Conceções e Expectativas de Professores e Educadores de Infância a Propósito do Conceito de Escola Digital

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Challenges 2015: Meio Século de TIC na Educação, Half a Century of ICT in Education

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CONCEÇÕES E EXPECTATIVAS DE PROFESSORES E EDUCADORES DE INFÂNCIA A PROPÓSITO DO CONCEITO DE ESCOLA DIGITAL Fernando Albuquerque Costa Elisabete Cruz Joana Viana Rita Brito Universidade de Lisboa, Portugal Carla Rodriguez Universidade de São Paulo, Brasil

Resumo: A questão da adoção das tecnologias digitais na Escola e as transformações ao nível das práticas por elas induzidas, é uma problemática em que intervêm dimensões cuja análise e articulação tanto podem ser equacionadas ao nível macro, como ao nível do que se passa e pode ser feito em cada escola em concreto. Neste texto centramo-nos no estudo de uma dessas dimensões - os professores e educadores de infância -, mais propriamente no que esses agentes pensam enquanto principais executores do currículo. Utilizámos como procedimento metodológico a análise de conteúdo das respostas a três questões abertas de um questionário com o objetivo  de  conhecer  as  suas  representações  sobre  o  que  é  ou  poderá  ser  uma  “escola   digital”.   Os   resultados   sugerem,   em   síntese,   que   o   conjunto   de   docentes   auscultados   idealiza uma escola que utiliza ferramentas digitais para enriquecer (e personalizar) a aprendizagem, para o que afirmam necessitar sobretudo de adquirir competências técnico-didático-pedagógicas necessárias à integração propriamente dita das tecnologias nos processos de ensino e de aprendizagem dentro da sala de aula. Palavras-chave: Escola digital, professores, conceções, expectativas, aprendizagem com TIC

Abstract: The issue of adopting digital technologies in school and the changes they estimulate, is an issue with several dimensions that can be analysed both at a macro level and at the level of what is happening and can be done in each school in concrete. In this paper we focus on the study of one of these dimensions - teachers and early childhood educators - more properly on what these educational agents think as main executors of the curriculum. The methodological procedure was the content analysis of the answers to three open questions in order to know their representations of what is or could be a "digital school". The results suggest, in short, that teachers envision a school that uses digital tools to enrich (and personalise) learning, for what they especially need to acquire technical-didactical-pedagogical skills needed to integrate technologies in the teaching and learning process. Keywords: Digital school, teachers, conceptions, expectations, e-learning

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Introdução A constatação de um fraco nível de competências digitais dos alunos e a necessidade de integrar as tecnologias da informação e da comunicação na preparação de professores e educadores de infância estão entre as conclusões mais salientes de um dos relatórios Horizon de 2014 sobre a situação nas escolas europeias (Johnson et al, 2014). Constituem, aliás, as duas faces do desafio que de alguma maneira está na génese dos estudos que temos vindo a desenvolver nos últimos anos (Costa et al, 2013) e aos quais a investigação que aqui se apresenta visa dar continuidade. É uma investigação que tem como principal objetivo aprofundar a compreensão do modo como professores e educadores de infância, enquanto agentes determinantes no processo educativo, perspetivam e assumem a responsabilidade de contribuir, de forma refletida e fundamentada, para a preparação das crianças e dos alunos com quem trabalham quotidianamente, para atuarem no contexto de uma sociedade tecnologicamente evoluída e em que o desenvolvimento tecnológico atinge patamares sem paralelo nomeadamente em termos de difusão e apropriação, pelo cidadão comum, da vasta panóplia de ferramentas que a cada momento vão emergindo. Tomando como referência o reconhecido potencial das tecnologias digitais emergentes,   como   é   o   caso   das   que   estão   na   base   do   “cloud   computing”,   do   “tablet   computing”   ou   do   “mobile   computing”,   nomeadamente   enquanto   fatores   indutores de novos modelos de organização do ensino e da aprendizagem, e aceitando que professores e educadores começam a dar sinais da inevitabilidade de uma mudança no papel que têm vindo a desempenhar por influência direta ou indireta dessas mesmas tecnologias e do impacto que as redes sociais já atingiram na vida dos alunos (Johnson et al, 2014), principalmente fora da escola, parece-nos fazer sentido centrar a discussão precisamente no que pensam os professores sobre esta problemática, percebendo em que medida estão dispostos e consideram estar preparados para assumir as mudanças necessárias (Nóvoa & Amante, 2015). Na linha do que temos vindo a defender noutros trabalhos (Costa, 2010, 2011; Costa et al, 2010, Cruz & Costa, 2011), parece-nos particularmente relevante que, ao longo do imenso tempo que constitui a escolarização obrigatória, aí se desenvolva em todos os alunos a capacidade de trabalhar autónoma e criativamente com as tecnologias de informação e comunicação, para que as possam utilizar de forma eficaz como instrumento de trabalho intelectual, de relação com os outros, ou como ferramenta de expressão, de criação e de produção (Tarragó, 2007).

Numa lógica, portanto, de

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desenvolvimento global e integral do indivíduo desde a mais tenra idade, quando entra no sistema escolar, apostando explicitamente e com a intencionalidade pedagógica que se espera da Escola, no desenvolvimento do conjunto de competências pessoais imprescindíveis para participar ativamente numa sociedade baseada na informação e no conhecimento.

Enquadramento Aceitando-se a ideia de que a ação dos professores é influenciada pelo modo como percebem e se posicionam face à realidade que os rodeia e face aos processos de inovação e mudança a que de alguma forma estão expostos (Ertmer, 2005; Hermans, Tondeur, van Braak & Valcke, 2008), no contexto desta comunicação parece-nos particularmente relevante um olhar sobre alguns aspetos que estarão presentes quando se trata de discutir a adoção das tecnologias digitais na Escola, em geral e, nas práticas educativas de cada professor, em particular. Sem a pretensão de exaustividade, até porque se trata de um tema vasto e complexo, com diferentes cambiantes em função dos contextos e dos pressupostos assumidos em cada caso, a reflexão aqui apresentada organiza-se em função de dois eixos de análise que poderão ajudar-nos   a   perspetivar   o   conceito   de   “escola   digital”   aqui   tomado como referência. Referimo-nos, em concreto, às perspetivas que os professores e educadores de infância poderão ter sobre: i) a apetência dos mais novos pelas tecnologias digitais de informação e comunicação, discutindo, entre outros, em que medida as utilizam de forma competente para fins educativos; e sobre ii) o papel da própria escola na estimulação da utilização dessas tecnologias, discutindo sobretudo as funções atribuídas à tecnologia e a criação das condições necessárias à sua integração na vida escolar, tanto em termos de equipamento como ao nível de recursos humanos.

Apetência dos mais novos pelas tecnologias digitais Embora a natural apetência dos mais novos para a utilização das tecnologias (Hague & Payton, 2010; Plowman, Stevenson, Stephen & McPake, 2012; Alves, 2014; Plowman, 2015) seja algo facilmente observável, levando mesmo alguns a fazer a distinção   entre   “nativos”   e   “imigrantes”  digitais  (Prensky,   2001,   2006,   2008;;  Tapscott,   1998, 2009; Fleer, 2013), são vários os autores que chamam a atenção para os

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problemas que tais pressupostos e classificações podem originar quando se trata de usar as tecnologias na escola para fins educativos. Por um lado, porque, correndo o risco de serem assumidos como estereótipos (Fraser, Atkins & Hall, 2013), poderão distrair-nos relativamente à necessidade de se apurar quais as competências efetivas dos alunos tendo em vista a sua utilização nas aprendizagens escolares (BECTA, 2010). Por outro lado, porque, não sendo igual o acesso aos dispositivos e à Internet, toda e qualquer generalização sobre a familiaridade dos jovens com as tecnologias aporta o risco de exacerbamento das desigualdades existentes em cada contexto (Fraser, Atkins & Hall, 2013). Apesar de podermos aceitar que a imersão dos jovens em ambientes tecnológicos e a utilização rotineira que fazem das tecnologias móveis e de jogos baseados na Web lhes proporciona o acesso a mais informação e lhes permite desenvolver determinadas capacidades que, por sua vez, contribuem para o incremento da confiança que têm no seu uso (Moura, 2010; Dietrich & Balli, 2014), isso não significa necessariamente que sejam desenvolvidas de igual forma as competências que a escola valoriza, necessárias, por exemplo, para selecionar e avaliar a informação que é devolvida pelo Google quando se faz uma pesquisa na Internet sobre um determinado assunto. É o que parece poder inferir-se de um relatório recente da OFCOM (2014) reportando-se à realidade norte americana, em que, apesar de alguma evolução demonstrada por crianças e jovens ao nível de "compreensão crítica" em relação a diferentes fontes de informação online, não são ainda muito significativos os ganhos

conseguidos

noutras

capacidades

criativas

e

críticas,

relacionadas

nomeadamente com o que Fraser, Atkins e Hall (2013) designam de cidadania ativa em ambientes digitais.

Papel da própria escola na estimulação do uso das tecnologias Apesar da tendência em se considerar que os mais novos possuem uma orientação clara para conteúdo e estilos de vida digitais e que isso poderia facilitar o trabalho das escolas, estamos perante algo que está longe de ser tarefa fácil para a comunidade escolar. Pelos desafios que resultam do facto de não haver uma resposta aplicável a todas as situações, mas também por estarmos perante o confronto entre duas culturas diferentes, porquanto assentes em pressupostos antagónicos. Um confronto que obrigatoriamente   requer   “negociação” entre a cultura existente e a cultura nova à medida que as inovações vão sendo introduzidas e as práticas vão sendo alteradas

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(Guzman & Nussbaum, 2009; Meister, 2010). Algo em que as lideranças da escola terão uma palavra a dizer, através da criação de condições objetivas de suporte (infraestruturas, equipamento, formação, etc.), mas também em termos de incentivo e estimulação dos diferentes agentes sob sua influência, levando-os a participarem de forma ativa na construção de uma visão sobre o tipo de escola pretendido (Petko, Egger, Cantieni & Wespi, 2015), no estabelecimento de metas e na definição de um plano de desenvolvimento em que todos se revejam e possa orientar a ação de cada um (Bartolomé, 2012; Bialobrzeska & Cohen, 2005). Um processo de discussão e planeamento envolvendo os elementos da comunidade escolar, dos corpos diretivos aos professores, passando pelos funcionários, mas abrangendo também os pais e a comunidade envolvente (Hinson, LaPraire & Heroman, 2006) e, bem assim, as ideias dos alunos (Joseph, 2006) enquanto últimos beneficiários da ação educativa. Nesta linha se situa também a ideia de que a visão da escola digital seja construída numa base que dê primazia à vertente pedagógica sobre a vertente tecnológica, como condição para ir além de meras operações de cosmética. Ou seja, de as decisões tomadas não se reduzirem a uma simples melhoria das formas tradicionais de ensino (Schiller, 2002), antes possam configurar uma aposta na transformação dos modos como habitualmente se organizam os processos de ensinar e de aprender, incluindo reequancionar os espaços e os tempos normalmente dedicados ao ensino e à aprendizagem. A criação de grupos de reflexão e discussão que, numa base regular, permitam

partilhar

sucessos

e

insucessos,

e,

dessa

forma,

avançar

no

estabelecimento de comunidades de aprendizagem e de desenvolvimento profissional dentro da escola (Castro & Alves, 2006) ou mesmo entre escolas, podem ser estratégias determinantes para a mudança. Não apenas para melhorar as condições objetivas da escola, mas principalmente pelos efeitos indiretos que tal abordagem poderá ter promovendo a auto-reflexão de cada interveniente sobre a sua prática atual com tecnologias digitais e, dessa forma, contribuir para a superação daquilo que Ertmer (2005) designou de barreiras de segunda ordem (resistências à mudança, receios relativamente ao uso das tecnologias, falta de confiança, crenças sobre o impacto das tecnologias na aprendizagem, etc.).

Metodologia Tal como referido no início, o estudo aqui apresentado insere-se num projeto de investigação-ação(1) mais amplo que tem como principal propósito o de permitir

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desbravar caminho sobre o que implica a utilização de tecnologias digitais numa escola concreta. Um projeto que se tem desenvolvido fundamentalmente através da reflexão conjunta entre professores e educadores de infância sobre a sua prática e entre estes e os próprios investigadores. No trabalho aqui apresentado, recorremos apenas a uma parte dos dados obtidos por questionário durante a fase de diagnóstico(2) em que se pretendeu caracterizar a perspetiva dos professores e educadores de infância sobre o que significaria para eles o  desenvolvimento  de  uma  “cultura  digital”  na  sua  escola.   Para além dos elementos que nos permitem a caracterização dos respondentes debruçar-nos-emos sobre os dados referentes à opinião dos professores e educadores de infância sobre três aspectos considerados determinantes para o sucesso do projeto em curso, designadamente: i) sobre o conceito chave em jogo (O que consideram ser uma   “escola   digital”); ii) sobre os seus próprios objetivos profissionais (O que gostariam de poder realizar do ponto de vista profissional); e iii) sobre sugestões para o desenvolvimento do projeto (Que sugestões gostariam de fazer para facilitar a concretização dos objetivos do projeto). No que respeita à exploração dos dados, recorremos à análise de conteúdo de natureza aberta e exploratória, isto é, sem fazer uso de categorias apriorísticas (Mayring, 2000; Prasad, 2008; Treadwell, 2014). Optando-se por uma lógica marcadamente indutiva, procurou-se   primeiramente   a   identificação   de   “estruturas   semânticas”  com  potencial  para  extrair  e  dar  conta  do  significado  ("meaning")  presente   no corpus empírico (Wiedemann, 2013). O envolvimento de três investigadores neste processo permitiu assegurar a fiabilidade do procedimento, garantindo que as categorias e subcategorias emergentes dos dados fossem claramente formuladas e definidas operacionalmente sem ambiguidade. Depois de analisadas todas as respostas, procedeu-se à contagem das unidades de registo categorizadas e à elaboração de matrizes de resultados (Mayring, 2000; Kohlbacher, 2006). É com base nos resultados da análise de conteúdo aqui descrita que, na próxima secção, depois de uma breve caracterização do perfil dos respondentes, daremos conta da perspetiva da comunidade docente sobre o conceito em  apreço  (“escola  digital”).  

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Resultados Do conjunto de docentes inquiridos, num total de 118 (professores e educadores de infância), responderam ao questionário 94 (79,7%), sendo 70% do sexo feminino e 30% do sexo masculino. A média de idades ronda os 35 anos, sendo de 11 anos no caso da experiência profissional. A maioria dos docentes possui licenciatura (69%), havendo 28% com o grau de mestrado e 2% com o grau de doutor. Entre os respondentes encontram-se professores da generalidade das áreas de formação, com predominância das áreas de humanidades (28%), ciências (17%) e matemática (13%), distribuídos de modo semelhante pelos diferentes níveis de ensino (desde o

1.º CEB ao ensino secundário), com exceção do pré-escolar, onde a

percentagem de educadores de infância é menor (apenas 15%). A esmagadora maioria dos docentes (90%) tem computador portátil, 63% possui computador de secretária, 50% tem smartphone e apenas 22% tem tablet. Conceções  sobre  o  que  será  uma  “escola digital” Quando  questionados  sobre  o  que  consideram  ser  uma  “escola  digital”  (Quadro  1)  os   professores e educadores de infância definem-na essencialmente em torno de três dimensões que, no seu conjunto, apresentam a maior parte das unidades de registo contabilizadas (73,2% do total). Em primeiro lugar, e com o mesmo valor em cada uma das dimensões (26,7%), definem-na   como   “uma   escola   que   rentabiliza   as   potencialidades das tecnologias no processo de ensino   e   de   aprendizagem”,   e   “uma   escola que disponibiliza e promove a utilização de ferramentas, recursos e meios digitais”.   Logo   a   seguir,   como   “uma   escola   que   utiliza   ferramentas   digitais   para   enriquecer  (e  personalizar)  a  aprendizagem”  (19,8%).

Quadro  1.  Conceções  sobre  o  que  será  uma  “escola  digital”  (N=72).

Uma escola que rentabiliza as potencialidades das tecnologias no processo de ensinoaprendizagem Uma escola que disponibiliza e promove a utilização de ferramentas, recursos e meios

UR (f)

UR (%)

23

26,7

23

26,7

Uma escola que utiliza ferramentas para enriquecer (e personalizar) a aprendizagem

17

19,8

Uma escola que articula o digital-virtual com o tradicional-real

6

7,0

Uma escola que promove a literacia informática de alunos e professores

5

5,8

3

3,5

Uma escola que partilha materiais, saberes e competências de forma mais célere

3

3,5

Uma escola que concebe as tecnologias como um meio

2

2,3

Uma escola que é o reflexo de uma maior autonomia e criatividade por parte dos professores

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UR (f)

UR (%)

Uma escola que ensina a saber fazer o que a sociedade atual exige

2

2,3

Uma escola que promove a aprendizagem sobre, com e através do computador

1

1,2

Uma escola que objetiva democratizar o acesso ao conhecimento

1

1,2

86

100%

Totais (UR)

Legenda: UR (f) – Unidades de registo (frequência absoluta); UR (%) – Unidades de registo (frequência relativa).

Expectativas sobre os seus objetivos profissionais No que se refere às expetativas dos professores e educadores de infância quanto às realizações que esperavam vir a ter oportunidade de desenvolver no âmbito do projeto (Quadro 2), foram indicados objetivos de índole profissional diversificados, mas que sugerem complementaridade entre si, para além de denotarem uma escala de valoração que importa registar. Surge em primeiro lugar, destacada, a expectativa de “aquisição   de   competências   técnico-didático-pedagógicas”,   com   41,1%   das   unidades   de   registo,   logo   seguida   da   expectativa   de   “integração   do   uso   de   tecnologias   nos   processos   de   ensino   e   de   aprendizagem”,   com   24,4%, e   da   perspetiva   de   “melhoria   dos  processos  de  ensino  e  de  aprendizagem  com  tecnologias”,  com  16,7%.   Em menor número, são feitas algumas referências explícitas em termos do suporte que   estão   dispostos   a   dar   “ao   desenvolvimento   da   cultura   digital   na   escola”(8,9%).   Surgem   ainda   “outras   expectativas”   (8,9%)   que,   no   seu   conjunto,   apelam   à   necessidade

de

criação

das

condições

necessárias

na

escola,

sugerindo

nomeadamente a promoção de projetos concretos para implementar em sala de aula, a partilha de informações sobre aplicações e ferramentas digitais e a oferta de formação em TIC adequada aos diferentes níveis de ensino e áreas curriculares.

Quadro 2. Realizações profissionais esperadas no âmbito do projeto (N=63). UR (f)

UR (%)

Aquisição de competências técnico-didático-pedagógicas

37

41,1

Integração do uso de tecnologias nos processos de ensino e de aprendizagem

22

24,4

Melhoria dos processos de ensino e de aprendizagem com tecnologias

15

16,7

Apoio ao desenvolvimento da cultura digital na escola

8

8.9

Outras expetativas

8

8.9

90

100

Totais (UR)

Legenda: UR (f) – Unidades de registo (frequência absoluta); UR (%) – Unidades de registo (frequência relativa).

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Sugestões para o desenvolvimento do projeto na escola Quando estimulados a fornecer ideias e propostas visando facilitar a concretização dos objetivos do projeto em que iriam estar envolvidos, os professores e educadores de infância que sobre isso se manifestaram explicitamente situam em diferentes planos as sugestões. Conforme pode observar-se no Quadro 3, destacam nomeadamente: i) o desenvolvimento de um plano de formação visando ensinar a trabalhar com (novos) recursos, através de sessões práticas sob a forma de workshops

(presencial

e/ou

online);

ii)

a

concretização

de

um

plano

de

acompanhamento por parte da equipa de investigadores que, através de uma rede de suporte e tendo em consideração a disponibilidade dos professores, permitisse, por exemplo, apresentar e discutir propostas de utilização das tecnologias com recurso a ferramentas concretas; e, por último, ii) o desenvolvimento de um plano de escola especificamente para esta área que permitisse, entre outros, contemplar o tempo suficiente para apostar no projeto, criando e disponibilizando recursos para os alunos.

Quadro 3. Planos em que se situam as sugestões dadas para a concretização do projeto (N=49). UR (f)

UR (%)

Formação

18

35,3

Acompanhamento

14

27,5

Escola

13

25,5

Pedagógico

3

5,9

Pessoal

2

3,9

Macro (currículo)

1

2,0

51

100

Totais (UR)

Legenda: UR (f) – Unidades de registo (frequência absoluta); UR (%) – Unidades de registo (frequência relativa).

Considerações finais sobre os resultados Tal como havíamos podido concluir em estudo anterior sobre o mesmo universo de professores e educadores (Costa et al, 2013), também aqui os docentes parecem confirmar uma atitude globalmente favorável relativamente ao uso das tecnologias na escola, transparente pelo conjunto de referências positivas e construtivas que acabam

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por fazer a propósito da reflexão sobre o que será uma escola digital. Além do reconhecimento explícito da importância das tecnologias na formação dos jovens, manifesto neste estudo nas alusões explícitas à utilização de ferramentas para enriquecer e personalizar a aprendizagem, surge aqui também a valorização do incentivo à utilização de ferramentas, recursos e meios numa perspetiva de rentabilização das potencialidades das tecnologias nos processos de ensino e de aprendizagem. Tudo isto, como ilustram os resultados, numa linha de pensamento que parece corroborar uma visão de escola digital que dê primazia à vertente pedagógica sobre a vertente tecnológica, vislumbrando os alunos enquanto últimos beneficiários da ação educativa (Joseph, 2006), mas imaginado também uma escola com capacidade para reforçar a autonomia e a criatividade dos professores, assim com a partilha de materiais, saberes e competências de forma mais célere. Não parecendo regatear o facto de o projeto constituir em si mesmo um desafio, pelo que isso poderá implicar a médio prazo em termos de transformação das suas próprias práticas, os professores e educadores que partilharam as suas expetativas quanto ao que gostariam de realizar a nível profissional, aproximadamente 53% da comunidade docente da escola em estudo, denotam estar minimamente cientes do que pode ser feito com recurso às tecnologias digitais e do que têm de fazer eles próprios para o conseguir. Merece-nos especial destaque a relação que parecem estabelecer entre a necessidade de aquisição de competências (técnicas, didáticas e pedagógicas) e a integração propriamente dita das tecnologias nos processos de ensino  e  de  aprendizagem,  tendo  em  vista  a  “melhoria”  desses  mesmos  processos.   Tratar-se-á de uma atitude favorável relativamente aos potenciais efeitos positivos que as tecnologias podem trazer ao ensino e à aprendizagem, que importa manter presente em conjunto com indícios menos favoráveis identificados em estudo anterior, no qual se identificaram duas tendências principais de sinal contrário: uma, em que são visíveis sinais de questionamento e dúvida sobre o potencial transformador das tecnologias, e uma outra de abertura relativamente à utilidade dos computadores para apoiar a prática docente (Costa et al, 2013). Por esta razão, em termos de intervenção, estamos em crer que o caminho em direção à escola digital pretendida, no contexto estudado, exigirá a implementação de estratégias destinadas à superação daquilo que Ertmer (2005) designou de barreiras de segunda ordem, em íntima articulação com a melhoria das condições tecnológicas que, como já tivemos oportunidade de documentar noutro contexto, também parecem perturbar uma

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utilização mais comprometida e regular das tecnologias em contexto de sala de aula (Costa et al, 2013). Enfim, tratar-se-á de um caminho em que, como discutimos inicialmente, as estruturas de lideranças da escola terão um papel fundamental (Bialobrzeska & Cohen, 2005; Bartolomé, 2012; Petko, Egger, Cantieni & Wespi, 2015), quer na promoção de uma cultura digital que dê lugar à transformação dos modos como habitualmente se organizam os processos de ensinar e de aprender, quer na construção de uma escola que, compreendendo como ensinar a saber fazer o que a sociedade atual exige, será capaz de rentabilizar as potencialidades das tecnologias nos processo de ensino e de aprendizagem. É justamente isso que nos sugerem as sugestões avançadas pelos professores e educadores para a concretização dos objetivos do projeto, destacandose, como se viu, a importância que atribuem às condições que ao nível da escola devem ser criadas para que   seja   possível   caminhar   no   sentido   da   “escola   digital”   ambicionada.

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NOTAS (1) A metodologia de investigação-ação pressupõe o envolvimento de todos os intervenientes, que aceitam a responsabilidade de refletir sobre a sua própria prática com o objetivo comum de diagnosticar problemas e implementar as ações necessárias para transformar criticamente a realidade (Latorre, 2003). Os procedimentos adotados têm normalmente caráter cíclico e flexível, ou seja, são desenvolvidos gradualmente através de fases que se articulam e se complementam (planificação, ação,

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observação/avaliação, reflexão), gerando,   segundo   o   mesmo   autor,   uma   “espiral   dialética”  entre  ação  e  reflexão,  com  um  ou  mais  ciclos  (Ibidem,  p.27) (2) O questionário foi dirigido aos 118 professores e educadores de infância, o que corresponde à totalidade da comunidade docente da escola.

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