Avaliação da qualidade de vida em mulheres com incontinência urinária pelo uso do Kings Health questionnaire Assessing quality of life of women with urinary incontinence using the Kings Health questionnaire

September 24, 2017 | Autor: L. Oliveira Martins | Categoria: Quality of life, Urinary incontinence, Health Status, General Health, Urinary Bladder
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Avaliação da qualidade de vida em mulheres com incontinência urinária pelo uso do Kings Health questionnaire Assessing quality of life of women with urinary incontinence using the Kings Health questionnaire João Bosco Ramos Borges1, Larissa Neri2, Rosa Maria Silveira Sigrist3, Larissa Oliveira Martins4, Telma Guarisi5,  Ana Carolina Marchesini6

RESUMO Objetivo: Avaliar a qualidade de vida em mulheres com incontinência urinária; e a associação de outros fatores demográficos e socioeconômicos que poderiam influenciar a percepção de qualidade de vida. Métodos: Cinquenta pacientes foram submetidas ao Kings Health questionnaire e a outras duas escalas independentes para avaliar a gravidade da incontinência urinária, a presença e a intensidade dos sintomas urinários. Resultados: 1/3 das mulheres classificou seu estado de saúde como ruim ou muito ruim. Metade das pacientes referiu que os sintomas ligados a incontinência urinária afetaram muito a qualidade de vida. As pacientes com sintomas de bexiga hiperativa e incontinência urinária mista apresentaram escores de qualidade de vida estatisticamente maiores no domínio “sono e disposição”. Não houve diferença estatística entre os grupos em relação aos demais domínios de qualidade de vida, a fatores sociodemográficos, e na correlação do problema vesical com a percepção geral da saúde. Conclusões: A maioria das mulheres com incontinência urinária considerou sua saúde variando de regular a muito ruim. Os fatores sociodemográficos não influenciaram a qualidade de vida das pacientes estudadas. O Kings Health questionnaire evidenciou impacto negativo da incontinência urinária na qualidade de vida das pacientes. Descritores: Incontinência urinária; Bexiga urinária hiperativa/patologia; Incontinência urinária por estresse; Qualidade de vida; Questionários

ABSTRACT Objective: To evaluate the quality of life of women with urinary incontinence, as well as its association with other demographic and socioeconomic factors that may influence their perception of quality

of life. Methods: A total of 50 patients were submitted to the Kings Health questionnaire and to other independent scales to evaluate severity of urinary incontinence, as well as presence and intensity of urinary symptoms. Results: One third of women considered their health status bad or very bad. Half of the patients referred that urinary incontinence symptoms greatly affected their quality of life. Patients with symptoms of overactive bladder and mixed urinary incontinence presented statistically higher scores of quality of life in the domain “sleep/mood”. There was no statistical difference between the groups concerning other quality of life domains, sociodemographic factors, and the correlation between bladder problem and general health perception. Conclusions: Most women with urinary incontinence considered their health status from regular to very bad. The sociodemographic factors did not influence the quality of life of the patients studied. The Kings Health questionnaire showed a negative impact of urinary incontinence on patient’s quality of life. Keywords: Urinary incontinence; Urinary bladder, overactive/pathology; Urinary incontinence, stress; Quality of life; Questionnaires

INTRODUÇÃO A incontinência urinária (IU) é definida pela Sociedade Internacional de Continência como perda involuntária de urina, que é um problema social ou higiênico(1) e pode acometer mulheres em todas as idades. Tem prevalência variada, podendo afetar entre 17 e 45% das mulheres adultas(2-3), com sérias implicações sociais, causando desconforto, perda de autoconfiança e interferindo negativamente na qualidade de vida (QV) de muitas mulheres.

Trabalho realizado no Serviço de Uroginecologia do Ambulatório da Saúde da Mulher, Faculdade de Medicina de Jundiaí – FMJ, Jundiaí (SP), Brasil. Professor Titular da Disciplina de Ginecologia da Faculdade de Medicina de Jundiaí – FMJ, Jundiaí (SP), Brasil.

1

Acadêmica da Faculdade de Medicina de Jundiaí – FMJ, Jundiaí (SP), Brasil.

2

Acadêmica da Faculdade de Medicina de Jundiaí – FMJ, Jundiaí (SP), Brasil.

3

Acadêmica da Faculdade de Medicina de Jundiaí – FMJ, Jundiaí (SP), Brasil.

4

Doutora, Professora adjunto da Faculdade de Medicina de Jundiaí – FMJ, Jundiaí (SP), Brasil.

5

Professora-assistente da Disciplina de Ginecologia da Faculdade de Medicina de Jundiaí – FMJ, Jundiaí (SP), Brasil.

6

Autor correspondente: João Bosco Ramos Borges – Rua Francisco Telles, 250 – Vila Arens – CEP 13202-550 – Jundiaí (SP), Brasil – Tel.: 4587-1095 – e-mail: [email protected] Data de submissão: 29/5/2009 – Data de aceite: 30/7/2009

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Muitas mulheres não recorrem a cuidados médicos por essa condição(4), na maioria das vezes por acreditar que os sintomas de perda urinária não merecem atenção médica, ou pelo fato dos sintomas não serem suficientemente fortes para lhes incomodarem; ou puramente por falta de tempo para procurar especialista(5-6). A IU representa problema de saúde pública, tendo em vista o alto custo que pode provocar tanto no âmbito do seu tratamento clínico ou cirúrgico, como nas situações de restrição de atividades que pode causar em pacientes economicamente ativas. Nos Estados Unidos, a IU é responsável por aproximadamente 2% dos gastos com a saúde(7), o qual foi estimado em mais de 16 milhões de dólares por ano(8). Além de ser problema de saúde pública nesse país, a IU de esforço (IUE) diminui seriamente a QV de mulheres profissionalmente ativas, causando problema econômico para sociedade(9). Algumas mulheres entendem a IU como uma evolução natural em função da idade e por isso, 30 a 50% das pessoas que sofrem de IU procuraram o serviço de saúde somente após o primeiro ano de início dos sintomas(10). Qualquer que seja o tipo da IU, seus sintomas têm vários efeitos negativos na vida das mulheres, principalmente no que diz respeito a atividades físicas, autoconfiança, autopercepção e atividades sociais(11). A IU interfere diretamente com as atividades diárias das mulheres, de tal maneira que aquelas que sofrem dessa condição apresentam índices mais baixos de QV(12). Desse modo, no momento em que procuram o serviço essas pessoas já apresentam redução da autoestima e depressão, sentindo-se muito angustiadas e incomodadas com o problema da perda urinária. Surge então a necessidade de proporcionar maior conscientização às mulheres, sobretudo as pós-menopausadas, quanto aos benefícios de procurarem tratamento médico para IU, a fim de melhorar a qualidade de suas vidas(13). Apesar da IU não ser razão de risco para a vida das pacientes, é uma condição que pode trazer sérias implicações médicas, sociais, psicológicas e econômicas afetando adversamente a QV(14). O interesse pelo estudo da QV é crescente em várias áreas da atividade humana. Embora o conceito de QV seja subjetivo, multidimensional e influenciado por vários fatores relacionados à educação, economia e aos aspectos socioculturais, não há consenso quanto a sua definição. Apesar disso, a maioria dos autores concorda que ao avaliar a QV, deve-se contemplar os domínios físico, social, psicológico e espiritual, na tentativa de buscar a experiência pessoal de cada indivíduo(15). Em diversos países, avaliam-se questões de QV referentes à IU por meio de questionários. Dois deles foram traduzidos e validados para o português: International Consultation on Incontinence questionnaire – Short Form (ICIQ-SF) e Kings Health questionnaire (KHQ). Entretanto, quando comparados, o KHQ mostrou-se de

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grande confiabilidade(16) e provou ser eficaz pela análise de suas propriedades de medida(17). Já o ICIQ-SF foi descartado por ser simples e breve, e apenas apresentar confiabilidade satisfatória(18). Utilizando a metodologia de aplicação do KHQ, o objetivo deste estudo foi avaliar a QV das mulheres que buscam atendimento especializado devido à IU; bem como a associação de outros fatores demográficos e socioeconômicos que poderiam influenciar a percepção da paciente em relação a sua QV.

MÉTODOS Foi realizado estudo do tipo série de casos, descritivo com análise transversal de dados, com 50 pacientes atendidas/entrevistadas no Serviço de Uroginecologia do Ambulatório da Saúde da Mulher do Hospital Universitário de Jundiaí, no período de Agosto a Dezembro de 2006. O estudo tinha como critérios de exclusão: pacientes menores de 18 anos e as que negaram participar do estudo. Durante a aplicação dos questionários, apenas uma paciente abordada se recusou a participar do estudo alegando não dispor de tempo suficiente. Todas as pacientes incluídas no estudo leram e assinaram o termo de consentimento livre e esclarecido, previamente aprovado em projeto junto ao Comitê de Ética em Pesquisa do referido hospital. Este estudo foi contemplado e viabilizado com Bolsa de Iniciação Científica pelo Programa Institucional de Bolsas de Iniciação Científica do Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico (PIBIC-CNPq). A entrevista foi realizada em ambiente reservado utilizando o KHQ, previamente validado. Este é composto de 21 questões, divididas em oito domínios: percepção geral de saúde (um item), impacto da IU (um item), limitações de atividades diárias (dois itens), limitações físicas (dois itens), limitações sociais (dois itens), relacionamento pessoal (três itens), emoções (três itens) e sono/disposição (dois itens). O KHQ é pontuado por cada um de seus domínios; as pontuações variam de 0 a 100 e quanto maior a pontuação obtida, pior é a QV relacionada àquele domínio(17). Outras duas escalas independentes foram aplicadas para avaliar a gravidade da IU e a presença e a intensidade dos sintomas urinários. Essas escalas são graduadas em quatro opções de respostas: “nem um pouco, um pouco, moderadamente, muito” ou “nunca, às vezes, frequentemente, o tempo todo”, exceto ao domínio ‘percepção geral de saúde’, com cinco opções de respostas (“muito boa, boa, regular, ruim, muito ruim”) e ao domínio ‘relações pessoais’ (“não aplicável, nem um pouco, um pouco, moderadamente e muito”). Os tipos de IU foram classificados segundo a terminologia da International Continence Society(1), descrieinstein. 2009; 7(3 Pt 1):308-13

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tos como: síndrome da bexiga hiperativa (BH), que é a presença de sintomas de urgência urinária e/ou urgeincontinência; IUE, perda de urina durante a realização de esforço físico; IU mista (IUM), associação de sintomas de perda de urina aos esforços associada à urgência e/ou a urge-incontinência. Os dados foram descritos por meio de média, desvio padrão, mediana e dos percentuais. Para avaliar a diferença e a associação entre as variáveis de controle, os domínios do Kings e as variáveis de IUE, BH e IUM, utilizou-se o teste exato de Fisher (por existirem frequências com n < 5 e nos domínios representados por médias e medianas, o teste de Mann-Whitney ou o t de Student (quando a distribuição dos dados passou pelo teste de normalidade de Kolmorov-Smirnov), e no caso de IUM, como havia mais de duas categorias, foi utilizado o teste de Kruskal-Wallis seguido de Mann-Whitney, ou ANOVA. O nível de significância assumido foi de 5%.

RESULTADOS A média da idade das pacientes do estudo foi de 51 anos. A maioria das mulheres convivia com parceiro (66%), era da raça branca (74%), apresentava como grau de escolaridade máxima o Ensino Fundamental Incompleto (68%). Renda familiar de até cinco salários mínimos ocorria em 92% dos casos e mais da metade das pacientes tinha a atividade doméstica como a principal. Aproximadamente metade das mulheres relatou como regular seu estado de saúde naquele momento e aproximadamente um terço classificou-o como ruim ou muito ruim. Quanto à interferência da IU em suas vidas, as pacientes se dividiram quase que igualmente em pouca ou moderada interferência (48%) e muita interferência (50%). Apenas uma paciente referiu que a incontinência não afetava a sua vida. A Tabela 1 apresenta a distribuição das pacientes segundo a percepção de estado de saúde geral referido por elas no momento da entrevista, e o quanto a IU afeta suas

Tabela 1. Distribuição percentual das pacientes segundo percepção de saúde e o impacto da IU Características Saúde no momento Muito boa Boa Regular Ruim Muito ruim Problema de saúde afeta a vida Nem um pouco Um pouco Moderadamente Muito

n

%

1 8 24 10 7

2 16 48 20 14

1 13 11 25

2 26 22 50

vidas. Aproximadamente metade das pacientes (42 a 56%) referiu que os sintomas de frequência, noctúria, urgência, urge-incontinência e IUE afetaram muito a QV. Por outro lado, infecções de repetição e dor na bexiga foram sintomas que a maioria das pacientes referiu afetar pouco ou moderadamente. Enurese noturna, incontinência durante a relação e dificuldade para urinar foram queixas referidas pela minoria das mulheres (Tabela 2). Em relação ao tipo de IU e aos domínios de QV questionados, observa-se que as pacientes com sintomas de BH e IUM apresentaram escores significativamente maiores no domínio sono e disposição quando comparadas àquelas com queixas somente de perda urinária aos esforços. Os demais domínios não mostraram diferenças estatisticamente significativas (Tabela 3). Também não houve diferença estatisticamente significativa quando correlacionados fatores sociodemográficos, como idade, escolaridade, estado civil e atividade profissional, com a percepção geral da saúde pelas pacientes e desses mesmos fatores correlacionados à interferência do problema de bexiga na vida das pacientes. Finalmente, analisou-se a correlação entre o problema de bexiga com a percepção geral da saúde no momento, sendo que não foi observada associação estatisticamente significativa (Tabela 4).

Tabela 2. Distribuição percentual das mulheres segundo a interferência dos sintomas urinários na QV Sintomas Aumento da frequência urinária Noctúria Urgência Urge-incontinência Incontinência de esforço Enurese noturna Incontinência durante relação sexual Infecções urinárias frequentes Dor na bexiga Dificuldade para urinar

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Um pouco n 7 13 9 11 9 5 4 7 12 4

Moderadamente % 14 26 18 22 18 10 8 14 24 8

n 12 7 4 7 11 5 3 10 8 3

% 24 14 8 14 22 10 6 20 16 6

Muito n 28 21 26 21 21 8 6 10 11 6

Ausência do sintoma % 56 42 52 42 42 16 12 20 22 12

n 3 9 11 11 9 32 37 23 19 37

% 6 18 22 22 18 64 74 46 38 74

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Tabela 3. Correlação entre o tipo de queixa de perda urinária com os escores de QV segundo domínios do Questionário Kings Health (n = 48) Variáveis

BH

IUE

IUM

Frequência

7

3

38

Média ± dp

59,5 ± 30,2

33,3 ± 57,7

49,1 ± 41,5

50

0

50

Frequência

7

3

38

Média ± dp

47,6 ± 29,6

27,8 ± 50,9

49,1 ± 41,5

50

16,7

50

Frequência

7

3

38

Média ± dp

50,8 ± 33,3

18,5 ± 32,1

36,1 ± 33,6

55,6

0

33,3

Frequência

7

3

38

Média ± dp

7,14 ± 48,9

44,4 ± 50,9

25,4 ± 55,7

0

33,3

8,33

Frequência

7

3

38

Média ± dp

81 ± 18,9

33,3 ± 22,2

54,4 ± 37,8

77,8

33,3

50

Valor de p

Limitações de atividades diárias

0,6771

Mediana Limitações físicas

0,3384

Mediana Limitações sociais

0,4279

Mediana Relações pessoais

0,6493

Mediana Emoções

0,0633

Mediana Sono e disposição

0,0368*

Frequência

7

3

38

Média ± dp

71,4 ± 36,9

5,56 ± 9,62

53,1 ± 34,6

83,3

0

50

Frequência

7

3

38

Média ± dp

56,2 ± 28,8

24,4 ± 15,4

60,2±27,6

60

33,3

63,3

Mediana Medidas de gravidade

0,0952

Mediana

Teste de Kruskal-Wallis; BH: bexiga hiperativa; IUE: urge-incontinência; IUM: incontinência urinária mista.

Tabela 4. Correlação entre a percepção geral da saúde no momento da entrevista e o problema de bexiga como fator de afecção à saúde (n = 50) Muito boa/boa

Regular

Ruim

n=9

n = 24

n = 10

Problema de bexiga afeta a vida Nem um pouco/um pouco Moderadamente Muito

FR 3 3 3

% 33,3 33,3 33,3

FR 9 6 9

% 37,5 25,0 37,5

FR 1 1 8

Muito ruim n=7 % 10 10 80

FR 1 1 5

Valor de p % 14,3 14,3 71,4

0,3080

Teste exato de Fisher; FR: frequência.

DISCUSSÃO O KHQ é considerado como questionário completo, que avalia tanto o impacto da incontinência nos diferentes aspectos da QV, como os sintomas do trato urinário baixo, percebidos pelas pacientes(19-20). A Sociedade Internacional de Continência o classifica como “altamente recomendável”, ou nível “A” para utilização em pesquisas clínicas, principalmente por sua popularidade e pelo fato de já estar em uso, após processos de tradução e validação em outros idiomas(21). O presente estudo incluiu pacientes encaminhadas da rede pública de atendimento primário ao ambulatório de Uroginecologia por qualquer tipo de queixa uri-

nária sem qualquer tipo de seleção quanto à gravidade. Da mesma forma, Tamanini et al.(17), no estudo de validação do questionário KHQ, basearam-se nas queixas clínicas das pacientes, apresentadas aos ginecologistas ou aos clínicos dos postos de atendimento básico de saúde. O mesmo padrão de seleção de pacientes tem sido reportado por outros autores na literatura(22). É possível que, à semelhança de Tamanini et al.(17), o presente estudo esteja limitado pelo predomínio de pacientes pertencentes a estratos socioeconômicos intermediários e baixos. Por esse motivo, tais pacientes poderiam apresentar alguma limitação no entendimento dos questionamentos. Além disso, esta amostra einstein. 2009; 7(3 Pt 1):308-13

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populacional apresentava baixo grau de escolaridade. Outros fatores, como idade e a quantidade de perda urinária também podem ser responsáveis pelas diferenças do comportamento pessoal frente à IU(11). Entretanto, mesmo conhecendo as variações individuais, sabe-se que, em maior ou menor proporção, a IU e seus sintomas associados podem repercutir negativamente não só na saúde física, mas em aspectos emocionais e psicológicos(23). Outra possível limitação do estudo é relativa ao momento em que as pacientes foram entrevistadas. Devese considerar que a entrevista foi realizada no momento em que as pacientes chegam para receber tratamento, podendo haver maior valorização da queixa urinária. Assim, a maioria das mulheres relatou seu estado de saúde de regular a muito ruim, e também considerou o problema da perda de urina com fator de moderada a acentuada afecção em suas vidas. Sintomas de frequência, noctúria, urgência, urge-incontinência e perdas aos esforços foram referidos como de muito impacto na QV. Por outro lado, dor e infecção urinária de repetição mostraram-se menos importantes. Resultados semelhantes foram encontrados em  estudo brasileiro anterior(20). Outros achados da literatura mostram que a IU associada ao aumento da frequência urinária, à noctúria e à urgência miccional demonstrou prejuízos nos escores dos domínios do KHQ, os quais envolvem as realizações de atividades físicas, domésticas, no relacionamento social, no sono e disposição da maioria das mulheres(20,24). Diferentemente das mulheres norte-americanas com IU que referiram que a esfera das relações sociais foi a mais afetada(25), as pacientes do presente estudo apresentaram os domínios das emoções e do sono mais afetados. Tal diferença pode ser explicada pelas diferenças entre o nível socioeconômico, de escolaridade e de atividade laboral remunerada entre essas populações. Apesar disto, a IU causa impacto na vida social, provocando restrições quanto a frequentar lugares públicos, viajar, dormir fora de casa e até fazer visitas aos amigos(14). Isso está relacionado ao fato de mulheres incontinentes, sejam elas casos de noctúria, urgência miccional ou até urge-incontinência, evitarem sair de casa. Essas mulheres, além de ficarem envergonhadas com o sintoma e temerem a percepção do odor da urina, não sabem se encontrarão um local adequado para realizar suas micções e sua higiene pessoal, no caso de perda urinária(11,26). O impacto da incontinência na QV das mulheres é muito estudado(27-30), entretanto não existem muitos dados em relação à diferença entre os tipos de incontinência. Observou-se neste estudo que as pacientes com BH e IUM apresentaram pontuação significativamente maior no domínio sono e disposição, quando comparaeinstein. 2009; 7(3 Pt 1):308-13

das àquelas com apenas queixa de perda urinária aos esforços. Isso sem dúvida é esperado, tendo em vista que os sintomas de BH incluem noctúria, enurese e, principalmente, urgência e urge-incontinência. Esses sintomas obrigam as pacientes a levantarem várias vezes à noite para urinar, ocasionando dificuldade em recuperar o sono, sobretudo por se tratarem na sua maioria de mulheres na perimenopausa. Apesar de não diferenciar o tipo de IU, uma publicação recente relatou que 63% das pacientes estudadas sentiam-se cansadas por não terem um bom sono, em virtude do fato de acordarem à noite para urinar(20), o que ratifica os achados do presente estudo. Quando se tentou identificar o quanto a incontinência afetava a vida das pacientes com alguns fatores sociodemográficos, não foram observadas diferenças significativas, o que provavelmente deve-se ao fato de ser uma amostra de mulheres com poucas diferenças entre si com relação a tais fatores. Os presentes achados demonstram que os sintomas de IU, associados ou não a outras queixas urinárias, apresentam impacto negativo na QV das mulheres que os experimentam. Estes resultados reforçam a necessidade dos profissionais de saúde questionarem sobre esse problema; e ainda dos serviços de atenção primária e secundária de saúde preocuparem-se em organizar equipes multidisciplinares no atendimento às mulheres portadoras de IU, no sentido de orientá-las e oferecer condições de atendimento acolhedor e individualizado, no que diz respeito aos aspectos emocionais e psicossociais das pacientes.

CONCLUSÕES Independente do tipo de IU, o KHQ evidenciou impacto negativo na QV das pacientes com queixa de incontinência. A maioria das mulheres atendidas considerou sua saúde no momento da consulta variando de regular a ruim e muito ruim; sendo o problema da bexiga tido como fator que muito afeta a saúde de aproximadamente metade das pacientes. Nenhum dos fatores sociodemográficos e culturais mostrou-se significativamente associado à QV das pacientes. REFERÊNCIAS 1. Abrams P, Cardozo L, Fall M, Griffiths D, Rosier P, Ulmsten U, et al. The standardisation of terminology in lower urinary tract function: report from the Standardisation Sub-committee of the International Continence Society. Neurourol Urodyn. 2002;21(2):167-78. 2. Thomas TM, Plymat KR, Blannin J, Meade TW. Prevalence of urinary incontinence. Br Med J. 1980;281(6250):1243-5. 3. Jolleys JV. Reported prevalence of urinary incontinence in women in a general practice. Br Med J (Clin Res Ed). 1988;296(6632):1300-2.

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