Convicção, crença e prova

September 5, 2017 | Autor: M. Vieira de Carv... | Categoria: Criminal Justice, Media Studies, Political Theory, Totalitarianism, Neoliberalism
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PÚBLICO, 12 de Janeiro 2015, p. 46

, Convicção, esidência? crença e prova

tência, dando a cara, nunca fugindo, panágio. ntemente que P.S.L. cometeu erros, nexplicáveis, mas aprender com os nsina-nos a evitá-los. O primeiro passo ar proveito deles consiste em perder nha de errar. Com os erros, aprendeoblema é que, em Portugal, o erro é o. Errar uma vez não quer dizer que ida mas que nos abre as portas para a dade e para fazer de outra forma. Nos Unidos, num processo de selecção m posto de trabalho, um currículo periências negativas é muito bem lguém que, por exemplo, montou ócio ou teve um lugar de chefia e ma experiência catastrófica passa a s experiência e maturidade do que ão a teve. A probabilidade que essa tem de ter mais iniciativa, ser mais ora e criativa, aumenta. o Santana Lopes, que já usufruiu subvenção vitalícia por ter sido primeiro-ministro, esteve bem ao não aceitar ser remunerado pela presidência da Santa Casa da Misericórdia. No seu currículo, consta ter sido deputado com 24 anos, secretário de Estado da presidência do Conselho de Ministros do Governo de Cavaco Silva, deputado europeu, mais tarde secretário de Estado da Cultura (nessa altura não havia ministro da Cultura, era o equivalente) e o-ministro. 012, numa sondagem promovida ário Económico, José Sócrates lhido como o melhor primeiroo, seguido de Pedro Passos Coelho, em terceiro lugar Pedro Santana à frente de Mário Soares e outros. ho dúvidas de que, se fosse feita ova sondagem, tendo em conta o está a passar, daria outros resultados. ção para Presidente da República renhida e terá contornos santes. É uma decisão pessoal e não pendente dos partidos políticos. Há hipotéticos candidatos com chances: o Rebelo de Sousa, António Guterres, o da Silva, Pedro Santana Lopes, P.S.L. é assim tão fraco e cheio de s, qual o problema de concorrer? que mete medo e receio a sua atura?

.L. é m tão fraco io de tos, qual blema ncorrer?

dor do Clube dos Pensadores

FERNANDO VELUDO/NFACTOS

Debate Processo judicial Mário Vieira de Carvalho

F

ernando Gil estabelece a diferença entre convicção e crença. A convicção supõe uma construção cognitiva. Sendo eminentemente subjetiva, é-lhe interditada a “pretensão a uma veracidade intrínseca”. Isto é: cada qual pode ser “ludibriado pela sua própria convicção”. Mas a convicção é, por definição, a crença no verdadeiro. Não pode ser crença no falso: isso constituiria uma contradição insanável. A construção cognitiva é indispensável para captar, não a verdade, mas sim o que o sujeito julga verdadeiro. Portanto: a convicção é a crença no que se julga verdadeiro. Sem construção cognitiva o sujeito não seria “constrangido” a aderir a um objeto, a aceitá-lo como verdadeiro. Subjetivamente, a convicção decorre desse constrangimento. Na crença (sem convicção) faltam a construção cognitiva e o constrangimento. A crença não reconhece ou adere a um objeto, antecipa-o. O real suposto substitui a construção cognitiva do objeto e produz um efeito subjetivo semelhante, mas sem constrangimento de aceitação. Por outras palavras: o sujeito não crê num real que julga verdadeiro; institui um real no qual crê. “A convicção é da ordem da verdade. A crença é a sede da ideologia.” A crença alucinatória altera o estatuto da realidade ao ponto da completa inversão dos meios e dos fins. É uma perceção com objeto, mas em que este vem depois: perceciona-se primeiro, e a seguir “preenche-se” a alucinação. Um bom exemplo seria o do matemático John Forbes Nash, tal como é efabulado no filme A Beautiful Mind (“Uma mente brilhante”), de Ron Howard (EUA, 2001). Outro exemplo, muito mais antigo e conhecido de todos, é o de Dom Quixote: ataca moinhos ao percecionar gigantes. Voltando a Fernando Gil, é ele próprio quem estabelece a conexão com os sistemas judiciários arcaicos, fundados na crença absoluta no julgador, como parte integrante de um “sistema de crenças indefectível”. Nesses sistemas, o Direito firma-se na religião. Ou então firma-se numa estrutura e num discurso de legitimação em tudo análogos aos da religião. Como nos processos de Moscovo do final da década de 30: “À maneira do direito arcaico, é julgada a pessoa e não o acto, a perigosidade potencial da pessoa e não a sua maldade real.” Para que serve então, nessas circunstâncias, o processo judicial? Para “demonstrar um crime que se ignora, oculto por detrás da consciência do acusado”. Bastam a coesão do grupo

e o fundo religioso ou ideológico para fundamentar a sentença. A “verdade” impõe-se por si só. Não carece de demonstração. Não carece de prova. Em vez da submissão à prova, privilegia-se a confissão ou a “autocrítica”: aquela enfraqueceria, estas reforçam a ordem totalitária. O show é imanente ao processo. O regresso ao arcaico, no Direito, não ocorre hoje apenas em países islâmicos. Manifesta-se também, e mais universalmente, na transferência da soberania para os centros de poder financeiro. Os mercados tomaram o lugar do “Príncipe” ou do “Ditador”. Por um lado, ditam a suspensão do Direito ou “estado de excepção”, como compete ao poder soberano (Fernando Gil aborda largamente o conceito, inclusive discutindo a Teologia Política de Carl Schmitt). Por outro lado, promovem, como nunca antes, a disseminação do “pensamento único” numa esfera pública “refeudalizada” (Habermas). Tais contornos totalitários deveriam ser tidos em conta na discussão do aparente regresso a uma arcaica “dispensa da prova”, na sua variante mais atual e refinada: a inversão objetiva do ónus da prova enquanto efeito automático e irreversível da gestão mediática dos processos judiciais — do caráter de show que os próprios agentes judiciários lhes conferem.

O regresso ao arcaico, no Direito, não ocorre hoje apenas em países islâmicos

Prof. catedrático jubilado (FCSH-UNL)

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