COOPERAÇÃO UNIVERSIDADE-EMPRESA: PROPOSTA DE METODOLOGIA PARA CONSTRUÇÃO DE PORTFÓLIO COMPARTILHADO DE P&D

June 24, 2017 | Autor: Raoni Bagno | Categoria: Management of Innovation, New Product Development, Cooperation, Cooperative Learning
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10o Congresso Brasileiro de Gestão da Inovação e Desenvolvimento de Produtos Itajubá - MG, 8 a 10 de setembro de 2015

COOPERAÇÃO UNIVERSIDADE-EMPRESA: PROPOSTA DE METODOLOGIA PARA CONSTRUÇÃO DE PORTFÓLIO COMPARTILHADO DE P&D Jessica Ferreira Castilho ([email protected]) - UFMG Raoni Barros Bagno ([email protected]) - UFMG Jonathan Simões Freitas ([email protected]) - UFMG Lin Chih Cheng ([email protected]) - UFMG

Resumo Como construir uma carteira inicial de projetos de P&D para iniciar uma cooperação universidade-empresa? Este artigo apresenta uma proposta para responder a esta pergunta. Particularmente, é apresentada uma metodologia concebida a partir de um programa de pesquisa-ação de 18 meses realizado entre uma empresa multinacional do setor automotivo e a escola de engenharia da UFMG. O resultado é uma metodologia composta por 3 estágios orientados pela construção de matrizes de correlação. A primeira matriz correlaciona performances (fatores de desempenho) e componentes/subsistemas do automóvel. Clusters de altas correlações nessa matriz são identificados e analisados, a fim de priorizar linhas de trabalho em P&D. Na segunda matriz, tais linhas são correlacionadas com competências típicas de engenharia para identificar quais delas são majoritariamente demandadas no desafio de se atender as linhas previamente definidas. Finalmente, uma consulta a experts nas competências priorizadas guia o preenchimento um roadmap com entregas potenciais de P&D ao longo do tempo. Entre as considerações finais, destacam-se a aplicabilidade da metodologia em auxiliar gestores das empresas na construção de um portfólio de P&D compartilhado com a universidade, e também as possibilidades de flexibilização da proposta no intuito de abarcar demandas de outros setores da indústria. Palavras-chave: Cooperação universidade-empresa; gestão da inovação; portfólio de P&D. Área: GDP e Inovação 1. INTRODUÇÃO Nas últimas décadas, a inovação tem adquirido cada vez mais importância para as organizações, especialmente nos setores industriais em que a tecnologia desempenha um papel fundamental (TERWRIESCH; ULRICH, 2008; TIDD; PAVITT; BESSANT, 2009). Neste contexto, para dar suporte às empresas no desenvolvimento de tecnologia, emerge o conceito de colaboração interorganizacional, no qual a cooperação universidade-empresa é uma de suas formas mais usuais.

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10o Congresso Brasileiro de Gestão da Inovação e Desenvolvimento de Produtos Itajubá - MG, 8 a 10 de setembro de 2015 Este tipo de cooperação apresenta, de um lado, a universidade, cujo objetivo principal é desenvolver pesquisas e projetos a fim de alavancar a geração de conhecimento novo. Do outro lado está a empresa, que demanda soluções de problemas que podem ser aderentes (ou não) à pesquisa realizada na universidade. Além disso, políticas públicas usualmente oferecem incentivos ao estabelecimento destas relações, como recursos ou redução de impostos, já que cooperações universidade-empresa são consideradas importantes aceleradores do desenvolvimento tecnológico de uma região ou país (HASENCLEVER, 2013). Apesar disso, ainda há barreiras relevantes para implementar a cooperação entre universidade e empresa de forma eficaz, como por exemplo as diferenças na dinâmica de trabalho de cada um, interesses centrais das pesquisas, visão estratégica e de longo prazo versus visão operacional e de curto prazo, etc. Além das questões contratuais tipicamente relacionadas ao modus operandi dos NITs das universidades, a clareza sobre quais tecnologias investir (sob a perspectiva de torná-las plataformas de trabalho cooperativo) pode representar uma questão relevante a fim de impulsionar essa relação. Dessa forma, esse problema foi resumido pela seguinte questão de pesquisa: "como construir um portfólio inicial de projetos de P&D para iniciar uma cooperação universidadeempresa?" Portanto, o objetivo deste estudo foi o de desenvolver uma metodologia para definição de uma agenda de P&D compartilhada entre universidade e empresa. Para isso, um programa de pesquisa-ação de 18 meses foi realizado entre uma grande empresa do setor automotivo e a escola de engenharia da UFMG. Este estudo sintetiza a metodologia construída no âmbito desta iniciativa e discute suas potenciais aplicações e adequações. 2. REVISÃO TEÓRICA 2.1. Inovação tecnológica e a abordagem da inovação aberta Inovação é definida nesse trabalho como a exploração com sucesso de novas ideias (DTI, 2003). No caso de empresas industriais, inovações em produtos e processos tendem a ser fortemente baseadas na disponibilidade de novas tecnologias. Utterback (1970) argumenta que o processo de geração, desenvolvimento e introdução da inovação de caráter tecnológico é fundamental para as empresas industriais, nas quais a inovação pode compreender novas tecnologias ou novas aplicações tecnológicas, melhores produtos e serviços, novos processos de produção ou mesmo processos mais eficientes e mais limpos e novos modelos de negócio. Sabe-se, contudo, que se o desenvolvimento de um produto ocorre em uma plataforma tecnológica pouco desenvolvida, isso poderá implicar em incertezas técnicas substanciais para o processo de inovação (SALERNO et al., 2015). Para o enfrentamento destas incertezas, a abordagem da inovação aberta, na qual podem ser

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10o Congresso Brasileiro de Gestão da Inovação e Desenvolvimento de Produtos Itajubá - MG, 8 a 10 de setembro de 2015 somadas ao processo de inovação as competências de parceiros externos, ou recursos adicionais para seu desenvolvimento, tem se mostrado importante alternativa. O termo "inovação aberta" refere-se às várias iniciativas destinadas a buscar fontes externas de conhecimento, tecnologia e/ou inovação para impulsionar o crescimento organizacional (CHESBROUGH, 2003). Ela se tornou um tema muito importante na gestão da inovação e pode ser implementada de muitas maneiras diferentes (HUIZINGH, 2011). Práticas de inovação aberta podem não apenas acelerar os processos de inovação, mas também levar as empresas à diversificação de mercados por meio de acordos de P&D (ALCALDE HERAS, 2014). Neste contexto, as organizações poderiam aumentar tanto a quantidade de parceiros quanto a intensidade de cada relação realizada (BAGNO et al., 2012). Por este motivo, o estabelecimento de parcerias com Institutos de Ciência e Tecnologia (ICTs, que incluem universidades, bem como outros centros de pesquisa) pode ser uma das principais atribuições de uma equipe engajada na construção de uma capacidade organizacional para a inovação sistemática em dada empresa (BAGNO; SALERNO; DIAS, 2015). 2.2. Gestão de Portfólio de P&D O principal objetivo de um programa de inovação em uma empresa é o de estimular e gerenciar um portfólio de projetos de inovação (KELLEY; PETERS; O'CONNOR, 2009), a fim de deixar claro para a empresa as prioridades e definições sobre quais projetos ela deve desenvolver e alocar recursos. A Gestão de Portfólio é um processo dinâmico, o que significa que a lista de projetos deve ser constantemente revista de acordo com perturbações no mercado, progresso dos projetos em curso, mudanças no futuro desejado da empresa, desempenho de produtos atuais no mercado, além do comportamento dos concorrentes (COOPER; EDGETT; KLEINSCHMIDT, 1997; TERWRIESCH; ULRICH, 2008). Quando a discussão sobre o portfólio concentra-se nas expectativas de longo prazo, a identificação de lacunas de tecnologia futuras assume relevância central. Inovações tecnológicas podem ser um meio para explorar novos segmentos, fazer renovações nos mercados atuais ou até mesmo servir como escudos contra mudanças futuras em mercados cativos. Para lidar com esta necessidade, Terwriesch e Ulrich (2008) propõem que uma empresa deva tratar suas demandas de desenvolvimento de novos produtos/processos (curto e médio prazo) e demandas de desenvolvimento de P&D (longo prazo) em portfólios distintos. Isto implicaria não somente em separar as listas de ideias e projetos ou delimitar mais precisamente as atribuições de recursos mas, principalmente, em se desenvolver abordagens distintas de gestão que sejam mais adequadas às características próprias de cada desafio mencionado.

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10o Congresso Brasileiro de Gestão da Inovação e Desenvolvimento de Produtos Itajubá - MG, 8 a 10 de setembro de 2015 3. METODOLOGIA DE PESQUISA O objetivo do estudo foi o de desenvolver uma metodologia para definição de uma agenda de P&D compartilhada entre universidade e empresa. Para isso, um programa de pesquisaação de 18 meses foi realizado entre uma grande empresa do setor automotivo e a escola de engenharia da UFMG. O evento disparador deste processo esteve na iniciativa direta da empresa (na pessoa do gerente da área de gestão da inovação) em buscar a universidade para construção do portfólio de P&D e, consequentemente de sua abordagem metodológica para que viesse a ocorrer sistematicamente. Neste contexto, a pesquisa-ação é aqui o método central de investigação (CHECKLAND; HOLWELL, 1998) na qual o pesquisador social deve ser, não um observador distante de um fenômeno, mas um ator engajado com um problema do mundo real (COGHLAN, 2002). Outras características importantes da pesquisa-ação encontram-se entre os principais vieses deste estudo (TURRIONI; MELLO, 2009): (i) há abordagem científica conciliada com a resolução de problemas organizacionais; (ii) verifica-se a participação dos membros da organização estudada; (iii) ocorre via ciclos de coleta de dados e realimentação, análise, planejamento e tomada de ações e avaliação e; (iv) a pesquisa ocorre em tempo real. O esforço de investigação foi realizado ao longo de três grandes passos, que se constituíram, posteriormente, nas etapas propostas para a versão final da metodologia (enquanto objeto de entrega final do estudo), lapidada em sua forma genérica para aplicação recorrente. As duas primeiras etapas se baseiam fundamentalmente na aplicação seletiva de matrizes de correlação e seguem as diretrizes estabelecidas pelo método QFD (CHENG; MELO FILHO, 2010), enquanto a última etapa perfaz uma aplicação típica de um Roadmap como descrito por Oliveira et al. (2012). Sob esta perspectiva, a metodologia resultante deste esforço conjunto de pesquisa pode ser também definida como um arranjo combinado de métodos e técnicas já consagrados na GDP, mirados na resolução de um problema de cooperação entre instituições para desenvolvimento de P&D. Uma descrição mais detalhada da estratégia metodológica empregada pode ser encontrada no relato registrado em Castilho et al. (2015). Por motivos de confidencialidade, algumas imagens, nomenclaturas e dados retirados da documentação do projeto foram alterados para inclusão no presente artigo sem, no entanto, comprometer o entendimento do conteúdo aqui apresentado e sua discussão. 4. RESULTADOS O programa de pesquisa-ação resultou em uma metodologia de 3 etapas para construir um

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10o Congresso Brasileiro de Gestão da Inovação e Desenvolvimento de Produtos Itajubá - MG, 8 a 10 de setembro de 2015 portfólio inicial de projetos de P&D para iniciar uma cooperação universidade-empresa. Para cada etapa, o Quadro 1 apresenta o resultado esperado, os passos do processo para alcançá-lo, e as saídas intermediárias e final. Quadro 1 - Três etapas para a definição do portfólio inicial de projetos de P&D Etapa

Abordagem

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Correlação Performances do Produto (PERF) X Componentes do Produto (COMP)

2

Passos

Saídas

1. Construção da tabela de PERF

Análises prioritárias de PERFxCOMP (Linhas de Pesquisa de P&D)

2. Construção da tabela de COMP 3. Avaliação da matriz PERFxCOMP

Correlação Linhas de Pesquisa de P&D (LINPESQ) X Competências (CPT)

Outros:

4. Ponderação das PERF

- Análises prioritárias de PERF

5. Ponderação dos COMP

- Análises prioritárias de COMP

1. Construção da tabela de LINPESQ

Análises prioritárias de LINPESQxCPT (Seleção de experts)

2. Construção da tabela de CPT 3. Avaliação da matriz LINPESQxCPT

Outros:

4. Ponderação das LINPESQ

- Análises prioritárias de LINPESQ

5. Ponderação das CPT

- Análises prioritárias de CPT

1. Construção do horizonte de tempo

3

Roadmap de P&D

2. Construção da camada do Ambiente

Portfólio inicial de projetos de P&D

3. Construção da camada de P&D

Fonte: Elaboração pelos próprios autores

4.1. Etapa 1: Correlação de Performances do Produto versus Componentes O resultado esperado da primeira etapa do método é uma matriz de correlação entre Performances de avaliação do produto X Componentes que o integram (PERFxCOMP). A Figura 1, mostra o exemplo desse resultado. Cada performance é ponderada (última coluna) segundo sua importância relativa. Consequentemente, após a correlação, cada componente (última linha) ganha um nível de importância de acordo com a intensidade com a qual está

BODY PARTE FRONTAL / VÃO MOTOR REVESTIMENTOS EXTERNOS BODY E VEDAÇÕES ACESSÓRIOS / DISPOSITIVOS EXTERNOS SEGURANÇA DO OCUPANTE SEGURANÇA OCUPANTE

BANCOS REVESTIMENTOS ACÚSTICOS ACESSÓRIOS / DISPOSITIVOS DAS PORTAS DASHBOARD (PLANCIA E CONSOLE) AQUECIMENTO / VENTILAÇÃO / AR

DIREÇÃO

SUSPENSÃO VEÍCULO SUSPENSÃO MOTOPROPULSOR COMANDOS

FREIOS SISTEMA DE ALIMENTAÇÃO DE COMBUSTÍVEL ENERGIA

MOTOR

Média Pes Toda a Indústria Peso Absoluto Estratético

associado a performances prioritárias e/ou ao número de performances nas quais impacta.

ENTRETENIMENTO A BORDO

1

0

1

0

3

0

3

0

5

1

0

3

1

0

0

0

5

3

1,68

53,8

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SISTEMAS DE AUXÍLIO À DIREÇÃO

1

0

0

3

5

0

0

0

1

0

5

3

0

5

3

0

3

3

1,94

0,0

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SEGURANÇA ATIVA

5

1

0

3

3

1

0

0

0

0

7

7

1

3

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0

1

1

1,87 68,8

5

7

7

0

3

7

7

1

3

5

0

1

1

3

5

1

7

3

5

3,23

59,8

5

5

1

3

3

1

3

1

1

3

3

1

1

1

0

3

1

5

7

3,03

0,0

8 6

- Preenchimento Matriz PERFORMANCES

CONECTIVIDADE

SEGURANÇA VEICULAR SEGURANÇA PASSIVA CONSUMO CONSUMO DESEMPENHO

DINÂMICA VEICULAR

PE SO

POWERTRAIN

CHASSI

5

1

1

1

0

0

0

0

0

5

3

3

0

0

1

1

5

7

2,45 70,0

MANOBRABILIDADE

5

3

0

3

1

1

0

0

3

0

7

3

0

5

1

0

1

1

1,55

68,6

1

HANDLING

5

3

0

0

5

5

0

0

0

0

7

7

1

5

5

0

0

5

2,13

68,5

0

5

0

0

1

3

7

0

1

1

0

5

7

5

3

1

0

0

5

1,84

63,8

1

7

3

3

3

1

0

7

1

3

5

3

5

7

3

5

1

3

7

3,19

68,9

0

5,72

2,57

2,17

2,42

3,14

2,93

1,47

2,11

3,63

2,44

3,86

2,59

2,55

2,12

2,81 4,57

2,5%

2,8% 3,7% 3,4% 1,7%

2,5%

4,2%

2,9%

4,5% 4,1% 2,8% 3,0% 3,0%

2,5%

3,3% 5,4%

CONFORTO DINÂMICO QUALIDADE VEICULAR (CONFORTO) CONFORTO ACÚSTICO

PESO

INTERIORS

Matriz Performances x Componentes

COMPONENTES

Figura 1 - Recorte da matriz PERFxCOMP

Peso Absoluto Peso Relativo

6,7% 3,0%

3,47 2,43

Fonte: Elaboração pelos próprios autores

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10o Congresso Brasileiro de Gestão da Inovação e Desenvolvimento de Produtos Itajubá - MG, 8 a 10 de setembro de 2015 Para se construir a tabela de performances, primeiramente buscou-se definir a lista de performances segundo as taxonomias já usadas no setor automotivo. Essa lista representa a linguagem do cliente, de acordo com o comportamento desejado do produto. As linhas da Figura 1 representam um recorte das performances do veículo. O segundo passo é a construção da tabela de componentes e segue as mesmas diretrizes gerais. A linguagem, entretanto é a do time de engenharia e a informação vem majoritariamente de agrupamentos realizados na árvore de estrutura do produto. A seguir, uma típica etapa de extração do QFD busca extrair componentes dos aspectos de performance. As colunas da Figura 1 representam um recorte para os componentes do veículo. Após a construção de tabelas de PERF e COMP, o terceiro passo é a avaliação da correlação entre eles. Esta avaliação foi feita inicialmente por dois gestores da área de qualidade. Para cada cruzamento, respondia-se à pergunta: "Quanto esse componente impacta essa performance do produto?". Uma escala de 5 pontos foi utilizada para codificar as respostas: 0 (nenhum impacto), 1 (fraco), 3 (médio-baixo), 5 (meio-forte) e 7 (forte impacto). A matriz resultante foi confrontada com a percepção do time de Gestão da Inovação que apontou alguns pontos de discordância para serem rediscutidos com os primeiros participantes, gerando um ciclo de refinamento até se chegar aos valores finais. O próximo passo é designar pesos (níveis de relevância) para as performances. Para isso, levou-se em consideração três perspectivas: o peso técnico, calculado pela média das correlações da linha (mostra o quanto a performance é transversal); o peso estratégico, obtido por meio de pesquisa direta com diretores (mostra o quanto a performance está ligada à estratégia da empresa); e o peso mercadológico, derivado de um relatório de pesquisa de mercado, que é atualizado periodicamente. As últimas colunas da Figura 1 representam pesos resultantes para cada um dos aspectos de performance do produto. O quinto e último passo é designar pesos aos componentes do produto. Uma vez que as performances já estão ponderadas, o peso dos componentes pode ser calculado a partir da soma ponderada das correlações de coluna correspondentes. As últimas linhas da Figura 1 exemplificam esse resultado para o caso em estudo. Uma vez que a matriz de correlação PERFxCOMP é construída, linhas de pesquisa de P&D podem ser derivadas a partir dela. Essas linhas são obtidas pela identificação de clusters de alta correlação entre performances e componentes, as chamadas “áreas quentes”. Ou seja: se um grupo de componentes adjacentes possui alta correlação com um grupo de performances adjacentes, mas não com outras performances, então uma linha de pesquisa focada nesta combinação pode ser distinguida. Um exemplo é circulado na Figura 1 mostrando a Linha de Pesquisa de P&D intitulada "otimização estrutural da carroceria". Essa

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10o Congresso Brasileiro de Gestão da Inovação e Desenvolvimento de Produtos Itajubá - MG, 8 a 10 de setembro de 2015 derivação só pode ser feita considerando que uma linha (coluna) está colocada em adjacência com outra linha (coluna) com a qual está mais correlacionada (para ordenar as linhas e colunas utiliza-se a diagonal principal das matrizes PERFxPERF e COMPxCOMP). Uma premissa é que uma linha de pesquisa é melhor definida por uma combinação de componentes e performances, e não por qualquer dessas dimensões isoladamente. Assim, a matriz PERFxCOMP foi analisada visualmente pelo time de pesquisa a fim de identificar esses grupos de altas correlações. Como resultado, 16 linhas de P&D foram identificadas. Outras saídas secundárias da Etapa 1 são as análises prioritárias dos aspectos de PERF e COMP. Gráficos de radar com base nos valores de correlação (ou valores ponderados pelos pesos escolhidos) podem ser representados a fim de visualizar os aspectos mais importantes. Por exemplo, para cada performance, os componentes correspondentes mais importantes podem ser identificados (e vice-versa). 4.2. Etapa 2: Correlação de Linhas de Pesquisa de P&D versus Competências O resultado esperado da segunda etapa é uma matriz de correlação entre Linhas de P&D e Competências (LINPESQxCPT). Mais uma vez, cada linha de pesquisa é ponderada, bem como cada competência. Os passos dessa etapa se assemelham com os da etapa anterior. A construção da tabela de Linhas de P&D havia resultado da análise prioritária de PERFxCOMP da Etapa 1. Já a construção da tabela de competências concentrou-se sobre competências técnicas (não organizacionais) típicas de departamentos universitários de engenharia, uma vez que os gestores optaram iniciar uma cooperação com a Escola de Engenharia. Tais competências foram obtidas principalmente a partir de análise curricular dos cursos de engenharia das principais universidades do país. O terceiro passo, que correlacionou cada linha de pesquisa com as competências, foi feito separadamente por três respondentes com experiência em áreas ligadas à engenharia do produto. Em seguida, as respostas foram comparadas e discutidas em duas oficinas perfazendo um refinamento para se chegar aos valores finais. Em seguida, no quarto passo, designaram-se de pesos para as linhas de pesquisa. Aqui também três tipos de pesos foram alocados para cada linha: peso técnico, obtido pela média das linhas; peso da importância de mercado, que mostra o impacto da linha na legislação e consumidores; e peso da intenção de investimento, que foi feita pela classificação dos 3 entrevistados no passo anterior. O quinto passo (designação de pesos para as competências) foi feito de forma semelhante à ponderação dos componentes na Etapa 1. Uma vez que a matriz de correlação LINPESQxCPT é construída, os especialistas de cada competência na universidade puderam ser selecionados a participar de um Roadmapping

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10o Congresso Brasileiro de Gestão da Inovação e Desenvolvimento de Produtos Itajubá - MG, 8 a 10 de setembro de 2015 das possíveis pesquisas de P&D entregáveis ao longo do tempo. Neste ponto, todos os pesquisadores da Escola de Engenharia da universidade foram listados em um banco de dados e classificados segundo suas áreas de especialização, para então se partir para uma priorização dos contatos selecionados. Outras saídas secundárias da Etapa 2 são as análises de prioridade das linhas de pesquisa de P&D, para uma consequente priorização de competências, o que pode ser feito a partir dos pesos. A Figura 2 mostra um exemplo de uma lógica de planejamento tático de P&D, que pode ser derivado a partir destas comparações. Essas matrizes 2x2 sugerem quais as táticas de gestão da inovação deve-se adotar dependendo dos pesos da LINPESQ, considerada em termos das possibilidades exploradas de ponderação. Figura 2 - Possíveis lógicas para o planejamento tático de P&D

Fonte: Elaboração pelos próprios autores

4.3. Etapa 3: Roadmap de P&D orientado por experts Na fase final da metodologia, os experts selecionados na fase 2 auxiliam na construção de um Roadmap focado em resultados possíveis de P&D. Este roteiro foi montado com duas camadas principais: a de ambiente externo e a de Linhas de P&D. Inicialmente, um eixo de tempo tem de ser definido. No contexto desse estudo, o horizonte proposto foi de 9 anos, dividido em três faixas de tempo: 1-3; 4-6; e 7-9 anos. Estes intervalos correspondem a diferentes gerações de produtos a serem lançados pela empresa, uma vez que se leva 36 meses, em geral, para desenvolver e lançar um carro novo. Uma vez que o eixo do tempo é estabelecido, uma camada do Roadmap relacionada com o ambiente externo deve ser construída. Para isso, buscou-se por outras pesquisas de tendências do setor automotivo. Entre as opções coletadas, foi utilizado, principalmente, o estudo prospectivo da ABDI para o setor automobilístico (ABDI, 2009). O Ambiente Externo foi então desdobramento em 6 subcamadas – dimensões citadas do referido relatório: mercado, infraestrutura, meio ambiente, ambiente político, ambiente social, e tecnologia. Em

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10o Congresso Brasileiro de Gestão da Inovação e Desenvolvimento de Produtos Itajubá - MG, 8 a 10 de setembro de 2015 seguida, o gerente de inovação da empresa avaliou cada tendência apontada pelo estudo da ABDI para cada uma dessas subcamadas, utilizando uma escala Likert de 7 pontos: de 1 (discordo plenamente) a 7 (concordo plenamente). As tendências com pontos maiores na opinião do gerente foram colocadas no intervalo de tempo segundo a significatividade considerada para a indústria. Finalmente, a camada de linhas de P&D foi construída. Suas subcamadas são os itens da tabela de linhas de P&D, definidas no passo 1 da Etapa 2. Para preencher essas subcamadas, os especialistas universitários selecionados na Etapa 2 foram envolvidos e a camada de ambiente externo foi a eles exposta para os ajudarem no preenchimento. Isso pode ser feito por meio de workshops e entrevistas individuais com foco na expertise das linhas de P&D de cada pesquisador. No programa aqui descrito, essa segunda abordagem foi adotada de forma preponderante. Uma vez que o Roadmap de P&D orientado por experts é construído, a saída final esperada pode ser obtida: um portfólio inicial de projetos de P&D para iniciar uma cooperação universidade-empresa, sendo também o ponto de partida proposto para o início dessa cooperação. Um exemplo do aspecto visual deste Roadmap é mostrado na Figura 3. Figura 3 - Aspecto visual geral do Roadmap de P&D

Fonte: Elaboração pelos próprios autores

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10o Congresso Brasileiro de Gestão da Inovação e Desenvolvimento de Produtos Itajubá - MG, 8 a 10 de setembro de 2015 5. CONCLUSÃO Esse estudo focou no desafio de estabelecer uma metodologia para a construção de um portfólio inicial de projetos de P&D para iniciar uma cooperação universidade-empresa. Foi então proposta uma metodologia de 3 etapas que visa apoiar empresas e universidades de forma conjunta. Da condução deste trabalho emergem, pelo menos, dois prismas possíveis de análise: (i) uma visão operacional, centrada em como a metodologia foi construída, como deve ser aplicada e os insights que vieram da abordagem intervencionista com as equipes envolvidas; e (ii) a perspectiva gerencial, o que levanta a discussão sobre a cooperação universidade-empresa e outros tópicos relacionados com a gestão da inovação. Centrando-se no primeiro prisma, a proposta é resultado de um esforço para responder a um problema do mundo real. Seu modelo básico geral serve como referencial orientador, uma vez introduzidos ajustamentos, aperfeiçoamentos, ou extensões para se aplicar em outro caso particular. A restrição, no entanto, está em negócios relacionados com produtos de estrutura complexa (combinação de vários componentes e performances), e negócios de média-alta tecnologia, para os quais tendências científicas e tecnológicas tendem a demandar desenvolvimentos de longo prazo e são difíceis de manusear sem uma abordagem sistemática. Na discussão gerencial, este trabalho relaciona alguns desafios da cooperação universidade-empresa com os problemas relacionados com o processo de inovação tecnológica das empresas, integrando as perspectivas de gestão do portfólio de P&D e de inovação aberta. A forma como a metodologia de 3 estágios proposta parece costurar esses tópicos reforça a necessidade de se ver a gestão da inovação numa perspectiva sistêmica ao invés de se concentrar em pequenos pedaços do fenômeno organizacional (O'CONNOR, 2012). Assim, reforça-se a necessidade de que haja um aglutinamento das expertises em gestão da inovação na empresa para que funcionem de forma coordenada e lidem com métodos e técnicas gradativamente mais sofisticados e que proporcionem crescimento continuado das competências organizacionais em gestão da inovação tecnológica. REFERÊNCIAS ABDI. Estudo Prospectivo Setorial Automotivo: Relatório de Perspectivas. Brasília: Centro de Gestão e Estudos Estratégicos, 2009. 71p. ALCALDE HERAS, M.D.H. Building product diversification through contractual R&D agreements. R&D Management, v. 44, n. 4, p. 384-397, 2014. BAGNO, R. B.; SALERNO, M. S.; AMATO NETO, J.; SILVA, D. O. D. Innovation and technological competence building in brazilian automotive subsidiaries from the perspective of interorganizational networks. 20th International Gerpisa colloquium. Krakow: Gerpisa 2012.

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