Da antropologia do consumo ao design de mobiliário: caracterização de consumidores da classe C

July 23, 2017 | Autor: Lílian Lago | Categoria: Etnografía, Comportamento Do Consumidor, Antropologia do Consumo, Design de Móveis
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Da antropologia do consumo ao design de mobiliário: caracterização de consumidores da classe C. From Anthropology of Consumption to furniture design: characterization of middleclass consumer. Violato, Nilson Carlos Stefani; Mestre em Educação; Universidade Estadual de Londrina [email protected] Hércule, Ísis Kelly de; Psicóloga; Faculdade Pitágoras [email protected] Lago, Lílian; Pós-graduada em Gestão Estratégica do Design; Universidade Estadual de Londrina [email protected] Hercule, Diogo de; Pós-graduado em Gestão Estratégica do Design; Universidade Estadual de Londrina [email protected] Bergamim, André Felipe; Graduando em Design Gráfico; Universidade Estadual de Londrina [email protected]

Resumo Este artigo apresenta o método utilizado na pesquisa sobre o consumidor de mobiliário da classe C realizada pela Rede SENAI de Design em 10 estados brasileiros. O método contou com as técnicas de Observatório de Sinais e Focus Group que permitiram a coleta dos dados e a posterior triagem destes sob o olhar da antropologia, da psicologia e do design. Como resultado, têm-se seis distintos perfis de públicos. A aplicação deste método baseado na etnografia vem somar os conhecimentos da antropologia do consumo ao design. Palavras Chave: antropologia do consumo; design do mobiliário; classe C; consumidor.

Abstract This paper presents the method used in a research about middle-class furniture consumer realized by Rede SENAI de Design in 10 Brazilian states. The method used the tools signs observatory e focus group that allowed data gather and after data classification from the perspective of anthropology, psychology and design. As a result, there are six distinct public profiles. The application of this method based on ethnography adds the knowlegde of anthropology of consumption in design. Keywords: anthropology of consumption; furniture design; middle-class; consumer.

Introdução Entender o processo de compra não é, necessariamente, uma tarefa fácil. Muitos aspectos estão envolvidos no que diz respeito a esta temática, tais como a necessidade de um móvel, o desejo de possuir determinado produto, a busca pela qualidade de vida - geralmente associada a algum objeto - entre outros motivos, que podem estar relacionados com fatores sociais, econômicos, culturais e até mesmo inconscientes - já que a motivação existente para efetuar a compra de determinada mercadoria pode ser desconhecida. Assim, contribuir para o entendimento dos motivos que levam alguém a realizar a aquisição de determinada mercadoria - e, consequentemente, conhecer o modo de vida dessas pessoas, fator que deve ser considerado pelas empresas ao desenvolver conceitos de produtos -, torna-se algo de extrema importância. Dessa forma, a presente pesquisa reuniu 104 participantes de diversos estados do Brasil em um estudo etnográfico, no qual foram utilizados como instrumentos de coleta de dados, as técnicas de observatório de sinais e de focus group. A partir dessas técnicas, foi possível identificar as características relevantes dos que contribuíram para este estudo. A presente pesquisa é um projeto da Rede SENAI de Design - Departamento Nacional, realizada em dez estados por doze técnicos, graduados e pós-graduados na área de Design. Após a coleta deste material, foi realizada uma triagem a partir de uma categorização de tais informações. No que se refere à análise, utilizou-se como leitura de dados o método do discurso imagético, seguido pela construção das palavras-chave que caracterizam os participantes. Na etapa seguinte, as características relevantes dos indivíduos foram agrupadas para formar os Perfis de Público que, ao serem conhecidos pelas empresas, podem ter suas necessidades e desejos satisfeitos, visto que há a possibilidade de produzir produtos compatíveis com o ideário dos clientes, o que resulta em satisfação na compra e motivação para as aquisições futuras.

Revisão de literatura A competitividade do mercado faz com que as empresas tentem atrair consumidores de diversas formas, principalmente no que diz respeito às promoções e à utilização de matérias-primas e processos produtivos mais baratos, porém, com a mesma qualidade - o que possibilita a fabricação e a venda de mercadorias com menor preço. Graças a essas características, as empresas podem manter-se atuantes e tentar atender às demandas do consumidor. Entretanto, mesmo sabendo que cabe ao consumidor tomar a decisão de adquirir ou não o produto, poucas empresas atentam para fatores relacionados ao ser humano, como, por exemplo, seus modos de vida, crenças, valores e costumes, entre outros aspectos que influenciam o indivíduo desde o desejo até a compra da mercadoria. A partir disso, deve-se atribuir atenção ao estudo sobre a antropologia do consumo, visto que, segundo Hall (apud TERRA, 2010), esta modalidade retrata uma abordagem antropológica dos domínios do consumo relativos ao espaço, e explicando o comportamento dos clientes. Embora possam passar despercebidos pelas empresas, fatores psicológicos também interferem na compra. Como estes são divergentes de pessoa para pessoa, segundo Guimarães (2001), enquanto alguns indivíduos efetuam suas compras em função do preço acessível, outros buscam por mercadorias que apresentam maior preço, podendo sentir a autoestima elevada ao realizar essa aquisição.

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Nesse sentido, é válido ressaltar que em meio a tantos fatores presentes na compra de determinado produto, existe a questão das representações sociais que, pelos estudos de Moscovici (apud Alexandre, 2000) podem ser entendidas como um posicionamento da consciência subjetiva no meio social, no qual os indivíduos constroem suas percepções1, através da interação com o meio. Diferente de muitas ciências, a antropologia abrange um vasto conhecimento sobre o homem, já que, ao considerar as representações sociais, tal ciência entende como verdade o conhecimento popular: o senso comum. Para Bergman e Luckman (apud Alexandre, 2000), este saber pode ser descrito como um conhecimento socialmente elaborado e compartilhado, constituído a partir das experiências do dia a dia, como também pelas informações e modelos de pensamento que são adquiridos e transmitidos através das ações das pessoas. Dessa forma, entende-se por verdade a percepção do entrevistado, pois, nas palavras de Alexandre, Independente de serem corretos ou equivocados, a construção de conhecimentos do senso comum, por parte dos indivíduos, constitui um processo gerador de ações sociais a partir de visões de mundo, concepções ideológicas e culturais que estão presentes nas relações sociais da vida cotidiana. (ALEXANDRE, 2000, p. 166)

Pensando nisso, através da utilização do método de pesquisa etnográfica2, proveniente na antropologia, a equipe de profissionais atentou para a descoberta do modo de vida das pessoas, considerando as representações sociais, as crenças, a cultura e os valores, entre outras características que, ao moldarem o universo do participante, possibilitam o entendimento de suas ações, no caso da pesquisa, relacionadas à compra. No que diz respeito aos valores, é válido destacar que estes não necessariamente estão relacionados com termos econômicos. Miller defende que A questão de valor é provavelmente uma das questões essenciais que vemos em termos de teoria. [...] Quando falamos em valor podemos falar em preço. O valor do microfone, da cadeira etc. Posso também falar do valor em termos de família, religião, qualquer coisa que não se reduza a preço, o oposto disso. (MILLER, 2006, p. 8)

Para criar valor e uma significante experiência do consumidor, é necessário um profundo entendimento do potencial do mesmo - o que eles procuram na categoria, suas necessidades e aspirações. Desenvolver e mapear personas (ou perfis de público) pode permitir às empresas identificar consumidores e suas prioridades no design. (PRAHALAD e SAWHNEY, 2010b). Na linguagem dos estudos de marketing e de design, uma persona representa um personagem fictício, criado para representar tipos de usuário e segmentos de mercado. “Uma persona incorpora as necessidades e aspirações dos consumidores que representa.” (PRAHALAD e SAWHNEY, 2010b, tradução nossa). No que diz respeito à construção de tais personas, foi utilizado um “olhar” da Psicologia, tendo como fundamento a teoria motivacional de Maslow, que formulou seus estudos com base na motivação. Nessa teoria, o ser humano busca a autorrealização ao 1

“[...] a percepção é considerada como a mediação entre o sujeito e o ambiente e esta é sempre cheia de significados [...]”. (Matos, 2004, p. 127) 2

De acordo com Spradley (1979 apud FINO, 2004), “[...] a etnografia deve ser entendida como a descrição de uma cultura, que pode ser a de um pequeno grupo tribal, numa terra exótica, ou a de uma turma de uma escola dos subúrbios, sendo a tarefa do investigador etnográfico compreender a maneira de viver do ponto de vista dos nativos da cultura em estudo.”

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atender suas necessidades, que são baseadas em dois agrupamentos: deficiência e crescimento. Para Huitt (apud GUIMARÃES, 2001), as necessidades de deficiência são: as fisiológicas, de segurança, de afeto e de estima, enquanto as necessidades de crescimento são as relacionadas com o autodesenvolvimento. Conforme Guimarães (2001), na abordagem de Maslow, o indivíduo deve ter suas necessidades mais básicas, como respiração, comida, água e sono satisfeitos, para somente assim, motivar-se para a satisfação de outras necessidades – que são apresentadas simbolicamente em uma pirâmide, configurando em escalas a busca pela satisfação das necessidades de segurança, amor, estima e por fim, a necessidade de realização pessoal – que seria o auge do desenvolvimento humano. Embora apresente complexidade, essa teoria vem sendo utilizada de forma simplista pelas empresas, visto que trabalhar com a Hierarquia das Necessidades ou Pirâmide Motivacional de Maslow implica em conhecer de fato o que isto significa. Frente a isso, Maslow alerta que: A liberdade para falar e agir como se deseja, desde que não se fira o direito alheio, liberdade de auto-expressar, de investigar e procurar informações, de se defender e buscar justiça, equidade e ordem dentro do grupo são exemplos de condições prévias para que sejam satisfeitas as necessidades fundamentais. (MASLOW apud BUENO e PEREZ, 2009, p. 2)

Nesse sentido, vale ressaltar que o fato de as empresas estudarem a teoria de Maslow sem conhecer realmente os desejos e necessidades das pessoas, pode gerar falhas na compreensão dos dados. Isso ocorre devido à falta de entendimento do universo do pesquisado por parte das empresas, que não atentam para o significado que o indivíduo atribui aos objetos. Assim, mais do que atender a uma necessidade, Guimarães (2001, p. 5) cita que a empresa deve buscar satisfazer o cliente, suas necessidades e seus desejos; ir além, de maneira a criar mais valor a ele. Isto porque a oferta de aspectos, tais como, entrega, manutenção, serviços agregados e atendimento de qualidade, entre outros, levará a empresa a satisfazer as necessidades dos clientes e isso criará condições que vão motivar os mesmos a efetuar a compra, já que a empresa estará criando um produto satisfatório por si só. Nota-se que ouvir/perceber o que o cliente tem a dizer sobre determinado produto, como foi notado no observatório de sinais e no focus group (caracterizado pelo trabalho fotoetnográfico3), torna-se primordial para a construção de produtos que apresentam valores para os indivíduos. Simone Terra (2010) explica que, no imaginário das pessoas, existe uma força que constitui valores imagéticos e simbólicos, fazendo com que os indivíduos associem sua preferência a uma marca que lhe traga orgulho, prazer, exclusividade e reconhecimento. Além de atentar para o comportamento do consumidor, devem-se considerar as questões econômica, cultural e social, como aspectos motivadores na compra, uma vez que, adquirir um objeto pode comunicar sinais e símbolos. Para Setubal e Carneiro, [...] os indivíduos utilizam os objetos como forma de transmitir uma mensagem aos seus grupos de referência, ora buscando se enquadrar e pertencer a um determinado 3

Boni e Moreschi (2007) apontam que, quando a fotografia é utilizada como meio de realização de um trabalho etnográfico, torna-se uma fotoetnografia, tendo como parâmetro de trabalho a linha da Antropologia Visual. A partir dela, o pesquisador tem a possibilidade de entrar em contato com diferentes etnias.

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grupo, ora com o objetivo de se diferenciar perante os demais. (SETUBAL e CARNEIRO, 2011, p. 217).

A partir daí, nota-se que a escolha do móvel não é feita somente em função de sua necessidade básica, e sim em função de julgamentos morais e valores que “[...] carregam significados sociais de grande importância, dizendo algo sobre o sujeito, sua família, sua cidade, sua rede de relações.” (SETUBAL e CARNEIRO, 2011, p. 223). Atentar para aspectos que não são facilmente observáveis faz-se necessário, pois somente desta maneira a empresa poderá atender aos seus clientes com mais precisão, proporcionando maior qualidade de vida, obtida inúmeras vezes através da aquisição do objeto desejado.

Método Para investigar os perfis de consumo, foram entrevistadas em torno de dez pessoas de cada uma das dez cidades participantes, sendo elas: Chapecó - SC, Cuiabá - MT, Curitiba PR, Feira de Santana - BA, Montes Claros - MG, Porto Velho - RO, Recife - PE, São Gonçalo - RJ, São José do Rio Preto - SP e Taguatinga - DF. As casas dos participantes também foram fotografadas. A partir da técnica de observatório de sinais, foi possível verificar seus costumes, desejos, preferências e hábitos. Para trabalhar com as fotos, a pesquisa foi baseada nos estudos de Roland Barthes, já que o autor relata que “[...] é bem verdade que a imagem não é o real, mas é, pelo menos, o seu analogon perfeito [...]” (BARTHES apud LIMA, p. 4). Desta forma, ao observar as imagens, manteve-se a atenção ao narrar os conteúdos existentes, atentando para não emitir julgamentos de valores, já que, os pesquisadores entraram em contato com o que há de mais verdadeiro na história de cada pesquisado. Dessa forma, ao realizar este estudo, observou-se além do comportamento dos participantes, a maneira como organizam suas casas, devido ao fato que, de acordo com Ruesch e Kees, O interior de uma residência revela as particularidades não-verbais de seus moradores. A escolha de materiais, a distribuição do espaço, o tipo de objetos a chamar a atenção ou a despertar o interesse de tocá-los em contraposição àqueles que intimidam ou repelem - têm muito a contar sobre a sensibilidade dessas pessoas. (RUESCH e KEES apud KNAPP e HALL, 1999)

Após os trabalhos com o observatório de sinais, realizou-se a técnica de focus group método de pesquisa qualitativa do campo da sociologia, atualmente utilizada por diversas áreas do conhecimento. Segundo Oliveira e Freitas (1998), as pessoas consideram determinada experiência se esta está próxima de sua realidade. Portanto, a utilização do focus group torna-se uma excelente opção para proporcionar ao indivíduo um ambiente no qual o mesmo relate seus pensamentos sobre uma situação específica de maneira espontânea, em interação com outras pessoas, tal como ocorre no meio social. Ainda conforme a concepção de Oliveira e Freitas, com a técnica do focus group: [...] Os participantes influenciam uns aos outros através de respostas às ideias e colocações durante a discussão, estimulados por comentários ou questões que são fornecidos pelo moderador (pesquisador ou outra pessoa). Os dados fundamentais produzidos por esta técnica são transcritos das discussões do grupo, acrescidos das anotações e reflexões do moderador e de outro(s) observador(es), caso exista(m). (OLIVEIRA e FREITAS, 1998, p. 3)

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A fim de constatar o pensamento dos indivíduos a respeito dos móveis e das questões envolvidas com o mobiliário, como motivação frente às compras, desejos e necessidades, entre outros, o focus group foi realizado e filmado nas mesmas 10 cidades que o observatório de sinais. Com este método, é possível retratar pensamentos, sentimentos e outras características implícitas, inerentes ao ser humano que, ao serem observadas, são interpretadas pautadas na Antropologia. Além disso, nesta pesquisa, nota-se um olhar da Psicologia e do Design, possibilitando a ampliação dos conhecimentos que ajudaram a construir este trabalho. Na sequência, para traçar os perfis, foram realizadas análises primárias e secundárias.

Figura 1: Construção do discurso narrativo

As análises primárias referem-se à triagem dos dados em termos de observatório de sinais e do material referente às entrevistas aos participantes realizadas pelos técnicos. Dessa forma, observou-se: Acolhimento, Distância (de Ambientes e de Pessoas), Religiosidade, Cores, Uso (armazenamento e organização), Produtos e Marcas, Tecnologia, Lazer/Cultura (música, arte, leitura), Roupas/Estilo e Estética. A partir dessas categorias, foram retratadas as evidências fortes, sendo a percepção do indivíduo a partir de sua cultura. As análises secundárias referem-se à triagem dos dados, ou seja, à filmagem de pessoas expostas em um ambiente laboratorial, com um facilitador incentivando a participação do público a partir da observação do focus group, dispostas em categorias como: Necessidades/ Desejos, Durabilidade, Resistência, Robustez, Valor Percebido, Segurança, Manutenção/Limpeza, Volume, Cor, Uso, Estética. Em relação aos serviços prestados pela loja, observaram-se Mídias, Serviço Agregado, Atendimento, Marcas. Para finalizar, foi observado: Preço percebido, Preço pago e Aprendizado obtido em relação à participação na

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pesquisa. Nesse sentido, foi realizada a qualificação das pessoas, sendo possível perceber como o indivíduo manifesta seus hábitos e costumes. Algumas dessas percepções relativas ao indivíduo e sua vivência foram retiradas da obra de Knapp e Hall (1999), outras foram pensadas pela equipe a partir de aspectos do cotidiano, embasando dessa forma a construção das personas através do discurso narrativo. Em seguida, a partir das análises primárias e secundárias, juntamente com o discurso imagético, a criação das palavras-chave e a descrição das características relevantes, foi possível pensar na construção dos perfis de público, ou seja, nas personas – termo muito utilizado no teatro, visando representar papéis, podendo ser pensado também na teoria Junguiana, uma das abordagens existentes na Psicologia. Na concepção de Silva (2010, p. 97), “[...] Jung define o conceito de persona como sendo a máscara social.” Dessa forma, cabe ao indivíduo exercer papéis, dependendo da exigência do meio no qual o mesmo está inserido. Reunidas algumas características similares entre os participantes, formaram-se seis personas – que, não foram nomeadas, já que o objetivo era possibilitar às empresas o exercício de criar produtos a partir do entendimento das características destas personagens, impossibilitando que as personas fossem qualificadas de maneira simplista, fato que limitaria o pensamento/criatividade por parte da empresa. Apesar das pessoas apresentarem características parecidas, respeitou-se a singularidade dos mesmos, já que em nenhum momento, o propósito da pesquisa foi rotular os participantes, mas sim reunir características semelhantes, proporcionando “categorias” de consumidores, tornando possível à empresa a percepção sobre o lugar no qual se encontra o desejo do consumidor.

Resultados Em relação à construção das personas, foi possível observar que alguns participantes transitaram entre as mesmas, já que atribuir um único lugar para determinadas pessoas tornase impossível devido à multiplicidade de desejos e sentimentos presentes no ser humano. Assim, tais personas foram sendo constituídas através da repetição das características presentes nos participantes. Dessa forma, quanto mais características uma pessoa tivesse da Persona 1, por exemplo, mais se distanciava das demais. Considerando estas questões, as personas foram retratadas com as respectivas características principais:  Persona 1: Idealizadora, sonhadora, com estilo de vida simples, influenciada pela mídia de massa.  Persona 2: Exerce a função materna, mesmo que de forma simbólica, prioriza o bem estar familiar, é tradicional, apresenta praticidade no dia a dia.  Persona 3: Apresenta estilo de vida contemporâneo, é consciente quanto a qualidade dos produtos, investe em cultura e educação.  Persona 4: É dinâmica, com bons relacionamentos interpessoais, vaidosa, muito consumista, necessitando de espaço.  Persona 5: É discreta, reservada, prioriza necessidades urgentes, podendo em função disso, adaptar alguns móveis e utensílios.  Persona 6: Caseira, não apresenta vaidades, tem preocupação com o presente, sua casa apresenta estilo eclético. Para facilitar a compreensão e visualização destes perfis, foi utilizado o mapa psicoestético, uma ferramenta de Prahalad e Sawhney (2010a):

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Mapas Psicoestéticos são formados pelos eixos X-Y onde o eixo vertical é representado pela emoção e o eixo horizontal é representado pela interatividade. A emoção e a interatividade combinam para formar a experiência. Para quantificar emoção, olhamos para a uma das primeiras teorias psicológicas expressa pela Hierarquia das Necessidades de Maslow. [...] O Mapa Psicoestético traduz a Hierarquia das Necessidades de Maslow na Hierarquia de Necessidade, Desejos, e Aspirações dos Consumidores, como mostrado na figura a seguir. (PRAHALAD e SAWHNEY, 2010a, tradução nossa)

Figura 2: Construção dos mapas psicoestéticos (baseado em PRAHALAD e SAWHNEY, 2010a)

Assim foram feitos mapas psicoestéticos do mobiliário existente no mercado quanto a quarto, sala e cozinha numa sinalização da representação que cada uma das seis personas expressa. As imagens foram retiradas de publicações, revistas especializadas, catálogos e sites de empresas moveleiras brasileiras de forma aleatória e atualizada.

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Figura 3: Mapa psicoestético do mobiliário de sala para a persona 2

Em relação ao consumidor e seu comportamento relacionado à compra, Salvi (2007) faz uma resenha crítica do clássico “Comportamento do Consumidor”, de Hawkins et al (2007). Na opinião do autor, quanto maior o envolvimento do indivíduo com o produto, “[...] maior a probabilidade dele prestar atenção ao estímulo” (SALVI, 2007, p. 146). Portanto, quanto mais o produto for reconhecido pelo consumidor trazendo a este a sensação de reconhecimento de si, maior será a probabilidade deste cliente adquirir o mesmo. Isso porque este bem material lhe trará mais do que o preenchimento de uma necessidade: será percebido como um produto que faz parte dele próprio. Em função disso é que se atribui importância a esta pesquisa, já que ao conhecer o desejo das pessoas, a empresa tem mais facilidade em criar produtos com os quais as mesmas se identifiquem.

Considerações finais As questões relativas ao comportamento do consumidor, ou ainda a antropologia do consumo ultrapassam explicações simplistas, tais como a necessidade em possuir determinado objeto. Para além desse aspecto sempre em pauta, existem vários fatores que interferem na escolha do produto e na decisão de compra - relacionados com desejos, sonhos, sentimento de pertencimento a grupos, reconhecimento de si mesmo no produto adquirido, entre outros motivos que dependem também do meio cultural, social, econômico, entre outros. Cabe às empresas voltar-se para o entendimento das questões que dizem respeito ao ser humano, atentando para o modo de vida dos mesmos, pois é sabido que o fato de produzir determinada mercadoria sem conhecer realmente os desejos, necessidades e motivações dos indivíduos não significa que este produto vai atender as expectativas do consumidor. E também, atentar-se a forma como este produto é comunicado ao seu público, utilizando-se de uma linguagem acessível e motivadora para o indivíduo.

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A partir disso, é necessário ressaltar que, em relação à pesquisa, muito além de proporcionar o entendimento das personas, buscou-se oferecer às empresas a possibilidade de atribuir um olhar diferenciado para o cliente, possibilitando a construção de móveis que agreguem valores aos compradores – que, muito mais do que simples clientes, apresentam-se como seres humanos. Nesse sentido, o objetivo não foi oferecer “fórmulas” prontas para “ensinar” às empresas a melhor maneira de se criar um móvel, mas sim, apresentar a possibilidade de reconhecer através do universo dos participantes da pesquisa suas necessidades e desejos. Para finalizar, é importante destacar que existe a necessidade de se aprofundar estudos na antropologia de consumo - um campo de saber promissor para o mercado. Em tempo, torna-se necessária ainda a constante atualização dos dados, visto que algumas escolhas realizadas pelos indivíduos, assim como algum valor, crença, pensamentos, entre outras características inerentes ao ser humano, podem mudar. Pois, se o homem é um ser formado através do meio em que vive e se este meio é sempre mutável, renovável, desconstruído e reconstruído, o indivíduo enquanto ser social também pode se modificar no que se refere a seu modo de se colocar no mundo e agir perante a vida, apresentando também modificações relativas às questões referentes à compra.

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