Crianças sempre existiram?

July 27, 2017 | Autor: Taysa Schiocchet | Categoria: Adolescentes, Direitos Fundamentais e Direitos Humanos, Crianças
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Citação do existiram?. A 2009. Disponível

texto: SCHIOCCHET, T. Crianças sempre Notícia, Joinville, p. 9 9, 06 nov. em: https://unisinos.academia.edu/TaysaSchiocchet.

Bio: Pós-doutora pela UAM, Espanha. Doutora em Direito pela UFPR, com estudos doutorais na Université Paris I–Panthéon Sorbonne e na FLACSO, Buenos Aires. Professora do Programa de Pós-Graduação em Direito da Universidade do Vale do Rio dos Sinos (UNISINOS). Líder do Grupo de Pesquisa |BioTecJus| Estudos Avançados em Direito, Tecnociência e Biopolítica. Tem experiência na área de Direito e Bioética, com ênfase em Teoria do Direito e Direito Civil-Constitucional, atuando principalmente nos seguintes temas: direitos humanos, ética na pesquisa, biotecnologia genética, laicidade e estudos de gênero, criança e adolescente, antropologia e povos indígenas.

CV Lattes: http://lattes.cnpq.br/4551065746013148 E-mail: [email protected] Site: http://biotecjus.com.br/

Crianças sempre existiram? Por Taysa Schiocchet* Arnaldo Antunes anda dizendo que “todo mundo foi neném. Einstein, Freud e Platão também”. Que “todo mundo teve infância”. Inclusive que “Maomé já foi criança”. Entretanto, ainda que parcialmente, temos que discordar do compositor. Crianças e adolescentes nem sempre existiram! Ao menos não como os concebemos hoje: enquanto “sujeitos de direitos”. Tratar a infância e a adolescência em termos de invenção implica perceber que ambas são categorias construídas historicamente. O fato é que quanto mais se retroage na história, mais se percebe a indiferença ou mesmo a severidade em relação às pessoas com pouca idade. Para se ter ideia, em toda a antiguidade ocidental, nem mesmo o poder do tirano era tão grande quanto o poder do pai de família (pater familias), que tinha poder de vida e de morte sobre os filhos. Além disso, a prática de infanticídio era largamente aceita na sociedade helênica antiga. Os adultos não se apegavam às crianças. Consequência direta da demografia da época. O ponto de vista predominante era o de ter muitos filhos, na esperança de que alguns deles sobrevivessem. Em certos períodos da história, as crianças se transformavam em adultos aos sete anos de idade, quando já tinham aprendido a falar. Outro aspecto curiosíssimo é que nas pinturas anteriores ao século 16, as crianças não tinham traços infantis. Elas eram pintadas com roupas de adultos ou com os músculos peitorais, porém, em tamanho menor, ou seja, como adultos em miniatura. E agora, José? Bom, depois de toda essa digressão, algumas perguntas merecem ser feitas. Se analisarmos o cotidiano de muitas famílias brasileiras, será que esse pater soberano, com poderes tirânicos sobre os filhos, efetivamente deixou de existir? Em que medida, afinal, a sociedade contemporânea continua a desenhar as crianças e adolescentes como adultos na hora de assumir responsabilidades familiares e laborais, e como miniaturas na hora de reconhecê-los efetivamente como sujeitos de direitos e de desejos? Por outro lado (porém não menos perverso), em que medida a mesma sociedade contemporânea retira das crianças o status de sujeitos e as transforma em objetos de desejo consumista ao concretizar o projeto parental (de ter filhos), seja pela adoção, seja pelas técnicas de reprodução humana assistida, utilizando critérios exclusivamente individualistas, que beiram práticas egoístas e eugênicas, como ao escolher a cor de pele, dos olhos ou a idade? Mais importante do que encontrar respostas contundentes a essas perguntas, é refletir sobre nossas práticas familiares, as quais não são mais tão privadas diante da possibilidade de intervenção estatal; sobre nossas condutas individuais, coletivas e mesmo institucionais em relação às crianças e adolescentes; bem como sobre a implicação direta e necessária dessas ações na construção de uma sociedade mais equitativa e menos adultocêntrica. Ou não. Esses e outros temas serão discutidos no 2º Simpósio da Infância e Juventude de Joinville, que ocorre hoje, na Câmara de Vereadores.

*Mestre em direito (Unisinos), professora universitária, advogada, membro da Comissão da Infância e Juventude da OAB/Subseção Joinvill

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