Brasil e África do Sul: reconhecimento da união entre pessoas do mesmo sexo e regimentos internacionais sobre diversidade sexual

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INSTITUTO UNIVERSITÁRIO DE PESQUISAS DO RIO DE JANEIRO
Graduação em Relações Internacionais







IOHANA DO NASCIMENTO CORRÊA BERTO




BRASIL E ÁFRICA DO SUL NO RECONHECIMENTO LEGAL DA UNIÃO ENTRE PESSOAS DO MESMO SEXO: DA CONSTRUÇÃO DE DIREITOS SEXUAIS À MANUTENÇÃO DE SOCIEDADES HETERONORMATIVAS







RIO DE JANEIRO
JUNHO, 2015
IOHANA DO NASCIMENTO CORRÊA BERTO



BRASIL E ÁFRICA DO SUL NO RECONHECIMENTO LEGAL DA UNIÃO ENTRE PESSOAS DO MESMO SEXO: DA CONSTRUÇÃO DE DIREITOS SEXUAIS À MANUTENÇÃO DE SOCIEDADES HETERONORMATIVAS




Monografia apresentada ao Curso de Graduação em Relações Internacionais do Instituto Universitário de Pesquisas do Rio de Janeiro, como requisito parcial para obtenção de título de Bacharel em Relações Internacionais, sob orientação da Prof. M.s. Ivi Vasconcelos Elias.







RIO DE JANEIRO
JUNHO, 2015

IOHANA DO NASCIMENTO CORRÊA BERTO

BRASIL E ÁFRICA DO SUL NO RECONHECIMENTO LEGAL DA UNIÃO ENTRE PESSOAS DO MESMO SEXO: DA CONSTRUÇÃO DE DIREITOS SEXUAIS À MANUTENÇÃO DE SOCIEDADES HETERONORMATIVAS



Monografia apresentada ao Curso de Graduação em Relações Internacionais do Instituto Universitário de Pesquisas do Rio de Janeiro, como requisito parcial para obtenção de título de Bacharel em Relações Internacionais, sob orientação da Prof. M.s. Ivi Vasconcelos Elias.


______________________________________
Prof. Ms. Ivi Vasconcelos Elias – IUPERJ

_______________________________________
Prof. Ms. João Ricardo Viegas – IUPERJ
Prof. Revisor

Aprovada em: ____/_____/_____ Conceito: ________































"O discurso não é simplesmente aquilo que traduz as lutas ou os sistemas de dominação, mas aquilo porque, pelo que se luta, o poder do qual nos queremos apoderar." Michel Foucault
Iohana do Nascimento Corrêa Berto
Brasil e África do Sul no reconhecimento legal da união entre pessoas do mesmo sexo: da construção de direitos sexuais à manutenção de sociedades heteronormativas.
2015
Orientador: Ivi Vasconcelos Elias
Monografia de conclusão de curso, Universidade Candido Mendes, Graduação em Relações Internacionais.
1 - O debate teórico sobre Gênero e Relações Internacionais
2 - África do Sul: do "aniquilamento" negro à Nação arco-íris
3 - Sociedades conservadoras e Regimentos sobre sexualidade
I - João Ricardo Viegas
II - Universidade Candido Mendes
III - Brasil e África do Sul no reconhecimento legal da união entre pessoas do mesmo sexo: da construção de direitos sexuais à manutenção de sociedades heteronormativas.


















Dedicatória
Gostaria de dedicar esta produção acadêmica a minha querida e amada avó Lacy Maria (em memória), que sempre esteve ao meu lado durante todo o meu caminhar e foi responsável por grande parte do que eu sou hoje. Tenho certeza que você estaria na primeira fila torcendo por mim e por essa grande conquista. Te dedico com amor e saudade este artigo.

















Agradecimentos
Agradeço primeiramente a Deus, que me permitiu chegar até aqui e por guiar meus passos a cada amanhecer.
Aos meus amados pais e minha irmã Ana Clara, por me darem todo apoio necessário ao longo da vida e por serem os primeiros a desejar o meu sucesso profissional. Obrigada por todo amor dedicado, por me apoiarem quando estava cansada e principalmente, por nunca me deixarem desistir. Sem o apoio de vocês, eu não estaria aqui.
Ao meu querido avô Sinval, que me ensinou que devemos enfrentar as adversidades da vida sempre de cabeça erguida e que nunca devemos desistir de quem amamos.
À minha querida orientadora Ivi Elias, a qual tenho grande admiração e criei laços afetivos de amizade, que me deu todo apoio necessário na condução deste trabalho. Por ter sido um exemplo de profissional e principalmente, por sempre ser gentil com o próximo. Obrigada pelo carinho e pela paciência.
Às queridas amigas que fiz ao longo deste curso, que me proporcionaram muitos momentos engraçados, dramáticos e divertidos. Em especial, Gabriel, Gabriela de Bonis, Yven, Ângela, Jéssica e Monique Lima. Obrigada por cada momento que passamos juntas.
Aos meus amigos Thalles, Laissa e Beatriz. Obrigada pelas manhãs e tardes adoráveis no Curto Café; por me apoiarem e por me segurarem as diversas vezes que me desestruturei com este artigo; obrigada pelo carinho, por essa amizade reveladora e sincera.
Por fim, agradeço a todos os queridos professores do IUPERJ, por serem grandes referenciais e responsáveis pela minha formação acadêmica; aos meus familiares, amigos e profissionais envolvidos, mesmo que indiretamente, por me fortalecerem com palavras de conforto, motivação e por me ajudarem na produção deste artigo.





SUMÁRIO
Resumo ...............................................................................................................................09
Introdução ..........................................................................................................................10
Capítulo 1: O debate teórico sobre Gênero e Relações Internacionais ........................11
1.1 A luta feminista por direitos sexuais e reprodutivos..........................................12
1.2 As retóricas do debate por direitos sexuais........................................................15
1.3 Conferências internacionais sobre saúde, reprodução e direitos sexuais........18
1.4 Princípios de Yogyakarta e a Comissão de Direitos Humanos.........................21
Capítulo 2: África do Sul: do "aniquilamento" negro à Nação arco-íris.....................23
2.1 A era Apartheid e a invisibilidade negra............................................................24
2.2 O desejo que vai além da "cor"..........................................................................26
2.3 Enfim, o direito democrático ao amor................................................................31
2.4 Brasil: ditadura militar e o ativismo pela livre sexualidade...............................32
2.5 Década 1980 e a fragmentação do movimento LGBT ......................................34
2.6 Vozes que se calam: a AIDS como "peste gay".................................................35
2.7 Reinventando o movimento e a conquista por direito à conjugalidade............36
Capítulo 3: Sociedades conservadoras e Regimentos sobre sexualidade......................39
3.1 Nascidos livres e iguais: ONU e os regimentos internacionais.........................40
3.2 O conservadorismo religioso e violência no Brasil..........................................48
3.3 África do Sul e seus contrastes sociais...............................................................52
Conclusão .............................................................................................................................55
Referências Bibliográficas ..................................................................................................57





Resumo
A proposta de pesquisa tem como objetivo central abordar a construção e a legalização dos direitos referentes à conjugalidade de casais do mesmo sexo no Brasil e na África do Sul. Tendo como ponto de partida suas raízes históricas que contribuíram significativamente para as necessidades de se reformular e firmar temas relativos à direitos humanos, gênero, sexualidade e raça. E principalmente, os movimentos transnacionais que nasceram destas raízes históricas e foram de grande relevância para as conquistas e garantias legais dos direitos sexuais.















Introdução
Este trabalho tem como objetivo discorrer sobre a construção e a legalização dos direitos sexuais referentes à conjugalidade de casais do mesmo sexo na África do Sul e no Brasil. Debater sobre o que o reconhecimento civil da união homoafetiva nesses dois países representou na agenda de lutas dos movimentos sociais da comunidade LGBTI e os motivos que levam a identidade e a orientação sexual continuaram a ser evocadas como direitos reconhecidos, porém, não aceitos socialmente.
A importância de analisar África do Sul e Brasil no que diz respeito à luta por direitos sexuais é evidenciar os motivos que ambos os países tiveram para conquistar constituições libertárias e em contextos históricos semelhantes. África do Sul emergia com a construção de uma democracia após o fim do regime de segregação racial do Apartheid; sendo o primeiro país a dar espaço e voz aos movimentos LGBTI, justamente com o intuito de se consolidar como uma constituição livre de qualquer tipo de preconceito devido às cicatrizes do passado. No Brasil, a passagem dos anos 60 para a próxima década foi marcada pelo endurecimento da ditadura militar. Neste período, nasceram as primeiras organizações estudantis e feministas que passaram a levar as reflexões de raça e sexualidade "às ruas".
Os objetivos mais importantes deste estudo estão vinculados à construção do ativismo transnacional no processo de reconhecimento legal dos direitos sexuais e seus desafios atuais frente ao patriarcado estatal e social na África do Sul e no Brasil; provocar uma breve reflexão sobre a igualdade de direitos relativos à conjugalidade e sexualidade entre casais hetero e homossexuais; relatar os posicionamentos dos dois Estados frente às reivindicações dos movimentos e suas medidas relativas à legislação e segurança. E por fim, evidenciar uma comparação cronológica das conquistas referentes aos direitos sexuais e suas agendas frente aos novos desafios.




1 - O debate teórico sobre Gênero e Relações Internacionais
A proposta deste capítulo é evidenciar o debate teórico sobre a construção dos movimentos transnacionais que deram origem às lutas de raça, gênero e sexualidade dentro do campo da disciplina de Relações Iternacionais, utilizando o movimento feminista como base central da corrente pós-positivista para este estudo e consequentemente, fazer uma breve reflexão sobre os agentes de mudanças nas raízes do processo de libertação do Apartheid e pelas garantias dos direitos sexuais em todo o mundo, assim como, suas influências diretas nas construções de normas humanitárias.
Uma das muitas contribuições potenciais de uma abordagem de gênero e relações internacionais poderia mostrar como as relações de gênero na economia, na política e na família são moldadas e modificadas por processos externos à sociedade. A questão poderia ser, portanto, parte de uma reorientação ampla das relações internacionais em direção ao estudo não somente do comportamento interestatal, mas também de como os Estados e as sociedades interagem (Halliday, Fred. Repensando as Relações Internacionais, 2007. pp. 182-183).

As discursões sobre as temáticas de gênero e pós-modernidade revelam ao meio acadêmico algumas formas de retraduzir e refletir sobre conceitos pré-definidos na política internacional. O mais importante para essa reflexão está relacionado à mulher e sua participação nas Relações Internacionais e sua forma de enxergar temas sensíveis e relevantes à política internacional (Tickner, 2006).
As premissas do viés feminista estão focadas em evidenciar a predominância e dominação masculina nas análises de temas relevantes para a disciplina de RI, como, poder, segurança, guerra e paz, economia e soberania estatal. A visão feminina é diferente, segundo a autora Tickner, na forma que estes temas são repensados e traduzidos ao social, não exclusivamente ao meio acadêmico, como também, na mídia e nas redes socias. A autora ainda salienta que há divergencias específicas nas análises femininas sobre a política internacional em razão das diferentes formas de se perceber o mundo (Tickner, 2006).
Ainda como tema emblemático em RI, as reflexões sobre gênero passam a configurar sua relevância na agenda internacional a partir dos anos 1990, segundo Tickner (2006). Outra autora de grande relevância nesta reflexão é da socióloga Raewyn Connell, em seu livro chamado Gender and Power, publicado em 1987. Sua abordagem sobre poder e dominação masculina nas esferas sociais agregou grande relevância para um pensamento feminista compacto e coeso direcionado à ciência política. Ainda sobre as contribuições da autora, a mesma revela os grandes desafios a serem enfrentados nesta agenda, principalmente, no âmbito do conservadorismo secular e heteronormativo da política sexual. Algumas conquistas, como, a participação na política eleitoral, na primeira metade do século XX, em diversos países democráticos, foi um grande primeiro passo para a ascenção da mulher na política. O protagonismo do movimento feminista durante a segunda metade do século XX trouxe também, outros questionamentos de grande importância para temas sensíveis ao que se chama de sociedade conservadora e patriarcal. Neste livro, Connell reforça a necessidade da reconfiguração do jeito de se pensar sobre relações internacionais, evidenciando a importância do olhar feminino para esta disciplina (Connell, 1987).
A corrente feminista é da vertente pós-positivista do que os analistas de RI chamam de terceiro grande debate sobre as correntes teóricas da disciplina. A escola feminista, assim como a vertente construtivista, constrói críticas sobre a epistemologia das ciências sociais como mecanismo de tradução do funcionamento das relações sociais e políticas. Tais correntes pós-positivistas vieram para desconstruir os conceitos e arranjos pré-definidos pelos positivistas clássicos (Tickner, 2006).
De acordo com Pontes Nogueira e Nizar Messari (2005), a disciplina de Relações Internacionais é profundamente marcada e influenciada pelo gênero. Desta forma, evidenciam discursos e análises que possivelmente flexibilizaria um entendimento entre masculino e feminino. Alguns temas sensíveis da disciplina, como, segurança internacional e defesa nacional, por exemplo, possuem um viés analítico e tendencioso de tom masculino, ignorando por completo a visão feminina sobre as temáticas.

1.1 - A luta feminista pelos direitos sexuais e reprodutivos
De acordo com o CFEMEA (2009), as articulações de mulheres, em suas lutas políticas, tem caráter inclusivo e tende a aprimorar os espaços onde as conquistas de direitos são fundamentais. O objetivo, nessa temática, é tornar os meios sociais e profissionais mais justos, onde todas e todos possam ter futuro. Foca-se também, na luta contra políticas de controle de natalidade onde o governo exerce discursos autoritários, inclinado geralmente, em cima dos grupos mais pobres a negação do direito à reprodução. Desta forma, as feministas se articulam em defesa da autodeterminação reprodutiva das mulheres; pela desconstrução da cultura enraizada da maternidade como um destino obrigatório, por ter o poder de decidir ter ou não ter filhos e como tê-los, sem a obrigação normativa de idade para tê-los ou com quem tê-los, pelo direito de decidir sobre seus corpos e ao aborto legal e seguro, contra a discriminação por orientação sexual, pelo direito ao prazer sexual, contra o patriarcado da heteronormatividade, as articulações feministas configuraram o que, no final dos anos 1980, se intitulou direitos sexuais e direitos reprodutivos (CFEMEA, 2009).
Das articulações das mulheres surgiram também outras lutas de apoio às minorias como, o racismo, a discriminação e o preconceito, a exploração do trabalho pelo capital, e contra os sistemas de dominação e discursos sobre o controle dos corpos das mulheres. Fizeram críticas sobre as diferentes formas de sobreposição aos corpos femininos, sendo, a partir da sexualidade e da capacidade de gestar vidas e pari-las, o movimento afirma que a ditadura machista sustenta e mantém a hierarquia de dominação e subordinação de gênero, como também, as hierarquias étnicas e raciais (CFEMEA, 2009).
De acordo com a visão feminista, a prática da colonização teve como base estrutural de sua formação a dominação e repressão sexual. Estas repressões foram feitas de várias formas e desde então, se tornou um ciclo vicioso e se sustenta até os dias de hoje. As articulações feministas, em suas reivindicações, denunciam publicamente os diversos meios de violação de direitos e do pleno exercício da cidadania feminina, desta forma, lutam pela liberdade sexual e pelo direito de decidir sobre seus corpos com plena autonomia (CFEMEA, 2009).
A autora e socióloga Silvia Camurça em seu artigo "Nós mulheres e nossa experiência comum", publicado em 2007, revela alguns questionamentos relevantes à temática. Um deles é de que as mulheres são "subjetivamente oprimidas e objetivamente exploradas". A autora também defende que essas subordinações são dão exclusivamente através das relações sociais. Desta forma, a opressão não se faz do mesmo jeito sobre todas as mulheres, onde varia por classe social e por identidade étnica e racial. A mesma denuncia as ferramentas que alimentam o sistema de dominação, de acordo com suas palavras:

1. A prática da violência contra as mulheres para subjulgá-las; 2. O controle sobre o corpo, a sexualidade e a vida reprodutiva das mulheres; 3. A manutenção das mulheres em situação de dependência econômica e; 4. A manutenção, no âmbito do sistema político e práticas sociais, de interdições à participação política das mulheres. (...) é instrumento de dominação o controle sobre o corpo das mulheres. Este controle é expresso na negação de sua liberdade sexual, na limitação a sua autodeterminação reprodutiva, na criminalização da prática do aborto (causa de milhares de mortes de mulheres, todos os anos) na expropriação mercantil do corpo e imagem das mulheres pela indústria da propaganda, da beleza, da moda e do sexo.(...)Sobre esta base estruturadora, articulam-se múltiplas outras desigualdades assentadas em preconceitos e discriminação. A hegemonia da perspectiva da heterossexualidade sobre a sexualidade humana é uma delas. (2007, p. 19 e 20).

Finalizando este debate, pode-se dizer que esse é um argumento feminista primordial que fomenta a luta por liberdade sexual e pelo direito e autonomia das mulheres de decidirem sobre seus corpos, não sendo exclusivo, pois as articulações das mulheres possuem um papel fundamental em todos os movimentos sociais com viés de transformação social. Desta forma, fica evidente que o movimento feminista tem um caráter muito importante quando se discorre sobre racismo, direitos sexuais e reprodutivos (CFEMEA, 2009). Para tornar mais evidente esta afirmação, será feita uma breve reflexão sobre os marcos teóricos da construção dos direitos sexuais e direitos reprodutivos nos tópicos a seguir.
















1.2 - As retóricas sobre o debate por Direitos Sexuais

"Nada mais pessoal que o corpo e tampouco nada mais político. O corpo político se situa não só atado ao privado ou ao ser individual, mas também vinculado integralmente ao lugar, ao local, ao social, ao espaço público. Sobre o corpo atuam o Estado, a comunidade, a família, a religião, o mercado, as forças fundamentalistas. "É através de uma grande quantidade de controles patriarcais que estas forças e instituições transformam os corpos das mulheres em expressões de relações de poder. Dessa maneira, os corpos das mulheres e as diversidades sexuais estão no centro de projetos autoritários ou democráticos2". E muitas vezes a linha divisória entre `democrático' e `autoritário' se desvanece quando se trata do corpo" (Manifesto por uma Convenção Interamericana dos Direitos Sexuais e dos Direitos Reprodutivos, 2006, p. 6)

A história latino-americana é marcada por narrativas e vivências de cunho pessoal e coletivo a cerca da sexualidade e da reprodução, pautados em contextos históricos em que a violência sempre esteve e se mantém presente com um protagonismo ímpar nas relações sociais. Desde as colonizações territoriais, de povos indígenas e africanos ao empoderamento e dominação dos limites corporais das mulheres, a violência é um elemento obscuro que sonda a história da opressão feminina e do patriarcado (CFEMEA, 2009).
O território corporal passa a ser a temática principal nas análises teóricas, discursos e práticas feministas de acordo com as feministas da Articulação de Mulheres Brasileiras, juntamente com as feministas guatemaltecas da Batucada Feminista e outras latino-americanas no Fórum Social Mundial em 2009. Desta articulação surge a ideia que vigora até hoje em todas as correntes feministas, a de que "nosso corpo é nosso território". O corpo passa a ser visto como um território autônomo e político para os movimentos (UNAIDS, 2009).
Quando se fala em exercício pleno da autonomia e cidadania de forma livre e igual, significa falar de direitos, ou seja, das diversas formas de expressar e exercer, sem coerção, afetos, desejos, relações amorosas e sexuais, sem discriminação e sem violência. Assim como defende Sonia Corrêa (2001, p. 21), quando a mesma fala de igualdade como uma autodeterminação e do exercício livre dos direitos sexuais perante a lei, significa que: "independentemente de como são os seres humanos, de que superfícies anatômicas apresentam, de que práticas sexuais preferem ou exercem, eles e elas devem receber o mesmo tratamento perante a lei (em casa, no local de trabalho e nas demais instituições)".
Betânia Ávila (2001, p. 8), Antropóloga e ativista, defende alguns pontos importantes para se garantir direitos no âmbito da sexualidade:
"O que é muito novo nos direitos reprodutivos e sexuais é o fato de serem inventados, pensados e reivindicados pelas mulheres. As mulheres não são, por tradição, inventoras de direitos; elas são guardiãs de normas. A ideia de direitos no campo da sexualidade é algo importante e muito novo, uma vez que a concepção de direito está ligada à garantia de autonomia, de liberdade e de igualdade. O próprio campo das fantasias sexuais é baseado em desigualdade e em violência, está baseado em pessoas desiguais – inclusive, como lugar de atração, como lugar de realização de fantasias sexuais. Então, pensar direitos é pensar uma mudança profunda, também do ponto de vista da transformação cultural do próprio exercício do erotismo. (...) Dito de outra maneira: é necessário um exercício filosófico que nos possibilite pensar novos símbolos de igualdade neste campo."
'
De acordo com Ventura (2004, p. 10), falar sobre 'direitos' significa "reconhecer que o campo da sexualidade e da reprodução são passíveis de construção de normativas jurídicas, visando responsabilizar o Estado para a promoção e implementação desses direitos". Desta forma, o autor defende que quando se fala em direitos sexuais e reprodutivos, sobre o âmbido dos direitos humanos, é um reconhecimento formal de que esses direitos são universais, pois são garantidos ao indivíduo desde seu nascimento; que são interdependentes, à medida que se atrela aos demais direitos humanos; e indivisíveis, pois atuam de maneira conjunta e integral (Ventura, 2004, p. 10).
Tomando como ponto de partida a reflexão de Ventura (2004), falar de direitos no âmbito da sexualidade, significa que ainda que o tema 'saúde' tenha maior ênfase como o principal pilar da construção dos direitos sexuais e reprodutivos, a garantia dos mesmos deve acontecer de forma conectada com outras temáticas da vivência plena da cidadania, como por exemplo, no campo político, nos meios culturais e sociais, além de normas legais; como representação de autonomia e liberdade dos indivíduos nos campos da sexualidade e reprodução (Ventura, 2004).
Sônia Corrêa (2006, p. 103), em sua reflexão sobre Direitos Sexuais afirma que no início da era moderna o sexo se converteu no motivo principal no qual todo o mecanismo da vida se desenvolve: o "sexo é um meio de acesso tanto à vida do corpo, quanto à vida da espécie; isto é, ele oferece um meio de regulação tanto dos corpos individuais quanto do comportamento da população (o corpo político) com um todo" ( citada por Weeks, 1999, p. 51). Nesse contexto, a lei moderna desenhou os "sujeitos sexuais" tais como os conhecemos. Ainda que se fale em heteronormatividade nos sistemas jurídicos existentes, códigos, leis e normas se mantém funcionando como sistemas de classificação, hierarquização e, em alguns casos, criminalização de identidades e práticas sexuais. E é no intuito de combater esse cenário que, ativistas de todo o mundo a partir dos anos de 1990, começam a defender os direitos sexuais.
As últimas duas décadas foram marcantes para o ativismo político e teórico feminista, tanto no campo nacional quanto no campo internacional. Importantes debates foram levantados em defesa de vivências da sexualidade sem violência e de forma livre, assim como, a liberdade sexual em relações heterossexuais; combate à violência sexual e estupros. Percebe-se que ainda há muito a se fazer e defender neste campo de luta; ainda que importantes avanços já foram dados como, as conquistas por leis não-discriminatórias, os princípios debatidos e aprovados nas conferências internacionais, como temática sobre a Mulher em Pequim 1995 e sobre a População no Cairo em 1994. É necessário falar mais sobre as políticas públicas de saúde reprodutiva, a gravidez como um fator determinante e de responsabilidade das mulheres; é necessário discutir os papéis dos homens diante das lutas feministas, sobre a concepção de família, de sociedade e o papel do Estado como regulador e ator fundamental na garantia e no exercício de direitos (CFEMEA, 2006).
O debate mais relevante, neste sentido, é que o enlaçamento entre "sexo" e política no cenário atual já não provém exclusivamente de ações e discursos repressivos e punitivos que partem dos Estados. É importante também salientar a importância das lutas por direitos articuladas por atrizes e atores da política sexual, que foram e são fundamentais na garantia de leis e normas adotadas e vigentes para proteger e respeitar a diversidade sexual. Os debates que vem acontecendo junto à ONU ,e em outras arenas de diálogos, sobre sexualidade e direitos humanos são exemplos e reflexos importantes desses movimentos de libertação que deram voz às minorias (Corrêa, 2008).





1.3 - Conferências internacionais sobre Saúde, reprodução e direitos sexuais
É fundamental neste capítulo fazer uma breve reflexão sobre as conquistas e contribuições que as conferências e fóruns internacionais trouxeram para as temáticas de gênero, saúde e sexualidade. Estas conferências representaram um marco importante de amadurecimento político no comportamento dos Estados e suas respectivas sociedades. Os movimentos ativistas conquistaram um espaço político e teórico tão relevantes que os atores estatais e internacionais não podem mais avançar em debates de cunho social sem suas presenças como atores relevantes.
De acordo com Sônia Corrêa (2008), o debate entre população e desenvolvimento ficou mais intenso com a participação de outros atores e temáticas, que começaram a ter grande influência no cenário internacional, principalmente, junto às Nações Unidas. A autora revela que no decorrer dos anos 1990, a ONU articulou uma série de conferências, que foram conhecidas como o Ciclo Social da ONU, para debater temas sensíveis aos Estados. Começando com a Cúpula da Infância (1990). Este Ciclo se deu por oito conferências intergovernamentais, onde os resultados são importantes para os debates que envolvem população, desenvolvimento e direitos. Estas conferências foram: Meio Ambiente e Desenvolvimento (Rio, 1992); Direitos Humanos (Viena, 1993); População e Desenvolvimento (Cairo, 1994); Cúpula do Desenvolvimento Social (Copenhague, 1995); Mulheres e Desenvolvimento (Pequim, 1995); Habitat (Istambul, 1996); Alimentação (Roma, 1997); Racismo, Discriminação Racial, Xenofobia e Discriminação Correlata (Durban, 2001).
Estas conferências foram fundamentais para a elaboração e a divulgação dos Princípios de Yogyakarta para a aplicação da Lei Internacional de Direitos Humanos em relação à Orientação Sexual e Identidade de Gênero que se deu entre 2006 e 2007, este, considerado como o princípio mais relevante no que tange direitos sexuais. No que se refere ao trajeto sobre os debates de sexualidade e direitos humanos na arena internacional, vale ressaltar que teve seu início em 1993, durante as organizações para a Conferência de População e Desenvolvimento, no Cairo em 1994, quando no plano do cronograma de ação em negociação foram incluídos os temas de saúde sexual e direitos sexuais. Porém, os direitos sexuais foram excluídos do texto final, mas voltaram a ser um tópico importante um ano mais tarde no parágrafo 96 da Plataforma de Ação de Pequim em 1995, que discorre sobre os direitos das mulheres na esfera da sexualidade (Corrêa, 2008). Tal parágrafo traz em seu texto original:
"Os direitos humanos das mulheres incluem seus direitos a ter controle e decidir livre e responsavelmente sobre questões relacionadas à sua sexualidade, incluindo a saúde sexual e reprodutiva, livre de coação, discriminação e violência. Relacionamentos igualitários entre homens e mulheres nas questões referentes às relações sexuais e à reprodução, inclusive o pleno respeito pela integridade da pessoa, requerem respeito mútuo, consentimento e divisão de responsabilidades sobre o comportamento sexual e suas conseqüências." (Parágrafo 96 da Plataforma de Ação de Pequim – 1995)

As discordâncias surgidas nos debates do Cairo e Pequim se fortaleceram na revisão de cinco anos das duas conferências e, a partir de 2001, se tornaram ainda mais profundas. Na primeira Sessão Especial da Assembleia Geral da ONU sobre AIDS em Durban (2001), diversos Estados foram contrários à participação de redes que atuavam com direitos LGBTI e saúde. Após um mês de ocorrido, o mesmo fato se repetiu na elaboração da Conferência contra o Racismo, Discriminação Racial e formas correlatas de discriminação (Durban, 2001). Vale ressaltar que, nesta conferência o Brasil propôs a inclusão de um parágrafo sobre discriminação por razão de orientação sexual, que não foi aprovado. Dois anos mais tarde, o governo brasileiro apresentou a mesma proposta de resolução à Comissão de Direitos Humanos da ONU. Porém, sua votação foi adiada para 2004, quando o país retirou o texto por pressão dos países islâmicos (Pazello, 2005).
Outro ponto importante a ser revelado é a participação e presença política das atrizes e dos atores da política sexual nesses debates internacionais. O tema sexualidade e direitos humanos não teria tais desdobramentos se a ONU não estivesse aberto à participação de organizações da sociedade civil, defende Sônia Corrêa (2008). A autora faz uma ressalva quanto ao perfil desses movimentos que variou bastante no tempo e no espaço. Na Conferência do Cairo em 1994, o tema criou espaço pelas feministas envolvidas com saúde e direitos reprodutivos. Já em Pequim (1995), as vozes vieram das redes lésbicas. Mas a presença efetiva dos grupos gays só aconteceu a partir de 2001 em Durban. Somente em 2003, os ativismos trans e intersex ganharam espaço e "visibilidade" no contexto da resolução brasileira junto à ONU (Corrêa, 2008).
No que diz respeito à resolução brasileira apresentada à ONU, este processo envolveu desde o início um ativismo bem mais plural de atrizes e atores políticos, além dos gays, feministas e lésbicas. Ativistas e grupos trans pressionaram para que fosse adicionada uma menção à identidade de gênero. Tal fato gerou profunda perplexidade, pois muitos chefes de estados, e até mesmo ativistas de direitos sexuais, não conheciam por completo o universo e as comunidades travestis, transexuais e intersex. Havia (e ainda há) quem não soubesse as diferenças entre identidade de gênero, e gênero, em sentido de masculino e feminino (Corrêa, 2008).
A África do Sul, emergindo das dores da saída do regime do Apartheid, teve um protagonismo ímpar no desenrolar das negociações e também em termos de influências a outros países africanos. A Índia teve um posicionamento muito positivo e o Egito, como país onde se realizava a conferência (Cairo, 1994), teve papel importante para que houvesse um entendimento final. Até mesmo o Irã jogou um papel crucial em relação ao parágrafo dos direitos reprodutivos. Foram essas mudanças nas posições dos Estados que vialibizou os consensos do Cairo e Pequim (Corrêa, 2008).
Na conferência de Pequim (1995), ainda havia muita relutância conservadora em se debater as temáticas relativas a sexualidade. Neste contexto, grupos religiosos e conservadores, Vaticano e alguns países islâmicos criticaram fortemente o termo gênero. O argumento utilizado por eles foi repassar entre os representantes de Estados e dos diversos movimentos ativistas, trechos de um artigo da feminista Anne Fausto-Sterling, em que, ao abordar sobre o binarismo de sexo, ela supõe que entre o viés de interceção que vai da mulher ao homem, existiriam cinco gêneros (Fausto-Sterling, 2001; Girard, 2008). Naquele contexto, grande parte das mulheres, mesmo as feministas, não tinha conhecimento do trabalho de Fausto-Sterling, assim como pouco se falava em identidades sexuais (Corrêa, 2008).
A autora Girard (2008), que analisou esses marcos paradigmáticos e difíceis de compreensão ou consenso, trouxe reflexões muito agregadoras sobre os debates de direitos sexuais, orientação sexual e identidade de gênero. De acordo com a mesma, no que se refere a sexualidade, o termo direitos sexuais pode, em determinados momentos, propiciar mais barganhas de negociações e consenso do que orientação sexual. A autora usa como ponto de partida desta análise a percepção de Michel Foucault sobre biopoder como uma pluralidade de relações já existente e pré-definidas que trascendem o corpo social. Girard salienta que se o poder não está centralizado, a resistência não virá de uma único campo ou, tampouco, focar em num único ponto do debate. Finalizando esta reflexão, a autora supõe que é preciso, ao mesmo tempo, ser capaz de perceber que "dentro das estruturas, mas construir as respostas desde um outro lugar" (Girard, 2008, p. 52).

1.4 - Princípios de Yogyakarta e a Comissão de Direitos Humanos
Não se pode deixar de fazer uma breve passagem sobre as reflexões de vinte e nove intelectuais sobre a questão da sexualidade e Direitos Humanos, na universidade de Gadjah Mada, em Yogyakarta (Indonésia, 2006). Essas reflexões que deram origem aos Princípios de Yogyakarta tratam de um ponto de extrema relevância no percurso global dos direitos sexuais, pois trouxe a aplicação de uma legislação internacional de Direitos Humanos em relação à orientação sexual e identidade de gênero. Na realidade, essas reflexões, não são novas em si. São um junção de princípios já estabelecidos de Direitos Humanos, a maioria desde a Declaração Universal dos Direitos Humanos, aplicados à vertente da sexualidade. Desta forma, a criação desses princípios traz uma nova diretriz aos Direitos Humanos já positivados na esfera internacional (Corrêa, 2008).
A iniciativa de Yogyakarta foi o resultado das divergências e regressões observados no desenrolar das negociações da Comissão de Direitos Humanos entre os anos de 2003 e 2005. A Assembleia Geral da ONU aprovou em 2005 a formulação do Conselho de Direitos Humanos (CHD-ONU), com o intuito de substituir a Comissão, se igualando ao Conselho Econômico e Social (ECOSOC) e ao do Conselho de Segurança da ONU. A partir deste momento, os movimentos feministas e LGBTI, juntamente com as organizações internacionais de direitos humanos, vem alimentando e expandindo a pauta de debate sobre direitos humanos e sexualidade nesta nova percepção de direitos (Girard, 2008).
Desde os anos 2005, uma articulação de organizações de direitos LGBTI e de direitos humanos, trouxe um projeto para propagar as definições da lei internacional de direitos humanos a fim de que elas fossem aplicadas com clareza às violações por razões de orientação sexual e identidade de gênero. Uma grande estratégia desta coalisão foi tornar explícitas as obrigações dos Estados de forma a influenciar a efetivação de normas gerais por eles aceitas e ratificadas (Corrêa, 2008).
A ideia principal é evidenciar que não é necessário produzir conceitos específicos para punir violações e proteger os direitos dessas minorias. Se faz suficiente aplicar os princípios gerais da lei internacional existente, aprovada e ratificada por grande parte dos países membros da ONU. Nesse sentido, o conteúdo dos Princípios se faz eficiente, contemplando um caráter constitucionalista ou melhor dizendo, de universalismo de normas no diz respeito à garantia de exercer a livre sexualidade (Plummer, 2001).
Desta forma, Sônia Corrêa (2008) acredita que os Princípios de Yogyakarta devem ser valorizados, pois abrem espaços para amplos debates, em contextos diversos, até mesmo no intuito de superar limites e premissas vigentes sobre os documentos de direitos humanos e seu conteúdo de forma centralizada . Uma dessas premissas se refere à temática da concepção sobre uniões ou casamentos, visto que em todas as convenções de direitos humanos articuladas, os artigos limitavam-se às uniões heteroafetivas. Com o intuido de desconstruir esse paradigma de gênero, os Princípios defendem o direito de constituir família, seja ela de que gênero for. A autora ainda defende que nos Estados em que o casamento ou união civil entre pessoas do mesmo sexo já foi legalizado, esse conceito de base familiar pode e deve ser revisto. Na outra via, onde as restrições e discriminações ainda existem, as reflexões de Yogyakarta permanecem válidas como argumentos; assim como, traz reflexões importantes para o social sobre o termo "Identidade de Gênero" (Corrêa, 2008).









2 - África do Sul: do "aniquilamento" negro à construção da Nação Arco-íris
"O nosso povo foi privado da parte que lhe cabia da riqueza do país. Corrigir as seculares injustiças econômicas é ponto central de nossas aspirações nacionais. Estamos conscientes da complexidade das situações que se apresentarão a um governo popular no período de transição e da magnitude dos problemas acarretados pela satisfação das necessidades econômicas das massas oprimidas. Mas uma coisa é certa: na nossa terra nada será resolvido eficazmente se os recursos básicos não forem postos à disposição de todo o povo, em vez de continuarem a ser manipulados por pequenos setores da população ou por indivíduos, sejam eles brancos ou negros." Estratégia e tática do Congresso Nacional Africano, 1969.

Panorama Histórico

Para iniciar este capítulo, é válido citar marcos históricos emblemáticos que tiveram grande importância no início dos estudos de gênero, raça e sexualidade. Como o período que se segue à Segunda Guerra Mundial e foi muito importante para a eclosão do capitalismo e ascensão do chamado socialismo real (Hobsbawm, 1994; Wallerstein, 1999). Este período foi marcado também por uma profunda reflexão moral das sociedades industrializadas, como por exemplo, o retorno das mulheres ao lar no pós-guerra europeu e norte-americano, a perseguição aos homossexuais feita por comunistas nos Estados Unidos e ainda, as concepções morais a cerca da homossexualidade e prostituição no mundo socialista, em que eram combatidos como reflexos da decadência burguesa (Corrêa, 1999).
Durante os anos decorrentes entre 1960 e 1970, alguns estados de Terceiro Mundo que emergiam do processo de descolonização, ainda estavam impregnados pela perspectiva anticolonialista e pautados em argumentos econômicos de corte patriarcal e nacionalistas, incluindo as fortes influências religiosas, que sequer ousariam intervir nas ordens de "sexo" e gênero. Nas décadas seguintes, feministas do Sul e do Norte do planeta iniciaram críticas levando à população a necessidade de se falar sobre os temas e "desataram" os paradoxos dos argumentos populacionais a partir de uma lógica argumentativa baseada das análises e premissas de igualdade entre homens e mulheres, da autodeterminação reprodutiva e da liberdade sexual (Corrêa, 1999).

Não se pode afirmar, com precisão, o momento em que o debate sobre conjugalidade de gays e lésbicas emergiu no ativismo homossexual em nível internacional. Inicialmente, o movimento gay lutava pela afirmação da identidade homossexual, que era associada a uma suposta "patologia" ou "transtorno sexual". Lutava-se pela liberação da sexualidade e criticava-se o machismo e o sexismo na cultura e nas relações sociais. O foco principal da luta homossexual era questionar os padrões socialmente definidos, não somente restritos à sexualidade, como também, aos arranjos afetivos conjugais (Engel, 2001; MacRae, 1990).
Na África do Sul, o início da mobilização a cerca da questão da livre orientação sexual pode ser data a partir da década de 1960. Este período foi notado pelo aparecimento de uma subcultura gay, com bares e casas noturnas voltados ao público homossexual, de maioria do sexo masculino, onde se vivenciava a homossexualidade de forma relativamente livre na conservadora e moralista sociedade sul-africana e propriamente, durante o período de segregação racial do Apartheid (Gevisser, 1995).
Para entender melhor o que foi o Apartheid, será necessário fazer uma breve reflexão histórica sobre colonização e construção da política de dominação dos territórios sul-africanos e consequentemente, o processo de segregação racial. Esta política de dominação foi responsável pelo desenvolvimento econômico tardio da África do Sul e pela perpetuação da cultura patriarcal e opressora que até hoje paira sobre a sociedade africâner. Deve se levar em consideração também, a grande mobilização internacional que deu origem aos movimentos transnacionais pela desocupação, libertação e fim da era Apartheid e que foi tema de grandes debates junto à Organização das Nações Unidas (Saturnino Braga, 2011).
2.1 - A era Apartheid e a invisibilidade negra
A colonização na África do Sul iniciou-se em 1652 com uma dominação hegemônica holandesa e mercantil no cabo da Boa Esperança, atual Cidade do Cabo. Neste contexto, os colonizadores holandeses se depararam com nativos africanos seminômades em bases sociais rudimentares, tribais e fundamentadadas na atividade agropastoril (Ribeiro; Visentini, 2010, p.18; Pereira, 1978, p. 27). A partir de então, os holandeses inciaram políticas de dominação territorial e infraestrutura básica do sistema colonial, em que os nativos africâners eram obrigados a deixar suas terras ou se tornavam servos dos holandeses (Thompson, 1990, p. 33).
A expansão da agropecuária na região formalizou a subserviência dos nativos aos holandeses e determinava o modo de vida precário e opressor, quase escravo, que os colonizadores submetiam aos tribais. Os exploradores desenvolveram uma economia de subsistência não capitalista da economia de mercado pré estabelecida na Cidade do Cabo. Neste período, o trabalho escravo era trazido de fora (importação) e fora essencial para o crescimento e funcionamento do sistema de plantation (Thompson, 1990, p. 46). Os nativos tiveram seu meio de subsitência depredado e foram igualados por seus "mestres" às políticas de controle aplicadas aos escravos; o idioma holandês foi incorporado como meio de comunicação entre colozinadores, escravos e servos; a dominação holandesa se deu até 1795 e após este período, o colonialismo britânico passou a ser o protagonista da opressão sul-africana (Thompson, 1990, p. 52).
Figura 1: ('Nanny and child', foto tirada em Johannesburgo por Peter Magubane, em 1956)

A dominação inglesa iniciou-se em 1795, porém, a política do Apartheid teve seu reconhecimento oficial em 1948. Durante este período transitório, se manteve a subserviência do povo sul-africano e a economia continuava pautada na agropecuária local. A política do Apartheid se caracterizava por violentos e fortes regimentos de segregação racial, onde a cor da pele era o ponto mais importante na definição da classe social do sul-africano. Estas leis limitavam os negros a permanência em zonas específicas do subúrbio, reservava aos brancos os melhores empregos, restringiu o direito da propriedade às terras reservadas para habitação e o acesso a educação era limitado ao volk afrikâner (branco africano). A contragosto deste regime, diversos movimentos internos se formularam, incluindo brancos sul-africanos, para derrubar o regime de segregação. Diversos movimentos transnacionais aliaram-se a luta antiapartheid e fortes pressões externas foram feitas por Estados democráticos e pela ONU. Em 1994, este regime foi derrubado e Nelson Mandela assume a liderança da África do Sul, pondo fim a toda opressão e inciando o processo de construção de um Estado democrático e progressista, ainda com sua economia baseada na agricultura (Saturnino Braga, 2011).
2.2 - O desejo que vai além da "cor"
Década de 1960
Retomando o pensamento do movimento LGBT da década de 60, esta subcultura gay ganhou visibilidade pelos membros do Partido Nacional (NP), implementadores das políticas de Apartheid, que viam a homossexualidade como um "perigo" à pureza racial do volk africâner (branco africano) e consequentemente, provocaram um endurecimento da legislação penal contra a homossexualidade, visto que no período em questão, tais práticas eram consideradas crimes de sodomia. Em respostas, diversos homossexuais fundaram, em 1968, o grupo Homosexual Law Reform, que pode ser apontado como a primeira organização de gays no país. Este era formado em sua maioria por gays, brancos e de classe média, onde adotaram uma postura discreta de reivindicação, com o intuito de agregar possíveis aliados da causa homossexual dentro do Partido Nacional (NP), sem questionar o status quo. Esta iniciativa não teve sucesso em revogar a legislação penal contrária à homossexualidade, em contrapartida, evitou maior endurecimento da legislação existente (Gevisser, 1995).
Década de 1980
De acordo com Gomes da Costa Santos (2012), somente no início da década de 1980 que se evidenciou o princípio de um ativismo homossexual na África do Sul. Formou-se em 1982, a Associação Gay da África do Sul (GASA) com o intuito de acolher os homossexuais, promovendo espaços de sociabilidade e oferecendo serviços de apoio e aconselhamento. Ainda de maioria branca e de classe média e com uma postura claramente conservadora e apolítica, evitaram vincular-se ao movimento de libertação de maioria negra, onde os negros eram malvistos por muitos membros e teria somente o intuito de demonstrar, internacionalmente, um caráter "não racista" da associação. Tão logo, este grupo apresentou diversas contradições internas e foi expulso do grupo da Associação Internacional de Lésbicas e Gays (ILGA).
Em meio a esses debates, é necessário lembrar que a eclosão da AIDS teve grande influência e desencadeou uma mudança radical nas premissas dos movimentos transnacionais de libertação homossexual. Inicialmente, a maioria infectada era homens gays e prostitutas; estes eram vistos como "desviantes da norma sexual" e vetores de uma venereologia letal. Com o advento da AIDS e a morte de diversos ativistas, o movimento homossexual passou a trabalhar intensivamente em campanhas de prevenção à doença e estas reforçavam que relações sexuais com múltiplos parceiros aumentariam o risco de contágio pelos vírus HIV. Este fator contribuiu de forma significativa para que muitos homossexuais buscassem relacionamentos monogâmicos e estáveis como uma forma de proteção contra a doença. Neste sentido, é provável que a AIDS tenha tido impacto fundamental e decisivo na importância que as demandas por direitos à conjugalidade homossexual obtiveram nos movimentos ativistas dos últimos anos a nível internacional (Gomes da Costa Santos, 2012).
Após o fim da Associação Gay da África do Sul (GASA) em 1986, outras duas frentes de militância homossexual foram fundadas no país. Uma denominada como Fundo para a Reforma Legal Nacional (NLRF) e tentava repetir o modelo conservador da Law Reform e GASA, focando suas atividades somente em prol das reformas das leis contrárias aos homossexuais. Em outro viés, a formação da GLOW (Gays e Lésbicas do Witwatersrand) em 1988, tentou vincular as reivindicações homossexuais ao fim do Apartheid e redemocratização. Este grupo, já com características diferentes dos anteriores, tinha participação predominantemente de ativistas negros sob a liderança de Simon Nkoli que foi integrante do grupo GASA e condenado à prisão por seu ativismo em 1982. Aliando-se à luta pelo fim do Apartheid, a Organização de Ativistas Gays e Lésbicas (OLGA) foi criada no mesmo ano, esta de maioria branca e intelectual de classe média, reforçando a luta pelo fim da segregação racial. Ambos os grupos vincularam-se à Frente Democrática Unida (UDF) que agregava diversas organizações de oposição ao regime de minoria branca e aliada ao ANC que atuava de forma clandestina.
Década de 1990
Em 1990, o Congresso Nacional Africano foi legalizado e subsequentemente, Nelson Mandela foi libertado. Neste período, iniciou-se o processo de democratização do país. No mesmo ano, a GLOW organiza a primeira Marcha do Orgulho de Gays e Lésbicas em Johanesburgo que contou com a presença de 800 participantes (Gevisser, 1995). Em seu discurso sobre liberdade, Nelson Mandela (1994) diz:
" Ser livre não é apenas livrar-se das próprias grilhetas, mas viver de uma forma que respeite e promova a liberdade dos outros. (...) Eu não tinha a menor dúvida de que o opressor tinha de ser libertado tanto quanto o oprimido. Um homem que tira a liberdade de outro homem está prisioneiro do ódio, está fechado atrás das grades do preconceito e da estreiteza de vistas. Não sou verdadeiramente livre se estou a tirar a liberdade a alguém, tão certamente quanto não sou livre quando me é roubada a minha humanidade. Tanto o oprimido quanto o opressor são espoliados da sua humanidade". Nelson Mandela, em 'longo caminho da liberdade' (1994)
Os anos de 1990 foram marcados por intensos e necessários debates sobre "sexo" e gênero nas negociações da ONU. Abriram-se espaços para que vozes daqueles prejudicados pelas normas e políticas globais passassem a ser ouvidas e seus corpos e "raças" fossem vistos. Inicialmente com as mulheres, melhor dizendo, as feministas e em seguida, incluindo ativistas do campo da AIDS, vozes do grupo LGBTQI (Lesbian, Bisexual, Transgender, Queer and Intersex) e profissionais do sexo. E é importante mencionar que já recorriam à linguagem de Direitos Humanos para ancorar e defender suas posições (Corrêa, 1999).
Em decorrência da abertura política, diversos ativistas passaram a reivindicar a inclusão da luta homossexual nos discursos de direitos humanos. Aliados ao ANC, lutavam pela proibição da discriminação em razão da orientação sexual e que o mesmo fosse incluído na Declaração de Direitos (Bill of Rights). Ainda que muitos membros do Congresso Nacional Africano fossem contrários a homossexualidade e a considerarem como "anormal" e alheia à cultura africana (Gevisser, 1995), os movimentos ganharam forças e garantiram o sucesso deste trabalho. Desta forma, em 1992, o ANC foi o primeiro partido africano a reconhecer legalmente o direito de gays e lésbicas (Fine e Nicol, 1995; Croucher, 2002).

Em 1994, 43 organizações de todo o país se juntaram para formar a Coalizão Nacional pela Equidade de Gays e Lésbicas (NCGLE). Este grupo passou a militar junto à Assembleia Constitucional, com o objetivo de garantir a manutenção da proibição da discriminação em razão da orientação sexual e tornou a África do Sul em 1996, o primeiro país no mundo a proteger formalmente os direitos dos homossexuais (Croucher, 2002). A partir daí, a NCGLE deu início, junto aos tribunais, uma profunda contestação da legislação vigente, contrária aos homossexuais (Louw, 2005). Outras temáticas foram levadas aos tribunais como, a revogação da lei antissodomia e até mesmo as mais polêmicas como, casamento e adoção por casais do mesmo sexo (Berger, 2008).
Ficou claro que, na medida em que as jurisdições internacionais se expandiam, as reivindicações sobre direitos sexuais atravessavam limites territoriais, sinais fortes de que o vocabulário dos direitos humanos em sexualidade, gênero e raça se desprendia de controles Estatais e assumia influências de caráter social e transnacional. A questão dos same-sexmarriages passou a provocar constantes debates da opinião pública de todo o mundo (Gomes da Costa Santos, 2012).
Finalmente, em 1997, o crime de Ofensas Sexuais (Sexual Offences Act, 1957), que proíbibe a prostituição e práticas sexuais entre adultos do mesmo sexo foi derrubado pela Corte Constitucional, que declarou contrariedade ao princípio da lei que proibia a discriminação por orientação sexual, visto que criminalizava uma prática sexual, como imoral e pecaminosa por parte da sociedade e reforçava o preconceito existe contra homossexuais, em que os colocavam em posições de vulnerabilidade. Esta decisão da Corte Constitucional foi de grande relevância para a consolidação do princípio da equidade entre homossexuais e heterossexuais previsto na constituição sul-africana (Gomes da Costa Santos, 2012).
O debate sobre o reconhecimento legal dos casais do mesmo sexo passou a ser tema principal nas agendas dos ativistas LGBT em 1997. A NCGLE organizou diversos eventos militantes para se discutir como o tema seria abordado e defendido nos tribunais. Ainda que contrariados, os ativistas concordaram em não levar a reivindicação à Corte Constitucional devido a proximidade da segunda eleição democrática no país em 1999. Havia o receio de que o tema "casamento gay" seria usado para benefícios partidários e, consequentemente, traria problemas para o ativismo LGBT. O cuidado com as eleições não vigorou como esperado e diversos casais homossexuais deram início a ações de litígio contra o Departamento de Assuntos Internos (Department of Home Affairs) a fim de garantir o direito ao visto de permanência de seus parceiros estrangeiros no país (Gomes da Costa Santos, 2012).
Não demorou muito e estes litígios ganharam visibilidade junto à Corte Superior do Cabo após os recursos movidos pelo Departamento de Assuntos Internos e logo depois, os casos chegaram à Corte Constitucional em 1999. A mesma julgou que estes litígios visavam proteger o direito dos parceiros sul-africanos de constituir família com seus parceiros estrangeiros. Homossexuais teriam a mesma capacidade que casais heterossexuais de firmar relações conjugais e familiares. Desta forma, a lei vigente seria discriminatória à medida que não se estendia aos casais homossexuais o direito de seus parceiros ao visto de permanência no país. E, por decisão da Corte, foi incluso e reconhecido na legislação atual o termo "ou parceiro do mesmo sexo em união não eventual" após o termo "cônjuge" (Gomes da Costa Santos, 2012).
Esta decisão foi uma porta de entrada para que outras reivindicações e demandas judiciais fossem levadas à Corte, como po exemplo, extensão de pensões a parceiros do mesmo sexo, indenização por morte do companheiro, etc. Porém, somente em 2005 essas reivindicações foram julgadas pela Corte Constitucional e a mesma declarou que a lei presente do casamento (Marriage Act, 1961) como inconstitucional, visto que não incluía os casais homossexuais a gozar do mesmo "status, direitos e responsabilidades" garantidos aos casais heterossexuais. E por determinação, a Corte ordenou ao Parlamento a "corrigir" o defeito da inconstitucionalidade e o mesmo deveria garantir "status, direitos e responsabilidades" aos casais homossexuais (Gomes da Costa Santos, 2012).




2.3 - Enfim, o direito democrático ao amor
Em setembro de 2006, a Comissão Parlamentar de Assuntos Internos (Parliamentary Portfolio Committee on Home Affairs) apresentou o projeto de lei de União Civil (Civil Union Bill) e a figura jurídica da parceria civil (civil partnership) e, enfim, a garantia aos casais do mesmo sexo os mesmos direitos previstos na legislação via casamento aos casais heterossexuais. Como também, o Parlamento iniciou uma consulta popular sobre o tema e audiências públicas foram realizadas em nove províncias do país. Muitas vozes foram contrárias ao projeto. Muitos ativistas acreditavam que a lei criava uma situação de "iguais, mas separados", visto que previa novo texto jurídico (parceria civil), restrito apenas aos casais do mesmo sexo. O foco era na verdade, a alteração da Lei do Casamento, já que todos os direitos relativos à conjugalidade eram os mesmos para ambas as formas de união (Gomes da Costa Santos, 2012).
Além da insatisfação dos ativistas, o projeto gerou grande inquietação aos opositores dos direitos de LGBT. Diversos argumentos religiosos e conservadores dominaram as razões levantadas para o impedimento da lei de União Civil. Entre estes argumentos, a condenação, por parte da Bíblia, à livre orientação sexual como um comportamento pecaminoso e imoral por partes de grupos religiosos e principalmente, a homossexualidade feria a moral e os valores da tradicional família africana onde se considerava como "família" a composição por um pai, uma mãe e seus filhos (Epprecht, 2012). A alteração a definição tradicional de casamento significaria destruir a instituição "sagrada" e milenar pregada do Deus. As crianças deveriam ter "um pai e uma mãe", caso contrário, efeitos desastrosos às suas identidades seriam causados pela criação perversa e imoral de pais do mesmo sexo.
Para amenizar o clima hostil entre conservadores e ativistas, a Comissão Permanente sugeriu uma alteração ao projeto de lei da União Civil que, continuaria com o mesmo termo, mas diferentemente da versão inicial, incluía tanto os casais heterossexuais quanto aos casais do mesmo sexo. Consequentemente, a lei deixaria a critério do casal escolher sua nomenclatura como "casamento" ou "parceria civil". Mesmo diante da insatisfação, o novo projeto também previa a livre escolha ao oficial de casamento o direito de se recusar celebrar uma união homossexual, alegando questões de consciência moral e religiosa (Gomes da Costa Santos, 2012).
Para finalizar, o Civil Union Act definiu duas formas de relação conjugal, casamento e parceria civil, que possuíam o mesmo efeito legal. Desta forma, este projeto proporcionou aos casais definirem o significado pessoal e social que eles desejariam atribuir às suas relações. O projeto representou um grande avanço aos direitos de gays e lésbicas, já que garantia o "livre status" a ambos os casais e descentralizou o casamento como "a" instituição conjugal por excelência e principalmente, seria a base para uma nova lei de família mais inclusiva e diversa (Bilchitz e Judge, 2008).
O primeiro casamento homoafetivo sob vigência da Lei de União Civil ocorreu em 2007, em Langebaan, Província do Cabo Ocidental. Desde então, de acordo com o Departamento de Estatísticas da África do Sul (Statistics South Africa), até o fim de 2011, foram realizados 3.324 casamentos homoafetivos. Quase metade (45,3%), entretanto, aconteceu na província de Gauteng e outros 28% na do Cabo Ocidental (Western Cape), o que reflete a desigualdade da realidade social do país (Sagarra, 2015).

2.4 - Brasil: ditadura militar nasce o ativismo pela livre sexualidade
"Jovem encantador, dize-me: por que, triste e suspirante, erras nestes reinos aprazíveis? Peço-te, dize-me: qual o teu verdadeiro nome? "Meu nome é o Amor." Então, o primeiro virou-se para mim, E gritou-me: "Ele mente, porque o nome dele é a vergonha. Eu é quem sou o Amor, e costumava estar aqui sozinho, neste belo jardim, até que ele chegou como um intruso durante a noite. Sou eu o verdadeiro Amor, que anima de uma chama mútua os corações dos rapazes e das moças. Então, suspirando, o outro disse: "Segue tua fantasia, porque eu, eu sou o Amor que não ousa dizer seu nome". Os dois amores - Oscar Wilde (1895)
No Brasil, pode-se afirmar que os primeiros registros indicam que o ativismo homossexual teve início em meados da década de 60 e se caracterizou em três diferentes momentos. O primeiro momento corresponde ao surgimento e expansão desse movimento durante o período de "abertura" política do processo de transição entre a Ditadura Militar e a volta do regime democrático. Este primeiro movimento tinha como característica principal o viés comunista e antiautoritário devido ao contexto histórico em questão, pois fazia parte da esquerda revolucionária estudantil, feminista e negra contra o regime ditatorial e foi classificado como "alternativo" ou "libertário" (MacRae, 1985, p.390).
O primeiro movimento homossexual independente se formou em 1978, em São Paulo. O mesmo se chamava SOMOS e adquiriu grande visibilidade no âmbito histórico, político e social por sua grande representatividade ativista. Este primeiro grupo foi de grande relevância e inspiração como modelo para outros que se formaram posteriormente e até mesmo, para os grupos LGBT da atualidade. Vale lembrar que, desde os primeiros indícios de ativismo homossexual na década de 60 até a formação do primeiro grupo em 1978, algumas tentativas de formulação de movimentos foram feitas e não obtiveram sucesso devido as suas dissolvências em poucas semanas (MacRae, 1985, p.220).
Inicialmente o movimento SOMOS era composto por homens e teve sua primeira manifestação através de carta endereçada ao sindicato dos jornalistas e foi convidado pelo mesmo a participar de uma semana sobre debates de grupos discriminados organizada pela Universidade de São Paulo (USP) em 1979. A partir de então, o SOMOS adquiriu maior visibilidade e novos integrantes se aliaram ao movimento, incluindo mulheres homossexuais e simpatizantes da causa. Neste mesmo ano, mais dois movimentos se formularam: o Eros e o Libertos. Ainda com a polarização de novos grupos LGBT, o SOMOS possuia maior abrangência ativista e passou a aliar-se com outras minorias com o intuito de promover transformações socias, como por exemplo, movimentos dos trabalhadores e grupos de esquerda (MacRae, 1985, p.257).
Ao analisar com maior profundidade o grupo SOMOS, o autor MacRae (1985) faz observações importantes sobre seus ideários:
"O grupo SOMOS deveria ser exclusivamente formado por homossexuais; as palavras "bicha" e "lésbica" ser esvaizadas de seu conteúdo pejorativo; na análise das relações de gênero, as assimetrias entre homens e mulheres deveriam ser combatidas, bem como a polarização ativo/passivo e os estereótipos efeminado/masculinizada; enquanto identidade ou subterfúgio para não assumir a homossexualidade, era criticada, embora, em alguns momentos, a prática bissexual fosse até mesmo glorificada como subversão de todas as regras; a monogamia e a possessividade nos relacionamentos eram questionados; o prazer era visto como bem supremo e o autoritarismo devia ser combatido em todas as suas manifestações, tanto fora, quanto dentro do grupo". MacRae, 1985, p. 257
No dia 16 de dezembro de 1979, foi organizado no Rio de Janeiro, o 1º Encontro de Homossexuais Militantes na Associação Brasileira de Imprensa (ABI). Este encontro contou com a participação de 61 ativistas - 11 lésbicas e 50 gays - e nove grupos compareceram ao evento: SOMOS, RJ; Auê, RJ; SOMOS, SP; Eros, SP; SOMOS, Sorocaba, SP; Beijo Livre, Brasília; Grupo Lésbico Feminista, SP; Libertos, SP; Grupo de Afirmação Gay, RS e um ativista de Belo Horizonte, MG. As diretrizes desse encontro se focaram em reivindicações em defesa do respeito à "opção sexual" na Constituição Federal e na luta pela discriminação da homossexualidade como uma patologia mental (MacRae, 1985, p. 339).
2.5 - Década 1980 e a fragmentação do movimento LGBT
Em 1980 o grupo SOMOS se polarizou em suas vertentes ideárias e foi dividido em três frentes: o SOMOS, o Grupo Lésbico-Feminista e o Grupo de Ação Homossexualista. Neste mesmo ano, as três frentes militantes se aliaram aos movimentos negro e feminista e organizaram o primeiro ato público em frente ao Teatro Municial seguindo em passeata pelas ruas do Centro. Passado este ato, as frentes ideárias permaneceram polarizadas e o grupo SOMOS volta a se deteriorar (MacRae, 1985, p.339).
No âmbito internacional, o movimento homossexual passou a considerar relações transnacionais no que foi definido como "segundo momento" no Brasil. O ativista João Antônio Mascarenhas esteve em uma conferência da International Lesbian and Gay Association (ILGA) na Itália, em abril de 1980 e torna o grupo Triângulo Rosa filiado à organização. Nesta mesma mão, há uma ruptura de comportamentos e ideários entre o movimento LGBT da década de 1970 e a nova onda da década de 1980 no Brasil (Silva, 1998).
A década de 1980 ficou conhecida como o segundo momento do movimento gay no Brasil. Foi um período de profundas transformações estruturais dos grupos militantes e muitos deixaram de existir. O movimento homossexual perde protagonismo ativista e sofre uma redução drástica de 22 grupos no Brasil no início dos anos 80 para 7 grupos existentes entre os anos de 1984 e 1985. O surgimento da epidemina da Aids como "peste gay" contribuiu de forma pragmática para esta desmobilização, fazendo com que o foco das reivindicações saísse da liberação sexual para campanhanhas de prevenção ao vírus que, neste primeiro momento, foi atrelado em âmbito internacional às relações entre pessoas do mesmo sexo e prostitutas (Facchini, 2000).
2.6 - Vozes que se calam: a AIDS como "peste gay"
A "peste gay" trouxe rumores sobre um "fim da homossexualidade". Como o autor Néstor Perlongher (1993) discorre em seu texto "O desaparecimento da homossexualidade":
"É preciso esclarecer: o que desparece não é tanto a prática das uniões dos corpos do mesmo sexo genital, mas a festa do apogeu, o interminável festejo da emergência à luz do dia, no que foi considerado o maior acontecimento do século XX: a saída da homossexualidade à luz resplandecente da cena pública, os clamores esplêndidos do - diriam na época de Wilde - amor que não se atreve a dizer seu nome. Não somente atreveu-se a dizê-lo, mas o tem gritado na vozearia do excesso. Acaba, poder-se ia dizer, a festa da orgia homossexual, e com ela termina-se (não era, por sinal, sua expressão mais chocante e radical?) a revolução sexual que sacudiu o Ocidente no decorrer deste acidentado século. Um declínio tão manso que se a gente não olha bem não percebe: esse é o processo da homossexualidade contemporânea. Ela abandona a cena fazendo uma cena poética e desgarrada: a da sua morte.
Somados ao advento da Aids, outros fatores também contribuíram para um declínio no movimento, como por exemplo, o aumento da inflação e do desemprego dificultava a mobilização dos ativistas; o desânimo frente a expectativa frustrada de que a reinstauração da democracia traria mais voz aos direitos dos homossexuais e o "falso" espaço que foi dado aos movimentos LGBT que trouxeram uma sensação de "liberdade" ao tão sonhado ideário ativista (Green, 1998).
A autora Cristina Silva (1993) relata um ponto interessante da pesquisa do autor MacRae (1985) sobre uma mudança na definição da homossexualidade de "opção" para "orientação" sexual. Esta relação de definição da essência homossexual gerava grande dúvida entre os movimentos e diversos acadêmicos de várias áreas foram consultados até chegarem a um consenso sobre a utilização da "orientação" como uma explicação que permitia afirmar certa concretude para a experiência da homossexualidade, sem entrar em questões mais profundas e de caráter "essencial".

O segundo momento do movimento homossexual no Brasil também foi marcado pela articulação dos militantes para desconstruir a relação "marginal" entre Aids e homossexuais, com a necessidade de reconstruir a imagem pública e protagonista do grupos LGBT. Certamente, os movimentos internacionais também tiveram grandes influências na luta pela quebra do "tabu" da "peste gay" e foram fundamentais para uma mudança de comportamento dos movimentos nacionais frente às temáticas de saúde, direitos humanos e direitos civis (Facchini, 2000).
2.7 - Reinventando o ativismo LGBT e a conquista por direito à conjugalidade
Os anos de 1990 foram considerados como um "reflorescimento" do movimento homossexual no Brasil o foi o período conhecido como terceira onda ativista. Calcula-se que o número de grupos militantes passou de 6 a 52, ao final da década de 1990. Diversos Encontros Brasileiros de Lésbicas e Gays foram realizados ao longo do período em outros estados e inclusive, incluiram o tema da Aids em seus debates. O movimento adquiriu tanto vigor de novas propostas quanto novos desafios frente às questões da epidemia (Reis, 1995; Rodrigues, 1997).
Foi no 2º Encontro Brasileiro Homossexual (1984) que os militantes incluiram às reivindicações de lutas a legalização do "casamento gay" e a inclusão da educação sexual nas escolas. Nos encontros posteriores, outros temas foram aprovados pelos ativistas, como, a questão da violência; a discriminação religiosa contra homossexuais que estava cada vez mais preocupante; a formação de um Conselho Brasileiro de Entidades Organizadas de Homossexuais; a entrada de novos atores aos movimentos - lésbicas, Organizações Não-Governamentais (ONGs) e militantes do Partido dos Trabalhadores (PT); a crianção de uma Comissão de Direitos Humanos de Gays e Lésbicas; a fundação da Associação Brasileira de Gays, Lésbicas e Travestis (ABGLT); a luta contra a Aids - este teve grande relevância, pois trouxe a presença de organizações de travestis e as discussões sobre temas como religiosidade, transexualidade e articulação com movimentos internacionais, como a ILGA (Facchini, 2000).


No final da década de 1990, a ABGLT contabilizava a existência de 68 organizações do movimento homossexual no país. Vale ressaltar no que tange o "reflorescimento" do movimento, não só o número de grupos aumentou, como houve uma grande participação de novos atores e formatos institucionais e uma ampla diversificação nas diretrizes de atuação. Outras conquistas como, aproximações com organismos inernacionais que deram caráter transnacional à luta e alguns grupos religiosos se mostraram mais flexíveis e ligados às questões de sexualidade (Facchini, 2000).
O reconhecimento do casamento entre pessoas do mesmo sexo no Brasil como entidade familiar, por analogia à união estável, foi declarado possível pelo Supremo Tribunal Federal (STF) em maio de 2011 no julgamento conjunto da Ação Direta de Inconstitucionalidade, apresentada pelo então governador do estado do Rio de Janeiro, Sérgio Cabral. Desta forma, no Brasil, são reconhecidos às uniões estáveis homoafetivas todos os direitos conferidos às uniões estáveis entre um homem e uma mulher. Em maio de 2013 o Conselho Nacional de Justiça (CNJ) aprovou uma resolução que obriga todos os cartórios do país a celebrar casamentos entre pessoas do mesmo sexo. O presidente do CNJ afirmou que a resolução remove "obstáculos administrativos à efetivação" da decisão do Supremo, em 2011 (Gomes da Costa Santos, 2012). Finalizando esse capítulo, vale ressaltar o pronunciamento do STF sobre Direitos Matrimoniais. Em discurso sobre seu voto, o Excelentíssimo Ministro Ayres Britto afirma:
"verbalizo que merecem guarida os pedidos formulados pelos requerentes de ambas as ações. Pedido de "interpretação conforme à Constituição" do dispositivo legal impugnado (art. 1.723 do Código Civil), porquanto nela mesma, Constituição, é que se encontram as decisivas respostas para o tratamento jurídico a ser conferido às uniões homoafetivas que se caracterizem por sua durabilidade, conhecimento do público e continuidade, além do propósito ou verdadeiro anseio de constituição de uma família. Pelo que dou ao art. 1.723 do Código Civil interpretação conforme à Constituição para dele excluir qualquer significado que impeça o reconhecimento da união contínua, pública e duradoura entre pessoas do mesmo sexo como "entidade familiar", entendida esta como sinônimo perfeito de "família". Reconhecimento que é de ser feito segundo as mesmas regras e com as mesmas conseqüências da união estável heteroafetiva. Desde que preenchidas, também por evidente, as condições legalmente impostas aos casais heteroafetivos. Inteligência que se robustece com a proposição de que não se proíbe nada a ninguém senão em face de um direito ou de proteção de um interesse de outrem. E já vimos que a contraparte específica ou o focado contraponto jurídico dos sujeitos homoafetivos só podem ser os indivíduos heteroafetivos, e o fato é que a tais indivíduos não assiste o direito à não-equiparação jurídica com os primeiros. Visto que sua heteroafetividade em si não os torna superiores em nada. Não os beneficia com a titularidade exclusiva do direito à constituição de uma família. Aqui, o reino é da igualdade pura e simples, pois não se pode alegar que os heteroafetivos perdem se os homoafetivos ganham. E quanto à sociedade como um todo, sua estruturação é de se dar, já o dissemos, com fincas na fraternidade, no pluralismo e na proibição do preconceito, conforme os expressos dizeres do preâmbulo da nossa Constituição." (Voto do Ministro Ayres Britto pelo reconhecimento legal da união entre pessoas do mesmo sexo, 2011).



















3 - Sociedades conservadoras e regimentos sobre sexualidade
Este capítulo é de grande importância a este trabalho, pois visa revelar como se dá a construção de normas internacionais sobre diversidade sexual, a partir dos Princípios vistos no capítulo 1, o posicionamento dos Estados frente a estas normas e as realidades sociais que África do Sul e Brasil vivem, que não condizem com suas constituições progressitas. Como também, será evidenciado a influência da religião nos pilares dos mesmos, tornando muito mais complexos os percursos para se garantir que todos exerçam sua livre sexualidade.
A consagração dos direitos humanos impõe grandes empasses a todas os povos, pois a garantia da efetividade desses direitos exige um trabalho árduo e de comprometimento, em especial, quando se refere a garanti-los para um grupo minoritário. As vulnerabilidades são desenhadas através de preconceitos e discriminações de toda as formas que se direcionam às características pessoais dos indivíduos, estas que são dadas pelo gênero, raça, orientação sexual, identidade de gênero ou qualquer outra característica atribuída ao "ser" tão singular e único, igualmente merecedor de respeito como qualquer outro ser aos seus direitos individuais (Corrêa, 2014).
As questões de identidade de gênero e orientação sexual continuam a ser utilizadas como argumentos para sérias violações dos direitos humanos em todas as nações. Ainda que os Estados reconheçam as normas internacionais e domésticas que devem por obrigação garantir a integridade do indivíduo como um ser de plenos direitos, a comunidade LGBTI apresenta uma vulnerabilidade ímpar, onde a discriminação, perseguição e maus-tratos, continuam a ser perpetuadas e muitas vezes, se chega a formas extremas de violência. Em diversos países, as relações sexuais entre pessoas do mesmo sexo são consideradas crime e punidas com prisão e até mesmo, com a pena de morte (Corrêa, 2014) .
Quando se diz que a violência é o grau extremado do preconceito, da invisibilidade e da discriminação, reflexão essa que representa vozes de todo o mundo, deve se chegar a conclusão de que os Estados não estão cumprindo com suas obrigações de proteger esses indivíduos e previnir qualquer outro tipo de violência. Omissão essa que se dá pela ausência de legislações igualitárias, pela falta de comprometimento das forças de segurança, ou pelas vias mais comuns em que o preconceito se perpetua, que é a manutenção de mentalides heteronormativas e patriarcais (Corrêa, 2014).

3.1 - Nascidos livres e iguais: ONU e os regimentos internacionais

Estados devem proteger "todas as pessoas, independente de orientação sexual (ou) identidade transgênero, da tortura e de tratamento ou castigo cruel, desumano ou degradante". (Comitê das Nações Unidas contra a Tortura, 2012)

Quando se fala em garantia do direito democrático à livre sexualidade, deve-se salientar que não é um assunto novo. Esta reflexão parte de dois pilares fundamentais que são referenciais no regime internacional de direitos humanos: igualdade e não discriminação. Desta forma, não há dúvidas e possibilidades de outras interpretações da Declaração Universal dos Direitos dos Humanos que, começa seu texto com a seguinte afirmativa: "todos os seres humanos nascem livres e iguais em dignidade e direitos."


Figura 5: (Love is a basic human right. ONU, 2014)

Ainda sim, graves violações a esses direitos estão profundamente enraizadas, na maioria dos casos, somados à falta de proteção jurídica específica contra a discriminação em razão de identidade de gênero e orientação sexual, vulnerabilizando os grupos LGBT, de todas as regiões do mundo, a exposições, crimes e discuros de ódio, motivados por suas características como ser . Esses grupos sofrem discriminação no mercado de trabalho, nas escolas e nos hospitais, e muitas vezes, renegadas por suas próprias famílias. São vítimas nas ruas do ataque físico, sendo espancadas, violentadas sexualmente, torturadas e mortas. E mesmo diante dessa realidade deprimente, em aproximadamente 76 países, a relação homoafetiva é tida como ato criminoso e de ofensa moral, expondo ainda mais esses grupos aos riscos de serem presos, acusados e violentados (Pillay, 2012).
A Organização das Nações Unidas vem demonstrando profundas preocupações com essas violações desde o início da década de 1990. Em 2011, o Conselho de Direitos Humanos (CDH-ONU) lançou nota e aprovou uma resolução expressando "grande preocupação" com com os resultados dos relatórios que indicavam uma quantidade assustadora de ataques contra indivíduos em razão de sua orientação sexual e identidade de gênero. De acordo com Navy Pillay (2012), se faz urgente a adoção de medidas para eliminar essas violações e está cada vez mais claro e universalmente aceita (Pillay, 2012).
Desta forma, a Alta Comissária das Nações Unidas para os Direitos Humanos, Navi Pillay (2012), defende que eliminar a violação e a discriminação contra pessoas em razão de sua orientação sexual e identidade de gênero é um dos maiores desafios dos direitos humanos hoje. Ainda sim, a Alta Comissária afirma ser este um momento de esperança, pois uma quantidade crescente de Estados passou a reconhecer formalmente a gravidade dessas violações e a necessidade de mudança. Assim, a ONU defende que com compromisso e empenho conjunto dos Estados e de suas sociedades, os princípios de igualdade e não discriminação serão verdadeiramente garantidos para pessoas LGBT em todo o mundo (Pillay, 2012).
No ano de 2011, mais precisamente em julho, o Conselho de Direitos Humanos aprovou a primeira resolução das Nações Unidas sobre direitos humanos, orientação sexual e identidade de gênero. A mesma foi aprovada por uma diferença pequena, mas foi recebida com significativo comprometimento dos membros do Conselho de diversas nações. Essa adoção rompeu obstáculo para o primeiro relatório oficial das Nações Unidas sobre a temática, preparado pelo Escritório do Alto Comissariado para os Direitos Humanos (CIDH, 2012).
Este relatório apresentou um padrão evidente de violência sistêmica e de discriminação direcionados às pessoas em razão da sua orientação sexual e identidade de gênero, desde discriminação em meios sociais à criminalização e ataques físicos, chegando até a assassinatos. Este documento anexou um conjunto de medidas dirigidas aos Estados comprometidos com a proteção dos direitos humanos de lésbicas, gays, bissexuais e transgêneros (LGBT). E através deste relatório foi formada o ponto principal de um painel de debates que ocorreu no Conselho em 7 de março de 2012, sendo a primeira vez em que um corpo intergovernamental das Nações Unidas liderou uma discussão formal sobre o tema (CIDH, 2012).
Relatando as graves violações sistêmicas apresentadas no relatório, a Alta Comissária Navi Pillay (2012) apelou para que os Estados tomem consciência de responsabilidade sobre esses crimes e os recrutou a escrever um "novo capítulo" na história das Nações Unidas, comprometido com fim da violência e qualquer tipo de discriminação contra todas as pessoas, independentemente de sua orientação sexual e identidade de gênero. O Secretário Geral das Nações Unidas, Ban Ki-moon, afirmou que a violência e discriminação contra os grupos LGBT é como "uma monumental tragédia para os que se preocupam e uma mancha na nossa consciência coletiva". O Secretário também alertou que se trata de uma violação do já existente regime internacional de direitos humanos (CIDH, 2012).
As normas legais dos Estados para proteger os direitos de pessoas LGBTI estão claramente estabelecidas no regime internacional de direitos humanos baseado na Declaração Universal dos Direitos Humanos e consequentemente, aprovados nos tratados internacionais sobre a temática. Pillay (2012) defende que "todas as pessoas, independente de sexo, orientação sexual ou identidade de gênero, tem o direito de proteção pelo regime internacional dos direitos humanos, sobretudo, em relação aos direitos à vida, à segurança e à privacidade, o direito de ser livre de tortura, detenções e prisões arbitrárias, o direito de ser livre de discriminação e o direito às liberdades de expressão, de reunião e de associação pacífica" (Pillay, 2012).
Mais uma vez salientando que, a proteção de pessoas LGBT não configura a necessidade de se formular novas leis ou direitos especiais para os mesmos. Apenas, é necessário propiciar a garantia da não discriminação para todos os direitos. A proibição contra a discriminação com base na orientação sexual e identidade de gênero não está limitada ao regime internacional de direitos humanos e deve ser adotada como princípio doméstico pelos Estados membros. Tribunais de diversos países declararam que tal discriminação fere as normas constitucionais domésticas, assim como o direito internacional. Esse debate também foi levantado pelos sistemas regionais de direitos humanos, em especial, pela Comissão Interamericana de Direitos Humanos e pelo Conselho da Europa (Pillay, 2012).
Como a Alta Comissária afirma, "o princípio da universalidade não admite exceção. Os direitos humanos são, verdadeiramente, direitos inatos de todos os seres humanos." Desta maneira, a Comissão Internacional de Direitos Humanos estabeleceu cinco normas para os Estados a fim de proteger e garantir tais direitos a todos os indivíduos (CIDH, 2012).
Em seu texto fiel, são estas normas: 1. Proteger as pessoas da violência homofóbica e transfóbica. Incluir a orientação sexual e a identidade de gênero como características protegidas por leis criminais contra o ódio. Estabelecer sistemas efetivos para registrar e relatar atos de violência motivados pelo ódio. Assegurar investigação efetiva, instauração de processo contra os perpetradores e reparação das vítimas de tal violência. Leis e políticas de asilo devem reconhecer que a perseguição de alguém com base em sua orientação sexual ou identidade de gênero pode ser um motivo válido para um pedido de asilo. 2. Prevenir a tortura e o tratamento cruel, desumano e degradante às pessoas LGBT em detenção através da proibição e punição de tais atos, garantindo que as vítimas sejam socorridas. Investigar todos os atos de maus tratos por agentes do Estado e levar os responsáveis à justiça. Prover treinamento apropriado aos funcionários responsáveis pela aplicação da lei e garantir um controle eficaz dos locais de detenção. 3. Revogar leis que criminalizam a homossexualidade, incluindo todas as leis que proíbem a conduta sexual privada entre adultos do mesmo sexo. Assegurar que não sejam presos ou detidos em razão de sua orientação sexual ou identidade de gênero, e não sejam submetidos a exames físicos degradantes e desnecessários com a finalidade de determinar sua orientação sexual. 4. Proibir a discriminação com base na orientação sexual e identidade de gênero. Promulgar leis abrangentes que incluam a orientação sexual e identidade de gênero como motivos proibidos para discriminação. Em especial, assegurar o acesso não discriminatório a serviços básicos, inclusive no contextos de emprego e assistência médica. Prover educação e treinamento para prevenir a discriminação e estigmatização de pessoas intersexo e LGBT. 5. Proteger as liberdades de expressão, de associação e de reunião pacífica para as pessoas intersexo e LBGT. Qualquer limitação destes direitos deve ser compatível com o direito internacional e não deve ser discriminatória. Proteger indivíduos que exercitam seus direitos de liberdade de expressão, de associação e de reunião dos atos de violência e intimidação por grupos privados (CIDH, 2012).
De acordo com a Comissão Internacional de Direitos Humanos (2012), a violência como representação do ódio contra pessoas LGBT é perpetrada por grupos conservadores não ligados ao Estado, sendo indivíduos, grupos organizados ou organizações extremistas. Porém, O estado falha em ser omisso e investigar, aplicar as devidas punições aos infratores. Pois parte do princípio que o Estado tem obrigação em proteger os direitos à vida, à liberdade e à segurança, como garante o artigo 3 da Declaração Universal dos Direitos Humanos e os artigos 6 e 9 do Pacto Internacional sobre Direitos Civis e Políticos: Artigo 3: Todos têm direito à vida, à liberdade e à segurança pessoal. Artigo 6: O direito à vida é inerente à pessoa humana. Este direito deverá ser protegido pela lei. Ninguém poderá ser arbitrariamente privado de sua vida. Artigo 9: Toda pessoa tem direito à liberdade e à segurança pessoal (CIDH, 2012).
De acordo com Navy Pillay (2012), os Estados tem obrigações junto ao direito internacional a fim de investigar tais violações e levar os responsáveis à justiça. A Assembleia Geral das Nações Unidas recomendou aos Estados que "garantissem a proteção do direito à vida de todas as pessoas sob sua jurisdição" e investigassem de forma rápida e comprometida tais violações, inclusive, as que foram motivadas pela orientação sexual da vítima. Assim sendo, se um Estado deixar de investigar e punir uma violação, estará violantando também suas obrigações perante a lei internacional (Pillay, 2012).
O relatório da CIDH também chama atenção para uma denúncia grave de agressão direcionada às pessoas LGBT. Essas violações também partem de pessoas da própria família e membros da comunidade com o argumento de vergonha e desonra familiar, por ferirem a "moral" de seus membros por conta do comportamento sexual ou identidade de gênero. Ainda que as mulheres sejam alvos mais frequentes deste tipo de discurso punitivo, esses ataques podem ser direcionados a indivíduos de qualquer sexo (Pillay, 2012).
Outra denúncia terrivelmente grave feita pela CIDH é a de que lésbicas estão sendo atacadas, estupradas, forçadas a engravidar e punidas de formas diversas com argumento de sua orientação sexual, deve-se dizer que esse tipo de violência contra a mulher vem acontecendo em diversas regiões do planeta. O Comitê afirma que "as lésbicas enfrentam um risco aumentado de se tornarem vítimas de violência, especialmente estupros, por causa de mitos e do grande preconceito", como por exemplo, que lésbicas mudariam sua orientação sexual se estupradas por um homem." Nas suas observações finais, o Comitê pede atenção especial para a África do Sul, onde salientou profunda preocupação com relação às ofensas sexuais relatadas e os homicídios contras as mulheres por causa de sua orientação sexual. Levando a atenção para o que se chama "estupros corretivos de lésbicas" (CIDH, 2012).
Para a CIDH (2012), leis que criminalizam a união homoafefiva dão espaço a uma série de violações em massa contra os LGBT. Estas leis violam o direito internacional do indivíduo de ser livre de discriminação, estabelecido no artigo 2 da Declaração Universal de Direitos Humanos e em tratados internacionais de direitos humanos, assim como o direito de ser protegido de tentativa contra sua integridade e vida privada, protegidos pelos artigos 12 e 9 da Declaração Universal e artigos 17 e 9 do Pacto Internacional sobre os Direitos Civis e Políticos. Ressaltando ainda que, leis que impõe a pena de morte para a conduta sexual, violam o direito à vida, assegurado pelo artigo 3 da Declaração Universal e artigo 6 do Pacto Internacional sobre Direitos Civis e Políticos (CIDH, 2012).
Levando em consideração também que a criminalização da prática sexual entre pessoas do mesmo sexo viola os direitos à privacidade e à não discriminação, a implementação da pena de morte é inaceitável e viola diretamente o artigo 6 do Pacto Internacional sobre Direitos Civis e Políticos e artigo 3 da Declaração Universal dos Direitos Humanos. Onde o artigo 6 prevê que, nos países que não aboliram a pena de morte, uma "sentença de morte pode ser imposta apenas para os crimes mais graves." Ofensas sexuais não se enquadra como 'os crimes mais graves' (CIDH, 2012). Assim, a Comissão afirma:

"É motivo de grande preocupação que em alguns Estados os relacionamentos homossexuais ainda sejam punidos com a morte. Deve-se recordar que nos termos do artigo 6 do Pacto Internacional sobre Direitos Civis e Políticos, as sentenças de morte só podem ser impostas para os crimes mais graves, uma cláusula que exclui claramente as questões de orientação sexual." (Comissão Internacional de Direitos Humanos, 2012)



O Conselho de Direitos Humanos (2012) afirma que criminalização das condutas sexuais com o mesmo sexo viola o direito à saúde, pois impede que os indivíduos tenham acesso à assistência média devido ao medo de que possam denunciar 'condutas criminosas', mediante sua orientação sexual. Consequentemente, a criminalização da homossexualidade abre margem para que planos de saúde e políticas nacionais não consedere necessária medidas específicas de saúde das comunidades LGBT. Em relatório de 2011, o Conselho de Direitos Humanos, sobre o direito à saúde, afirmou:

"Leis penais acerca de condutas consensuais entre pessoas do mesmo sexo, orientação sexual e identidade de gênero frequentemente infringem vários direitos humanos, incluindo o direito à saúde. Estas leis são geralmente e inerentemente discriminatórias e, como tal, violam as condições para se ter o direito à saúde, que requer igualdade de acesso para todas as pessoas. O impacto da discriminação baseada na conduta e na orientação sexual na saúde é de longo alcance e impede os indivíduos afetados de terem acesso a outros direitos econômicos, sociais e culturais. A violação de outros direitos humanos, por sua vez, tem impacto no exercício do direito à saúde, tal como o impedimento no acesso ao emprego e moradia." (Conselho de Direitos Humanos, 2011)

Em diversas nações, transgêneros enfrentam dificuldades diárias no acesso à Saúde. O processo de mudança de sexo, quando é permitido, depende de investimentos pessoais, onde financiamentos estatais raramente estão disponíveis. Deixando os profissionais da saúde, muitas vezes, inertes às necessidades das pessoas transexuais e lhes falta, até mesmo, treinamento profissional adequado. Além deste fato, crianças intersexo, consideradas aquelas que nascem com características sexuais deferentes de seus corpos biológicos, frequentemente são alvos de discriminação e podem ser submetidas a cirurgias inadequadas, realizadas sem o seu consentimento ou de seus pais, na tentativa de corrigir o seu sexo (CEDAW, 2012).
A discriminação nas escolas é outro ponto de preocupação, pois pode prejudicar e inibir a capacidade de jovens percebidos como gays, lésbicas, bissexuais, transgêneros ou intersexo de gozar de seu direito à educação. Em determinados casos, autoridades de educação e algumas escolas discriminam claramente jovens em razão de sua orientação sexual ou indentidade de gênero, levando-os à recusa de admissão ou expulsão da instituição de ensino. Além do fato de que, jovens LGBT sofrem frequentemente com violência e assédio nas escolas, violações essas que vão do bullying por parte de seus colegas e professores à agressões físicas e discursos de ódio. Combater esse tipo de conduta e requer comprometimento reforçado por parte da instituição e de autoridades da educação a fim de adotarem os princípios de não discriminação e diversidade nos discursos escolares (CEDAW, 2012).
Para finalizar as reflexões desde tópico, vale ressaltar a preocupação relacionada a educação sexual. O princípio do direito à educação afirma que todos devem receber informação completa e adequada à sua idade sobre sexualidade humana, a fim de garantir que jovens tenham informações necessárias para ter uma vida saudável, livre de discriminação, tornar o sexo uma prática responsável e se protegerem de doenças sexualmente transmissíveis (UNESCO, 2012).

Reconhecimento da união Civil entre pessoas do mesmo sexo
Muitos países já reconhecem a união civil entre pessoas do mesmo sexo e garantem os mesmos direitos à benefícios que os casais heterossexuais. Porém, em outros Estados, além de rejeitarem a parceria civil, negam os mesmos direitos à casais homossexuais não casados. Como por exemplo, os direitos de pensão, herança de bens, cobertura extendida no plano de saúde e seguro de vida, a chance de garantir residência para o parceiro estrangeiro, entre outros direitos relativos à conjugalidade, devidamente assegurados em uma relação heterossexual. A falta de reconhecimento oficial dos relacionamentos homoafetivos e a ausência de proibição legal da discriminação também estimula o preconceito por parte de atores privados, como, profissionais da assistência médica e de companhias de seguro (CIDH, 2012).
De acordo com o regime internacional de direitos humanos, as nações não são obrigadas a permitir que casais homoafetivos se casem. Mas ainda sim, os Estados devem cumprir com o dever de proteger seus indivíduos contra a discriminação por razão sua orientação sexual e assegurar que casais do mesmo sexo que não sejam casados possam ser tratados com toda a integridade que lhes tem por direito, igualmente assegurados aos casais heterossexuais não casados (CIDH, 2012).


3.2 - O conservadorismo religioso e a violência no Brasil
O Brasil é um país em que o percurso da política sexual tem sido amplamente debatido. Na realidade, as características "progressistas" da constituição brasileira nesse campo, principalmente, seu enganjamento na luta pela prevenção ao HIV (AIDS), foram amplamente reconhecidos e exaltados. Pode-se dizer que, o país teve grandes progressos no que diz respeito aos direitos sexuais, porém, atualmente, é arena de grandes batalhas político-religiosas que mantém e até mesmo intensificaram uma concepção patriarcal por parte da sociedade civil e da crescente influência da bancada religiosa, sobre o que um dia ativistas LGBT e feministas lutaram arduamente para conquistar (Kaoma; Queiroz, 2013; Vital; Leite Lopes, 2013).
De acordo com o autor Miguel Vale de Almeida (2014), o caso brasileiro, se constitui de uma federação, com estados e municípios federados que possuem certos graus de autonomia sobre as esferas legislativas e executivas. Alguns pontos a serem observados no sistema eleitoral representativo e de organizações partidárias é que, nos últimos anos, um cenário político de crescentes empasses, de uma lado, os liberais, com discursos inclusivos e de afinidade com a comunidade LGBT; por outro, o aumento gradativo da dificuldade nos avanços legislativos a nível nacional, devido à forte entrada na arena política de representantes religiosos ultraconservadores e, por muitas vezes, incitam o ódio e a violência contra pessoas homossexuais. Esta realidade tem provocado um retrocesso no plano de proteção dos direitos e do combate à violência homofóbica, em que a mesma toma níveis preocupantes sobre representação de violência física, em alguns casos.
No que diz respeito ao âmbito nacional, em 2009 foi criado na estrutura da Secretaria de Direitos Humanos da Presidência da República a Coordenação-Geral de Promoção dos Direitos de LGBT. Esta Coordenação foi criada após a formulação da 1ª Conferência Nacional LGBT em 2008 e que teve consequencia o Plano Nacional de Promoção da Cidadania e Direitos Humanos de LGBT em maio de 2009. Tendo como um de seus objetivos, a garantia da promoção de direitos à comunidade LGBT e combater qualquer tipo de discriminação contra os mesmos. Agregado a este plano, foi criado o Conselho Nacional de Combate à Discriminação e Promoção dos Direitos de LGBT em 2010, um órgão integrante de estrutura da Secretaria de Direitos Humanos, contando com representantes do Poder Público Federal e representantes da sociedade civil (Almeida, 2014).
Desde 2010, apesar de progressos legais terem sido registrados, como, a decisão do Supremo Tribunal Federal (STF) de legalizar uniões do mesmo sexo em 2011, o retrocesso se mantém atenuante, como se viu no caso dos projetos legislativos de proibição do aborto, a censura de materiais educacionais relacionados à sexualidade e ao HIV, em 2013, a entrada de um pastor evangélico bastante conservador como presidente da Comissão de Direitos Humanos e Minorias da Câmara dos Deputados (De La Dehesa, 2010).
Pedro Chequer (2014), que dirigiu o Programa Nacional de HIV/AIDS na década de 1990 e início de 2000, analisou as diretrizes das políticas sexuais no país como uma espécie "era Bush" no Brasil, como um fato tardio que se repetiu nos Estados Unidos. Chequer (2014) acredita que, a política sexual vigente hoje, no Brasil, é representada por uma 'subserviência' ímpar do Governo Federal aos grupos conservadores e consequentemente, conserva e aumenta, a manutenção de mentalidade social heteronormativa e preconceituosa. Em suas palavras:

"Tivemos campanhas suspensas, material educativo proibido de ser utilizado no ambiente escolar ao lado de uma agenda oficial quase silenciosa para evitar irritar essas forças conservadoras organizadas. O país perdeu a laicidade há algum tempo com a assinatura do acordo com o Vaticano em 2009."


Violência contra LGBT
O Grupo Gay da Bahia (GGB) divulga anualmente um Relatório de Assassinatos de Homossexuais no Brasil, de acordo com as estatísticas apresentadas pelo Disque Denúncia da Secretaria de Direitos Humanos da República do Brasil, que era responsável por elaborar tal relatório. Porém, sua última elaboração transparente à sociedade civil foi em 2012. No que se refere a atualidade, em 2014 foram registrados 326 mortes de gays, travestis e lésbicas no Brasil, incluindo 9 suicídios. Um assassinato a cada 27 horas. Um aumento de 4,1 % em relação ao ano anterior que somava um total de 313 crimes (GGB, 2014). Conforme gráfico representado pelo Grupo:

Figura 2: (Quadro comparativo por ano de vítimas de violência homofóbica. Por GGB, 2014)

O Brasil continua sendo um dos países com os maiores índices de crimes motivados pela homofobia, segundo dados apontados, 50% dos assassinatos de transexuais no ano de 2014 foram cometidos em território brasileiro. Dos 326 mortos, 163 eram gays, 134 travestis, 14 lésbicas, 3 bissexuais e 7 parceiros de travestis. Levando a reflexão que foram assassinados 7 heterossexuais, por terem sido confundidos com gays ou por estarem em contextos ou espaços reservados aos LGBT (GGB, 2014).
Conforme gráfico abaixo, os estados onde a violência homofóbica foram mais atenuantes, encontra-se São Paulo no ranking com 50 assassinatos; e Minas Gerais com 30. porém em termos parciais, Paraíba e Piauí e suas respectivas capitais, são as regiões que mais oferecem riscos aos LGBT. De acordo com o GGB (2014), por décadas, o Nordeste foi o espaço de maior registro de crimes homofóbicos, mas pela primeira vez em 2014, o Centro-Oeste surge como a região mais intolerante, com 2,9 de homocídios para cada 1 milhão de habitantes, seguido do Nordeste com 2,1, Norte 1,5 e Sudeste com 1,2 (GGB, 2014).

Figura 3: (Vítimas por Estado e por segmento LGBT. Por GGB, 2014)




Figura 4: (Vítimas de violência por segmento LGBT. Por GGB, 2014)


O Prof. Luiz Mott (2014) fundador do Grupo Gay da Bahia e Coordenador desta pesquisa há mais de três décadas afirma com propriedade que:

"99% destes homocídios contra LGBT têm como agravante seja a homofobia individual, quando o assassino tem mal resolvida sua própria sexualidade e quer lavar com o sangue seu desejo reprimido; seja a homofobia cultural, que pratica bullying contra lésbicas e gays, expulsando as travestis para as margens da sociedade onde a violência é endêmica; seja a homofobia institucional, quando o Governo não garante a segurança dos espaços frequentados pela comunidade lgbt ou como fez a Presidente Dilma, ao vetar o kit anti-homofobia, que deveria ter capacitado mais de 6 milhões de jovens no respeito aos direitos humanos dos homossexuais e mais recentemente, ao ter pressionado os senadores para que não aprovassem o PLLC 122 que equiparava a homofobia ao crime do racismo."

Luiz Mott (2014) chega a conclusão que há quatro vias emergenciais para se combater os crimes homofóbicos: a educação sexual para instruir os jovens e a população em geral o respeito sobre a diversidade sexual; consolidação de leis afirmativas que asseguram a plena cidadania dos LGBT, assim como, equiparar a homofobia e transfobia ao crime de racismo; a sociedade deve exigir que a polícia e a Justiça investiguem e punam com rigor os crimes de ódio contra as minorias e principalmente, que os LGBT evitem situações de que coloquem em risco sua integridade física, pois certeza da impunidade alimentam a ação desses agressores.

3.3 - África do Sul e seus contrastes sociais
A África do Sul hoje é uma nação que conta com uma das constituições mais progressistas do mundo. Sendo o primeiro país a proibir constitucionalmente a discriminação em razão de orientação sexual e o quinto de todo o mundo a reconhecer e legalizar o casamento entre pessoas do mesmo sexo, como também, o primeiro do continente africano a garantir tais direitos. Porém, sua realidade entra em contraste absoluto com o cenário institucional, onde crimes e violência contra as minorias permanecem configurando a realidade sul-africana. Este cenário é gritante para a comunidade negra LGBT, que são os que mais sofrem com essas violações. As diferenças socioeconômicas são massacrantes e acompanham as vidas das pessoas desde a era do Apartheid. Desta forma, tais desigualdades levam ao isolamento social e exclusão do meio cultura e consequentemente, impedem que a maioria tenha garantia e acesso aos direitos legais e às liberdades que foram proclamadas desde 1994, com o fim do regime repressor (Sagarra, 2015).
Uma denúncia que reflete essa realidade é a alta incidência de estupros das mulheres, pontualmente, os estupros "corretivos" e assassinatos de lésbicas negras, além do fato de que o Estado e a sociedade civil sul-africana não se empenham para investigar e punir os culpados. Sagarra (2015) também apontou que as comunidades LGBT e suas agendas políticas estão presas na hierarquia dos velhos paradigmas de desigualdades sociais, onde cita o exemplo da parada do orgulho gay, que conta com maioria branca e intelectualmente mais instruída.
A nação sul-africana continua como uma referência importante no que diz respeito à conquista por direitos sexuais, porém, exerce um papel incoerente ao que se viu nas décadas anteriores, na promoção internacional dos direitos humanos de lésbicas, gays, bissexuais e transgêneros. Foi veementemente contrária a aprovação de leis anti-LGBT na Uganda, Nigéria e Gâmbia. Porém, na sessão do Conselho de Direitos Humanos das Nações Unidas de junho de 2014, o país adotou uma posição contrária às suas ideologia quando apoiou uma resolução chamada de "Proteção da Família", colocando em debate seu velho compromisso com a igualdade dos direitos sexuais. Se já não bastasse sua posição retrógada frente a esta resolução, a África do Sul apoiou um violento movimento da Rússia para encerrar o debate sobre uma definição mais justa de "família" (Corrêa, 2014).
No âmbito doméstico, a fim de amenizar a violência generalizada, o país adotou algumas medidas punitivas mais eficazes e de prevenção ao crimes contra as minorias. Em abril de 2014, o Departamento de Justiça e Desenvolvimento Constitucional iniciou uma campanha pública que acoplou uma estratégia militar e de intervenção nacional para conter a violência anti-LGBT e assegurar respostas institucionais para as violações e crimes de ódio contra a comunidade LGBT sul-africana (Corrêa, 2014).
A maior dificuldade enfrentada pela nação sul-africana com relação à homofobia de uma forma geral é o grande incidente nos números de "estupros corretivos" é certamente a mentalidade cultural, uma herança moralista do apartheid e da colonização calvinista, pode-se dizer que a cultura tribal também alimenta este sentimento, pois condena qualquer que seja a concepção diferente da cultura "africana" de família, como também, a visão do estupro, como algo aceitável e cultural, que "corrige" as mulheres (Middleton, 2014).
Sagarra (2015) defende que mudança de concepções nunca é simples e é o principal desafio da África do Sul hoje, ainda que tenha se passado vinte anos após a diversidade sexual ser reconhecida ao nível constitucional, como um direito fundamental à liberdade humana. Apesar dos esforços conjuntos dos ativistas e do Estado em construir um Estado livre de qualquer preconceito, status que foi conquistado arduamente após a democratização do país, de nada talvez tenha mudado ou sido feito para a maioria da população negra, que vive acompanhada do medo e com a falta de segurança que o governo deixou pairar como sensação (Sagarra, 2015).























Conclusão final
A importância de analisar África do Sul e Brasil no que diz respeito à luta pelos direitos sexuais é evidenciar a árdua batalha ativista que ambos os países sofreram para obter constituições libertárias e em contextos históricos relativamente parecidos. Por um lado, África do Sul emergia como uma democracia após o fim do regime de segregação racial do Apartheid; sendo o primeiro país a dar espaço e voz aos movimentos LGBTs, justamente com o intuito de se consolidar como uma constituição livre de qualquer tipo de preconceito devido às suas cicatrizes do passado. Sendo, portanto, o primeiro do mundo (2006) a defender a descriminalização por orientação sexual. Por outro, Brasil, que inicia seu ativismo durante o regime repressor da Ditadura Militar e posteriormente, cede às pressões externas (principalmente dos países europeus) a reconhecer e legalizar a união entre pessoas do mesmo sexo (2011) e garantir todos os direitos previstos por lei a esses casais.
Esse artigo visa contrastas a diferença entre comportamentos sociais que não caminham nas mesmas vias que as leis progressistas de seus países. Evidenciar que o preconceito não diminuiu com a discriminalização da relação homoafitiva, mas sim, se perpetua e se agrava à medida que cresce o conservadorismo cultural e religioso manifestados através de discursos de ódio, perseguições, violações dos direitos relativos à conjugalidade e violências físicas e verbais.
Apesar de serem Estados laicos (o poder do Estado é oficialmente imparcial em relação às questões religiosas), África do Sul e Brasil sofrem fortemente influências do cristianismo em suas sociedades. Isto significa, que a imparcialidade e o discurso de que todos são iguais perante a lei é completamente violado a partir do momento em que um grupo se comporta de maneira superior ao outro, ao ponto de torna-lo invisível e excluido socialmente por sua conduta incompatível com os princípios religiosos e conservadores que regem e alimentam o patriarcado cultural.
Ainda que o reconhecimento legal da união homoafetiva tenha garantido aos casais todos os direitos igualmente assegurados à uma união heterossexual nos dois países, a identidade e a orientação sexual continuaram a ser evocadas como direitos reconhecidos, porém, não aceitos socialmente. O grande desafio nos dois países de pesquisa é a mentalidade patriarcal que ambas as sociedades possuem, que, além de perpetrar o preconceito e a discriminação, não reconhecem em cunho religioso e social a união homoafetiva, agravando os índices de violências e crimes de ódio contra os LGBTs.
É interessante notar que argumentos de cunho religioso/cristão são recorrentes nos debates acerca do reconhecimento legal das uniões entre pessoas do mesmo sexo, em países tão distintos como Brasil e África do Sul. O intervencionismo evangélico é hoje objeto de crítica no mundo inteiro, inclusive no Brasil. Contudo, a mesma cautela e visão crítica não tem sido desenvolvidas em relação às intervenções de direitos humanos mobilizadas por grupos LGTBs e feministas também pautados em lógicas salvacionistas e na imposição de "categorias" e discuros políticos não compartilhados e muito menos negociados com aqueles diretamente afetados pelas violações (Epprecht, 2012).
A elucidação de novas ideias acerca de direitos sexuais revisitam e enriquecem críticas clássicas das visões convencionais sobre cultura, nação e comunidade no centro da política sexual. No Brasil, se vê um crescente número de evangélicos na bancada parlamentar, o que tem dificultado veementente o diálogo entre Estado e LGBTs, tornando cada vez mais árduo o direito democrático à sexualidade. Mas também por motivos de ordem política: os discursose diretrizes de direitos humanos, inclusive em relação a gênero e sexualidade, estão cada vez mais entrelaçados aos interesses dos Estados e de lógicas geopolíticas (Corrêa, 2014).
Esses retrocessos frente à diversidade sexual não deveriam efranquecer a luta, que trazem em suas realidades os problemas que decorrem da configuração da presença cada vez mais atenuante dos Estados e do conservadorismo nas políticas de gênero, sexualidade e "raça". Há de ser enxergar que o contexto atual assiste a volta de antigas e novas lógicas soberanistas e heteronormativas. É por este motivo, que mais do que nunca, talvez, tenha sido tão importante para a sociedade civil persistir na luta para dar continuidade ao trabalho árduo de desenvolvimento dos direitos à livre sexualidade que foi severamente conquistado e não deve de maneira alguma sofrer repressão em seu exercício (Corrêa, 2014).




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