Balula, L. (2008) Dialéticas Espaciais na Cidade Contemporânea – e o Poder Integrador do Desenho Urbano. Cidades, Comunidades e Territórios (CET-ISCTE), nº 15 (pp. 55-65).

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Dialécticas Espaciais na Cidade Contemporânea

e o poder integrador do desenho urbano Luis Balula •

Resumo:

O presente

das transformações

artigo propõe uma análise das dinâmicas

estruturais

do pós-fordismo.

nização do espaço urbano e as contradições urbanismo

"pós-modernista".

cente privatização rejeitadas

pelo modernismo,

temporâneo

Face à crescente

do espaço público, enquanto

Examinam-se

inerentes

emergentes

os aspectos formais da reorga-

à sua actual produção num contexto de

despacialização

propõe-se

a recuperação

contributo

fundamental

para o reforço da comunicação

de urbanização

da esfera pública,

e à cres-

das morfologias

espaciais

do planeamento

físico con-

e da coesão social.

Palavras-chave: Desenho urbano; Espaço público; Espaço pré-modernista; Espaço modernista; Urbanismo neo-tradicional.

A oposição dialéctica entre urbanismo e urbanização, tal como definida por Andrew Merrifield em Dialectical Urbanism: Social Struggles in the Capitalist City (Merrifield, 2002: 115), é elucidativa das contradições inerentes à actual produção de espaço urbano. Enquanto que urbanismo se refere à cidade enquanto experiência vivida, uma experiência subjectiva de lugares com um valor de uso, representando um agregado de experiências individuais e ligações emocionais ao espaço, isto é, espaço enquanto

lugar de afectos; urbanização refe-

re-se à cidade enquanto capitalismo,

cidades

do modo de produção",

instrumento

enquanto

abstracto

"os centros

consequentemente

do

vitais lugares

experiência forma

de vi ver na cidade contemporânea

como o ambiente

urbano

determinado pelos processos de acumulação capitalismo pós-industrial, ou pós-fordista. O presente

ensaio

propõe uma análise

dinâmicas

de urbanização

formações

estruturais

emergentes

do capitalismo

ea

é fisicamente do das

das transpós-fordista.

Examinam-se alguns dos aspectos formais da organização do espaço urbano; como o cânon modernista modificou aspectos elementares da sua morfologia; e como - no seio de uma cultura "pós-moderna" entendimento uma reacção

de desenho

urbano,

orientada

do espaço enquanto com vista a restaurar

por um

mercadoria certos princí-

objectivos com um valor de troca, isto é, espaço enquanto mercadoria'. Desta forma, o espaço ur-

pios elementares de composição espacial, está presentemente a tomar forma. Procurar-se-á demons-

bano, e sobretudo

trar que, em resposta a forças de mercado que ten-

gera

tensões

maximizar maximizar,

"a produção

entre

aqueles

de espaço urbano" que

pretendem

o valor de troca e os que procuram ou por vezes apenas manter, determi-

nados valores de uso. A contradição

entre urbanis-

mo e urbanização expõe assim o conflito entre a

* I

dem a produzir

cidades

das, é possível identificar

incoerentes

e fragmenta-

um conjunto de princí-

pios integradores de desenho urbano com vista a resolver a oposição que Merrifield estabelece entre urbanismo e urbanização. Demonstrar-se-á

ain-

Arquitecto-Urbanista, Mestre em Planeamento Urbano, Doutorando em Planeamento Urbano e Políticas de Desenvolvimento na Rutgers University, NJ. Contacto: [email protected] A distinção entre o valor de uso e o valor de troca do espaço urbano, tal corno estabeleci da por Logan, J. e Harvey, M. (1987), baseia-se na elaboração de David Harvey a partir dos conceitos originais de K. Marx.

Cidades • Comunidadese Territórios,n." 15,2007, pp. 55 - 62

55

CIDADES Comunidades e Territórios

Fotomontagem: Peter Lyssiotis

da a importância do espaço público no reforço dos

entanto é questionável,

processos comunicativos da esfera pública"; e que,

sociedade urbana contemporânea, é o entendimento

perante a crescente "despacialização"

do espaço urbano enquanto a expressão fixa de uma cultura uniforme. É certo que a forma urbana ten-

ra pública, os planeadores

desta esfe-

com responsabilidades

no desenho da cidade têm hoje a oportunidade recuperar

os princípios

"esquecidos"

de

de organização espacial,

pelo modernismo,

para reforçar a comunicação social.

que contribuem

humana e a coesão

perante a fragmentação da

de a "exprimir e realizar os interesses

da classe

dominante, de acordo com um determinado

modo

de produção e um modo específico de regulação" (Castells, 2003:59). No entanto, visto que diferentes indivíduos ou grupos atribuem diferentes valores ao espaço, o processo de urbanização torna-se

Interpretação e produção urbano

do espaço

um fenómeno social complexo, e polarizador de tensões e conflitos. "Objectivos divergentes levam grupos de interesse a mobilizar-se para estimular,

Ninguém questiona que o espaço urbano, enquanto produto da acção humana, seja historica-

ou para limitar, o desenvolvimento urbano. Enquan-

mente produzido e socialmente interpretado. A sua

machines" (Molotch, 1976:309), formadas por gru-

está intimamente ligada à evolução

pos de interesse económico associados a grupos político-governamentais promovem projectos imo-

transformação

histórica e a sua morfologia é produto de determinados regimes de acumulação económica e correspondentes modos de regulação social. O que no

2

to que coligações pró-desenvolvimento,

ou "growth-

biliários com o duplo objectivo de maximização do lucro privado e dos pressupostos

benefícios

so-

A noção de "esfera pública", tal como definida por Habermas: uma arena de deliberação política que transcende as organizações políticas formais (parlamento, partidos, etc.) ao incluir igualmente os círculos deliberativos, mais ou menos informais, da sociedade civil.

56

Dialéticas Espaciais na Cidade Contemporânea

ciais e económicos decorrentes, algumas organiza-

nista,

ções da sociedade civil, motivadas por interesses

racionalismo positivista que determinaram

ambientais,

gresso tecnológico industrial, constituiu uma espécie de "experimentação social" baseada em for-

de preservação histórica, ou de equi-

dade social, têm vindo a organizar-se para contestar esses mesmos projectos. Da mesma forma, noções de "bairro" e "comunidade" têm vindo a tornar-se relevantes nos processos de contestação dos usos do espaço urbano. Como Paul Clark bem sintetiza, "a produção

de espaço tem vindo a ser

permeada por uma crescente sensibilidade

em re-

lação aos lugares" (Clark, 2003:35). decorrentes

dos processos

de

globalização têm igualmente produzido importantes efeitos na definição do espaço urbano. Ao longo das últimas três décadas temos assistido a profundas transformações sociais e económicas, a saher, resumidamente:

a crescente transferência

de

emprego do sector industrial para o sector de serviços;

o crescimento

florescente

de novas

tecnologias de comunicação e de transferência instantânea

de informação;

nos

mas arquitectónicas

mesmos

princípios

de o pro-

totalmente novas e na rejei-

ção de todo o conhecimento acumulado acerca das formas de "fazer cidade" do passado. O planeamento urbano modernista promoveu áreas urbanas hiper-simplificadas,

rigidamente

separadas

por

critérios de exclusividade funcional, eixos urbanos sem outra função que a da circulação de veículos

Neste sentido, é útil observar como as alterações estruturais

fundado

o domínio dos grandes

gmpos económicos e a internacionalização

dos seus

investimentos; a entrada das mulheres no mercado de trabalho e consequentes alterações na estrutura

entre essas zonas funcionais, e, em geral, sistemas urbanos completamente organizados em função de uma "inevitável" dependência do automóvel e consequente congestão urbana, seguida pela construção de auto-estradas e expansão suburbana, seguida por mais congestão e construção de mais auto-estradas (Newman e Kenworthy, 2003:241). Assim tomaram forma as megacidades, metropolitanas,

ou áreas

que constituem hoje o suporte es-

pacial do investim~nto económico e das relações sociais. Sendo certo que ."os padrões de povoamento constituem a fundação física da nossa sociedade" (Calthorpe, 1993:16), tal como na sociedade, tam-

do agregado familiar; o acentuado recuo do Esta-

bém neles ocorrem profundas fracturas. Os sistemas metropolitanos contemporâneos constituem

do-providência

"constelações

descontínuas

to sindical; a crescente privatização dos bens e ac-

ciais,

funcionais,

tividades tradicionais do Estado; a competição inter e intra-urbana pela acumulação de capital fixo em projectos imobiliários; a emergência de parcerias

(Castells, 2003:59) - e são precisamente estas condições que definem já o contexto de um urbanismo pós-moderno.

e o enfraquecimento

do movimen-

peças

de fragmentos espae fracturas

sociais"

entre os sectores público e privado em actividades de desenvolvimento urbano; e a articulação de novos valores liminais e ecológicos por parte da classe média. Todas estas alterações

estruturais,

sua vez, "estão a ser reproduzidas

no espaço atra-

por

vés de relações de propriedade articuladas pelo sector imobiliário, mediadas pelas profissões implicadas (bem

como

construido"

no desenho urbano, e reflectidas condicionadas

pelo)

(Knox, 2003:357).

zoável sugerir que o planeamento

Organizações formais e funções sociais do espaço público

no

ambiente

Será portanto rae o desenho ur-

bano - que durante o período modernista terão sido

Uma outra questão central à dialética entre urbanismo e urbanização estrutura-se através da definição de - e nas relações entre - espaço público e espaço privado. Os espaços públicos, enquanto infra-estruturas físicas da vida social, tiveram desde sempre uma importância fundamental

para

a cidade: é neles que as pessoas se encontram e desenvolvem actividades diversas, económicas, po-

instrumentais para o desenvolvimento do capitalismo industrial- prosseguem hoje uma lógica es-

líticas e culturais. Os espaços públicos podem ser-

pacial inerente ao capitalismo pós-industrial.

na sua maioria são tradicionalmente

O modelo de urbanização

modernista

é fre-

quentemente acusado de ter contribuído para o declínio da cidade tradicional e da sua inerente cultura urbana. O desenvolvimento urbano moder-

vir diferentes usos e possuir diferentes formas, mas constituídos

por mas, praças, parques. Uma concepção pré-modernista do espaço público, como a de Camillo Sitte no final do século dezanove, salientava o seu carácter "contido"

enquanto essencial:

os espaços

57

CIDADES Comunidades

Fotomontagem:

e Territórios

Peter Lyssiotis

deveriam ser visualmente fechados a partir de qual-

métricos a relações espaciais previamente complexas e orgânicas. Um dos resultado mais negativos

quer ponto do seu interior (Sitte, 1889). Raymond

do desinteresse

Unwin, seguidor das ideias de Sitte e figura cen-

nais, associado à ideologia do zonamento funcio-

tral do movimento das cidades-novas

nal, foi a produção de inúmeros espaços vazios ou

públicos,

enquanto

"salas

creveu exaustivamente

de estar"

da cidade,

inglesas, des-

as regras de desenho que

subutilizados

pelos espaços públicos

tradicio-

uma parte do tempo, com pouca ou

deveriam regular as relações entre o espaço públi-

nenhuma relação com outros espaços urbanos, e o

co e os edifícios privados circundantes,

consequente social.

por forma

a obter uma desejável sensação espacial de contenção e término de vistas (Unwin, 1909). O movimento moderno, no entanto - dominante na arquitectura

e urbanismo a partir da se-

reforço da fragmentação

Contra o anti-historicismo

espacial

e

do Movimento Mo-

derno, uma aproximação neo-tradicional

ao dese-

nho urbano começou a definir-se na década de 60

gunda metade do século vinte - opôs-se frontal-

e tem vindo a ganhar uma crescente influência nos

mente a este entendimento

processos de definição formal do espaço urbano.

do espaço público. Ao

advogar vastos espaços abertos, propícios à implan-

Gordon Cullen desenvolveu a ideia de visão serial

tação livre e flexível de edifícios isolados, o desenho urbano modernista condenou irremediavelmen-

de Sitte, dissecando

te a relação íntima entre o espaço público e os edi-

percorrido (Cullen, 1986). Kevin Lynch, igualmen-

fícios que o circundam.

te interessado na forma como a cidade é percebida

planeadores

A pouca atenção que os

do modernismo. terão prestado aos es-

paços públicos da cidade tradicional, terá sido para neles intervir através de projectos de "renovação" urbana e impor a simplicidade

58

dos traçados geo-

em detalhe a forma como o

espaço urbano é percepcionado

à medida que é

pelos seus habitantes, desenvolveu a célebre teoria da "imageabilidade", ou seja, a identificação dos elementos da estrutura urbana que devem estar presentes para criar uma imagem, e uma sensa-

Dialéticas Espaciais na Cidade Contemporânea

ção intensa, de coerência espacial (Lynch, 1960).

no - a tradicional infra-estrutura

Jane Jacobs lançou um verdadeiro assalto às fun-

ra pública. Quando pessoas e actividades

dações do planeamento urbano modernista, nome-

tribuem

adamente aos princípios do CIAM3, com uma elo-

dispersos, o espaço público perde parte das fun-

quente descrição do sucesso social e económico

ções que outrora cumpriu na vida social da cida-

dos padrões urbanos tradicionais rejeitados pelo modernismo (Jacobs, 1965). Arquitectos como Leon Krier e Rob Krier assinalaram a importância da

trocas comerciais, e para representações

complexidade

ção instantânea

tipológica

reinstauraram "contidos",

dos tecidos

urbanos

e

a importância dos espaços públicos definidos por edifícios: "os edifícios

no espaço

espacial da esfe-

em padrões

se dis-

cada vez mais

de: lugar de encontro para o debate político, para culturais.

Da mesma forma, quando as redes de comunicacriam novas arenas de debate e

sistemas de troca que não dependem do espaço físico nem de contactos face-a-face, a importância

devem constituir a carne da cidade e a pele do es-

dos

paço público" (Krier, 1978). Ruas e praças voltaram a fazer parte dum alfabeto, através do qual é

diminuida. O papel coesivo do espaço público, entendido enquanto "o lugar colectivo onde as pes-

possível ler e desenhar

soas desenvolvem as actividades funcionais e rituais que estruturam a comunidade" (Carr et al.,

o espaço urbano (Krier,

1979). Tomou-se sobretudo essencial criar de novo

espaços

urbanos

vê-se

gradualmente

"espaço urbano positivo", quer dizer, espaço urba-

1992:xi) entrou em processo de rápida erosão e,

no definido

consequentemente, os espaços públicos estão em vias de tomar-se irrelevantes para os processos

intersticial,

por edifícios,

em vez de espaço

ou aquilo que sobra depois da implan-

tação dos edifícios (Alexander, 1987). Também no actual panorama

do planeamento

urbano norte-

-americano a crescente influência de movimentos como o "Novo Urbanismo", o "Smart Growth", ou

comunicativos de uma esfera pública cada vez mais "despacializada"; Acrescidamente,

numa altura em que as au-

toridades públicas municipais

não têm a capaci-

o "Transport Oriented Development (TOD)" atesta uma clara aproximação a modelos neo-tradicio-

dade, ou a vontade, de o fazer, são os promotores

nais de povoamento e de desenho urbano. Na ver-

e a gestão dos espaços públicos. Uma das consequências visíveis do investimento privado em

dade, o que todos estes movimentos e autores pro-

privados que têm vindo a assumir a implementação

curam introduzir na agenda do planeamento é a necessidade de voltar a 'desenhar o meio urbano

espaços públicos é a implementação

de acordo com as regras e os elementos formais da cidade tradicional.

vos" fortemente orientados para o consumo comercial e/ou turístico de massas. Uma forte ênfase na

A importância

funcional do espaço público

generalizada

de espaços (semi- )públicos "seguros"

e "atracti-

imagem (cidade enquanto mercadoria espectacu-

tem vindo igualmente a sofrer consideráveis transformações ao longo das últimas décadas. Como afir-

lar) e na segurança

ma Madanipour, "comparativamente

mais eficaz para a promoção das localidades, e para atrair e reter o investimento económico. Centros comerciais, onde o espaço - exclusivamente orien-

à maioria dos

períodos históricos do passado, a importância

do

espaço público é hoje bastante reduzida" (Madanipour, 2003:142). Isto é, em parte, resultado da descentralização

e dispersão territorial das

. cidades, mas também é resultado de uma crescente "despacialização" são crescente

da esfera pública. A dimen-

da cidade

(estimulada

pelas

tecnologias

de transporte),

a especialização

actividades,

a separação entre os lugares de resitêm vindo a desconstruir

enquanto

tado para o consumo - é constantemente

o meio

vigiado

por forma a eliminar comportamentos indesejáveis; condomínios residenciais murados, onde "o público" é submetido

a uma pré-selecção;

"parques

temáticos", onde a experiência urbana é completamente determinada pela indústria do divertimento; ou jardins e praças que são fechados a determina-o das horas para excluir usos "impróprios", entre ou-

a coerên-

tros exemplos, são lugares em que faltam muitas

cia simbólica e funcional do espaço público urba-

3

é entendida

ambiente

de

dência e de trabalho, e as novas tecnologias comunicação,

das

social controlado)

(cidade enquanto

das qualidades

que definem os verdadeiros espa-

Congrés Internationaux d'Architecture Moderne, que se reuniu pela primeira vez em 1928 e veio a aprovar a Carta de Atenas em 1933.

59

CIDADES Comunidades e Territórios

ços públicos

de encontro

e interacção

social.

Em resumo, a crescente produção e gestão do es-

tolerância relativamente a um público cada vez mais diversificado e potencialmente conflitual.

paço urbano pelo sector privado tem vindo a limi-

Como Madanipour

tar drasticamente "pública" .

clusivos

a sua dimensão verdadeiramente

afirma, "a criação de 'nós in-

pode constituir um passo positivo para a

redução dos potenciais

O corrente envolvimento do sector privado no "desenvolvimento e gestão da cidade, no entanto, não deve ser ponderado apenas nos seus aspectos

diferentes interpretações

conflitos provenientes e expectativas

de

acerca do

espaço urbano. e promover um urbanismo de tolerância e coesão ocial" Madanipour; 2003: 149).

negativos. O trabalho colaborativo dos planeadores físicos da cidade com a administração pública, com grupos de interesse

da sociedade

bém com os grandes investidores são mais "liberal"

civil, mas tamprivados - a ver-

de um regime de governância-

pode ser orientado por forma a encorajar espaços que promovam uma relação equilibrada entre os interesses

Inovação e tradição: as opções do desenho urbano De um ponto de vista puramente estético, ou es "l'S~"CO. "um urbanismo de tolerância e coesão

privados e as funções cívicas necessá-

rias a um público diversificado.

Interessa

salien-

tar que a tarefa de um planeador físico é distinta da tarefa do arquitecto (trabalhando num único imóvel) pois o seu projecto transcende

e assumir diversas formas. No entanto, rtante c

linhas de pro-

priedade e opera através de divisões entre o público e o privado. Numa altura em que "os mercados imobiliários

subdividem

r

ercadoria cultural, e o planeamento urs-moderno pode ser visto enquanto um pro-

urbano em

e o espacial dessa tendência. Numa era ue as cidades apostam fortemente na imagem

gerando cidades inum bom desenho ur-

" ar vantagens competitivas relativamente .;;cidades, a produção e o consumo de ar-

o ambiente

compartimentos estanques, coerentes e fragmentadas",

otar que a produção estética se en-

ente integrada num regime de mer:nodernismo promoveu o "design" en-

bano deverá procurar "contrariar

este factor eco-

nómico através do reforço da coesividade da experiência urbana" (Sternberg, 2000:275).

Assim sen-

o

ectura e espaço público encontram-se

as m smas condições

sujeitos

de mercado que qualquer

produto de consumo. O "edifício assinado"

in-

pe o arquitecto superstar é exemplar de um tipo de

vestidores privados e o Estado deverá procurar con-

produção pós-moderna de espaço urbano que comnina marketing de imagem, branding, e estímulo

do, o esforço colaborativo trariar a fragmentação

Fotomontagem:

60

entre planeadores.

socioespacial,

Peter Lyssiotis

e encorajar

Dialéticas Espaciais na Cidade Contemporânea

ao consumo de produtos "de marca". E, neste con-

acordo com uma lógica de acumulação cultural, e

texto, a ideia de "novidade" é fundamental. A pro-

não apenas seguir uma estética "da moda", tipica-

pósito da lógica cultural do capitalismo pós-indus-

mente orientada para os imperativos da concentra-

trial, J ameson assinala a necessidade

ção de capital económico, em detrimento do capital social e do capital cultural.

económica

de produzir ambientes com uma "aparência de novidade" a um ritmo cada vez mais "frenético" (Jameson,

1984:56).

subjacente

à produção espacial pós-moderna,

Afinal, é esta a ideologia já

Novas áreas urbanas,

novos espaços públi-

cos, e intervenções em áreas urbanas e espaços públicos existentes, devem contribuir formalmente

latente, aliás, no ideário do espaço urbano moder-

para reforçar o sentido de permanência

nista: "inovação estética e experimentação,

bilidade e não reflectir apenas as tendências

com

de uma sociedade

e de esta-

de consumo

pas-

vista à captação e acumulação de capital" (Clarke,

sageiras

impa-

2003:37). Inovação estética e "aparência de novidade"

ciente por novidades e ansiosa por mudança. Cabe

são conhecidas estratégias utilizadas no marketing

aos planeadores urbanos com responsabilidades no desenho da cidade investigar os bons exem-

da maioria dos produtos de consumo: de acordo

plos de organização espacial pré-modernista,

com uma lógica estritamente

forma a redescobrir

economicista,

é su-

as qualidades

posto que os consumidores substituam bens (anti-

bano positivo"

gos e "desactualizados")

espaço público "contido"

por outros bens relativa-

mente idênticos (mas "actualizados")

com uma fre-

por

do "espaço ur-

(Alexander et al., 1977), isto é, no qual as pessoas se

possam encontrar para actividades variadas, e não

quência cada vez mais curta, com vista a aumentar

apenas com os desígnios reducionistas

os lucros da produção e acelerar a renovação dos

mo ou divertimento

stocks. Quando aplicada ao espaço urbano, no entanto, a "aparência de novidade" revela-se uma ten-

da cidade consideram os argumentos a favor dos usos do desenho urbano para influenciar o com-

dência estética bastante problemática.

portamento social enquanto puro determinismo ambiental. No entanto, "é tão simplista afirmar

Ainda que

tal estratégia, de um ponto de vista estritamente económico, possa até resultar - implicando lucros imobiliários com a substituição

de estruturas

ur-

do consu-

de massas. Alguns teóricos

que a forma física da comunidade

não tem qual-

quer impacto no comportamento

humano, como

banas, digamos, cada vinte anos - o entendimento

afirmar que é possível promover determinados

do espaço urbano enquarito mais uma mercadoria

comportamentos através do desenho urbano" (Calthorpe, 1993:9). O desenho, por si só, não

substituível e "actualizável" é socialmente insustentável. A relação humana com o espaço baseia-se num sentido de permanência,

não de transito-

será concerteza suficiente para provocar mudança social, mas comprovadamente

a forma física

riedade; e não se trata apenas de uma questão histórica, cultural, ou social, mas igualmente de uma

dos lugares inibe determinadas

actividades

condição física, emocional e orgânica. Ambientes

composição espacial que produziram as ruas e as praças pré-rnodernistas - espaços que ainda hoje

quanto favorece certas outras. Os princípios

ende

urbanos saudáveis sobrevivem inúmeras gerações, e as pessoas desenvolvem afectos com os lugares

continuamos

construídos ao longo de toda a sua vida. No entan-

dem provar-se decisivos para a recuperação

das

to "a paisagem pós-moderna representa uma des-

qualidades

No-

truição de longevidade, de acumulação cultural e

vos modelos de fazer cidade deverão pois "pro-

de supostas garantias de permanência

a gostar e a querer preservar - poperdidas

dos espaços públicos.

(... ) resul-

curar restaurar o melhor das antigas tradições do

tante da oposição entre os interesses de mercado e o espírito do lugar" (Zukin, 2003:52), em que este

desenho urbano, adaptando-as às novas condições" (Calthorpe, 1993:9), tendo em vista a pro-

é sistematicamente

moção de lugares urbanos capazes de incentivar.

sacrificado em função daque-

les. Neste sentido, o desenho do espaço público deve procurar apostar na continuidade histórica de

a coesão social e estimular os processos comunicativos da esfera pública.

61

CIDADES Comunidades

e Territórios

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