Beatriz Weigert (Universidade de Évora) apresenta o livro \'Convite à navegação\', de Susana Ventura

August 19, 2017 | Autor: Susana Ventura | Categoria: Portuguese and Brazilian Literature, Portuguese Literature
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Apresentação a Convite à navegação, uma conversa sobre literatura portuguesa Professora Doutora Beatriz Weigert (Universidade de Évora/CLEPUL)

Susana Ventura, com o título Convite à navegação: uma conversa sobre literatura portuguesa, com

ilustrações de Silvia

Amstalden, atrai o leitor, acenando com excursões aéreas, terrestres e marítimas para ensinar arte literária. Maneira sedutora de prender a atenção, enquanto abre o mapa e descortina o espaço, sinalizando, pelo sumário, os pontos da visita. Partindo da apresentação do motivo da viagem, há a navegação aérea, divisando um território, e logo, porto a porto, a navegação marítima,

sua

expansão

e

abrangência,

incluindo

paragem

terrestre. É estudo de obras literárias, contudo apanhado de Geografia e História, acrescido de Sociologia e Linguística. Assim tanto quanto o estudo sobrevoa a totalidade da região, recorda aquisição e conquista, disputa e posse, hierarquia e saber, comunicação e diferenciação da expressividade. São doze capítulos que dão conta da Literatura, desde a formação do idioma, na hibridez dos termos, até à composição de verso e prosa, encarecendo a oralidade, valorizando a escrita, recolhendo fontes, constatando influências. Estudam-se, neste

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trabalho, os períodos literários do Trovadorismo, do Humanismo e do

Classicismo,

evidenciando

imagens

que

repercutem

no

Modernismo e na Contemporaneidade. Nesse caminho, encontramse nomes reverenciados, como Alfonso X, Dom Dinis, Fernão Lopes, Gil Vicente, Camões, Fernando Pessoa e José Saramago. No primeiro capítulo, “Uma conversa sobre viagens e o convite à navegação”, Susana Ventura, insistindo na metáfora, inquire sobre o modo como se inicia uma viagem por mar, e alerta sobre a “preparação prévia”. Assim, é navegação no espaço, e é navegação no tempo: recuo ao antes para apreender o depois. Orienta sobre a viagem, mas é a estratégia do ensino que está aí demonstrada. A Professora expõe o próprio método: a preparação prévia, conforme diz o segundo capítulo “Antes de tudo... sobrevoando o território europeu”. E este “antes de tudo” é o “antes” da lição de Literatura. Aqui, a escritora contextualiza: delimita a geografia, resgata a história, examina a organização da sociedade, os meios e modos de transmissão do saber. Recua na História, para trazer o projeto linguístico, o galego-português, que se registra em documentos como Notícia de Fiadores, de 1175; Testamento de Afonso II, de 1211; Notícia de Torto, de 1214. Requisitada é a presença de Alfonso X, conhecido como o rei sábio. Atento a todas as formas da cultura, da astronomia à poesia, este

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rei documenta e fomenta o conhecimento, como diz Susana Ventura, “preparando o terreno para o florescimento científico e humano

que

iria

ter

como

consequência

a

aventura

das

navegações”. Pelo terceiro capítulo, Susana introduz o tópico [“das águas doces”] da poesia, para encetar, no quarto capítulo, “Uma viagem por terra: rumo à Provença”. Trata-se aqui de estudar o Trovadorismo, a lírica dos trovadores provençais a exercer influência na Europa do século XII. Susana Ventura ilustra sua exposição, com o extrato do poema Chantars no pot gaire valer, do século XII, de autoria do trovador Bernart de Ventadorn. Poesia aristocrática dos castelos, a mulher sendo elevada à posição de “senhora”, constitui o centro simbólico da poesia e o código de comportamento do “amor cortês”. O tema é o da mulher amada, inacessível, reunindo-se a esse item o culto à Virgem Maria. Mudança de mentalidade em toda a Europa, registra Alfonso X o momento de convidar trovadores ao seu reino e contratar jograis, os músicos, para executar, inclusive, o repertório do rei. Alfonso X protege e patrocina esses artistas do trovadorismo, sendo ele compositor e amante da poesia cortês. Consideram-se as Cantigas

de

amigo,

amor

e

maldizer,

provavelmente por Alfonso X, nos Cancioneiros.

mandadas

reunir,

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O quinto capítulo, “Sonhando a navegação: plantam-se os pinheiros”, focaliza o sucessor de Alfonso X, neto que se eterniza como grande trovador. Este é Dom Dinis, rei que, tendo cantado no idioma galego-português, determina o uso do português como língua oficial. Sua ação exerce-se em diferentes áreas: ensino, comércio e agricultura. No ensino, ao promover o Estudo Geral, planta a semente da Universidade. Ao comércio e à agricultura, atribui incentivos, mesmo decidindo a plantação de pinheiros em terras alagadas. Com essa iniciativa, prepara o futuro das navegações,

desenha

a

história

do

projeto

marítimo

dos

portugueses. Em “Um outro mar: mar de histórias”, vêm as narrativas em prosa e verso. Aqui Susana refere os cantares de gesta, as narrativas épicas, Cantares del Mio Cid, Cavaleiros da Távola Redonda, a Demanda do Santo Graal. Essa literatura importada retém influência na literatura de Portugal que, na épica jogralesca, consagra a Lenda de Dom Afonso Henriques. A seguir, lê-se “Construindo a embarcação, fixando a História”. Neste capítulo, a ensaísta ressalta Fernão Lopes, escrivão e notário, eternizado pela História de Portugal como o primeiro grande cronista português. Fernão Lopes pode ter

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presenciado, em criança, o cerco de Lisboa por Castela. Sua obra maior é a Crónica de D. João I. O oitavo capítulo do livro de Susana Ventura tem por título “Enfim, navegando, porque é preciso”. Aqui a escritora recorda a expansão ultramarina, desde a conquista de Ceuta, em1415, até ao desaparecimento de Dom Sebastião, na Batalha de Alcácer-Quibir, em 1578. Conquista relevante sobre o mar tenebroso é a ultrapassagem do cabo Bojador em 1434. Século de Ouro Português, marcam-se fatos e feitos determinantes para a supremacia de Portugal na História do Mundo. A expansão ultramarina, com início no século XV, impõe o estabelecimento do Império Português, domínio que se encerra com a descolonização em 1975. O nono capítulo, “Na barca”, apresenta o sucessor de Fernão Lopes, na História da Literatura Portuguesa. Nasce Gil Vicente, a voz que inaugura o teatro em Portugal, sendo ele o maior dramaturgo do Ocidente em seu tempo. E então Susana Ventura sugere a viagem “na barca”, diz ela, em “várias barcas”. Inaugurada sua obra na corte Portuguesa em 1502, ao nascimento do Príncipe, com Auto da Visitação ou Monólogo do Vaqueiro, a partir dessa peça, desfilam-se títulos de obras e de personagens que se cristalizam na memória de Portugal.

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Com “Ainda uma pequena excursão terrestre: Itália do Renascimento”, décimo capítulo, a Professora Susana lembra a Itália como berço do Renascimento. Este fato devendo-se ao incremento do comércio, é a poesia épica almejada como projeto de exaltação das conquistas. “Por mares nunca dantes navegados: Luís de Camões, Os Lusíadas e algo mais” intitula as considerações da Professora Susana sobre a epopeia e sobre seu autor. A designação Lusíadas, conforme Segismundo Spina e Evanildo Bechara, que Susana cita, emprega-se em Portugal pela primeira vez por André de Resende, em 1531. No exemplo de Virgílio com a Eneida, a significar a epopeia do herói Eneias, Lusíadas corresponde aos feitos gloriosos do povo luso. E então Susana Ventura conclui seu trabalho com uma despedida: “Adeus, adeus: embarcando numa certa jangada”. A metáfora da viagem explicita-se, nesse título, com o verbo sublinhando o étimo da “barca”, de Gil Vicente, e com o substantivo “jangada” a provocar memória e sensibilidade na saudade do nobel Saramago da Literatura. Assim, na vertente dos períodos literários estudados, a Professora traz, de longe, símbolos e temas, para sublinhar a repercussão das imagens na Literatura mais próxima. Com esse objetivo, Susana cita Mensagem, livro de

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revisitação da História de Portugal, da autoria de Fernando Pessoa. Diz Susana: “a imensa aventura da expansão marítima não foi realizada sem dores, como refletiu Fernando Pessoa no poema “Mar português”. “Quanto do teu sal, São lágrimas de Portugal”. Lágrimas que se vertem ainda em diferenciadas circunstâncias, não sendo apenas portuguesas, mas de muitas nacionalidades, de acordo com a expansão marítima nos diversos países. E diz Susana: “ A literatura em língua portuguesa floresceu em quase todos eles, dando à literatura mundial, somente a partir do século XX, nomes notáveis como os de Machado de Assis, Guimarães Rosa, Luandino Vieira, Pepetela, José Craveirinha, Luís Carlos Patraquim, Mia Couto, Paulina Chiziane, Abdulai Sila, Conceição Lima, Armênio Vieira, Fernando Pessoa, Florbela Espanca, Agustina Bessa Luís, José Saramago entre tantos outros que nos encantam já, ou que estamos por descobrir”. E é, em 1986, que, na inventividade de José Saramago, a Jangada de Pedra singrará o oceano. Na voz de Susana, sabe-se que o escritor “sonha com uma Península Ibérica novamente unida e voltada para si mesma”, na expectativa de transformar a península/ilha em uma “jangada de pedra” que se fixe perto das colônias na África e na América Central e na América do Sul. Em seu

romance,

Saramago

recupera

elementos

da

Literatura

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Universal, invocando o realismo mágico patente em Carpentier que ajuda a sonhar com o futuro, apondo a epígrafe “Todo futuro es fabuloso”. Completa-se o livro. E assim, tendo aceito o Convite à Navegação que Susana faz, e tendo ouvido Uma conversa sobre Literatura Portuguesa, que a Professora expõe, deve-se ressaltar o modo inteligente com que Susana Ventura desenvolve seus temas. Navega-se em águas caudalosas, com ventos favoráveis. Como o título promete, Susana faz o convite à navegação e conversa sobre literatura. Sendo convite, a Professora aposta na aceitação dos receptores e, por essa confiança, dirige-se aos leitores de maneira fluente. Susana conversa mesmo com seu leitor. Chama-lhe a atenção para esse e aquele aspecto da literatura. Provoca a confirmação do interesse, por meio da função fática da linguagem. E as lições que Susana ministra atestam pesquisa e estudo. Ao longo da navegação, a Professora vai invocando e evocando antecessores mestres e doutores das letras, das ciências e das artes. Bibliografia apropriada sustenta as afirmações, trazendo notas sobre conceitos, fatos históricos e posições ideológicas. Aponte-se

a

ilustração

convidativa

dos

quadros

de

Silvia

Amstalden, remetendo aos momentos da navegação que Susana propõe. Excelente viagem! Retorna-se ao dia-a-dia com os tesouros

 

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acumulados nesta conversa sobre Literatura Portuguesa. Parabéns à Susana e à Silvia por essa realização de sucesso! Parabéns à Editora Peirópolis pela iniciativa e principalmente, parabéns aos leitores que têm o livro em mãos!

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