Crime Organizado e Segurança Pública: Caso Específico de Moçambique Ernesto Raúl Timbe1
O
Presente artigo tem como tema Crime Organizado e Segurança Pública: Caso Específico de Moçambique e é abordado no contexto pós-guerra fria, onde por um lado encontramos o fim da guerra fria, que alargou o objecto de Estudos de Segurança
(ES) e é caracterizado por ameaças não militares e reforça a importância da segurança humana (política, económica, pública, societal e ambiental), e por outro lado encontramos a alteração dos promotores das ameaças à segurança pública, neste caso, antes do término da guerra fria, o Estado era considerado como principal ameaça à segurança pública, mas com o fim da guerra fria, o Estado deixou de ser visto como principal ameaça à segurança pública, passando também a se olhar para os actores não Estatais como principais ameaças à segurança pública (David, 2000:75). Portanto, é no contexto da emergência de actores não estatais e do alargamento do objecto de ES que se estuda o impacto do crime organizado para a segurança pública em Moçambique. O presente artigo tem como objectivos identificar os principais factores que contribuem para o crime organizado em Moçambique e por fim analisar o impacto do crime organizado para a segurança pública em Moçambique e está dividido em dois capítulos, a saber: o primeiro capítulo apresenta uma reflexão a cerca do crime organizado em Moçambique; o segundo e último capítulo debruça sobre o impacto do crime organizado para a segurança pública em Moçambique. Como resultado final deste trabalho, no fim são apresentadas algumas considerações finais em jeito de conclusão.
1
Ernesto Raúl Timbe, Licenciando em Relações Internacionais e Diplomacia no Instituto Superior de Relações Internacionais (ISRI) – Moçambique. Junho de 2016. E-mail:
[email protected]. 1
(Hampson)i citado por Williams (2008:232),
CAPÍTULO 1
a segurança pública pode ser entendida DEBATE SOBRE CRIME ORGANIZADO EM MOÇAMBIQUE
como
a
protecção
das
liberdades
fundamentais, proteger as pessoas das O presente capítulo focaliza dois pontos a
ameaças e da situação crítica, uso de
saber: reflexão sobre crime organizado em
processos que irão garantir nas pessoas as
Moçambique, neste subcapítulo também são
forças e aspirações, neste caso, criar um
apresentadas as principais características do
sistema
crime organizado em Moçambique e os
ambiental, militar e ambiental que possam
principais factores que contribuem para o
permitir com que as pessoas consigam
crime organizado em Moçambique.
garantir a sua sobrevivência. De salientar
1.1.Reflexão Sobre Crime Organizado em
político,
social,
económico,
que a segurança pública constitui um instrumento importante que contribui de
Moçambique
forma significativa para a manutenção de Antes de se fazer uma reflexão a cerca do
um ambiente político, social e prosperidade
crime
socioeconómica estável ao nível intra-
organizado
em
Moçambique,
é
imperioso dizer que crime organizado é um
estatal.
acto praticado por qualquer grupo que apresente alguma forma de estrutura com a principal finalidade de obtenção de lucro por meio de actividades ilegais e uso da violência
estrutural
ou
física
Borges
(2010:3). Por sua vez, Cressey (1969:72) defende que crime organizado é uma organização virada para a maximização dos lucros com a venda de bens ou a prática de actividades
ilícitas,
tendo
a
intenção
criminosa como o elemento definidor da sua
De
acordo
Educational,
a
Scientific
United
Nations
and
Cultural
(UNESCO)ii,
Organization
o
crime
organizado em Moçambique não constitui nada novo e historicamente realiza-se sob diferentes formas, mas no contexto da globalização, adquiriu dimensões chocantes e tornou-se mais complexo, multifacetado e envolve muitas partes de interesse a nível institucional e comercial, daí que para se compreender
estrutura.
com
o
crime
organizado
em
Moçambique, é necessário olhar para as Não obstante há necessidade de se definir a
transformações
segurança
Moçambique sofreu depois da guerra fria.
pública.
De
acordo
com
político-económicas
que
2
Segundo (Gastrow e Mosse)iii citados por
isto abriu espaço aos desempregados e aos
Borges (2010:2-3) só é possível falar de
demais desfavorecidos para que se refugiem
crime organizado em Moçambique depois
no sector da informalidade ou então
de 1986, quando o regime socialista entrava
enveredarem por condutas desviantes como
em colapso, pois no Estado socialista a
forma de se inserir na lógica mercantilista.
organização
policial
se
apresentava
devidamente equipada e combatia-se com veemência qualquer acção contrária a lei e qualquer possibilidade de acumulação de riquezas sem justa causa. No regime socialista,
o
Estado
centrava-se
num
planeamento centralizado orientado para a construção de uma sociedade livre das desigualdades
sociais
e
das
injustiças
baseadas na exploração do homem pelo homem. Porém a transição do regime socialista para o capitalista trouxe consigo uma série de modificações que para além de incidir sobre as privatizações de empresas estatais
também
gerou
mutações
no
comportamento criminal dos indivíduos em face da acentuação do desemprego motivado pela demissão massiva de trabalhadores desqualificados
que
pertenciam,
principalmente, ao sector industrial, razão pela qual os novos padrões de vida exigiam uma competitividade permanente entre os indivíduos na busca da autonomia individual financeira através de iniciativas orientadas para a sua inserção no contexto da sociedade regulada pelos mecanismos de mercado, e
Segundo Brown e Weimer (2010:28-29) e Paulino (2003:6-7), devido à sua geografia e contexto
de
governação,
Moçambique
presta-se à função de rota de trânsito de uma série de tráficos ilícitos que vão das drogas às armas e aos seres humanos. O grupo alvo no tráfico de seres humanos são as mulheres e crianças, e de acordo com alguns estudos feitos em 2010, as mulheres eram seduzidas com promessas falsas de empregos na África do Sul, acabando por ser vendidas e obrigadas a prostituir-se naquele país. Por mês eram traficadas cerca de 40 mulheres, cobrando aos recipientes cerca de 5000 Rands por pessoa. De salientar que os mesmos estudos feitos por Brown e Weimer (idem), indicam que o tráfico também incluía mulheres chinesas, transportadas voluntariamente
para
Moçambique
em
navios porta-contentores e cada chinesa custava cerca de 7.000 Rands. Ainda na mesma linhagem, actualmente o crime organizado também está relacionado com o tráfico e extracção de órgãos (que são usados pelos curandeiros e feiticeiros em troca
do
“suposto”
enriquecimento) 3
principalmente de seres humanos portadores
de caju já processada, como se fossem ração
de albinismo e acredita-se que os principais
para galinhas de aviário. Em 1997, 12
mercados estejam na Suazilândia e na África
toneladas de haxixe na posse de um
do Sul. De salientar que os protagonistas
empresário que anteriormente havia sido
têm são essencialmente familiares.
acusado e detido em conexão com outros casos de contrabando de haxixe para
Em
relação
ao
tráfico
de
drogas
Moçambique é uma das grandes rotas de trânsito de drogas. Para além de um abastecimento constante de mandrax, vindo da Índia e destinado principalmente ao mercado sul-africano, transitam também por Moçambique cannabis (e seus derivados), heroína
e
cocaína.
Estas
substâncias
destinam-se principalmente a fornecer a Europa, os carregamentos de cocaína vindos
América e Europa a partir do Porto de Nacala em recipientes onde a droga vinha disfarçada em pacotes de Chá, foram apreendidas em Quissanga, na província de Cabo Delgado. Noutro caso, descobriu-se uma moradia de um bairro residencial da cidade da Matola, concretamente no bairro Trevo, que se dedicava ao fabrico de comprimidos de uma substância conhecida como mandrxiv.
da América do Sul com destino à Europa também transitam cada vez mais por
Olhando para a apreensão de haxixe e o
Moçambique. Parte desta cocaína entra no
desmantelamento de uma fábrica de fabrico
país escondida nos corpos, mas a maior
de mandrax, pode-se observar que o crime
parte dos carregamentos é contrabandeada
organizado em Moçambique, tem tendência
por indivíduos com bons contactos, capazes
transnacionalista porque segundo Paulino
de remeter contentores cheios de drogas para
(ibid:8) os indivíduos da Colômbia, Chile,
Moçambique (Brown e Weimer, ibid:30).
Espanha e outros países da Europa que se dedicam ao tráfico de cocaína, usam
Na década de 1990 houve apreensão de 40 toneladas de haxixe no momento em que eram transportadas num enorme camião que circulava em plena cidade de Maputo. Aquelas 40 toneladas de haxixe, estavam devidamente embaladas em latas como as que são usadas para acondicionar a castanha
Moçambique como área de trânsito de droga para Europa e para outras regiões do mundo, e aparentemente os barões de droga têm os contactos políticos necessários para fazer com que as autoridades presentes finjam não ver o que está dentro destes contentores, como o que aconteceu em Junho de 2010, 4
quando a administração norte-americana
Nos aliando na perspectiva de Cumbi
denominou Momad Bashir como “chefe da
(2014:23), actualmente os mecanismo de
droga” e as autoridades moçambicanas
actuação dos actores do crime organizado
fingiram em como se nada soubessem
são
(Brown e Weimer, 2010:30-31) e (Paulino,
assassinato de algumas individualidades
2003:8).
ligadas ao sector da justiça, perseguição
os
sequestros
e carcere privado,
política e o crime cibernético. De acordo com Brown e Weimer (2010:2829), Moçambique também é visto como
Em relação aos sequestros e carcere privado,
ponto de trânsito de alguns indivíduos que
geralmente os actores do crime organizado
tem contacto com o terrorismo ou intenções
tem sequestrado alguns indivíduos com
fundamentalistas. A título de exemplo, sabe-
algum poder económico e de acordo com o
se que o Xeque Abdullah El-Faisal, clérigo
Ministério do Interior, de 2000 até então,
islâmico radical, natural da Jamaica, que foi
mais de 70 casos de sequestros foram
expulso do Quénia em Janeiro de 2010,
registados,
passou por Moçambique por estrada, a
sequestros de (Mail Abdul Latifo em 2010;
caminho do Quénia, numa tentativa de evitar
de Salim Mussa Judge, Bilal Wassim,
a detenção. O nome de El-Faisal faz parte de
Hamida Valy Adam, Hina Faruque, Ayob
uma lista de suspeitos terroristas que tiveram
Yacub Satar em 2012; de Rachid Takidir e
contacto com (e podem ter influenciado)
de um adolescente de 13 anos em 2013)v,
Germaine Lindsay, um dos terroristas que
mas infelizmente este último acabou sendo
atacaram Londres a 7 de Julho de 2005.
assassinadovi e de Momad Bashir em 2014vii.
Acredita-se ainda que ele tenha radicalizado Richard Reid, o malogrado “bombista do sapato” de 2001. El-Faisal também deve ter tido contacto ou ajudado a radicalizar o nigeriano Umar Farouk, que no dia de Natal, em 2009, tentou destruir um avião de passageiros norte-americanos em pleno voo, no Botswana, El-Faisal tentou estabelecer um campo de treino de terroristas e de radicalizar jovens nos arredores de Lobatse.
com
mais
destaque
nos
Em relação a assassinato de algumas individualidades ligadas ao sector da justiça, pode-se observar que os envolvidos na prática desses actos, tem como objectivo de avisar ou de transmitir de uma mensagem a outras individualidades ligadas a esse sector, aqui encontramos o exemplo de assassinato de Dinis Silica em 2014viii, Gilles Cistac em 2015ix e Marcelino Vilanculos em 2016x. 5
Em relação a perseguição política, pode-se
Lucros; Simbiose com o Estado; Divisão do
dizer
Trabalho;
que
os
praticantes
do
crime
organizado, geralmente tem perseguido
Violência
ou
Intimidação
e
Isolamento dos Líderes.
alguns membros seniores partidários e esses membros
são
intimidados
ou
a
1.2.1. Previsão de Lucros
sua
integridade física é posta em causa, aqui
Geralmente
podemos encontrar a tentativa de assassinato
organizado são sempre de soma zero (win-
do Secretario da Resistência Nacional de
lose) na medida em que, os envolvidos no
Moçambique, o Sr. Manuel Bissopo em
acto estão conscientes de que caso sejam
xi
2016 .
actividades
do
crime
apanhados serão responsabilizados, mas isso
E por fim em relação ao crime cibernético, há que antes de mais nada dizer que é o
é relativo e depende de circunstância para circunstância (Cumbi, ibid:13).
exemplo mais sofisticado que os grupos de crime
as
organizado
tem
usado
para
1.2.2. Simbiose com o Estado
a
realização das suas acções. Este tipo de
Nesta característica do crime organizado em
crime, constitui um conjunto de actividades
Moçambique, pode-se dizer que geralmente
relacionadas
de
as pessoas ou os envolvidos na prática de
computadores e meios informáticos para a
um determinado tipo de crime organizado,
realização de actividades ilegais através do
tem um vínculo com o Estado, mas preferem
recurso a meios informáticos. A título de
por em causa as leis do Estado onde se
exemplo, encontramos a falsificação de
encontram
várias identidades no facebook e de uma
conhecedores da lei, mas preferem agir de
forma atenta contra a segurança pública e
forma contrária as leis já estatuídas (Cumbi,
contra a segurança do Estadoxii.
idem).
com
a
utilização
1.2.Características do Crime Organizado em Moçambique
a
operar
neste
caso,
são
1.2.3. Divisão do Trabalho Geralmente
os
praticantes
do
De acordo com Borges (2010:3), o crime
organizado
são
conduzidos
por
organizado em Moçambique apresenta as
hierarquia, ou seja, cada membro de uma
seguintes
organização criminosa, presta contas ao seu
características:
Previsão
de
crime uma
superior hierárquico mais próximo e são 6
conduzidos por uma disciplina rígida no sentido de que quem não as segue corre o
1.3. Factores que Contribuem para o Crime Organizado em Moçambique
risco de ser afastado da organização para não
comprometer
os
objectivos
da
Para melhor explicar os factores que contribuem para o crime organizado em
organização (Cumbi, idem).
Moçambique,
pode-se
recorrer
às
características de um Estado fraco na
1.2.4. Violência ou Intimidação
perspectiva de Jacksonxiii. O Estado fraco Esta característica constitui o principal modus operandi e modus vivendi dos praticantes do crime organizado, na medida em que para conseguirem alcançar os seus objectivos recorrem à violência física ou estrutural, desafiando assim o poder do Estado de ser o único que detém o poder e monopólio de uso de recursos coercivos contra a sua população (Cumbi, idem).
apresenta uma coesão social e capacidade infra-estrutural fraca, não tem a capacidade de monopolizar os seus instrumentos de violência,
apresenta
fracas
instituições,
proliferação de armas, instabilidade política, centralização do poder, democracia não consolidada, crises económicas e economia fraca,
pobreza,
fome,
vulnerabilidade
externa, divisão social, fraca identidade nacional e nestas condições a probabilidade
1.2.5. Isolamento dos Líderes
do Estado fraco entrar em colapso e atrair o Esse tipo de característica é a que mais dor
crime organizado é maior pois os desafios
de cabeça dá aos órgãos competentes na
de segurança são maiores. Olhando para as
medida em que, os líderes do crime
características de um Estado fraco descritas
organizado a prior nunca são e identificados
acima, pode-se dizer que o crime organizado
e nem de fácil localização e um dos factores
em Moçambique tenderá a recrudescer cada
que contribuem para que isso aconteça, tem
vez mais porque Moçambique não dispõem
a ver com a falta do conhecimento por parte
de capacidade coerciva e de impor as suas
de
regras; não tem capacidade infra-estrutural,
outros
integrantes
do
grupo
da
localização dos seus líderes (Cumbi, idem).
legitimidade e efectivação das instituições do Estado e de as regrar através de consensos; há vulnerabilidade fronteiriça; dispõe de fraca vigilância e formação policial; equipamentos inadequados das 7
agências
de
administração
de
justiça;
corrupção na polícia e no poder judicial.
dinheiro para o Zimbabué, de refugiados vindos da Somália e da África Ocidental, vendas
Sem se distanciarem muito de Jackson, Brown e Weimer (ibid:30), dizem que
informais
transfronteiriças
de
combustíveis ao Malawi e a pesca ilícita no Lago Malawi.
Moçambique ocupa o lugar que ocupa no tráfico internacional de drogas, sequestros,
Segundo Brown e Weimer (idem), um outro
tráfico de seres humanos por causa da
factor que contribui para o crime organizado
fraqueza das suas instituições e do facto de
em Moçambique, tem a ver com o contexto
não ter capacidade para controlar as próprias
das transformações políticas e económicas
fronteiras. Estas inaptidões são também
que permitiram a transição do socialismo
exploradas pelos traficantes de pessoas,
para o capitalismo que trouxeram consigo
numa condição em que as fronteiras
algumas alterações na área de segurança
terrestres nacionais são longas e porosas,
pública, designadamente: o crescimento da
permitem um trânsito fácil e informal de
criminalidade, gerado pela desigualdade
pessoas e mercadorias. Algumas pessoas
social e, igualmente, a segurança tornou-se
procuram explorar a fraqueza das fronteiras
algo simbólico, pois a organização encontra-
e dos controlos de imigração e entrar na
se debilitada materialmente, o que não
África do Sul, enquanto que outras pessoas
permite um enfrentamento qualitativo não
que são provenientes da África Ocidental
somente
especialmente, utilizam Moçambique como
organizada, neste caso, a complexidade da
“plataforma de lançamento” para entrar na
infracção e os custos da investigação inibem
União Europeia (UE). Outras pessoas vêm
uma intervenção policial eficaz e eficiente
para Moçambique para iniciar vários tipos
perante o crime organizado.
em
relação
à
criminalidade
de actividades, desde a exploração mineira artesanal não regulada até ao comércio. As principais rotas de trânsito destas pessoas são
rotas
marítimas
directas
para
Moçambique, embora haja cada vez mais indivíduos que vêm de avião, com trânsito em Nairobi, no Quénia. A título de exemplo, temos a transferência de grandes quantias de
Portanto, as fragilidades materiais na área de segurança tornam Moçambique um local preferencial pelas organizações criminosas devido à certeza de impunidade e de um trânsito facilitado: As fracas estruturas estatais, resultantes das disrupções de economias em transição, contribuem para 8
um ambiente favorável a organizações
título de exemplo, é que devido à falta do
criminosas predatórias. Estruturas paralelas
controlo dos recursos coercivos e garantia de
em substituição das estruturas de segurança
protecção do Estado moçambicano aos seus
estatal
cidadãos,
dominam
essas
economias
e
o
crime
organizado
tem
prosperam através do medo e da intimidação
recrudescido e se consolidando cada vez
(UNESCO, 2006:12).
mais em Moçambique. Devido a falta do controlo e monopólio de instrumentos
CAPÍTULO 2
coercivos por parte do Estado, vários casos
IMPACTO DO CRIME ORGANIZADO PARA A SEGURANÇA PÚBLICA
de sequestros,
assassinatos,
tráfico de
pessoas e extracção de órgãos humanos, perseguição política têm sido noticiados
O presente capítulo tem como objectivo
com muita frequência (Cumbi, 2014:23).
identificar e explicar os principais impactos do crime organizado para a segurança
Em Moçambique o crime organizado é mais
pública em Moçambique.
ou menos constante e exerce um impacto
2.1. Impacto do Crime Organizado para a
sobre a paz e segurança pública, e
Segurança Pública em Moçambique
geralmente envolve cidadãos (muito) pobres que em condições normais não participariam
No que diz respeito ao impacto do crime
em nenhum tipo de crime, mas devido aos
organizado para a segurança pública em
problemas
Moçambique, pode-se dizer que as suas
xenofóbicos, aumento do custo de vida
acções recaem directamente na população,
acima de um nível que a população seja
pois verifica-se o aumento de insegurança
capaz de absorver sentem que não têm
no seio da população visto que a fraca
alternativa a não ser entrar no mundo do
capacidade do Estado em ter o monopólio e
crime organizado. Não obstante, o problema
controlar os recursos coercivos para fazer
de crime organizado reflecte problemas
face às ameaças internas, permite com que
sociais não resolvidos, mas também acaba
haja
detém
por exacerbar ainda mais os problemas
instrumentos coercivos e esses instrumentos
sociais já existentes enquanto cria outros
são usados por esses grupos para a prática de
efeitos nocivos. A violência por exemplo na
diversos tipos de crime em Moçambique no
Polana Caniço, Maxaquene, Magoanine é
geral e principalmente nas zonas urbanas. A
exemplo disso, há cada vez mais jovens,
grupos
organizados
que
económicos,
políticos,
9
grupos organizados, a se envolvem com
outros casos, o crime organizado também
crimes que tem a ver com o tráfico e
tem envolvido ajustes de contas como o que
consumo de drogas e como consequência, o
aconteceu quando um jovem empresário foi
tráfico e o consumo de drogas, provoca
morto por não ter honrado com os seus
problemas de saúde as populações, uma vez
compromissos financeiros com os senhores
que
toxicodependência,
do crime. Dias depois vários membros de
prostituição e sobretudo a degradação do
uma família foram mortos como represália
tecido social, (Cumbi, idem).
por parte da facção afecta ao empresário
aumenta
a
assassinado. De acordo com Brown e Weimer (2010:7) e Paulino (2003:11), tem se verificado muitos
Por fim outro impacto do crime organizado
casos de raptos de cidadãos moçambicanos,
para a segurança pública, é que o crime
ameaças de morte contra os agentes da
organizado envolve sindicatos de criminosos
polícia, investigadores e juízes que se
e inclui muitas vezes funcionários da polícia
revelam
que
e de outras agências de aplicação da lei. Os
tenham ao seu dispor processos que de
agentes do crime organizado conseguem
algum
corromper
incorruptiveis
e
íntegros
modo
contenham
e
comprometedoras
sensíveis
informações
funcionários
públicos
os
(incluindo o departamento da polícia),
senhores do crime organizado, além disso,
proporcionando um grande incentivo para os
há ainda ocorrência de crimes que tem a ver
indivíduos substituírem um sistema de
com ajuste de contas no seio do próprio
valores público pelo enriquecimento pessoal
crime
exemplo
e como resultado, a polícia (e outros
encontramos o assassinato de Siba-Siba
funcionários públicos) não cumprem a sua
Macuácua,
Alberto
função, ou seja, a promoção, protecção e
Nkutumula, Dinis Silica, Gilles Cistac. Não
garantia da ordem e tranquilidade pública, o
obstante, o chefe da alfândega moçambicana
que acaba colocando a população insegura e
foi assassinado no final de Abril de 2010,
com medo, (Brown e Weimer, 2010:35-36).
organizado.
Carlos
Como
Cardoso,
para
os
três horas depois de ter aparecido na media a fazer pronunciamentos sobre apreensão de três carros de luxo, pode-se aqui observar que o assassinato do chefe das alfandegas tinha como objectivo de silencia-lo em
Portanto, perante os cenários descritos acima pode-se dizer que o recrudescimento do crime organizado em Moçambique, está associado à busca de enriquecimento fácil 10
por
parte
dos
seus
praticantes
e
à
crescimento da criminalidade, gerado pela
participação de funcionários públicos e
desigualdade social e a segurança tornou-se
como consequência, há um sentimento de
debilitada.
insegurança e medo por parte da população e de algumas individualidades ligadas ao
Em relação ao impacto do crime organizado para a segurança pública em Moçambique
sector da justiça.
chegou-se a conclusão que as acções do crime organizado recaem directamente na
CONSIDERAÇÕES FINAIS
população, por um lado, verifica-se o Feita esta reflexão em torno do Crime Organizado
e
Segurança
Pública
em
Moçambique, chegou-se a conclusão que o crime
organizado
em
Moçambique,
é
influenciado pelas características que um Estado fraco apresenta e pelo contexto das transformações políticas e económicas. Em relação ao primeiro factor, é que devido a falta de capacidade e monopólio de uso de instrumentos
coercivos,
vulnerabilidade
fronteiriça e fraca capacidade institucional por parte do Estado moçambicano, a tendência do recrudescimento de crime organizado é maior porque outros actores não estatais, aparecem com instrumentos coercivos que são usados para intimidar as suas vitimas e devido a falta de capacidade por parte do Estado em controlar as fronteiras, acabam se aproveitando dessa inaptidão para o transito fácil. Em relação ao segundo factor, as transformações políticas e
aumento
de
insegurança
no
seio
da
população e por outro lado, o crime organizado tem envolvido cidadãos pobres que
a
vários
problemas
económicos,
políticos, sentem-se obrigados a entrar no mundo do crime organizado. Além disso, a insegurança advém pelo facto do tráfico e consumo
de
drogas,
provocar
efeitos
colaterais como a toxicodependência e degradação do tecido social. Um outro impacto do crime organizado, é que leva ao envolvimento no crime organizado, de alguns funcionários públicos e de outras agências de aplicação da lei, que são corrompidos
pelos
agentes
do
crime
organizado e como consequência do tal envolvimento, é a falta de protecção, promoção e a não garantia da ordem e tranquilidade
pública,
o
que
acaba
colocando a população insegura e com medo.
económicas depois da guerra fria, trouxeram consigo na área de segurança pública o 11
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Notas de Rodapé i
HAMPSON, Fen Osler, (2004), Can the UN still mediate? in Price and Zacher.
ii
Em Português significa Organização das Nações Unidas para a Educação, a Ciência e a Cultura
iii
GASTROW, Peter e MOSSE, Marcelo, (2002), Mozambique: Threats posed by the penetration of criminal
networks. ISS, Regional Seminar – Pretoria. iv
http://macua.blogs.com/moambique_para_todos/justia_polcia_tribunais/page/73/. Consultado em 14 de Maio de
2016. v
http://needhelpmoz.blogspot.com/2013/03/a-historia-de-raptos-sem-fim.html. Consultado em 14 de Maio de 2016.
vi
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Consultado em 14 de Maio de 2016. vii
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Idem
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