CONSIDERAÇÕES SOBRE O ESTATUTO SEMIÓTICO DO DESEJO

July 19, 2017 | Autor: Gil Nuno Vaz | Categoria: Semiotics, Psicanálise, Semiótica Peirceana, Teoria Geral dos Sistemas
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Considerações sobre o Estatuto Semiótico do Desejo Gil Nuno Vaz

Resumo

Uma importante questão que emerge das correlações estabelecidas entre as teorias de Jacques Lacan e Charles Sanders Peirce é localizar a posição que o Desejo ocupa no processo semiótico. O propósito deste ensaio é oferecer uma abordagem sobre o estatuto semiótico do Desejo que, além das referências citadas, adiciona conceitos da Teoria dos Sistemas. Apresenta o Desejo como um tipo de signo que resulta da capacidade perceptiva desenvolvida por uma determinada função sistêmica: a função de alerta, que sinaliza ao sistema a ocorrência ou iminência de um desequilíbrio, obrigando-o a uma resposta de adequação às novas condições. Corresponderia à busca da permanência sistêmica, expressão mais abrangente para o que costumamos nos referir como "instinto de sobrevivência".

Abstract An important question arising from the correlations betwenn Jacques Lacan and Charles Sanders Peirce's theories is to point out the position of Desire in the semiotic process. The aim of this essay is to bring up an approach about the semiotic status of Desire which adds, to the mentioned references, concepts from the Theory of Systems. It introduces Desire as a system function inside human psychic system, an alert function warning the system about any lack of balance, and urging the system a proper reaction to face a new situation. It would correspond to the systemic search for standing active, something we know as "survival instinct".

VAZ, Gil Nuno. Considerações sobre o Estatuto Semiótico do Desejo. Ensaio desenvolvido para o Curso Semiótica Psicanalítica, ministrado pela Profa Dra Samira Chaloub, no Programa de Pós-graduação em Comunicação e Semiótica da PUC-SP – Pontifícia Universidade Católica de São Paulo, 2º Semestre de 1997.

Introdução

Este estudo pretende apresentar, a partir das correlações estabelecidas entre as teorias de Jacques Lacan e Charles Sanders Peirce, algumas considerações que possam contribuir para expandir nosso entendimento sobre o estatuto semiótico do Desejo, especialmente sobre a posição que ocupa na rede de signos formulada por Peirce. O ensaio assume alguns pressupostos iniciais (Preliminares), principalmente em relação às referidas correlações, e a uma outra correlação que se propõe entre a Semiótica peirceana e a Teoria dos Sistemas. Estipula esta que

"... a busca da permanência sistêmica (a luta pela sobrevivência, em nosso linguajar mais imediato) é um processo interativo em que o sistema percebe uma perda e desenvolve uma reação compensatória de posse ou captura de elementos que contrabalancem a perda experimentada. Esse processo se dá pelo desenvolvimento de determinadas funções sistêmicas, que tornam progressivamente mais complexa a rede sígnica do sistema. Em outras palavras: cada passo rumo à complexidade é comandado pela emergência de uma função sistêmica, e envolve um signo de perda (que equivale à metonímia, expansão do conhecimento da realidade através de uma cadeia sintagmática de signos) e outro signo correspondente de posse (equivalendo este à metáfora, uma expansão do conhecimento da realidade através do estabelecimento de paradigmas)" (Vaz 1997).

A Seção 1 aborda duas possíveis posições do Desejo na rede semiótica, uma como correlato do signo e outra como um tipo especial de signo. Uma terceira possibilidade é citada, mas não abordada, uma vez que foge aos pressupostos assumidos ao início. Buscando aprofundar a segunda alternativa de um estatuto semiótico para o Desejo, a Seção 2 descreve a Rede Sígnica Básica (10 Classes principais) de Peirce, avançando posteriormente para a Rede Sígnica Expandida (66 classes), mostrando a localização do tipo de signo que representa o Desejo, e as circunstâncias sistêmicas de tal estatuto. A Seção 3 descreve o interior da oitava Classe principal de signos, em termos das classes que compõem a Rede Sígnica Expandida (66 classes), onde o ensaio propõe que o Desejo está situado. Nas Conclusões, as considerações são resumidas, invocando-se a necessidade ainda de um aprofundamento da proposta apresentada.

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VAZ, Gil Nuno. Considerações sobre o Estatuto Semiótico do Desejo. Ensaio desenvolvido para o Curso Semiótica Psicanalítica, ministrado pela Profa Dra Samira Chaloub, no Programa de Pós-graduação em Comunicação e Semiótica da PUC-SP – Pontifícia Universidade Católica de São Paulo, 2º Semestre de 1997.

Preliminares – Pressupostos Iniciais

Este estudo toma como ponto de partida as seguintes assunções:

Primeira Assunção

Assume-se a validade de uma conexão entre semiótica e psicanálise através do estabelecimento de algumas correlações entre as teorias de Charles Sanders Peirce e Jacques Lacan, como segue:

1. A compreensão de que a realidade psíquica, objeto do conhecimento da investigação psicanalítica, é um campo semiósico especial dentro do universo da investigação semiótica; 2. A possibilidade de aplicação de conceitos semióticos, fundados nas teorias de Peirce, a aspectos das teorias de Lacan.

O aspecto que será abordado neste estudo é o Desejo, complementado pela sua imbricada relação com o conceito de Outro.

Segunda Assunção

Uma segunda assunção deste estudo é que a realidade psíquica pode ser entendida como um sistema, o sistema psíquico, que por sua vez é sub-sistema do conjunto de propriedades (biológicas, físicas, químicas, psíquicas, sociais) que constituem a pessoa, o ser humano.

Terceira Assunção

A terceira assunção é que, se a classificação de signos formulada por Peirce (CP 2:264 e 8:344) abrange o contínuo perceptivo da natureza e do pensamento, qualquer sistema pode ser representado por uma determinada configuração das classes de signos e de interações entre as mesmas.

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Seção 1 – Dois (ou Três) Lugares Semióticos do Desejo

O primeiro estatuto semiótico do Desejo, a ser aqui destacado, situa-o na posição que o Interpretante ocupa no processo semiósico, segundo a teoria de Peirce. Esta postulação pode ser encontrada em Santaella (1989:114-115), que traça uma aproximação entre Lacan e Peirce. Estabelecendo correlações entre os registros lacanianos do Imaginário, do Real e do Simbólico e, respectivamente, as categorias peirceanas da Primeiridade, Segundidade e Terceiridade, a autora entende que tais correlações podem ser traçadas também entre os conteúdos específicos dos registros lacanianos (o Amor, a Pulsão e o Desejo) e os correlatos do signo peirceano, respectivamente o Signo (ou, segundo entendemos, o Fundamento do Signo), o Objeto e o Interpretante. No artigo referido, afirma, em relação ao Desejo, que o mesmo, "...sob a dominância do Simbólico, situa-se na posição do Interpretante". O Desejo tem assim o estatuto semiótico de um correlato do signo, ocupando, na semiose psíquica, a mesma posição do Interpretante na semiose de um modo geral, considerada a primeira um campo específico do universo semiótico. z

Um segundo lugar semiótico possível do Desejo é a posição de Signo, isto é, o Desejo seria um tipo de signo, característico do sistema psíquico. Tal hipótese encontra, se não respaldo, pelo menos indicações em Lacan (1992:296), cujo texto parece enquadrar o Desejo nos contornos de uma função sistêmica:

É na verdade... como desejo do Outro que o desejo do homem encontra forma, mas antes ao guardar somente uma opacidade subjetiva para aí representar a necessidade. (...) O desejo se esboça na margem em que a demanda se destaca da necessidade: essa margem sendo aquela que a demanda... abre sob a forma do defeito possível que aí pode trazer a necessidade, por não ter satisfação universal (o que se chama: angústia).

O trecho em negrito busca destacar os pontos do texto que se relacionam estreitamente com os conceitos da Teoria Sistêmica, no sentido da interação sistema/ambiente, e que se apresentam sob a forma de desequilíbrios gerando reações compensatórias, ou percepção de eventos estranhos que provocam esforços de conhecimento ou reconhecimento, por parte do sistema.

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Um terceiro estatuto, a partir de concepções que procuram colocar-se além dos conceitos de entropia, homeostase e outros que regem a Teoria de Sistemas, aguarda talvez um estágio mais avançado de pesquisas, como vislumbrado, por exemplo, em trabalhos desenvolvidos por Sayeg (1997), para que seja apontado de modo mais preciso e definido o lugar semiótico que o Desejo ocuparia nesse contexto. z

Não obstante o embasamento do primeiro estatuto semiótico, algumas dúvidas se instauram relativamente à posição do Desejo como Interpretante, ainda que consideradas as palavras com que Lacan parece confirmar tal posição, conforme apontado por Saporitti (1989:93):

Resto esse que, numa linguagem lacaniana, seria o chamado objeto pequeno "a", o que Lacan também denomina o "mais gozar" ... em resumo ... aquela sobra encarregada de levar a corrente do desejo sempre mais adiante... a responsável pela continuidade do processo e à qual Lacan, num determinado momento de sua transmissão, equiparou ao próprio "interpretante" peirceano (Lacan 1971).

A autora citada reforça esta correlação, no mesmo artigo, ao afirmar que

... desejo não é um querer e nem se confunde com um capricho qualquer. O desejo é algo vital. A nossa própria essência. O estofo do qual somos feitos. Ao "penso, logo existo" de Descartes, poderíamos, aqui, substituir por... "se desejo, existo".

Embora a correlação não esteja aí explicitada, o fato de que este trecho antecede o outro, no desenvolvimento de um raciocínio, evidencia o propósito de estabelecer aquela correlação. Vale entretanto ressaltar que o citado texto lacaniano deixa em aberto uma interpretação de que é o "resto" (ou "mais gozar", ou "objeto pequeno a") o equivalente ao interpretante, responsável, esse sim, por levar adiante a corrente do desejo. Na realidade, então, o Interpretante estaria ocupando o lugar do vazio semiótico, que é a própria essência da semiose. O conceito de "vazio semiótico" pode ser encontrado em Floyd Merrell, representado por um ponto no centro de um tripé, conforme mostra a Fig. 1.

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Fig. 1- O vazio semiótico, conforme representação de Floyd Merrell

Entretanto, como se vê, na Fig. 1, o vazio semiótico (o ponto central) não se confunde com o Interpretante. Situa-se no limite entre ser o resultado da insuficiência representacional do signo, e o elemento que provoca o Interpretante. Não é certamente por menos que Bonetti (1997:40) refere-se a esse ponto como a "figura mais incomôda já inventada em toda a história da humanidade. A figura do vazio. O que está lá ser estar. O que ocupa o lugar sem ocupar. O que não é nada sendo o potencial de tudo." Além desta questão, o conceito peirceano de Interpretante envolve o entendimento de uma continuidade entre mente e matéria, entre pensamento e natureza (sinequismo). Considerada então a nossa realidade psíquica como um sistema, e tendo em vista que a sensibilidade do sistema ao ambiente se dá pela atuação de uma Função Transferência (Vieira 1994:33-35), já nesse estágio, em que os correlatos do signo estão em total primeiridade, o Desejo deveria estar presente. Ora, se esse momento do processo semiótico é o mesmo, em tese, em qualquer tipo de sistema, orgânico e inorgânico, pois as diferenças começam a aparecer só nas funções superiores, como seria caracterizada então a condição do Interpretante-Desejo nesse estágio? Haveria uma denominação especial para o Rema do InterpretanteDesejo? Da mesma forma, todas as tricotomias deveriam ser repensadas, procedendo-se às alterações taxionômicas correspondentes. No quadro 1 abaixo, que apresenta apenas as três tricotomias geradoras das Dez classes de signo, elas estão indicadas com

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interrogações. O mesmo deveria ser feito para as dez tricotomias, geradoras das 66 classes de signo.

AMOR

PULSÃO

DESEJO

SIMBÓLICO

Legisigno (?)

Símbolo (?)

Argumento (?)

REAL

Sinsigno (?)

Índice (?)

Dicente (?)

IMAGINÁRIO

Qualisigno (?)

Ícone (?)

Rema (?)

Quadro 1 – As três tricotomias principais dos signos na realidade psíquica humana.

A partir de tais reflexões, este estudo volta-se para a exploração da segunda possibilidade do estatuto semiótico do Desejo. A terceira possibilidade não será aqui perseguida por estar além do campo delimitado nas Preliminares (Pressupostos Iniciais). Nossa proposta é apenas levantar e apresentar a hipótese desse segundo estatuto semiótico do Desejo, instigar o pensamento a respeito, sem a pretensão de uma necessária e exaustiva verificação, que não cabe no corpo deste ensaio. Em tal sentido, deparamo-nos com semelhante limitação apontada em Santaella 1989:116, deixando para um estágio futuro tal investigação e aprofundamento. Ainda: para apresentarmos as considerações que pretendemos trazer sobre o estatuto semiótico do Desejo, é necessário anexar a este trabalho o ensaio A Perda e a Posse - Funções Sistêmicas e a Rede Sígnica, elaborado para o curso Ciências da Informação. Os conceitos que vão orientar as seções seguintes estão, em grande parte, ali baseados. O presente trabalho pode ser compreendido como aplicação parcial daquele ensaio, de âmbito semiótico geral, ao campo específico da Psicanálise.

Seção 2 – Esquadrinhando o Campo do Desejo

O aforisma "O desejo do homem é o desejo do Outro" (Lacan 1973:105) coloca, junto com as citações anteriores, duas condições básicas para a abordagem em curso:

a. Tendo em vista o conceito lacaniano de Outro como lugar onde se situa a cadeia significante (Lacan 1973:185), e estando ali sediado o Desejo, a localização do Desejo, na Rede Sígnica Básica formada pelas dez Classes de signo estabelecidas por C. S. Peirce, estará nas mesmas posições ocupadas pelos signos que remetem à fonte, que

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apontam para o seu Autor, que revelam o Outro. Tais signos manifestam-se verticalmente ao longo de três daquelas classes (área hachurada), que em conjunto fazem remissão à Origem (Vaz 1997).

Fig. 2- A Rede Sígnica Básica (Dez classes de signos) e as Funções Sistêmicas Principais.

A primeira é a classe III, dos Vestígios (Recorrência), a segunda é a classe VI, de posição central no triângulo peirceano, exemplificada pela designação individual, o nome próprio (Marca), e a terceira Classe (VIII) é a dos nomes comuns (Acepção), conforme Fig. 2. Assim, quando um sistema detecta um signo, através da operação de sua Função Transferência, o signo se coloca, de início, em um estado de Latência (I), uma vez que é pura qualidade (primeiridade). À medida em que o sistema percebe esse signo posicionalmente, como alteridade, entra em ação a Função Memória Sintática, que detecta a Ocorrência (II) como um evento singular e, em resposta interna, estabelece um registro para esse signo, buscando enquadrá-lo em um Padrão (V), que possibilita o reconhecimento de formas, como ipseidade (Passos 1986:15). O passo seguinte nesse processo metonímico-metafórico é a busca da origem do signo. O sistema procede então, através da Função Memória Semântica, a uma Recorrência (III), volta-se para o signo como vestígo da fonte do sinal, na procura de uma direção que confira sentido, a Acepção (VIII) que deve ser atribuída ao evento. Como etapa intermediária nesse processo, o sistema passa pela apreensão do signo enquanto Marca (VI), enquanto sinal característico da fonte, vale dizer, o seu nome,

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ainda que em manifestação sensorial. Após isso, atua a Função Tendência que busca o conhecimento do processo, envolvendo as quatro Classes de signo restantes. Este estudo entende que o Desejo surge, na Rede Sígnica, como um signo situado dentro da Classe VIII (Acepção), que é onde se configura a origem dos signos e, consequentemente, onde se manifesta o propósito do Outro, que é a fonte e autor dos signos e, em nossa abordagem específica, fonte e autor do Desejo.

b. O Desejo mantém estreita relação com a emergência de uma necessidade, demanda ou ausência de satisfação. Nesse diapasão, o Desejo pertenceria, ou estaria relacionado, à mesma classe de signos de carência, de privação. Isso não significa que o Desejo seja equivalente, por exemplo, a necessidades como fome, sede e outras, do mesmo modo que não se confunde o impulso animal com a pulsão humana. Embora pertencentes à mesma classe de signo, diferem pela configuração da Rede Sígnica de cada sistema. A Rede Sígnica de um dado sistema, ou seja, sua capacidade semiósica terá uma configuração tanto mais completa e complexa quanto mais desenvolvido for o conjunto de capacidades de decodificação do ambiente que o sistema apresentar. Um sistema que tenha uma Rede Sígnica completa pode ser descrito como tendo percepção ao nível das 10 Classes de signos e, em uma representação mais detalhada, das 66 classes de signos (caso da percepção humana). Já um sistema de menor acuidade perceptiva apresentará lacunas em algumas classes de signos.

Fig. 3- Redes Sígnicas hipotéticas de dois sistemas em níveis diversos de semiose (Vaz 1997:23)

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Na Fig. 3 temos a representação exemplar hipotética (não é objetivo deste estudo comprovar a sua coerência com a realidade) de dois sistemas incompletos em sua rede sígnica, A sendo um sistema inorgânico e B um sistema orgânico primitivo. Para prosseguir na especulação de um segundo estatuto semiótico para o Desejo, e uma vez que já chegamos a uma representação com a Rede Sígnica Expandida, é oportuno adentrar agora níveis mais detalhados da Rede Sígnica, vale dizer, as 66 classes de signo formuladas por Charles Sanders Peirce, conforme mostra a Fig. 4.

Fig. 4- Rede Sígnica Expandida (66 classes de signos) e Funções Sistêmicas determinantes

A área hachurada na Fig. 4, delineando um triângulo interno cujos vértices são as classes 39-43-53, correspondendo à Classe VIII (Acepção) de signos, indicada na Fig. 2. As classes 18 a 32, que ocupam as três linhas diagonais logo abaixo dessa área,

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correspondem à Classe VI (Marca), e as classes 5 a 9 formam a Classe III (Recorrência). Vamos nos ater a seguir à Classe III (Acepção). É em torno do conjunto de classes de signos no seu interior que se concentram nossas considerações sobre o segundo estatuto semiótico do Desejo. O processo da interpretação semiótica ocorre, dentro da Rede Sígnica, através da passagem de um signo a outro, numa mesma classe, ou entre signos de classes diferentes. O processo revela a existência de relações e propriedades dinâmicas entre as classes (Queiroz 1997:10), que podem ser apontadas por setas, à maneira de operadores (Merrell 1995:135-165) ou através de direções orientadas de leitura, que podem avançar vertical, diagonal ou horizontalmente no triângulo dos signos (Vaz 1997). De qualquer modo, a interpretação pode obedecer a uma sequência gerativa, no sentido da classe mais baixa para a mais alta, ou Degenerativa, no sentido inverso (Merrell 1995:108), que correspondem, respectivamente, às leituras Gerativa (de Noam Chomsky) e Analítica (de Jean Piaget), conforme abordado por Vieira (1994:44-46). Para exemplificar o estatuto semiótico do Desejo enquanto classe de signo, vamos nos valer inicialmente de uma leitura analítica, em que temos conhecimento da gramática envolvida e, a partir daí, reconstituímos o processo do significado.

Seção 3 – A Acepção do Desejo

Começamos, portanto, por assumir que o Desejo é um tipo de signo localizado na Classe III (Acepção), e a sua posição dentro dessa Classe será agora apontada, como também as ligações com as outras classes internas (além das denominações utilizadas, procuramos ainda caracterizar a diferença entre as dez Classes principais e as 66 classes com o emprego da palavra "Classe", com inicial maiúscula, para as primeiras e "classe" com minúscula para as outras.

Acepção de Contingência

O primeiro nível, na sequência analítica adotada, é a Acepção de Contingência, que representa a percepção do sentido, da coerência semântica, que emerge de um evento contingente, de algo que se impõe como dado disposto pelo universo. É ligada à Função Alerta, situada na Fig. 4 como a função que desencadeia ou possibilita, 10

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diretamente, a percepção de signos da Classe 53, que denominamos Acepção Motivacional de Contingência, sendo o único tipo possível de acepção de contingência, uma vez que representa o propósito (inescrutável?) do universo, uma motivação exterior que foge ao nosso alcance. Os eventos geradores de tais signos manifestam-se sempre sob a sensação de alguma privação, de alguma carência, de algo que nos falta, que nos é ausente, e sobre o qual não temos comando. São incluídos aqui, portanto, as sensações de sede, de fome, carências afetivas, inseguranças, medos. A propósito, vejamos dois trechos de um texto básico da Semiótica da Cultura, extraídos de Bystrina (1995).

"A única teleonomia... seria a superação do medo existencial. E esse medo tem a ver com as variações do biótipo a partir das modificações ocorridas com a transferência da vida nas matas para a vida nas savanas, onde o perigo vem de todas as direções vislumbradas do horizonte." "As oposições ... dia/noite ou claro/escuro são mais do que uma necessidade técnica de comunicação ou expressão linguística adequada. Vistas pelo eixo cultural, vão até a estrutura mais profunda do texto. Por exemplo: têm a ver com os bons aos maus espíritos, com o céu e o inferno... até o medo primordial do reino das trevas."

O medo é a manifestação de alerta e de resposta à iminência do perigo, do desconhecido, da morte. Existe uma sensação de estar à mercê de forças externas, de sujeição a motivações da fonte que gerou o signo. O sistema busca então uma resposta imediata, automática. O primeiro signo a ser então gerado está relacionado com a Motivação de quem causou o desequilíbrio, o propósito que levou a fonte a originar tal signo. O sistema responde com um signo de Contingência, um impulso, instinto ou pulsão, que vem implacavelmente das entranhas do sistema. Em termos animais e humanos, utilizamos para essa reação a expressão "instinto de sobrevivência". Na rede sígnica, esse impulso irrefreável é caracterizado pela classe de número 53, a classe da Privação Básica. "O que parece ser a busca do desejo é a busca de uma falta. Lacan toma como referência a tese freudiana de que o objeto do desejo é um objeto perdido." (Lima 1989) Tal medo existencial, ou primordial, pode ser assim entendido como a manifestação, no sistema psíquico humano, de uma função que se encontra em todos os sistemas, a Função Alerta, responsável por reconhecer mudanças no sistema, quando irrompe uma perturbação, identificando onde está a geração da carência, da falha, da privação imposta ao sistema. Essa função diz respeito à geração de desequilíbrios e, portanto, de necessidades compensatórias, validando a ação de resposta, e promovendo

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mecanismos de busca de novas condições. Corresponde, no âmbito do sistema humano, ao conceito de "assimilação" utilizado por Piaget (1975) para a absorção de mudanças e reformulação de hábitos. É nesse contexto que se insere o Desejo, como o signo produzido por uma carência, a falta de algo no sistema psíquico. Tal sensação pode ser provocada pela simples constatação de uma alteridade, do choque do Outro, que se coloca como exterior, desconhecido, resistência, algo que, no fundo, incomoda, ameaça, perturba por ser estranho a nós. Uma dúvida sobre o que se conhecia.

Acepção de Providência

Para avançar na exploração desse segundo estatuto semiótico do Desejo, vamos continuar a sequência analítica na Classe da Acepção, passando para o nível inferior, que é desencadeado pela Função Relaxação, um mecanismo sistêmico que está bem próximo ao que Piaget (1975) denominou, no contexto humano, de "acomodação". Assim, após a percepção da carência, o sistema busca imediatamente uma Acepção Motivacional de Providência (classe 52), ou seja, desenvolve uma reação, uma prática que enfrente, reduza a carência. É o procedimento básico que leva o animal a procurar comida quando sente fome, que faz uma planta se mover na direção da luz, que comanda a acomodação de rochas sob o efeito da erosão, que concentra o Desejo humano na realização de algo que preencha o vazio que sente. À medida em que essa prática se revela eficaz, ainda que parcial ou temporariamente, na mitigação da carência, instaura-se uma Acepção Original de Providência (classe 51), um hábito assentado no sentido de que a prática possui um valor. Cria-se então uma crença, a adoção de um princípio que justifica aquele procedimento. Uma vez que a prática é adequada, assume-se que o princípio está intimamente ligado à contingência, que está na origem da carência. Representa o conceito de Autoria, conforme exposto por Baltazar (1989), e que se liga ao conceito de Fonte do signo. Pode-se fazer, neste estágio, uma aproximação entre a Teoria dos Sistemas, as idéias de Lacan e a semiótica peirceana, uma vez que a Função Relaxação, que comanda as acepções de providência, procura proporcionar ao sistema um estado de equilíbrio, de repouso, uma inércia sem abalos. Lacan, explorando o conceito de "princípio do prazer", chega à concepção de uma "inércia do gozo" e "o gozo, por sua vez, é uma 12

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ação que inclui a idéia de inércia", afirmando ainda que "desejo e gozo devem ser vistos como um nó... um nó cego, humanamente impossível de desatar"(Saporitti 1989:89-96). A autora referida diz que "permanecer na crença implica sempre numa espécie de gozo", ao falar de esforços que nos lançam "num gozo, ou numa crença". Peirce, por sua vez, sempre estabeleceu ligações fortíssimas entre dúvida e crença. Tudo isso estabelece ligações muito estreitas entre Desejo (classe 53), Crença ou Gozo (classe 51) e a Função Relaxação. É importante ressaltar que não estamos nos referindo aqui à sensação do gozo, do desejo, ou à tranquilidade da crença, mas a percepção sígnica que representa o significado de tais sensações. Na grande maioria, as pessoas (e os sistemas em geral) experimentam tais sensações, mas não conseguem identificar o seu significado profundo. Daí o divã do psicanalista...

Acepção de Partilha

O estágio seguinte da formação do significado é a Acepção de Partilha, quando as práticas e valores percebidos anteriormente (classes 52 e 51) passam para uma etapa que podemos denominar, em termos da realidade humana, de "sacralização". A função aí envolvida é a Função de Auto-Correlação Semântica, que comanda a compreensão de que pertencemos a uma determinada comunidade por partilharmos os mesmos costumes, valores, comportamentos. Ao nível do propósito da fonte, a classe 50 inclui os signos de Acepção Motivacional de Partilha, em que a prática torna-se tradição, é partilhada com a coletividade, transforma-se em rito, um padrão que deve ser seguido para que a prática tenha efeito. Desde as inscrições de animais nas paredes das cavernas, para garantir a caça, aos rituais religiosos, esta classe de signos é o aceitação da validade e acerto de determinadas, a tal ponto que infringi-las pode acarretar riscos. A classe 49 (Acepção Original de Partilha) reúne os signos que remetem diretamente à autoridade da fonte, que legitima os valores dentro da comunidade. É uma acepção da tradição dos valores e princípios, que se transformam em dogmas, crendices, seitas, religiões, ideologias. A autoridade passa a ser representada por um sacerdócio (Jolles 1976:23-24), na figura de um mestre, de um iluminado, aquele que recebe a inspiração divina e a incumbência de passá-la adiante. Em sistemas menos complexos, no sentido de que não avançam em abstrações, essa classe é representada por figuras que concentram o sentido de uma comunidade, como a abelha-rainha e semelhantes. 13

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A Acepção Característica de Partilha (classe 48) é preenchida por signos que sacralizam os conteúdos portadores dos valores e princípios, das revelações. É a classe dos Mitos, das histórias que buscam explicar o caráter do mundo, em seus múltiplos e infindáveis aspectos.

Acepção de Vínculo

Na fase seguinte da Acepção, surgem as expressões que, através da variedade e da pluralidade, refletem os valores, crenças, princípios e práticas em todas as culturas. Entra em ação a Função de Inter-Correlação Semântica, em que as relações de interdependência entre os sistemas são sentidas, avaliadas, comparadas. Este nível perceptivo, ao nível sígnico, é o que melhor caracteriza o conceito peirceano de símbolo. Na Acepção Motivacional de Vínculo (classe 47), os comportamentos aparecem enquanto soluções exemplares que estabelecem as ligações entre os atos isolados e os atos consagrados, entrelaçando-se em um desdobramento infinito das práticas básicas. O comportamento obsessivo, apaixonado, calmo, amoroso e outras variações são exemplos de uma motivação que orienta todos os propósitos. Assim também os gestos que ganham significados diferenciados, os costumes de pronúncia, os hábitos de trajar. A Acepção Original de Vínculo (classe 46) reúne os signos que dizem respeito ao Autor do comportamento, da expressão, sendo o autor aqui entendido no sentido atribuído por Baltazar (1989), ao relacionar autor/autoria/pessoa. É o compositor, o escritor, o artífice, o operário, o pintor, enfim, aquele (ou aquilo) que age, desencadeando um enredo, real ou fictíco. Autor ou personagem. O herói, o mártir, o palhaço, o líder, o radical, o apaziguador, o militante. Diz respeito à origem da relação do termo, da expressão. A Acepção Característica de Vínculo (classe 45) é a própria expressão, a forma que define um uso, desde o emprego de uma determinada palavra ou expressão em um contexto (erguer uma bandeira por defender uma ideologia), como de uma forma artística, um jogo, um quadro, uma sinfonia, conto, romance, escultura, enquanto estruturas. Uma equação, um modelo matemático. A Acepção Distintiva de Vínculo (classe 44) é o campo expressivo, a acepção de expressão da categoria a que pertence o signo. A música como campo da forma 14

VAZ, Gil Nuno. Considerações sobre o Estatuto Semiótico do Desejo. Ensaio desenvolvido para o Curso Semiótica Psicanalítica, ministrado pela Profa Dra Samira Chaloub, no Programa de Pós-graduação em Comunicação e Semiótica da PUC-SP – Pontifícia Universidade Católica de São Paulo, 2º Semestre de 1997.

sinfonia, a literatura como campo da poesia, do conto, do romance, as artes plásticas como campo da pintura, da escultura e, mais adiante, o som, a palavra, o desenho, respectivamente, como seus campos mais específicos. E também a luz, o gesto, o corpo. É esta, ainda, o nível em que se dá o que denominamos conotação, a amplitude de significação, a derivação.

Acepção de Tipo

Esta fase limiar da Acepção traz, por um lado, signos que expressam o conceito peirceano de "símbolo singular" e, por outro, o de "símbolo abstrato" (Peirce CP 2:293294). A Acepção Motivacional de Tipo (classe 43) corresponde à convenção que um determinado propósito implica, através de um ato específico. O sentimento de nacionalidade, por exemplo, caracterizado pela atitude de respeito perante a bandeira do país natal. É uma espécie de senha, válida no contexto de uma comunidade. É, também, o significado de um ato específico que visa satisfazer uma carência, ainda que o significado dessa carência não tenha sido percebido. Assim, é a expressão "aqui e agora" da carência. A solução de cada sistema, pessoa, comunidade. É o ato enquanto símbolo singular, aplicável a um contexto delimitado. A Acepção Original de Tipo (classe 42) diz respeito à percepção de um signo que representa uma convenção de origem, da fonte do signo. O Brasil, enquanto país, um ser específico, denotado. Vale também para a pessoa, no sentido em que toma Baltazar (1989), nas suas relações com autor e autoria. A Acepção Característica de Tipo (classe 41) estabelece os contornos formais de uma convenção de uso. É formado por um símbolo singular, no que refere à regra, ao jargão, a uma etiqueta ou protocolo específicos de procedimento, conduta ou expressão. O desenho da bandeira de uma nação, a representação específica de seus símbolos. A Acepção Distintiva de Tipo (classe 40) contém o símbolo singular de uma comunidade: a bandeira do Brasil. É a categoria de um termo (signo) específico, seja ele verbal, sonoro, visual, sonoro que se aplica a uma comunidade. A raga como denotação da música hindu. Finalmente, a Acepção Sensorial de Tipo (classe 39) é o campo semântico dos signos cujo significado está em aberto, a ser preenchido. É o lugar do símbolo abstrato concebido por Peirce, onde se dá a hipótese do objeto, do sentido do termo, do signo. Uma palavra em língua desconhecida revela-se apenas como palavra. 15

VAZ, Gil Nuno. Considerações sobre o Estatuto Semiótico do Desejo. Ensaio desenvolvido para o Curso Semiótica Psicanalítica, ministrado pela Profa Dra Samira Chaloub, no Programa de Pós-graduação em Comunicação e Semiótica da PUC-SP – Pontifícia Universidade Católica de São Paulo, 2º Semestre de 1997.

Conclusões.

No desenvolvimento da proposta formulada neste estudo, e tendo em vista o seu caráter especulativo voltado para a instigação de pesquisas complementares, destacamos as seguintes considerações: „

A possibilidade de que o Deseja seja um tipo de signo na Rede Sígnica é uma

hipótese a ser averiguada com maior nível de detalhamento, dados os fundamentos em que se assenta, tanto quanto o também apreciado e comentado estatuto de correlato do signo; „

Na Classe da Acepção (VIII), o Desejo está situado em um dos vértices do

triângulo da Classe, sendo a classe de signo com maior concentração de Terceiridade da referida Classe, enquanto os outros vértices abrigam as classes de signo (39 e 44) com maior concentração, respectivamente, de Primeiridade e Segundidade; „

As diferenças tradicionalmente apontadas entre Necessidade e Desejo que,

bruto modo, estabelecem uma separação entre o natural e o cultural, entre o físico e mental, ganham, com esta visão, a suposição de que representam, na verdade, estágios de uma realidade semiósica progressiva que se estende e se complexifica, continuamente, pelos sistemas da natureza e do pensamento, concretos e conceituais, segundo a visão sinequista adotada por Peirce. „

Além dos dois estatutos semióticos do Desejo aqui abordados, e da alusão a

um terceiro, há ainda outras possibilidades, dentro do enfoque semiótico peirceano. Seria o caso de especular, por exemplo, uma equiparação do Desejo com a categoria da Terceiridade, no sistema psíquico humano, uma vez que aparece, na figura da Rede Sígnica, em um eixo direcional onde se situam também o Interpretante e a classe de signo relacionada à Acepção da Contingência. Uma outra área de investigação, ao nosso ver mais remota, seria o estatuto do Desejo como plano ou modo de significação. Ficam as indicações para eventuais reflexões futuras.

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VAZ, Gil Nuno. Considerações sobre o Estatuto Semiótico do Desejo. Ensaio desenvolvido para o Curso Semiótica Psicanalítica, ministrado pela Profa Dra Samira Chaloub, no Programa de Pós-graduação em Comunicação e Semiótica da PUC-SP – Pontifícia Universidade Católica de São Paulo, 2º Semestre de 1997.

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