Aumenta que isso aí é Cinema Brasileiro!

Share Embed


Descrição do Produto

Aumenta que isso aí é Cinema Brasileiro!

Rodrigo Bouillet Organizador do Cineclube Tela Brasilis [email protected] Texto escrito para o programa da sessão do Cineclube Tela Brasilis realizada na Cinemateca do Museu de Arte Moderna do Rio de Janeiro em 5 de janeiro de 2005. A sessão de Roberto Carlos em ritmo de aventura (dir. Roberto Farias, 1968) foi antecedida do curta Fernando José (dir. Felipe Reynaud, 2003)

O ensaísta e professor Ismail Xavier entende por Cinema Moderno os movimentos do Cinema Novo e Marginal. Talvez possamos considerar 1961 como o ano de advento do primeiro, por conta de Bahia de todos os santos e Barravento, respectivamente dos diretores estreantes Trigueirinho Neto e Glauber Rocha, principal mentor do movimento. Apesar de ter-se iniciado na Bahia, este se limitou praticamente ao Rio de Janeiro como núcleo de produção. O Cinema Moderno só se esboçou de forma mais evidente em São Paulo a partir de 1965, engrenando de vez três anos mais tarde através do Cinema Marginal, que, por sua vez, se concentrou quase que exclusivamente no eixo Rio-Sampa. A utopia presente nos primeiros filmes cinemanovistas é substituída pela fossa pós-64. A comunicação com o público era escassa. Importante lembrar que ao longo da década de 1960 o preto e branco deu lugar à cor, o que encarecia os custos de produção e imprimia maior necessidade de se chegar e de se ter público. Isto obrigou à formação da distribuidora Difilm e à realização de obras pretensamente mais palatáveis como Garota de Ipanema (Dir.: Leon Hirszman, 1967) - tardia primeira experiência colorida do movimento, uma vez que em 1970, basicamente, apenas alguns filmes marginais ainda não eram coloridos. Muitas vezes feito em 16mm e em preto em branco, sem uma temática identificável à priori pelo grande público e de tom exasperante, o Cinema Marginal contava com poucas possibilidades de exibição. À exceção de poucos filmes da Bahia e de Minas Gerais, que não chegaram a somar uma dezena, o resto do Brasil desconheceu a realização de filmes do Cinema Moderno. Até mesmo São Paulo distanciou-se desta filiação após 1973, quando se encerrou o Cinema Marginal. Prevaleceu nestes locais, sobretudo, o cinema de características mais comerciais, o cinema de rotina. De 1962 a 1974 foram feitos 746 filmes de longa-metragem no Brasil, 438 deles no Rio de Janeiro (pólo do Cinema Moderno), sendo 284 de rotina e 154 modernos. Apesar das inegáveis qualidades das produções modernas – que impelem Fernão Ramos a afirmar que “o plano geral do cinema brasileiro na década de 1960 é a história do Cinema Novo e suas evoluções”

– é de entendimento comum que elas foram pouco vistas. Então, a que filmes assistiram os brasileiros? Produziam-se filmes de gênero e, a partir de 1969, pornochanchadas. A comédia, neste período, passava por transformações profundas com o fim da chanchada. Em 1961, a produtora Cinedistri interrompe este tipo de produção, no ano seguinte Atlântida e Cinelândia encerram suas atividades. A Herbert Richers passaria a lidar com outros gêneros, além de filmes do Cinema Novo e pornochanchadas. O fim da chanchada fez com que diversos atores encerrassem suas carreiras no cinema, como Oscarito, Violeta Ferraz, Zé Trindade, Eliana, Ronaldo Lupo, Dercy Gonçalves e Ankito. Outros como Catalano, Colé, Fregolente, Wilza Carla, Carlos Imperial, Zezé Macedo e Costinha tiveram suas carreiras interrompidas durante anos, mas foram redescobertos mais tarde pela pornochanchada. O que estava em jogo não era somente o esgotamento de um gênero e, por conseguinte, de toda uma forma de atuação. O cinema de rotina experimentava uma grande renovação de seus quadros, com atores mais novos, através da ascensão de John Herbert, Milton Morais, Adolpho Chadler, Agildo Ribeiro, Ary Fontoura, Renato Aragão, Daniel Filho, Dedé Santana, Emiliano Queiroz, Jece Valadão, Reginaldo Faria, Cláudio Cavalcanti, Betty Faria, Darlene Glória, Leila Diniz, Irene Stefânia, Adriana Prieto e Stepan Nercessian – alguns deles tendo atuado nos últimos anos de chanchada. Na realidade, desde meados da década de 1950 já se esboçava a demanda por esta renovação. Em 1955, Bill Halley And His Comets tornou o rock’n’roll conhecido, literalmente, por todo o mundo através da música Rock Around The Clock, graças à sua participação na trilha-sonora do filme Sementes da Violência (The Blackboard Jungle, de Richard Brooks), marcando o início da cultura teenager através da mídia. No ano seguinte, chegava às telas No Balanço das Horas (Rock Around The Clock, de Fred F. Sears), com o mesmo conjunto. O sucesso do ritmo estrangeiro sinaliza o momento da criação de um similar nacional e, em 1957, Cauby Peixoto registra o primeiro rock: Rock and Roll em Copacabana. O cinema também esteve atento e entrou na nova onda com Alegria de viver (Dir.: Watson Macedo, 1957), De vento em popa (Dir.: Carlos Manga, 1957) e Agüenta o rojão (Dir.: Watson Macedo, 1958). Na década de 1960, a segunda geração do rock no Brasil constitui o primeiro movimento de afirmação jovem nacional, a Jovem Guarda. Em 1965, quando se iniciam os festivais de MPB organizados por redes de TV, a Record de São Paulo “tapa buraco” de sua grade levando ao ar o programa de auditório que dá nome ao movimento, promovendo os vários nomes desta geração. Realizaram-se, então, filmes que apostavam na popularidade de artistas musicais em evidência. Assim, os ídolos adolescentes da Jovem Guarda foram transformados protagonistas de filmes, como Essa gatinha é minha (Dir.: Jece Valadão, 1966, com Jerry Adriani e Pery Ribeiro), Jerry – a grande parada e Em busca do ouro (ambos

de Dir.: Carlos Alberto de Souza Barros, 1967, com Jerry Adriani), Os Incríveis neste mundo louco (Dir.: Paulino Brancato Jr., 1967, com Os Incríveis), Juventude e ternura (Dir.: Aurélio Teixeira, 1968, com Wanderléia) e Roberto Carlos em ritmo de aventura (Dir.: Roberto Farias, 1968, com Roberto Carlos), sendo o de propostas mais instigantes por lidar consciente e ironicamente com os meandros da indústria cultural, além de apresentar boas investidas de metalinguagem. Por fim, Na onda do iê-iêiê (Dir.: Aurélio Teixeira, 1966), Rio, verão e amor (Dir.: Watson Macedo, 1966) e Jovens pra frente (Dir.: Alcino Diniz, 1968) são filmes tributários da Jovem Guarda, mas não contam com nenhum de seus astros. Não por acaso, Watson Macedo (cuja estréia na direção se dá em 45), Carlos Alberto de Souza Barros (56) e Roberto Farias (57) dirigiram a maior parte dos filmes. Eram egressos do sistema das chanchadas – Aurélio Teixeira e Jece Valadão foram atores – onde adquiriram o know-how em associar cinema ao ritmo musical do momento. Os filmes do gênero continuaram nos anos seguintes sem tanto entusiasmo, tendo como produções mais estimulantes em termos de linguagem e com maior reconhecimento de público os que completam a trilogia de Roberto Carlos em parceria com Roberto Farias: Roberto Carlos e o diamante cor de rosa (1970) e Roberto Carlos a 300 Km/h (1972). A fórmula da Jovem Guarda se mostraria cada vez mais escassa, culminando seu fim em 1973 com É isso aí, bicho! (ou Geração bendita), de Carlos Bini, abrindo espaço para a cultura hippie no cinema.

Lihat lebih banyak...

Comentários

Copyright © 2017 DADOSPDF Inc.