As propostas de Padre António Vieira a D. João IV - CF

Share Embed


Descrição do Produto

As propostas de Padre António Vieira a D. João IV, para melhorar a situação económica do Reino de Portugal História Moderna Economia e Sociedade Professor Doutor João Cosme

CLÁUDIO FONSECA Nº 50350 8 de Junho de 2015 1

ÍNDICE

Introdução

3

No Tempo de Padre António Vieira

4

Análise da carta a D. João IV

10

Conclusão

16

Bibliografia

17

Anexos

18

2

Introdução

Neste trabalho que se segue destinado a uma análise da carta enviada a D. João IV sobre o estado em que se encontra o Reino de Portugal e o que fazer para mudar a situação do país apresentando os vários casos pelos quais se deve mudar a política económica do reino, que se encontra num momento particular. Pretende-se neste trabalho mostrar em que conjuntura esta carta aparece, no sentido de como está o Império no contexto das guerras da Restauração, onde Portugal tendo estado na União Ibérica, muitos dos seus territórios foram perdidos, para os adversários da Espanha: Inglaterra, e Holanda. Por último teremos em conta as propostas do Padre António Vieira, procurando ao detalhe percebêlas.

3

No Tempo de Padre António Vieira

A uma simples pergunta de quem é Padre António Vieira podemos responder desta maneira: “ […] Antônio Vieira (1608-1697) é um desses poucos autores de primeira plana que, ao mesmo tempo, ocupam lugar proeminente na vida política do país, em sua época. […]” 1, esta frase pressupõe que esta figura histórica tenha sido algo mais do que ter sido proeminente na vida política, quando se fala de António Vieira existem duas coisas que nos saltam logo a partida: padre jesuíta missionário no Brasil e os sermões. Padre António Vieira como sabemos é um agitador de consciências e é o imperador da língua portuguesa, foi aos 6 anos para o Brasil, veio poucas vezes a Portugal, mas como iremos ver será muito útil à monarquia lusa, pois não existem apenas documentos de padre António Vieira relacionados com teologia, existem textos de génese política e económica sendo bastante útil a D. João IV, uma das teorias que Vieira tinha era a construção do Quinto Império e o jesuíta via no duque de Bragança a encarnação do neo-sebastianismo, “ […] O propósito evidente de Vieira em seu desempenho da tópica é promover a concórdia das gentes dos três estados do reino em torno da nova cabeça da monarquia. […]”2. “[…] Tal como sucedera na crise de 1383-1385, e como viria a repetir-se no futuro, a mudança de poder em 1640 foi provocada pela elite intermedia, que estava insatisfeita com a sua situação corporativa e que foi capaz de dar voz ao descontentamento da população. […]” 3, havia descontentamento por parte da população porque as promessas de Filipe I de Portugal não estavam a ser cumpridas pelos seus sucessores e o império português estava em derrocada devido às sucessivas acções quer dos Holandeses quer também dos Ingleses, aproveitando as revoltas que assolam a Península Ibérica, como em Aragão, consegue-se dar a aclamação de D. João IV através de um “[…] típico golpe palaciano, perpetrado por um grupo de algumas dezenas de fidalgos, depois identificados como os referidos «quarenta restauradores». […]” 4, na cidade estavam poucas centenas de soldados castelhanos, não houve grande massacre, como foi dito existiam várias revoltas na península. Foquemo-nos agora no que se seguiu à restauração sobretudo os 28 anos seguintes a ela, “[…] o reino suportou uma longa guerra de fronteira, rechaçando invasões consecutivas, ao mesmo tempo que mantinha uma verdadeira guerra mundial contra a Holanda […]”5. A notícia de que o trono agora de Portugal era ocupado pelo duque de Bragança, correu o Império, aceitando todos com naturalidade a notícia tal como aconteceu quando Filipe II de Espanha uniu as coroas, todavia houve um território que não aderiu e se manteve na causa espanhola: Ceuta, a sua proximidade com a Andaluzia poderá ser a justificação para tal atitude, todavia mesmo a cidade de Macau que com isto perdia o comércio com Manila aceitou bem a novidade vinda do reino.

1

Vide, VIEIRA, Padre António, Escritos históricos e políticos, 1ª edição, Livrarias Martins Fontes, São Paulo, 1995, p.VII. Vide, idem, ibidem, p.X. 3 Vide, COSTA, João Paulo Oliveira e, História da expansão e do Império Português, 1ª edição, Esfera dos livros, Lisboa, 2014, p.187. 4 Vide, MONTEIRO, Nuno Gonçalo, História de Portugal, coord. Rui Ramos, 4ª edição, Esfera dos livros, Lisboa, 2010,296. 5 Vide, COSTA, op. Cit, p. 188. 2

4

O império já não era o mesmo, nem o dinheiro disponível era o mesmo, muito tinha mudado, acima de tudo a Rota do Cabo já não era algo exclusivo dos portugueses, nem tão pouco se mantiveram as possessões que garantiam o controlo das especiarias, ora se não se tem o controlo absoluto da Índia, obviamente que os lucros já não são as mesmos e deixa de ser tão rentável, embora que já antes o próprio Vasco da Gama quando regressou disse que não era um negócio muito viável, todavia para o rei D. Manuel a Índia é sobretudo uma questão de prestígio pois mais nenhum príncipe europeu tem a Índia e eles todos que antes dependiam de Veneza, passam agora a depender de Portugal que irá por tudo secar a antiga rota, procurando assim o controlo do comércio das especiarias. Pois se o Oriente está em decadência e apenas consegue manter Goa e Baçaim e Diu. Tal já não é suficiente, modo que para onde se vai mudar o foco de interesse da Coroa? Atlântico Sul é a resposta, é curioso como vários são os analistas dizem que Portugal esteve sempre dependente, primeiro tudo se concentrava na Índia, perde-se a Índia Portugal apoia a sua economia no Brasil, o Brasil torna-se independente a economia vira-se para as colónias africanas, com o 25 de Abril 1974 as colónias tornam-se independentes e o interesse passa a ser a CEE em 1986, UE actualmente. Padre António Vieira começa a aparecer na questão político-económica onde em cartas trocadas com Ribeiro de Macedo “[…] discutiram a possibilidade de experimentar o cultivo das especiarias asiáticas em solo brasileiro. […]”6 Se esta experiência funcionasse Portugal retomava o mercado das especiarias, visto elas agora viajarem em melhores condições e preços mais baixos, desta força a riqueza de Portugal subia mas também se desenvolvia o próprio Brasil, se este projecto funcionasse outra que podia acontecer como consequência à falência da VOC, que era a companhia mercantilista marítima dos holandeses, ou seja, se no século XVI se conseguiu secar a rota de Veneza, com este investimento no Brasil seria a antiga Rota do Cabo que seria secada e a Holanda que tal como Portugal estava viciada nos negócios além-mar, quase já não vivendo sem eles, entraria igualmente em decadência, mas o imperador da língua portuguesa “[…] ele esperava de facto, era que, por esta via, Portugal aproveitasse o colapso dos Neerlandeses e restaurasse o Estado da Índia na sua configuração quinhentista. […]”7, temos aqui bem vincada a ideia do Quinto Império. Os anos após a restauração foram essencialmente da busca da consolidação e da paz com os europeus do norte, mas nunca se esqueceu a reconquista dos territórios que tinham pertencido à Coroa, estes que então “[…] procuravam substituir os Ibéricos nos diferentes espaços de actuação. […]” 8, Portugal não teve anos tranquilos pois tinha na sua fronteira a ser atacada por Espanha e tinha barcos e homens a combater no Atlântico e Índico, até porque “[…]as coisas humanas estão sujeitas à inconstância dos tempos […]”9. O Padre António Vieira envia uma carta a D. João IV de que ele necessita de conservar Portugal e diz como e onde o fazer, mas vamos apenas retirar as ideias em relação à situação política e diplomática, pois as leituras em relação à economia e sociedade ficam para o próximo capítulo do presente trabalho. “[…] O reino de Portugal, senhor, não melhorando do estado em que de presente o

6

Vide, idem, ibidem, p. 199. Vide, idem, ibidem, p. 199. 8 Vide, idem, ibidem, p. 205. 9 Vide, VIEIRA, op. cit, p. 283. 7

5

[…]”10, Portugal está em guerra com Espanha, todavia esta guerra encaixa-se numa conjuntura muito delicada na Europa, pois está a decorrer a guerra dos trinta anos, esta presente carta é escrita em 1643 ou seja irão decorrer mais cinco anos desta guerra europeia, que será a última guerra de cariz religioso e nesta guerra a Espanha está também de armas apontadas à França, mas acontece que “[…] A nação francesa naturalmente é inconstante, inquieta, amiga de novidades e fácil de corromper-se por dinheiro; e se tantas vezes vimos em nossos dias rebelado o duque de Orleans, contra o seu irmão rei tão católico; […] as inteligências de Castela de solicitar comprar estas inquietações de França, quando delas depende o seu remédio; nem os hereges franceses deixaram de as promoverem para melhorarem o seu partido. […]”11, Vieira o que pretende dizer com isto é muito simples, é necessário o rei perceber que as coisas como estão não se manterão para sempre, até porque os cofres dos outros países também se vão esvaziando. Padre António Vieira faz referência de que a guerra requere muito dinheiro para custear as despesas, mas também fala de que é necessário pessoas. Portugal está em guerra aberta na Europa contra a Espanha e no mundo contra a Holanda. Na Europa para se afirmar como monarquia independente e no mundo enquanto potência marítima. Mas não só de guerra se tratou a política externa de Portugal. Quem também estava em guerra com a Holanda era a Inglaterra, e Portugal desde cedo teve uma proximidade e uma aliança, ora Portugal vai assinar com a Inglaterra um tratado em 1661, para reforçar outros tratados já antes assinados, um deles que nos obrigou a dar Tânger e Bombaim, pois eram parte do dote de D. Catarina que se iria casar com Carlos II. Cromwell já antes forçara o rei de Portugal a renovar a aliança entre estes dois países12 Também no mesmo ano se vai assinar acordo com as Províncias Unidas. Mas estes tratados não tem apenas uma função político-militar, também têm funções comerciais pois “[…] ao mesmo tempo que concediam importantes privilégios aos mercadores ingleses com negócios nos territórios da monarquia portuguesa, favoreciam a participação inglesa no comércio de produtos portugueses. […]”13 Era necessário reconstruir a economia portuguesa, o vinho da Madeira e dos Açores por exemplo estiveram sempre salvaguardados mesmo quando a Inglaterra decretava que produtos que não fossem da metrópole não podiam entrar, desta forma não só se protegia os produtos vindos destes arquipélagos em concreto, como também ajudou a que esses arquipélagos fossem alvo de interesse dos ingleses que iram desenvolver esses território, mais tarde o mesmo processo acontecerá no Douro, devido ao vinho do Porto.14 Conseguido o apoio da Inglaterra, foi necessário literalmente comprar a paz com a Holanda, foi uma paz muito cara, mas Portugal não tinha outra opção, pois não podia estar com muitas frentes de batalha abertas, precisava sim de mostrar que era independente e assim conseguir mostrar-se de novo à Europa e conseguir reatar alianças, como aconteceu com a Inglaterra. Mas com a Holanda era necessário comprar a paz, mas vejamos sob que moldes para que o Brasil voltasse à Coroa: “[…] Portugal ficava obrigado a pagar a soma de 4 milhões de cruzados em numerário num prazo de 16 anos a troco da desistência holandesa em relação aos territórios que a republica calvinista tinha perdido no 10

Vide, idem, ibidem, p. 284. Vide, idem, ibidem, pp.284-285. 12 Vide, COSTA, op. cit, p. 207. 13 Vide, idem, ibidem, p. 207. 14 Vide, idem, ibidem, p. 208. 11

6

Brasil e em África; […]”15 esta paz era benéfica mais à Holanda do que a Portugal, mas Portugal a 6 de Agosto de 1661 teve de aceitar esta paz, embora beneficiasse mais a Holanda, mas porquê é que a Holanda beneficiava mais? Beneficiava porque se mantinha-se o status quo em que os “[…] territórios ultramarinos e os navios capturados ficavam sob o domínio de quem os possuía, […] Caso Portugal rompesse o tratado, as Províncias Unidas tinham o direito de reclamar a restituição do Nordeste[…]”16 Portugal perdera muitos territórios e só conseguiu desde a sua restauração até à data do tratado recuperar o Brasil, Angola e S. Tomé.17 O problema que se coloca igualmente prende-se pela questão da data em que os Estados Gerais das Províncias Unidas colocaram em prática este tratado acordado em 1661, só passados dois anos é que este tratado entra oficialmente em vigor, a razão é muito simples: “[…] a VOC ganhou tempo para manter a pressão sobre as posições que os portugueses ainda detinham no Malabar, tendo concluído a sua conquista em 1663 com a tomada de Cochim; e, no Atlântico, a WIC ocupou posições na Costa do Ouro. […]”18. Mas as negociações ainda não tinham terminado com as Províncias Unidas, em 1669 volta-se a firmar outro tratado onde Cochim fica definitivamente com os holandeses bem como Cananor. A situação financeira não era muito viável mesmo passados vinte e três anos depois da Restauração e Portugal não estava a conseguir pagar as suas dívidas para com a Holanda pelo que “[…] aceitou pagar a dívida atrasada em sal de Setúbal; em contra-partida, confirmou o senhorio do Nordeste brasileiro. […]”19. Mais ainda os holandeses passaram a ter os mesmos privilégios que os ingleses tinham no comércio português, foram acordos que beneficiaram sobretudo os holandeses, mas Portugal não podia fazer muito, pois existiam vários teatros de operação e não haviam nem recursos financeiros nem humanos, estes últimos podemos afirmar que nunca houve em abundância, e isso pode-nos ajudar a perceber o porquê de o império português ser apenas costeiro, não haviam portugueses suficientes para se sobreporem aos indianos e assim colonizar o local, Portugal em suma tinha de garantir a paz o mais rápido possível para conseguir reerguer ou pelo menos nivelar-se em relação às outras potências europeias, que cada vez mais disputavam o mundo. É de relembrar que desde 1640 até 1668 Portugal esteve em guerra com Espanha e procurou depois colocar-se o mais neutral possível bem como investir em si próprio, seguindo assim uma política de neutralidade, “[…] com a excepção da Guerra da Sucessão de Espana e de pequenos confrontos com a monarquia bourbónica. […]”20. O que se depreende até ao momento é que o império deixou de ser tão grande quanto o era, embora seja necessário fazer a seguinte ressalva Portugal nunca apostou num império territorial, (também pelas razões acima apresentadas) tirando a questão do Brasil, o Estado da Índia eram as cidades que estavam na costa, portanto é um império comercial. A questão de voltar a ter o Estado da Índia pode-se 15

Vide, idem, ibidem, p. 208. Vide, idem, ibidem, p. 208. 17 Vide, Mapa presente nos anexos página 18 deste trabalho. 18 Vide, COSTA, op. Cit. p. 208. 19 Vide, idem, ibidem, p. 209. 20 Vide, idem, ibidem, p. 209. 16

7

resumir a esta frase de Padre António Vieira: “[…] «Quem agora for restaurar a Índia, também lhe é necessário o conquistá-la de novo; mas temo que não sejam tão fáceis de vencer os Holandeses como os Canarins.» […]”21, o Estado da Índia não tinha apenas que se preocupar aqueles que podiam atacar vindos do mar, o perigo vinha também dos mongóis que estavam em expansão. Para se perceber também o quanto frágil estava este pequeno Estado da Índia D. Pedro II escreve ao vice-rei a pedir que as naus façam escala em Baía, Brasil para que estas possam ser enquadradas numa frota, modo a que se rentabilizasse o melhor possível, e assim “[…] Os navios da Carreira da Índia escalavam a Baía e o comércio do tabaco brasileiro, em alta no último quartel de Seiscentos e exportado também para a Índia, contribui para as receitas da Coroa, apesar de não compensar a queda global da Rota do Cabo. […]”22. As decisões políticas de apostar na neutralidade permitiram que o império se restruturasse, talvez a paz a todo o custo não tenha sido uma oportunidade para que o império se reorganize e tomasse políticas de busca de alternativa fase à situação como ela estava, e essas como já vimos foram de facto a aposta no Brasil, a abstinência de confrontos directos fez com que o “[…] «orçamento» do Estado da Índia de 1680 mostrava já um saldo positivo de 27 1164 xerafins e, em 1681, António Paes de Sande legou ao seu sucessor mais de 202 000 xerafins, 12 navios de alto bordo, 20 navios de remos e um terço com salários pagos. […]”23. Estamos obviamente longe do século XX onde se começou a esquematizar ciclos de crise, mas talvez não seja de todo errado reflectir se aqui não estamos na presença de ciclos e onde apenas os que tem mais capacidades continuam no mercado, talvez Portugal tenha adormecido um pouco pois durante muito tempo era o único player a operar no Oceano Índico e vemos que quer a Inglaterra e a Holanda se desenvolvem bastante pois encontram-se em competição directa, procurando de toda a forma superarem-se e à Inglaterra era útil ter do seu lado Portugal pois seria uma ajuda na luta/disputa no mar. Portugal teve que essencialmente reestruturar o seu pensamento em relação à expansão, no sentido de que, deveria ponderar aquilo que tinha ao seu dispor, recursos financeiro e humanos e aí perceber onde podiam competir se é que poderia competir junto dos grandes é isto que se procura tirar conclusões quando se inseriu a questão dos ciclos, Portugal apostou como se viu num território onde não existiam muitos players e onde o lucro e o custo eram mais favoráveis, devido não só à maior proximidade do Brasil, mas também porque agora surgiam produtos ais interessantes para o mercado europeu que provinham justamente da América do Sul. Em suma os diplomatas do Rei D. João IV e também do rei D. Afonso VI (embora sob regência do seu irmão e seu sucessor enquanto D.Pedro II que desde 1668 era regente) vão se preocupar sobretudo de apoios primeiro contra a Espanha, ficando para traz as questões relacionadas com as posses ultramarinas, todavia, “[…] o Brasil era a fonte de riqueza que alimentava as finanças da Coroa, possibilitando a organização do exército que defendia o reino e a construção de novas estruturas defensivas na linha da fronteira, mas era simultaneamente uma das frentes do diferendo luso-holandês. Por tudo isto, D. João IV não organizou uma expedição para recuperar as capitanias brasileiras perdidas para a WIC. […]”24, o objectivo principal era o de primeiro conseguir garantir a independência em relação a Espanha e começa-se a procurar junto de outros países europeus isso 21

Vide, idem, ibidem, p. 209. Vide, idem, ibidem, p. 213. 23 Vide, idem, ibidem, p. 212. 24 Vide, idem, ibidem, p. 191. 22

8

mesmo, restaurando assim também a aliança com a Inglaterra. Falou-se igualmente do preço muito elevado que Portugal teria de pagar para ver restituído parte do seu império ultramarino todavia em 1648, nas negociações com a Holanda chegou a admitir-se a possibilidade de Portugal reconhecer o domínio neerlandês sobre a região de Pernambuco; […] No entanto, os luso-brasileiros encarregaramse de forjar a sua própria História. […]”25, existia portanto um claro desagrado por quem se encontrava no norte do Brasil em relação à ocupação holandesa. Se tal não tivesse acontecido possivelmente seria mais um território perdido. Vimos e analisamos a conjuntura internacional em que o Reino de Portugal se enquadra e fomos lançando algumas medidas que poderiam ser aplicadas, assim como analisamos as medidas e tratados aplicados classificando essencialmente como benéficas ou prejudiciais, embora que quase todas as medidas tomadas com a Holanda foram prejudiciais, mas como vimos estas medidas podemos classifica-las como males menores no sentido da agenda que estava a ser aplicada e também os recursos existentes para actuar. Passemos agora então para a análise da carta do Padre António Vieira, assim como as propostas dele.

25

Vide, idem, ibidem, p. 191.

9

Análise da carta a D. João IV No capítulo acima vimos em que quadro se encontrava Portugal, era necessário fazer esta análise da política e diplomacia, para percebermos como é que Portugal se pode movimentar, sem comprometer a agenda europeia e internacional. Esta carta é escrita três anos depois da Restauração, nesta carta em análise vamos analisar sobretudo as propostas de Padre António Vieira, assim como o seu impacto na economia e na sociedade. Talvez fosse bom começarmos por ver o que os reis portugueses anteriormente fizeram, D. Manuel, D. João III e D. Sebastião em especial com os judeus e os cristãos-novos que é sobretudo a medida que Padre António Vieira fala e desenrola o seu discurso, tendo sempre por base a “captação” do investimento de portugueses que se encontram a servir casa reais estrangeiras. “[…] O senhor rei D. Manoel os admitiu neste reino, e lhes prometeu os favores que se contêm nas palavras seguintes, que são de uma sua provisão real: - E lhes prometemos, e nos apraz que daqui em diante não faremos nenhuma ordenança, nem diferença como de gente distinta e apartada, mas assim nos apraz que em tudo sejam bavidos como próprios cristãos velhos, sem serem distintos e apartados em coisa alguma. […]”26, vemos então que a política deste rei é da inclusão pois a partir do momento em que se converteram ao cristianismo não podem nem devem ser vistos como cristãos de segundo. “[…] Isto mesmo confirmou depois o senhor rei D. João III, o qual favoreceu muito aos homens de nação, e se serviu deles em postos de grande confiança, e é certo que estes dois reis foram os mais felizes de Portugal, e seus anos os mais prósperos e gloriosos, assim espiritual, como temporalmente, pelo muito que dilataram a fé, e enriqueceram o reino.[…]”27 D. João III segue muito a linha de pensamento do seu antecessor, todavia é de relevar que o rei quando sobe ao trono passado pouco tempo envia cartas aos dignatários a informá-los de que não há dinheiro e por isso é que nós vemos a existência de um recuo nas praças do Norte de África, onde se perdem muitas praças porque não há capacidade de as manter e num confronto militar a guarnição portuguesa seria massacrada. Chegamos a D. Sebastião e o caso já muda de figura pois “[…] revogou a lei ou contracto que os reis seus antepassados tinham feito com a gente da nação, a qual revogação por grandes fundamentos de direito julgaram muitos ser nula, e dos sucessos de Portugal no tempo do seu reinado são boas testemunhas as lágrimas de setenta anos, que a fez aclamação de vossa majestade nos enxugou. […]”28, neste último excerto temos uma clara alusão ao neo-sebastianismo, em que D. João IV aparece como um potencial salvador da pátria pois, já enxugou as lágrimas de setenta anos. Muitos dos problemas relacionados com pouco dinheiro, ou homens do dinheiro presentes em Portugal pende-se justamente com a questão religiosa, tal como aconteceu em 1492 com a Espanha em que expulsou muito judeus, muitos deles vieram para Portugal, mas D. Manuel pede que seja instalada a Inquisição em Portugal mas essa chega depois da sua morte, entra em função no reinado de D. João III em 1536, antes D. Manuel tinha pedido em 1515, pois ia casar-se com D. Maria de Aragão pelo que teve de pedir a Inquisição, Padre António Vieira parece não concordar muito com os mecanismos da 26

Vide, VIEIRA, op. Cit, p. 303. Vide, idem, ibidem, p. 303. 28 Vide, idem, ibidem, p. 303. 27

10

Inquisição diz apenas que: “[…] toda esta nação se há de converter, e conhecer a Cristo, as nossas profecias contam esta fidelidade entre os prodigiosos efeitos do milagroso reinado de vossa majestade; porque dizem que ao rei encoberto virão ajudar os filhos de Jacó, e que por meio deste socorro tornarão ao conhecimento da verdade de Cristo, a quem reconhecerão e adorarão por Deus. […]” 29, vemos aqui novamente referência ao encoberto. Agora que vimos como foram em parte os reinados anteriores, vamos analisar como se deve pôr as fazendas de Portugal num bom nível para sobretudo, conservar a monarquia portuguesa, não procurando anacronismos este texto de 1643 do Padre António Vieira, é muito actual, não só no panorama mundial como também no nacional, pois hoje fala-se em todos os países em conseguir captar capital estrangeiro mas também de recuperar os nacionais que foram para o estrangeiro e que por isso estão a servir os países alheios a se desenvolverem em prejuízo dos seus países natais. O imperador da língua portuguesa mostra-nos de que a conservação de Portugal se está a fazer sob dois caminhos são elas “[…] as forças interiores do reino, ou as exteriores das conquistas; e nenhuma por si, nem ambas juntas são bastantes ao conservar naturalmente […] tudo isto se reduz a dinheiros […]”30, uma força mais fácil para se conseguir dinheiro é aumentar os impostos, mas percebemos através desta mesma carta que os portugueses fizeram bastantes sacrifícios em prol da causa nacional: “[…] nunca o reino poderá socorrer a vossa majestade com maiores somas, do que houve estes anos; porque além dos direitos das décimas e mais tributos, acresceram donativos, confiscações, e cunho das moedas, e outros aumentos da fazenda, que se não podem esperar cada ano. […]” 31, encaixar estas porções é benéfico, todavia, só acrescentar lucros não basta, António Vieira desafia o rei enquanto pai da pátria que reduza os seus gastos da corte,32 aqui está bem patente também a questão da teoria política da época, em que o rei ou príncipe deve ser amado e que é dessa forma que deve reinar, procurando assim o apreço pelo povo. Começamos logo a seguir a ter informação de como está o país, tal como as fronteiras estão fracamente protegidas, e o próprio Tejo. E uma ressalva é feita “[…] pouca oposição que hoje nos faz o inimigo nos consome de todo o cabedal, e ainda são necessários empréstimos e empenhos; que será se Castela meter em Portugal todo o seu poder? […] Estas razões senhor são evidentes, e ainda é maior a força delas, considerando-se que o dinheiro com que o reino serve e assiste a vossa majestade, não só não pode crescer mais, procedendo dos mesmos efeitos, mas cada vez será muito menos. Porque as confiscações e cunho de moeda, foram acidentes, que se não podem repetir […]” 33, aqui fica bem patente a ideia de que o cenário é preciso mudar e que esta situação não é sustentável pois Portugal não tem segurança nenhuma nas suas fronteiras e de facto goza de muita sorte em Espanha não estar a entrar em Portugal, porque tem pelo menos mais duas frentes de batalha muito próximas de si, que são a Catalunha e a França, se esta situação tivesse cambiado, Portugal levaria com as armas espanholas em peso e não teria qualquer poder de reacção e defesa. Obviamente que isto tem repercussões na componente económica bem como a sociedade, ora se as fronteiras não se encontram protegidas não é possível as pessoas terem estímulo a cultivar, porque lá se encontram os inimigos, a população vai 29

Vide, idem, ibidem, p. 302. Vide, idem, ibidem, p. 286. 31 Vide, idem, ibidem, p. 286. 32 Vide, idem, ibidem, p. 287. 33 Vide, idem, ibidem, p. 287. 30

11

decrescer pois a maioria dela é canalizada para a guerra o que faz com que “[…] em poucos anos não poderão os homens manter as vidas, quanto mais pagar os tributos, e sustentar as despesas da guerra. […]”34. Vamos ver agora tendo por base as várias ideias em relação às pessoas, pois quer se queira quer não, e isto já depende da óptica que cada um tenha, um país sem população não consegue existir e por isso Bodin tem razão ao dizer que não há maior riqueza e força que a dos homens, já Maquiavel não é um teórico da economia ou da demografia, mas ele diz que uma população numerosa dá muito poder ao príncipe, e tal é verdade, pois terá homens para o exército, bem como pessoas que produzam para o reino, mas também acima de tudo são contribuintes, pagam impostos. Todavia quando se chega a um estado em que já não é possível conter as pessoas no reino temos que nos socorrer por assim dizer, das ideias de Botero que diz que quando se rompe a proporção entre recursos alimentares e número de habitantes estes devem sair do país e estamos então na presença do fenómeno da colonização, algo que já acontece há muito tempo e que justifica por exemplo a expansão dos gregos na antiguidade para aquilo que será a Magna Grécia, pois derivado a vários acontecimentos as terras começaram a concentrar-se nas mãos de poucos. Retomando Bodin o mesmo diz que uma população que é numerosa permite a valorização de um país e da sua terra e assim não haverá fome. Em suma “[…] Este é o pouco cabedal com que se acha Portugal no estado presente da paz, o qual no tempo da guerra será menor; porque com as entradas do inimigo se impedem as lavouras, se suspendem os comércios, cessam as artes, cresce a gente nos lugres, seguem-se fomes, carestas e outras consequências naturais das guerras, com que serão muito difíceis, e quase impossíveis de pagar os impostos. […]”35 Agora que tivemos a leitura do estado do reino no continente europeu vejamos como está no ultramar “[…] As conquistas […] estão reduzidas a tal estado, que nada melhoram esta esperança. De três anos a esta parte tem vossa majestade mandado à Índia uma nau de guerra, e nove galeões, e em retorno de todo este cabedal, temos visto três caravelas, servindo-se aquela conquista, pela gente, navios e dinheiro, que nos leva, de muito estorvo, e maior gasto que proveito.[…]” 36, temos aqui outra opinião da pouca rentabilidade da Índia, desde que Portugal deixou de ser o único player os resultados decresceram e muito, tornava-se mais uma questão de orgulho pessoal que uma vantagem para a economia do reino. E sobretudo o jesuíta sabe quase como se vai desenrolar lá o futuro do Estado da Índia, “[…] a pouca fé, e falsa amizade com que debaixo do nome da paz, nos querem fazer na Índia a mesma guerra, que em Pernambuco, Angola, Maranhão e S. Tomé, entretendo-nos com fingidas promessas e embaixadas, para mais nos divertirem e segurarem as suas conquistas. […]” 37, já no outro capítulo tínhamos de facto estudado e analisado estas diplomacias com os Holandeses, sendo o caso mais gritante aquele que envolve Cochim e os Estados Gerais das Províncias Unidas. Se até agora temos estado a fazer uma exposição sobre o estado do reino e do seu consequente império, está na altura de começarmos a analisar as propostas de solução que o jesuíta tem para nos oferecer, começa na resolução do império. 34

Vide, idem, ibidem, p. 288. Vide, idem, ibidem, p. 289. 36 Vide, idem, ibidem, p. 288. 37 Vide, idem, ibidem, p. 288. 35

12

“[…] O Brasil (que é só o que sustenta o comércio e alfândegas, e o que chama aos nossos portos esses poucos navios estrangeiros que neles vemos) com a desunião do rio da Prata, não tem dinheiro, e com a falta de Angola, cedo não terá açúcar; […] porque a falta de negros de Angola, não se pode suprir com escravos de outras partes, por serem incapazes de aturar o trabalho dos canaviais e engenhos, como a experiência mostra largamente. […]”38, acontece que todo o império português estava ligado e funcionava muito como um relógio em que cada nau quando chegava a um porto acionava uma roda deste império e ela girava. Padre António Vieira, homem da igreja não tem medo daquilo que a seguir irá dizer, ele diz que em caso de extrema gravidade que o rei “[…] obrigue a tirar a prata das igrejas […]” 39, dizendo que isto dará para dois anos de guerra, o jesuíta diz que a força de uma monarquia se mede pelo seu número de vitórias que consegue obter, Portugal de resto está a passar por um período em que no plano mundial poucos apoios está a receber e pouca importância está a ter, tamanha é a fraqueza deste reino, nem “[…] o papa não recebendo o nosso embaixador; Dinamarca não admitindo a confederação; Rússia não continuando o comércio; Holanda não guardando amizade; França, que é mais obrigada, não nos mandando embaixador assistente. […]”40, Portugal bem procura os apoios europeus mas não os consegue pois não obtém resposta pois os embaixadores são enviados mas poucos são os príncipes que acreditam na conservação desta monarquia e por isso pouco ou nada negoceiam. Portugal vai ter que se preocupar com o seu reino e fazer-se resistir no ultramar. Mas se os príncipes não acreditam também “[…] os mercadores estrangeiros receiam meter as suas fazendas nos portos de Portugal, e os mercadores portugueses passam seus cabedais a outas partes, porque, assim uns como outros, não dão por seguras as suas fazendas neste reino. […]” 41, basicamente o que esta frase ultima é que Portugal não dá credibilidade aos reinos e comerciantes estrangeiros e que portanto se não conseguir chamar o investimento para os portos portugueses para assim conseguir pôr a economia a girar. A grande solução que o jesuíta quer apresentar é justamente a seguinte: “[…] Por todos os reinos e províncias da Europa está espalhado grande número de mercadores portugueses, homens de grandíssimos cabedais, que trazem em suas mãos a maior parte do comércio e riquezas do mundo. Todos eles pelo amor que têm a Portugal, como pátria sua, e a vossa majestade, como seu rei natural, estão desejosos de poderem tornar para o seu reino, e servirem a vossa majestade com suas fazendas, como fazem aos reis estranhos. […]”42. Mas o que importa aqui analisar é o porquê de estes comerciantes terem saído. É sabido que a maioria destes comerciantes é de origem judia, porque aos cristãos fazerem comércio e no fim ao cabo enriquecerem à custa do gasto do dinheiro dos outros é algo muito mal visto e criticado, e portanto são judeus a maioria destes homens de negócios, muitos deles vieram para Portugal para fugirem à Inquisição espanhola, todavia os que para aqui vêm terão de voltar a sair quando se instala a Inquisição em Portugal, e o grande sucesso da Holanda vai ser justamente pela questão religiosa, aceitam todos quanto queiram viver na Holanda, podendo professar a sua fé desde que esta nada interfira nas fés 38

Vide, idem, ibidem, p. 289. Vide, idem, ibidem, p. 289. 40 Vide, idem, ibidem, p. 290. 41 Vide, idem, ibidem, p. 290. 42 Vide, idem, ibidem, p. 291. 39

13

alheias, ora aqui está uma medida que beneficia e em muito a economia, isto mostra como a monarquia abstendo-se de se intrometer ou fiscalizar a economia ela pode ter melhores resultados pois assim a economia tem uma dinâmica própria e desenvolve-se e tem grande poder de atração e é isso que falta a Portugal ter a capacidade de acolher todos e deixá-los gerirem-se a eles mesmos. No que toca a economia se quisermos que ela se desenvolva tem de se reduzir os embargos que são colocados. “[…] Se vossa majestade for servido de os favorecer e camar será Lisboa o maior império de riquezas e crescerá brevissimamente todo o reino a grandíssima opulência, e se seguirão infinitas comodidades a Portugal, juntas com a primeira e principal de todas, que é a sua conservação. […]” 43. É preciso não esquecer que estamos presente um momento de grande desenvoltura do capitalismo comercial, em que o simples facto de fazer circular o dinheiro é uma forma de riqueza, muitos destes mercadores estão associados às companhias comerciais marítimas como a VOC por exemplo, ora esta estratégia que é uma estratégia económica de engrandecimento e conservação de Portugal, mas que vai levar por inerência a que as outras monarquias onde estes mercadores portugueses e os outros que virão através do efeito da atracção, se vão esvaziando pois perdem os alicerces onde estão assentes e por isso perdem poder, pois muitos destes mercadores estão a sustentar a Espanha ao comerciarem em Madrid e Sevilha, sustentando os exércitos desses países portanto. “[…] Os holandeses da mesma maneira ficarão muito diminutos no poder de suas companhias, com que nos têm tomado quase toda a Índia, África e Brasil; porque ainda que os mercadores portugueses não sejam as pessoa imediatas das bolsas; entram nas mesmas companhias com grandes somas de dinheiro, que, divertidas de Portugal, não só lhe fazem grande falta, mas também grande guerra. E não só virão para este reino os moradores que agora são de Holanda e Castela, mas os de França, Itália, Alemanha, Veneza, Índias Ocidentais e outros muitos, com que o reino se fará poderosíssimo […]”44. E mais uma vez Padre António Vieira volta a salientar a necessidade de alimentar a população e que esta se reproduza, pois as sociedades apenas se reproduzem quando tal é possível no ponto de vista económico, nesta sua frase o jesuíta parece Nicolau Maquiavel a falar: “[…] Crescerá a gente, que é uma parte do poder, e estará o reino provido e abundante. […]”45. Aquilo que o rei restaurador deve procurar fazer é tão simplesmente fazer as pazes com os cristãonovos “[…] que por julgarem pouco provável a conservação de Portugal, ainda têm animo em Castela; e é certo, que quanto o reino crescer em poder, tanto mais firmes raízes lançará a fidelidade dos mais zelosos portugueses. […]” 46, conseguindo mais dinheiro terá reconhecimento e conseguirá submeter muitos capitães que são “[…] mais fáceis de render pelos interesses, que pelas armas, e só desta maneira se pode restituir a Índia, Angola e Brasil.[…]”47. Aqui está claramente espelhada a ideia de Deyon, que defende que o mercado era sinónimo de poder, pois os lucros e o comércio faziam recolher benefícios, o que significa uma vantagem de poder e assim o comércio é símbolo de poder. O facto de com esse dinheiro se usar para se criar no fundo de crise, para desta forma não ter de oprimir financeiramente o reino. “[…] Por falta de comércio se reduziu a grandeza e opulência de Portugal ao miserável estado em que vossa majestade o achou […] E se o castelhano para reduzir 43

Vide, idem, ibidem, p. 292. Vide, idem, ibidem, p. 292. 45 Vide, idem, ibidem, p. 292. 46 Vide, idem, ibidem, p. 293. 47 Vide, idem, ibidem, p. 293. 44

14

Portugal a província, […] tomou por arbítrio, retirar-lhe os mercadores e chamar as praças de Castela os homens de negócio; chame-os vossa majestade[…]”48 e agora Padre António Vieira apresenta a causa da saída destes mercadores, tal como já foi enunciado acima que é justamente a questão a religião e para voltar a trazê-los para o reino o rei deve “[…] dar a sua real palavra de procurar admitir o perdão que eles alcançaram do passado, e para o futuro a moderação do rigor que sua santidade julgar ser mais conveniente […] cuide que nesta permissão se encontra a pureza de nossa santa fé, e que na aparência, posto que não no efeito, ficará parecendo o reino de Portugal menos católico, admitindo uns homens, que, ou publicamente foram condenados, ou que por fugirem do reino se fizeram suspeitosos de heresia; […] admiti-los neste reino, na forma que se propõe, não é contra lei alguma, divina nem humana. […]”49, parece que os fins justificam os meios, mas o que se trata de facto é que o grau de rigor estava demasiado apertado o que levou à fuga de capitais, que foram muito bem vindos a outros países. E dá o caso prático do reino de França em que levando a doutrina demasiada apertada levou a que este reino quase fosse destruído. 50 O jesuíta continua a justificar que não existe mal nenhum em o rei acolher os cristãos-novos, chegando a dar exemplo bíblicos em que duas fações opostas se unem por uma causa, chegando ao ponto máximo de que o vigário de Cristo na terra permite que existam sinagogas públicas, onde professam o seu culto.51 Parece uma pergunta muito banal e genuína esta que o jesuíta vai fazer mas tem toda a razão de ser: “[…] Se o dinheiro dos homens de nação está sustentando as armas dos hereges, para que semeiem e estendam as seitas de Lutero e Calvino pelo mundo, não é maior serviço de Deus e da igreja que sirva este mesmo dinheiro às armas de rei mais católico, para propagar e dilatar pelo mundo a lei e a fé de Cristo?[…]”52 Perceba-se que esta pergunta também é feita numa conjuntura de guerra religiosa na Europa. Em suma o que se depreende desta carta do Padre António Vieira é que o rei deve ter a capacidade de fazer atrair os comerciantes que estão em outros países e que esses são concorrentes de Portugal e esses mesmos não fazem comércio com Portugal porque Portugal está numa forma duvidosa de conseguir manter-se face a Espanha e por isso não existe retorno dos embaixadores, nem o comércio está tão dinâmico como esteve em tempos, e por isso conclui-se que o futuro de Portugal está na sua capacidade bélica, se conseguir ganhar a guerra da Restauração e a guerra que está a fazer com a Holanda terá que conseguir arrecadar grandes somas de dinheiro para que possa pôr a economia a funcionar, pôr as pessoas a trabalharem as terras mesmo na fronteira, pois essas já deverão de estar protegidas, estão a população a sentir-se segura num clima de paz e de capacidade de as armas portuguesas serem capazes de conter as alheias irão conseguir desenvolver-se e reproduzir-se e assim garantir aquilo que vimos ser uma das grandes riquezas do país a: população. É uma carta rica no detalhe, nada escapa a este visionário e crítico português em que diz de que forma se deve agir para conseguir atingir o fim, que é re-colocar novamente Portugal no mapa europeu e voltar a fazer com que o império português funcione bem tal como um relógio em que cada roda faz girar a que se encontra ao lado.

48

Vide, idem, ibidem, pp. 294-295. Vide, idem, ibidem, p. 295. 50 Vide, idem, ibidem, p. 297. 51 Vide, idem, ibidem, p. 298. 52 Vide, idem, ibidem, p. 301. 49

15

Conclusão Deste trabalho podemos concluir que Portugal através de muitos esforços e sobretudo de cedências conseguiu garantir a sua solidez enquanto monarquia europeia e que no campo da exploração do mundo através de muitos cordos conseguiu suavizar por assim dizer os danos que foram causados ainda aquando do período da União Ibérica, entre esses danos aligeirados foi a restituição total do Brasil, embora que não se deva descartar nem esquecer que os locais do Pernambuco também ajudaram e muito, podemos dizer que em parte o império se restaurou a ele próprio. No que diz respeito à carta analisada, ela foi analisada sempre na óptica das componentes da sociedade e da economia, onde se conclui que nesta altura o capitalismo comercial é a doutrina que faz o globo girar, e só vai perder vento na popa quando se der a revolução industrial, onde vai aparecer o capitalismo industrial. Viu-se sobretudo como a religião tem um peso enorme na política toda ela qual seja, pois pela religião estava a existir uma guerra europeia, tomaram medidas extremas como a Inquisição que quer se queira, quer não vai atrofiar para os países essencialmente do sul cuja tradição religiosa se compreende que seja maior devido à Reconquista, e nesses reinos de facto condicionou-se muito o comércio havendo em certos períodos a eliminação e expulsão dos mercadores de ascendência judia, tal vai ser aproveitado por exemplo pela Holanda onde a liberdade religiosa impera e regula tudo.

16

Bibliografia

COSTA, João Paulo Oliveira e, História da expansão e do Império Português, 1ª edição, Esfera dos livros, Lisboa, 2014. MONTEIRO, Nuno Gonçalo, História de Portugal, coord. Rui Ramos, 4ª edição, Esfera dos livros, Lisboa, 2010. VIEIRA, Padre António, Escritos históricos e políticos, 1ª edição, Livrarias Martins Fontes, São Paulo, 1995.

17

ANEXOS

Territórios do Império Português (verde); Territórios da República das Sete Províncias Unidas (laranja); As zonas disputadas entre 1588 - 1654 surgem a tracejado; (mapa da Wikipédia)

18

Lihat lebih banyak...

Comentários

Copyright © 2017 DADOSPDF Inc.