outra mentira para inocentar o próprio Arlequim. Enquanto isso, Sílvio, Doutor e Pantaleão tentam convencer Clarisse de se casar com Sílvio, já que esta hesita devido aos atos ciumentos e insanos do amado, ela porém acaba cedendo. Ao final do terceiro ato, todos os personagens se reúnem no hotel, e além da união de Beatriz com Florindo e de Clarisse com Sílvio, Arlequim também acaba conseguindo a mão de Esmeraldina, porém para conseguir isso arma outra peripécia que lhe faz ter que admitir sua mentira com relação à Pascoal contando que, na verdade, todo esse tempo ele foi servo de dois amos.




O codinome "Frederico-Beatriz" foi utilizado para facilitar o entendimento dos momentos que fazem referência à personagem Beatriz caracterizada como seu irmão. O nome "Beatriz" será utilizado apenas em momentos que esta não estiver disfarçada.

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