DE VOLTA PARA O FUTURO: O Brasil de Dilma Rousseff entre a Rússia e os Estados Unidos
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DE VOLTA PARA O FUTURO: O BRASIL DE DILMA ROUSSEF ENTRE A RÚSSIA E OS ESTADOS UNIDOS Carlos Frederico Pereira da Silva Gama1
Após uma visita de negócios aos Estados Unidos de Barack Obama, a Presidenta Dilma Rousseff se encaminhou para a Rússia, onde o anfitrião Vladimir Putin presidiu, em Ufa, a sétima cúpula dos BRICS. Das especulações pré-cúpula, a maior delas não se concretizou. A Grécia (recém-saída do referendo no qual o governo do Syriza foi vitorioso) não marcou presença na reunião, possibilidade alimentada por semanas pela imprensa russa. A acolhida do país europeu no Novo Banco de Desenvolvimento (o Banco dos BRICS) também foi adiada sine die. Algo que já era esperado – o silêncio de Brasil, Índia, China e África do Sul frente à anexação da Criméia ucraniana pela Rússia – veio, mas ofuscado por notícias ainda piores. O sinal de que a Grécia não era mais bem-vinda foi o mesmo que deu a tônica da cúpula dos BRICS. Os emergentes se reuniram sob o signo da crise econômica. Dois deles (Brasil e Rússia), com crescimento negativo do PIB em 2015. As más notícias chegaram mais cedo a Ufa, graças à megadesvalorização das bolsas chinesas, cujas ações perderam em média 1/3 de seu valor de mercado no último mês2. A possibilidade da locomotiva chinesa em desaceleração levar a um descarrilamento da economia mundial transformou a reunião dos BRICS num gabinete de crise improvisado. A implementação do Banco dos BRICS e do Fundo de Reservas anti-crises (100 bilhões de dólares) se tornaram prioridades absolutas. A declaração da Cúpula da Crise3 deixou inquietação no ar, com mais perguntas do que respostas. Avessa a viagens oficiais, Dilma preferiria estar em outros lugares, a fim de evitar o protocolo. O timing da crise era o mais inadequado possível. Se pudesse, a Presidenta embarcaria no DeLorean de Michael J. Fox e Christopher Lloyd na famosa série de filmes De Volta para o Futuro4. Dilma poderia voltar a 2009, quando mal havia sido escolhida para suceder Luiz Inácio Lula da Silva na Presidência do Brasil. Em 2009, a então ministra Rousseff veria um cenário bem diferente na triangulação EUA-Brasil-Rússia. Pouco depois da Rússia de Putin invadir a vizinha Geórgia (para “proteger” minorias russas nas províncias da Ossétia do Sul e Abkházia), Obama cumprimentou Lula de forma bombástica numa reunião do G-20: “That’s my man! The most popular politician on Earth!5”. O entusiasmo de Obama por Lula era justificado pela crise econômica de 2008. Ambos implementaram programas de reforma econômica que tiraram seus países do atoleiro de PIBs negativos. Lula encerrou seu mandato com crescimento de 7.5%. Obama (Prêmio Nobel da Paz no primeiro ano de governo) foi reeleito graças à recuperação econômica. O relacionamento bilateral andava de vento em popa. Antes da crise, o comércio bilateral atingiu a cifra recorde de 55 bilhões anuais (os EUA eram os maiores parceiros
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Professor de Relações Internacionais da Universidade Federal do Tocantins e pesquisador voluntário do BRICS Policy Center 2 http://g1.globo.com/economia/mercados/noticia/2015/07/bolsas-da-china-tem-forte-queda-e-arrastammercados-entenda.html 3 http://www.itamaraty.gov.br/index.php?option=com_content&view=article&id=10465:vii-cupula-do-bricsdeclaracao-de-ufa-ufa-russia-9-de-julho-de-2015&catid=42:notas&lang=pt-BR&Itemid=280 4 http://globotv.globo.com/globo-news/jornal-globo-news/t/todos-os-videos/v/de-volta-para-o-futurocompleta-30-anos-de-estreia/4312500/ 5 http://www.newsweek.com/brazils-lula-most-popular-politician-earth-79355
comerciais do Brasil6). E mesmo um crítico confesso das políticas externas de alinhamento – o chanceler Celso Amorim – era elogiado na América do Norte: “o melhor ministro de relações exteriores do mundo”7. Amorim e o chanceler russo Serguei Lavrov foram os grandes promotores das reuniões dos BRICS. De início em caráter informal, durante reuniões anuais da Assembleia-Geral da ONU em Nova York. Em seguida, os BRICS oficializaram seus encontros. A primeira cúpula foi em Ekaterimburgo, Rússia, justamente em 2009. No ano em que Lula visitou Nova York e Ekaterimburgo, o Brasil parecia fazer parte dos países do futuro. Dilma gostaria de voltar a 2009. Uma grande diferença em relação a 2015 é o sumiço da Presidenta na fala do Presidente Obama8. Ao contrário de Lula, Dilma não é considerada uma liderança mundial capaz de mobilizar corações e mentes para a importância crescente do Brasil. A possibilidade do Brasil oferecer novas ideias no plano global se torna mais difícil com essa perda de poder suave (soft power). Algo preocupante em 2015, quando expiram as metas do milênio e a ONU discutirá novos objetivos globais de desenvolvimento. A COP-21 na França, no fim do ano, buscará criar um novo marco global de sustentabilidade ambiental. Desafios nas áreas de saúde global e a ameaça crescente do “estado islâmico” no Oriente Médio também oferecem oportunidades para os principais países emergentes. O perfil baixo e pragmático da Presidenta não faz sombra ao carisma de Obama. Por outro lado, discrição e pragmatismo (além de dificuldades políticas domésticas) facilitaram a assinatura de 31 acordos entre Brasil e EUA9. Dilma buscou desde o início de seu mandato manter as boas relações com os EUA herdadas de Lula. Seus chanceleres (Antônio Patriota, Luiz Alberto Figueiredo e Mauro Vieira) tiveram longas passagens por Washington. E ao contrário de Amorim (deslocado para o Ministério da Defesa), não nutriam resistências prévias à cooperação. Sucessor de si próprio, Obama teve calorosa recepção em visita ao Brasil em 2011, ano inicial do governo Dilma. Tais acordos refletem a ampla gama de interesses sobrepostos dos dois gigantes das Américas. Vão desde a liberação da exportação de carne bovina brasileira para o mercado dos EUA10 (negociada pela ministra da Agricultura Kátia Abreu) até um acordo de cooperação militar11, o primeiro desde o governo do general Geisel na ditadura, em 1976 – impulsionado pela MINUSTAH. É interessante comparar a disposição do governo Dilma em ampliar laços militares com os EUA apenas 4 anos após o então chanceler Patriota ter proposto o conceito de “responsabilidade ao proteger”12 como crítica da intervenção da OTAN na Líbia durante a Primavera Árabe. Tal acordo seria impensável nos anos Amorim (hoje fora do governo Dilma).
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http://www.itamaraty.gov.br/temas/temas-politicos-e-relacoes-bilaterais/america-do-norte/estadosunidos/pdf 7 http://foreignpolicy.com/2009/10/07/the-worlds-best-foreign-minister/ 8 https://www.whitehouse.gov/the-press-office/2015/06/30/joint-communique-president-barack-obamaand-president-dilma-rousseff 9 http://www2.planalto.gov.br/noticias/2015/06/conheca-os-acordos-firmados-por-dilma-rousseff-e-barackobama-nos-estados-unidos 10 http://www.valor.com.br/agro/4096902/apos-eua-katia-abreu-fala-em-abrir-japao-carne-bovina-do-brasil 11 http://tecnodefesa.com.br/brasil-e-estados-unidos-vao-desenvolver-projeto-na-area-de-defesa/ 12 http://www1.folha.uol.com.br/fsp/opiniao/11620-a-responsabilidade-de-dilma.shtml
Também merecem destaque a adesão do Brasil à moldura minilateral acordada por EUA e China para reduzir emissões de poluentes e preservar florestas entre 2025 e 203013 (o Brasil é um dos primeiros países a apoiar a polêmica proposta, que se afasta de parâmetros e responsabilidades multilaterais como os do Protocolo de Quioto) e tratativas para facilitar a vida dos muitos imigrantes e turistas de Brasil e EUA. Mesmo que sejam em certa medida previsíveis, os acordos marcaram a reaproximação de Dilma com Obama, após as feridas abertas pelo escândalo de espionagem denunciado por Edward Snowden em 2013. Se o DeLorean tivesse energia para visitar 2013, Dilma relembraria um momento decisivo de seu primeiro governo. Contestada nas ruas e com popularidade despencando em meio aos preparativos para a Copa do Mundo, a Presidenta reagiu com firmeza e empreendedorismo às denúncias de que Obama teve acesso a seu e-mail pessoal e seus telefonemas. Cancelou visita prevista aos EUA (a primeira visita presidencial desde 1995) e foi à Assembleia-Geral da ONU. Em discurso memorável, acusou veladamente o anfitrião Obama de praticar espionagem eletrônica e propôs a regulação multilateral da Internet como promoção dos direitos humanos14 – novidade normativa que já rende, em 2015, seus primeiros frutos. Dilma também acharia os ares de 2013 mais aprazíveis e inovadores. Outra mudança importante em relação a 2015 ocorreu na relação Brasil-Rússia. Ao contrário do que ocorreu na invasão à Geórgia, Putin espera maior “solidariedade” de Dilma na ressaca pós-Criméia – algo que o Brasil não pode oferecer, tendo a integridade territorial dos estados como um dos mais antigos e consolidados princípios de sua política externa. O desconforto de Dilma com as pressões russas foi sentido na ausência de acordos no último encontro dos BRICS (para além de declarações de intenções). Economicamente, o Brasil e a Rússia estão em situação mais complexa que em 2009. A Rússia já afundava rumo ao abismo pós-crise, com grande queda do PIB. Mas o Brasil crescia e se recuperava vigorosamente. Isso colocava o Brasil como alternativa interessante, caso a Rússia demorasse para se recuperar (o país não estava sob o efeito de sanções europeias e dos EUA). O Brasil era tido como uma alternativa segura – mesmo próximo da União Europeia e EUA, estava crescendo e buscava manter boas relações com todos. Em 2015 tanto a economia brasileira quanto a economia russa vão terminar o ano menores do que em 2014 (possivelmente, ainda menores do que em 2013). Após a Criméia, a Rússia foi alvo de sanções da UE e EUA. Os BRICS aumentaram rapidamente suas exportações para o país. De plano B dos sonhos da Rússia, o Brasil passou a fazer parte de um grupo incômodo de países do plano A – junto a China e Índia. Maior proximidade, na visão de Putin, implica maior compromisso “estratégico”. O Brasil, recentemente, abriu mão de cooperação na área aeroespacial com a Ucrânia (sem que houvesse uma “contrapartida” russa). Mas a notícia de que o Brasil (assim como a Índia) intensificará suas relações militares com Washington desagradou o mandatário do Kremlin, em processo acelerado de deterioração de suas relações com a UE e com os membros da OTAN. Isso torna o Brasil ao mesmo tempo indesejável e indispensável para Moscou. A viagem no tempo pouparia Dilma dos dissabores do presente e oferece lições para um futuro incerto. O Brasil de Dilma está novamente próximo dos EUA de Obama – mas comparativamente menor que em
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http://www.itamaraty.gov.br/index.php?option=com_content&view=article&id=10386:declaracaoconjunta-brasil-estados-unidos-sobre-mudanca-do-clima-washington-d-c-30-de-junho-de2015&catid=42:notas&lang=pt-BR&Itemid=280 14 http://g1.globo.com/mundo/noticia/2013/09/dilma-diz-na-onu-que-espionagem-fere-soberania-e-direitointernacional.html
2009. Em relação à Rússia o Brasil ficou maior – colocando Dilma numa incomoda proximidade com um Putin cada vez mais nostálgico do discurso da Guerra Fria. Em desacordo com posicionamentos fixos e indesejáveis, em busca de ampliar suas relações em todas as frentes possíveis, o pragmatismo da política externa brasileira implica lidar com contradições surgidas nas relações com colegas de continente e de BRICS – sem poder escolher uma única destinação.
13/07/2015
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13/07/2015 09h35
Artigo: De volta para o futuro - O Brasil de Dilma Rousseff entre a Rússia e os EUA Carlos Frederico Pereira da Silva Gama* Após uma visita de negócios aos Estados Unidos, de Barack Obama, a presidenta Dilma Rousseff se encaminhou para a Rússia, onde o anfitrião Vladimir Putin presidiu, em Ufá, a sétima cúpula dos BRICS.
Das especulações pré-cúpula, a maior delas não se concretizou. A Grécia (recém-saída do referendo no qual o governo do Syriza foi vitorioso) não marcou presença na reunião, possibilidade alimentada por semanas pela imprensa russa. A acolhida do país europeu no Novo Banco de Desenvolvimento (o Banco dos BRICS) também foi adiada sine die. Algo que já era esperado - o silêncio de Brasil, Índia, China e África do Sul frente à anexação da Crimeia ucraniana pela Rússia - veio, mas foi ofuscado por notícias ainda piores. O sinal de que a Grécia não era mais bem-vinda foi o mesmo que deu a tônica da cúpula dos BRICS. Os emergentes se reuniram sob o signo da crise econômica. Dois deles (Brasil e Rússia), com crescimento negativo do PIB em 2015. As más notícias chegaram mais cedo à Ufá, graças à megadesvalorização das bolsas chinesas, cujas ações perderam em média 1/3 de seu valor de mercado no último mês. A possibilidade da locomotiva chinesa em desaceleração levar a um descarrilamento da economia mundial transformou a reunião dos BRICS num gabinete de crise improvisado. A implementação do Banco dos BRICS e do Fundo de Reservas anti-crises (100 bilhões de dólares) se tornaram prioridades absolutas. A declaração da Cúpula da Crise deixou inquietação no ar, com mais perguntas do que respostas. Avessa a viagens oficiais, Dilma preferiria estar em outros lugares, a fim de evitar o protocolo. O
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timing da crise era o mais inadequado possível. Se pudesse, a presidenta embarcaria no DeLorean de Michael J. Fox e Christopher Lloyd na famosa série de filmes "De Volta para o Futuro". Dilma poderia voltar a 2009, quando mal havia sido escolhida para suceder Luiz Inácio Lula da Silva na Presidência do Brasil. Em 2009, a então ministra Rousseff veria um cenário bem diferente na triangulação EUA-BrasilRússia. Pouco depois da Rússia, de Putin, invadir a vizinha Geórgia (para "proteger" minorias russas nas províncias da Ossétia do Sul e Abkházia), Obama cumprimentou Lula de forma bombástica numa reunião do G-20: "That’s my man! The most popular politician on Earth!" [Este é o cara! O mais popular político na Terra!]. O entusiasmo de Obama por Lula era justificado pela crise econômica de 2008. Ambos implementaram programas de reforma econômica que tiraram seus países do atoleiro de PIBs negativos. Lula encerrou seu mandato com crescimento de 7,5%. Obama (Prêmio Nobel da Paz no primeiro ano de governo) foi reeleito graças à recuperação econômica. O relacionamento bilateral andava de vento em popa. Antes da crise, o comércio bilateral atingiu a cifra recorde de 55 bilhões anuais (os EUA eram os maiores parceiros comerciais do Brasil). E mesmo um crítico confesso das políticas externas de alinhamento - o chanceler Celso Amorim - era elogiado na América do Norte: "o melhor ministro de Relações Exteriores do mundo". Amorim e o chanceler russo Serguei Lavrov foram os grandes promotores das reuniões dos BRICS. De início, em caráter informal, durante reuniões anuais da Assembleia-Geral da ONU em Nova York. Em seguida, os BRICS oficializaram seus encontros. A primeira cúpula foi em Ekaterimburgo, Rússia, justamente em 2009. No ano em que Lula visitou Nova York e Ekaterimburgo, o Brasil parecia fazer parte dos países do futuro. Dilma gostaria de voltar a 2009. Uma grande diferença em relação a 2015 é o sumiço da presidenta na fala do presidente Obama. Ao contrário de Lula, Dilma não é considerada uma liderança mundial capaz de mobilizar corações e mentes para a importância crescente do Brasil. A possibilidade do Brasil oferecer novas ideias no plano global se torna mais difícil com essa perda de poder suave (soft power). Algo preocupante em 2015, quando expiram as metas do milênio e a ONU discutirá novos objetivos globais de desenvolvimento. A COP-21, na França, no fim do ano, buscará criar um novo marco global de sustentabilidade ambiental. Desafios nas áreas de saúde global e a ameaça crescente do "estado islâmico" no Oriente Médio também oferecem oportunidades para os principais países emergentes. O perfil baixo e pragmático da presidenta não faz sombra ao carisma de Obama. Por outro lado, discrição e pragmatismo (além de dificuldades políticas domésticas) facilitaram a assinatura de 31 acordos entre Brasil e EUA. Dilma buscou desde o início de seu mandato manter as boas relações com os EUA herdadas de Lula. Seus chanceleres (Antônio Patriota, Luiz Alberto Figueiredo e Mauro Vieira) tiveram longas passagens por Washington. E, ao contrário de Amorim (deslocado para o Ministério da Defesa), não nutriam resistências prévias à cooperação. Sucessor de si próprio, Obama teve calorosa recepção em visita ao Brasil em 2011, ano inicial do governo Dilma. Tais acordos refletem a ampla gama de interesses sobrepostos dos dois gigantes das Américas. Vão desde a liberação da exportação de carne bovina brasileira para o mercado dos EUA (negociada pela ministra da Agricultura Kátia Abreu) até um acordo de cooperação militar, o primeiro desde o governo do general Geisel na ditadura, em 1976 - impulsionado pela MINUSTAH. É interessante comparar a disposição do governo Dilma em ampliar laços militares com os EUA apenas 4 anos após o então chanceler Patriota ter proposto o conceito de "responsabilidade ao proteger" como crítica da intervenção da OTAN na Líbia durante a Primavera Árabe. Tal acordo seria impensável nos anos Amorim (hoje fora do governo Dilma).
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preparativos para a Copa do Mundo, a presidenta reagiu com firmeza e empreendedorismo às denúncias de que Obama teve acesso a seu e-mail pessoal e seus telefonemas. Cancelou visita prevista aos EUA (a primeira visita presidencial desde 1995) e foi à Assembleia-Geral da ONU. Em discurso memorável, acusou veladamente o anfitrião Obama de praticar espionagem eletrônica e propôs a regulação multilateral da internet como promoção dos direitos humanos - novidade normativa que já rende, em 2015, seus primeiros frutos. Dilma também acharia os ares de 2013 mais aprazíveis e inovadores. Outra mudança importante em relação a 2015 ocorreu na relação Brasil-Rússia. Ao contrário do que ocorreu na invasão à Geórgia, Putin espera maior "solidariedade" de Dilma na ressaca pósCrimeia - algo que o Brasil não pode oferecer, tendo a integridade territorial dos estados como um dos mais antigos e consolidados princípios de sua política externa. O desconforto de Dilma com as pressões russas foi sentido na ausência de acordos no último encontro dos BRICS (para além de declarações de intenções). Economicamente, o Brasil e a Rússia estão em situação mais complexa que em 2009. A Rússia já afundava rumo ao abismo pós-crise, com grande queda do PIB. Mas o Brasil crescia e se recuperava vigorosamente. Isso colocava o Brasil como alternativa interessante, caso a Rússia demorasse para se recuperar (o país não estava sob o efeito de sanções europeias e dos EUA). O Brasil era tido como uma alternativa segura - mesmo próximo da União Europeia e EUA, estava crescendo e buscava manter boas relações com todos. Em 2015 tanto a economia brasileira quanto a economia russa vão terminar o ano menores do que em 2014 (possivelmente, ainda menores do que em 2013). Após a Crimeia, a Rússia foi alvo de sanções da UE e EUA. Os BRICS aumentaram rapidamente suas exportações para o país. De plano B dos sonhos da Rússia, o Brasil passou a fazer parte de um grupo incômodo de países do plano A - junto à China e à Índia. Maior proximidade, na visão de Putin, implica maior compromisso "estratégico". O Brasil, recentemente, abriu mão de cooperação na área aeroespacial com a Ucrânia (sem que houvesse uma "contrapartida" russa). Mas a notícia de que o Brasil (assim como a Índia) intensificará suas relações militares com Washington desagradou o mandatário do Kremlin, em processo acelerado de deterioração de suas relações com a UE e com os membros da OTAN. Isso torna o Brasil ao mesmo tempo indesejável e indispensável para Moscou. A viagem no tempo pouparia Dilma dos dissabores do presente e oferece lições para um futuro incerto. O Brasil de Dilma está novamente próximo dos EUA de Obama - mas comparativamente menor que em 2009. Em relação à Rússia, o Brasil ficou maior - colocando Dilma numa incômoda proximidade com um Putin cada vez mais nostálgico do discurso da Guerra Fria. Em desacordo com posicionamentos fixos e indesejáveis, em busca de ampliar suas relações em todas as frentes possíveis, o pragmatismo da política externa brasileira implica lidar com contradições surgidas nas relações com colegas de continente e de BRICS - sem poder escolher uma única destinação.
*professor de Relações Internacionais da Universidade Federal do Tocantins e pesquisador voluntário do BRICS Policy Center em colaboração voluntária ao SRZD
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