COMUNICAÇÃO: SOBRE_DRAMATURGIA

September 9, 2017 | Autor: W. Lima Torres Neto | Categoria: Dramaturgy, Drama, Dramaturgia, Dramaturgie
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Descrição do Produto

Coordenação Geral e Organização

Antonia Pereira e ivani Santana Capa, Projeto Gráfico, Editoração Eletrônica, Impressão e Acabamento Past Design Revisão

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Scrninírio internacional sobre Dança, Teatro e Performance: poéticas tecnológicas (3. : 2010: SalvadorBA). Anais do 3. Seminário Internacional sobre Dança, Teatro e Pcrfbrinance poéticas recno!ógicas Salvador 03 a 07 de novembro de 2010.— Salvador: UFBAIPPGAC, 2011, 216 f.: ii. 1. Representaçio teatral - Congressos. 2. Dança - Congressos. 3. Teatro - Congressos. 1. Titulo. CDD 792.028

ISBN: 978-85-88863-42-2

Impresso tio Brasil cm Novembro de 2011 pela Fasr Design - Prog. Visual Editora e Gráfica Rápida Lula. CNPJ: 00.431,294/0001 -06— I.M.: 165,292/001-60 Tiragem: 500 exemplares

SUMÁRIO EDITORIAL 9

REFLEXÕES CRUZAIMENTOS E INTERDISCIPLINARIDADES ANTIGAS MOTIVAÇÕES POÉTICAS; NOVO CONTEXTO CULTURAL E NOVOS PARADIGMAS MARTA SILVA I

s

EXPLORING THE TAXONOMY Ok' KINETIC TRACES' BODY, SHADOW, SPACE AND DRAWING IN MOTION: AN INTERDISCIPLINARY WORKSHOP PETRÔNIO BENDITO 21

CORPO E

CocNIçÃo

CORPO E COGNIÇÃO NA CULTURA DIGITAl. TARA SYDENSTRICKER 43 TECNOLOGIAS DA PERCEPÇÃO EPISTEMOLOGIA DO GESTO E CENA CONTEMPORÂNEA ENRICO PITOZZI 51 A "CONSCIÊNCIA" DE CADA DANÇA: REVERBERAÇÕES DE CORPO - REL(AÇÃO) - OBJETO IVANI SANTANA 77

CONTEXTOS E NARRATIVAS CONTEXTOS E NARRATIVAS: À GUISA DE INTRODUÇÃO ARMINDO BIÃO 91

PRÉSENCE ET EFFETS DE PRÉSENCE DANS LES ARTS SCÉNIQUES JOSETTE FÉRAL 103

MEMÓLIAs, REcIsTitos

E RASTROS

POR UMA DRAMATURGIA DAS MEMÓRIAS, DOS REGISTROS E DOS RASTROS WALTER LIMA TORRES NETO 119 TOOLS FOR ARTISTIC AND ACADEMIC RESEARCH: AN EVOLVING GLOSSARY FOR INTERDISCIPLINARY COLLABORATION IN DIGITAL (LIvE) PERFORMANCE STEPIIAN -JÜRGENS 125 EIGHT STRATEGLES FOR INTERACTIVE SITUATIONS IN HCI CONTEXTS STEPHAN -.JÜRGENS '35

AÇÕES DO GRUPO DE PEsquisA POÉTICAS TECNOLÓGICAS MAPA E PROGRAMA DE ARTES EM DANÇA DIGITAL MAPA D2 JACSON ESPÍRITO SANTO '49 UN RECORTE DEL MAPA SITUACIONAL DE LA DANZA/PERFORMANCE CON MEDIACJÓN TECNOLÓGICA EN ARGENTINA ALEJANDRA CERIANI '55 UNA HISTORIA BREVE DIEGO CARRERA

A ILHA DA TEMPESTADE: MAPEANDO A SITUAÇÃO PORTUGUESA DANIEL TÉRCIO 169

POÉTICAS TECNOLÓGICAS EM/ENTRE UM SER HÁJE UM OUTRO CYRILLE BRISSOT E VALCIA RIBEIRO '77 RETINA: IMPROVISAÇÃO ENTRE LINGUAGENS NA CRIAÇÃO CNICA EM TEMPO REAL DANIELA GUIMARÃES

LE SON DE NOS SONGES, UNE CRÉATION FRANCO BRÉSILIENNE, UNE EXPÉRIENCE MULTIMÉDIA: CYRIL HERNANDEZ E CAROLINE BAUDOUIN '95 KÕNIC THTR : SOBRE EL CUERPO MEDIADO POR LA TECNOLOGiA EN EL PROCESO DE CREACIÓN DE LA PIEZA A[D 'AIGUA] ROSA SÁNCHEZ E AisIN BAUMANN 203 PROGRAMAÇÃO DO 'POÉTICAS TECNOLÓGICAS. III SEMINÁRIO INTERNACIONAL SOBRE DANÇA, TEATRO E PERFORMANCE 211

Comunicação de abertura

POR UMA DRAMATURGIA DAS MEMÓRIAS, DOS REGISTROS E DOS RASTRO 5 "Nós pensamos que a arte não pode deixar de se relacionar Com aspulsões que monem os coletivos e os homens na direção de suas liberdades, com esta revohução permanente' que modela, destrói e remodela as estruturas e as formas. Nesse sentido, a criação artística dramática e a criação social seriam dois aspectos complementares de uma mesma e única Jbrça que a sociologia do teatro deveria explicitar." Jean Duvignaud. Les Ombres Collectives: .eociologie dii théãtre, Paris, PUP 1973,p. 62. De. Wairer lima 'Forres Ncto mediador

No âmbito da prática teatral contemporânea brasileira, verifica-se uma recorrência que chama a atençâo do espectador, e que será o objeto de nossa breve reflexão aqui, a guisa de introdução aos trabalhos de nossos colegas, nesta mesa redonda sobre memórias, registros e rastros. O emprego da palavra dramaturgia, sempre seguida de um complemento: "dramaturgia do corpo"; "dramaturgia da luz"; "dramaturgia da cena"; "dramaturgia do ator"; "dramaturgia do figurino", ultimamente ouvida, e mais recentemente ainda a "dramaturgia da voz" percebida por mim quando cruzei a conversa de um grupo de jovens aspirantes à carreira de ator e de bailarino, que discutiam, acaloradamente, os seus processos criativos. Para que o espectador não imagine que o substantivo feminino dramatwgia acompanhado desses complementos é algo que se percebe somente na oralidade, na conversa entre os práticos d'a cena, quc ele leia então os projetos de montagem; as peças publicitárias de divulgação dos espetáculos; que leia ainda VValrrr l.ima Torres Neto é arar e diretor formado em Arte, cénicas pela UNIRIO com doutondo na Instituto de EsmdosTearrais da Sorboone Nouvel]e cm Paris 1H. Atual 'lente professar Ia Estudos 'loatrais no cu de Graduaçi,, e no curso de Ris O raduaçiocm Letras da U1"l'R, em Curitiba limarsarrcséPuípr,hr

120 os programas das peças entre outras publicações que sinalizam o fazer co pensar teatral de nossos agentes criativos e de nossos coletivos coreográficos e teatrais. O nosso interesse central, aqui, é de refletirmos sobre opor que do termo dramaturgia, em específico, e não outro termo do vocabulário teatral, ter sido escolhido para ser empregado na designação de uma certa especificidade, de tima certa denominação. O emprego deste termo seria um sintoma revelador de um diferencial, em &uição da atitude criativa dos artistas da cena coreográfica e teatral? Compreender a especificidade da apropriação do termo, que parece ser bem variada, conforme nossos exemplos acima citados, explicaria, naturalmente, a escolha do termo. Portanto, como foi dito, interessa-nos compreender opor que do termo e o que ele agrega em termos de significado do ponto de vista de urna atitude criativa. Talvez o melhor nesse sentido fosse promover uma enquête mediante questionário aplicado aos agentes criativos que reivindicam o emprego deste termo. Este, entretanto não será o caso aqui. Noutra oportunidade furemos essa enquête no âmbito da cidade de Curitiba onde desenvolvemos nossas pesquisas. Nossa hipótese traçada aqui é a de pensarmos que haveria urna apropriação e, portanto um emprego deste termo do um ponto de vista hierárquico, da afirmação de urna identidade criativa e na direção da construção de uni espaço de poder no âmbito do processo criativo em artes cênicas. Em primeiro lugar, seria interessante remontar a noção mais corriqueira para não dizer tradicional de drarnaturgia, associada,como sabe o nosso espectador, ao trabalho de um dramaturgo, isto é, um escritor de peças de teatro, uni autor de uni texto teatral, de uma dramaturgia. De maneira geral, empregamos o termo drarnalurgia para nos referirmos à produção de um autor teatral - a dramaturgia de Ibsen, a dramaturgia de Lope de Vega, a dramaturgia brechtiana, etc. -. Ainda dc fhrina genérica, emprega-se tambérti o termo dramaturgia na tentativa de definir um certo conjunto de obras, seja por urna periodicidade, ainda que arbitrária - dramaturgia clássica, dramaturgia elisabetana, dramaturgia romântica, etc.—, seja por afinidades devidas aos traços formais ou temáticos uma drarnaturgia do absurdo, uma dramaturgia erótica, uma dramaturgia espírita, etc—. Há, ainda hoje, aquela distinção que sempre marcou a atividade teatral - uma dramaturgia amadora e uma dramaturgia A a ai iilCtliL• pt• Sq li Ul. os athrc

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121 profissional - ou também em termos de gênero ou páblico alvo - urna dramaturgia feminina ou urna dramarurgia para infância e adolescência—. Desta forma, já se estabelece a diferença entre o theatre

drama

eo

conforme a visão dos ingleses. O primeiro é o texto, a composição dramatúrgica, a peça teatral, o

outro é a sua realização efetiva, a transposição daquele nesse pela operação da encenação. Etimologicamente, drama é oriundo do grego e significa ação. Dramaturgia, em si, seria por definição particular "a arte ou a técnica da composição dramática". Mas qual composição dramática em tempos, predominantemente, pós-dramáticos? Em primeiro lugar, esta arte da construção ou da des-construção dramática pressuporia certos elementos integrantes desta mesma composição ou des-coniposição: personagem; corpo; voz; intriga; ação dramática; tempo; espaço; diálogo; etc. Partindo-se do legado de A.ristóteles, e tendo-se

b

cuidado de ler seu pequeno tratado

—AArte Poética

-, como uma obra mais descritiva do que teórica e prescririva, não se observa nessa poética a definição, propriamente, de uma dramaturgia, no tocante à tragédia. Ali se apresentam, as noções observadas acerca da constituição, urdidura e confecção do espetáculo teatral corno um todo: do texto, da representação e du próprio espetáculo que constituem uma "poética do drama", ou os fundamentos de uma teoria do drama, e neste caso específico afeito à tragédia como género inscrito na sociedade grega. Nesse mesmo sentido, Jacques Scherer que é autor, nos anos 1950, dc unia outra dramaturgia, isto é,

La dramaitírgie classique en France,

estabelece uma clara distinção cm seu estudo entre os elementos

integrantes da estrurura interna da peça teatral (personagens; exposição; nós dramáticos; obstáculos e peripécias; unidades de ação; tempo e lugar; desenlaces; etc.) e os elementos que compõem a estrutura externa da peça, isto é, a sua transposição espacial ou a encenação, aqueles elementos que constituem, em certa medida, a materialidade dos primeiros dados inerentes ao texto, isto é, a sua forma. Portanto, tradicionalmente, a dramaturgia enquanto "arte ou a técnica da composição dramática" a serviço da redação de um texto escrito,estabeleceria para esse mesmo texto teatral uma sutil distinção entre a voz do autor e as vozes de seus personagens. Seja no registro do épico ou do dramático, a voz do autor se apresentaria na sua totalidade no texto didascálico, enquanto que essa mesma voz autora! apareceria "mascarada" pela massa de texto atribuida, por esse mesmo autor, aos seus personagens nos diálogos em forma de "falas". Esse princípio é válido ainda hoje, desde a dramaturgia antiga, passando pela dramaturgia do século XTX e a eclosão do

Nouveau lhéátre ou

do dito Teatro do Absurdo, no pós-guerra. No século

XIX, essa "arte ou técnica da composição dramatúrgica" forjou a noção de

piêce hienfaite

como sendo o

padrão aceitável da dramaturgia ideal em termos comunicacionais com seu público. Essa noção, atribuída

122 em parte à vasta produção de Eugêne Scribc, foi o paradigma seguido pelos autores que almejavam o sucesso de um público que ele estimava instruir e divertir. O modelo aí empregado foi aquele herdado do século XVII, do teatro clássico francês, que por sua vez reabilitou, em forma de cânone, os parâmetros da dramaturgia antiga, greco-romana. Aliou-se a isso, no caso da França, a presença de um crítico como Francisque Sarcey que através de seus folhetins no jornal Le 7'nips colaborou de forma indelével para cristalização desta receita. Esta fórmula visava a produção em série de uma dramaturgia de sucesso junto ao público burguês, um sucesso de bilheteria, de público e dc crítica. Condicionada aos mecanismos de causa e efeito no interior da ação dramática, apiáce hien faite ajudou a imortalizar esse formato de dramaturgia que ainda hoje é empregado, abundantemente, na teledrarnaturgia e nos roteiros cinematográficos. Entretanto é necessário perceber que já o surgimento deste neologismo dramaturgia de alguma coisa seguida de outro substantivo (ator; corpo; espaço; etc.) sinalizaria o aparecimento e concomitantemente a intenção dc sistematização de uma nova atitude criativa por parte dos agenciadores da cena contemporãnea e de seus elementos constituintes. Neste caso, todas essas dramaturgias corno são reivindicadas devem ser entendidas corno o sintoma de uma atitude criativa particularizada que emana da crise da própria noção de drama rigoroso, a maneira do que postulava Anatol Rosenfeld acerca da dramaturgia tradicional. Isto é, mesmo que em principio drarnaturgia possa ser entendida como natural sinônimo, do que sempre significou; o pensamento criativo contemporâneo que se detém sobre as diversas áreas - atuação; expressão vocal e corporal; cenografia, indumentária; sonoplastia; entre outros; - nos sinalizaria três tendências para melhor compreender essa associação de termos, para formar a palavra composta que a princípio tem servido de pedra dc toque a encantar os agentes criativos. Essas três tendências para melhor compreender o emprego do termo dramaturgia poderiam ser: a reivindicação de uma especificidade ou de uma especialidade numa atitude que afirma uma identidade de um coletivo de atores; decorrente desta primeira, a afirmação de uma autoria aparentemente sem hierarquias; e por fim a mamfestação de certo rigor que ao mesmo tempo em que reivindica autonomia no processo criativo conquista espaço de poder, de controle sobre o processo produtivo. A especificidade é reivindicada no ato mesmo de anunciar uma encenação, por exemplo, como que subsidiada por uma "dramaturgia do ator", isto é, uma encenação construída, francamente estabelecida sobre os ombros do ator. Ora, o que significa isso? Se perguntarmos aos agentes criativos da cena,por que empregam a expressão composta?Teremos, certamente respostas diversas cujas motivações são particulares. Se pensarmos em Stanislávski, indutor da modernidade na atuação teatral, constatamos que ele teria sido um precursor desta mesma especificidade, pois ao passar da compreensão e da investigação psicológica e "interna" do

123 ator/personagem, voltou seu interesse para a expressão externa como nos permite observar à leitura de seus esboços acerca do trabalho do ator com as ações físicas. Ora, encontramos no legado de Stanislávski tanto a reivindicação pela especificidade da atuação quanto do caráter autoral do trabalho do ator eivado, como deveria ser segundo ele, de rigor. Com isso não queremos afirmar que a expressão composta seja sinõnima de trabalho do ator como preconizava o diretor pedagogo, fundador do Teatro de Arte de Moscou. Tendo em vista, entretanto, que o teatro se inscreve na trama viva da vida cotidiana, como sempre afirmou Jean Duvignaud, dessa forma, não se trataria, unicamente, de se considerar que o neologismo significaria uma releitura ou unia ressignificação do que recomendara Stanislávski, mas, todavia não exclui a sua experiência. A especificidade está na formulação de um conjunto de características que poderia alcançar a noção de um novo gênero. Entrëtanto, isso seria impossível, pois certamente a "dramaturgia do ator' ou a "dramaturgia da voz" ou a "dramaturgia da luz", não se traduziriam nunca como gêneros, no máximo como ênfiises de criatividade, que colaboram na explicitação de como o processo criativo se deu ao longo do tempo de gestação, ao longo de seu momento preparatório, ao transcorrer dos ensaios. Na verdade coloca-se em jogo a disputa pela protagonização, a liderança do processo criativo e secundariamente do processo produtivo do espetáculo, já que a noção de mimeses, dc representação forjada no texto teatral ou rio trabalho do diretor, em muitos casos é rejeitada. Como ficaria a autoria de um processo criativo colaborativo ou não, quando ancorada na "dramaturgia da cena" ou na "dramaturgia do espaço" ou na "dramaturgia do figurino"? Como se sabe o teatro é prática social coletiva e partilhada. Não há espetáculo sem a mobilização de um grupo social. Mesmo que diminuto esse grupamento de pessoas está disponível para fazer com que o ato teatral possa ter lugar. E nessa dinâmica interna deste grupamento as estruturas sociais aparecem e se atritam para estabelecimento da forma cênica. Entretanto, a história do espetáculo nos ensina que passada a era dos grandes atores, dos monstros da sagrada arte, sucedeuse a era da encenação teatral, mais do que isso da moderna encenação teatral. Essa denominação esrereotipada, porém bastante esclarecedora nos reafirma a condição hierarquizada da própria produção teatral. A hierarquia deveria emanar da palavra escrita de um autor teatral que estaria a serviço do monstro sagrado ou era amplificada pelo trabalho de porta-voz que se fazia o diretor teatral do texto de um autor. Hierarquia de sentidos e de interpretação, mas hierarquia também acerca dos meios de produção do espetáculo teatral. Com a crise engendrada pela suposta falência do drama, do sujeito, os elementos que outrora constituíam a encenação, idealizada como uma obra total e orientada pelos sentidos e pela visão de conjunto do

124 moderno diretor teatral, teve seu concerto harmônico comprometido. Se é que algum dia houve alguma harmonia, pois é bastante questionável a idealizada visão de que os elementos integrantes da cena possuam o niesrno peso e a mesma importância. Apesar de idealii,ada, e aparentemente sem conflitos, esses elementos eram entendidos como integrantes da linguagem da encenação teatral,orientada e encaminhada pelo rigor e pelo poder do diretor teatral, mais ou menos despótico, conforme a situação criativa.Portanto, a encenação sobreviveu muito mais da tensão criativa entre os diversos signos teatrais que comporiam a cena do que do princípio ideal da harmonização desses mesmos signos. Do ponto de vista histórico as duas 'eras" citadas acima, não deixam dúvidas acerca de quem era a atribuição de sentido sobre o que se pressupunha dizer desde o palco. Sc nos apropriarmos do jargão da semiologia do teatropoderíamos dizer que quando o discurso teatral, englobando o conjunto de signos lingüísticos e os signos da representação, entra em saturação e o principio da palavra expressa no drama ou o principio relacional,dialético expresso no dialogo de uma obra dramática é dissolvido, graças à instituição de um outro olhar para modernidade, que se vem construindo desde a dramaturgia do pós-guerra, constata-se a tentativa de superação criativa entre os diversos elementos que constituíam a cena orquestrada pelo diretor teatral. E nesse sentido, o termo dramaturgia que trás no seu primeiro significado uma certa precisão, a "arte e técnica de escrever peças teatrais", acabou por contaminar esses diversos elementos da cena que foram hierarquizados pelo coordenador do espetáculo. Ao subtrairem a figura do autor de uma dramaturgia no sentido mais convencional e ao procurarem criar suas próprias

dra;nainrgias,

certos coletivos teatrais ou agentes

criativos da cena se lançaram numa corrida pelo lugar da autoria. Mesmo que parte da produção teatral não conte mais uma história ao apresentarem suas exibições sobre um palco, cada agente criativo reivindicaria a especificidade da sua "arte e técnica de escrever peças teatrais". Ou ao menos, reivindicaria a ênfase autoral em relação a este ou aquele outro elemento integrante do mesmo processo criativo. Ocaso é que por detrás de cada elemento constituinte da cena existe uni agente criativo, que possui uma formação específica e manifesta seu pensamento, sua visão de mundo e, por conseguinte a sua visão do real transposta ao teatro. Como se pode deduzir, a dinâmica do processo criativo se modifica e a liderança desse mesmo processo fica deslocada na busca por uma nova forma de expressão. O processo criativo ganha autonomia e fica condicionado ao estabelecimento de novas rclaçõcs criativas e sociais. 1 Joje, essas relações são fortemente subsidiadas pela tecnologia à serviço do edifício teatral ou da poética da cena em si mesma; são mediadas seja pelas memórias individuais ou coletivas ou pelos registros ficcionais e/ou reais e ainda pelos r'astros, rastros dos próprios condicionamentos dos agentes criativos da cena contemporânea ou os rastros da própria memória do teatro.

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