Conciliação e Mediação

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CONCILIAÇÃO E MEDIAÇÃO BRUNO GARCIA REDONDO

1. Autocomposição no Direito brasileiro contemporâneo

Ninguém desconhece a célebre máxima de que a solução negociada costuma trazer, aos conflitantes, uma satisfação muito maior do que qualquer solução imposta/forçada. O Direito brasileiro, em seu contemporâneo estágio, vem apostando, com maior ênfase, no desenvolvimento e no aprimoramento de mecanismos para o alcance da autocomposição. Apenas no ano de 2015, por exemplo, vimos a aprovação de duas Leis Federais que regulam as figuras da conciliação e da mediação: o Código de Processo Civil de 2015 e a Lei 13.140/2015 (“Lei da Mediação”).

2. Atribuições dos conciliadores e mediadores judiciais

Tratando, com maior ênfase, da autocomposição judicial, o NCPC regula, nos arts. 165 a 175, a figura dos conciliadores e mediadores judiciais, integrantes do grande grupo de sujeitos processuais intitulados “auxiliares da justiça”.

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Referência da publicação: REDONDO, Bruno Garcia. Conciliação e mediação. In: WAMBIER, Luiz Rodrigues; WAMBIER, Teresa Arruda Alvim (coord.). Temas essenciais do novo cpc: análise das principais alterações do sistema processual civil brasileiro. São Paulo: RT, 2016, p. 219-226.  Doutorando e Mestre em Direito Processual Civil pela PUC-SP. Pós-Graduado em Direito Processual Civil pela PUC-Rio. Pós-Graduado em Advocacia Pública pela UERJ (ESAP/PGERJ). Pós-Graduado em Direito Público e Direito Privado pela EMERJ (TJRJ/UNESA). Professor efetivo nas Graduações da PUC-Rio e da UFRJ e nas Pós-Graduações da PUC-Rio, da Escola da Magistratura (EMERJ), do IBMEC, do CESUSC, da ABDConst e da ABAMI. Professor convidado nas Pós-Graduações da UERJ; da Universidade Estadual de Londrina (UEL – PR); da Faculdade Baiana de Direito (FBD – BA); da Faculdade Pitágoras (Guarapari – ES); da Universidade Católica Dom Bosco (Campo Grande – MS); das Escolas do Ministério Público (AMPERJ), da Defensoria Pública (FESUDEPERJ), de Administração Judiciária (ESAJ/TJRJ), da Advocacia-Geral da União (EAGU/RJ) e da Advocacia (ESA OAB-RJ); da Rede LFG; do Damásio (CEDJ/CEPAD); do FORUM; do CERS e da ABAMI. Membro efetivo e Secretário-Geral Adjunto do Instituto Brasileiro de Direito Processual (IBDP). Membro fundador do Instituto Carioca de Processo Civil (ICPC). Membro efetivo do Instituto Iberoamericano de Derecho Procesal (IIDP) e da Academia Brasileira de Direito Processual Civil (ABDPC). Vice-Presidente da Comissão de Estudos em Processo Civil da OAB-RJ. Procurador da OAB-RJ. Procurador da UERJ. Advogado. http://lattes.cnpq.br/1463177354473407. http://www.facebook.com/profgarciaredondo. [email protected].

Conforme o §2º do art. 165, o conciliador deve atuar preferencialmente nos casos em que não houver vínculo anterior entre as partes, podendo sugerir soluções para o litígio, sendo-lhe vedado utilizar qualquer tipo de constrangimento ou intimidação para que as partes conciliem. Já o mediador, referido no §3º, deve atuar preferencialmente nos casos em que exista vínculo anterior entre as partes, cabendo-lhe auxiliar os interessados a compreender as questões e os interesses em conflito, de modo que eles possam, pelo restabelecimento da comunicação, identificar, por si próprios, soluções consensuais que gerem benefícios mútuos.

3. Princípios e regras que regem a autocomposição

A conciliação e a mediação são informadas pelos princípios da independência, da imparcialidade, da autonomia da vontade, da confidencialidade, da oralidade, da informalidade e da decisão informada (art. 166). A confidencialidade estende-se a todas as informações produzidas no curso do procedimento, cujo teor não poderá ser utilizado para qualquer outro fim, diverso daquele previsto por expressa deliberação das partes (§1º). Ainda em razão do dever de sigilo que lhes compete, é vedado ao conciliador e ao mediador, bem como aos membros de suas equipes, divulgar ou depor sobre fatos ou elementos oriundos da conciliação ou da mediação. Em atenção à informalidade, a mediação e a conciliação são regidas conforme a livre autonomia dos interessados, inclusive no que diz respeito à definição das regras procedimentais (§4º). Com o objetivo de proporcionar ambiente favorável à autocomposição, admitese a aplicação de técnicas negociais (§3º).

4. Centros judiciários de solução consensual de conflitos

O art. 165 estipula que os tribunais devem criar centros judiciários de solução consensual de conflitos, aos quais caberá a realização de sessões e audiências de conciliação e mediação e o desenvolvimento de programas destinados a auxiliar, orientar e estimular a autocomposição.

A composição e a organização dos centros serão definidas pelo respectivo tribunal, observadas, evidentemente, as normas do Conselho Nacional de Justiça (§1º). Complementando a referida regra, o art. 174 exige que a União, os Estados, o Distrito Federal e os Municípios criem câmaras de mediação e conciliação, com atribuições relacionadas à solução consensual de conflitos no âmbito administrativo, tais como: dirimir conflitos envolvendo órgãos e entidades da administração pública (inc. I); avaliar a admissibilidade dos pedidos de resolução de conflitos, por meio de conciliação, no âmbito da administração pública (inc. II); e promover, quando couber, a celebração de termo de ajustamento de conduta (inc. III).

5. Conciliadores, mediadores e câmaras privadas de conciliação/mediação

O art. 167 do NCPC admite a atuação não somente de conciliadores e mediadores judiciais, mas também de câmaras privadas de conciliação e mediação. Todos (conciliadores, mediadores e câmaras privadas) devem ser inscritos em cadastro nacional e em cadastro de Tribunal de Justiça ou de Tribunal Regional Federal, a quem compete manter o registro dos profissionais habilitados, com indicação de sua área profissional. O referido dispositivo regula ainda, em seus parágrafos, pressupostos e requisitos para o credenciamento e o registro dos conciliadores, dos mediadores e das câmaras privadas de conciliação/mediação.

6. Autonomia da vontade das partes para a escolha do conciliador, mediador ou câmara privada

As partes podem escolher, de comum acordo, o conciliador, o mediador ou a câmara privada de conciliação e de mediação (art. 168). A lei não exige que o conciliador ou o mediador escolhido pelas partes esteja cadastrado no tribunal (§1º). Se inexistir acordo sobre a escolha do mediador ou conciliador, deverá haver distribuição entre aqueles cadastrados no registro do tribunal (§2º). Caso se faça necessário, pode haver a designação de mais de um mediador ou conciliador (§3º).

7. Remuneração do conciliador, do mediador e das câmaras privadas

Tal como ocorre com a maior parte dos auxiliares da justiça, o art. 169 dispõe que o conciliador e o mediador devem receber remuneração prevista em tabela fixada pelo tribunal, conforme parâmetros estabelecidos pelo CNJ, ressalvada a hipótese do art. 167, §6º. É possível, porém, que a mediação e a conciliação sejam realizadas como trabalho voluntário, observada a legislação pertinente e a regulamentação de cada tribunal (§1º). Cabe aos tribunais determinar o percentual de audiências não remuneradas que devem ser suportadas pelas câmaras privadas de conciliação e mediação, relativas aos processos sob o manto da gratuidade da justiça, como contrapartida do credenciamento da câmara (§2º).

8. Impedimento ou impossibilidade temporária do conciliador ou mediador

Em caso de impedimento, deve o conciliador ou mediador comunicar o fato de imediato, preferencialmente por meio eletrônico, devolvendo os autos ao juiz (do processo ou coordenador do centro judiciário de solução de conflitos), ao qual caberá promover uma nova distribuição (art. 170). Se a causa de impedimento vier a ser apurada após o início do procedimento, deve a atividade ser imediatamente interrompida, lavrando-se ata com relatório do ocorrido e solicitação de distribuição para novo conciliador ou mediador. Por outro lado, em caso de impossibilidade temporária do exercício da função, compete ao conciliador ou mediador informar o fato ao centro (também preferencialmente por meio eletrônico), para que, durante o período em que perdurar a impossibilidade, não ocorram novas distribuições (art. 171). Finalmente, o art. 172 consagra o prazo de 01 (um) ano (contado do término da última audiência em que atuaram) como o período em que o conciliador e o mediador ficam impedidos de assessorar, representar ou patrocinar qualquer das partes.

9. Exclusão do cadastro

O art. 173 elenca as hipóteses de exclusão de conciliadores e mediadores do cadastro, isto é, quando: agir com dolo ou culpa na condução da conciliação ou da

mediação sob sua responsabilidade ou violar qualquer dos deveres decorrentes do art. 166, §§1º e 2º (inc. I); ou atuar em procedimento de mediação ou conciliação, apesar de impedido ou suspeito (inc. II). A apuração sobre a prática de alguma dessas condutas vedadas deve ocorrer mediante processo administrativo (§1º). Cabe ao juiz (do processo ou coordenador do centro de conciliação e mediação, se houver) que verificar atuação inadequada do mediador ou conciliador afastar o profissional de suas atividades por até 180 (cento e oitenta) dias, mediante decisão fundamentada, devendo o fato ser imediatamente informado ao tribunal, para instauração do respectivo processo administrativo (§2º).

10. Dever-poder do juiz de buscar a autocomposição em qualquer fase do processo

O inciso V do art. 139 consagra o dever-poder do juiz de promover, a qualquer tempo, a autocomposição, preferencialmente com auxílio de conciliadores e mediadores judiciais. Em outras palavras, pode o juiz, em qualquer fase do processo, determinar a realização de audiência de conciliação ou mediação (v.g., mesmo após o momento previsto no art. 334, inclusive durante a fase de execução ou em instância recursal).

11. Audiência de conciliação ou mediação

A audiência de conciliação ou mediação é regulada no art. 334, cujos principais aspectos serão abaixo analisados.

11.1. Cabimento da audiência

De acordo com o caput do art. 334, não sendo o caso de indeferimento da inicial (após a oportunização de emenda) nem de improcedência liminar do pedido, deve o juiz receber a inicial e citar o réu para comparecer à audiência de conciliação ou mediação.

11.2. Dispensa da audiência

Em duas situações excepcionais a audiência não será realizada (art. 334, §4º): se ambas as partes manifestarem, expressamente, desinteresse na composição consensual (inc. I); ou quando o direito não admitir autocomposição (inc. II). No que tange à dispensa da audiência por vontade das partes, é essencial a unanimidade de vontades no sentido da não realização. De acordo com o art. 319, VII c/c art. 334, §5º, a audiência somente não será realizada se todas as partes a dispensarem. Nessa mesma linha, havendo litisconsórcio, o desinteresse na realização da audiência deve ser manifestado por todos os litisconsortes (art. 334, §6º). Quanto à forma para se pedir a dispensa da audiência, cabe ao autor indicar, na petição inicial, seu desinteresse na autocomposição (art. 319, VII c/c art. 334, §5º). O silêncio do demandante na exordial deve ser interpretado como interesse na realização da audiência, uma vez que o art. 334, §5º, revela que a exigência de manifestação expressa é para o caso de haver desinteresse. A opção pela dispensa da audiência é que deve vir expressa, e não o interesse em sua realização, já que esta decorre da lei, sendo a regra padrão do procedimento comum. Já o réu deve indicar seu desinteresse na autocomposição por meio de simples petição, apresentada com 10 (dez) dias de antecedência, contados da data da audiência (art. 334, §5º).

11.3. Designação (tempo) da audiência e intervalo mínimo entre audiências

Ainda conforme o caput do art. 334, cabe ao juiz designar a audiência de conciliação ou de mediação com antecedência mínima de 30 (trinta) dias, devendo ser citado o réu com pelo menos 20 (vinte) dias de antecedência. Nessa contagem de prazo, devido à sua natureza claramente processual, devem ser computados apenas os dias úteis. O art. 334, §12, impõe que a pauta das audiências de conciliação ou de mediação seja organizada de modo a respeitar o intervalo mínimo de 20 (vinte) minutos entre o início de uma e o início da seguinte. A nosso ver, a sanção pelo descumprimento dessa regra não implicará nulidade da audiência. Se realizada com concordância das partes, a audiência será válida. Não obstante, a parte e seu advogado passam a ter o direito de se ausentarem licitamente, isto é, faltarem à audiência sem serem sancionados com aplicação de multa, uma vez

que o descumprimento, pelo juízo, da regra do intervalo mínimo, configura “motivo justo” para ausência da parte.

11.4. Intimação de autor e réu para comparecimento à audiência

Como já explicado, como regra geral o réu é citado para comparecer à audiência de conciliação ou mediação. Excepcionalmente, contudo, sendo o caso do art. 334, §4º, II, a citação será para o que réu apresente, já de uma vez, sua resposta (art. 335, III). Já a intimação do autor para comparecimento à audiência deve ser feita na pessoa de seu advogado (art. 334, §3º).

11.5. Renovação da sessão de conciliação ou mediação

Como visto, uma das diretrizes fundamentais do NCPC é a busca pela autocomposição. Por essa razão, o §2º do art. 334 permite que seja designada “mais de uma sessão destinada à conciliação e à mediação, não podendo exceder a 02 (dois) meses da data de realização da primeira sessão, desde que necessárias à composição das partes”.

11.6. Audiência por meio eletrônico

O §7º do art. 334 permite que a audiência de conciliação ou de mediação seja realizada por meio eletrônico (“videoconferência”), nos termos da lei.

11.7. Presença física na audiência

O art. 334, §9º, exige a presença das partes e de seus advogados ou defensores públicos. Excepcionalmente admite-se a dispensa da presença da parte, já que o §10 lhe permite constituir representante, por meio de procuração específica, com poderes para negociar e transigir. Esse representante pode ser um “preposto” (inclusive se a parte for pessoa natural) ou, até mesmo, seu próprio advogado, mediante inserção de poderes especiais, na procuração (art. 105), para celebração de autocomposição.

11.8. Ausência injustificada da parte (ou de seu representante)

O não comparecimento injustificado do autor ou do réu à audiência de conciliação é considerado ato atentatório à dignidade da justiça, sendo sancionado com multa de até 2% (dois por cento) da vantagem econômica pretendida ou do valor da causa, revertida em favor da União ou do Estado (art. 334, §8º). Essa multa independe da sucumbência e do resultado do processo, devendo ser aplicada ainda que a parte, ausente à audiência, tenha manifestado desinteresse na realização da audiência e venha, ao final, a obter sentença de mérito em seu favor. A multa somente não será aplicada se a ausência se basear em um motivo justo, isto é, caso fortuito, força maior ou defeito processual que tenha impedido a parte de tomar ciência sobre a data da realização da audiência ou de comparecer ao dia e hora designados. Não deve ser considerado motivo justo, para fins de afastamento da multa, o mero desinteresse da parte na realização de autocomposição (já que a audiência permanece obrigatória se qualquer das demais partes deixar de manifestar igual desinteresse). Tampouco configura motivo justo a incompetência do juízo, uma vez que, nesse caso, cabe a antecipação do protocolo da contestação (art. 340, §§3º e 4º), que, por si só, já é capaz de gerar a suspensão do dever da parte de comparecer à audiência designada perante o juízo incompetente.

11.9. Obtenção da autocomposição

Independentemente da fase do processo, obtida a autocomposição, deve a mesma ser reduzida a termo e homologada por sentença (art. 334, §11).

11.10. Negócios jurídicos processuais envolvendo a autocomposição

Podem as partes celebrar negócio jurídico processual relativo à autocomposição, desde que atendidos os pressupostos de existência e validade das convenções processuais (art. 190 do NCPC). É possível, por exemplo, que seja convencionada, extrajudicial e préprocessualmente, a dispensa multilateral da realização da audiência. Em sentido oposto,

também cabe estipulação no sentido da obrigatoriedade de tentativa prévia, extrajudicial e pré-processual, de conciliação ou mediação.

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