AS RUAS E AS NOTÍCIAS – ANALISANDO A COBERTURA JORNALÍSTICA DO TWITTER DO CORREIO24HORAS DURANTE AS MANIFESTAÇÕES DE JUNHO DE 2013 EM SALVADOR

October 6, 2017 | Autor: Preta Oster | Categoria: Twitter, Jornalismo Online, Webjornalismo, Ciberativismo, Correio*, CORREIO24HORAS
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UNIÃO METROPOLITANA DE ENSINO BACHARELADO EM COMUNICAÇÃO SOCIAL/JORNALISMO WÉVELA DE PAULA MENDES

AS RUAS E AS NOTÍCIAS – ANALISANDO A COBERTURA JORNALÍSTICA DO TWITTER DO CORREIO24HORAS DURANTE AS MANIFESTAÇÕES DE JUNHO DE 2013 EM SALVADOR

Salvador, 2014

WÉVELA DE PAULA MENDES

AS RUAS E AS NOTÍCIAS – ANALISANDO A COBERTURA JORNALÍSTICA DO TWITTER DO CORREIO24HORAS DURANTE AS MANIFESTAÇÕES DE JUNHO DE 2013 EM SALVADOR

Monografia submetida ao curso de graduação em Comunicação Social/Jornalismo, da União Metropolitana de Ensino – UNIME, como requisito para obtenção do título de Bacharel em Comunicação Social/Jornalismo. Orientador Prof. Laércio Torres de Góes

Salvador, 2014

WÉVELA DE PAULA MENDES

A RUA FAZ NOTÍCIA – ANALISANDO A COBERTURA JORNALÍSTICA DO TWITTER DO CORREIO24HORAS DURANTE AS MANIFESTAÇÕES DE JUNHO DE 2013 EM SALVADOR

Este Trabalho de Conclusão de Curso foi julgado adequado e aprovado em sua forma final pelos seguintes professores, no dia dezessete de dezembro de 2014.

BANCA AVALIADORA

______________________________ Prof. Laércio Torres de Góes Mestre em Comunicação e Cultura Contemporânea pela Universidade Federal da Bahia

______________________________ Prof. Frederico Burgos Doutor em Administração pela Universidade Federal da Bahia

______________________________ Prof. José Carlos Peixoto Mestre em História Social pela Universidade Federal da Bahia

AGRADECIMENTO

Agradeço aos meus mentores espirituais, Aos orientadores Arla Coqueiro e Laércio Góes por acreditarem no projeto, Aos professores do curso de Jornalismo que me incentivaram, E aos amigos próximo que doaram suas forças para que eu conseguisse finalizar este trabalho. Taian, Yuri, Helber, Igor, essa é para vocês!

Sumário 1. INTRODUÇÃO ........................................................................................................................................ 4 2. INTERNET E ATIVISMO SOCIAL........................................................................................................ 7 2.1 Internet .............................................................................................................................. 7 2.2 O Twitter.......................................................................................................................... 12 2.3 Ciberativismo .................................................................................................................. 14 2.3.1 Primavera Árabe ......................................................................................................... 15 2.3.2 Occupy Wall Street ...................................................................................................... 16 2.3.3 Black Bloc .................................................................................................................... 16 2.3.4 Ciberativismo no Brasil ................................................................................................. 17 2.3.5 Mídia Ninja ................................................................................................................... 18 3. A CIDADE NAS RUAS ......................................................................................................................... 19 3.1 Movimento Passe Livre ................................................................................................... 19 3.2 Salvador na Voz do Povo – Junho de 2013 .................................................................... 20 3.2.1 Quem Protesta? ........................................................................................................... 21 3.2.3 O que as ruas relatam? ................................................................................................ 23 4 AS COBERTURAS DAS MANIFESTAÇÕES PELOS VEÍCULOS ................................................ 24 4.1 O Correio* ....................................................................................................................... 24 4.2 O que o Correio* publicou? ............................................................................................. 25 4.3.1 O que o Correio24horas twittou? .................................................................................. 26 4.3.2 Análise das postagens: ............................................................................................... 30 5. EMBASAMENTO TEÓRICO ............................................................................................................... 32 5.1 Teoria do Agendamento .................................................................................................................... 32 5.3 Teoria Ator-Rede e os Atores Não-Humanos ................................................................................ 33 6.0 CONSIDERAÇÕES FINAIS .............................................................................................................. 35 7.0 REFERÊNCIAS................................................................................................................................... 37 ANEXOS ..................................................................................................................................................... 39

A RUA FAZ NOTÍCIA – ANALISANDO A COBERTURA JORNALÍSTICA DO TWITTER DO CORREIO24HORAS DURANTE AS MANIFESTAÇÕES DE JUNHO DE 2013 EM SALVADOR MENDES, W. P1.; GÓES, L.T.²

RESUMO

Diante do rumo que a história política e social e a comunicação brasileiras vêm tomando desde o início dos anos 2000, é observável por muitos estudiosos a presença das mídias sociais como formas de interação entre o leitor/telespectador e as redações. Esse fenômeno ficou mais evidente durante as manifestações nas mais de 200 cidades brasileiras durante os meses de maio a outubro de 2013. As Manifestações de Junho foram em sua maioria organizadas utilizando a Internet. Em Salvador, aconteceram protestos no mês de junho, contidos pela Polícia Militar e Força Nacional, e desde então a capital baiana não teve mobilizações tão fortes como naquela Copa das Confederações. O presente trabalho se propõe a analisar os posts via Twitter do Correio* através de perfil oficial do veículo, no período de 20 a 23 de junho de 2013, época das manifestações mais relevantes. Palavras-chaves: Ciberativismo, Twitter, manifestações de junho, correio24horas.

Graduanda em Comunicação Social/Jornalismo – UNIME. E-mail: [email protected] ² Mestre em Cultura Contemporânea pela UFBA, professor de Jornalismo da UNIME. 1

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1. INTRODUÇÃO “Você tem fome de quê?” – poderia ser um refrão cantado pelos Titãs em um de seus shows. Mas era um dos inúmeros cartazes presentes na concentração de uma manifestação na Praça do Campo Grande, região central de Salvador, no sol de uma tarde de junho de 2013. Em outras manifestações realizadas à época por todo o Brasil, a linguagem dos cartazes levados pelos cidadãos impressionou pela criatividade, e também pelas citações de músicas e poemas. Era a voz das ruas dizendo o que eles pretendiam com toda a movimentação. Cidadãos em massa exigindo diversos direitos, e usando sua linguagem para expressar isso. Em contrapartida, conhecidos veículos de comunicação de vários segmentos retrataram as manifestações das mais diversas formas, em sua maioria induzindo os consumidores da notícia a pensar que os manifestantes eram uma ameaça a sociedade. As manifestações ocorridas no Brasil durante o ano de 2013 tiveram - para além do viés político – uma gana de justiça engasgada na voz de toda uma população há décadas. As tarifas para o transporte público foram o estopim de muitas delas. Escândalos políticos e a desigualdade social e cultural há muito amargada pela maior parcela da população brasileira alimentaram um gigante que foi às ruas pedir - cada um a seu modo – pelos direitos. Direitos estes em sua maioria assegurados pela Carta Magna – a Constituição Federal de 1988 e não cumpridos pelo Poder Público. Entretanto, vale salientar que não foram apenas as indignações com o governo brasileiro que levaram pessoas às ruas naquele mês de junho. A presença das mídias sociais foi de grande valia para a propagação de um movimento que surgiu no Sudeste do país e se espalhou de forma estrondosa em pouco tempo. O ciberativismo, contudo, está presente na história brasileira há mais tempo, de forma organizada propondo ideias e adequações na legislação que atendam as necessidades das gerações atuais.

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Em São Paulo, Goiânia, e outras capitais brasileiras as manifestações tiveram retornos, como a redução das tarifas de ônibus.2 Em Salvador, porém, as manifestações – ainda que organizadas de uma forma diversa – não lograram êxito real para a população baiana. Cidadãos foram às ruas, e exerceram seus direitos de manifestar pelo que achavam justo, porém diversos fatores contribuíram para que as manifestações enfraquecessem e acabassem por não mais ocorrer. A mídia, neste contexto, apresenta-se como um dos principais fatores de enfraquecimento dos movimentos. O presente trabalho propõe-se a analisar linguagem e técnica de cobertura adotada pelo perfil no Twitter3 do Correio24horas, para entender o papel de um dos maiores veículos jornalísticos da Bahia para a descaracterização de um movimento legítimo. A análise de um veículo de comunicação é importante para que se desenvolvam linhas de pensamento sobre as notícias que vão ao ar, e a partir disso, compreenda-se o processo social ao qual a comunidade que consome esta notícia se encontra. Para uma melhor compreensão do trabalho proposto, faz-se necessário uma contextualização da internet e do papel dela para a cobertura jornalística, além dos significados de ciberativismo e de como o ativismo na internet está inserindo-se nos contextos sociais e jornalísticos no Nordeste e principalmente em Salvador. As redes sociais, neste cenário, apresentam-se como principal meio utilizado para divulgar, informar e aglutinar pessoas. Importante também que se faça a contextualização das manifestações no Brasil no ano de 2013, observando-se o papel das manifestações do povo baiano no contexto nacional. Em um segundo momento é interessante que se fale sobre o veículo e sua posição no mercado atual, para que se faça entender a postura que o mesmo adota em suas postagens e coberturas.

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http://g1.globo.com/goias/noticia/2013/06/liminar-cancela-reajuste-da-tarifa-de-onibus-em-goiania.html Rede social de postagens curtas.

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A ausência de pesquisas voltadas para o problema da comunicação na Internet na Bahia e principalmente, para a linguagem adotada por veículos de comunicação nas redes sociais baianas é uma das motivações para a presente análise. Através deste trabalho propõe-se uma análise da cobertura dos tweets do Correio24Horas nas manifestações de Junho de 2013 em Salvador, utilizando como parâmetros: a data em que os protestos aconteceram (entre 20 e 23 de junho), o veículo determinado (Correio24horas, através de sua página no Twitter), o alcance da informação (medido através dos retweets4 – réplicas de cada informação), e da linguagem escolhida pelo veículo para comunicar-se.

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Função do Twitter que permite a réplica de uma postagem citando o autor.

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2. INTERNET E ATIVISMO SOCIAL 2.1 Internet

Idealizada para fins militares, a primeira transmissão de dados online, que se tornaria a internet, aconteceu em 1969. Durante a Guerra Fria, muitos dados precisavam ser enviados em curto espaço de tempo e a longas distâncias - a ARPANET (Advanced Research Projects Agency Network) era uma rede de dados da ARPA (Agência de Projetos de Pesquisa Avançada dos Estados Unidos). O processo de envio das mensagens era rudimentar, e consistia em um sistema de chaveamento de pacotes (também chamado de comutação). As informações eram divididas em pequenos pacotes e estes eram enviados utilizando diferentes caminhos. Ao chegar no seu destino, os receptores reuniam os pacotes e decodificavam a informação. Em 1973 aconteceu a primeira transmissão dos protocolos TCP (Transmission Control Protocol). No ano seguinte utilizou-se pela primeira vez o termo “internet” para conexões de dados à distância, mas, apenas nove anos depois, em 1984, que a primeira grande rede baseada em protocolos TCP/IP foi ao ar. Dois anos depois, nasceu a National Science Foundation Network, nos EUA, um conjunto de redes universitárias interconectadas em 56 kilobits por segundo (kbps). Foi em 1988, no entanto, que a rede de computadores foi aberta pela primeira vez para interesses comerciais. Serviços de correio eletrônico e provedores que faziam a conexão à rede pelo antigo método dial-up começaram a surgir no final dos anos 80. Na década de 90 aconteceu o boom: a criação do WWW (World Wide Web), um sistema de documentos em hipermídia, em 1992, o servidor de busca Google e outros grandes portais, como AOL – America On Line Yahoo, as salas de bate-papo e os programas de mensagens instantâneas, como mIRC e ICQ, e os servidores de e-mail gratuitos como o Hotmail, contribuíram para a evolução dos protocolos de internet e também para sua disseminação em todo o planeta. A partir dos anos 2000, porém, o desafio da internet era não apenas consolidarse como transmissora de dados, mas estabelecer-se no cotidiano das pessoas. E a

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partir das redes sociais e dos blogs isso acontece. A criação de redes sociais de grande alcance no Brasil como o Orkut e o Facebook foi determinante para a disseminação da internet entre usuários de todo o mundo. Além das redes sociais, os mensageiros instantâneos se tornaram cada vez mais eficientes, e a tecnologia dos smartphones e dispositivos móveis, como tablets e notebooks, foram de grande valia neste processo. As redes sociais promovem conexão entre as pessoas com transferência de dados, como vídeos e fotos, de uma forma mais rápida do que os outros meios de comunicação até então tradicionais - como cartas, telegramas e telefonemas. Os diários escritos são aos poucos deixados de lado e cada vez mais adota-se a ferramenta

“blog”.

Videologs

e

fotologs,

as

versões

com

vídeos

e

fotos,

respectivamente, fazem sucesso entre os mais jovens. Dessa forma, a Web 2.0 que é a segunda geração da World Wide Web, despontou através da proposta de interação entre seus usuários. Segundo Tim O’Really, criador da expressão: Web 2.0 is the network as platform, spanning all connected devices; Web 2.0 applications are those that make the most of the intrinsic advantages livering software as a continually-updated service that gets better the more people use it, consuming and remixing data from multiple sources, including individual users, while providing their own data and services in a form that allows remixing by others, creating network effects through an "architecture of participation," and going beyond the page metaphor of Web 1.0 to deliver rich user experiences. (O’RELLY, 2007, p.17)5

Para ele a Web 2.0 é um conjunto de elementos – interfaces, softwares, redes de dialogo via internet – que propõem e estimulam a comunicação entre seus usuários. Na Web 2.0 a transmissão de dados é feita de uma forma mais rápida que na primeira

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Web 2.0 é a rede como plataforma, abrangendo todos os dispositivos conectados; Aplicações Web 2.0 são aqueles que fazem a maioria das vantagens intrínsecas que entregam software como um serviço continuamente atualizado que fica melhor quanto mais pessoas usam, consumindo e remixando dados de várias fontes, incluindo os utilizadores individuais, ao fornecer seus próprios dados e serviços em um formulário que permite remixar por outros, criando efeitos de rede através de uma "arquitetura de participação", e indo além da metáfora da Web 1.0 para oferecer experiências de usuário

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geração da Web, e mais ainda que os meios de comunicação anteriores a ela, como a mídia impressa. A mudança comportamental da sociedade com relação aos meios de comunicação diz respeito principalmente à necessidade do homem de manter-se informado. Através da história dos meios de comunicação podemos compreender como os veículos de comunicação mais rápidos sobressaem-se em detrimento de seus antecessores, que se tornam obsoletos. Nenhum deles deixou de existir, porém a queda no número de assinaturas de impressos registra uma proporcionalidade ao número crescente de assinantes de versões dos mesmos veículos para a web. O rádio, porém continua sendo um dos principais meios de disseminação de informação, sobretudo em regiões onde ainda não há acesso à internet. No Brasil os portais de notícias ganharam espaço a partir da década de 90, e para, além disso, os veículos de comunicação impressos - como a Folha de São Paulo e O Globo - tem suas versões online no mesmo período. A Folha de São Paulo entrou para a história da comunicação no Brasil como o primeiro portal de notícias atualizado em tempo real em língua portuguesa. Depois surgem a versão brasileira do UOL (Universo On Line), e as versões online de outros periódicos, como a Veja, do Grupo Abril, e a Globo.com, das Organizações Globo. O webjornalismo6 é mais leve, e tem o dever de ser mais ágil do que o impresso. Enquanto nos jornais e revistas há um tempo para escrever, um deadline periódico para entregar as pautas e matérias, na internet sai ganhando o veículo que posta a notícia primeiro. Para Nilson Lage (1985), no entanto: Há, porém, limitações devidas ao número gigantesco de fontes, o que torna difícil a organização num thesaurus operacional e justifica a popularidade dos portais de busca; à dúvida quanto à qualidade e à veracidade da informação de fonte desconhecida; à própria velocidade da evolução dos equipamentos, que se tornam arcaicos ainda em plena condição de uso; e as questões relacionadas com os direitos de autor em um sistema assim plural e devassável. (LAGE, 1979, p.45)

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Jornalismo que inicialmente buscou adaptar o formato de noticia dos impressos para a internet, e hoje possui um modo de noticiar próprio.

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Como observado, a internet e suas ferramentas - redes sociais, principalmente alteram o cotidiano da chamada geração Y, que cresce mais próxima dessa tecnologia. E o jornalismo encaixa-se neste conceito de estar mais próximo da tecnologia, seja no uso de modernas ferramentas de apuração - as câmeras fotográficas, filmadoras, gravadores e recursos tecnológicos para entrevistas - ou na funcionalidade em postagem de notícias online e compartilhamento através das redes sociais. É o advento da Web 3.0. Segundo o sociólogo espanhol Manuel Castells (2004): O que a Internet está fazendo é converter-se no coração articulador dos distintos meios, da multimídia. Em outras palavras, transforma-se no sistema operativo que permite interconectar e canalizar a informação sobre o que acontece, onde acontece, o que podemos ver, o que não podemos ver, e torna-se o sistema conector interativo do conjunto do sistema multimídia. (CASTELLS, 2004, p284)

Os blogs surgem como redes sociais de compartilhamento de dados que lembram diários virtuais, e depois são utilizados por seus usuários para desenvolver um conceito de webjornalismo caracterizado pela postagem de notícias de forma livre em seus perfis, com a reprodução das notícias em páginas individuais na rede, e a possibilidade de intervenção direta e rápida dos interlocutores. No jornalismo impresso, até meados dos anos 90, qualquer comentário do leitor era feito por carta, que demorava dias para chegar ou talvez não chegasse. Na internet, este processo é encurtado, acaba sendo feito em tempo real, e a interação se torna um dos pontos fortes do jornalismo online em detrimento dos impressos. Essa adequação à Web 3.0 também atinge o jornalismo de TV e rádio. Estações de rádio ganham transmissões web que ultrapassam os limites das frequências AM e FM, e os telejornais passam a ser arquivados online - normalmente para assinantes dos portais - de forma a estarem disponíveis para consulta depois que o mesmo vai ao ar. Não nos aprofundaremos sobre este tema no presente estudo. Os blogs, como forma descentralizada de divulgação da informação, vêm fazendo frente ao chamado jornalismo tradicional - da televisão, do rádio e dos jornais impressos. Em uma tentativa de adequação ao novo mercado, os jornais ganham um

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novo formato: os portais de notícias, com espaço direto para a opinião e intervenção dos leitores. A internet discada foi abandonada, principalmente por sua lentidão e indisponibilidade, e os novos formatos de convergência de internet: banda larga - para residências, e 3G e 4G para dispositivos móveis, contribuem para a atualização de dados e geração de conteúdos na internet. A promessa da Web 3.0 se torna cada vez mais factível à medida que a internet deixa se tornar apenas meio de opinião e réplica, para ser a nova sala de pautas do jornalismo moderno. A presença de internet em dispositivos móveis que podem enviar dados de qualquer lugar é um aliado do jornalismo. Inicialmente observado nas editorias de entretenimento - onde as redes sociais de figuras ditas famosas ajudam a gerar notícias - a partir de 2008 nas eleições presidenciais dos Estados Unidos da América observa-se outro aspecto: figuras políticas buscam divulgação através das redes sociais, muitas delas obtendo êxito em suas eleições, a exemplo da campanha presidencial de Barack Obama. A partir deste período e principalmente diante dos acontecimentos posteriores, as redes sociais se tornam mais um lugar em que os jornalistas buscam suas matérias. Uma postagem em blogs ou redes sociais pode se tornar uma pauta. Nesse meio tempo os veículos de comunicação ganham perfis nas redes sociais - sobretudo Facebook e Twitter - onde começam a propagar as notícias veiculadas nos sites, propondo chamadas e links diretos – normalmente para as notícias completas em seus portais. Esses perfis tornam-se também canais por onde o usuário das redes sociais enviam suas notícias - um acidente, um engarrafamento, o buraco no asfalto da rua - para que os seus acontecimentos cotidianos ganhem a devida dimensão que o veículo permite. O Orkut, pelo seu formato, torna-se obsoleto diante das funcionalidades que seus concorrentes - Twitter, Instagram e Facebook - dispõem. Concentraremo-nos, porém, na rede de microblog Twitter. A internet torna-se cada vez mais rápida, e os dispositivos de acesso à rede caminham na mesma direção. Rapidez, design e praticidade acompanham a evolução dos gadgets. Os computadores ficam cada vez menores, os notebooks evoluem em redução de peso e aumento de memória e capacidade de conexão. Surgem os netbooks, computadores portáteis ainda menores, e posteriormente os tablets.

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Acompanhando essa evolução, os telefones celulares acumulam funções: é o domínio dos smartphones e da funcionalidade de conectar-se de qualquer lugar. As redes sociais ocupam grande espaço no número de acesso, mas não estão sozinhas: o email é a ferramenta com maior número de usuários da internet. A convergência entre evolução da internet e dos dispositivos provoca uma mudança comportamental que afeta inclusive a forma de se fazer jornalismo. A migração de conteúdos, dos materiais impressos para os disquetes, CD-ROM e posteriormente pendrives e armazenamento online na nuvem é um processo que traduz a necessidade de se fazer informação de forma cada vez mais rápida. A adequação dos conteúdos que outrora eram trabalhados para o jornal do dia seguinte, agora são disponibilizados quase que em tempo real. Neste interim, a qualidade da informação se mantém em uma balança, em que do outro lado pesa a necessidade da sociedade em se manter informada.

2.2 O Twitter A rede social Twitter surgiu como uma proposta de formato reduzido dos blogs – um microblog - que permite ao usuário postagens de até 140 caracteres e/ou fotos. Surgida em 2006, segundo fundadores a proposta inicial é de que o Twitter fosse “a SMS da internet”. A estimativa de número de usuários não é divulgada por seus desenvolvedores, cabendo a números informais que, em 2012, alcançaram a casa dos 200 milhões. Dentre eles, 33,3 milhões de usuários são brasileiros, ocupando o segundo lugar em maior número, ficando atrás apenas dos Estados Unidos, de acordo com a empresa de pesquisa de dados Semiocast7 Através de perfis, individuais e corporativos, é possível postar status (tweets) com texto, links para outros sites, fotos, links para vídeos e as chamadas hashtags. Para compartilhar o conteúdo de algum perfil, existe o recurso do retweet, que automaticamente posta o tweet, citando a fonte original. 7

http://semiocast.com/publications/2012_01_31_Brazil_becomes_2nd_country_on_Twitter_superseds_Ja pan

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Os links são importantes no Twitter, pois, em uma rede que limita suas postagens a 140 caracteres, na maioria das vezes é necessário um redirecionamento para que haja uma comunicação efetiva, completa. As hashtags são basicamente tags de buscas acompanhadas do símbolo sustenido (#). Em 2007 Chris Messina foi o primeiro a utilizá-la, para caracterizar um assunto específico de forma a agrupar tweets com conteúdos semelhantes. Os assuntos mais comentados em tempo real alimentam uma listagem, a Trending Topics. Essa listagem de “assuntos do momento” é contabilizada tanto pelas hashtags quanto por nomes próprios, e pode ser filtrada por abrangência total (mundial), por país (disponível na Argentina, Austrália, Brasil, Canadá, Estados Unidos, Itália, Alemanha, Espanha, Reino Unido ou por cidades (restrito a grandes metrópoles, como São Paulo, Londres ou Paris). A interação proposta pela rede de microblogs é diferente das outras redes sociais A ideia principal de seguir e ter seguidores é a de manter uma rede de comunicação que não para e que produz múltiplos fluxos de informação provenientes de diversos canais. Segundo SANTAELLA e LEMOS (2010): Nessa plataforma ocorre uma ruptura com os padrões de interação social digital anteriores, inaugurando uma nova espécie de entrelaçamento informacional onde a continuidade do movimento dos fluxos, juntamente com as mídias móveis, perfaz uma nova experiência de temporalidade, o always on. Nesse movimento contínuo, os laços sociais são feitos e desfeitos constante- mente e em tempo real (p. 93-94).

Grande parte do serviço de réplica e comentários de notícias trabalhados no presente trabalho provém do Twitter, uma vez que a mídia digital possui ferramentas de uso interessantes, como o “retweet” e os “trending topics”. Encaixando-se bem no conceito de Web Colaborativa, o Twitter é hoje um dos principais meios pelo qual são realizadas denúncias à imprensa, e foi também objeto de estudo do presente trabalho, na forma da conta oficial de Twitter do Jornal Correio*.

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2.3 Ciberativismo Através de meios eletrônicos - sobretudo as redes sociais- surgiu o ciberativismo. O ciberativismo é uma forma de organização social através da internet feita por pessoas com interesses comuns que, não raro, denunciam problemas cotidianos, fazendo frente aos meios de comunicação tradicionais – rádios, TV e impressos. O Ciberativismo apresenta-se também como forma de discussão, formação e troca de experiências on-line. Para Sérgio Amadeu (2009):

Os ciberativistas não tem uma coloração ideológica definida nos marcos tradicionais Suas ações se espalham em um amplo espectro de motivações políticas que vão das questões ambientais até as causas feministas ou de solidariedade aos refugiados palestinos. (AMADEU, 2009, p13)

Essa forma de mobilização chama a atenção por ser organizada totalmente através de meios eletrônicos. Reuniões via mensageiros online - o Messenger e o ICQ, e hoje os hangouts, chats no facebook e Skype – e fóruns de discussão apontam os rumos que cada causa devem tomar. Listas de e-mails e abaixo-assinados virtuais também são constantemente utilizados pelos ciberativistas. As causas normalmente são ambientais, políticos e sociais, utilizando a visibilidade da internet e também seu baixo custo para divulgação de conteúdos. Ainda falando de mobilização social na internet, podemos citar os grupos hackers, definidos como indivíduos com conhecimentos elevados de computação e segurança, que os utiliza para fins de diversão, interesse, emoção. Em geral, hackers não destroem dados, possuem um código de ética e não buscam ganhos financeiros. O termo hacker é atualmente adotado pela mídia de forma indiscriminada, se referindo a crackers, por exemplo. Atualmente os grupos mais conhecidos são Anonymous e Lulzsec. Eles utilizam ataques cibernéticos para tirar sites do ar (principalmente sites governamentais ou de empresas específicas - bancos principalmente). Não nos aprofundaremos neste tema.

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Nos últimos cinco anos o ciberativismo ganhou novos rumos, com mobilizações como a Primavera Árabe (2010) e o Ocuppy Wall Street (2011), este último ganhando dimensões mundiais com versões como Occupy London e Ocupa Rio. No Brasil o ciberativismo também representou momentos importantes, como a sugestão popular da Lei da Ficha Limpa.

2.3.1 Primavera Árabe A utilização de mídias sociais - principalmente facebook e Twitter - como forma de mobilização, formação e divulgação de informações de forma significativa - a ponto de derrubar governos ditatoriais no poder há décadas - começou no Oriente Médio em 2010. O termo Primavera Árabe faz referência à Primavera de Praga (1969), e todo o processo iniciou-se na Tunísia, com Mohamed Buoazizi, que ateou fogo ao próprio corpo em protesto pelas condições de vida que o país oferecia, incluindo tortura policial e maus-tratos. Protestos pela morte do rapaz e, consequentemente, conta o governo de Zine El Abdine Ben Ali fizeram com que o chefe de estado da Tunísia fugisse, pouco mais de um mês depois do martírio de Buoazizi. Os protestos na Tunísia, apoiados inclusive pelo exército tunísio, inspiraram também outros países do Oriente Médio, derrubando três chefes de Estado: Zine El Abdine Ben Ali fugiu da Tunísia em 18 de janeiro de 2011, o presidente do Egito Hosni Mubarak renunciou em 08 de Fevereiro, e o presidente da Líbia Muammar al Gaddafi foi capturado por populares, torturado e morto em 20 de outubro. Outros chefes de Estado de países vizinhos manifestaram desejo de abandonar a vida pública, renunciando a reeleição, como os presidentes do Iêmen, Sudão, Jordânia e Iraque. Em outros países os protestos tiveram como resultado algumas garantias por parte do governo, como reformas nos governos. Porém, como descreve George Joffé (2011): [...] A facilidade de comunicação – e consequentemente, de organização – proporcionada pelos celulares e pela internet tem sido inegável. Mas, ao contrário do

16 que têm sugerido alguns observadores, não foi um fator determinante. Ou seja, nem a tecnologia dos celulares nem a internet – quer se trate do Twitter ou do Facebook – foram essenciais para o sucesso das manifestações na Tunísia ou no Egito. Com efeito, em ambos os países os dois tipos de serviço foram bloqueados pelas autoridades durante, pelo menos, parte do período das manifestações, o que não fez abrandar de forma alguma o seu crescimento. (JOFFÉ, 2011, p.85)

2.3.2 Occupy Wall Street O movimento Occupy Wall Street surgiu em Nova Iorque em 2011, como uma forma de mobilização e protesto contra desigualdades sociais e principalmente econômicas, a corrupção política e a influência de empresas privadas nas decisões tomadas pelo governo dos Estados Unidos. Assim como na Primavera Árabe, o principal agente de aglutinação de pessoas, formação e informação são as redes sociais. Após a primeira manifestação, em agosto de 2011 com aproximadamente dez mil pessoas no centro de Nova Iorque, o movimento espalhou-se por outras cidades dos Estados Unidos e do mundo. O movimento Occupy tomou uma dimensão mundial, com protestos na Europa e na América do Sul. No Brasil, o Occupy se tornou Ocupa Rio, conhecido também como “Os Indignados”. Enquanto fora do país as ações do Occupy se resumem à ocupação de espaços públicos, promovendo assembleias e discussões, no Brasil o Ocupa Rio teve uma dimensão menor, espalhando-se a outros grupos, como os black blocs.

2.3.3 Black Bloc Surgida na década de 80 na Alemanha, a tática Black Bloc possui ação direta, seus componentes sempre vestidos de preto e com os rostos cobertos. Essas ações diretas são direcionadas a propriedades privadas, em forma de protesto pela concentração de renda e desigualdade econômica e social. As roupas pretas dos membros do Black bloc servem tanto para proteção (em possíveis confrontos com policiais) como para evitar a identificação de seus agentes. Embora seja um movimento

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de grande presença nos protestos, sua evidência foi caracterizada pela mídia apenas no segundo semestre de 2013, não sendo citados, por exemplo, nas matérias em que se baseiam este estudo. A forma de organização Black Bloc também utiliza das redes sociais para organização, formação e mobilização.

2.3.4 Ciberativismo no Brasil A proposta do ciberativismo no Brasil veio por inspiração de modelos bem sucedidos em outros países. Os coletivos de comunicação independente, como o Mídia Ninja, e as plataformas de mobilização como Avaaz.org, Greenpeace e Fundação SOS Mata Atlântica são bons exemplos de como o ciberativismo vem ganhando espaço no país. A Lei da Ficha Limpa (Lei Complementar 135 de 2010) é uma legislação complementar emendada à Lei das Condições de Inelegibilidade. Foi originada de um projeto de iniciativa popular através de assinaturas online (abaixo-assinado) que reuniu cerca de 1,3 milhão de assinaturas. A lei torna inelegível por oito anos o candidato a cargo público que tiver mandato cassado, renunciar para fugir da cassação ou for condenado por decisão de órgão colegiado (mais de um magistrado) O projeto de lei foi idealizado pelo Juiz Márlon Reis, um dos fundadores do Movimento de Combate a Corrupção Eleitoral (MCCE) e ganhou força com abaixo-assinado através da ferramenta Avaaz.org, rede de ativistas de mobilização global. A Lei da Ficha Limpa é um dos mais importantes casos de ciberativismo no Brasil com grande mobilização popular. Além da Lei da Ficha Limpa, podemos citar também o Marco Civil da Internet (Lei nº 12.965 de 2014) como proposta de iniciativa popular através das redes que ganhou espaço nas mídias tradicionais e repercutiu de forma positiva até a sua aprovação pelo Senado e sanção da Presidente Dilma Roussef em abril de 2014. O Marco Civil da Internet é a lei que regulamenta o uso da Internet no Brasil, e conta com vinte e cinco artigos que garantem direitos dos usuários, provisão de conexão e uso da

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Internet e atuação do poder público em assuntos que tangem conteúdos da Internet, versando que o “Acesso à Internet é essencial ao exercício da cidadania”.

2.3.5 Mídia Ninja Em alternativa às coberturas das manifestações de Junho de 2013 pela mídia corporativa, muitos cidadãos tornaram-se repórteres ao registrar os fatos e disponibilizá-los na internet. Como definiu Nelson Pretto (2013), “A mídia tradicional não deu conta da cobertura e outras alternativas ninjas foram criadas. Todos eram manifestantes e repórteres ao mesmo tempo, com seus gadgets digitais nas mãos e em rede. O coletivo Mídia Ninja (Narrativas Independentes, Jornalismo e Ação) se destacou no período disponibilizando pequenas equipes e gadgets para as transmissões em todo o país, inclusive em Salvador. Com uma estrutura descentralizada e baseada na divulgação via Facebook, o Mídia Ninja foi responsável por grande parte dos arquivos sobre os protestos de junho/2013. Vale ressaltar, porém, que mesmo havendo uma cobertura direta e imparcial dos fatos ocorridos nas manifestações, ainda assim uma grande parcela da população que não tinha acesso à internet ficou alheia aos acontecimentos. Outra grande parcela provavelmente deixou de participar das passeatas por todo o Brasil por não estarem conectadas às redes sociais. Enquanto a grande imprensa omitiu as transmissões, fazendo recortes nas notícias que na maioria das vezes não condiziam com o que as transmissões online (e consequentemente

sem

edição)

disponibilizavam,

as

transmissões

alcançaram picos de 80 mil acessos, equivalente a um ponto do IBOPE.8

8

http://revistapiaui.estadao.com.br/edicao-82/esquina/guerra-dos-memes

livestream

19

3. A CIDADE NAS RUAS 3.1 Movimento Passe Livre Na contramão das evoluções tecnológicas, o Movimento Passe Livre surgiu, em 2005 durante o Fórum Social Mundial em Porto Alegre, com a proposta de passe livre estudantil. Antes disso, em 2003 acontecia em Salvador a Revolta do Buzú. Na época a movimentação política, que partiu de lideranças estudantis, surgiu dos boatos de aumento da tarifa do transporte público - de R$1,30 para R$1,50. Porém a movimentação da Revolta do Buzú ganharia dimensões maiores, como observa MANOLO: A Revolta do Buzu muda de aspecto quando vista por uma perspectiva de classe: transforma-se de uma manifestação estudantil num ensaio de revolta popular, abortada antes que todo seu potencial pudesse ser desenvolvido.9

Nove anos depois da Revolta do Buzú, em Natal, Rio Grande do Norte, aconteceram as primeiras manifestações contra aumento de passagem. Os protestos contra aumentos abusivos nas taxas do transporte público desencadearam uma onda de passeatas e movimentações que chegam a Porto Alegre (Março/2013) e Goiânia (Maio/2013). Em Junho, dessa vez em São Paulo, o Movimento Passe Livre se manifesta contra o aumento anunciado das passagens de ônibus. Atuante desde 2006, o MPL/SP propõe transporte público acessível para toda a população - expressado pelo slogan “Por Uma Vida Sem Catracas”. O aumento de R$ 0,20 proposto pela Prefeitura de São Paulo foi o estopim para manifestações que provocaram confronto policial. A legenda do grupo, porém, seria “Não é só por vinte centavos”, agregando aos protestos as insatisfações de várias camadas da população, que foram s ruas demonstrar sua insatisfação. Essa primeira parte das manifestações, acontecida durante a primeira quinzena do mês de junho, possui pouca cobertura da mídia

9

: MANOLO. Teses sobre a Revolta do Buzu. TarifaZero.org. Disponível em http://tarifazero.org/wpcontent/uploads/2009/07/por_QS3_RevoltaBuzu.pdf

20

tradicional, mas ganha corpo nas redes sociais através das coberturas via Twitter e outros aplicativos de fotos e vídeos.

3.2 Salvador na Voz do Povo – Junho de 2013 As mobilizações ganham espaço também em outras cidades, e chegam a Salvador no dia 17 de junho de 2013, com uma caminhada pacífica pelo Passe Livre entre o Iguatemi e a Avenida Tancredo Neves, e a presença de aproximadamente cinco mil pessoas, em contagem oficial da Policia Militar. Segundo o próprio movimento Passe Livre, o número chegaria ao dobro da contagem oficial. Com a esperança de uma segunda manifestação pacífica, a população baiana foi às ruas novamente no dia 20 de junho de 2013. As reivindicações, porém, tinham vários focos: a rejeição à PEC 37, o gastos abusivos do governo para a Copa das Confederações, o atraso na entrega do Metrô da cidade de Salvador, e o passe-livre estudantil. Reuniram-se dessa vez no Campo Grande, região central da cidade, e rumaram ao Estádio da Fonte Nova, onde aconteceria o jogo Nigéria x Uruguai, pela Copa das Confederações. Antes de chegar ao estádio, porém, houve repressão policial em todos os acessos à Fonte Nova, com uso de bombas de efeito moral e balas de borracha. As principais vias de informação que alimentaram os sites e blogs naquela tarde foram fotos e vídeos enviados pelos leitores a sites como o Portal Terra e o UOL através das redes sociais. O Twitter se tornou a ferramenta mais viável para enviar informações de onde aconteciam as manifestações. De acordo com o relatório do site Causa Brasil10 as maiores reivindicações da internet neste dia (quando aconteceram manifestações em mais outras 69 cidades brasileiras, destas, 11 baianas), as maiores menções na internet eram por Qualidade no Transporte Público, Educação, Preço das Passagens, Segurança, Combate à corrupção, Saúde, Moradia e Governo Dilma Rousseff. Vale ressaltar que essas menções são totalmente qualitativas, excluindo-se a possibilidade de mensurar se eram positivas, negativas ou neutras. Nesse cenário de manifestações e transmissões livestream dos confrontos policiais, aconteceram também às coberturas jornalísticas. 10

http://www.causabrasil.com.br

21

O fenômeno dos protestos nas ruas de centenas de cidades brasileiras chama a atenção de estudiosos para a insatisfação popular em forma de revolta. Semelhante a outras formas de protesto espalhadas pelo mundo, como Occupy Wall Street e a Primavera Árabe, os protestos brasileiros de 2013 possuem aspectos observáveis do ponto de vista de quem trabalha com cibercultura. São eles:

3.2.1 Quem Protesta?

Ao transmitir uma notícia é necessário seguir um lead pré-estabelecido para entender o que se passa. No caso das manifestações, saber quem protesta é a primeira questão, que podemos adaptar: Quem convoca o protesto? Inegável perceber que a juventude classe média foi a responsável pelas primeiras aglutinações contra o aumento das passagens do transporte público em Natal, Porto Alegre e São Paulo. Mas as movimentações cresceram, e o que se observa nos registros em fotos e vídeos é que a dita periferia esteve presente lado a lado com a classe média, protestando pelas suas realidades. A articulação via internet que resultou em uma aglutinação de pessoas lutando por objetivos comuns é um fenômeno tratado por Manoel Castells e Jordi Borja (1996). “Esta articulação se realiza através da ação coletiva e conjunta, que pode responder a formas e objetivos diversos: — a resistência ou o confronto com um agente externo (por exemplo, uma administração superior, uma multinacional etc.); (...) — mobilização sócio-política que encontra sua base principal na afirmação da identidade coletiva ou na vontade de autonomia política (que se concretiza também em objetivos especialmente urbanos).” (CASTELLS E BORJA, 1996)

Ou seja, a mobilização depende de uma identidade, de uma sensação de pertencimento a determinado grupo, pois o cidadão deve lutar apenas pelas causas em que acredita. No caso dos protestos no Brasil, todos eles foram inicialmente motivados por aumentos abusivos no transporte público, que afeta diretamente a maioria das camadas da população.

22

3.2.2 Como protestam?

Os protestos acontecidos no Brasil em 2013 tiveram uma causa e um agente em comum: o aumento das tarifas de transporte público foi a causa das movimentações, e o agente aglutinador foi a internet, através de redes sociais digitais. O Facebook se apresenta como forma de discussão e de movimentação política, enquanto o Twitter surge como meio de disponibilizar online os acontecimentos dos protestos. Quando, no Rio Grande do Norte em agosto de 2012, grupos de estudantes se reuniram para protestar conta o aumento na tarifa de ônibus na capital, eles queriam que o aumento fosse revogado, o que aconteceria dias depois. No ano de 2013 em Porto Alegre o aumento chegou a entrar em vigor, mas foi julgado abusivo pela 5ª Vara da Fazenda Pública, e reajustado por ordem judicial posteriormente. Na terceira onda de manifestações dessa vez em Goiânia. Após um mês de maio conturbado, com confrontos policiais, no dia 13 de junho, as tarifas voltaram a custar R$ 2,70, após liminar expedida pelo juiz Fernando de Mello Xavier, da 1ª Vara da Fazenda Pública Estadual. Na decisão, o juiz argumentou que desde o dia 1º de junho as empresas de transporte coletivo deixaram de pagar os impostos PIS e COFINS, porém essa isenção não foi repassada ao usuário. As manifestações, assim, se tornaram a voz do usuário de transporte público que busca uma forma de exprimir sua insatisfação com o serviço e a taxa cobrados. Em Salvador o primeiro protesto aconteceu no dia 17 de junho. Uma passeata que originou-se na região do Shopping Iguatemi teve a presença de milhares de pessoas. Os números oficiais da Polícia Militar da Bahia são de 8 mil manifestantes. Na ocasião, não houve confronto policial. Os populares, com faixas e cartazes, direcionaram-se para a Avenida Tancredo Neves. Em 20 de junho aconteceu o segundo protesto, cuja concentração aconteceu na praça do Campo Grande, região central da cidade. Os manifestantes organizaram-se para ir em direção ao Estádio da Fonte Nova, onde acontecia o jogo Nigéria x Uruguai, pela Copa das Confederações. Na ocasião, a repressão policial aconteceu em todas as vias de acesso ao Estádio, e as reações mais violentas foram registradas na Avenida

23

Joana Angélica e na região do Dique do Tororó, onde o Batalhão de Choque e as Polícias do Exército e Militar montaram barricadas. A mesma repressão aconteceria em outras capitais que sediaram jogos, a exemplo de Fortaleza - CE e Belo Horizonte - MG. 3.2.3 O que as ruas relatam?

Durante as manifestações pelo Brasil e principalmente em Salvador, os protestos inicialmente não receberam atenção da mídia tradicional. Telejornais negligenciaram ou deram pouca importância a marcha do Iguatemi no dia 17 de junho, enquanto que nas manifestações do dia 20 a pouca atenção que foi dada ao assunto nas TVs ressaltava os manifestantes como agentes causadores de desordem pública. Utilizando os mecanismos tecnológicos disponíveis – smartphones, câmeras, tablets - os manifestantes alimentaram as redes sociais com fotos e vídeos dos confrontos. Algumas imagens chegavam ao Youtube quase instantaneamente, enquanto outros links direcionavam para transmissões ao vivo dos protestos via livestream, ou seja, transmissões pela internet ao vivo.11 Foi através de links disponibilizados e replicados no Twitter que os primeiros confrontos entre a Polícia Militar e os manifestantes chegaram ao conhecimento público. Entre 16 e 19 de junho, a participação no Twitter atinge seu ápice ─ quase 170 mil perfis participam das discussões no Brasil.12 .

11

http://comunicaisalvador.wordpress.com/2013/06/29/smarthphones-sao-usados-para-transmissao-deprotestos-em-salvador/ 12http://www.bbc.co.uk/portuguese/noticias/2013/07/130710_protestos_tweets_hashtags_cc_mdb#1

24

4 AS COBERTURAS DAS MANIFESTAÇÕES PELOS VEÍCULOS 4.1 O Correio* O Correio* pertence à Rede Bahia, conglomerado de empresas da área de comunicação com sede no Estado da Bahia, na cidade de Salvador. O Correio* impresso possui veiculação diária e foi fundado em dezembro de 1978. No ano de 2008, em comemoração aos 40 anos de circulação, o até então Correio da Bahia passou por reformulações em seu formato e conteúdo, passando a denominar-se apenas Correio*. Atualmente ocupa a liderança em circulação na região Nordeste e a 16ª posição entre os veículos impressos circulando no Brasil.13 A Rede Bahia é composta por 14 empresas dos segmentos de Mídia, Conteúdo e Entretenimento, atuando na Bahia e região Nordeste. O atual presidente do Conselho de Administração e Conselho Editorial da Rede Bahia é Antonio Carlos Peixoto de Magalhães Junior, filho do ex-senador e ex-governador da Bahia Antonio Carlos Magalhães. 14 O Correio* possui uma plataforma online, Correio24Horas, que é alimentado com notícias ao longo do dia, em tempo real com acesso grátis para todos os assinantes. As notícias do Correio24 horas também são replicadas pelos perfis no Twitter (@Correio24horas) e Facebook (www.facebook.com/correio24horas).

13 14

http://www.correio24horas.com.br/detalhe/noticia/correio-fecha-o-ano-como-jornal-lider-do-nordeste www.correio24horas.com.br/institucional

25

4.2 O que o Correio* publicou? Nas edições do Correio* entre os dias 18 e 23 de junho (fase em que os protestos em Salvador estiveram mais fortes) o jornal impresso limitou-se a manter a postura de não comentar sobre os acontecimentos em Salvador, ou fazê-lo de forma sutil. Na capa do dia 18 de Junho, depois da passeata pacífica na Avenida Tancredo Neves, a capa do Correio* mostrava a imagem emblemática da incursão de protestantes no Congresso Nacional em Brasília, mas não fez nenhuma referência à passeata pacífica que havia acontecido no dia anterior em Salvador. Na capa e edição do dia 19 de Junho, o Correio* contribui para a formação da imagem do manifestante vândalo. Tanto a capa com cores e discurso provocativo quanto as matérias tentam tornar evidente que os protestos buscam destruição e violência. Mais uma vez na edição do dia 19 o Correio* não faz menções aos protestos ou mobilizações na capital soteropolitana, concentrando-se nas notícias do eixo RioSão Paulo. No dia 21 de Junho pela primeira vez a capa do jornal Correio* traz uma manchete de Salvador, desde o início dos protestos. Nela, um ônibus em chamas e o título da matéria, que evidenciam a presença de vândalos nos protestos. No dia 22 o destaque da capa é para a seleção brasileira de futebol e o pacto pelo Transporte público assinado pelo Governo Federal. No dia 23 de Junho o jornal Correio* volta a falar sobre os protestos em Salvador na sua capa, com uma foto de um manifestante imobilizado por um policial, com chamada que deixa claro que os manifestantes se tornaram ameaças para a população.

26

4.3 Escolha do produto e análise dos dados Os vinte e cinco tweets apresentados foram selecionados através de ferramenta online Topsy15 que coletou tweets do perfil @Correio24horas entre os dias 20 e 23 de junho de 2013. A ferramenta nos retornou as cem postagens do perfil @Correio24horas que obtiveram mais retweets no período. Destas cem, 47 tratavam direta ou indiretamente das manifestações. As postagens apresentadas neste estudo foram selecionadas considerando a quantidade de interações (retweets, curtidas), os links para os quais eram direcionadas, e a linguagem comum usada para a chamada das notícias. A análise propõe-se a fazer uma convergência entre a cobertura do veículo e os rumos que as mobilizações online tomaram, chegando à descaracterização da legitimidade do movimento e consequentemente a sua desintegração. Vale lembrar que no mesmo período a cidade de Salvador era uma das sedes da Copa das Confederações, e este pode ser um dos fatores que influenciou o agendamento das notícias pelo veículo analisado. Escolhido o material, fizemos análise dos retweets e de termos específicos que se repetiram nos tweets, observando o contexto utilizado pelo perfil da rede para noticiar os acontecimentos das manifestações e relacionados. A análise da linguagem parte das premissas do jornalismo com breve estudo do lead e da abordagem geral dos tweets.

4.3.1 O que o Correio24horas twittou?



Correio, Jornal (correio24horas). “Mais de 55 mil confirmam participação em manifestação nesta quinta em Salvador http://t.co/pqbFy6UTbc”. 19 de Junho, 19:31.

15

www.topsy.com

27



Correio, Jornal (correio24horas). “Movimento prevê manifestação perto da Arena Fonte Nova http://t.co/xes6jkYmeN”. 19 de junho, 06:40



Correio, Jornal (correio24horas). “Cerca de 400 pessoas fazem protesto e fecham via parafuso em Camaçari http://t.co/1HHO23xbKW”. 19 de Junho, 14:22.



Correio, Jornal (correio24horas). “Sem participar de manifestação, estudante de 24 anos é baleado no Garcia http://t.co/Hqqk08IMJq”. 20 de Junho, 19:12.



Correio, Jornal (correio24horas). “Há registro de ônibus incendiados na avenida Centenário e no Garcia.”. 20 de Junho, 13:47.



Correio, Jornal (correio24horas).

“20 mil manifestantes foram às ruas em

Salvador nesta quinta, estima SSP http://t.co/jzF6G1Jycr”. 20 de Junho, 14:32. 

Correio, Jornal (correio24horas). “Manifestação continua em Salvador; saiba como foi o dia de confrontos e veja galeria de fotos http://t.co/SCrAZDIiWr”. 20 de Junho, 17:24.



Correio, Jornal (correio24horas). “Centenas de manifestantes se reúnem no Campo Grande para protestos http://t.co/jGMnoILeN1”. 20 de Junho, 10:10.



Correio, Jornal (correio24horas). “Salvador terá protesto hoje e SSP garante: PM estará preparada para qualquer situação http://t.co/zGbj6Fl9vO”. 20 de junho, 04:58.



Correio, Jornal (correio24horas). “Governador Jaques Wagner dá coletiva nesta sexta para falar de manifestação http://t.co/RTtKsk3p8G”. 20 de Junho, 18:52.

28



Correio, Jornal (correio24horas). “Ônibus é incendiado por manifestantes na região do Dique http://t.co/XdCaeCu4sR”. 20 de Junho, 13:34.



Correio, Jornal (correio24horas). “Manifestantes se reúnem no Campo Grande para protestos http://t.co/jGMnoILeN1”. 20 de Junho, 09:58.



Correio, Jornal (correio24horas). “Loja de óculos na avenida Sete é arrombada e saqueada durante manifestação http://t.co/wwcjHiCgfp”. 20 de Junho, 14:59.



Correio, Jornal (correio24horas). “Em entrevista, professor da UFBA fala sobre manifestações em Salvador http://migre.me/f72kn”. 20 de Junho, 07:41.



Correio,

Jornal

(correio24horas).

“SSP

identifica

viatura

que

assustou

manifestantes; agente deu tiros para o alto http://t.co/lZkZKRPjCl”. 21 de junho, 06:56. 

Correio, Jornal (correio24horas). “Policial pede reforço para "descer a madeira" em manifestantes; confira o vídeo http://glo.bo/10DBk3S”. 21 de Junho, 07:34.



Correio, Jornal (correio24horas). “Protestos: Copa das Confederações pode ser suspensa; Itália quer ir embora http://t.co/sOZYYYnuQ9”. 21 de Junho, 06:24.



Correio, Jornal (correio24horas). “Polícia apreende coquetel molotov com manifestantes nos Barris http://t.co/rW99uNHrTm”. 22 de Junho, 14:39.



Correio, Jornal (correio24horas). “Movimento Passe Livre marca novo ato para o dia 27, saindo do Campo Grande http://t.co/SMY2W5R6Kq”. 23 de Junho, 17:18.



Correio, Jornal (correio24horas). “Polícia dispersa manifestantes como bomba de efeito moral na região do Dique do Tororó http://t.co/fxCOQtpaIr”. 22 de Junho, 13:01.

29



Correio, Jornal (correio24horas). “Repórter do iBahia é cercado por policiais e obrigado

a

apagar

fotos

da

máquina

durante

manifestação

http://t.co/cq6cP3LEWf”. 22 de junho, 13:38. 

Correio, Jornal (correio24horas). “Advogado da OAB acompanha detidos durante manifestação http://t.co/ny6eV1qszY”. 22 de Junho, 17:45.



Correio, Jornal (correio24horas). “Polícia Militar realiza blitze em ônibus e confisca máscara de manifestante http://t.co/3ii4TFz3Hu”. 22 de junho, 09:47.



Correio, Jornal (correio24horas). “Conflito na região do Iguatemi. Manifestantes dizem

que

polícia

reagiu

com

violência

a

protesto

pacífico

http://t.co/FeGsipUmPa”. 22 de Junho, 15:10. 

Correio, Jornal (correio24horas). “Repórter do CORREIO recebe tiro de bala de borracha durante manifestação http://t.co/IstZc6oJPd”. 23 de Junho, 06:56.

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4.3.2 Análise das postagens: Dos tweets coletados no perfil do Correio24horas no Twitter, 47% fazem referências diretas ou indiretas às manifestações na cidade de Salvador. Destes, selecionamos 25 tweets, utilizando como parâmetro a quantidade de retweets, ou seja, o número de vezes em que as informações foram replicadas. Com a análise quantitativa dos retweets, foram contabilizados 318 RT’s, com uma média de 12,72 retweets por postagens. Ou seja, cada informação relacionada aos protestos foi replicada aproximadamente doze vezes na rede social. Diante dessa média, podemos destacar três tweets que tiveram réplicas acima da média: 

Correio, Jornal (correio24horas). “20 mil manifestantes foram às ruas em Salvador nesta quinta, estima SSP http://t.co/jzF6G1Jycr”. 20 de Junho, 14:32. 22 retweets.



Correio, Jornal (correio24horas). “Repórter do iBahia é cercado por policiais e obrigado a apagar fotos da máquina durante manifestação http://t.co/cq6cP3LEWf”. 22 de junho, 13:38. 78 retweets.



Correio, Jornal (correio24horas). “Conflito na região do Iguatemi. Manifestantes dizem que polícia reagiu com violência a protesto pacífico http://t.co/FeGsipUmPa”. 22 de Junho, 15:10. 22 retweets.

O tweet que obteve maior número de retweets tratava da opressão policial contra um jornalista, funcionário de uma das empresas pertencentes ao conglomerado de comunicação do qual o Correio24Horas faz parte. Considerando a linguagem utilizada nos tweets selecionados, foi feita a contagem das palavras e termos utilizados. A

palavra

“manifestação”

possui

dez

ocorrências

(40%).

A

palavra

“manifestantes” possui também dez ocorrências (40%), enquanto a palavra protesto aparece quatro vezes nos tweets (16%). Isso denota a preocupação do veículo em retratar os acontecimentos como fatos sociais para seus seguidores do Twitter, afirmando o caráter revolucionário do movimento.

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Palavras relacionadas às forças de segurança pública (SSP/ PM e Polícia) tiveram dez ocorrências. Em 40% dos tweets selecionados a polícia ou suas forças foram citadas. Nisso percebemos a preocupação do veículo em noticiar a força do Estado nas manifestações de civis. As ocorrências de palavras e expressões relacionadas a demonstrações de violência (tais como “baleado”, “incendiado”, “confronto”, “tiros”) têm quinze ocorrências (60%). É um número ainda maior, denotando a opressão do Estado aos manifestantes, e provocando uma onda de reações entre os seguidores. Em algumas publicações, o tom usado para a chamada da notícia atribui atos de vandalismo aos manifestantes, como por exemplo: 

Correio, Jornal (correio24horas). “Ônibus é incendiado por manifestantes na região do Dique http://t.co/XdCaeCu4sR”. 20 de Junho, 13:34. 15 retweets.

Diante desta análise, pode-se afirmar que o discurso utilizado pelo perfil @Correio24Horas no Twitter contribuiu para a descaracterização das manifestações, bem como em algumas postagens contribuiu para que fosse propagada uma onda de terror na cidade. Utilizando a Teoria do Agendamento, podemos pensar este processo como uma forma de inserir no imaginário dos seguidores a ideia de que as manifestações não trariam outro resultado que não a desordem, o caos e a violência. Através da Teoria Ator Rede podemos analisar os tweets de forma a entender que cada um deles, bem como o perfil do veículo, os links das notícias e, principalmente, os retweets (que ajudaram a espalhar as informações) foram atores de um fluxo de comunicação que também contribuiu para que as manifestações perdessem sua legitimidade. Por fim, a Teoria da Espiral do Silêncio ajuda-nos a compreender o processo pela qual as notícias foram espalhadas de forma rápida e repetitiva, provocando nos seguidores a sensação de descrédito que pode ter contribuído para que os manifestos não continuassem.

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5. EMBASAMENTO TEÓRICO Algumas teorias da comunicação podem nos ajudar na compreensão da cobertura do Correio das Manifestações de Junho, tais como:

5.1 Teoria do Agendamento A agenda setting é a teoria da comunicação que pensa a forma como a mídia escolhe o que deve e como será veiculado, descrita por Maxwell McCombs e Donald Shaw (1979): Em consequência da ação dos jornais, da televisão e dos outros meios de informação, o público é ciente ou ignora, dá atenção ou descuida, enfatiza ou negligencia elementos específicos dos cenários públicos. As pessoas tendem a incluir ou excluir dos próprios conhecimentos o que a mídia inclui ou exclui do próprio conteúdo. Além disso, o público tende a conferir ao que ele inclui uma importância que reflete de perto a ênfase atribuída pelos meios de comunicação de massa aos acontecimentos, aos problemas, às pessoas. (SHAWU, 1979, p.96)

No caso das manifestações, é notório de que havia uma agenda prédeterminada a evitar mostrar ao mundo os confrontos entre manifestantes e policiais ocorridos durante a Copa das Confederações. O foco das emissoras de televisão e da mídia corporativa em geral era “abafar” as insatisfações populares, ao passo que a internet naturalmente transmitia para todo o mundo as imagens do confronto. Essa grande dimensão que a internet gerou com as transmissões livestream, postagens de fotos e vídeos, e principalmente tweets e retweet alterou a agenda prevista, que tratava da Copa das Confederações, colocando na capa dos principais jornais os embates entre a Policia Militar, a Força Nacional e os manifestantes. A agenda pública foi alterada também, com pronunciamentos dos governos estaduais, federal, e até mesmo da FIFA. Nas plataformas online e impressa do Correio* não foi diferente, porém na edição impressa o tema Manifestações foi tratado com cautela. Somente as capas dos dias 21 e 23 de Junho tiveram imagens das manifestações. Nos tweets, 47% das postagens coletadas tratavam das manifestações, enquanto o restante dividia-se em cobertura da Copa das Confederações e temas diversos.

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5.2 Teoria da Espiral do Silêncio A Teoria da Espiral do Silêncio, proposta por Noelle Newman (1993) em estudos sobre o processo eleitoral alemão na década de 80, pensa o processo de comunicação que pode induzir a população a abandonar opiniões próprias de forma a encaixar-se na maioria. A Teoria baseia-se em um tripé de mecanismos que norteiam as notícias veiculada, dando a elas importância e realidade. São elas a Acumulação, a Consonância e a Ubiquidade. A Acumulação no processo explica o excesso da veiculação das notícias sobre o assunto de forma a tratar os manifestantes como ameaças à integridade da população. A consonância e a ubiquidade tratam da maneira comum em que a mesma notícia é tratada em diversas mídias. No caso do Correio e suas plataformas diversas (online), explica a maneira pela qual as mesmas notícias eram replicadas em diversos lugares, de forma a se espalharem com rapidez. Através da Teoria da Espiral do Silêncio, podemos justificar tanto a rápida adesão da população baiana aos protestos, como também explicar a não aderência das movimentações na cidade, diante da descaracterização do movimento pacífico.

5.3 Teoria Ator-Rede e os Atores Não-Humanos A Teoria Ator-Rede foi desenvolvida por Bruno Latour (2005), John Law e outros pesquisadores, e propõe uma visão construtivista de que o ser humano não é o único responsável pelos processos sociais. Pela Teoria Ator-Rede, todos os atores sociais estão interligados pelas suas necessidades, e o conhecimento é, por esse fato, um produto social do meio, e não o resultado de um método científico. Para Law e Latour, não há diferença entre atores humanos e não-humanos. O ator-rede é humano e não humano, e estes permanecem ligados por uma rede de ideias que não necessariamente explica os interesses que geram fatos. O não-humano é representado pela tecnologia, mas pode ser também uma situação econômica-

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política-social que provoca reações, tem a mesma força de um ator humano. O poder das ideias e das máquinas equipara-se a voz humana. É através dos atores não-humanos que as necessidades dos humanos tomam corpo e criam voz. A partir dessa teoria ator-rede podemos pensar as transmissões dos protestos - muitas vezes em tempo real. A ausência de cobertura dos fatos pela mídia tradicional provocou a necessidade de uma mídia alternativa (Mídia Ninja) e também dos manifestantes (mesmo não fazendo parte de nenhum veículo de comunicação) comunicarem ao mundo o que acontecia nos protestos em Salvador. Os atores deste cenário não se limitam às pessoas que participam dos protestos. São também seus gadgets, seus perfis em rede, as interações que aconteceram através da internet e as próprias informações que foram veiculadas. Os tweets do Correio24horas, tratados no presente trabalho, também são atores não-humanos.

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6.0 CONSIDERAÇÕES FINAIS A internet neste processo atua como estruturante do pensamento, pois através dela se produz conteúdo, se comunica fatos (os protestos), desenvolve-se discussões e principalmente inclui grupos, ao promover a aglutinação de pessoas em prol de uma causa e, mais, possibilitando o acesso à informação. É evidente que a presente análise não se propõe a atribuir culpa ao veículo analisado, e sim pensar a forma como foi feita a cobertura jornalística, e o quanto esta contribuiu para que as manifestações na Bahia não continuassem. O Jornal Correio* e suas plataformas online, como o Correio24horas, pertencem a um grupo midiático que vende a imagem de notícia com qualidade, líder no segmento na Bahia. Neste contexto, o jornal Correio* atuou como retransmissor de informações, reproduzindo conteúdos feitos para a internet, imagens, e disponibilizando em seu canal na internet os vídeos de manifestantes. Através de seus perfis em redes sociais, e sobretudo, no Twitter, o Correio24horas distribuiu notícias que contribuíram para a construção da imagem de manifestantes como ameaça à sociedade. As notícias com maiores número de retweets foram aquelas em que se falava de derramamento de sangue. Quando o sujeito da notícia foi algum funcionário da empresa, os números do alcance das mesmas atingiram índices elevados. Ao nos deparar com este cenário, presenciamos o paradoxo da comunicação baiana da atualidade, a informação deixada de lado para dar lugar ao sensacionalismo, como na galeria de fotos dos confrontos. Uma das grandes dificuldades encontradas neste trabalho foi na própria escolha do tema, afinal há poucas pesquisas, referências e estudos acadêmicos voltados para coberturas via Twitter, faltando assim materiais em que pudesse basear para escrevêlo. A coleta dos dados (tweets) foi uma parte complicada. Foram pesquisadas várias ferramentas de coletas de dados, diante do fato de que os tweets haviam sido postados há mais de um ano, e na internet, quanto mais o tempo passa, mais difícil é localizar dados antigos.

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O embasamento teórico do trabalho foi uma parte gratificante. Resultado de dois anos de preparação, muitas leituras e estudos, a parte difícil foi selecionar apenas algumas citações para o trabalho.

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7.0 REFERÊNCIAS ALCÂNTARA, LÍVIA MOREIRA. Ciberativismo: Mapeando discussões. Disponível em http://www.anpocs.org/portal/index.php?option=com_docman&task=doc_view&gid=867 9&Itemid=429 .Acessado em 13/05/2013 CASTELLS, M. E BORJA, J. As cidades como atores políticos. Disponível em http://www.acsmce.com.br/wp-content/uploads/2012/10/AS-CIDADES-COMOATORES-POL%C3%8DTICOS.pdf CASTELLS, MANUEL. Redes de Indignação e Esperança. Tradução de Carlos Alberto Medeiros, Zahar. 2013. DA SILVEIRA, Sergio Amadeu. "Game-ativismo e a nova esfera." 2009 JOFFÉ, George. A Primavera Árabe no Norte de África: origens e perspectivas de futuro. Relações Internacionais (R: I), n. 30, p. 85-116, 2011. LAGE. N. Linguagem Jornalística. Série Princípios, Editora Ática. P. 45. LATOUR, Bruno. "Reagregando o social: uma introdução à teoria do atorrede." Salvador: Edufba. 2012 MALINI, FÁBIO & ANTOUN, HENRIQUE. @Internet e # Rua: ciberativismo e mobilização nas redes sociais. Editora Suilna, 2013. MORAES, DENIS DE. Internet e sociedade em rede, Por uma Outra Comunicação. Rio de Janeiro, Record, 2004. p.284 MORETHSZON, SYLVIA. A Mídia Ninja ataca outra vez. Disponível em http://www.observatoriodaimprensa.com.br/news/view/a_midia_ninja_ataca_outra_vez Acessado em 07/05/2013; NORE, JÚLIO CÉSAR & PEDRO, ROSA. Reflexões sobre possibilidades metodológicas da Teoria- Ator Rede. Disponível em http://web.unifoa.edu.br/cadernos/edicao/14/47.pdf . Acessado em 05/05/2013. NOELLE-NEUMANN, Elisabeth; NOELLE-NEUMANN, Elisabeth. The spiral of silence: Public opinion, our social skin. 2. ed., Chicago: University of Chicago Press, 1993

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O’REILLY, TIM. "What is Web 2.0: Design patterns and business models for the next generation of software." Communications and Strategies 65.1 (2007): 17-37.) PRETTO, Nelson; AQUI, Jovens do Mundo; POPULAR, Cultura. “Saímos do Facebook”: o que quer nas ruas a geração alt+ tab?. SANTAELLA, Lucia; LEMOS, Renata. Redes sociais digitais: a cognição conectiva do Twitter. São Paulo: Paulus, 2010. SHAW, E. Agenda Setting and Mass Communication Theory, Gazette – International Journal for Mass Communication Studies, vol XXV, n. 2, p. 96

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ANEXOS

Figura 1 - Disponível em: twitter.com/correio24horas/status/347542263922057216

Figura 2 - Disponível em twitter.com/correio24horas/status/347348223830138880

Figura 3 - Disponível em twitter.com/correio24horas/status/347464412401106944

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Figura 4 - Disponível em twitter.com/correio24horas/status/347899817948753920

Figura 5 - Disponível em twitter.com/correio24horas/status/347818063971889152

Figura 6 - Disponível em twitter.com/correio24horas/status/347829436462297089

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Figura 7 - Disponível emtwitter.com/correio24horas/status/347872711260917760

Figura 8 - Disponível em twitter.com/correio24horas/status/347763328522780672

Figura 9 - Disponível em twitter.com/correio24horas/status/347684828235309057

42

Figura 10 - Disponível em twitter.com/correio24horas/status/347894758296928257

Figura 11 - Disponível em

twitter.com/correio24horas/status/347814763025289216

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Figura 12 - Disponível em twitter.com/correio24horas/status/347760445421146114

Figura 13 - Disponível em twitter.com/correio24horas/status/347836240244113409

Figura 14 - Disponível em twitter.com/correio24horas/status/347876842109280256

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Figura 15 - Disponível em twitter.com/correio24horas/status/348077033307402240

Figura 16 - Disponível em twitter.com/correio24horas/status/348086460093710336

45

Figura 17 - Disponível em twitter.com/correio24horas/status/348068990993715200

Figura 18 - Disponível em twitter.com/correio24horas/status/348555947767107584

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Figura 19 - Disponível em

twitter.com/correio24horas/status/348958153410506752

Figura 20 - Disponível em twitter.com/correio24horas/status/348531161255006208

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Figura 21 - Disponível em twitter.com/correio24horas/status/348540489886232576

Figura 22 - Disponível em twitter.com/correio24horas/status/348602732120244225

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Figura 23 - Disponível em twitter.com/correio24horas/status/348482299358240768

Figura 24 - Disponível em twitter.com/correio24horas/status/348563730453389312

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Figura 25 - Disponível em twitter.com/correio24horas/status/348801619384729601

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