ASPECTOS JURÍDICOS E ECONÔMICOS CONCERNENTES À PROMOÇÃO, PROTEÇÃO E GARANTIA DOS INVESTIMENTOS INTERNACIONAIS

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Aspectos Jurídicos e Econômicos Concernentes à Promoção, Proteção e Garantia dos Investimentos Internacionais Adriano Koslides Mitre 1

Resumo Tomando-se por consideração o receio que aflige o mercado internacional ante as recentes demonstrações de instabilidade de grandes economias e a diminuição ou perda de prestígio de diversos Estados tradicionalmente conhecidos por atraírem vultosos investimentos e hospedarem grande quantidade de capital estrangeiro – a exemplo do próprio Estado Brasileiro -, muito em razão da míngua de recursos e aparatos jurídicos que lhes permitam oferecer maior segurança e comodidade aos investimentos externos, importa trazer a lume ao espeque normativo que respalda o instituto em âmbito internacional, bem como as diferentes alternativas, ou ‘saídas’, já conhecidas e proporcionadas pela ‘Ordem Jurídica Internacional’. Diante de um cenário que torna evidente a desconfiança do mercado internacional em governos pouco transparentes e políticas demasiadamente intervencionistas, que ofereçam uma segurança jurídica escassa ao capital internacional, há de se incentivar a busca de mecanismos legais e econômicos aptos a propulsionar a recuperação deste capital e reduzir os riscos das operações de investimento, reconhecendo-se ainda, quiçá, uma consequente necessidade de planejamento de novas diretrizes e decisões no seio político-econômico e jurídico estatal.

Palavras-chave: Direito internacional dos investimentos. Investimentos estrangeiros. Direito internacional privado. Direito internacional econômico. Economia internacional. Investimento Estrangeiro Direto (IED). Tratados Bilaterais de Investimento (TBIs). Abstract

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Pós-graduando em Direito Internacional pelo Centro de Direito Internacional (CEDIN).

Considering the fear that afflicts the international market before the recent demonstrations of instability of major economies and the reduction or loss of prestige from different states, traditionally known by attracting loads of investments and hosting great amounts of foreign capital - such as the Brazilian State – much of that because of the dearth of legal resources and apparatuses that enables it to offer safety and convenience to extern investment, it’s essential to explore the normative stanchion that supports the mentioned institute as well as the different alternatives and outputs already known and provided by the "International Legal Order". Faced with a scenario that makes clear the market’s distrust in untransparent governments and too interventionist policies, providing scarce legal certainty to international capital, there’s a necessity to encourage the pursuit of legal and economic mechanisms which are able to propel the recovery of this capital and to reduce the risk of investment operations, recognizing even, perhaps, a consequent need for new planning guidelines and decisions in stateowned political-economic and legal bosom.

Keywords: International investment law. Foreign investment. Conflicts of law. International economic law. International economy. Foreign Direct Investment (FDI). Bilateral Investment Treaties (BITs).

1. Considerações Iniciais Cada vez mais evidente é a fuga de capitais de centros que não proporcionam aos investidores (bem como ‘especuladores’) os mecanismos jurídicos e práticos mais seguros e previsíveis, permeados e oferecidos por uma economia estável e correspondente às expectativas de crescimento do mercado internacional. A título de exemplificação, há muito vem se observando que o fluxo de empresas estrangeiras e particulares com pretensões de investirem seu capital em países de economia mais fechada ou de certa instabilidade econômica, como o Brasil (que embora tenha passado por um bom período de alta em sua economia e ainda permaneça entre os Estados que mais atraem investimentos estrangeiros no mundo, já encara a desaceleração daquela desde o segundo semestre de 2013), vem em constante e significativo declínio, o que acaba por fazer com que estas economias mais “frágeis”, ou “inflexíveis”, percam cada vez mais espaço no cenário mundial. Como cediço, a captação de recursos externos – seja no investimento direto em títulos e valores mobiliários, seja diretamente na própria produção -, pode gerar

inúmeros benefícios aos investidores e, sobretudo, à economia do Estado receptor do capital, a exemplo do aumento de empregos, da estimulação do crescimento do PIB, do desenvolvimento de novas tecnologias, dos efeitos positivos na balança de pagamentos, e mesmo do efeito multiplicador que pode ser desencadeado pelos investimentos diretos. Portanto, dentre as maiores dúvidas que daí emergem, destacam-se a razão para que ocorra este afastamento do capital de tais centros econômicos, bem como quais as possíveis alternativas disponíveis para que os Estados possam contornar tal situação. Não se pode deixar de se indagar, enquanto tais problemas persistirem, se os principais motivadores para esta desconfiança, e para este receio no momento do investimento do capital, decorrem única e essencialmente de questões relativas à economia e às políticas econômicas adotadas por cada Estado, ou se estes fatores e riscos aos quais os investidores evitam se submeter - como nos parece a priori -, também se encontram intimamente relacionados e influenciados pelo respaldo normativo conferido por tais Estados, o que vem a ser o principal foco do presente estudo.

2. Dos Investimentos Internacionais Inicialmente, cumpre salientar que não se procura nem se entende possível um distanciamento completo entre o arcabouço jurídico adotado por determinado Estado Soberano e suas políticas econômicas, uma vez que nítida - mormente nos momentos de internalização de normas e ratificação de tratados internacionais -, a influência significativa de todas suas ideologias, concepções e objetivos práticos, como se demonstrará ao longo da pesquisa.

2.1. Abordagem histórica e conceitual Historicamente, pode-se conceber a regulamentação dos investimentos internacionais como corolário da crescente necessidade de proteção aos direitos dos estrangeiros, na medida em que o passar dos séculos carreou consigo uma comunicação cada vez maior entre as nações e diferentes povos da Terra, bem como uma transcendência de fronteiras e, como de maior relevo para o presente estudo, uma inevitável flexibilização das barreiras comerciais.

Todavia, certo é que esta preocupação em envolver e normatizar os investimentos internacionais jamais se cingiu a um cuidado dedicado exclusivamente

aos estrangeiros - enquanto indivíduos e sujeitos de direito, capazes de exercer uma atividade econômica -, embasado nas noções de tratamento justo e equitativo. O que se passou a verificar em crescente evidência foi o interesse dos próprios Estados soberanos em exercerem essas respectivas soberanias para se cercarem de um aparato legal que os conferisse segurança - econômica e jurídica -, e previsibilidade. Lado outro, um fator cada vez menos relacionado à ordem ética e econômica passou a ser hasteado. Também considerado um mecanismo de se prover aos investimentos internacionais um cenário jurídico que lhe permita encontrar sua melhor utilização, ele acaba por transferir seu foco da segurança da operação para a rentabilidade dessa operação. É nesse contexto que se insere a ideia de acompanhamento dos investimentos internacionais conforme a “mobilidade dos fatores de produção”, imprescindível ao desenvolvimento econômico das nações. Em suma, este conceito parte do pressuposto de que, uma vez possibilitada a análise do fluxo de ofertas e demandas de fatores de produção, passar-se-ia a uma condição de maior previsibilidade e segurança - tão desejadas pelos investidores

-, o

que,

consequentemente, acabaria por gerar um aumento das aplicações de capital nestes mercados favorecidos pela mobilidade dos fatores.

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“Du point de vue historique, le droit international des investissements est la résultante de deux forces qui sont exercées sucessivement pour lui donner son contenu. Cette double origine se perçoit encore: et, un peu à la manière de ces fleuves, qui sont formés de la réunion de deux affluents don les eaux ne se mêlent pas, le droit international ds investissements est consitué de deux séries de règles qui ont quelque mal à fusionner, parce que leur fondement n’est pas identique. D’une part, le droit international des investissements se présente comme un prolongement du droit de la condition des étrangers. Cette branche du droit international est ancienne. Son fondement est d’ordre éthique, et reflète sa tradition, qui est celle de l’humanisme chrétien. Parce que le Souverain est l’élu de Dieu, el doit protection au chrétien, dans la personne de l’étranger. Le droit international lui fait donc obligation de respecter certains droits fondamentaux de l’étranger, dès lors que celui-ci se trouve en séjour sur ses Etats. (...) Cette tradition d’ordre éthique s’est d’abord manifestée, sur le terrain juridique, par l’apparition de standards de droit international, destinés à corriger l’action du Souverain vis-à-vis de l’étranger. Ces standards – parmi lesquels figure, au premier plan, le standard du traitement just et équitable, devaient suffire à la sécurité des personnes. Mais le développement des relations économiques entre les Etats, pendant la période moderne, et les mouvements qu’entraînait ce développement, ont mis en lumière l’insuffisance du standard en tant qu’instrument de protection : la voie était dès lors ouverte à la prolifération des instruments conventionnels, dont les traités d’amitié, de commerce et de navigation ont longetemps été les plus importants, tant par le nombre que par le contenu, avant d’être supplantés par les conventions bilatérales de promotion et de protection des investissements. Mais, d’autre part, le droit international des investissements au cours des années récentes, s’est montré de plus en plus sensible à une nouvelle préocupation, qui est moins d’ordre éthique que d’ordre économique. Il s’agit de fournir à l’investissement international le cadre juridique qui lui permettra de trouver sa meilleure utilisation. L’accent n’est plus mis sur la sécurité de l’opérateur, mais sur la rentabilité de l’opération. Ce qui est ici en cause, ce n’est plus la condition des étrangers, mais la mobilité des facteurs de production, qui est considérée comme nécessaire à la richesse des nations. » CARREAU, Dominique. JUILLARD, Patrick. Droit International Économique. 4ª edição. Paris : LGDJ, 1998. Ps.391-392. (tradução livre)

D’un point de vue historique, le droit international des investissements a une double origine. Il est la « résultante de deux forces qui se sont exercées successivement pour lui donner son contenu ». Ainsi, il est, d’une part, un prolongement du droit de la condition des étrangers, qui protège la personne de l’étranger mais également ses biens. D’autre part, le droit international des investissements constitue un prolongement de la mobilité des facteurs de production, considérée comme nécessaire à la richesse des nations. 3

Embora de definição múltipla e flexível, para a melhor doutrina atual, pode-se compreender ‘investimentos estrangeiros’, ou ‘investimentos internacionais’, como a “aplicação de recursos (dinheiro ou títulos) em empreendimentos que renderão juros ou lucros, em geral a longo prazo, bem como a compra de máquinas, equipamentos e imóveis para a instalação de unidades produtivas e a compra de títulos financeiros (letras de câmbio, ações etc.)” 4. Neste sentido, percebe-se que a ampla conceituação de investimentos internacionais acaba por abarcar qualquer espécie de fluxo lícito de capital, no cenário internacional, voltado à obtenção de lucros, seja pelas operações de aquisição ou reestruturação de sociedades, seja pela variação dos juros no mercado receptor, seja por outra forma que o detentor do capital venha a prever um retorno financeiro satisfatório a ele; podendo ser sujeitos da relação os investidores individuais, as sociedades empresariais, e os próprios governos de Estados que almejem lucros no exterior, ou que se interessem por atrair capital externo para seus mercados nacionais. Na perspectiva da UNCTAD (United Nations Conference on Trade and Development), o termo investimento pode ser definido sob o critério de ativos, de transações e empreendimentos, ou de presença comercial, englobando qualquer espécie de operação – neste caso um negócio jurídico voltado ao lucro, quando balanceadas as expectativas e o custo da oportunidade – que podem envolver desde propriedades móveis e imóveis e direitos sobre elas (hipotecas, empréstimos, garantias etc.), a títulos de participações societárias ou concessões advindas de leis ou contratos. 5 3

MEZGHANI, Ali. Le Maroc et l’arbitrage CIRDI. Réflexion sur la compétence. 2011. 61 f. Dissertação (Mestrado em Direito) - Université Paris 1 – Panthéon Sorbonne. Paris,2011. P. 7. 4 KLOSS, Karla. Os acordos de promoção e proteção recíproca de investimentos e o equilíbrio entre o investidor e o Estado receptor de investimentos. 2007. 176 f. Dissertação (Mestrado em Direito) Universidade Federal de Santa Catarina. Florianópolis, 2007. P. 17. 5 “The term ‘investment’ shall mean every kind of asset and in particular shall include, though not exclusively: a) movable and immovable property and any other property rights such as mortgages, liens

De toda sorte, a doutrina especializada ainda distingue entre as definições de investimentos sob o contexto dos ‘instrumentos de livre circulação’, em que determinados países utilizem-se de sua soberania para se sujeitarem a normas estabelecidas em comum acordo por um tratado multilateral, promovendo entre eles interação e a livre circulação de capital; como ‘instrumentos de proteção’, à lume da crise de confiança que arrebata as relações de investimento entre os países desenvolvidos; e como uma inserção óbvia e essencial aos ‘instrumentos de promoção do desenvolvimento estatal’, donde se extraem as noções de proteção, garantia e promoção dos investimentos por meio de tratados internacionais bilaterais, consoante as necessidades e preocupações de cada parte. 6

2.2. Modalidades de investimentos internacionais No cenário atual se visualiza facilmente uma grande alteração no fluxo dos investimentos internacionais e um maior equilíbrio entre as exportações e importações de capital dentro de um mesmo Estado, ao passo em que alguns destes, conhecidos tradicionalmente pela vultosa exportação de capital, vêm tendendo a receber cada vez mais investimentos, enquanto outros, antes conhecidos por somente hospedarem o capital estrangeiro, passam também a investir fora de seu mercado nacional. Dentre eles se destacam os EUA, que impressionam pela capacidade de captação de investimentos internacionais - talvez determinada pela segurança proporcionada por seu mercado e pelo respaldo de seu sistema jurídico -, bem como o Brasil, que ainda se esforça, mas já vislumbra bons resultados na tentativa de se equiparar em termos de competitividade no âmbito internacional. Insta destacar ainda o ressurgimento de algumas posturas nacionalistas que tendem a se opor, conforme seus ideais, à liberalização econômica, e ao favorecimento e incentivo dos investimentos estrangeiros, a exemplo da Venezuela quando governada por Hugo Chávez e ‘herdada’ por Nicolás Maduro, e a Bolívia do presidente Evo Morales. 7 and pledges; b) shares, stocks and debentures of companies or interests in the property of such companies; c) claims to money or to an performance under contract having a financial value; d) intellectual property rights and goodwill; e) business concessions conferred by law under contract, including concessions to search for, cultivate, extract, or exploit natural resources”, em UNCTAD – Key terms and concepts in IIA’s: a glossary. Issues paper series: keywords. New York e Genebra, 2004. P. 94. Disponível em: . Acesso em: 27 set. 2014. (tradução livre) 6 CARREAU, Dominique. JUILLARD, Patrick. Droit International Économique. 4ª edição. Paris: LGDJ, 1998. Ps.396-406. 7 KLOSS, Karla. Os acordos de promoção e proteção recíproca de investimentos e o equilíbrio entre o investidor e o Estado receptor de investimentos. 2007. 176 f. Dissertação (Mestrado em Direito) Universidade Federal de Santa Catarina. Florianópolis, 2007. P. 11.

Fato é que os investimentos internacionais podem ser efetuados dentre as modalidades de ‘investimentos diretos’ ou ‘indiretos’ (os chamados investimentos em carteira ou investimentos de portfólio). No que tange ao ‘Investimento Estrangeiro Direto’ (IED, IDE ou FDI), tem-se que este “é uma das principais fontes de financiamento externo dos países em desenvolvimento. No atual cenário internacional, marcado pela crescente desigualdade econômica entre os Estados, o IED pode funcionar como instrumento de promoção do desenvolvimento dos países mais pobres”. Todavia, deve-se destacar que o êxito nesta operação fica totalmente condicionado ao preparo e às políticas adotadas pelo governo interessado em atrair o capital estrangeiro. 8 O investimento direto é constituído quando o investidor detém 10% ou mais das ações ordinárias ou do direito a voto numa empresa. Enquanto isso, é considerado que o investimento em carteira se dá quando tal aplicação financeira for inferior a 10% das ações ordinárias ou do direito a voto numa empresa.

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Conforme se verificará no próximo tópico, dados oficiais já apontam um elevado crescimento de IEDs por todo o mundo, o que demonstra o papel cada vez mais importante destes mecanismos de financiamento por capital externo para as economias globais. Ademais, para fins didáticos, se faz necessário compreender que os investimentos diretos se dividem em duas modalidades distintas, a ‘participação no capital de uma sociedade’ e os ‘empréstimos intercompanhias’. A participação no capital compreende os ingressos de recursos de bens, moeda e as conversões externas em investimento estrangeiro direto, incluindo os valores destinados ao programa de privatizações, relacionados com a aquisição/subscrição/aumento de capital, total ou parcial do capital social de empresas residentes. Os empréstimos intercompanhias compreendem os créditos concedidos pelas matrizes, sediadas no exterior, a suas subsidiárias ou filiais estabelecidas no país. 10

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KLOSS, Karla. Os acordos de promoção e proteção recíproca de investimentos e o equilíbrio entre o investidor e o Estado receptor de investimentos. 2007. 176 f. Dissertação (Mestrado em Direito) Universidade Federal de Santa Catarina. Florianópolis, 2007. P. 15. 9 RECEITA FEDERAL DO BRASIL. O Investimento Direto Estrangeiro – IDE. Disponível em: . Acesso em 28 set. 2014. 10 RECEITA FEDERAL DO BRASIL. O Investimento Direto Estrangeiro – IDE. Disponível em: . Acesso em 28 set. 2014.

O investimento direto se difere do intercâmbio de bens e serviços por vários fatores. Primeiro, não tem liquidez imediata (pagamento à vista) ou diferida (crédito comercial). Segundo, tem uma dimensão intertemporal, pois os investimentos são seguidos pelos fluxos de produção, venda e lucros, com um certo atraso. Terceiro, implica em transferências de direitos patrimoniais. Quarto, decorre de uma estratégia que resulta do processo da empresa tentar antecipar a ação de suas concorrentes. 11

2.3. O Investimento Estrangeiro Direto (IED) e a economia brasileira Segundo relatório publicado pela conferência UNCTAD (United Nations Conference on Trade and Development), da Organização das Nações Unidas, no ano de 2014 (World Investment Report 2014), o fluxo de IEDs voltou a aumentar consideravelmente nos últimos anos. No ano de 2013 esta crescente representou um percentual de 9% em relação ao ano de 2012, movimentando valores próximos a U$1.45 trilhões somente naquele ano, dentre economias desenvolvidas, em transição e em desenvolvimento, de todo o mundo. 12 Embora as economias de Estados desenvolvidos ainda representem aquelas que mais investem capital no cenário internacional por meio de IEDs, já se verifica um crescimento significativo - e imprescindível à economia global -, do fluxo nas economias em desenvolvimento e em transição, que atualmente já investem mais de U$500 bilhões ao ano; aproximadamente 40% do valor total. 13 Por outro lado, dado extremamente positivo à economia internacional é apontado quanto ao recebimento dos IEDs. Consoante as novas estatísticas, as economias em desenvolvimento e em transição já hospedam mais de 60% de todo o capital investido anualmente, sendo que as expectativas para os próximos anos permanecem indicando uma alta no setor. Embora as notícias e estatísticas mais recentes indiquem uma ligeira queda nos investimentos internacionais direcionados ao mercado brasileiro, o último relatório divulgado pela UNCTAD ainda aponta o país como o maior receptor de investimentos na América do Sul e um dos maiores investidores de capital do continente. Em uma 11

RECEITA FEDERAL DO BRASIL. O Investimento Direto Estrangeiro – IDE. Disponível em: . Acesso em 28 set. 2014. 12 UNCTAD. World Investment Report 2014. Investing in the SDGs: an action plan. New York e Genebra, 2014. p. XII. Disponível em: < http://unctad.org/en/PublicationsLibrary/wir2014_en.pdf>. Acesso em 29 set 2014. 13 UNCTAD. World Investment Report 2014. Investing in the SDGs: an action plan. New York e Genebra, 2014. p. XIII. Disponível em: < http://unctad.org/en/PublicationsLibrary/wir2014_en.pdf>. Acesso em 29 set 2014.

análise global quanto ao recebimento de tais investimentos em determinados setores, permanece atrás somente dos Estados Unidos, China, Rússia e Hong Kong (China), com captação de valores próximos a U$55 bilhões anuais. 14 De todo modo, “Um levantamento divulgado pela ONU revela que, no primeiro semestre do ano (2013), o Brasil foi a oitava economia que mais recebeu investimentos no mundo. Em 2012, o País ocupava a 6 posição. Multinacionais investiram três vezes mais em aquisições no México que no Brasil.” 15 É neste sentido, e baseado nas novas informações divulgadas a todo o tempo pela imprensa internacional, que se deve proceder com bastante cautela ao se analisar a situação brasileira no que toca os investimentos de capital no cenário internacional, haja vista que, por mais que o país possua inúmeros atrativos – dentre eles seus recursos naturais -, o crescimento de sua economia já começa a oscilar. Em último balanço divulgado pelo Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE), “o Produto Interno Bruto Brasileiro (PIB) teve queda de 0,6% no segundo trimestre de 2014 em relação aos primeiros três meses do ano, resultado que faz o Brasil entrar na chamada recessão técnica”.

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“Técnica” porque a queda em outros fatores

relacionados a uma recessão propriamente dita - a exemplo do nível de desemprego e a renda do trabalhador -, ainda não se demonstra tão evidente e preocupante. O resultado negativo tem a ver com os problemas no setor industrial brasileiro. No segundo trimestre, o PIB foi de 1,27 trilhão de reais, segundo o Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE). O melhor desempenho neste trimestre foi registrado pelo setor de agropecuária, que cresceu 0,2% em relação aos últimos três meses. O PIB da indústria caiu 1,5% e o de serviços, 0,5%, no período. Quando a comparação dos dados divulgados nesta sexta-feira ocorre com o segundo trimestre do ano passado, a queda atinge

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UNCTAD. World Investment Report 2014. Investing in the SDGs: an action plan. New York e Genebra, 2014. p. XV. Disponível em: < http://unctad.org/en/PublicationsLibrary/wir2014_en.pdf>. Acesso em 29 set 2014. 15 CHADE, Jamil. Brasil perde espaço como destino de investimentos internacionais. Jornal Estadão, Genebra, 31 out. 2013. Blogs Jamil Chade: direto da Europa. Disponível em: . Acesso em 29 set. 2014. 16 PIB do Brasil cai pelo segundo trimestre seguido. Carta Capital, São Paulo, 29 ago. 2014. Economia. Disponível em: . Acesso em 29 set. 2014.

0,9%, com agropecuária sem crescimento e indústria com recuo de 3,4% e serviços com alta de 0,2%. 17 Como visto, a queda se deve principalmente ao setor industrial, que avançou somente no subsetor de extrativismo mineral (3,2%), enquanto os demais apresentaram quedas significativas, como a indústria de transformação (-2,4%), a de construção civil (-2,9%) e a de eletricidade e gás, água, esgoto e limpeza urbana (-1%).

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Ademais, enquanto a expectativa de crescimento do PIB no início do ano de 2014 rondava os 2% - percentual aquém do atingido em 2013, quando houve um avanço 2,5% -, o Banco Central se viu obrigado a reduzir, pela segunda vez no ano, este índice para 0,7%, menos da metade da previsão anterior, de 1,6%. Se confirmado o percentual, esta será a menor expansão da economia brasileira desde o ano de 2009, quando a mesma teve de arcar com uma retração de 0,33%. 19 De todo modo, expectativas ainda mais negativas partem do mercado financeiro, que prevê um crescimento de apenas 0,30% para a economia brasileira no ano de 2014. Diante de um cenário conturbado como o presente, o Estado brasileiro se vê sem muitas alternativas políticas e econômicas a fim de contornar os efeitos nefastos que podem advir de uma desaceleração tão impactante de seu crescimento. Como ele, diversos outros países se encontram na mesma situação, a exemplo de seus vizinhos Argentina e Venezuela, que recentemente perderam espaço para a Colômbia dentre as maiores economias do continente. Os dados atuais confirmam a previsão proferida pela Organização das Nações Unidas (ONU) em meados do primeiro semestre de 2014, quando revisou “para baixo suas previsões de crescimento para toda América Latina e o Caribe, principalmente por causa da desaceleração na América do Sul causada pelos problemas no Brasil, Argentina e Venezuela”. 20

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PIB do Brasil cai pelo segundo trimestre seguido. Carta Capital, São Paulo, 29 ago. 2014. Economia. Disponível em: . Acesso em 29 set. 2014. 18 PIB do Brasil cai pelo segundo trimestre seguido. Carta Capital, São Paulo, 29 ago. 2014. Economia. Disponível em: . Acesso em 29 set. 2014. 19 MARTTELO, Alexandro. Banco Central baixa para 0,7% previsão de alta do PIB neste ano. Jornal G1, Brasília, 29 set. 2014. Economia. Disponível em: . Acesso em 29 set. 2014. 20 ONU prevê forte desaceleração econômica na América do Sul. Exame.com, São Paulo, 21 mai. 2014. Disponível em: . Acesso em 29 set. 2014.

Destarte, vislumbra-se neste cenário a grande razão pela qual se deve buscar nas veredas do meio jurídico opções para impulsionar novamente determinados setores da economia, ao se corrigir falhas estruturais que se apresentam quando da comparação às grandes economias mundiais, uma vez que, em matéria de investimentos internacionais, pode se dizer que o Estado Brasileiro carece de um sistema normativo mais robusto. Até o ano de 2014, o Brasil, apesar de ser signatário de diversas convenções bilaterais de proteção a investimentos, não ratificou quaisquer delas, restando aos investidores que aplicam suas reservas no país a proteção geral e insegura dos poucos tratados multilaterais aplicáveis, ou da legislação doméstica do país.

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Enquanto isso, como se pode conferir de uma das páginas oficiais do Executivo norte-americano, o Estado conta com tratados bilaterais pactuados por todo o globo, sobretudo naquelas regiões que figuram como principais destinos do capital estadunidense.

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Acredita-se que, com o reforço do atual sistema normativo brasileiro pela ‘internalização’ de novas normas, mediante a celebração de mais tratados bilaterais de investimento (TBIs) e da ratificação de normas multilaterais de evidente relevância e totalmente afáveis – a exemplo da Convenção de Washington –, crescem as possibilidades de êxito na recuperação da economia do país, principalmente no que diz respeito a uma possível equiparação aos principais Estados em termos de recebimento de IEDs, como será melhor discorrido ao longo do estudo.

3. A Proteção dos Investimentos Internacionais Hodiernamente, já se pode observar que os investimentos internacionais passaram a possuir uma regulação geral em âmbito internacional, além daquela mais específica definida em relações estatais bilaterais. Todavia, como cediço, elemento fundamental para que tratados internacionais possuam validade em determinado território e surtam todos seus efeitos (jurídicos, econômicos e mesmo políticos), para e contra determinados Estados e demais sujeitos de Direito internacional, é o

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UNCTAD. World Investment Report 2014. Investing in the SDGs: an action plan. New York e Genebra, 2014. p. 222. Disponível em: < http://unctad.org/en/PublicationsLibrary/wir2014_en.pdf>. Acesso em 29 set 2014. 22 USTR. Office of the United States Trade Representative – Executive office of the President. Trade & Investment Framework Agreements (TIFAs). Disponível em . Acesso em 30 set 2014.

consentimento, “que pode ser expressado por meio da assinatura, do intercâmbio de instrumentos constitutivos, da ratificação, da aceitação, aprovação ou da adesão” 23 Deste modo, não há que se falar na aplicação ou vinculação de determinados tratados que regulamentem os investimentos de capital estrangeiro àqueles países que não os houverem ratificado.

3.1. Aspectos normativos e reflexos econômicos: a prevalência do bilateralismo De modo geral e sintético, pode-se dizer que os governos dos Estados que buscam maior acesso ao mercado internacional - ou prover maior visibilidade e acessibilidade do mercado externo às suas economias -, tendem a pactuar os chamados “Tratados bilaterais de investimento” (TBIs), ou “bilateral investment treaties” (BITs), ou fixar códigos e normas internas para a regulamentação dos investimentos, para que não fiquem totalmente dependentes da mera utilização de princípios e costumes internacionais. A título de ilustração, cabe ainda ressaltar que, em sociedades onde imperam governos de ideais ou políticas socialistas/ comunistas, a situação, por óbvio, se torna mais complexa e limitada, uma vez que, quando muito, são admitidos apenas investimentos estrangeiros nas formas de joint ventures, o que acaba por condicioná-los à regulamentação pelas “joint venture laws”. 24 Para que se obtenha melhores resultados e até maior eficiência quanto à atração de investimentos estrangeiros, se torna imprescindível a criação de um cenário normativo favorável, ou seja, o fornecimento de uma regulamentação dos investimentos estrangeiros suficiente para que se garanta segurança jurídica àqueles interessados em “internacionalizar” seu capital. Afinal, os investimentos internacionais tendem a gerar inúmeros benefícios não apenas para os investidores, mas também para os Estados que os recebem, que os “hospedam”, ao passo que o incentivo da indústria, da agropecuária, da produção em

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“The consent of the states parties to the treat in question is a vital factor, since states may (in the absence of a rule being also one of customary law) be bound only by their consent. Treaties are in this sense contracts between states and if they do not receive the consent of the various states, their provisions will not be binding upon them. There are, however, a number of ways in wich a state may express its consent to an international agreement. It may be signaled, according to article 11, by signature, acceptance, approval or accession. In addition, it may be accomplished by any other means, if so agreed.” SHAW, Malcolm Nathan. International Law. Fifth Edition. Cambridge: Cambridge University Press, 2005. P. 817. (tradução livre). 24 AUGUST, Ray. International Business Law: text, cases, and readings. Revisions by Don Mayer and Michael Bixby. 5ª edição. New Jersey: Prentice Hall - Pearson Education, 2009. P. 222.

termos gerais, da circulação de bens, serviços e capital local, figura como de extremo interesse destes, como muito bem delineado por Ray August:

Until 1987, for example, Vietnam allowed only joint ventures. But foreign investment is one of th most sought-after resources that states could ask for, and most states will set up investment codes to encourage foreign capital investment in a legal framework that will benefit the state, not just the investor. A few states do not have general investment laws but instead put restrictions on investment in specific sectors of the economy, such as agriculture, technology, media (television and movies), tourism, and so on. Some states have a complex system of laws controlling investment providing incentives, governing technology transfers, and limiting foreign exchange such that the combination of theses laws functions as a kind of investment code. 25 Deste modo, em termos gerais, pode-se afirmar que a carência de um sistema normativo adequado, ou mesmo a existência de um extremamente restritivo, pode levar o Estado hospedeiro a inúmeras desvantagens e prejuízos. Este fechamento da economia de certos países, de fato, deve ser obrigatoriamente observado pelos investidores, para que não embarquem em verdadeiras aventuras e envolvam seu capital em situações de risco latente. Demais disso, este ‘fechamento econômico’ também deve ser analisado com muita cautela pelos próprios Estados receptores (que venham a cogitá-lo), pois, ao adotarem ou não normas reguladoras dos investimentos internacionais, podem condicionar inteiramente suas políticas econômicas e comprometer suas próprias economias, suas próprias indústrias nacionais, seus próprios comerciantes, prestadores de serviços, e mesmo investidores nacionais. Todavia, ao mesmo passo que se permeiam tais críticas, deve-se considerar também a diversidade de ideologias, políticas, culturas e capacidades econômicas das quais se trata, uma vez que nem sempre os interesses de um governo irão ao encontro de suas possibilidades, condições e expectativas, e nem sempre seus ideais - ou mesmo suas melhores alternativas -, se encontrarão em acordo com a promoção de uma regulamentação completa dos investimentos estrangeiros. Nos dizeres do ilustríssimo jurista Nguyen Quoc Dinh e dos sempre celebrados professores Alain Pellet e Patrick Daillier: 25

AUGUST, Ray. International Business Law: text, cases, and readings. Revisions by Don Mayer and Michael Bixby. 5ª edição. New Jersey: Prentice Hall - Pearson Education, 2009. P. 223.

A atitude dos Estados sempre foi ambivalente no que respeita aos investimentos estrangeiros no seu território e aos investimentos nacionais no estrangeiro. Por um lado é desejável - a médio e a longo prazo – favorecer a entrada de capitais que financiem os primeiros e a saída daqueles que financiam os segundos; entre outros argumentos, esta política permite tornar a economia nacional mais dinâmica e facilita a penetração nos mercados estrangeiros; a contrapartida desta política é que é preciso garantir a segurança dos investimentos estrangeiros e a liberdade de circulação de capitais no sentido da entrada e da saída. Inversamente, a curto prazo, os Estados preocupar-se-ão em conservar o domínio da sua política industrial e em não submeter a sua balança de pagamentos a tensões excessivas. Em consequência, eles desejarão manter os instrumentos nacionais do controlo dos fluxos financeiros correspondentes. Esta hesitação tornou difícil um consenso internacional, porque a ponderação dos argumentos varia de um Estado para o outro e mesmo, da parte de um Estado, de uma época para a outra. 26 Neste sentido, verifica-se que diversos podem ser os empecilhos a obstar ou retardar a elaboração de um arcabouço jurídico doméstico mais completo e seguro no que tange aos investimentos internacionais, devendo ser compreendidos de antemão não apenas os objetivos de Estados e investidores, mas todos os reflexos que tal normatização pode gerar, bem como se estes estarão em acordo com as propostas e com aquilo que cada uma das partes se fará disposta no momento do investimento. Com efeito, atualmente, “embora a prioridade seja concedida à competitividade de cada Estado enquanto ‘palco financeiro’, a aproximação geral repousa num compromisso entre a liberdade reconhecida aos operadores econômicos privados, as necessidades de financiamento das instituições públicas e a preocupação da segurança jurídica”. 27 Mesmo que se considere que a segurança da operação já não se apresente mais como a principal preocupação Estatal, relegada em detrimento da rentabilidade da operação, não se pode negar a relevância do assunto, que certamente se enquadra dentre os mais significativos em termos de captação de investimentos estrangeiros. O Direito Internacional, em matéria de investimentos internacionais, tende a priorizar, portanto, o sistema bilateral na formação de tratados ante o multilateralismo, 26

DINH, Nguyen Quoc; PELLET, Alain; DAILLIER, Patrick. Direito Internacional Público. 2ª Ed. Lisboa: Fundação Calouste Gulbenkian, 1999. P. 1107. 27 DINH, Nguyen Quoc; PELLET, Alain; DAILLIER, Patrick. Direito Internacional Público. 2ª Ed. Lisboa: Fundação Calouste Gulbenkian, 1999. P. 1107.

uma vez que, muito em razão das diversidades políticas e econômicas já apontadas, se torna complexa a regulamentação eficaz por meio de sistemas de abrangência geral e erga omnes. Mesmo assim, não se pode ignorar a imensa relevância das regras multilaterais existentes, mormente ao se tratar dos acordos no âmbito da Organização Mundial do Comércio (OMC) – TRIMs (Acordo sobre Medidas de Investimentos Relacionados ao Comércio) e GATS (Acordo Geral sobre comércio de Serviços) – e os acordos regionais que também abordam a matéria, como o NAFTA (North American Free Trade Agreement) e o MERCOSUL (Mercado Comum do Sul). 28 Estes principais acordos de regulamentação, promoção e proteção dos investimentos internacionais, pactuados bilateralmente (BITs ou TBIs),

asseguram

garantias e deveres recíprocos, e costumam ser assinados por um Estado mais desenvolvido - tradicionalmente conhecido por sua vultosa exportação de capital -, e um país em desenvolvimento, ou ‘emergente’. Todavia, em razão de se considerar que comumente os maiores beneficiários dos BITs são os investidores estrangeiros por si próprios, hoje já se fala em uma suposta ‘relação trilateral’, entre o Estado exportador de capital, o receptor de capital, e o investidor estrangeiro. Os interesses que revestem a relação podem ser diversos, mas geralmente estão envolvidos em uma expectativa de crescimento e desenvolvimento do Estado receptor no mercado internacional, mediante esta captação de novos recursos do exterior, enquanto as nações mais desenvolvidas já tendem a se preocupar mais com a conquista de um respaldo jurídico maior aos seus investidores, que venha a lhes oferecer maior segurança, por meio das normas de proteção e garantia destes investimentos. Nos dizeres da professora Fernanda Kallás, “enquanto o Estado vela pela sua soberania estatal (principalmente no que se refere a seus recursos naturais e minerais), o investidor busca incentivo e se preocupa com a proteção do capital que foi investido”. 29 Deste modo, conforme se pode verificar, estas normas bilaterais são cunhadas com o objetivo precípuo de ‘proteger’ os investimentos estrangeiros, o que acaba por desencadear certo desequilíbrio na relação, a partir do momento em que se passa a

28

KLOSS, Karla. Os acordos de promoção e proteção recíproca de investimentos e o equilíbrio entre o investidor e o Estado receptor de investimentos. 2007. 176 f. Dissertação (Mestrado em Direito) Universidade Federal de Santa Catarina. Florianópolis, 2007. P. 13. 29 CAETANO, Fernanda Araújo Kallás e. Direito Internacional dos Investimentos na Atualidade: uma análise da posição brasileira. E-civitas – Revista Científica do Departamento de Ciências Jurídicas, Políticas e Gerenciais do UNI-BH, Belo Horizonte, vol. III, n. 1, jul. 2010. P. 4. Disponível em: < http://revistas.unibh.br/index.php/dcjpg/article/viewFile/84/47>. Acesso em 25 de setembro de 2014.

fornecer – para que as negociações sejam concluídas satisfatoriamente - uma imprescindível proteção de extremo rigor ao investidor, sem que seja possível garantir ao Estado receptor o sucesso das operações, ou seja, sem que este tenha um mínimo de condições de se certificar que, na prática, os investimentos estrangeiros que passará a receber lhe proverão o retorno esperado ao desenvolvimento de sua economia. Contudo, exatamente por serem os Investimentos Estrangeiros Diretos uma das principais fontes de financiamento externo dos países em desenvolvimento, atualmente já vêm sendo determinadas novas políticas e condições baseadas nos ideais de promoção do desenvolvimento dos Estados receptores, a fim de equilibrar a relação abrangida pelos BITs.

Sob uma perspectiva da evolução histórica do conteúdo e dos objetivos dos acordos de investimentos, consideram-se quatro gerações de acordos: a primeira se caracterizou pela liberalização dos regimes de investimentos; a segunda pela adoção de políticas de liberalização e de atração de investimentos; a terceira pela incorporação de novos temas; e a quarta pelo foco na atração de investimentos que correspondam aos interesses nacionais de desenvolvimento. Esta última, denominada nova geração, busca corrigir o desequilíbrio dos acordos. 30 Interessante questão é levantada por Patrick Julliard na obra L’Évolution des Sources du Droit des Investissements, ao se indagar sobre como os países desenvolvidos poderiam persuadir aqueles em desenvolvimento a consentir com as limitações de soberania acarretadas pela promoção dos investimentos que lhes são direcionados. Certamente a resposta encontrada não diz respeito ao uso da força, que poderia ser considerada, no máximo, uma medida paliativa abusiva. Somente as negociações, a fim de coadunarem os interesses de dois Estados envolvidos em um acordo bilateral de investimentos – apoiado sobre os princípios gerais de direito internacional -, poderiam ser consideradas meios adequados para se chegar a uma maior segurança jurídica.

31

A resolução do dilema que envolve o compromisso jurídico de um Estado respeitar uma ‘limitação’ à sua soberania, para que possa alcançar determinados 30

KLOSS, Karla. Os acordos de promoção e proteção recíproca de investimentos e o equilíbrio entre o investidor e o Estado receptor de investimentos. 2007. 176 f. Dissertação (Mestrado em Direito) Universidade Federal de Santa Catarina. Florianópolis, 2007. P. 12. 31 SILVA, Lauriana de Magalhães. Direito Internacional dos investimentos e tratados internacionais contra dupla tributação da renda. Revista do Curso de Mestrado da Universidade Católica de Brasília, Brasília, v. 2, n.1, 2008. P. 52. Disponível em: . Acesso em 29 set. 2014.

objetivos políticos e econômicos, é bastante complexa. Pode se tentar imaginar quais as razões um Estado de economia interna mais frágil teria para restringir o exercício de sua soberania, a fim de celebrar um tratado que limite as ações de seu governo na defesa ou proteção futura de seus interesses. 32 Algumas explicações foram apresentadas no seguinte sentido: a) Promoção do investimento internacional – a barganha da abertura em troca de maiores recursos a ingressar no futuro. b) Construção de relacionamentos – a obtenção de benesses que ultrapassam a questão dos investimentos em si, tais como a ampliação do comércio e transferência de tecnologia. c) Liberalização econômica – o aumento do intercâmbio entre diversos países por intermédio de investimentos provoca crescimento econômico. d) Encorajamento do investimento doméstico – o respeito ao tratado sobre investimentos tende a formatar uma atmosfera de confiança entre o capital privado e o governo e) Melhoria da governança e fortalecimento do estado de direito – desenvolvimento de regimes internacionais que impelem a política interna do Estado, obrigando-o indiretamente, a um maior respeito aos compromissos aos quais se submete. 33 Destarte, para que não fiquem totalmente à mercê dos costumes internacionais, as partes celebrantes do acordo devem sopesar e negociar cautelosamente suas condições e objetivos quando da pactuação do mesmo, uma vez que todos os mecanismos de proteção e garantia dos investimentos – os quais são de extremo interesse dos Estados de onde parte o capital -, somente serão colocados em pauta pelos Estados receptores uma vez que os seus próprios interesses (comumente relacionados ao desenvolvimento de suas economias) sejam atendidos. Ademais, “A ocorrência cada vez mais frequente de medidas de nacionalização, expropriação, disposições fiscais e financeiras de caráter discriminatório, quebra de contrato e transferência de divisas, fundamentavam a criação de um mecanismo de proteção mais favorável aos investimentos internacionais”.

32

34

SILVA, Lauriana de Magalhães. Direito Internacional dos investimentos e tratados internacionais contra dupla tributação da renda. Revista do Curso de Mestrado da Universidade Católica de Brasília, Brasília, v. 2, n.1, 2008. P. 51. Disponível em: . Acesso em 29 set. 2014. 33 SALACUSE, Jeswald W. The Treatification of International Investment Law. Law and Business Review of the Americas; Winter 2007; 13, 1; ABI/INFORM Global. P. 155. 34 CAETANO, Fernanda Araújo Kallás e. Direito Internacional dos Investimentos na Atualidade: uma análise da posição brasileira. E-civitas – Revista Científica do Departamento de Ciências Jurídicas, Políticas e Gerenciais do UNI-BH, Belo Horizonte, vol. III, n. 1, jul. 2010. P. 6. Disponível em: < http://revistas.unibh.br/index.php/dcjpg/article/viewFile/84/47>. Acesso em 25 de setembro de 2014.

3.2. Noções sobre expropriação, nacionalização e privatização Tema controverso que se faz relevante destacar ao se falar dos investimentos estrangeiros consiste nas ‘prerrogativas’ de expropriação, nacionalização e privatização por parte do Estado hospedeiro, ao passo que, por vezes, o receptor acaba por se utilizar da imponência e dos poderes gerados pela Soberania que detém para agir de forma arbitrária, interferindo diretamente na economia e no mercado conforme sua própria conveniência, seja por visualizar determinada ameaça (por exemplo, à sua estabilidade econômica), seja para simplesmente atender aos seus interesses imediatos. Para que se possa falar nas noções de expropriação ou nacionalização, é necessário que o Estado seja o beneficiário da transferência de determinada propriedade, e que esta seja efetuada de forma autoritária, inspirada em motivos políticos, econômicos ou sociais; podendo, inclusive, o patrimônio ou capital estrangeiro ser objeto de tais imposições. Embora haja diferenciações doutrinárias entre os dois conceitos mencionados (pode-se entender que o ‘confisco’ ou ‘expropriação’ possui caráter punitivo), em âmbito internacional não acarretam distinções práticas ou de regime jurídico. 35 De todo modo, malgrado o direito de nacionalizar as propriedades estrangeiras situadas em território nacional não possa ser colocado em dúvida

36

, cumpre indagar-se

até qual ponto o capital ou patrimônio estrangeiro pode se ver desamparado de tal modo, desprotegido contra as possíveis arbitrariedades de um Estado Soberano. Por óbvio, as primeiras medidas a serem providenciadas pelo investidor necessariamente devem possuir caráter preventivo. Entende-se aqui que o ‘bom senso’ deve prevalecer, ao se analisar cautelosamente as políticas adotadas pelo Estado em que se pretende investir. Entrementes, como já exposto, o investidor não se encontra totalmente desamparado em termos de legislação internacional. Ao contrário, quando se vê protegido por um acordo bilateral, pode se assegurar de que seu Estado de origem já se preocupou em garantir um respaldo satisfatório a seus investimentos, haja vista que o maior beneficiário daquele costuma ser mesmo o investidor.

35

DINH, Nguyen Quoc; PELLET, Alain; DAILLIER, Patrick. Direito Internacional Público. 2ª Ed. Lisboa: Fundação Calouste Gulbenkian, 1999. P. 1109-1110. 36 DINH, Nguyen Quoc; PELLET, Alain; DAILLIER, Patrick. Direito Internacional Público. 2ª Ed. Lisboa: Fundação Calouste Gulbenkian, 1999. P. 1110.

Desde o início os BITs foram celebrados com a finalidade de proteger os investimentos estrangeiros contra a nacionalização ou expropriação, além de garantir a transferência de recursos para o país de origem do investidor e prever mecanismos de solução de conflitos investidor-Estado. O fato de os BITs se fundamentarem historicamente no interesse dos países desenvolvidos em proteger seus investidores fez com que tais nações desenvolvessem uma abordagem própria e que inclui, geralmente, um modelo de acordos que serve como base para as suas negociações. O primeiro modelo de acordo – a AbsShawcross Draft Convention – já revelava a tendência de proteger os investimentos relegando a um segundo plano a questão do desenvolvimento dos países receptores de capital. 37 No caso do Brasil, a própria legislação interna já se preocupou em assegurar compensações indenizatórias nas hipóteses de expropriação ou nacionalização, o que já pode ser considerado, de certa forma, um avanço legislativo. Do mesmo modo que nas hipóteses anteriormente mencionadas, deve o investidor se resguardar contra possíveis políticas de privatização, uma vez que sua intenção inicial pode ser somente a de aplicar seu capital no setor público, em negócios pertencentes ao Estado/Governo (atividades de monopólio estatal, empresas, fundos de investimento etc.), acaso visualize maior segurança ou possibilidade de lucro.

4. Mecanismos De Proteção E Garantia Dos Investimentos Internacionais

4.1. Uma análise que transcende os BITs Mesmo que não guardada por um acordo bilateral entre Estados, nenhuma atividade comercial em âmbito internacional se encontra em total desamparo normativo, haja vista a enorme variedade de tratados em vigor que, ao menos de modo geral, abrangem o assunto.

O tema ‘regulamentação dos investimentos’ vem sendo tratado no âmbito internacional desde o final da Segunda Guerra Mundial. Já em 1948, a Carta de Havana conferia certa disciplina aos investimentos estrangeiros. Desde então, diversos instrumentos vêm sendo negociados como forma de conferir maior segurança e estimular o fluxo de investimentos entre os países. 37

KLOSS, Karla. Os acordos de promoção e proteção recíproca de investimentos e o equilíbrio entre o investidor e o Estado receptor de investimentos. 2007. 176 f. Dissertação (Mestrado em Direito) Universidade Federal de Santa Catarina. Florianópolis, 2007. P. 11-12.

Para aqueles Estados que os ratificaram, podem-se mencionar como principais exemplos o TRIMs (Trade Related Investment Measures), e o AMI (Acordo Multilateral de Investimentos) da OCDE. O acordo denominado TRIMs foi negociado durante a Rodada Uruguai - última rodada de negociações no âmbito do GATT – e entrou em vigor em 1995. Embora se restrinja ao investimento no comércio de bens, despontou acréscimos substanciais à regulamentação de todos os investimentos estrangeiros. Foram estendidos aos investimentos estrangeiros o princípio do tratamento nacional (art. III do GATT), bem como a obrigação de eliminação das restrições quantitativas (art. XI do GATT), limitando a possibilidade para os Estados de estabelecerem requisitos de desempenho e transferência de tecnologia. As citadas restrições, todavia, geram inúmeras controvérsias no cenário internacional, uma vez que os Estados em desenvolvimento mantêm sempre a expectativa de expandirem suas políticas industriais. 38 Considerando-se este limitado campo de aplicação do TRIMs, foi definida a necessidade de se colocar em pauta a negociação de um acordo que abrangesse os fluxos financeiros em termos gerais. Em 2001 ficou estabelecido, na capital do Catar, o início da Rodada de Doha, com o objetivo precípuo de liberalizar o comércio entre os países-membros da OMC. Após cinco anos de paralisação, a rodada foi desbloqueada ao final de 2013, devido a um acordo alcançado em Bali entre os 159 países-membros da OMC, o qual pode significar uma elevação próxima a US$ 1 trilhão na economia mundial. 39 Os temas negociados durante a rodada de Doha, dentre eles o alcance e a definição dos investimentos internacionais, transparência nas relações e não discriminação, bem como as plataformas de consulta e solução de controvérsias, ainda se demonstram totalmente atuais, pois não concluídos os debates e definidas normas regulamentadoras em caráter satisfatório. Já acerca do Acordo Multilateral de Investimentos da OCDE, insta ressaltar que, embora as intenções iniciais fossem de grande acréscimo à sociedade internacional - ao pretender unificar as disposições espalhadas por diversos acordos bilaterais e regionais e 38

SILVA, Lauriana de Magalhães. Direito Internacional dos investimentos e tratados internacionais contra dupla tributação da renda. Revista do Curso de Mestrado da Universidade Católica de Brasília, Brasília, v. 2, n.1, 2008. P. 55. Disponível em: . Acesso em 29 set. 2014. 39 OMC desbloqueia Rodada de Doha na conferência de Bali. Exame.com, São Paulo, 07 dez. 2013. Disponível em: . Acesso em 29 set. 2014.

criar um acordo multilateral sobre investimentos estrangeiros, que garantisse a liberalização do fluxo de capital estrangeiro, a proteção dos investimentos e a definição de procedimentos para resolução de conflitos entre países e investidores estrangeiros – a tentativa foi frustrada.

40

Embora difícil se precisar as razões para o fracasso, muito se

comenta acerca da falta de atendimento aos interesses dos grandes Estados investidores, principais financiadores da causa e geralmente signatários de diversos tratados bilaterais reguladores da matéria. Quanto às garantias oferecidas aos investimentos internacionais, merecem destaque aquelas disciplinadas pela Convenção para Garantia dos Investimentos, constitutiva da Agência Multilateral de Garantia dos Investimentos (AMGI ou MIGA), celebrada no intuito de incentivar e assegurar a realização de investimentos em regiões de economias mais instáveis, que impliquem maiores riscos ao investidor. Sem a segurança e a confiabilidade necessárias para atrair o capital estrangeiro, os Estados que compõem essa massa encontraram no respaldo jurídico uma alternativa para o desenvolvimento de suas economias. Dentre as garantias oferecidas pela Convenção destacam-se o seguro sobre o risco político para investimentos internacionais em países em desenvolvimento, a assistência técnica destinada à promoção do investimento internacional, as oportunidades de investimento em países em desenvolvimento, e os serviços de mediação, voltados à solução de possíveis controvérsias que possam dificultar os investimentos. 41 Ao se mencionar também a assistência prestada aos Estados interessados na celebração de acordos para a facilitação dos investimentos estrangeiros, não se pode deixar de mencionar que UNCTAD se coloca à inteira disposição dos representantes destes para consultas e publica, regularmente, orientações acerca da matéria. 42 Os mecanismos de garantia dos investimentos internacionais podem ser assegurados tanto por normas eminentemente internas, quanto internacionais. Estes 40

LIMA, Thaís Sundfeld. A posição do Brasil perante a regulamentação internacional de investimentos estrangeiros: estudo de caso da situação da Argentina no ICSID e comparação com a posição brasileira. Revista Âmbito Jurídico, Rio Grande, 2008. Disponível em: . Acesso em 30 set. 2014. 41 SILVA, Lauriana de Magalhães. Direito Internacional dos investimentos e tratados internacionais contra dupla tributação da renda. Revista do Curso de Mestrado da Universidade Católica de Brasília, Brasília, v. 2, n.1, 2008. P. 59. Disponível em: . Acesso em 29 set. 2014. 42 UNCTAD. International Investment Agreements (IIAs). Disponível em: . Acesso em 29 set. 2014.

mecanismos - de interesse público e garantidos por fundos públicos -, costumam ser firmados por contratos acessórios unilaterais, que preveem a proteção do investimento quando do surgimento de determinada condição, e podem ser firmados entre os Estados interessados (do investidor e o receptor do investimento), entre o próprio investidor e o Estado de nacionalidade, ou entre o investidor e o Estado receptor. São semelhantes aos ‘contratos de seguro’ que, em âmbito internacional, podem proteger o investidor tanto contra os riscos econômicos quanto políticos, enquanto internamente não se fala na abrangência dos políticos. 43 No cenário internacional, além da MIGA se destacam ainda o projeto de sistema conjunto de garantia (CEE/ACP) – uma tentativa de criação de um sistema de garantia comunitária dos investimentos -, e a ‘Inter-Arab Investment Guarantee Corporation (I.A.I.G.C.), ou ‘Compagnie Interarabe pour la garantie de l’investissement (CIAGI), que tem como seu escopo conectar, de forma bastante original, os investimentos entre mais de vinte países entre o continente africano e o Oriente médio.

44

4.2. Soluções de controvérsia e a arbitragem mista Por décadas, os investidores e Estados receptores de investimentos estrangeiros se viram condicionados a submeter as soluções de possíveis controvérsias oriundas da relação ao foro doméstico, ou seja, aos tribunais sediados no próprio país receptor, os quais se demonstravam, portanto, adstritos à soberania e jurisdição deste. Assim sendo, se tornava sempre complexo assegurar a imparcialidade do órgão julgador, que em tese respondia aos interesses de apenas uma das partes. “Nesse sentido, a indisposição de alguns tribunais internos em condenar seu próprio Estado criou para o investidor estrangeiro a possibilidade de ser protegido diretamente na via internacional, por meio da proteção diplomática de seu país”. Em tese, a demanda só poderia, então, se tornar internacional por meio deste mecanismo, após o esgotamento de todas as vias de recurso interno do país, e acaso estas tivessem sua efetividade comprovada. 45 43 CARREAU, Dominique. JUILLARD, Patrick. Droit International Économique. 4ª edição. Paris: LGDJ, 1998. Ps. 501-508. 44 ‘Trois expériences méritent de retenir l’attention. La première, cést le projet de système conjoint de garantie C.E.E./A.C.P. que prévoyait la convention de Lomé III ; la deuxième est la Compagnie interarabe de garantie des investissements (C.I.A.G.I) ; la troisème est l’Agence multilatérale de garantie des investissements (A.M.G.I).’ CARREAU, Dominique. JUILLARD, Patrick. Droit International Économique. 4ª edição. Paris : LGDJ, 1998. P. 509. 45 CAETANO, Fernanda Araújo Kallás e. Direito Internacional dos Investimentos na Atualidade: uma análise da posição brasileira. E-civitas – Revista Científica do Departamento de Ciências Jurídicas,

Entretanto, este mecanismo também nunca fora dos mais eficazes no que diz respeito ao atendimento dos interesses do indivíduo - no caso, o investidor -, posto que, ao ser representado pelo seu Estado em sede internacional, diversas motivações políticas e de interesse econômico acabavam por interferir na demanda, ocultando assim os verdadeiros propósitos que a haviam ensejado. Tentativas de correção a tal desamparo ao investidor surgiram, como a criação da cláusula calvo - inspirada na Doutrina Calvo, de 1868 -, que contrariava a internacionalização das demandas e previa a renúncia ao ‘direito à proteção diplomática’ pelos investidores. Todavia, se entendeu posteriormente que este direito não era de propriedade dos investidores particulares, mas do Estado e, portanto, por aqueles não poderia ser objeto de renúncia. Apenas no ano de 1965 foi pactuada a Convenção de Washington, que, “embasada nesta necessidade de imparcialidade e independência”

46

das demandas

sobre investimentos internacionais, constituiu o Centro Internacional de Resolução de Disputas sobre Investimento (CIRDI). Vinculado ao Banco Mundial, o CIRDI não possui o condão de processar, conciliar ou arbitrar os litígios, mas tão somente de administrá-los, em conformidade com os procedimentos previstos na Convenção e com a manifestação dúbia de vontade de seus Estados-membros (144 em 2014), que deve se proceder tanto no momento da ratificação do Tratado por esses, quanto com a anuência dos Estados e investidores envolvidos em determinado litígio, quando da instauração de uma solução de conflito no foro arbitral. Este procedimento arbitral administrado pelo CIRDI é denominado “arbitragem mista”, haja vista que “permite o acesso direto dos particulares a um mecanismo de solução de controvérsias contra o Estado estrangeiro”.

47

Como já mencionado, existe também a possibilidade de Estados parte em processos de integração regional convencionarem mecanismos próprios para a solução de conflitos em foro arbitral, como ocorre no âmago da União Europeia e do NAFTA.

Políticas e Gerenciais do UNI-BH, Belo Horizonte, vol. III, n. 1, jul. 2010. P. 5. Disponível em: < http://revistas.unibh.br/index.php/dcjpg/article/viewFile/84/47>. Acesso em 25 de setembro de 2014. 46 CAETANO, Fernanda Araújo Kallás e. Direito Internacional dos Investimentos na Atualidade: uma análise da posição brasileira. E-civitas – Revista Científica do Departamento de Ciências Jurídicas, Políticas e Gerenciais do UNI-BH, Belo Horizonte, vol. III, n. 1, jul. 2010. P. 6. Disponível em: < http://revistas.unibh.br/index.php/dcjpg/article/viewFile/84/47>. Acesso em 25 de setembro de 2014. 47 CAETANO, Fernanda Araújo Kallás e. Direito Internacional dos Investimentos na Atualidade: uma análise da posição brasileira. E-civitas – Revista Científica do Departamento de Ciências Jurídicas, Políticas e Gerenciais do UNI-BH, Belo Horizonte, vol. III, n. 1, jul. 2010. P. 7. Disponível em: < http://revistas.unibh.br/index.php/dcjpg/article/viewFile/84/47>. Acesso em 25 de setembro de 2014.

Contextualizando-se novamente o Estado brasileiro, cumpre destacar que o mesmo não aderiu à Convenção do CIRDI por razões pouco esclarecedoras. Pode se imaginar que, diante de uma situação política pouco benéfica aos interesses do governo – que ao ratificar a Convenção estaria concordando também em abdicar-se do direito de oferecer proteção diplomática às sociedades empresárias nacionais – esse tenha optado pela alternativa menos ‘arriscada’ ou ‘ameaçadora’ à Soberania, mas, que muito provavelmente, foi também a menos promissora em termos de atração de capital estrangeiro. Salienta-se ainda que, no seio do MERCOSUL, não existem mecanismos claros e eficientes em vigor para otimizar a integração quanto aos investimentos de capital entre seus membros, o que complica ainda mais a captação destes recursos externos. De qualquer modo, vale destacar que, numa clara tentativa de atenuar os efeitos dessa escassez de recursos jurídicos que proporciona aos seus investidores, o Estado brasileiro anunciou, ao final do mês de setembro de 2014, a implantação de novas regras internas a fim de simplificar e desburocratizar as operações de investimentos estrangeiros. Segundo a agência ‘Reuters Brasil’, “O Conselho Monetário Nacional (CMN) aprovou mudanças simplificando as regras para investimentos de estrangeiros nos mercados financeiro e de capital do país, reduzindo inclusive o número de operações de câmbio que precisam ser realizadas.” 48

5. Conclusão Por todo o exposto, verifica-se que não há de se falar em falta de incentivo à adesão de normas bilaterais ou multilaterais, tampouco em escassez de alternativas e orientações para tanto. Casos semelhantes ao do Estado brasileiro - que mesmo diante de um cenário conturbado em sua economia prefere optar por não ratificar tratados de regulamentação geral dos investimentos, ou mesmo por não celebrar simples acordos bilaterais sob a alegação de que poderiam vir a ‘restringir’ sua soberania -, são cada vez menos justificáveis e rentáveis. Sob uma análise global, se torna de fácil percepção os inúmeros benefícios que a estruturação de um escopo legal robusto em matéria de investimentos internacionais pode angariar a um Estado. Ademais, a fim de se perfazerem os variados interesses dos

48

OTONI, Luciana. Governo brasileiro facilita investimento estrangeiro no mercado de capitais. Reuters Brasil, Brasília, 29 set. 2014. Disponível em: . Acesso em 29 set. 2014.

Estados exportadores de capital, torna-se de extrema necessidade que estes negociem bilateralmente com aqueles receptores de investimentos, mormente os que possuem economias de maior instabilidade ou sistemas normativos frágeis, que garantam pouca ou nenhuma proteção ao capital estrangeiro.

6. Referências Bibliográficas AUGUST, Ray. International Business Law: text, cases, and readings. Revisions by Don Mayer and Michael Bixby. 5ª edição. New Jersey: Prentice Hall - Pearson Education, 2009.

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