Coerência em suspensão: Adorno e os modelos de pensamento

October 12, 2017 | Autor: E. Soares Neves S... | Categoria: Critical Theory, Theodor Adorno, Frankfurt School, Teoría Crítica, Negative Dialectics
Share Embed


Descrição do Produto

Adorno e os modelos de pensamento

1

Eduardo Soares Neves Silva*

O ponto de vista que deu origem a este artigo poderia ser assim resumido: um estudo ampliado dos textos de Adorno, que abranja aqueles textos perenemente à margem da interpretação canônica, acaba por revelar um amálgama de pequenas obsessões e repetidos desvios. Não há dúvida de que é possível encontrar uma abundante coleção de argumentos, imagens, termos e referências a se repetir em textos diversos, o que faz saltar aos olhos uma unidade inegável. Acresce a isso que a reiterada uniformidade estilística1 – a artificialidade na construção de frases, a abundância de parataxes, elipses e quiasmos, a insurgência repentina de conceitos –, se pensada conjuntamente com a dependência radical entre conteúdo e modo de exposição, desdobrada por Adorno ao longo de sua produção intelectual, reforça a impressão da mais pacífica continuidade. No entanto, um olhar atento ao detalhe, ao contexto específico, mostra que os materiais de que se faz a teoria, os conceitos, nunca recebem uma definição que não seja sujeita a correções – não nomeadas, mas presentes – se é que alguma vez chegam a receber definições no sentido rigoroso do termo. No mais das vezes, o que observamos ao acompanhar um conceito é um esboço de definição que, ao longo de um mesmo texto, vai sendo nublada, deixada de lado, negada e reconstruída, em um processo tão persistente quanto subcutâneo. Ao fim e ao cabo, apenas na composição do texto é possível perceber aquela coerência que escapa à análise isolada do detalhe.2 Por essa razão, ao passarmos os olhos pela literatura secundária sobre Adorno, encontramos raros estudos que se constroem como análise de um conceito, algo tão comum com outros autores. Em contrapartida, é comum o estudo da relação entre Adorno e seu espectro de influências ou a análise de algo que, na falta de palavra mais apropriada, poderíamos chamar de motivo. Isto é, uma vez que carece tanto a estrita estabilidade dos conceitos como sua definição em viés analítico, a tradição interpretativa é constrangida a rever a expectativa de compreensão de sua teoria através da atividade de decomposição do todo em partes elementares, e busca – nos melhores, mais profícuos casos – iluminar a obra através de uma atividade que conjuga os esforços de atenção ao detalhe e vislumbre do todo, uma tarefa que, em termos adornianos, implica em pensar a teoria a partir da mútua negação entre momento e sistema, a partir de sua oposição recíproca. Frente a essa exigência, a análise de um motivo que conjugue um elemento organizador da teoria a um de seus conceitos tornou-se modo privilegiado de interpretação, uma vez que nele o princípio de composição da obra se mostra de modo claro.

55 Artefilosofia, Ouro Preto, n.7, p. 55-72, out.2009

Coerência em suspensão:

* Universidade Federal de Minas Gerais 1 A primeira análise conseqüente da questão do estilo de Adorno pode ser encontrada em ROSE, The melancholy science, Macmillan, 1978, p. 11-26. Cf. também o artigo que antecedeu a publicação do livro e que apresenta sinteticamente sua posição: ROSE, “How is Critical Theory possible”, Political Studies, vol . XXIV, n. 1, 1976, p. 69-85.A mais completa apresentação da questão pelo próprio está em ADORNO, “Der Essay als Form”, in Theodor W.Adorno Gesammelte Schriften (doravante GS, seguido do volume e página), Suhrkamp, 1998, vol. 11, p. 9-33; trad.,“O ensaio como forma”, in Theodor W.Adorno, Ática, 1994, p. 167-187. 2 Em termos musicais, o processo acima descrito se assemelha a um procedimento que Adorno reconhece e elogia em Schönberg:“aquele que, como compositor, conduz o subcutâneo para fora, encontrou e transmitiu um modo de exposição [Darstellungsweise] no qual essa estrutura subcutânea torna-se visível, no qual a execução torna-se realização integral da coerência musical” (ADORNO,“Arnold Schönberg (1874-1951)”, GS 10.1, p. 172; trad.,“Arnold Schönberg (1874-1951)”, in Prismas, Ática,

Eduardo Soares Neves Silva

56

1998, p. 165). Logo à frente na passagem, Adorno irá aproximar esse procedimento, próprio aos “sistemas tecno-estéticos”, dos procedimentos ditos “cognitivos”, chamando a ambos de modelos: “Pois cada obra de arte é um campo de forças, e assim como o conteúdo de verdade do juízo lógico é inseparável do ato de pensamento, também as obras de arte são verdadeiras apenas na medida em que superam os seus pressupostos materiais. [...] Eles se transformam em modelos”. Essa aproximação, como se verá à frente, tem ressonância em pontos-chave da obra de Adorno. *** 3

Transformações de um motivo presente nas Passagens de Walter Benjamin (cf. BENJAMIN, Das Passagen-Werk, in Gesammelte Schriften,V.1, Suhrkamp, 2001, p. 578), essas noções evocam o caráter dialético da obra de Adorno e assinalam a necessidade da reconstrução continuada da teoria, conquanto motivada por um diagnóstico do tempo que comporte uma reordenação dos termos do problema ao qual a teoria alude.Tal necessidade, inerente ao projeto da teoria crítica, raras vezes encontra a atenção que merece na tradição de estudos adornianos, freqüentemente vítima do fetiche do cânone. A noção de núcleo temporal da verdade recebe, entre outras, duas formulações decisivas:“A verdade, como processo, é um ‘percorrer de todos os momentos’ contraposto à ‘proposição isenta de contradição’ e tem, como tal, um núcleo temporal [Zeitkern]. Isso liquida aquela hipóstase da abstração e do conceito

Todos esses aspectos somados, ou seja, a se levar em conta o parentesco entre motivo e composição, o acordo não-linear entre momento e sistema, os deslizamentos pelos quais passam os conceitos e ainda a ênfase nas noções de diagnóstico do tempo e núcleo temporal da verdade,3 não há como afirmar categoricamente se na obra de Adorno prevalece a continuidade ou a ruptura. Somada à impressão de unidade, que todavia persiste, o que se forma é uma coerência em suspensão.4 Se a última expressão causa estranhamento não é porque se apresente aqui um Adorno autor de paradoxos. Tampouco seria correto atribuir a instabilidade dos conceitos em sua atividade teórica a uma carência de capacidade lógico-argumentativa. Segundo o que se propõe neste artigo, o que realmente alinhava cada uma dessas características constitui o mais íntimo projeto intelectual de Adorno, projeto que circunscreve a busca de um modo de pensamento capaz de acolher e dar expressão ao que se deixa entrever na passagem seguinte: Nos debates estéticos mais recentes, as pessoas falam de antidrama e anti-herói; analogamente, a dialética negativa, que se mantém distante de todos os temas estéticos, poderia ser chamada de antissistema [Antisystem]. Com meios logicamente consistentes, ela se esforça por colocar no lugar do princípio de unidade e do domínio totalitário do conceito supraordenado [übergeordneten Begriffs] a idéia daquilo que estaria fora do encanto [Banns] de tal unidade.5 Há vários problemas a se compreender nessas poucas linhas. Pode-se, por exemplo, perguntar por que a dialética negativa se afasta de todos os temas estéticos, o que, aliás, não deixaria de ter um impacto sobre a tradição, uma vez que parte considerável da literatura secundária procura esclarecer essa relação. Pode-se procurar entender como é possível que a conseqüência lógica atue contra o princípio de unidade e o domínio do conceito, o que é agravado pelo fato de o pensamento de Adorno ser fundamentalmente erguido ao largo dos conceitos rigidamente definidos. Pode-se questionar o sentido de atribuir a algo do âmbito da lógica um sentido que lhe é avesso, o de encanto. Desde já, contudo, é imprescindível entender o que significa “antissistema”. A primeira observação a se fazer é que, afora as formas derivadas, essa é a única ocorrência do termo “antissistema” em toda a obra de Adorno publicada em vida.6 O notável, insista-se, não é o fato de ser uma ocorrência rara, mas de ser única. O que se pergunta, então, é por que esse termo, de todo apropriado ao que se chamou acima de mútua negação entre momento e sistema, não se constituiu como tema principal da filosofia de Adorno, ao modo do que o termo “sistema” representou para o idealismo em geral, ou “crítica”, para Kant, ou “absoluto”, para Hegel. A resposta ladina seria: por isso mesmo. A resposta adequada parte da atenção ao que, na passagem citada, aparece como o que é visado pela dialética negativa entendida como antissistema: chegar à idéia de algo que estaria fora da unidade dada pelo conceito.

Uma confiança como sempre questionável no fato de que isso é possível para a filosofia; no fato de que o conceito pode ultrapassar o conceito, os estágios preparatórios [das Zurüstende] e o toque final [das Abschneidende], e, assim aproximar-se do não-conceitual [Begriffslose]: essa confiança é imprescindível para a filosofia e, com isso, parte da ingenuidade da qual ela padece. De outra forma, ela precisaria capitular e, com ela, todo espírito. Não se poderia pensar a mais simples operação, não haveria nenhuma verdade, e, em um sentido enfático, tudo não seria senão nada.Todavia, aquela parte da verdade que pode ser alcançada por meio dos conceitos, apesar de sua abrangência abstrata, não pode ter nenhum outro cenário senão aquilo que o conceito reprime [Unterdrückte], despreza [Mißachtete] e rejeita [Weggeworfene]. A utopia do conhecimento seria abrir o não-conceitual com conceitos, sem equipará-lo a esses conceitos.8 Ao lado da nomeação por negação – não-conceitual – daquele algo que escapa ao conceito e, rigorosamente, não poderia ser nomeado de outra forma, Adorno realiza nessas linhas uma das mais explícitas tomadas de posição que encontramos na sua obra. Na primeira parte da passagem, a tarefa da filosofia se mostra em sua inteireza: se por um lado a ela cabe persistir no esforço de alcançar o não-conceitual através do conceito, por outro lado essa atividade só pode se realizar como renovada confiança, uma vez que seu resultado não é outro que a mesma conceituação isolante. Em outros termos, a filosofia se vê enredada na necessidade, “a despeito de Wittgenstein, [...] [de] dizer o que não pode ser dito”,9 tendo, porém, que ver frustrada sua expectativa, posto que “somente os conceitos podem rea-

57 Artefilosofia, Ouro Preto, n.7, p. 55-72, out.2009

Antes mesmo de se pensar o que poderia estar além do conceito, teríamos que aceitar dois passos implícitos na formulação acima: em primeiro lugar, não há identidade entre o que se pensa – o conceituado, o objeto do saber – e o que é resultado do pensar – o conceito, o saber –, caso contrário Adorno não poderia sugerir que a dialética negativa visaria algo fora do domínio do conceito; em segundo lugar, qualificando o passo anterior, embora o conceito procure dar unidade àquilo ao qual ele se dirige, algo escapa ao seu encanto. Ora, se não há identidade entre saber e objeto, se é possível dizer que há algo nãoconceitual em relação ao qual a atividade de conceituação mostra sua insuficiência, e se o antissistema da dialética negativa procura chegar à idéia disso, logo se entende por que a resposta ladina não deixou de ser verdadeira: em uma cartada, a filosofia de Adorno põe-se substantivamente distante daquelas filosofias mencionadas, ainda que delas não se afaste a ponto de perder de vista suas categorias.7 Essa primeira aproximação ao que foi qualificado como o mais íntimo projeto intelectual de Adorno nos leva a outra passagem da Dialética negativa que, por seu turno, nos conduzirá às portas do problema a ser enfrentado:

que se iguala a si mesmo, que domina a filosofia tradicional.” (ADORNO, Drei Studien zu Hegel, GS 5, p. 284, aspas no original); e “Não nos agarramos sem modificações a tudo o que está dito no livro. Isso seria incompatível com uma teoria que atribui à verdade um núcleo temporal, em vez de opô-la ao movimento histórico como algo de imutável” (HORKHEIMER; ADORNO,“Zur Neuausgabe”, Dialektik der Aufklärung, GS 3, p. 9; trad.,“Sobre a nova edição alemã”, Dialética do esclarecimento, Zahar, 1986, p. 9). Cf. o primeiro capítulo da minha tese de doutorado. 4 Em outro momento, chamei essa circunstância de “coerência em fragmentos”. Embora a expressão seja ainda mais viva, evitei utilizá-la para não causar a impressão de que Adorno operaria a partir do recurso a fragmentos, no sentido caro aos românticos alemães, por exemplo. Devo essa correção às observações dos professores Ricardo Barbosa e Jorge de Almeida, a quem agradeço. 5 ADORNO, Negative Dialektik, GS 6, p. 10; trad., Dialética negativa, Zahar, 2009, p. 8. 6 Cf. a “Consideração Intermediária”, seção metodológica da minha tese de doutorado.

Eduardo Soares Neves Silva

58

7 Em face do que já foi exposto, é possível compreender o que está implicado na célebre questão da primazia do objeto. Embora uma apresentação completa do problema exija bem mais do que uma nota, posso sugerir uma apreciação que me parece correta e que atinge precisamente o ponto que nos interessa:“O objeto tem primazia porque, em seu ser-outro [Anderssein], como algo absoluto, ele não pode ser abstraído como ‘idéia’ do sujeito, justamente ao contrário. Evidentemente, o objeto só pode ser pensado através do sujeito, ‘mas ele se mantém sempre em relação a esse como um outro’” (BOZZETTI, Hegel und Adorno, Alber, 1996, p. 70). Cf. também SCHWEPPENHÄUSER, Theodor W. Adorno zur Einführung, Junius, 2000, p. 62-63;THYEN, Negative Dialektik und Erfahrung, Suhrkamp, 1989, p. 207-213. 8 ADORNO, Negative Dialektik, GS 6, p. 21; trad., Dialética negativa, p. 16-17. *** 9 ADORNO, Negative Dialektik, GS 6, p. 21; trad., Dialética negativa, p. 16. 10 ADORNO, Negative Dialektik, GS 6, p. 62; trad., Dialética negativa, p. 53. 11 ADORNO, Drei Studien zu Hegel, GS 5, p. 319. 12 WITTGENSTEIN, Tractatus Logico-Philosophicus, Edusp, 1994, aforismo 7, p. 281. 13 ADORNO, Drei Studien zu Hegel, GS 5, p. 336. Cf. as formulações paralelas proferidas em aula à época da publicação desses Três estudos sobre Hegel

lizar aquilo que o conceito impede”.10 Esse giro em falso nos leva à segunda parte da passagem, em que Adorno não apenas sustenta que há na atividade de conceituação uma dose incalculável de violência, como sugere que no instante indiviso em que a conceituação gera a extensão do conceito – aquilo que ele efetivamente coordena – o que ele tem verdadeiramente diante de si é o isso, o τόδε τι, que a violência oprime. Esse “τόδε τι não-conceitual”11 recebe, não obstante a impossibilidade de conceituação, um nome: o não-idêntico. À filosofia caberia, enfim, a tarefa de dizer esse algo inexprimível, como se lê em outra das raras referências de Adorno a Wittgenstein: A máxima de Wittgenstein, “Sobre aquilo de que não se pode falar, deve-se calar”,12 na qual o extremo do positivismo transborda [hinüberspielt] no habitus da reverente autenticidade autoritária, e que por isso exerce um tipo de sugestão de massas intelectual, é pura e simplesmente antifilosófica. A filosofia se deixa definir, se possível for, como o esforço [Anstrengung] de dizer aquilo de que não se pode falar; auxiliar o não-idêntico [Nichtidentischen] a chegar à expressão, ao passo que a expressão de qualquer modo sempre o identifica.13 Para recuperar o fio da meada, diríamos que a dialética negativa entendida como antissistema, modo próprio de realização da filosofia de Adorno, teria como tarefa chegar à idéia do não-idêntico, justamente aquilo que permanece não-conceitual porque não é acolhido no processo de identificação, no encanto da unidade. Além disso, tal tarefa retém simultaneamente sua possibilidade – à medida que uma confiança se apóia “[n]aquela parte da verdade que pode ser alcançada por meio dos conceitos” – e sua impossibilidade – à medida que a expressão desse cenário paga “de qualquer modo” tributo à identificação. Não é por outro motivo que essa tarefa é definida, na passagem da Dialética negativa, como utópica. Com efeito, se “pensar significa identificar”,14 como seria possível chegar a pensar o não-idêntico? E ainda, que filosofia sobrevive a essa necessidade? Desde já, somente uma filosofia que desafie o sentido de se fazer teoria.

Pensamento: modo e modelo Para compreender o que é denotado por esse desafio, é preciso retomar a questão acerca da unidade da obra de Adorno ou, nos termos propostos, a questão da coerência em suspensão. Se tomarmos como válida tal proposição, então a atualização – necessária porque constitutiva – do pensamento de Adorno dependeria da negação de seus momentos, realizada em vista de um novo diagnóstico do tempo, pautado pela atenção à concreção histórica. Tal processo condenaria, em última instância, tanto a tradição interpretativa da continuidade (que sustenta um Adorno sistemático e, assim, perde de vista seus momentos), como a tradição interpretativa da ruptura (que embora atenta à idéia de modelos sucessivos de teoria crítica, tende a não considerá-los segundo sua sempre atual possibilidade). Em função disso, defende-se

Dialética ‘negativa’ não é outra coisa que a negação determinada da dialética idealista. Ela gostaria de libertar o particular, o não-idêntico, da subordinação no universal e no idêntico do conceito.17 Que se façam duas observações: em primeiro lugar, a reconstrução da dialética proposta por Adorno está apoiada na já mencionada rejeição da identidade entre conceito e conceituado, portanto em uma crítica ao princípio idealista que dá forma ao sistema; em segundo lugar, tal crítica não surge sem mais, ela está apoiada em um diagnóstico das condições de produção do próprio pensar que, segundo Adorno, transformam o modo de uma crítica possível ao sistema.18 Dessa disposição

59 Artefilosofia, Ouro Preto, n.7, p. 55-72, out.2009

aqui uma leitura da obra que revela seus matizes segundo a oposição dialética entre momento e sistema, corrigido por cada diagnóstico do tempo. Assim, faríamos justiça ao princípio de composição da obra de Adorno que, sob o aspecto formal, articula consistência e fragmentação, face visível da dialética negativa entendida como antissistema. Desse modo, é possível compreender porque somente um antissistema poderia executar a tarefa de “auxiliar o não-idêntico a chegar à expressão” e ainda circunscrever sua utopia do conhecimento: “abrir o não-conceitual com conceitos, sem equipará-lo a esses conceitos”. A pergunta que deve dirigir os próximos passos não pode ser outra que a seguinte: que teoria é capaz de comportar a dupla necessidade representada por tal utopia do conhecimento? E, supondo que haja essa teoria, como representar, ou ainda, como exprimir adequadamente o pensamento do não-idêntico sem trair sua intenção? Afinal, esse deve ser necessariamente negativo, uma vez que pensar e identificar se coadunam. Claro está que se os conceitos trazem consigo não apenas o esforço de identificação, mas também a identidade positiva resultante, o caminho tradicional da teoria é precisamente o que está em crise. Se por um lado o que deve vir à luz é “aquela parte da verdade que pode ser alcançada por meio dos conceitos, apesar de sua abrangência abstrata”, o que aponta para a expressão do não-idêntico “que o conceito reprime, despreza e rejeita”, por outro lado essa tarefa se vê bloqueada, uma vez que “a expressão de qualquer modo sempre o identifica”. Assim, entende-se por que Adorno encontra razões para afirmar que “somente os conceitos podem realizar aquilo que o conceito impede”. Essa ambigüidade, que aponta para uma radical não-identidade entre o que deve ser exposto e o que efetivamente é exposto, o leva a pensar a própria atividade conceitual no limite de sua possibilidade, o que não só justifica a aposta em um antissistema – que rejeita a atividade teórica linear e a identidade entre conceito e conceituado –, como exige que se persista nessa resistência à falsidade inerente ao estado de identidade. Ora, é precisamente esse o sentido do “conceito transformado de dialética”,15 representado por uma dialética negativa: contra a afirmação da dialética idealista, Adorno vai encontrar o cerne da dialética – sua verdade – não na suprassunção [Aufhebung] hegeliana, mas na resistência à identidade, ou ainda, em uma suspensão da síntese.16 Como sustenta Schweppenhäuser:

em ADORNO, Philosophische Terminologie, vol. 1, Suhrkamp, 1997, p. 55-56 (4.Vorlesung, 17/5/1962) e p. 82 (7.Vorlesung, 5/6/1962); vol. 2, p. 183 (35. Vorlesung, 15/1/1963). 14 ADORNO, Negative Dialektik, GS 6, p. 17; trad., Dialética negativa, p. 12-13. *** 15

ADORNO, Drei Studien zu Hegel, GS 5, p. 250. 16 Cf. a muito influente apresentação dessa questão por THEUNISSEN,“Negativität bei Adorno”, in FRIEDEBURG; HABERMAS (Orgs.), AdornoKonferenz 1983, Suhrkamp, 1983, p. 41-65. Cf. também THYEN, Negative Dialektik und Erfahrung, p. 162-169; e BOZZETTI, Hegel und Adorno, p. 55-75. 17 SCHWEPPENHÄUSER, Theodor W.Adorno zur Einführung, p. 54. Outro dos termos de extração hegeliana que, reconstruídos, conferem ao pensamento de Adorno sua especificidade em relação à tradição dialética, a “negação determinada” é, em Hegel, peça-chave da chamada Lógica do Conceito e o passo para a universalidade concreta. Na “Introdução” da Fenomenologia do espírito encontramos a seguinte posição do problema: “[...] a exposição [Darstellung] da consciência não-verdadeira

Eduardo Soares Neves Silva

60

na sua não-verdade não é um movimento meramente negativo. [...] é o ceticismo que vê sempre, no resultado, apenas o puro nada e por isso abstrai do fato de que esse nada é determinado, é o nada daquilo do qual ele resulta. Porém, o nada considerado apenas como o nada daquilo do qual procede é, de fato, o resultado verdadeiro; ele é, pois, algo determinado e possui um conteúdo. O ceticismo, que termina com a abstração do nada e da vacuidade, não pode avançar além dessa, mas deve esperar que algo de novo se lhe ofereça para lançá-lo no mesmo abismo vazio. Ao contrário, à medida que o resultado é apreendido como negação determinada [bestimmte Negation], como na verdade é, então com isso uma nova forma surge imediatamente e, na negação, é feita a passagem por meio da qual o processo se efetua por si mesmo, através da série completa das figuras [Gestalten]” (HEGEL, Phänomenologie des Geistes, in Hauptwerke in sechs Bänden, vol. 2,WBG, 1999, “Einleitung”, §79, p. 57; trad., A fenomenologia do espírito, Abril Cultural, 1974, p. 51). Para o propósito deste artigo, o mais importante a destacar nessa truncada passagem de Hegel é que a negação determinada, ao contrário da negação abstrata que define a Lógica da Essência (e que o ceticismo assume), considera o que está sendo negado. Assim, quando algo é apreendido como negação determinada (ou concreta), ele não é eliminado, ao contrário, sua negação é passo do reconhecimento de sua dependência às demais figuras. Ou seja, passo da suprassunção, a negação determinada faz do que é negado um momento dialético. Cf. a excepcional análise

de crítica ao impulso sistemático, já é factível inferir alguns resultados para o sentido da sobrevivência do pensamento. Como se disse acima, o que está em crise é a idéia tradicional de teoria. A hipótese de Adorno é que o resultado da atividade teórica – tanto na crítica kantiana, como na dialética hegeliana – acaba por afastar do centro da análise aquilo que realmente importa: à medida que ela gera através de conceitos uma falsa solução do problema da não-identidade entre pensamento e coisa, afirmando que, afinal, não se trataria disso, mas da identidade entre conceito e conceituado, a teoria perde de vista o único elemento ao qual deve fidelidade, o não-idêntico. Logo, uma vez que a atividade filosófica visa alcançar o não-conceitual, senão “ela precisaria capitular e, com ela, todo espírito”, Adorno é obrigado a trabalhar com conceitos e contra a ilusão de identidade que eles representam. Que essa ilusão de identidade seja, porém, inescapável, isso é um resultado direto da tese implícita na frase “pensar significa identificar”; e que, além disso, ela seja necessária e tenha uma razão objetiva, esse é o horizonte descortinado por seu diagnóstico do tempo.19 Em outros termos, precisamente porque esse diagnóstico revela transformações constitutivas nas condições de produção do pensar, como mencionado, é que Adorno é obrigado a esse esforço do conceito. Grosso modo, isso significa elaborar um modo de pensamento que permita perseguir o não-idêntico entre o conceituado e o conceito, sem que isso implique entendê-lo como o “resto” da atividade de conceituação. Embora seja freqüente na tradição interpretativa a assimilação do não-idêntico ao “resto” do conceito, há boas razões para não fazê-lo. A principal delas, já suficiente, advém da compreensão de que, conforme a passagem da Dialética negativa anteriormente citada, o conceito efetivamente “pode ultrapassar o conceito, os estágios preparatórios [das Zurüstende] e o toque final [das Abschneidende]”.20 Se o conceito simplesmente cortasse e isolasse [abschneiden] algo, poderíamos sim localizar o não-idêntico como uma categoria residual do processo de identificação. No entanto, como a atividade de conceituação envolve também um preparar [zurüsten] do cenário, uma armação prévia, o não-idêntico indica um excesso, não um resto. Dito claramente: caso o não-idêntico fosse um resto, teríamos que compreendê-lo como aquilo que escapa a uma dada determinação, ou seja, algo que está além deste ou daquele conceito; não é disso que se trata, pois o não-idêntico indica algo que excede todo e qualquer conceito, ou seja, algo que excede o estado de identidade pressuposto pela atividade de conceituação.21 Daí o motivo de Adorno, coerentemente, afirmar: “em uma oposição brusca ao ideal de ciência corrente, a objetividade de um conhecimento dialético precisa de mais, não de menos sujeito”.22 Ora, o modo de pensamento que procura realizar tais tarefas não pode seguir nenhum caminho usual do discurso teórico porque, fundamentalmente, ao buscar a expressão do não-idêntico, o pensamento se vê às voltas com a necessidade de se deixar guiar, na medida do possível, pelo conceituado. A medida desse “possível” se mostra em mais um trecho da Dialética negativa:

Assim, subjacente à tarefa de levar o não-idêntico à expressão, encontramos a exigência de que o conceito se aproxime do conceituado deixando-se instruir pelo procedimento mimético. Mesmo que aqui não se faça a apreciação do problema da mimesis,24 vale ressaltar a aproximação entre a causa da mimesis recalcada pelo conceito e o cenário do que é reprimido pelos conceitos: duas instâncias de resistência à ilusão de identidade dada pelos conceitos.25 Tal aproximação aponta para um outro aspecto da tarefa filosófica de Adorno: se o pensamento deve ser solidário a essas instâncias que sobrevivem de maneira lacunar, como elementos de negatividade, ele deve abandonar a forma mais persistente do discurso teórico, aquela que justamente supõe um discurso linear, sem lacunas. Com isso, seu pensamento não apenas permanece refratário ao que convencionamos chamar de teoria, como traz para dentro de si um pressuposto estético, que se exprime – por força do momento mimético apropriado pelo conceito – em um procedimento relativo ao seu “modo de comportamento”. Logo, como mostra Duarte, a tarefa filosófica de Adorno tem como pressuposto “a não-exterioridade entre o conteúdo do filosofema e sua forma de apresentação [Darstellungsform] convergentes na própria expressão”.26 Tal é a razão primária para o momento estético não ser acidental para a filosofia.

Filosofia e arte, identidade e expressão O projeto filosófico de levar o não-idêntico à expressão e a utopia do conhecimento que ele exprime resolvem-se, portanto, em um pensamento que parece guardar maior parentesco com a arte, terreno privilegiado da mimesis, do que com a lógica discursiva. Contudo, dada a insistência na centralidade inapelável dos conceitos, convém examinar melhor esse parentesco. De volta à Dialética negativa: A filosofia que quisesse imitar a arte, que quisesse ser por si mesma obra de arte, arriscaria a si mesma. [...] Arte e filosofia não tem o seu elemento comum na forma ou no procedimento configurador [gestaltendem Verfahren], mas em um modo de comportamento [Verwaltensweise] que proíbe a pseudomorfose. As duas permanecem incessantemente fiéis ao seu próprio teor [Gehalt] através de sua oposição [Gegensatz]: a arte, na medida em que se enrijece [spröde] contra as suas significações; a filosofia, na medida em que não se atém a nenhuma imediatidade. O conceito filosófico não renuncia à nostalgia [Sehnsucht] que anima a arte como algo não-conceitual e cujo preenchimento

61 Artefilosofia, Ouro Preto, n.7, p. 55-72, out.2009

O conceito não consegue defender de outro modo a causa daquilo que recalca [verdrängte], a da mimesis, senão na medida em que se apropria de algo dessa mimesis em seu próprio modo de comportamento [Verhaltensweisen], sem se perder nela. Dessa forma, o momento estético, ainda que por uma razão totalmente diversa do que em Schelling, não é acidental para a filosofia.23

desse mecanismo hegeliano, em relação à determinação das três dimensões do espaço, em ARANTES, Hegel – a ordem do tempo, Polis, 1981, p. 33-37; e o comentário de LEBRUN, Passeios ao léu, Brasiliense, 1983, p. 24-31. Cf. também a exposição dos sentidos da negação determinada em Hegel, Marx e Adorno em GRENZ, Adornos Philosophie in Grundbegriffen, Suhrkamp, 1974, p. 75-116. 18 Faz-se necessário ressaltar alguns desdobramentos desse problema que, embora nos levem além do intento deste artigo, fincam um marco possível de estudo da obra de Adorno e retomam questões aqui sugeridas: é exatamente o peso desse diagnóstico acerca das condições do pensar que situa a obra de Adorno em um lugar indiviso, a meio caminho de várias escolas filosóficas, e confere possibilidades insuspeitas de aproximação. Em um ótimo parágrafo de Demmerling:“a crítica ao idealismo por Adorno deve ser entendida como crítica à filosofia do sujeito.A correção materialista do idealismo excede as suposições fundamentais da filosofia da consciência. De modo análogo à crítica materialista ao idealismo,Adorno exerce uma crítica ‘antropológica’ ao princípio fenomenológico de Husserl. Com isso é dado mais um passo na direção de uma transformação

Eduardo Soares Neves Silva

62

materialista da filosofia clássica. O materialismo é validado [abgesichert] de maneira críticocognitiva” (DEMMERLING, Sprache und Verdinglichung, Suhrkamp, 1994, p. 143). *** 19

Eis a posição do problema por Nobre:“a dialética é a teoria da não-identidade de sujeito e objeto no interior da formação social em que a lógica da dominação é exatamente a da ‘ilusão necessária’ da identidade entre sujeito e objeto: a dialética é a ontologia do estado falso’” (NOBRE, A dialética negativa de Theodor W. Adorno, Brasiliense, 1998, p. 174-175). 20 ADORNO, Negative Dialektik, GS 6, p. 21; trad., Dialética negativa, p. 16. 21 Esse mesmo problema já se anuncia na Dialética do esclarecimento, embora a resposta não seja exatamente a mesma: “o conceito é a ferramenta ideal que se encaixa nas coisas pelo lado onde se pode pegá-las” (HORKHEIMER; ADORNO, Dialektik der Aufklärung, GS 3, p. 57; trad., Dialética do esclarecimento, p. 50). 22 ADORNO, Negative Dialektik, GS 6, p. 50; trad., Dialética negativa, p. 42. Para uma leitura que, por argumentos distintos, rejeita a aproximação entre não-idêntico e resto ver TÖBBICKE, Negative Dialektik und kritische Ontologie, K&N, 1992, p. 115-116. Cf. também uma definição possível do não-idêntico: “ele é o resultado conceitual-negativo da negação determinada do conceito de identidade” (SCHWEPPENHÄUSER,

escapa de sua imediatidade como de uma aparência. Organon do pensamento e, não obstante, o muro entre este e aquilo que há para pensar, o conceito nega essa nostalgia. A filosofia não pode nem contornar uma tal negação nem se curvar a ela. Nela reside o esforço [Anstrengung] de ir além do conceito por meio do conceito.27 A relação da filosofia com a arte, portanto, não se faz pela subsunção ou equivalência, mas pela contraposição. Enquanto a arte parece prometer à filosofia a realização daquilo que a última tanto busca quanto reprime, a reafirmação da específica tarefa filosófica, “ir além do conceito por meio do conceito”, reforça a caracterização da tarefa como bloqueada por seus próprios meios. Se esse bloqueio já implicava, como se viu, a aposta em um antissistema e a resistência à falsidade representada pelo estado de identidade entre o conceito e o conceituado (ou entre o pensamento e o que é para ser pensado) – único modo de se manter a verdade da dialética –, agora já se sabe que persistir nessa tarefa exige que a filosofia não abandone algo que a arte parece exprimir. Desse modo, a contraposição entre ambas, arte e filosofia, é trazida para dentro do próprio procedimento conceitual: ele não renuncia àquela nostalgia, mas a nega. Mais especificamente, aquela contraposição é salva, como expressão, nesse impasse. Ao fim da “Introdução” da Dialética negativa encontramos uma passagem que elucida essa relação e situa a posição filosófica de Adorno como projeto crítico e tarefa: “A dialética, segundo o sentido literal do termo a linguagem enquanto organon do pensamento, seria a tentativa de salvar [erretten] criticamente o momento retórico: aproximar uma da outra a coisa e a expressão, até a indiferenciação”.28 A dialética buscada por Adorno não pode se resolver em sistema, posto que deve ser expressão da resistência ao estado de identidade. No entanto, do mesmo modo que os conceitos expressam o esforço de alcançar além de si mesmos, através de si mesmos, a dialética guarda também a necessidade de salvar o conceituado no conceito. Em outras palavras, a dialética negativa de Adorno não é mera denúncia da falsidade efetiva do estado de identidade, mas exprime também a verdade possível da identidade que o momento retórico aponta: aquela que reconciliaria pensamento e realidade. Assim, em relação ao pensamento, Adorno pode afirmar que “sua aparência e sua verdade se confundem”.29 Alguns aspectos sugeridos merecem um desenvolvimento. De imediato, cumpre destacar a dupla remissão desse processo: o sistema filosófico, a construção teórica, converge com o sistema histórico-social, a construção do mundo. Logo, a falsidade e a verdade do estado de identidade só se deixam compreender plenamente a partir da análise da formação social, da qual o projeto filosófico de Adorno é, fundamentalmente, um diagnóstico. Sendo assim, a falsidade do estado de identidade, embora diga respeito à relação entre conceito e conceituado, só se define em função do estado de coisas que afirma essa identidade e no mesmo passo a bloqueia. Só por esse motivo Adorno pode falar de um aspecto do conceito que está além de uma teoria do significado, a saber, seu momento utópico,

A exigência de ser vinculante sem sistema é a exigência por modelos de pensamento [Denkmodellen]. Esses modelos não são de um tipo meramente monadológico. O modelo diz respeito ao específico e mais do que específico, sem fazê-lo volatizar-se em seu conceito mais genérico supraordenado. Pensar filosoficamente significa o mesmo que pensar em modelos; a dialética negativa é um ensemble de análises de modelos.34 Uma vez que, como visto acima, a dialética negativa entendida como antissistema “com meios logicamente consistentes [...] se esforça por colocar no lugar do princípio de unidade e do domínio totalitário do conceito supraordenado a idéia daquilo que estaria fora do encanto de tal unidade”,35 reconhece-se no modelo aquele modo de pensamento que procura realizar essa tarefa: enquanto reconstrução do sistema e da atividade lógica de conceituação, o

63 Artefilosofia, Ouro Preto, n.7, p. 55-72, out.2009

aquele que aponta para o cumprimento da promessa do conceito ser uno com a realidade. É nessa dupla remissão que se apóia o sentido preciso que Adorno dá ao princípio de crítica ao sistema,30 e é essa dialética entre possibilidade e bloqueio que esclarece o sentido do célebre motivo da solidariedade “com a metafísica no instante de sua queda”.31 Com isso, já é possível antecipar o desdobramento dessa renovada tarefa crítica. Por um lado o projeto dialético de Adorno desafia o sentido tradicional de teoria e se constrói à medida que realiza a “desmontagem dos sistemas”,32 por outro lado ele não abandona a teoria nem deixa de resgatar no sistema aquilo que é sua verdade: a busca de uma coerência entre o plano do pensamento e o plano do real. Ora, é exatamente essa coerência que o conceito, ao afirmar, bloqueia. Aqui reencontramos a afinidade entre o momento mimético que sobrevive no procedimento conceitual, no seu modo, e o momento retórico entendido como impulso dialético: se o que importa é “auxiliar o não-idêntico a chegar à expressão” e se essa tarefa está bloqueada pelo conceito, então a crítica filosófica só pode fazê-lo à medida que defender a mimese salvando-a no momento retórico. Desse modo, a “teoria” que Adorno propõe exprime um mundo governado, por assim dizer, pelos conceitos e pelos conceituados, que em sua oposição recíproca recuperam algo daquela indiferença que a mimesis expressa e o momento retórico tenta salvar. Obviamente, não é possível que isso ocorra a não ser que o modo de exposição, sobre o qual incide o momento retórico, traduza tanto a resistência à violência do sistema, como a afirmação de sua coerência. Logo, a dimensão expressiva do pensamento, trazida para o primeiro plano por um motivo estritamente crítico, exige que o discurso filosófico, ao mesmo tempo, conduza e se deixe levar: “algo racionalmente organizado e, não obstante, descontínuo, assistemático e mais espontâneo, exprime o espírito autocrítico da razão”.33 Na Dialética negativa essa reconstrução da herança do pensamento sistemático ganha nome: modelo de pensamento.

Theodor W. Adorno zur Einführung, p. 64). 23 ADORNO, Negative Dialektik, GS 6, p. 26; trad., Dialética negativa, p. 21. 24 Algumas apresentações do problema informam esta tese e podem ser lidas em GAGNEBIN,“Do conceito de mímesis no pensamento de Adorno e Benjamin”, Perspectivas, n. 16, 1993, p. 67-86; DUARTE, Mímesis e racionalidade, Loyola, 1993, p. 133-141 e BARBOSA, Dialética da reconciliação, Uapê, 1996, p. 55-66. 25 Como sintetiza Barbosa: “o conceito de mimese evoca antes a resistência do reprimido no interior mesmo da lógica da identidade” (BARBOSA, Dialética da reconciliação, p. 56). 26 DUARTE,“Expressão como fundamentação”, in Adornos, UFMG, 1997, p. 178. *** 27

ADORNO, Negative Dialektik, GS 6, p. 26-27; trad., Dialética negativa, p. 21-22. 28 ADORNO, Negative Dialektik, GS 6, p. 66; trad., Dialética negativa, p. 55. 29 ADORNO, Negative Dialektik, GS 6, p. 17; trad., Dialética negativa, p. 13. ***

Eduardo Soares Neves Silva

64

30 Cf.THYEN, Negative Dialektik und Erfahrung, p. 116-131; NOBRE, A dialética negativa de Theodor W. Adorno, p. 165-176; BEHRENS, Adorno-ABC, Reclam, 2003, p. 202-203. 31 ADORNO, Negative Dialektik, GS 6, p. 400; trad., Dialética negativa, p. 337. Cf. o desenvolvimento desse motivo em MARAS, Vernunft- und Metaphysikkritik bei Adorno und Nietzsche, Eberhard-KarlsUniversität zu Tübingen, 2002, esp. p. 96-102. 32 ADORNO, Negative Dialektik, GS 6, p. 43; trad., Dialética negativa, p.36. 33 ADORNO, Negative Dialektik, GS 6, p. 40; trad., Dialética negativa, p.33. 34 ADORNO, Negative Dialektik, GS 6, p. 39; trad., Dialética negativa, p.32-33. 35 ADORNO, Negative Dialektik, GS 6, p. 10; trad., Dialética negativa, p.8. *** 36

ADORNO, Negative Dialektik, GS 6, p. 33; trad., Dialética negativa, p.27. 37 ADORNO, Negative Dialektik, GS 6, p. 10; trad., Dialética negativa, p.8. 38 “Que posso saber? Que devo fazer? Que me é permitido esperar?” (KANT, Kritik der reinen Vernunft, in Werke in zehn Bänden, vol. 4, WBG, 1983, B 832-833, p. 677; trad., Crítica da razão pura, vol. 2, Nova Cultural, 1988, p. 223). Há ainda a conhecida quarta pergunta anotada por Jäsche: “Que é o homem?” (KANT, Logik, in Werke..., vol. 5, A 25, p. 448).

modelo exprime a possibilidade da filosofia não se render nem à nostalgia de imediatidade, a dissolução no específico, nem à “não verdade dos próprios sistemas, sua loucura”,36 que é a evaporação no genérico. Portanto, o modelo exprime tanto o esforço [Anstrengung] de se “ir além do conceito por meio do conceito”, como o esforço [Anstrengung] em “auxiliar o não-idêntico a chegar à expressão”. Com isso, é possível responder à questão lançada no início desta análise, a saber, que filosofia sobrevive à necessidade representada por tal utopia do conhecimento? Memória da limitação constitutiva da filosofia, é no modelo de pensamento que se deposita a responsabilidade de “abrir o não-conceitual com conceitos, sem equipará-lo a esses conceitos”. Não é outro o sentido da mais precisa referência à sua função por Adorno, encontrada no prefácio da Dialética negativa: os modelos devem “elucidar o que é a dialética negativa, impelindo-a, de acordo com seu próprio conceito, para o interior do domínio do real”.37

Dialética negativa e modelos de pensamento Sem o peso de ter que representar todo o interesse da razão, como na célebre asserção de Kant,38 mas com a mesma força de síntese, é possível fazer três perguntas a partir dos últimos passos da argumentação, a fim de circunscrever a tarefa que a filosofia de Adorno se dispõe a enfrentar: o que é o modelo? Qual é o seu método? Quais são seus resultados? Embora já se veja que o modelo se apresenta no pensamento de Adorno como efetivação da dialética negativa e reconstrução da filosofia sistemática em antissistema, a primeira dessas perguntas é, das três, a que menos admite resposta direta. Não porque a pergunta “o que é o modelo?” prescreva uma exegese em que a mão do intérprete pese mais que a do autor; justo ao contrário, isso se dá porque, enquanto modo de pensamento que demanda um modo de exposição, o modelo realiza a filosofia intentada por Adorno. Logo, a única resposta possível é a que devolve uma pergunta pelo sentido da atividade específica da filosofia: na reconstrução que faz da herança filosófica com a qual debate, Adorno salva no modelo a verdade do pensamento sistemático; nele se resguarda o princípio sistemático da aproximação entre razão e coisa, corrigido pela causa do não-idêntico. Do mesmo modo, a terceira pergunta também aponta para fora de si mesma: se “pensar filosoficamente significa o mesmo que pensar em modelos”, julgar a realização do modelo significa repor a pergunta pela realização do projeto de Adorno, sua atribuição de sentido à própria filosofia. Assim, nos dois casos, a resposta apenas se mostra: é seu pensamento. Entretanto, se uma definição direta não parece factível, a aproximação ao problema através da atenção às suas circunstâncias é plenamente realizável. Como o modelo de pensamento conforma a filosofia de Adorno e sustenta a possibilidade de enfrentar as questões que ele se propõe, as marcas dessa atribuição podem ser encontradas dispersas em sua obra. Com efeito, não são poucos os textos

Esses modelos não são exemplos; eles não se limitam simplesmente a ilustrar considerações gerais. Na medida em que conduzem para aquilo que é realmente relevante para o tema [Sachhaltige], eles gostariam de fazer justiça ao mesmo tempo à intenção material [inhaltlichen Intention] daquilo que, por necessidade, é inicialmente tratado em termos gerais; e isso em contraposição ao uso de exemplos como algo em si indiferente, um procedimento introduzido por Platão que a filosofia vem repetindo desde então. Apesar de os modelos deverem elucidar o que é a dialética negativa, impelindo-a, de acordo com

65 Artefilosofia, Ouro Preto, n.7, p. 55-72, out.2009

de Adorno que se definem a si mesmos como modelos: esse é o caso da terceira parte da Dialética negativa, que realiza três modelos,39 bem como o dos dois volumes de ensaios Intervenções (1962)40 e Palavras-chave (1969)41 e o planejado terceiro volume que completaria essa série de modelos críticos.42 Em uma atribuição mais tímida, esse mesmo termo designa também a função dos aforismos finais de cada parte da Minima moralia (1951), que deveriam fornecer modelos “para um futuro esforço [Anstrengung] do conceito”.43 Deve-se notar também que não é casual que as mais explícitas referências se encontrem em textos da maturidade: o modelo é o resultado da busca por um modo de pensamento que permita o enfrentamento de um problema que, em larga medida, já era presente para o jovem Adorno mas que só se esclareceu ao longo de seu percurso intelectual. Não obstante a explicitação tardia, ao longo de toda sua obra a idéia de modelo está presente, ainda que não se reconheça como modo privilegiado de pensamento ou categoria operatória. Assim, embora possamos dizer que o modelo de pensamento só vem à autoconsciência no Adorno tardio, sua presença se faz notar em toda a obra, o que faz com que mesmo as ocorrências do termo Modell, seus derivados (Denkmodell, Grundmodell, Hauptmodell, Modellanalyse, Modellcharakter, Modellfunktion, modellieren, gemodelt, modellartig, etc.) e formas flexionadas e declinadas se contem às centenas.44 Descontadas muitas ocorrências que não guardam relação direta com a questão, mas apenas com o sentido trivial do termo, encontramos ainda uma grande quantidade de referências ao modelo como um modo de pensamento.45 No entanto, em função do grau de importância relativa que o termo ganha em cada texto, é possível dizer que, contanto já encontremos em um dos seus primeiros textos uma definição de modelo muito congruente com os traços apontados,46 o tempo altera para Adorno a consciência da centralidade dessa idéia e sua compreensão. Com isso, voltamos à segunda pergunta, a única, dentre as sugeridas acima, que não se dissolveu na remissão ao todo: qual é o método dos modelos de pensamento? Ou: como se analisam modelos de dialética negativa? Uma indicação dessa resposta é encontrada também no prefácio da Dialética negativa, no momento em que Adorno afirma que a terceira parte do livro “realiza os modelos de dialética negativa” [führt Modelle negativer Dialektik aus]:

Em relação a isso, vale citar uma conhecida passagem de uma entrevista dada por Adorno. Confrontado com a questão: “Mas como o senhor pretende alterar a totalidade social sem ações isoladas?”, Adorno contesta: “Essa pergunta vai além de mim. Diante da pergunta ‘o que se deve fazer?’ eu realmente só posso responder, na maioria das vezes, ‘eu não sei’. Eu só posso tentar analisar, intransigentemente, o que é” (“Keine Angst vor dem Elfenbeinturm”, GS 20.1, p. 404). Sobre o papel dessas questões, especialmente a quarta, no plano geral da filosofia de Adorno, cf. BEHRENS, “A dialética negativa da negação determinada”, in DUARTE et al. (Orgs.), Theoria Aesthetica, Escritos, 2005, p. 140-141. *** 39

Cf. ADORNO, Negative Dialektik, GS 6, p. 10; trad., Dialética negativa, p.8. 40 ADORNO, Eingriffe, GS 10.2, p. 455-594. 41 ADORNO, Stichworte, GS 10.2, p. 595-782; trad., Palavras e sinais,Vozes, 1995. 42 ADORNO, Kritische Modelle 3, GS 10.2, p. 783-799. Cf. “Editorische Nachbemerkung”, GS 10.2, p. 842.

Eduardo Soares Neves Silva

66

43

Cf. ADORNO, Minima moralia, GS 4, p. 17; trad., Minima moralia, Ática, 1992, p. 10. 44 Cf. a “Consideração Intermediária”, seção metodológica da minha tese de doutorado. 45 Além de centenas de ocorrências nas obras citadas há pouco, cf. também as seguintes obras: HORKHEIMER; ADORNO, Dialektik der Aufklärung, GS 3, p. 227; trad., Dialética do esclarecimento, p. 188; ADORNO, Kierkegaard, GS 2, p. 161; Zur Metakritik der Erkenntnistheorie, GS 5, p. 9 e 52; Jargon der Eigentlichkeit, GS 6, p. 507; Ästhetische Theorie, GS 7, p. 105, 300, 392 e 530; trad., Teoria estética, Edições 70, [1993?], p. 83 e 228 (a parte final, “Paralipomena”, não foi traduzida); “Zum Verhältnis von Soziologie und Psychologie”, GS 8, p. 43; “Soziologie und empirische Forschung”, GS 8, p. 196; “Über Statik und Dynamik als soziologische Kategorien”, GS 8, p. 219, 224 e 227; “Einleitung zum ‘Positivismusstreit in der deutschen Soziologie’”, GS 8, p. 331; trad., “Introdução à controvérsia sobre o positivismo na sociologia alemã”, in Textos escolhidos, Abril, 1975, p. 249; “Charakteristik Walter Benjamins”, GS 10.1, p. 239; trad. “Caracterização de Walter Benjamin”, in Theodor W. Adorno, p. 189; “Blochs Spuren”, GS 11, p. 241; “Zum Studium der Philosophie”, GS 20.1, p. 320; “Kritische Theorie und Protestbewegung”, GS 20.1, p. 400. 46 “Elas [as imagens históricas] são modelos com os quais a ratio, examinando e provando, se

o seu próprio conceito, para o interior do domínio real, eles determinam, de um modo não muito diverso do assim chamado método exemplar [exemplarischen Methode], conceitos-chave de disciplinas filosóficas a fim de intervir nesses conceitos de maneira central.47 O mais importante a se desdobrar a partir dessa passagem é que, se os modelos procuram fazer justiça [gerecht werden] à intenção particular daquilo sobre o qual se debruçam enquanto modo de pensamento, então o modelo não é indiferente àquilo que representa, embora seja, por necessidade [aus Not], um esquema geral de atribuição. De fato, o que Adorno indica é que o modelo deve ser conduzido por isso que foi tratado de modo genérico. Ora, se por um lado Adorno quer se referir à primazia do objeto e seu impacto sobre o sentido da dialética negativa – qual seja, ela é sua limitação constitutiva –, por outro lado ele quer acentuar que os modelos de dialética negativa só podem existir em prática, já que dessa restrição dependeria a possibilidade de o modelo pretender ser mais que exemplo e, com isso, intervir no sentido de se fazer filosofia. Em outras palavras, tomada ao pé da letra, a sugestão de que os modelos devam tomar um conteúdo particular como constitutivo implicaria em dizer que não há método abstrato, só há métodos concretos, materiais, guiados por uma intenção intrínseca dos particulares, ou seja, atentos à sua concreção histórica. Se os modelos acabam por passar em terrenos já demarcados pela filosofia, isso não se daria porque o método impõe essa adequação, mas porque os modelos – na exata forma da crítica filosófica – viram os conceitos contra si mesmos. Claro, o horizonte não é outro que o do estabelecimento de um método dialético capaz de “aproximar uma da outra a coisa e a expressão, até a indiferenciação”, o que justifica a afirmação de que os modelos elucidam a dialética negativa: em última análise, os modelos acabam por apoiar a dialética não no método, domínio da razão, mas no que é próprio à coisa, domínio do real. A metodologia inferida dessa apresentação dos modelos de pensamento guarda um parentesco com Hegel e Marx, como é claro, mas também com Husserl, como pode não parecer à primeira vista.48 Efetivamente, se os modelos devem se aferrar à coisa, o que Adorno faz não é senão, em nome de uma necessidade dialética, portanto extrínseca à fenomenologia de Husserl, mas próxima ao sentido enfático da fenomenologia em Hegel, radicalizar uma premissa husserliana tornada lema: zu den Sachen selbst (às coisas mesmas).49 Dessa fenomenologia tornada crítico-dialética se segue, contudo, uma ambigüidade: a ênfase de Adorno na impossibilidade de se estabelecer métodos abstratos, que no fim das contas trairiam a intenção daquilo em relação ao qual eles deveriam se construir, implica em concluir que os modelos, para não serem indiferentes ao que é próprio à coisa, não podem seguir método; porém, sua realização parece seguir princípios metódicos ao se deixar guiar pelos particulares. A dissolução dessa ambigüidade é o último passo a ser dado neste artigo.

Procedimento como método: modelos de dialética negativa

Artefilosofia, Ouro Preto, n.7, p. 55-72, out.2009

Não são poucos os estudos na tradição de interpretação da obra de Adorno que procuram definir qual é sua metodologia. Muitos desses estudos passam por alto a explícita tomada de posição de Adorno contra uma metodologia geral, o que implica em desconhecer algo que, como se viu, está sustentado em uma cadeia de argumentos que remonta a aspectos nodais de seu pensamento. Outros apostam na total ausência de métodos, o que, além de ser contraproducente ao extremo, não considera a tão inegável quanto incômoda presença de procedimentos recorrentes em suas obras, aquilo que abrange o que o próprio Adorno chama de proceder “metodicamente sem método”,50 o que na feliz expressão de um comentador configura seu “imperativo metodológico”.51 Nas poucas apresentações mais explícitas da questão metodológica em filosofia, como a da passagem da Dialética negativa analisada acima, Adorno tanto condena o estabelecimento de uma metodologia geral – ela trairia a filosofia –, como condena os métodos abstratos – eles trairiam seus objetos.52 No entanto, não só porque há diversas passagens em que Adorno defende um método genérico para se lidar com os problemas – mesmo que guiado pela intenção intrínseca dos particulares – e chega a afirmar, por exemplo, que “o nervo da dialética como método é a negação determinada”,53 mas principalmente em função do escopo exato da crítica de Adorno, é possível coligir procedimentos que são tratados como métodos. O que de fato se verifica é que esses procedimentos se estabelecem frente a uma impossível metodologia geral como redescrição de um princípio de crítica imanente: contra o caráter coercivo de um sistema lógico que se torna método, tanto na filosofia como na teoria social, Adorno adota procedimentos que, por um lado, à medida que resultam em um ensemble de modelos, explicitam os limites do método abstrato, enquanto que, por outro lado, à medida que regem efetivamente cada um desses modelos, devolvem à atividade teórica a possibilidade compreensiva. Não deve escapar à atenção que “imanente”, nesse caso, implica algo diferente do sentido tradicional que o termo ganha em um sistema. Ou seja, ao invés de se referir apenas ao âmbito interno do método e do sistema, de ser apenas crítica à pretensão do sistema em ser uno com a realidade e a pretensão do método em chegar à exposição dessa unidade, a crítica imanente no antissistema é redescrita como crítica imanente e transcendente: trata-se tanto de expor a inverdade do sistema, sua afirmação de identidade, quanto de fazer a crítica da sociedade que o engendra. Logo, em consonância à passagem anterior que apontava a dupla remissão analítica – sistema filosófico e sistema histórico-social – aquilo de que se trata aqui é o diagnóstico do tempo traçado por Adorno: na inverdade do sistema filosófico sobrevive um momento verdadeiro, qual seja, a de que o sistema histórico-social se comporta conforme aquela identidade.54 Logo, o modelo, como procedimento e exemplo, repõe o sentido exato da noção de crítica em Adorno: por um lado trata-se de mostrar o limite da teoria sistemática, por outro lado – do mesmo modo que o conceito é obrigado a ir através de si mesmo além de si mesmo – não há como

67

aproxima de uma realidade que se nega a lei, mas que o esquema do modelo pode pouco a pouco imitar, se ele estiver corretamente cunhado” (“Die Aktualität der Philosophie”, [1931] GS 1, p. 341). Observe-se que, na passagem citada, a idéia de modelo está associada à de imagem histórica, outra idéia de Benjamin que tem grande impacto no pensamento de Adorno. *** 47

ADORNO, Negative Dialektik, GS 6, p. 10; trad., Dialética negativa, p.8. Nesta passagem particularmente intraduzível, Adorno recupera sua crítica e transformação da fenomenologia de Husserl. Há duas marcas claras dessa apropriação: o termo inhaltlichen Intention, que inverte a relação estabelecida em termoschave fenomenológicos, como intendierte Objekt e, especialmente, intendierte Inhalt,“conteúdo intencionado”; e o emprego específico do termo Sachhaltige, substantivação do adjetivo sachhaltig,“dotado de conteúdo concreto”. A referência última são as Investigações lógicas (edição de 1913) e as insuficiências que Adorno vê na alegação husserliana da imediatidade entre o conhecer e o que é conhecido. Para Adorno, pareceria ou contraditória ou insuficiente uma tese como “o objeto intencional

Eduardo Soares Neves Silva

68

da representação é o mesmo que seu objeto efetivo [wirklicher] e, conforme o caso, o mesmo que seu objeto exterior, e é um contra-senso distinguir entre ambos” (HUSSERL, Logische Untersuchungen, vol. 2, parte 1, Max Niemeyer, 1968, p. 425). 48 Adoto aqui o termo “método” para me referir aos procedimentos que guiam os passos e operações em vista de um objetivo, isto é, literalmente, “caminho para se chegar a um fim”. Com o termo “metodologia” refiro-me à reflexão geral que coordena e justifica esses métodos. Conquanto essa diferença não seja relevante em todos os casos, entendo que na obra de Adorno ela é importante, como mostrarei na seqüência do artigo. 49 Interessante observar que nesse ponto Adorno parece não ter sido levado pela mesma miopia que acometeu os primeiros intérpretes de Husserl, que entendiam o princípio literalmente – como se Husserl propusesse um retorno às coisas brutas ou aos objetos ônticos, e não um retorno às coisas que estão em questão, ou seja, um retorno às representações próprias da coisa visada, determinada pela intenção. O que Adorno questiona em Husserl é justamente ele não ter dado esse passo. Cf. a análise da banalização da fenomenologia no zu den Sachen selbst e o erro dos intérpretes em MOURA, Crítica da razão na fenomenologia, Nova Stella, 1989, p. 18-25. *** 50

“Der Essay als Form”, GS 11, p. 21; trad.,“O ensaio como forma”, p. 177.

mostrar esse limite por outros meios que não aqueles que governam o próprio sistema. Ou seja, não se trata de questionar a metodologia tradicional “de fora” apontando como seus métodos traem o objeto, mas através de procedimentos metódicos mostrar sua própria insuficiência constitutiva: um método possível, por concreto que fosse, seria ainda método. Daí, ser guiado pela intenção intrínseca dos particulares não significa comparar o objeto real com o objeto teórico (como fazer isso se não metodicamente através da teoria?), mas insistir na sua não-identidade contra a afirmação de sua identidade pela metodologia tradicional. Vale notar que essa é a forma que o problema do não-idêntico se apresenta em relação ao método da atividade crítica. Ou seja, aqui como lá, está em pauta o esforço de “auxiliar o não-idêntico a chegar à expressão, ao passo que a expressão de qualquer modo sempre o identifica”. Para tanto, é preciso simultaneamente expor “o que é próprio à coisa”, o “específico”, e reconhecer o que há de geral no particular, o “mais do que específico”.55 Tal é a tarefa a que se dedica o modelo: sua realização – nas análises que compõem a Dialética negativa – se dá através justamente dos procedimentos, os quais, nessa medida, conferem à atividade crítica seu modo de exposição [Darstellungsweise].56 Ora, do mesmo modo que em outras questões, como a pertinente aos modelos, se há uma metodologia que coordena e justifica tais procedimentos, ela não pode ser outra coisa que toda a obra de Adorno como projeto filosófico. Portanto, se nos remetermos à pergunta que motivou o desvio para as questões de método – “qual é o método dos modelos de pensamento?” – é razoável afirmar que o que há de método na obra de Adorno está representado pelos procedimentos que guiam a realização de modelos. Daí se constrói uma hipótese: a metodologia de Adorno se restringe à recorrência a esses procedimentos que atuam na formação de modelos de dialética negativa. Logo, é razoável atribuir a esses procedimentos aquela responsabilidade que repousa nos modelos: não esquecerem a utopia do conhecimento. Remontando a questões ainda mais internas ao projeto filosófico de Adorno, reencontra-se a hipótese deste artigo: se ao modelo cabe elucidar a dialética negativa e levá-la para o domínio do real, isso só pode se dar porque eles se constroem a partir de alguns procedimentos que, tratados como método mas guiados pela intenção intrínseca dos particulares, aproximam coisa e expressão na própria análise.57 A necessidade de desenvolver essa hipótese exige a busca de indícios de procedimentos que possam cumprir as exigências determinadas pelo projeto crítico aqui desdobrado. Para tanto, é preciso atender a uma dupla exigência. Em primeiro lugar, um tal procedimento precisaria exprimir o cerne da questão enfrentada, precisaria resguardar a primazia do objeto. Esse seria o único modo de não atribuir a esse procedimento mais do que ele sustenta, isto é, de não resvalar para a afirmação de uma metodologia geral em Adorno, resultado inevitável da instrumentalização dos seus procedimentos. Nos seus termos: Por mais que os momentos dos modos de proceder [Verfahrungsweise] queiram ser definidos de forma instrumental – sua adequação ao objeto fica ainda assim exigida, mes-

mo que de modo oculto. Os procedimentos [Verfahren] serão improdutivos quando carecerem dessa adequação. O objeto precisa alcançar validade no método segundo seu próprio peso, caso contrário até mesmo o método mais refinado resultará falho.58

Se não se quiser confundir definitivamente a sociologia com modelos das ciências naturais, então o conceito de experimento deverá se estender também ao pensamento que, saturado da força da experiência, ultrapassa-a para compreendê-la. [...] O momento especulativo não é uma carência do conhecimento social, mas, como momento seu, lhe é imprescindível, muito embora a filosofia idealista que outrora glorificava a especulação já pertença ao passado.59 Assim, conquanto o procedimento procurado deva ser necessariamente marcado pelo traço intrínseco aos particulares, essa marca não pode se fazer nem à custa da consideração dos momentos da teoria, sustentada pela mais estrita compreensão do sentido dos modelos de pensamento, nem à custa da atenção ao todo da teoria, ao momento de verdade do sistema, ao qual cada um desses momentos se refere em oposição recíproca. Satisfeitas essas condições, encontrar tal procedimento abre a possibilidade de ler a obra de Adorno como um ensemble de análises de modelos. Não cabe aqui o desenvolvimento deste passo, mas cumpre dizer ao que ele se refere: esse procedimento é a constelação, categoria elementar do pensamento de Adorno que, ao acolher a negação determinada, dá forma ao seu antissistema. Por sua vez, o modelo, a quem cabe realizar a dialética negativa, só pode auxiliar o não-idêntico a chegar à expressão à medida que se compõe ao modo do ensaio: coerência em suspensão.

Artefilosofia, Ouro Preto, n.7, p. 55-72, out.2009

Em segundo lugar, esse procedimento precisaria estar presente – garantidas as adequações determinadas pelo que se viu acima – em toda a obra de Adorno. Uma razão para isso é de ordem interpretativa: porque se pretende defender que o pensamento de Adorno se constitui de momentos que são sucessivamente negados em vista de novos diagnósticos do tempo, é necessária uma chave de leitura da obra que permita percorrer esses momentos e qualificá-los em relação ao princípio da oposição dialética entre momento e sistema. Em outros termos, essa é uma necessidade que surge de uma lógica da descoberta do sentido de seu pensamento. A outra razão para isso é, contudo, de ordem interna: por mais que os procedimentos devam estar atentos ao particular para não traírem a promessa que a filosofia faz ao não-idêntico, jamais foge ao esforço do pensamento uma dimensão especulativa, na verdade, ela é que lhe dá seu sentido. A remissão ao todo, o impulso sistemático, sobrevive na obra de Adorno como única instância possível de realização daquela noção de crítica que configura o telos de todo o seu projeto filosófico. No mesmo texto citado acima, ele reitera:

69

51

Cf. ZUIDERVAART, Adorno’s aesthetic theory, MIT Press, 1991, p. 53-54. 52 Além das já mencionadas passagens da Dialética negativa e dos textos “Der Essay als Form” e “Die Aktualität der Philosophie”, outras referências metodológicas importantes são: HORKHEIMER; ADORNO, Dialektik der Aufklärung, GS 3, p. 37-44, 227-228, 249; trad., Dialética do esclarecimento, p. 33-39, 188 e 204-205; ADORNO, Negative Dialektik, GS 6, p. 42-45 e 163-168; trad., Dialética negativa, p. 35-38 e 140-144.; Ästhetische Theorie, GS 7, p. 530-533; “Gesellschaft”, GS 8, p. 13-17; “Theorie der Halbbildung”, GS 8, p. 101-102;“Spätkapitalismus oder Industriegesellschaft?”, GS 8, p. 356-360; trad.,“Capitalismo tardio ou sociedade industrial?”, in Theodor W. Adorno, p. 63-67; “Beitrag zur Ideologienlehre”, GS 8, p. 461-462. Além disso, há um conjunto de textos de Adorno sobre teoria social em que ele faz a crítica de diversas metodologias: ADORNO, “Soziologie und empirische Forschung”, GS 8, p. 196-216; “Einleitung zu Emile Durkheim ’Soziologie und Philosophie’”, GS 8, p. 245-279;“Einleitung zum ‘Positivismusstreit...’“, GS 8, 280-353; trad.,“Introdução à controvérsia...”, p. 215-263; “Zur gegenwärtigen Stellung

Eduardo Soares Neves Silva

70

der empirischen Sozialforschung in Deutschland”, GS 8, p. 478-493;“Zur Logik der Sozialwissenschaften”, GS 8, p. 547-565; trad.,“Sobre a lógica das ciências sociais”, in Theodor W. Adorno, p. 46-61. 53 ADORNO, Drei Studien zu Hegel, GS 5, p. 318. 54 Cf. o desenvolvimento desse problema, em que se imbricam tanto as análises de Sohn-Rethel acerca da troca de equivalentes no modo de produção capitalista e as de Pollock sobre o capitalismo de estado, quanto o legado das análises de Lukács sobre as antinomias do pensamento burguês, em THYEN, Negative Dialektik und Erfahrung, esp. p. 185-198; NOBRE, A dialética negativa de Theodor W. Adorno, p. 44-58; BEHRENS,“A dialética negativa da negação determinada”, p. 141147. *** 55 Cf. MÜLLER-DOOHM, Die Soziologie Theodor W. Adornos, Campus, 1996, p. 133-149. Acerca desse passo, Müller-Doohm conclui: “por conseguinte, os métodos precisam estar referidos à compreensão da relação de tensão [Spannungsverhältnis] entre o geral e o particular em sua concreção histórica” (p. 149). 56 O sentido preciso de mais esse termo que deve sua concepção a Hegel, e que já se insinua desde as primeiras páginas deste artigo, indica de maneira clara o desdobramento da noção de crítica que Adorno põe para funcionar em seu antissistema. O espaço em que esse termo se desenvolve na obra de Adorno é determinado pelo sentido

Bibliografia ADORNO, Theodor W. Dialética negativa. Tradução de M. A. Casanova, revisão técnica de E. S. N. Silva. Rio de Janeiro: Zahar, 2009. ADORNO, Theodor W. Filosofia da nova música. Tradução de M. França. 2.ed. São Paulo: Perspectiva, 1989. ADORNO, Theodor W. Minima moralia. Reflexões a partir da vida danificada. Tradução de L. E. Bicca, revisão de G. Almeida. São Paulo: Ática, 1992. ADORNO, Theodor W. Palavras e sinais. Modelos críticos 2. Tradução de M. H. Ruschel, supervisão de A.Valls. Petrópolis, RJ:Vozes, 1995. ADORNO, Theodor W. Philosophische Terminologie. 2 vols. 8.ed. Frankfurt a.M.: Suhrkamp, 1997. ADORNO, Theodor W. Prismas. Crítica cultural e sociedade. Tradução de A. Wernet e J. M. B. Almeida. São Paulo: Ática, 1998. ADORNO, Theodor W. Teoria estética. Tradução de A. Morão. Lisboa: Edições 70, [1993?]. ADORNO, Theodor W. Textos escolhidos. Seleção de Z. Loparic e O. F. Arantes. São Paulo: Abril, 1975. (Coleção Os Pensadores). ADORNO, Theodor W. Theodor W. Adorno Gesammelte Schriften. Edição de Rolf Tiedemann. 20 vols. Frankfurt a.M.: Suhrkamp, 1997. ADORNO, Theodor W. Theodor W. Adorno. Organização de Gabriel Cohn. 2.ed. São Paulo: Ática, 1994. (Coleção Grandes Cientistas Sociais). ARANTES, Paulo E. Hegel – a ordem do tempo. São Paulo: Polis, 1981. BARBOSA, Ricardo. Dialética da reconciliação: estudo sobre Habermas e Adorno. Rio de Janeiro: Uapê, 1996. BEHRENS, Roger. “A dialética negativa da negação determinada. Algumas implicações estéticas na teoria crítica da sociedade de Theodor W. Adorno”, in DUARTE, Rodrigo et al. (Orgs.). Theoria Aesthetica. Porto Alegre: Escritos, 2005. BEHRENS, Roger. Adorno-ABC. Leipzig: Reclam, 2003. BENJAMIN, Walter. Gesammelte Schriften. Edição de Rolf Tiedemann e Hermann Schweppenhäuser. 7 tomos. 3.ed. Frankfurt a.M.: Suhrkamp, 2001. BOZZETTI, Mauro. Hegel und Adorno. Die kritische Funktion des philosophischen Systems. Freiburg i.B.; München: Alber, 1996.

DUARTE, Rodrigo. Adornos: nove ensaios sobre o filósofo frankfurtiano. Belo Horizonte: UFMG, 1997. DUARTE, Rodrigo. Mímesis e racionalidade: a concepção de domínio da natureza em Theodor W. Adorno. São Paulo: Loyola, 1993. GAGNEBIN, Jeanne-Marie. “Do conceito de mímesis no pensamento de Adorno e Benjamin”. Perspectivas, São Paulo, n. 16, p. 67-86, 1993. GRENZ, Friedemann. Adornos Philosophie in Grundbegriffen. Auflösung einiger Deutungsprobleme. Frankfurt a.M.: Suhrkamp, 1974. HEGEL, Georg W. F. A fenomenologia do espírito. Tradução de H. C. L.Vaz. São Paulo: Abril Cultural, 1974. HEGEL, Georg W. F. Hauptwerke in sechs Bänden. Edição compacta das Gesammelte Werke, sob licença da editora Felix Meiner. 6 vols. Darmstadt: WBG, 1999. HORKHEIMER, Max; ADORNO, Theodor W. Dialética do esclarecimento: fragmentos filosóficos. Tradução de G. A. Almeida. 2.ed. Rio de Janeiro: Zahar, 1986. HUSSERL, Edmund. Logische Untersuchungen. 3 vols. Tübingen: Max Niemeyer, 1968. KANT, Immanuel. Crítica da razão pura. Tradução de V. Rohden e U. B. Moosburger. 3.ed. São Paulo: Nova Cultural, 1988. KANT, Immanuel. Werke in zehn Bänden. Reimpressão da Kant-Studienausgabe, edição de Wilhelm Weischedel. 10 vols. Darmstadt: WBG, 1983. LEBRUN, Gérard. Passeios ao léu. São Paulo: Brasiliense, 1983. LUTZ MÜLLER, Marcos. “Exposição e método dialético em ‘O Capital’”. Boletim SEAF, Belo Horizonte, n.2, p. 17-41, 1982. MARAS, Konstadinos. Vernunft- und Metaphysikkritik bei Adorno und Nietzsche. 2002. Tese (Doutorado) – Eberhard-Karls-Universität zu Tübingen, Tübingen, Alemanha. MOURA, Carlos A. Ribeiro de. Crítica da razão na fenomenologia. São Paulo: Nova Stella, 1989. MÜLLER-DOOHM, Stefan. Die Soziologie Theodor W. Adornos. Eine Einführung. Frankfurt a.M.: Campus, 1996.

71 Artefilosofia, Ouro Preto, n.7, p. 55-72, out.2009

DEMMERLING, Christoph. Sprache und Verdinglichung. Wittgenstein, Adorno und das Projekt einer kritischen Theorie. Frankfurt a.M.: Suhrkamp, 1994.

da crítica de Marx a Hegel e o lugar que a exposição aí ocupa. Para a compreensão desse passo, remetemo-nos imediatamente à seguinte passagem de um brilhante artigo sobre o problema:“a análise do elemento ‘exposição’ no método dialético d’O Capital não pode, em nenhum momento, levar ao esquecimento de que a exposição das categorias da economia política está indissociavelmente unida à crítica, e que é este um dos aspectos em que a exposição dialética de Marx se distingue da de Hegel. A exposição é essencialmente crítica porque ela só reconstitui a totalidade sistemática das determinações do capital, através da tematização da sua estrutura e do seu movimento contraditórios, a partir da pretensão de dominação total do capital sobre o trabalho e do seu malogro sistêmico (crise) [...]. Enquanto exposição das contradições do capital ela é essencialmente crítica, embora a crítica se exerça exatamente e apenas (enquanto teoria) através da exposição sistemática da sua instabilidade estrutural e da necessidade da sua superação” (LUTZ MÜLLER,“Exposição e método dialético em ‘O Capital’”, Boletim SEAF, n. 2, 1982, p. 19, nota). As vicissitudes da apropriação desse modelo crítico por Adorno podem ser

Eduardo Soares Neves Silva

72

lidas em NOBRE, A dialética negativa de Theodor W. Adorno, p. 103-148 e 172-177. 57 Note-se mais uma vez a relação do modelo com o princípio de composição que liga Adorno a Schönberg, como mencionado em nota anterior. Não é por outro motivo que outra das mais importantes referências à idéia de modelo também se reporta a Schönberg:“logo, em relação ao desenvolvimento, ela [a variação] oferece a produção de relações universais concretas, não esquemáticas. A variação é dinamizada. Até mesmo se ela ainda mantém idêntico o material de partida, que Schönberg chama de ‘modelo’. Tudo é sempre ‘o mesmo’. Mas o sentido dessa identidade se reflete como não-identidade. O material de partida está feito de tal maneira que mantê-lo significa ao mesmo tempo modificá-lo. ‘É’ não em si, mas somente em relação com a possibilidade do todo” (ADORNO, Philosophie der neuen Musik, GS 12, p. 58; trad., Filosofia da nova música, Perspectiva, 1989, p. 51). *** 58

ADORNO,“Zur Logik der Sozialwissenschaften”, GS 8, p. 557; trad.,“Sobre a lógica das ciências sociais”, p. 53. 59 ADORNO,“Zur Logik der Sozialwissenschaften”, p. 556; trad.,“Sobre a lógica das ciências sociais”, p. 53.

NOBRE, Marcos. A dialética negativa de Theodor W. Adorno. A ontologia do estado falso. São Paulo: Iluminuras, 1998. ROSE, Gillian. “How is Critical Theory possible. Theodor W. Adorno and concept formation in sociology”. Political Studies, Sheffield, vol. XXIV, n. 1, p. 69-85, 1976. ROSE, Gillian. The melancholy science. An introduction to the thought of Theodor W. Adorno. London: Macmillan, 1978. SCHWEPPENHÄUSER, Gerhard. Theodor W. Adorno zur Einführung. 2.ed. Hamburg: Junius, 2000. SILVA, Eduardo S. N. Filosofia e arte em Theodor W. Adorno: a categoria de constelação. 2006. Tese (Doutorado) – Universidade Federal de Minas Gerais, Belo Horizonte, Brasil. THEUNISSEN, Michael. “Negativität bei Adorno”, in FRIEDEBURG, Ludwig von; HABERMAS, Jürgen (Orgs.). Adorno-Konferenz 1983. 3.ed. Frankfurt a.M.: Suhrkamp, 1999. THYEN, Anke. Negative Dialektik und Erfahrung. Zur Rationalität des Nichtidentischen bei Adorno. Frankfurt a.M.: Suhrkamp, 1989. TÖBBICKE, Christian. Negative Dialektik und kritische Ontologie: eine Untersuchung zu Theodor W. Adorno. Würzburg: K&N, 1992. WITTGENSTEIN, Ludwig. Tractatus Logico-Philosophicus. Edição bilíngüe. Tradução de L. H. L. Santos. 2.ed. São Paulo: Edusp, 1994. ZUIDERVAART, Lambert. Adorno’s aesthetic theory: the redemption of illusion. Cambridge: MIT Press, 1991.

Lihat lebih banyak...

Comentários

Copyright © 2017 DADOSPDF Inc.