Baroni, R. (2014) « A tensão narrativa através dos gêneros : questões éticas e estéticas do suspense », in Experiência estética e performance, B. Picado, C. Magno Camargos Mendonça & J. Cardoso Filho (dir.), Salvador, Edufba, p. 63-82.

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A TENSÃO NARRATIVA ATRAVÉS DOS GÊNEROS: QUESTÕES ÉTICAS E ESTÉTICAS DO SUSPENSE1

Raphael Baroni2

TENSÃO NARRATIVA E STORYTELL/NG: OS IRMÃOS BOGDANOV DAS CIÊNCIAS HUMANAS E SOCIAIS

Os trabalhos mais recentes no campo da Psicologia cognitiva insistem mais e mais sobre um caráter inextricável das relações entre pensamento e corpo, cognição e emoção, a um tal ponto que falar de inteligência emocional não mais aparece mais como um paradoxo ou um oxímoro.3 Igualmente, no campo da estética, é absurdo perguntar se a dimensão narrativa que se ma­ nifesta principalmente em uma forma de pathos poderia ter um valor, fosse este ético, intelectual ou educacional. Em outras palavras, nestas linhas, meu objetivo será o de me interrogar sobre a inteligência do suspense. Para fazer isso, vou tentar sair do quadro restrito dos estudos literários, a fim de desta­ car, em contraste com outros tipos de discurso, o sentido e o valor do suspense na ficção em geral, e particularmente no romance. Será, portanto, também a questão daquilo que é chamado na França, nos últimos 15 anos, de stroytelling, Tradução de Benjamim Picado. 2

Professor da Universidade de Lousanne.

3

Ver, por exemplo, as obras de Antonio Damasio (1995). ou de Daniel Goleman (1999).

isto é, uma prática ou estratégia discursiva que tende a saturar todas as áreas

tensão narrativa seria contrária à realização de uma arte cujo objetivo mais

das sociedades contemporâneas. Veremos que, para lançar as bases para uma

nobre seria a exposição de sua própria materialidade;

reavaliação da arte de contar histórias e, mais especificamente, da arte de

Enfim, o terceiro argumento é bem mais trivial e consiste simplesmente em afirmar que o enredo é comercial. Ora, como Bourdieu o demonstrou, na lógica

criar suspense, é necessário superar a repulsa que os pesquisadores em ciên­ storytelling. Isso vai exigir uma restituição do suspense, por ressituá-lo em seu

da distinção própria ao campo artístico, não se pode apelar ao grande público sem, ao mesmo tempo, perder a sua autonomia e seu valor simbólico. supomos

contexto, tendo em conta o gênero narrativo, a identidade dos falantes e as

que os grandes escritores deveriam necessariamente permanecer incompreen­

cias humanas ou sociais experimentam com respeito à tensão narrativa e ao

didos, devendo assim idealmente escrever livros ilegíveis. Relativamente a este plano, lembramo-nos das críticas que Roland Barthes dirigiu ao suspense, que ele associava aos "hábitos comerciais e ideológicos de nossa sociedade, que

questões pragmáticas da interação discursiva.

recomenda 'jogar fora' a história, uma vez que tenha sido consumida ('devora­

CRÍTICAS DA INTRIGA E DA TENSÃO NARRATIVA

da'), para que possamos então passar para outra história, comprar outro livro." (BARTH ES, 1970, p. 20)

A questão do valor da intriga foi por um longo tempo objeto de debates acalorados no campo dos estudos literários e, pode-se até argumentar - em continuidade com o trabalho de Michel Raymond (1966) e Pierre Astier (1969) -

que a história do romance (pelo menos na França) pode ser lida como uma

CRÍTICAS DO STORYTELLING

série contínua de crises e renascimentos da intriga. Ao curso desta história, é Do lado do storytelling, saímos do campo da crítica literária, com a con­

possível identificar três argumentos básicos que muitas vezes têm sido avan­

denação se colocando de imediato em um nível bem mais geral, que já não

çadas pelos críticos da intriga:

mais diz respeito a estética, mas à ética, engajando as formas narrativas que O primeiro argumento é de natureza realista: ele consiste em afirmar que o

ocupam o centro de nossa sociedade. Bem frequentemente, o discurso narra­

enredo é um puro artifício literário e que a vida autêntica os dispensa. Sus­

tivo aparece como a contraparte negativa do discurso racional, e considera-se

tenta-se aí que o suspense que cria os nós e os desata - a intriga que orienta

que seu poder de sedução seria particularmente prejudicial no contexto de

a narrativa para uma resolução possível - somente se encontra em romances

uma sociedade democrática baseada na razão e no diálogo.4 Em tal contexto,

de ficção ou em contos. É bem conhecido este argumento feito por Roquentin,

pode-se criar uma lista não exaustiva de defeitos que são tradicionalmente

que crê poder afirmar que "na vida, nada acontece", e que entre viver e contar,

associados aos discursos narrativos:

"há que se escolher"; O segundo argumento está relacionado à potência de imersão que é associado

Em primeiro lugar, há uma tendência recorrente de se associar e, quem sabe

com a intriga. Com efeito, este último é suposto para reforçar a ilusão referen­

até, a se confundir formas narrativas e formas ficcionais. Em uma crítica que

cial e da adesão do leitor ao romance. Em um contexto estético que se poderia

relembra o enredo assim chamado de artificial, insiste-se em que "contar uma

qualificar - para ser simples - de modernista, argumenta-se, portanto, que a 4

Raphael Baroni

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Para uma reflexão crítica sobre a condenação do storyte/ling, indico J. Migozzi (201o, p. 247.255).

A

tensão narrativa

através dos gêneros:

questões éticas e estéticas

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do suspense

história" equivale à mesma coisa que "contar histórias". Em outras palavras, o ato narrativo consistiria em fabricar uma história e, assim, trair a realidade; Em segundo lugar, num nível retórico e argumentativo, a narrativa surge como uma poderosa ferramenta de persuasão, capaz de engendrar o pathos, por nar­ rar um caso exemplar. Portanto, podemos contrastar a persuasão pela narrativa e pela emoção, à persuasão que passaria sobretudo por argumentos lógicos e refutáveis; Em terceiro lugar, de acordo com o exposto, pode-se ainda opor o discurso nar­ rativo ao discurso racional, salientando que a narrativa é geralmente monológi­ ca, o que subtrai aquilo a que jürgen Habermas chamou de �'ética do discurso"; (HABERMAS, 1992)

narratologia [...]), o storytel/ing experimenta, com efeito, um sucesso supreendente nos Estados Unidos, a que al­ guns qualificam como triunfo, ou ainda, como 'reviva!'. É uma forma de expressão que se aplica a todos os setores da sociedade e transcende as divisões políticas, culturais ou profissionais, creditando aquilo a que os cientistas so­ ciais têm chamado a narrative tum e que foi comparada a partir daí, à entrada em uma nova era, a 'idade narrati;a'. (SALMON, 2007)

Não é de surpreender que Christian Salmon, ao apresentar esta nov � "idade narrativa", tenha retomado a crítica habitualmente direcionada para

0

discurso narrativo, mas situando-a em um contexto contemporâneo dominado pela cultura americana, à qual ele opõe os "bons velhos tempos", isto é, à épo­

Por fim, a narrativa colocaria à frente os casos particulares, em detrimento da regra geral, o que agravaria a sua irracionalidade e seu atoleiro na empiria. Com efeito, a narrativa torna-se relatável quando se refere a um event9 sin­ gular, no qual a carga emocional é proporcional à sua dimensão misteriosa e imprevisível. Em outras palavras, na narrativa de suspense, o evento faz parte de uma multitude de potencialidades, de poss'íveis caminhos que formam uma espécie de labirinto, ao invés de se submeter a uma necessidade, a uma ordem causal que visão sobredeterminante permitiria aparecer mais tarde.

Se isso não foi suficiente para desqualificar o storytelling, uma evolução cultural recente veio aguçar ainda mais o problema. O simples fato de que es­ tamos falando hoje, na França, storytel/ing (em vez de "narrativa") descreve a natureza do problema e sua origem. Em seu best-sel/er, Storytelling: /e machine à fabriquer des histoires et formater /es esprits, Salmon Christian descreveu a

ca a qual os contadores de histórias sabiam confinar-se a seu papel de griot, poeta ou, a rigor, um romancista: As grandes narrativas que pontuam a história da humani­ dade, de Homero a Tolstoi e Sófocles a Shakespeare, con­ tavam mitos universais e transmitiam lições de gerações passadas, de sabedoria, resultados de uma experiência acumulada. O storytelling percorre o caminho inverso: ele aplaca sobre a realidade as narrativas artificiais blo­ queia as interações, satura o espaço simbólico de sé �ies e histórias. Ele não mais narra a experiência passada, mas desenha linhas e direciona o fluxo de emoções. Longe destes 'percursos de reconhecimento' que Paul Ricoeur decifra na atividade narrativa, o storytelling implementa engrenagens narrativas, segundo as quais os indivíduos são levados a identificar padrões e cumprir protocolos. (SALMON, 2007)

"virada narrativa" que ocorreu nos Estados Unidos em meados da década de 1990:

Reconhecem-se aqui os comentários que acabo de mencionar: contar uma história seria um "truque" que deturpa a realidade, que bloqueia as inte­ Há muito considerado como uma forma de comunicação para as crianças [sic], em que a prática foi confinada às horas do lazer, ao tempo que a análise ficou restrita aos estudos literários (lingüística, retórica, gramática textual,

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rações, que orienta o fluxo das emoções do público e, em última instância, que o manipula. E depois de Christian Salmon, a situação seria muito pior hoje do

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que no tempo de Homero, Sófocles e Platão, pois a crítica da história f nciona como a crítica de um grande Satã: a saber, o complexo militar-industrial ame­ ricano, que se vale da forma narrativa para nos escravizar.

CONTEXTUALIZAR A CRÍTICA

Eu não teria a ambição de discutir ponto por ponto, estes supostos de­ feitos de tensão narrativa e do storytelling. Que me permitam apenas men­ cionar

0

fato de que

0

Para além disso, do lado da análise do discurso, Raphael Micheli mos­ trou recentemente que, no debate parla mentar francês, são precisamente os opositores da pena de morte, e não seus partidários, que se apoiaram mais 1 frequentemente sobre argumentos acer ca do pathos. Aí estão aqueles que deveriam contribuir na redistribuição a cada uma destas posições de sua devida identidade de decoro moral e dos meio s corretos de sua argumentação. Do mesmo modo que Micheli também cons egue mostrar que o pathos não se evade do campo da razão crítica, ele afirm a, com efeito, que

caráter assim chamado de artificial ou inestético, que

foi amplamente criticado nos anos 1960-1970, está longe de ser unânime, de­ vendo ser colocado em seu contexto histórico e cultural. Assim, Wayne Booth (19s3, p. 121) afirmou que: A maior parte dos ataques sobre o caráter pretensamente inestético da intriga e da implicação emocional das nar­ rativas estavam baseadas na redescoberta moderna do 'distanciamento estético'. ( ... ] Mas. não foi até o (século XX] que as pessoas começaram a levar a sério a possibili­ _ a uma dade de que o poder do artifício que nos mantem distância da realidade poderia ser uma virtude em vez do que simplesmente um obstáculo inevitável para realismo total.

(...] se aceitarmos que as emoções implicam 'diferenças entre idéias e crenças', pode-se pensar que eles não esca­ param às garras do debate ( ...] as emoções se vêem, por vezes, sujeitas aos processos de refutação ou justificação. (MICHELI, 2010, p. 52-53) Em suma, embora se admita que o suspense contribua na melhora das vendas de livros ou jornais, e, para além disso, que seja uma poderosa fer­ ramenta de persuasão, a mim parece ser necessário que haja uma nuance de algumas críticas que lhe foram construídas. Para colocá-lo de forma mais simples, estou convencido de que o valor do suspense depende, antes de mais nada, do gênero discursivo que o atualiza, das constrições pragmáticas e da finalidade da interação discursiva. Isto é o que eu vou ilustrar, comparando

Eu acrescentaria que o caráter imoral de pathos também poderia ser dis­

três extratos de narrativas bem diversas.

cutido. sobre este ponto, mencionarei simpesmente o fato de que esta paixão

O primeiro excerto é retirado de um romance francês bem conhecido,

não é a razão que Schopenhauer localiza no fundamento da moralidade, mas

que é considerado um dos protótipos do gênero. Neste momento da história, o

sim a compaixão, a identificação, enfim, a piedade. (SCHOP E NHAUER, 1991)

protagonista Fabrice Dei Dongo se encontra no campo da batalha de Waterloo:

Quanto a Wittgenstein (1961, p. 103), ele afirmou que, por um lado, a ética e estética são uma e a mesma coisa e que, por outro lado, "dar com a cabeça contra os limites da linguagem, isto é o ética". O que significa destacar a difi­ culdade, ou a impossibilidade, de tratar as questões morais e estéticas sob um plano puramente lógico.

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Ah! Aqui estou eu, então, finalmente, em um incêndio!, ele o disse. Eu vi o fogo! repetia ele para si mesmo com satisfação. Aqui estou, um verdadeiro soldado. Neste mo­ mento, a escolta ia a galope, e nosso herói percebeu que eram balas que faziam voar a terra para todos os lados. Ele olhou bem para o lugar de onde os tiros vinham, viu a fumaça branca da bateria a uma enorme distância e, no

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meio do ronco igual e contínuo produzido pelos golpes de canhão, pareceu-lhe poder ouvir descargas bem mais próximas; ele não compreendia nada. (STENDHAL, 19 64)

Estados Unidos: a dois meses da eleição, Obam a e Rom­ ney cabeça a cabeça nas pesquisas, [...] O suspense mantêm-se inteiramente na feroz corrida para a Casa Branca, entre Mitt Romney, recém-inves tido pelos republicanos, e Barack Obama, que vai tentar nesta semana convencer os americanos ainda indecisos de que ele merece um segundo mandato. Um pouco mais de dois meses antes da eleição presidencial de 6 de novem bro, as pesquisas mostram uma igualdade quase perfei ta entre Romney e Obama, vendo-se derreter a vantagem que o presidente manteve sobre o ex-governador de Massa chu­ setts ainda há dois meses. (ASSOCIAÇÃO FRANC E PRES­ SE, 2012)

O SEGUNDO T RECHO É RETI RADO DE UM ARTIGO de imprensa, publi­ cado em um jornal suíço,s numa sexta-feira, a 13 de março de 2009. Trata-se de uma notícia particularmente sangrenta, cujo protagonista foi recentemente condenado à prisão perpétua: Lucie Trezzini deita-se [sic] sobre o chão do pequeno apartamento de Daniel H., inconsciente. Por volta de 19 horas, numa quarta-feira, 4 de Março, a noite cai sobre Rieden (AG) e a jovem de Fribourg, 16 anos, se agarra à vida. Apesar dos golpes que lhe são infligidos na cabeça por seu agressor, com uma fúria indescritível. Daniel H., este jovem de 25 anos, com uma longa história de delin­ quência, a observa mergulhada na escuridão. Mas, como as coisas não avançam rápido o suficiente, este cozinhei­ ro desempregado toma uma faca e transforma-se num 'açougueiro sangrento', um 'assassino louco', como relata, emocionado, um policial da região, que nunca viu tal bar­ bárie. o 'açougueiro de Rieden' se aproxima então do cor­ po sem vida de sua vítima, que ele não conhecia quatro horas antes e com quem ele cruzou, por acaso, na estação de trem de Zurique. Como um furioso, ele enfia a lâmina de aço na garganta da vítima. Uma, duas, três vezes [ ..] A jovem menina, que não foi abusada sexualmente, entre­ gou sua alma rapidamente.

'

Antes de proceder à análise propriamente dita, eu gostaria de definir em poucas palavras aquilo que eu quero dizer com o suspense. No prolonga­ mento dos trabalhos que se relacionam com a narratologia retórica e cogni­ tivista, considero que a narrativa é amarrada pela produção de um suspense, quando o evento narrado se articula com virtualidades alternativas daquilo que poderia ocorrer, mesmo quando o resultado dos eventos já é previamente conhecido, isto é, mesmo quando se sabe de antemão que Fabrice sobreviverá à batalha ou então que Lucy não sobreviverá à agressão que sofre. De fato, como mostra o trabalho sobre a força resistente do suspense aos processos

.

de releitura das narrativas, este efeito se mantém eficaz, na medida em que o leitor seja capaz de imaginar que o evento que lhe é narrado poderia tomar um destino diferente, mesmo na ausência de uma incerteza sobre este desdo­

o

terceiro extrato é também um artigo, publicado a 2 de setembro de

bramento. (BARONI, 2007)

2012, no site do jornal Le Point. Ele se refere a um evento político do qual já conhecemos agora a resolução: A NARRATIVA DE FICÇÃO E A ATUALIZAÇÃO DA HISTÓRIA Comentarei agora o primeiro exemplo, começando por mostrar de que maneira o suspense é criado: primeiramente, a narrativa nos coloca no nível 5

Trata-se do diário Le Matin, propriedade do grupo Edipresse. O artigo em questão, à página três, está situado na seção « Zoom » e foi assinado pelo repórter Patrick Vallélian.

da percepção e da compreensão limitada do personagem, uma vez que ele é

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lançado no coração do conflito. Assim sendo, a perspectiva é propositadamen­

focalização da narrativa, a qual permite que nos coloquemos na perspectiva

te restrita e, mesmo quando conhecemos o resultado desta famosa batalha,

de um personagem que age e sofre os eventos:

numa escala coletiva, o destino do herói ainda encontra-se em aberto e sus­ cetível de se ramificar em quaisquer direções, tal é o percurso como o curso errático da escolta à qual Fabrice se inscreve por acaso, já que ele não pôde conduzir o curso de sua montaria. Recoloquemos este suspense, mas agora no seu contexto romanesco, para tentar compreender sua função estética. Podemos partir da constata­ ção banal de que quando lemos um livro de história, o nosso investimento

A narração é focalizada sobre e em um personagem de ficção[ . .] criando um efeito de presença que dá a impres­ são de que ele se abre para um futuro desconhecido. [ ... ] Somente a ficção é capaz de criar a impressão de que ela apresenta estes eventos históricos no momento em que eles ocorreram, trazendo assim para a vida a 'matéria bru­ ta e vivente' da experiência, sem as distorções do após­ fato. (COHN, 2001, p. 228-229) .

emocional face ao relato de uma batalha é muito menos forte do que quando estamos envolvidos na trama de um romance de Stendhal ou Tolstoi. Tente, mos explicar esta característica que se relaciona com aquilo que Dorrit Cohn

e através da magia de imersão, o leitor tem a ilusão de ali estar, igualmente.

chamou de o "próprio da ficção":

Decerto que, ao aprofundar-se assim, o mundo perde a inteligibilidade, mas

Fabrice pode exclamar: "Aqui estou eu, finalmente, no meio do fogo!",

Cohn demonstra que, por este artifício, o romance chega a se aproximar da­ Em primeiro lugar e antes de tudo, a ficção permite ao escritor fixar os eventos históricos sob a forma de uma experiência pessoal e imediata dos seres humanos indivi­ duais. (COHN, 2001, p. 227)

Isto não é simplesmente uma questão de escala, mas é também uma questão de perspectiva temporal. Cohn acrescenta, com efeito, que a "uni­ dade infinitesimal" que "escapa à esquematização do historiador implica pri­ meiramente o mergulho nas profundezas singularizadas das almas ficcionais e/ou históricas. Implica também (e simultaneamente) a instantaneidade do

quilo que ele considera como "matéria bruta e vivente" da experiência. Esta é a mesma observação que levou Bakhtin (1978, p. 466) a ar9umentar que: O interesse específico para a suíte ('o que vai acontecer?') e a conclusão ('como isto vai terminar?') não caracteriza a possibilidade do romance, a não ser em uma zona de proximidade e contato, e portanto impossível em uma re­ presentação distante. A representação 'à distância' dá o evento em sua totalidade, e o interesse pelo assunto (que é ignorado) não pode existir aí. O romance especula sobre a categoria de ignorância.

momento temporal." (COHN, 2001, p. 227) Assim sendo, quando estamos imersos em uma novela, o tempo ainda

Novamente, para Bakhtin (1978, p. 472), esta "ignorância" não é consi­

não foi ultrapassado, mas ainda está em curso de se constituir, ele é ainda uma

derada como um defeito ou falta de inteligência. Ao invés disso, ela tem um

tessitura de potencialidades atualizáveis, que se articulam sobre os eventos já

valor positivo, já que a perspectiva temporal do romance permite à repre­

lidos. É assim que o leitor pode imaginar as possíveis lesões que ameaçam Fa­

sentação descer ao nível do que ela significa, por seu turno, enquanto "uma

brice, mas também os feitos heróicos que ele poderá realizar, em suma, tudo

realidade atual, fluida e inacabada". Somente neste contexto, o homem pode

o que poderia acontecer neste momento na história, e que provavelmente

deixar de ser um prisioneiro de seu destino ou o seu papel, e adquirir, ao

jamais acontecerá. Cohn também salienta a importância desempenhada pela

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contrário, uma "iniciativa ideológica e lingüística que modifica sua figura." (BAKHTIN,1978, p. 471)

Nesta experiência simulada, podemos aprender a despoetizar a guerra, por vivê-la na maré da experiência, na confusão e na carnificina, e não no

Assim sendo, é o valor ético da narrativa que depende desta margem de

mundo higienizado de políticos e estrategistas. Mais uma vez aqui, o próprio

liberdade que nos permite comparar a ação do protagonista com outras ações

da ficção é o de recolocar a ética no campo prático e permitir conjugar o con­

possíveis, assim como opomos a ação correta à incorreta. No campo crescente

ceituai e sensível. Isso pelo menos é a opinião defendida por Sandra Laugier

de pesquisas sobre a relação entre ética e literatura, o romance aparece ainda

(2006, p. 16), que afirma que:

como um verdadeiro laboratório de experiências morais. Assim, como afirma Sandra Laugier (2006, p. 5) que "(...] o conteúdo moral das obras literárias não pode ser reduzido a um edifício ou aos julgamentos morais: ele tem bem mais a ver com a experiência moral e com uma especificidade humana desta experiência." como afirmou igualmente Jacques Bouveresse (2006, p. 196), também na nossa relação com o literário, torna-se então necessário dar-se conta de

Não há [...) o que separar, como tendem fazer, de uma for­ ma ou de outra, muitos teóricos contemporâneos, entre o conceituai e o sensível, em termos de moral: a educação moral fornecida pela literatura é intrinsecamente concei­ tuai e sensível. A educação do conceito pela experiência e percepção, e inversamente, formação da experiência e educação dos sentimentos, pela sensibilidade do conceito.

que: [ ...) o interesse por vezes apaixonado que associamos à pessoa e às vidas dos personagens de ficção, a seus dese­ jos e suas emoções, aos problemas e conflitos éticos com que se defrontam, às experiências e aventuras morais em que elas estão envolvidas, àquilo que faz de suas exis­ tências um sucesso em sucessos das suas vidas ou, pelo contrário, fracassos mais ou menos lamentáveis.

No caso do herói de Stendhal, obviamente, pode-se ficar chocado pelo júbilo de seu personagem, uma vez posto no coração de um conflito sangren­ to. Pode-se imaginar que, inversamente, Fabrizio deve ser aterrorizado ou horrorizado pelo caráter mortífero dos combates, mas nós constatamos que ele simplesmente não considerou este aspecto das coisas, antes de ser com elas confrontado e de tombar, pálido, na frente de cadáveres mutilados. Qual­ quer que seja o nosso grau de adesão ao perfil moral do herói, este último torna-se um personagem de ficção através daquilo que é possível viver como 0

que Jean-Marie Schaeffer (1999, p. 120) chama de "simulação lúdica", e que

depende de uma forma de "aprendizado mimético".

Raphael Baroni 74

TENSÃO NARRATIVA NO NOTICIÁRIO COTIDIANO

Gostaria agora de enfrentar estas qualidades éticas e estéticas do sus­ pense literário, a saber, aquilo a que poderíamos definir como suas qualidades pedagógicas ou educativas, partindo dos outros dois extratos de textos, que dizem respeito a gêneros jornalísticos. No primeiro deles, o jornalista opera a reescritura de uma notícia, a fim de criar um efeito de hipotipose, da qual esta narrativa é a marca mais evi­ dente. Ao encenar o evento desta forma, temos a impressão de estarmos re­ vivendo-o em sua atualidade, nos achando in medias res, no momento em que a vítima, depois de ter sido levada para o apartamento do criminoso, ainda se agarra à vida. Por esse artifício, o pathos é acentuado e ato assassino torna-se particularmente sórdido. Com efeito, neste instante, Daniel H., que "olha para sua vítima mergulhada na escuridão", ainda parece ter a opção de tomar-se de remorsos e se salvar. Mas, ao contrário, o personagem escolhe pegar uma faca, transformando-se naquilo a que o jornalista se refere como um "açou­ gueiro sangrento". Mesmo a repetição do gesto fatal não nos é poupada, como

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e

estéticas do suspense

se a cada golpe das facadas ("uma, duas, três vezes" ) ainda se pudesse esperar que o braço de Daniel H. parasse. o

que é surpreendente é que, ao ceder à tentação do sensacionalismo,

ção seria perfeitamente legítima num tribunal, na medid a em que a defesa poderia muito bem argumentar racionalmente para contra dizer os elementos factuais da narrativa. E essa defesa também poderia produz ir-se numa narra­

esta narrativa adquire ao mesmo tempo uma dimensão argumentativa bem

tiva, contando uma versão alternativa para retirar a carga da responsabilid

poderosa. Este é um discurso que se poderia imaginar no argumento em juízo

do assassino, transmitindo-a para a instituição.

ade

de um promotor do Ministério Público sobre o caso. Testemunha-o notada­

É compreensível, portanto, que eu não nego aquilo a que alguns

mente a riqueza emocional e ideológica do léxico adotado: "apego à vida",

observadores das narrativas mediáticas denunciam, enquan to uma deriva sensacionalista do discurso jornalístico. No entanto, gostari a de acrescentar que a racionalidade não está completamente evacuada em um tal contexto

"fúria indescritível", "açougueiro sangrenta", "assassino louco", "barbárie". Assim, vários elementos deste texto parecem justificar os argumentos dos detratores do storytel/ing: primeiramente, esta maneira de criar a ilusão de que estamos assistindo a cena ao vivo deve obviamente ser denunciada como um artifício. Na ficção, é possível colocar-se na perspectiva do herói, simples­ mente porque os eventos não têm uma existência objetiva. Mesmo quando Stendhal nos narra que Napoleão venceu a Batalha de Waterloo, somos obri­ gados a aceitar esta versão dos acontecimentos, porque é este o privilégio da ficção para moldar os eventos a seu próprio gosto. Pelo contrário, no noticiário cotidiano, podemos muito bem contestar alguns elementos da narrativa sobre

1

e que, ademais, às narrativas de alguns podem se opor as versões de outros. O que importa, em última análise, é que a esfera pública oferece espaço para histórias conflitantes, observando-se para tanto determinados padrões éticos, o que está longe de ser garantido em um universo mediát ico dominado pela lógica do lucro. No entanto, esta é precisamente uma das funções específicas dos tribunais, definidos como fórum para permitir pelo menos duas versões

dos fatos (a história do Ministério Público e da defesa), devendo os mesmos ser atestados por evidências cientificamente verificáveis.

os fatos. Neste caso, durante o julgamento do processo, ficou estabelecido que Lucie já estava morta quando o os golpes de faca foram desferidos. Pode­ mos concluir que, na reescritura deste acontecimento, o repórter privilegiou a dramatização, em prejuízo da prudência. Lucie se apegando à vida é uma imagem mais patética, ainda que menos fiel à realidade. Em segundo lugar, a narrativa insiste na responsabilidade do assassino, sem tentar discutir, em um nível mais geral, o conjunto das causas possíveis para a origem do drama. Novamente aqui, se compararmos o acontecimento reportado com a ficção, a perspectiva adotada não se destina a produzir uma experiência simulada que nos permitiria avaliar um problema moral de na­ tureza geral, confrontando-nos a uma experiência prática, mas engaja uma pessoa real, tendo a reconstrução do evento a função principal de orientar o julgamento do leitor sobre um indivíduo. No entanto, poderíamos repetir os argumentos de Raphael Micheli e acrescentar que esta forma de argumenta-

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A TENSÃO NARRATIVA NA SERIALIZAÇÃO MEDIÁTICA O último trecho que gostaria de comentar rapidamente coloca em evi­ dência uma última forma de suspense que se relaciona com aquilo que Rico­ eur (1983) chamou sem dúvida de o pano-de-fundo das histórias narradas 1

e que ele associou às histórias emergentes ou "incoativas". Com efeito, este episódio de um folhetim mediático da última eleição preside ncial americana é parte de uma história inacabada, cujo desfecho manté m-se incerto no mo­

mento mesmo da publicação do artigo, tanto para o autor

quanto para o leitor. Apesar desse caráter inacabado, parece-me inegável que alguma forma de intriga se desenhe, uma vez que o discurso refere-se a um acontecimento cujo desenvolvimento abre diversas virtualidades mais ou menos aguardadas ou temidas. A história é assim tramada por acontecimentos passados, e se orien-

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ta para um resultado futuro, cujo caráter puramente virtual cria um efeito de

nos inquietar, gerando um pathos e uma espera da suite da história, ajudando

suspense muito eficaz. Como afirmado por Philippe Marion (1993, p. 94):

assim a vender jornais, mas, ao mesmo tempo, engajando nossa responsabi­ lidade com um devir ainda em aberto. E no caso de uma eleição, os cidadãos

A cada vez que um assunto aponta para um fim de seus episódios na mídia, ele é carregado de hesitações entre pelo menos duas possibilidades do devir, dois desenvol­ vimentos futuros. Assim que o assunto emerge, cada por­ ção da grande narrativa certamente aporta seu conteúdo particular, mas também traz, especialmente em conexão com o que precede, o potencial atrativo da evolução pre­ visível. Ele deve ter a capacidade de deixar germinar es­ boços de cenários possíveis na mente de um leitor ligado.

americanos não eram apenas espectadores ou leitores, mas também eleitores, ou seja, os principais protagonistas desta história que não havia ainda sido escrita. Em retrospecto, os jornalistas tiveram a facilidade de explicar que Ba­ rack Obama não poderia perder essas eleições porque o Partido Republicano havia alienado eleitores hispânicos e cindindo-se entre sua tendência para a extrema direita e sua base centrista. Olhando para trás, a história é sempre muito mais clara e muito menos intrigante. Mas aí, esses discursos ratam da

o

interesse deste tipo de narrativa é justamente o de destacar a nature­

za dessa "realidade atual, fluida e incompleta", da qual falavam Bakhtin (1978)

história, e nós já não estamos no centro do conflito, não podendo agir para mudar o curso dos acontecimentos.

e para a qual a estética do romance - e notadamente a estética de suspen­

No sentido inverso, como para o pobre Fabrice perdido no campo de

se - deveriam supostamente se restituir. De fato, no mundo social, quando

batalha de Waterloo, quando nos encontramos no meio de uma eleição, o hori­

o suspense não é um simples artifício - isto é, como acabamos de ver, uma

zonte aparece ainda escondido pela fumaça de batalha, as balas ressoando em

narrativa falsamente real de acontecimentos passados -, então esta narrativa

nossos ouvidos, e a razão deve admitir que não é "toda-poderosa", devendo

de suspense refere-se a uma verdadeira ética da ação para o leitor-cidadão.

ceder seu lugar, em face das incertezas do devir. Mas somos bem treinados

Como afirmou Claude Labrosse (2000), para o jornalista "político" que tenta

para este tipo de situação. Somos assim preparados por nossa experiência prá­

"perceber o futuro sob a forma de possibilidades argumentadas":

tica, mas também por nossas experiências simuladas, por nossa familiaridade

[...] o tempo não aparece mais apenas como o reserva­ tório organizado das coisas terminadas, mas podemos também percebê-lo e até mesmo e pensá-lo como um ho­ rizonte razoável feito de ações prováveis e de decisões re­ alizáveis. Tocamos aqui sobre o conjunto das concepções modernas de política. (LABROSSE, 2000, p. 120)

com ficções narrativas. Reconhecemos assim que o suspense não é necessa­ riamente uma ilusão, mas a marca de uma aventura em cujo seio nos é ainda possível agir de forma responsável.

CONCLUSÕES

Em outras palavras, mesmo quando dependente, até um certo ponto, o

No limite desta análise, tomando a sério as preocupações expressas por

discurso mediático não constitui uma ilusão ou um simples artifício, mas pelo

aqueles que denunciam o reinado da emoção e do storytelling, espero haver

contrário, é uma realidade política, assim como bem simplesmente a marca

conseguido mostrar que a questão do valor de suspense é muito mais comple­

de um engajamento do leitor-cidadão em uma história ainda em aberto. As

xa do que ela aparenta a um primeiro olhar. Na verdade, este valor não pode

virtualidades da história que ainda não foram atualizadas podem certamente

ser discutido, a não ser na medida em que o suspense esteja articulado com

Raphael Baroni 78

A tensão narrativa através dos gêneros: questões éticas e estéticas do suspense

79

os tipos de discurso que o atualizam, em seus contextos de uso e limitações

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específicas. É verdade, o enredo é comercial, e pode fornecer uma alavanca

em: 3 jan. 2013.

argumentativa da qual se deve desconfiar, assim como é claro que ele pare­

ASTIER, Pierre. La crise du roman /rançais et /e nouveau réa/isme. Paris: Nouvelles Éditions Debresse, 1969.

ce artificial quando promove a ilusão de recriar a atualidade dos eventos do passado, apenas para aumentar o pathos. Mas a intriga e suspense também podem se alojar no coração da vida cotidiana, quando os acontecimentos ain­ da estão se mantêm abertos para as virtualidades de uma história futura. Em tal situação, suspense e ética convergem e acabam por se tornar inseparáveis:

Acesso

BAKHTINE, Mikha"il. Esthétique et théorie du roman. Paris: Gallimard, 1978. BARONI, Raphael. La tension narrative. Paris: Seuil, 2007. BARONI, Raphael. L'CEuvre du temps. Paris: Seuil, 2009.

sem potencialidades, sem medos ou esperança, a ação responsável seria sim­

BARONI, Raphael. Ce que !'intrigue ajoute au temps: une relecture critique de Temps

plesmente impensável. É por esta razão que o suspense pode ser considerado

et récit de Paul RicCEur. Poétique, n. 163, p. 361-382, 2010.

como realista, na medida em que a ficção tenta imitar a atualidade das histó­

BARTHES, Roland. S/Z. Paris: Seuil, 1970.

rias em que estamos engajados,6 podendo até tornar-se útil quando conduz o leitor a viver experiências simuladas e, ainda assim, portadoras de uma lição ética e prática. O que Mikhail Bakhtin, Dorrit Cohn, Sandra Laugier e Jean-Marie Schae­ ffer nos sugerem é que a inteligência profunda do romance (ou da ficção, em geral), assim como seu valor social e educativo, residem precisamente naquilo que excita e apaixona os leitores comuns, isto é: na imersão, no apego à per­ sonagem, em seus dilemas morais e no suspense que nos liga à narrativa antes

BOOTH, Wayne C. The rhetoric of fiction. Chicago: The University of Chicago Press, 1983.

BOUVERESSE, Jacques. La littérature, la connaissance et la philosophie morale. ln: LAUGIER, S. (Dir.). Ethique, littérature, vie humaine. Paris: PUF, 2006. COHN, Dorrit. Le Propre de la fiction. Paris: Seuil, 2001. DAMASIO, Antonio. L'erreur de descartes: la raison des émotions. Paris: Odile Jacob, 1995.

de sua conclusão, nesta tensão que articula as virtualidades de uma história

DAMASIO, Antonio. L'esprit est modelé par le corps. La Recherche, n. 368, p. 69, 2003.

na qual nos movemos, sempre tateantes.

GOLEMAN, Daniel. L'intelligence émotionnelle. Paris: Robert Laffont, 1999. HABERMAS, Jürgen. De l'éthique de la discussion. Paris: Flammarion, 1992. LABROSSE, Claude. L'avenement de la périodicité. ln: VITALIS, A. et ai. (Dir.). Médias,

REFERÊNCIAS

temporalités et démocratie.

ASSOCIAÇÃO FRANCE PRESSE - AFP. Etats-Unis: à deux móis de l'élection, Obama et Romneyau coude-à-coude dans lês sondages. Le Point, 02 set. 2012. Disponível em:
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