Dar valor ao Turismo Açoriano

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Dar valor ao Turismo Açoriano Félix Rodrigues Madalena do Pico, Ilha do Pico, Açores, 6 de Junho de 2015 A essência do que somos, a liberdade que temos de todos os dias poder olhar para o horizonte e não ver fronteiras, mas apenas a silhueta de outra ilha perto ou longe de nós, vê-la fisicamente real ou virtualmente próxima, faz desta Região Açores, o local das “ilhas encantadas”, um local que está no imaginário de qualquer europeu ou de qualquer residente no “Novo Mundo”. “Há muito tempo atrás, quando Portugal tinha um rei que se chamava João II, muitos marinheiros sonhavam com encontrar as Ilhas Encantadas do outro lado do mar. O sonho era tão bonito que acabaram por convencer o rei a permitir uma Expedição às Ilhas encantadas...”. Sonharam e encontraram. São estas, os Açores. E quem não acredita, é porque não as experimentou. Foi publicado, o mês passado, um estudo realizado à escala global, o segundo do mesmo género realizado a nível mundial, onde se procura perceber o que é que faz o homem feliz, ou o que é que ele considera ser importante para a sua felicidade. Em 1938, os valores considerados importantes para a felicidade do homem eram: a segurança, o conhecimento e a religião. Em 2015, esses valores alteraram-se, e passaram a ser: a segurança, o bom humor e o lazer. Valorizar o turismo açoriano é apostar nos valores que temos, que coincidem com aquilo que a maioria das pessoas procura na atualidade: Segurança, bom humor e lazer. Estamos num dos lugares mais seguros do mundo. Isso é muito importante para o turista. Somos muito bem-humorados e bem-dispostos, quando comparados com os ambientes stressantes das grandes cidades ou das grandes metrópoles. Temos locais fantásticos para lazer. Afinal estamos na crista da onda daquilo que o turista procura mas, não poderemos ter sucesso nessa área se descurarmos o conhecimento e o planeamento.

A paisagem é tudo o que se capta com um simples golpe de vista. Se a estratégia dos operadores turísticos for levar turistas ao cimo da Montanha do Pico, por exemplo, daí tem-se a sensação de ter visto toda a ilha do Pico, São Jorge e Faial. Não há estratégia mais errada do que esta para o turismo do triângulo. O turista passará apenas um ou dois dias nessas ilhas e fica com a sensação de já ter visto tudo. A subida à Montanha do Pico deve ser a última atividade a ser desenvolvida pelo turista nessa ilha, ou no triângulo (Faial, Pico e São Jorge). A “subida à Montanha” deve ser a cereja em cima do bolo. A subida à Montanha do Pico, deve ser condicionada, obrigatoriamente acompanhada, pelos riscos físicos que lhe estão subjacentes, especialmente quando não a conhecem como a palma da sua mão, e como em qualquer lado, paga. Dar valor ao turismo açoriano é ter uma estratégia política e uma participação pública adequada para daí tirarmos benefícios económicos dessa indústria, sem condicionarmos a liberdade de quem nos visita. Dar valor ao turismo açoriano, implica ter uma estratégica concertada entre agentes públicos e privados, pois só assim seremos capazes de criar emprego e garantirmos a sustentabilidade dessa indústria na Região. Dar valor ao turismo, implica ver a Região Açores como um todo, e cada ilha, como um órgão funcional e imprescindível para o seu funcionamento. Dar valor ao turismo, implica a aplicação de um modelo de transportes aéreos capaz de servir de modo equilibrado e equitativo todas as ilhas do Arquipélago, uma gestão eficaz dos serviços da transportadora aérea regional, abrir os aeroportos da Região para apoio ao imenso tráfego aéreo que cruza o nosso espaço aéreo, implica profissionalismo e uma visão holística da gestão integrada dos nossos espaços aéreo e marítimo. Temos um ambiente natural e cultural competitivo a nível regional, nacional e internacional. Temos competitividade a nível macro e microeconómico. As nossas vantagens comparativas deverão ser transformadas em vantagens competitivas, assumindo um modelo sustentável a nível arquipelágico mas também ao nível de ilha. Nesse contexto, temos nove destinos turísticos distintos, com capacidade de aumentar a taxa de retorno, se de cada ilha o turista sair com a melhor das impressões e satisfação das suas expectativas. Defende-se que a competitividade de um destino turístico implica uma política e estratégia assente na sustentabilidade. Neste momento não temos sustentabilidade turística, estando dependentes de uma sazonalidade que é assumida nos modelos de promoção turística da região. Na promoção, misturamos o que não deve ser misturado. Queremos que todas as ilhas sejam ricas, em vez de duas ou três que sustentam, sem necessidade, as outras. Não aceitamos o atual modelo de transportes aéreos de e para a região, que não serve a maioria das ilhas. Não queremos só uma ilha a tirar partido do

turismo, queremos que todas o façam, à sua medida e à sua escala. Queremos que todos contribuem para o desenvolvimento dos Açores quando tem capacidades para tal. A estratégia para o desenvolvimento turístico da região não passa forçosamente pelo preço das passagens aéreas ou das acessibilidades, mas também pela diversificação da oferta e por um híbrido entre o preço e a oferta. Numa estratégia de promoção bem-sucedida, há que ter em conta os clientes, os fornecedores de serviços, os nossos concorrentes e os complementos que podemos oferecer aos turistas que escolham um dos nossos destinos. Os nossos clientes não são o mundo inteiro, nem todos os nórdicos, nem todos os austríacos, nem todos os portugueses, nem todas as pessoas da terceira idade deste mundo. Os nossos clientes são aqueles que procuram e compram produtos específicos. Ninguém compra o destino Açores sem saber o que ele comporta. Ninguém compra um pacote turístico para passar uma semana numa qualquer ilha dos Açores, quando a única coisa que que lhe oferecemos é uma volta à ilha, que nalguns casos pode levar menos de uma hora. Uma volta à ilha é uma estratégia errada, quando temos tanto para oferecer em termos paisagísticos e culturais. É preciso formar melhor os nossos operadores turísticos. É preciso informar melhor as nossas gentes, daquilo que temos e daquilo que somos, bem como do caminho que pretendemos trilhar. Sob as asas do Anticiclone dos Açores existe um arquipélago de ilhas mágicas, as nossas, de verde único, com um esplendor natural singular, numa mistura heterogénea de cultura, património, biodiversidade, geodiversidade, mar, aventura, e até mesmo, de representações pictóricas do paraíso. Deixemo-nos de poesia e enfrentemos a realidade: -Não temos planeamento turístico. Há que fomentá-lo, fazê-lo e implementá-lo. O planeamento turístico constitui-se uma ferramenta fundamental, não só para o desenvolvimento económico, mas também para a salvaguarda dos nossos recursos naturais e histórico-culturais. É pelo planeamento turístico que se adquire uma maior eficácia e eficiência dos investimentos públicos e privados a efetuar na Região. A atividade turística nos Açores só terá peso económico se lhe for atribuída importância social e se for encarada como um fator de desenvolvimento regional, ilha a ilha. O Turismo nos Açores, enquanto somatório de recursos naturais do meio ambiente, culturais, sociais e económicos, de todas as ilhas do Arquipélago tem um enorme potencial. Se centrado numa ilha, corre o risco de transformá-la noutra Madeira. Os Açores não necessitam de ter uma “Madeira”, precisam de ser o que são: Ilhas com identidade.

Não somos eficientes na promoção turística. Há que pensá-la, enquadrá-la, profissionalizá-la e torná-la também eficiente em termos económicos, sociais e ambientais. A oferta turística é normalmente descrita como “um conjunto de recursos e características inerentes a um destino turístico”, onde se incluem as facilidades turísticas, as estruturas económico, sociais e políticas, a geografia e o ambiente, as infraestruturas e as acessibilidades internas. A nossa geografia é riquíssima e não corresponde a apenas uma área de 2,346 km². A Zona económica exclusiva dos Açores (ZEEA), subzona da ZEE nacional até às 200 milhas, compreende uma superfície de 948,439 Km2, ou seja, representa 55% da ZEE de Portugal e 16,3% da ZEE da União Europeia (UE-25). Se não contabilizarmos os departamentos ultramarinos da UE teremos cerca de 30% da ZEE da UE continental. Somos 9 ilhas com muito mar, e o mar, é um recurso turístico a explorar. Somos 9 ilhas, mas também 19 Concelhos, com muita cultura e identidade para oferecer. Se queremos geografia terrestre, somos 9 ilhas, mas centenas de destinos turísticos que vão desde os Ilhéus das Formigas ao Ilhéu de Monchique. Os pequenos ilhéus são oásis de terra no imenso mar. Veja-se se vale ou não vale a pena passar um dia no Ilhéu de Vila Franca? Vale ou não vale a pena passar meio-dia e emudecer com a brutalidade das escarpas do ilhéu das Cabras? Vale ou não vale a pena perceber a referência cultural que se constitui para o triângulo os dois enormes pedregulhos que formam os ilhéus da Madalena “O sentado e o em Pé”, entre tantos outros exemplos que aqui poderiam ser referidos? A nossa geografia vai do micro ao macro. Se a olharmos pequena, pequena será. O nosso ambiente vai da Montanha do Pico, o ponto mais alto de Portugal, à Fossa do Hirondele, o ponto mais baixo de Portugal. Vai das Jazidas de Fósseis de Santa Maria, o local mais antigo dos Açores, ao Vulcão dos Capelinhos, a formação vulcânica mais recente dos Açores. Se alguém quiser ver uma ilha a nascer, não é nem na Terceira nem em São Miguel, é exatamente a meio: No Banco D. João de Castro. Com tanto ambiente que nos une, por que razão hão de existir, políticas que nos separam? O que nos separa, são as acessibilidades internas, como o modelo agora implementado, e que no caso do turismo se traduz em deficientes promoções da imagem da Região, do marketing e da informação. As acessibilidades internas e o turismo interno, são económica, social e ambientalmente desejáveis. São as acessibilidades internas que proporcionam a todos os açorianos igual

oportunidade de apropriação dos espaços e dos ambientes, e se constitui um direito inalienável dos portugueses que vivem neste sector do Atlântico. O planeamento turístico deve procurar interrelacionar todas as componentes da oferta turística: atrações, transportes, informação, promoção e serviços. Há que promover o aparecimento de organizações turísticas regionais, sem serem tuteladas pelo Governo e que, de forma espontânea, consigam a concretização de objetivos regionais e locais. Este tipo de organização turística, semelhante ao que acontece nos modelos das grandes regiões turísticas, garante a inovação, a procura de mercado e a assertividade de decisões para uma Região, que não sendo uma região única e homogénea, se constitui, tal como se refere na bibliografia científica da especialidade: “…num espaço heterogéneo de dimensão acrescida, de maior diversidade, o que permite a formatação da oferta de um produto compósito, caracterizado pela complementaridade dos recursos turísticos. É do carácter compósito destas áreas turísticas, que são formadas unidades espaciais de menor dimensão, com especificidades e identidades próprias, mas que em estreita articulação poderão gerar novas dinâmicas turísticas, e que, deste modo, permitem, uma melhor adequação às necessidades de uma procura sempre em mutação. Em suma, obtém-se dimensão, mas, fundamentalmente, ganha-se eficácia na máquina administrativa do sector.” Não avaliamos sinergias entre ilhas: Há que estudá-las, encontrá-las e operacionalizálas. Não pensamos em sectores, há que elencá-los e estudá-los. O investimento no turismo, não é só marketing e imagem, também é promoção do conhecimento. Há que criar aumento do interesse pela região usando a nossa biodiversidade. A pesca desportiva e o mergulho não se devem ficar apenas pelo seu potencial. O Banco D. João de Castro, os Campos hidrotermais “Lucky Strike” e “Menez Gwen”, as fontes hidrotermais “Ewan”, “Seapress” e “Bubbylon” servem para muito mais do que simples curiosidades científicas. O Património da Humanidade das vinhas do Pico e de Angra do Heroísmo bem como as Reservas da biosfera das Flores, Corvo, Graciosa e futuramente das Fajãs de São Jorge, têm que servir para alguma coisa, Numa Região como a nossa, com um forte sector agropecuário, o Agroturismo encaixase-lhe como uma luva. O Agroturismo é uma das modalidades de turismo que se desenvolve no meio rural promovido por famílias de agricultores que estão dispostas a compartilhar seu modo de

vida com pessoas oriundas do meio urbano. Nos tempos recentes, o mundo sofreu uma reviravolta e deixou de ser maioritariamente rural para passar a ser maioritariamente urbano. Assim sendo, a maioria da população mundial pode ser cliente de empresas de Agroturismo. Os Açores têm um grande potencial neste ramo turístico: temos meios de produção singulares, paisagens inigualáveis, animais afáveis, famílias hospitaleiras, entre muitas outras qualidades que poderiam ser aqui enunciadas. O cliente do Agroturismo não está interessado em pagar para trabalhar numa exploração agrícola, interessa-lhe sim conhecer o modo de vida de uma comunidade, a sua cultura, a qualidade organolética e ambiental dos produtos das explorações de um determinado local, a que se lhe associa o contacto com a natureza e a aquisição de conhecimentos sobre o funcionamento dos sistemas de produção e dos ecossistemas. Necessita, tal como todo o turista, de um plano de atividades, variado e rico. Neste contexto, o agroturismo nos Açores só se poderá tornar uma realidade se soubermos trabalhar em conjunto, com uma rede bem montada com diferentes produtos agroturísticos, onde todos terão forçosamente que ganhar. O agroturismo poderá constituir-se um excelente complemento económico às atividades dos agricultores, mas para isso, o agricultor não terá que ser simultaneamente agricultor e guia turístico, terá que saber acolher, saber explicar o que faz e saber quando deve levar o turista a outros que sejam capazes de lhes mostrar outros modos de produção, outras formas de socialização, outras formas de tornar inesquecível a experiência agroturística na Região. Sem uma boa coordenação, capacidade de diálogo e associação com outros agricultores e empresários do ramo turístico, por sua vez integrando redes nacionais e internacionais, desligadas por completo de apoios públicos, o agroturismo nos Açores não tem potencial. Teremos mini-experiências de agroturismo. As redes e associações de agricultores que pretendam desenvolver o agroturismo, entre as diversas ilhas dos Açores, constitui o nosso ponto forte na área, pois cada ilha, tem realidades culturais diferentes e especificidades produtivas diferentes. A oportunidade de um turista conhecer duas ou três ilhas numa experiência desta natureza, é em termos psicológicos, muito mais vantajosa do que conhecer uma só, mas para isso é preciso dar-se o primeiro passo e perceber: Quem são os nossos clientes e como nos temos que organizar em pequenos grupos de agricultores, de forma espontânea, que se complementem uns aos outros, para tornar o agroturismo uma verdadeira indústria na Região. Temos que começar praticamente do nada, com trabalho e sem grandes investimentos, com vista a alcançar nesse ramo um lugar ao sol. Dar valor ao turismo nos Açores, é no nosso entender, valorizar as pessoas, valorizar a participação pública nas decisões, valorizar tudo aquilo que fazemos.

Dar valor às pessoas é ter uma política de chamar todos e cada um a participar no desenvolvimento do setor com naturalidade, com planeamento, com inclusão. O Futuro está nas nossas mãos, bem como o turismo, que é feito de pessoas e com pessoas que querem ser felizes.

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