AUTOS DE RESISTÊNCIA e VIOLÊNCIA NO RIO DE JANEIRO

August 25, 2017 | Autor: Luiz Peixoto | Categoria: Direitos Fundamentais e Direitos Humanos
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AUTOS DE RESISTÊNCIA e VIOLÊNCIA NO RIO DE JANEIRO. Luiz Peixoto de Siqueira Filho1

Recentemente chegaram ao público denúncias de atuação da polícia civil violadora de direitos. Membros da força policial alvejaram e mataram pessoas em fuga, depois alteraram a cena dos crimes, transportando os corpos a pretexto de lhes prestar socorro2. Os vídeos que documentam a ação foram divulgados em maio de 2013, depois de uma disputa interna na Política Civil. No Rio de Janeiro, os policiais em serviço são responsáveis por quase 18% do número total de mortes, matando três pessoas a cada dia3, adverte a Organização dos Estados Americanos – OEA. A circunstância em que vieram à tona tais denúncias não é tão ou menos importante que o seu teor. Os documentos mostram mais dois episódios lamentáveis de um fenômeno complexo e de grandes proporções que vem se consolidando ao longo de décadas e traz reflexos econômicos, sociais e políticos. Cenário em que está inserido também o Município do Rio de Janeiro. A construção da política de segurança militarizada, nas décadas de 1980-1990, foi baseada no discurso de combate ao “tráfico de drogas” na cidade do Rio de Janeiro. Entre os principais efeitos ao longo desses anos se destacam: aumento do número mortes de civis não investigadas e o desaparecimento de pessoas. Em 2001, as Nações Unidas lançou documento denominado Execuções Extrajudiciais, Sumárias ou Arbitrárias. Mais tarde, na 11ª Sessão do Conselho de Direitos Humanos da OEA, o relator fez grave denúncia relacionando as práticas policiais às Execuções Sumárias. 1

Advogado e Membro da Comissão de Direitos Humanos e Assistência Judiciária da Ordem dos Advogados do Brasil Seção Rio de Janeiro 2 Vídeo disponível em < http://extra.globo.com/casos-de-policia/video-mostra-policiais-civis-forjandoauto-de-resistencia-em-favela-do-rio-8361610.html#ixzz2T0H9cV8f> 3 Alston, Philip Relatório do Relator Especial de execuções extrajudiciais, sumárias ou arbitrárias, CONSELHO DE DIREITOS HUMANOS, OEA, 2008. Disponível em , acessado em 31 de maio de 2013, p.9

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Se todos estes fatos encontram raízes em causas mais antigas, trazem também consequências nas questões mais atuais e relevantes do cenário político e social. A concepção de segurança pública nas décadas de 1980 e 19904 foi herdada da doutrina de Segurança Nacional vigente durante a ditadura militar. Atualmente, a utilização de outras estratégias o Página | 2 “inimigo interno” passa dirigida às parcelas mais miseráveis da população5. Os autos de resistência foram regulamentados durante a ditadura militar pela Ordem de Serviço n.º 803, de 02/10/1969 e publicado no Boletim de Serviço do dia 21/11/1969 do Estado da Guanabara. Naquela altura, o dispositivo dispensava a lavratura do auto de prisão em flagrante ou a instauração de inquérito policial em casos de mortes de civis em ações policiais. Daquela época até nossos dias a prática se difundiu, e os homicídios em nome do estado passaram a ter impacto nas mais diversas áreas da sociedade. Dados divulgados pelo Escritório contra as Drogas e o Crime das Nações Unidas6 dão conta de que estados como São Paulo tem comprometido 60% de seu PIB relacionado a gastos da sociedade em segurança privada. Já o Rio de Janeiro soma mais de US$ 2,5 (dois bilhões e meio de dólares) em custos de atendimento às vítimas e perdas materiais e gastos com segurança. Os dados são do ano de 1995. No Rio de Janeiro, o custo por cada vítima, 93% delas do sexo masculino, giraria em torno de R$ 53.278,00 (cinquenta e três mil, duzentos e setenta e oito reais). O que resultaria em um prejuízo da ordem de aproximadamente R$ 400.000.000,00 (quatrocentos milhões de reais) somente no ano de 2007. Os desaparecidos não estão contabilizados neste valor.

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Camilla Ribeiro, Rafael Dias e Sandra Carvalho, Discursos e práticas na construção de uma política de segurança in Segurança, tráfico e milícia no Rio de Janeiro, Organização: Justiça Global. Rio de Janeiro : Fundação Heinrich Böll, 2008. P. 6-15 5 Recentemente o Ministério Público do Rio de Janeiro ajuizou Ação Civil Púbica por Ato de Improbidade Administrativa do Prefeito do Município Eduardo Paes em virtude de atos de perseguição e recolhimento compulsório da população adulta em situação de rua no Rio de Janeiro. Ação Civil Pública nº 0119079-14.2013.8.19.0001 e Ação Civil Pública nº 0119051-46.2013.8.19.0001. 6 Ministério da Justiça - Secretaria Nacional de Segurança Pública, Depto. de Pesquisa, Análise da Informação e Desenvolvimento de Pessoal em Segurança Pública, Custos sociais e econômicos da criminalidade no Brasil. , acessado em: 31 de maio de 2013

Segundo pesquisas, haveria também uma relação direta entre a taxa de homicídios o valor de alugueis. Os dados da pesquisa foram medidos em Belo Horizonte no ano de 1999. Para uma diminuição da taxa de homicídios em um ponto percentual, haveria um incremento no valor dos aluguéis em 0,61%7. O que revela uma intrincada relação entre a adaptação Página | 3 dos mercados e a situação de violência disseminada, bem como na pressão a qualquer custo para reduzir as taxas de homicídio, mesmo que artificialmente. O resultado da disseminação de uma cultura de medo alimenta comportamentos de isolamento, diminuição da vida cultural da população, do ponto de vista social, redução de investimentos externos e turismo, com campo econômico; bem como a fragmentação e sobreposição de uma pauta de discussões de políticas públicas, marcando a ação política pelo caráter reativo e pela superficialidade no planejamento. A questão dos autos de resistência e execuções sumárias foi abordada pelo Relator Especial de Execuções Extrajudiciais, Sumárias ou Arbitrárias, Dr. Philip Alston, junto ao CONSELHO DE DIREITOS HUMANOS, da OEA, em 29 de agosto de 2008, verbis: O Brasil tem um dos mais elevados índices de homicídios do mundo, com mais de 48.000 pessoas mortas a cada ano. Os assassinatos cometidos por facções, internos, policiais, esquadrões da morte e assassinos contratados são, regularmente, manchetes no Brasil e no mundo. As execuções extrajudiciais e a justiça dos vigilantes contam com o apoio de uma parte significativa da população que teme as elevadas taxas de criminalidade, e percebe que o sistema da justiça criminal é demasiado lento ao processar os criminosos. Muitos políticos, ávidos por agradar um eleitorado amedrontado, falham ao demonstrar a vontade política necessária para refrear as execuções praticadas pela polícia.8

Estatísticas oficiais são construídas neste cenário fortemente influenciado econômico, social e politicamente. A contagem das execuções sumárias pela política e os desaparecimentos fica excluída. Não é sem esforço que os pesquisadores buscam medições que possam apresentar um cenário mais aproximado da realidade.

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Fonte: CRISP/UFMG, apud Custos sociais e econômicos da criminalidade no Brasil. Alston, Philip Relatório do Relator Especial de execuções extrajudiciais, sumárias ou arbitrárias, CONSELHO DE DIREITOS HUMANOS, OEA, 2008. Disponível em , acessado em 31 de maio de 2013. 8

O outro lado da guerra de desinformação vem fomentado pela propaganda do estado disseminando a violência e o medo, que finda por atender a uma economia voltada em grande parte para investimentos em segurança privada. A escandalosa relação de agentes públicos que também exercem funções em empresas privadas e vendem segurança não passa Página | 4 desapercebida no cenário internacional, que as designa de perniciosa e mafiosa. Uma análise mais acurada dos dados estatísticos9 só é possível através do cruzamento de informações dos sistemas de segurança pública – no Rio de Janeiro, o Instituto de Segurança Pública ISP/RJ – com órgãos o SIM/Datasus/Ministério da Saúde10, já que os registros de óbitos revelam a manipulação na apresentação dos dados pelo órgãos de segurança pública. Sobre as discrepâncias nos dados cabe ainda ressaltar: As taxas de homicídios do Rio de Janeiro, 40,7 em 2006, de Pernambuco, 53 em 2005, são significativamente mais altas do que a média nacional. É importante ressaltar que as estatísticas oficiais de homicídios não incluem todas as mortes.11

De acordo com estatísticas oficiais, houve 6.133 homicídios não incluindo as mortes por policiais - no Rio de Janeiro em 2007. Naquele ano 1.330 cidadãos foram mortos pela polícia. O número total de mortos foi 7.463. Em 2006, o percentual de mortes por policiais foi 14% - foram 6.323 mortos e 1.063 cidadãos mortos por policiais, 7.386 no total12. Juntamente com os trabalhos de estatística descritiva, há produção e analise qualitativa dos autos de resistência. Segundo trabalhos de análise da fundamentação contida nestes autos de resistência, o fato de a vítima ter tido anotações criminais pregressas ou de morar em área 9

MISSE, Michel. “AUTOS DE RESISTÊNCIA”: UMA ANÁLISE DOS HOMICÍDIOS COMETIDOS POR POLICIAIS NA CIDADE DO RIO DE JANEIRO (2001-2011), Núcleo de Estudos da Cidadania, Conflito e Violência Urbana Universidade Federal do Rio de Janeiro Núcleo de Estudos da Cidadania, Conflito e Violência Urbana Universidade Federal do Rio de Janeiro, Rio de janeiro. 2011 10 Disponível para consulta em: 11 No Rio de Janeiro, por exemplo, as mortes por policiais em serviço não são incluídas nas taxas estaduais de “homicídio”. Se fossem, as taxas de homicídios no Rio de Janeiro e Pernambuco (onde tais mortes são incluídas) seriam similares: Governo do Estado de Pernambuco, Secretaria de Defesa Social, Gerência de Análise Criminal e Estatística, Relatório N° 366/2007/GACE/SDS-PE, “Informações Sobre Violência Envolvendo Policiais em Pernambuco”, Recife, 30 de novembro de 2007, p 4 12 Rio de Janeiro, Instituto de Segurança Pública, 19 de março de 2008.

dominada por quadrilhas ligadas ao tráfico de drogas, por exemplo, pode influenciar, na construção da ideia de que sua morte foi necessária e legítima13. A partir destas constatações foi forjado o termo Página | 5 “criminalização da pobreza”, de ampla utilização pelos setores da sociedade civil engajados na luta pela paz. No Rio de Janeiro, esta prática dos autos de resistência consolidou, dispensando laudos de exame de corpo de delito, perícia armas e do local, ou da observância do devido processo legal. Não processo ou contraditório, por isso, a designação execuções sumárias extrajudiciais lhes foi atribuída.

se de há ou

A fiscalização externa da atividade policial pelo Ministério Público sequer chega a ser exercida, já que a prática dos autos de resistência inverte a lógica do inquérito policial, fazendo com que as vítimas sejam o objeto da investigação e não a ação que provocou a sua morte. Segundo dados divulgados pelo Delegado Orlando Zaconni em conferência proferida no dia na UERJ sobre a incidência de autos de resistência, estes teriam seguido a seguinte evolução: em 2007, 1330 casos; em 2008, 1134 casos; em 2009, 1048 casos; em 2010, 855 casos 14. Haveria ainda a proporção entre o número de pessoas presas para o número de pessoas mortas pela polícia: em 2000, havia uma pessoa morta para cada 56 presas, em 2001, uma para 46; em 2002, uma para 18; em 2003, uma para 13, e em 2007, uma morta para cada 6 pessoas presas. O número de pessoas que “desapareceram” também não está incluído nas estatísticas de homicídios. No Rio de Janeiro, 4.562 pessoas

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MISSE, Michel. “AUTOS DE RESISTÊNCIA”: UMA ANÁLISE DOS HOMICÍDIOS COMETIDOS POR POLICIAIS NA CIDADE DO RIO DE JANEIRO (2001-2011), Núcleo de Estudos da Cidadania, Conflito e Violência Urbana Universidade Federal do Rio de Janeiro Núcleo de Estudos da Cidadania, Conflito e Violência Urbana Universidade Federal do Rio de Janeiro, Rio de janeiro. 2011, p 11 14 Seminário Processo Penal no Rio de Janeiro: autos de resistência e a prisão provisória após a Lei 12.403/11, Mesa de encerramento da Semana Jurídica do CALC 2011 (04/11/2011, Manhã, Auditório 71 da UERJ), presentes: Geraldo Prado- desembargador do TJ e professor de Processo penal na UFRJ, Orlando Zaccone- delegado de polícia, Sergio Verani- desembargador do TJ e professor de Prática Forense Penal na UERJ, disponível em , acessado em 31 de maio de 2013

foram registradas como desaparecidas em 2006 15. Enquanto algumas certamente estão vivas, presume-se que uma parte significativa foi morta e seus corpos eliminados. A violência afeta desproporcionalmente as classes. Na cidade Página | 6 do Rio de Janeiro, as áreas pobres da Zona Norte e da Baixada tiveram taxas de homicídios por 100.000 entre 2000-2005 de 56,8 e 55, respectivamente, enquanto a área da Zona Sul tem uma taxa de 12,6 por 100.00016. Diante dos fatos, por decisão unânime do Colegiado do Conselho de Defesa dos Direitos da Pessoa Humana, realizada em sua 214ª reunião ordinária17, foi aprovada a Resolução n.º8/2012. O referido documento reconhece dentre diversos aspectos que:

1. não existe, na legislação brasileira, excludente de ilicitude de “resistência seguida de morte”, frequentemente documentada por “auto de resistência”, o registro do evento deve ser como de homicídio decorrente de intervenção policial e, no curso da investigação, deve-se verificar se houve, ou não, resistência que possa fundamentar excludente de antijuridicidade; 2. Entre janeiro de 2010 e junho de 2012 houve 3086 mortes em confrontos, das quais 96% - 2986 – foram registrados em autos de resistência nos estados de Mato Grosso do Sul, Rio de Janeiro, São Paulo e Santa Catarina; 3. As mortes afetam as vítimas, familiares e a toda a comunidade, criando um ambiente de insegurança e medo; Entre as providências apontadas, se encontram: -

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Abolição os autos de resistência, reconhecida a necessidade de instauração de inquérito policial, comunicação obrigatória a Delegacia de Crimes contra pessoa, ao Ministério Público.

Alston, Philip Relatório do Relator Especial de execuções extrajudiciais, sumárias ou arbitrárias, CONSELHO DE DIREITOS HUMANOS, OEA, 2008. Disponível em , acessado em 31 de maio de 2013 16 Dados do ISP/RJ, disponível em acessado em: 31 de maio de 2013. 17 BRASIL, Ministério da Justiça, Resolução n.º8/2012, do CONSELHO DE DEFESA DOS DIREITOS DA PESSOA HUMANA, disponível em < http://goo.gl/hgpLT>, acessado em: 31 de maio de 2013.

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Obrigatoriedade da realização de perícia técnica especializada conforme o disposto no art. 6.º, incisos I e II; art. 159; art. 160; art. 164 e art. 181, do Código de Processo Penal. Proibição de remoção corpo do local da morte. art. 6.º, incisos I e II, do Código de Processo Penal; Página | 7 Proibição de arquivamento de inquérito relacionado à morte em razão atuação da polícia sem juntada do respectivo laudo necroscópico ou cadavérico; A distribuição do inquérito a membro do Ministério Público com atribuição para atuar no Tribunal do júri, exceto no caos de lesão corporal; Instalação de câmeras de vídeo e equipamentos de geolocalização em todas as viaturas policiais; Proibição de uso de símbolos e expressões de uso intimidador, ou músicas ou jingles de treinamento com apologia à violência; Condiciona o repasse de verbas federais ao cumprimento de metas públicas de redução de mortes decorrentes de intervenção policial e homicídios com suspeitas de grupo de extermínio com participação de agentes públicos;

As recomendações do conselho de Defesa dos Direitos da Pessoa Humana, em sua grande maioria, reafirmam dispositivos da legislação existente, dos princípios da Carta Constitucional de 88 e dos Instrumentos Internacionais de defesa dos Direitos Humanos. Inova na recomendação de uso de câmeras e GPS por viaturas policiais e no condicionamento de verbas federais à redução de índices, o que é louvável iniciativa. Mas esbarra em uma realidade que precisa ser construída. Os resquícios da ditadura militar ainda estão atuantes e firmes, no decorrer dos anos se sofisticou e assumiu feição complexa diante dos fenômenos sociais. De um lado, é necessário ampliar a atuação dos mecanismos de defesa dos Direitos Humanos em uma rede articulada de atuação e proteção, intensificando os métodos de apuração de denúncia. É necessário observar e difundir instrumentos de treinamento de pessoal especializado,

especialmente diante da importância do papel da Advocacia, Ministério Público e Magistratura no que se refere à questão18. Por outro lado, a difusão do medo cultivado e difundido por tantos anos no país conduz à intolerância que se reveste em obstáculo para Página | 8 construção de uma cultura de paz. A intolerância difundida de forma massificada pelo estado tomou a forma de marginalização de grupos vulneráveis e de sua exclusão de toda a participação na vida social e política, e também, da violência e discriminação contra os mesmos. O aumento dos atos de violência e de intimidação cometidos contra pessoas que exercem sua liberdade de opinião e de expressão, seja no campo da formação, seja no embate direto das denúncias e atuação política ameaça a consolidação da paz e constituem obstáculo para o desenvolvimento19. A educação para a tolerância deve visar contrariar as influencias que levam ao medo e a exclusão do outro, ajudando os jovens a desenvolver sua capacidade de exercer um juízo autônomo, de realizar uma reflexão critica e de raciocinar em termos éticos. É esta um imperativo prioritário para contrariar as influências que levam ao medo. No cenário atual, em que o Estado financia corporações que propagam o medo e o assassinato é necessário fugir ao lugar comum, e passar a um embate fundamentado em documentos e fatos solidamente coletados de forma criteriosa. Vejam por exemplo, a reportagem que acaba de ser publicada. Acessem o vídeo indicado e julguem por si próprios. Uma tropa do Batalhão de Operações Especiais, o Bope, foi flagrada cantando um grito de guerra que faz apologia à violência durante um exercício de corrida nas ruas do Rio. O vídeo foi gravado na semana passada, no parque Eduardo Guinle, que fica logo abaixo da sede do Bope, ao lado do Palácio Laranjeiras, a residência oficial do governador, na Zona Sul da cidade. 18

Sobre o assunto: Foley, Conor Protegendo os brasileiros contra a tortura: Um Manual para Juízes, Promotores, Defensores Públicos e Advogados / Conor Foley; tradução Tatiana Dicenzo, Rita Lamy Freund – Brasília: International Bar Association (IBA) / Ministério das Relações Exteriores Britânico e Embaixada Britânica no Brasil, 2011. 1ª edição 252 p. 19 Declaração de Princípios sobre a Tolerância , aprovada pela Conferência Geral da UNESCO, em sua 28ª reunião em Paris, 16 de novembro de 1995.

Os soldados aparecem correndo sem camisa e gritam respondendo a um líder, que entoa os seguintes versos: 'É o Bope preparando a incursão / E na incursão / Não tem negociação / O tiro é na cabeça / E o agressor no chão. / E volta pro quartel / pra comemoração'.20

Este é um exemplo claro da existência de uma cultura de extermínio, que pouco a pouco vem se estabelecendo no país. Homens de preto, adornados com caveiras em seus uniformes já trouxeram o extermínio de populações marginalizadas, excluídas e perseguidas, a tudo isto se chamou Holocausto. Mas o horror daquela guerra foi precedido de aplausos populares, apoio irrestrito de políticos e empresários, magistrados, intelectuais e filósofos, do controle da informação e de uma imensa campanha política e movimentos de massa, que canalizou frustrações, intolerância e preconceito. O crime traz sérias consequências, faz sofrer as vítimas e suas famílias, traz indignação e desejo de vingança, tem o potencial transformar a vida pessoas de bem e suas consciências, de deixa-las vulneráveis a cooptação, para se transformarem elas também em agentes propagadores de violência. O retorno à velha ideia do olho por olho nos transformará como de fato vem transformando - em uma terra de cegos. Agir com ética significa adotar uma postura de sacrifício pessoal diante da situação e assumir sua parcela de responsabilidade. Significa tomar para si o sofrimento de todas as vítimas, mas não empreender uma só ação de retaliação ou vingança. E esta não é uma tarefa fácil, nem acessível a qualquer pessoa que a encare sem ajuda ou preparação. Mas estamos chegando a um ponto em que não teremos mais escolha e antes que este momento chegue, é importante que preparemos para lutar pela paz. Precisamos de coragem e fé, precisamos abolir desigualdades seculares em nossa sociedade, cultivar a abertura de espírito, a ouvida mútua e a solidariedade para eliminar toda forma de hostilidade e fanatismo. Ainda há tempo21.

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Reportagem do Globo News, publicada dia 30/05/2013, disponível em < http://youtu.be/NUY_L4svqBk>, acessada em 30/05/2013 21 Artigo escrito a pedido dos membros da Comissão de Direitos Humanos e Assistência Judiciária da OAB/RJ. Rio de Janeiro, 01 de junho de 2013.

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