Dea Roma: a personificação da urbs em moedas no período das Guerras Púnicas

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Universidade Federal do Estado do Rio de Janeiro Departamento de História Escola de História – EH Licenciatura em História

Dea Roma: a personificação da urbs em moedas no período das Guerras Púnicas

Orientadora: Profª. Drª. Claudia Beltrão da Rosa Autor: Diego Santos Ferreira Machado

Rio de Janeiro 2014

DIEGO SANTOS FERREIRA MACHADO

Dea Roma: a personificação da urbs em moedas no período das Guerras Púnicas

Trabalho de conclusão de curso apresentado como requisito para obtenção do grau licenciatura em História pela Universidade Federal do Estado do Rio de Janeiro – UNIRIO

Aprovado em: ___/___/____.

Banca examinadora:

Profª. Drª. Claudia Beltrão da Rosa (Universidade Federal do Estado do Rio de Janeiro – UNIRIO / Orientadora)

Profº Drº Giorgio Ferri (Université de Toulouse II – Le Mirail)

Profª Doutoranda Gisele Oliveira Ayres Barbosa (Centro Universitário Geraldo di Biasi - UGB) 2

Dedico este trabalho monográfico a Armando Ferreira de Pinho, Amélia Santos Ferreira de Pinho (in memoriam), Manoel Ferreira Machado Filho (in memoriam) e Marli Martins Machado (in memoriam):

bases

indispensáveis

à

minha

formação.

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Agradecimentos

Agradecer não é somente nomear pessoas, mas também colocá-las, afetuosamente, no mundo. Ao preencher cuidadosamente as linhas das páginas que se seguem, momentos, lembranças, risadas, emoções, lágrimas e sorrisos são confrontados e apreciados. Agradeço a Rosinda Machado, Carlos Machado, Rodrigo Machado, Maria de Lourdes Pinho e Nathalia Pereira pelos incondicionais apoio e força, mesmo nos momentos em que a própria certeza das escolhas por mim decididas seja dubitável. À Claudia Beltrão agradeço não somente pela orientação na iniciação científica e trabalho de conclusão de curso, mas por toda minha formação acadêmica e intelectual se antes tinha gosto pelos clássicos, após conhecê-la somou-se a isto um enriquecedor aprendizado. Porém, trabalhar com Claudia Beltrão é conhecê-la fora dos muros da universidade, e também a isso devo agradecê-la: sua calma e precisão, muito bem pontuadas, dignificam-na enquanto pessoa e me fazem admirá-la grandiosamente. Gostaria de indicar alguns professores que marcaram, de diferentes e singulares formas, meu trajeto até aqui: Patrícia Horvat, Giorgio Ferri, Keila Grinberg, Anita Lima, Icleia Thiesen, Daniel Ferreira, Miriam Coser, Fabio Faversani, Alexandre Carneiro, Deivid Gaia, Gilvan Silva, Leni Leite, André Bueno, Claudio Carlan, Sueann Caulfield, Norma Mendes, Maricí Magalhães, Maria Manuela Martins, Luís Fontes, Fernanda Magalhães, Cristina Braga, Raquel Peñin, Jorge Ribeiro, Fábio Cerqueira, Izabel Mendonça. No âmbito acadêmico, desde o início, fiz parte de um grupo de pesquisa, coordenado por Claudia Beltrão, no qual me senti integrado e completo. Separo,

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portanto, este parágrafo para cada um dos componentes deste maravilhoso grupo. Raquel Soutelo é fonte de inspiração diária: seu fervor e sua sede por conhecimento, somados a bom humor e prazerosa companhia, a torna parte crucial disso tudo. Debora Casanova é o misto de uma canceriana possessiva e de uma amiga extrovertidíssima: combinação, embora perigosa, bastante querida. Jhan Daetwyler é um arauto de beleza e genialidade: indispensável para uma discussão acadêmica intensa tanto quanto para simplesmente papear. Pedro Paulo Rosa é a ponte do que há de mais terreno para o que escapa às mãos e foge aos pés: ter-te por perto é a certeza de uma descontraída e deleitosa conversa. Paulo Márcio de Sousa é nosso eterno bebê de dezessete anos, por mais que insista em crescer, amadurecer e se tornar gente grande. João Soeiro é a experiência religiosa em pessoa: dos atabaques aos caduceus. Ao longo dessa aventura por meio do trabalho histórico e historiográfico, conheci alunos e pesquisadores que me marcaram, em debates acadêmicos e/ou admiração. Gostaria, também, de mencionar alguns: Airan Borges, Gisele Ayres, Claudia Gomes, David Mendes, Thiago Zardini, Barbara Benevides, Leila Grossi, Patrícia Rocha, Priscila Silva, Diego Rosas, Stéphanie Barros, Lívia Borges, Camilla Paulino, Maria Sant‘Angelo Eichler, Ellen Moura, Rita Melo, Lilian Laky, Luís Miguel Mega, Luiza Câmpera, Thiago Pires, Paulo Duprat. Agradeço a Érica Salles pela doçura e atenção – o coração e a engrenagem da Escola de História. À Unidade de Arqueologia da Universidade do Minho devo toda minha paixão pela Arqueologia. E à Reserva Técnica de Arqueologia do Museu Nacional da UFRJ, notadamente à Ângela Rabello e à Cleide Martins, devo todo o aprendizado no trato da cultura material, bem como o trabalho de prevenção.

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Acredito ser necessário também olhar para fora do campo acadêmico e pensar em alguns bons amigos que fiz e prezo ao longo do tempo: Carolina Reis, Jaqueline Neves, Felipe Romero, Gabriel Cardoso, Giovanna Pezzino, Ana Fialho, Bruna Mouffron, Lívia Mouffron, Lucas Tavares, Cheyenne Christine, Pedro Lopes, Pedro Pessanha, Pedro Mendes, Nicolas Monti, Juliana Felício, Álvaro Prates, Erir Ribeiro, Bruna Caroline, Helen Frade, Hevelly Acruche, Marina Contin, Mariana Reis, Pedro Romero, João Santoro, João Monteiro, Leandro Torres, Leonardo Neves, Cesar Barros, Edson Gama, Ludmila Oliveira, Luis Pinto, Yure Moura, Caroline Carrilho, Iasmin Moura, Luiz Pinto, Luiz Paulo Marquez, Andressa Witiney Silva, Alexandre Stoque, João Paulo Jacintho, Anna Beatriz Bittencourt, Jefferson Lomenha, Fernando Santos, Pedro Gama, Priscila Guedes, Mayara Meira, Lyvia Ferreira, Thais Contino, Alice Rocha, Ana Luiza Serrano, Danilo Cunha, Matheus Simões, Luniara Miranda, Henri Mathieu, Anderson Canto, Julio Magalhães, Guilherme Venâncio, João Wisnesky, Caroline Marchesini, Julio Berwanger, Bernardo Berwanger, Bruno Amorim, Renan Santiago, Rodrigo Santiago, Danilo Nascimento, Luciano Nascimento, Murilo Afonso, Matheus Afonso, Marco Afonso, Gustavo Nascimento, Alan Melo, Paulo Poffo. Dentro dos mais diversos grupos de amigos que conquistei, há um que merece especial citação: embora já tenha nomeado os integrantes, as Periquitas da Urca foram e são parte importante da minha vida, nos momentos com elas passados pude perceber que em universos totalmente opostos e até contrários são cabíveis boas risadas e valorosos conselhos. Agradeço aos calouros pelo frescor da novidade e pela vontade em aprender. Embora eu prefira o mundo acadêmico e científico por sua racionalidade e métodos de controle, o lado pessoal e emocional devem ser observados. A respeito disso

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agradeço, sobretudo, aos colegas e amigos que fiz durante a Educação Básica, principalmente no Ensino Médio. Nossos encontros anuais em Maricá destroem toda minha sistematização das relações interpessoais e sociais e me mostram a maravilha que é descobrir e se aventurar face ao novo, que surge de dentro, reflete e é refletido em cada palavra, sorriso, gesto e som. Agradecer é, em suma, olhar para o horizonte, rumo ao destino e ao futuro, de mãos dadas com o passado e o presente.

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Quanto fui quanto não fui tudo isso eu sou. Quanto quis quanto não quis tudo isso me forma. Quanto amei ou deixei de amar é a mesma saudade em mim. Sou eu mesmo, a charada sincopada que ninguém da roda decifra nos serões da província. Fernando Pessoa

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Resumo

Em meio às transformações sociais e políticas dos séculos III-II a.C., observamos o surgimento de Dea Roma, a personificação divinizada da urbs romana, em moedas romanas do período, e a relacionamos diretamente à necessidade de se impor e se afirmar perante outras cidades e povos. Acreditamos que a representação imagética desta personificação pode nos dar pistas e indícios das relações romanas com outros povos, bem como sobre o mundo romano em geral, a partir da análise do simulacrum de Dea Roma. Moedas não eram, em sua essência, objetos religiosos, mas sim públicos, que mostravam a forma publica populi Romani, isto é, faziam parte dos símbolos que defendiam a identidade do povo romano, e nas suas cunhagens observamos signa pertencentes aos rituais, aos sacerdócios, às divindades oficiais da cidade de Roma – ao sistema religioso.

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Abstract

Between the social and political changes in III and II centuries B.C. we can see the emergence of Dea Roma, the divine personification of the Roman urbs in coins and match it directly to the need to impose and assert itself before other cities and peoples. We believe that the study of iconographical representation of this personification may allow us to understand the relationships between the Romans and other societies, as well as the Roman world itself, based on an analyzis of the simulacrum of Dea Roma. Coins were not religious objects, but public objects, showing the ―forma publica populi Romani‖, i.e., they were part of the symbols which defended the identity of the Roman people and, on their coinages, we can observe the signa of rituals, gods and goddess, priests and priestess – of the Roman religious system.

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Sumário

Lista de figuras ______________________________________________________ 13 Lista de abreviações ___________________________________________________ 13 Introdução ___________________________________________________________ 14

Capítulo 1 – A República Média Romana __________________________________ 17 1.1 – Expansão do domínio romano na Itália e as mudanças em Roma______ 18 Capítulo 2 – Numismática e Iconografia ___________________________________ 26 2.1 – Moedas ___________________________________________________ 27 2.2 – Imagens __________________________________________________ 31 Capítulo 3 – Dea Roma: a personificação da urbs ____________________________ 36 3.1 – A deusa __________________________________________________ 36 3.2 – As representações __________________________________________ 40

Conclusão ___________________________________________________________ 49 Referências bibliográficas_______________________________________________ 51 Apêndice – fichas metodológicas da documentação numismática ________________ 54

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Lista de figuras

Figura 1. Mapa da Itália Central e Sul _____________________________________ 19 Figura 2. Cunhagem de moedas _________________________________________ 29

Lista de abreviações

Cr. – Catálogo de moedas Roman Republican Coins/RRC, de Michael Crawford. Syd. – Catálogo de moedas de Edward Allen Sydenhanm. RIC – Catálogo de moedas Roman Imperial Coins. BMC – Catálogo de moedas British Museum Catalogue of Greek coins. Haeb. – Catálogo de moedas de Ernst Justus Haeberlin.

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INTRODUÇÃO

Este trabalho monográfico teve sua origem nas atividades do subprojeto de pesquisa intitulado Dea Roma: a personificação da urbs em moedas no período das Guerras Púnicas, sob a orientação da professora doutora Claudia Beltrão da Rosa. As atividades foram desenvolvidas durante a Iniciação Científica, realizada por três anos, de 2011 até 2014, tendo, nos dois primeiros, o auxílio financeiro do programa de fomento da Universidade Federal do Estado do Rio de Janeiro, IC/UNIRIO, e o último do Programa Institucional de Bolsas de Iniciação Científica do Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico, PIBIC/CNPq. Em meio às transformações sociais e políticas dos séculos III-II a.C., observamos o surgimento de Dea Roma, a personificação divinizada da urbs romana em moedas romanas do período, e a relacionamos diretamente à necessidade de se impor e se afirmar perante outras cidades e povos. Acreditamos que a representação imagética desta personificação pode nos dar pistas e indícios das relações romanas com outros povos, bem como sobre o mundo romano em geral, a partir da análise do simulacrum divino de Roma. Moedas não eram, em sua essência, objetos religiosos, mas sim públicos, que mostravam a forma publica populi Romani, isto é, faziam parte dos símbolos que defendiam a identidade do povo romano, e nas suas cunhagens observamos signa pertencentes aos rituais, aos sacerdócios, às divindades oficiais da cidade de Roma – ao sistema religioso. Temos como recorte temporal, portanto, os séculos III e II a.E.C., momento em que a recém-estabelecida República Romana está se estruturando e o movimento de

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expansão de Roma ruma para fora da Itália. A documentação utilizada é, em sua totalidade, numismática. Essas moedas foram cunhadas a mando ou sob encomenda de Roma em cidades da Magna Grécia, em Roma ou em cidades dominadas pelos romanos ao longo da península itálica, tratando-se, portanto, de nosso recorte espacial. O critério para a seleção e composição do corpus documental é a presença da personificação da cidade de Roma, Dea Roma, em pelo menos um dos lados dessas moedas 1, totalizando dez moedas. Concentramos nossa análise no período enunciado porque, no início do século III a.E.C., temos o início das cunhagens com a presença de Dea Roma, e suas modificações ocorrem ao fim desse século e ao longo do seguinte. Nossos objetivos se concentram em analisar, a partir do estudo das representações imagéticas em moedas de Dea Roma, a personificação da cidade romana, os interesses de Roma no que diz respeito à comunicação com os romanos e à veiculação dessa imagem, e de suas respectivas mensagens, às cidades vizinhas. E teremos como hipóteses, a) as representações de Dea Roma dialogavam com o contexto vivido pelos romanos no momento em que as moedas foram cunhadas; b) as mensagens veiculadas nas moedas romanas expressavam, para além de uma simples comunicação do que acontecia na cidade de Roma e nas guerras que travava, os interesses do Senado em qualificar a urbs como proeminente e capital no mundo Mediterrânico antigo. No primeiro capítulo, buscaremos conceituar o recorte temporal, séculos III e II a.E.C., e apresentar a cidade de Roma nesse período, sinalizando suas transformações internas e suas atuações externas.

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As moedas utilizadas foram retiradas do projeto Davy Potdevin, que produziu um catálogo online de moedas romanas e provinciais a partir de outros já existentes, como Crawford, Sydenham e Haeberlin, tendo o primeiro como principal a partir do RRC – Roman Republican Coins. Disponível em: http://davy.potdevin.free.fr/.

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Já no segundo capítulo, o foco será as bases teóricas e metodológicas que compõe esse trabalho: a numismática, definindo o que era a moeda no mundo antigo e o seu uso para os estudos históricos; e a iconografia, conceituando imagem e representação e concentrando nos símbolos religiosos. Por fim, no terceiro capítulo abordaremos Dea Roma, definindo a deusa, e analisando as representações imagéticas da mesma nas moedas dos séculos III e II a.E.C. cunhadas em Roma ou na Itália. Todas as datas estão no período a.E.C. (antes da Era Comum). Quando ocorrer alguma referência ao período E.C. (Era Comum), isto será indicado.

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1. A REPÚBLICA MÉDIA ROMANA

O objetivo desse capítulo se concentra na contextualização do período da história romana chamado de República Média, tradicionalmente situada nos séculos III 2 e II. Dentro da experiência republicana romana, a partir de sistematizações baseadas nos mecanismos de funcionamento do sistema político romano (FAVERSANI, 2013: 102), a República Média teve como marco inicial a Primeira Guerra Púnica, em 264, quando Roma começa a travar batalhas fora da península itálica, e termina com a morte do tribuno da plebe Tiberius Gracchus, em 133, marcando o início da violência entre os romanos no espaço cívico da cidade (FLOWER, 2010: 61). Esse modelo explicativo, que divide a República Romana em três partes (arcaica, média e tardia) é útil para certos estudos: funciona e auxilia na interpretação de determinada documentação a partir de problemáticas específicas. Nosso trabalho, embora divirja de objetivos relacionados exclusivamente ao âmbito político de Roma, está inserido, cronologicamente, nos séculos III e II. Desta forma o modelo tradicional de periodização pode ser aplicado, sem resultar em anacronismos, generalizações e/ou cortes (BELTRÃO, 2013: 120). Portanto, apresentaremos, a seguir, a sociedade romana dos séculos III e II em suas experiências externas e internas à cidade.

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Todas as datas estão no período a.E.C. (antes da Era Comum). Quando ocorrer alguma referência ao período E.C. (Era Comum), isto será indicado.

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1.1.

Expansão do domínio romano na Itália e as mudanças em Roma

No século III, os romanos atuaram sobre toda a península Itálica e parte da grega por meio de uma série de guerras favoráveis a Roma, como a que ocorreu contra a Confederação Samnita, as vitórias sobre as cidades etruscas, sobre Tarento e Epiro, tendo a efetiva dominação política ocorrida dois séculos depois3. Por toda a Itália, Roma estabelece suas colônias, bem como intensifica a concessão de cidadania e poderes legais para diversas cidades, dando-lhes status de municipia4. Ao passo que criava as coloniae latinae, isto é, colônias da liga latina chefiadas por Roma, como também as civitates sine suffragio5, que tinham a cidadania, mas não podiam participar das eleições das magistraturas. E, finalmente, colônias fundadas por Roma, as coloniae civium Romanorum6. Este início da dominação romana sob a península itálica é eficaz, pois garante a multiplicação do poder romano em um curto período de tempo (ALFÖLDY, 1986, 42-43). Essas cidades (coloniae e municipia ex novo) permitiram uma das sólidas e eficazes experiências, junto com diversas outras, nas quais o imperialismo romano seria baseado. As formas, fórmulas e atos de fundação de colônias nos séculos IV-II permitiram a Roma construir e consolidar práticas administrativas que se adaptariam e perpetuariam por todo o Império, como a

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Sobre o processo de romanização da Itália ao longo dos séculos IV e I, c.f. STEK, 2013. Comunidades de populações locais com cidadania romana e uma administração comunal própria. 5 ―Comunidades de semicidadãos‖ com cidadania romana, mas sem o direito de intervir na escolha dos funcionários romanos. 6 Cidades fundadas por Roma a partir de princípios próprios, como o plano ortogonal medido e demarcado por agrimensores e finitores, magistrados que cuidavam fundação dos espaços físicos a partir de rituais específicos. Para um estudo sobre a demarcação dos limites (fronteiras) durante a República Romana nas coloniae, c.f, BELTRÃO, 2013. 4

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demarcação das fronteiras, dos espaços e a sacralização de determinadas áreas (SEWELL, 2010: 10; BELTRÃO, 2013: 187-188).

Figura 1: Mapa da Itália Central e Sul, c. 218, In: ROSENSTEIN, Nathan; MORSTEINMARX, Robert (orgs.). A Companion to Roman Republic. Oxford: Blackwell Publishing, 2006.

De acordo com o mapa acima (Mapa 1), podemos perceber a expansão territorial romana com a anexação de diversos territórios por toda a Itália, bem como os territórios aliados. Porém, chamamos mais a atenção para a pluralidade de colônias latinas

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fundadas ao longo da península, em diversas regiões: cidades portuárias, como Paestum, Firmum, Cosa e Brundisium; da mesma forma que cidades ao interior peninsular, como Beneventum, Venusia e Luceria. A ocupação romana na península, através da expansão territorial e da fundação das diversas colônias por toda a Itália, garantiu a atuação de Roma sob uma área maior e com uma população diversa e plural7. O crescimento romano e sua expansão pela Itália trouxeram profundas mudanças à cidade. Com as colônias sendo fundadas e as cidades romanas ou itálicas estabelecidas ao longo da península, a cidadania romana foi ampliada e multiplicada em um curto período de tempo para uma grande quantidade de pessoas, bem como impulsiona a migração para a urbs. A demografia romana, nesta época, dá um salto de alguns milhares de habitantes localizados apenas na cidade de Roma, para um número de milhões8, marcadamente heterogêneos e situados em toda a Itália (ALFÖLDY, 1986: 45). A expansão e a atuação romana sobre distintos povos itálicos acarretaram em contatos e trocas culturais e econômicas mais intensas. Não apenas latinos, mas etruscos, gregos, entre outros, foram incorporados ao nascente Império e integrados à vida romana. Essa aproximação gerou mudanças nas práticas romanas, dentre as quais nos concentraremos em alguns aspectos relacionados às transformações religiosas. Chamamos por religião romana o conjunto de práticas e crenças que compõe o cotidiano romano e que, por meio de rituais, investem o mundo físico, humano e divino de sentido. Nas palavras de Clifford Geertz, religião é:

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Um estudo detalhado dos modelos arquitetônicos utilizados nas colônias itálicas pode ser visto em SEWELL, 2010. Para uma análise das mudanças na Itália causadas pela expansão romana, c.f, PATTERSON, 2006. 8 Para uma crítica aos métodos de análise demográfica de Roma e do império, sobretudo à época de Augusto, c.f. LO CASCIO, 2013.

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um sistema de símbolos que atua para estabelecer poderosas, penetrantes e duradouras disposições e motivações nos homens através da formulação de conceitos de uma ordem da existência geral e vestindo essas concepções com tal aura de fatualidade que as disposições e motivações parecem singularmente realistas (GEERTZ, 2008: 67).

Abordaremos aqui alguns aspectos da religio publica, ou seja, rituais, sacerdócios e divindades que eram promovidos a fim de garantir a segurança e a prosperidade da urbs e eram destinados a todo o corpo de cidadãos romanos e demais habitantes da cidade. Esses grupos humanos que chegaram a Roma trouxeram consigo diversas divindades, o que provocou uma intensa alteração na religião romana. No século III podemos ver, sobretudo no final, a chegada de um grande número de novos deuses e deusas e a dedicação de diversos templos, bem como inovações nos rituais e criação de novos jogos (BEARD, NORTH, PRICE, 1998: 79-80). Um bom exemplo das modificações na religio publica desse período podem ser observados com a deusa Magna Mater. O medo causado pela campanha de Aníbal pela Itália, durante a Segunda Guerra Púnica9, resultou na adoção de medidas religiosas que promovessem a restauração da ordem romana. Nesse momento, após consulta aos livros Sibilinos 10, foi decidido que Cybele, deusa da Ásia Menor, interpretada11 como Magna Mater, deveria ser transportada para Roma e assim garantir a vitória na guerra. Essa divindade recebeu

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Segunda das três guerras travadas contra Cartago, cidade do norte da África. Uma espécie de manual de consulta religiosa. Utilizado em momentos específicos para buscar orientações rituais a fim de solucionar determinados problemas (ROSA, 2013: 46). 11 Interpretatio, processo de identificação de divindades estrangeiras e sua associação às realidades romanas, reconhecendo e ―romanizando‖ deuses e deusas não romanas (DAETWYLER. 2014: 19) 10

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um templo, rituais e jogos em sua homenagem (BEARD, NORTH, PRICE, 1998: 8093; BELTRÃO, 2012: 7-12). Além de divindades, homens também eram celebrados em Roma. O modo romano de contar sua própria história é realizado através dos heróis que protegeram e garantiram a res publica, consolidando suas instituições e promovendo a expansão sob o Mediterrâneo. Estátuas, colunas e arcos representavam os heróis e seus feitos, tanto imagética como textualmente, e produziam um discurso que legitimava seus status. Essa publicização constante através dos espaços físicos da cidade favorecia às principais famílias da aristocracia romana na obtenção de títulos e magistraturas, ao fixar sua importância para a construção da res publica, estabelecendo seu lugar nas celebrações das honrarias públicas e promovendo socialmente essas gentes12. Esse modo romano de contar a própria história, a partir dos exempla13 fornecidos pelos feitos e atos dos heróis republicanos, segundo K.-J. Hölkeskamp, ―serviu para fortalecer a identidade coletiva14 e dar legitimidade ou meritocracia a uma elite dominante, baseada na ideia de permanente, infalível e inabalável serviço ao populus Romanus e à grandeza do Império‖ (HÖLKESKAMP, 2006, p. 479). Por toda a cidade de Roma é possível perceber, através dos dados arqueológicos e literários, um grande investimento também em obras públicas, que expandiram algumas áreas da cidade. O Comitium, local onde o Senado faz os seus pronunciamentos, foi ampliado a fim de garantir espaço ao crescente de habitantes em

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Gens, pl. gentes, grupo familiar da aristocracia romana oriundo de um mesmo antepassado, como os Claudios, os Julios e os Fabios. 13 Exemplum, pl. exempla, Precedentes com uma força normativo-exemplar que podem ser chamados em qualquer situação a qualquer momento. 14 Hölkeskamp utiliza esse conceito com base nas ideias de Pierre Nora sobre memória coletiva. As memórias de um povo, inscritas fisicamente nos espaços públicos da cidade, coadunam-se para a formação de uma identidade coletiva a partir de símbolos e marcos comuns a todos.

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Roma. Foi construída Via Appia, importante estrada que liga a Porta Capena (em Roma) à cidade de Capua, integrando mais solidamente o sul da Itália à urbs. A construção da Aqua Appia e do Anio Vetus, dois aquedutos que abasteciam a Porta Trigemina e o Forum Boarium, importantes espaços comerciais em Roma, indicam o florescimento das trocas comerciais entre romanos e demais povos. Essas construções refletiam pelo menos dois pontos cruciais das necessidades de Roma e dos romanos: buscar soluções face ao crescimento populacional que a cidade sofrera desde a expansão territorial; da mesma forma que serviu para promover os magistrados15 que realizaram essas obras, garantindo seus nomes fixos na concretude material do espaço público romano, que incluía também templos e tumbas (DAVIES, 2013: 443-445). Embora o início da representação de figuras humanas para fins de promoção das famílias só aconteça ao fim do século II (BEARD, NORTH, PRICE, 1998: 77-78), as moedas foram uma das mais importantes formas de comunicação e propagação de mensagens no mundo antigo, pois chegavam a diferentes e distantes pessoas, ultrapassando os limites políticos e geográficos estabelecidos. O sistema monetário romano que, até então, tinha suas moedas cunhadas em cidades gregas, foi fundado em torno do denário, bastante semelhante ao drachma grego na forma de cunhar e às moedas itálicas no uso de metal, porém inegavelmente romano (POBJOY, 2006: p. 65). Ter um sistema monetário próprio era garantir o controle dos pesos e das medidas, além da utilização de termos latinos para definir as moedas. Não ser um drachma que estipula o valor das mercadorias e sim um denarius reitera a centralidade de Roma no mundo mediterrânico.

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A Via Appia e a Aqua Appia, por exemplo, são relacionadas a Claudius Appius Caecus, censor em 312 e cônsul em 307 e 296.

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Moedas não eram, em sua essência, objetos religiosos, mas sim públicos, que mostravam a forma publica populi Romani, isto é, faziam parte dos símbolos que defendiam a identidade do povo romano, e nas suas cunhagens observamos signas pertencentes aos rituais, aos sacerdócios, às divindades oficiais da cidade de Roma – ao âmbito religioso (WILLIAMS, 2007: 155-163). Como primeira iniciativa, as moedas lançadas trazem a inscrição ―ROMANO‖ ou ―ROMA‖, como forma de legitimar a cidade e o povo, assim como divindades romanas ou romanizadas estão presentes nas cunhagens. As imagens que compunham as moedas eram definidas pelo Senado, que estabelecia o corpo simbólico permitido a partir da representação oficial de Roma. Dentro do cursus honorum de um cidadão romano, i.e., a carreira de magistraturas e sacerdócios que compõe a atuação pública dos cidadãos, um dos primeiros cargos ocupados pelos jovens romanos é fazer parte do corpo dos tresuiri monetales, uma magistratura menor composta por três homens que se encarregavam de chefiar a produção de moedas. Esses monetários eram eleitos anualmente e usavam o prestígio do início da primeira atuação na vida pública como propaganda para alavancar suas carreiras, ao serem conhecidos pelo corpo de cidadãos e conquistar aliados para suas candidaturas (CRAWFORD, 1974: 602-603; WILLIAM, 2007: 144). A disputa pelas magistraturas e pelos sacerdócios entre as famílias da aristocracia romana, a fim de se promoverem, gerava uma busca por mecanismos de popularização e comunicação com os eleitores. A carreira de títulos, cargos e funções que os romanos adquiriam ao longo de suas vidas garantiam seu lugar de proeminência na urbs e nos exempla da res publica. Os tresuiri monetales correspondiam, certamente, a um desses primeiros ―degraus‖ a serem transpostos a fim de se obter as maiores

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magistraturas, como o Consulado e a Censura, com elas, as honras inscritas nos espaços públicos da cidade. Analisar as moedas pode nos trazer importantes dados sobre as intenções de Roma durante a República. As composições iconográficas do período traduzem bem os anseios e os desafios que Roma enfrentou ao seu lançar pelo Mediterrâneo e confirmar sua proeminência sobre o mundo antigo. Assim como as moedas cunhadas pelos romanos indicavam suas motivações e comunicavam às mais diversas cidades e povos sua almejada posição de caput mundi.

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2. NUMISMÁTICA E ICONOGRAFIA

Neste capítulo nos debruçaremos sobre dois pontos fundamentais desse trabalho monográfico: a numismática e a iconografia. Tendo como objetivo, portanto, definir o que é a moeda no mundo antigo, em especial o romano, abordando a produção e a circulação desses objetos no Mediterrâneo antigo. Além disso, retrataremos conceitualmente a iconografia, com enfoque na produção numismática e suas relações com a religião romana. Definimos Numismática pela ciência que estuda as moedas, desde seus aspectos técnicos e econômicos, até sua composição cultural e religiosa. Nas palavras de Jean Babelon, o campo da Numismática é imenso, pois a moeda reveste-se de aspectos infinitamente variáveis, uma mina de informações sobre a História das religiões, dos costumes, da arte, das relações sociais ou comerciais, sobre a civilização, sobre a política (BABELON, 1948 apud CARLAN, FUNARI, 2012: 17)

Nossas preocupações nesse trabalho não concernem ao âmbito econômico ou financeiro dos estudos numismáticos, mas ao plano social. Entendemos a moeda como um dos objetos definidores da identidade de um povo, que reproduz através de símbolos e pequenas frases posições oficiais de um reino, império ou cidade. Compreendemos a Numismática romana pelo estudo das moedas cunhadas sob a ordem de Roma, seja antes da criação de um sistema monetário próprio com o denário

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ao fim do século II16, quando as moedas eram encomendadas pelo Senado para serem fabricadas nas cidades gregas, ou por todo o período posterior até fins do Império Romano nas casas de cunhagem em Roma, na Itália ou nas províncias (MEADOWS, 2009: 49). O estudo da iconografia, em particular nos objetos numismáticos, permite a observação de um fenômeno comunicativo sem igual. As moedas viajam por longas distâncias e transpunham os limites físicos e geográficos estabelecidos, chegando de maneira uniforme a um vasto número de pessoas. Propomos para esse tópico retratar a numismática, pensando meios de produção e circulação, e a iconografia, compondo o aparato teórico que dá base a essa monografia.

2.1. Moedas

A experiência numismática de representação de um povo ou lugar através de símbolos que os relacionem pode ser datada de por volta do século VII a.E.C., tendo como local de partida a Lídia, cidade da Ásia Menor, com as imagens de leão e punho presentes nas moedas. Antes disso, as moedas eram objetos metálicos redondos ou ovais apenas com marcas em sua superfície, normalmente riscos ou bolinhas, que indicavam a quantidade de metal utilizado em sua fabricação, o que definia o seu valor. Ao longo do século VI a.E.C. diversas cidades gregas, cartaginesas e fenícias, como Atenas, Corinto,

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Todas as datas estão no período a.E.C. (antes da Era Comum). Quando ocorrer alguma referência ao período E.C. (Era Comum), isto será indicado.

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Cartago, entre outras, começaram suas cunhagens com símbolos que as representassem. Podemos perceber, nesse momento, a estreita e crucial relação entre a religião e a numismática, tendo em vista que grande parte da expressão imagética presente nas moedas era de deuses, deusas e/ou símbolos que pertenciam ao simulacrum dessas divindades, como exemplo temos Athena e sua coruja como imagens representativas da cidade de Atenas (WILLIAMS, 2007: 143; POBJOY, 2006: 62-63). A cunhagem era feita com o uso de um módulo fixo, de madeira, no qual se colocava um disco com a imagem desejada a ser impressa na moeda (o disco no módulo fixo é chamado de obverso, reverso ou coroa). Sobre esse era posto o metal, fino e redondo, que será a moeda. Um segundo disco é colocado num módulo móvel (chamado de anverso ou cara), também de madeira, que será encaixado sobre o metal (formando, assim, disco/metal/disco). Com uma martelada, as imagens presentes nos dois discos se fixam ao metal e a moeda está feita, pronta para uso (Figura 1). Em relação aos metais utilizados, três são os principais: bronze, prata e ouro. Durante a República Média Romana percebemos majoritariamente o uso do bronze e da prata, enquanto o ouro, com algumas poucas exceções, só vai ser produzido depois da reforma monetária de Julio Cesar (POBJOY, 2006: 65-66).

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Figura 2: Cunhagem de moedas, In: POBJOY, Mark. Epigraphy and Numismatics. In: ROSENSTEIN, Nathan; MORSTEIN-MARX, Robert (orgs.). A Companion to Roman Republic. Oxford: Blackwell Publishing, 2006.

Do ponto de vista arqueológico, as moedas são encontradas de duas formas a partir da maneira como foram depositadas: intencionalmente ou não. Moedas depositadas intencionalmente são aquelas presentes em tesouros, agrupamentos de centenas ou mesmo milhares de moedas escondidos em potes e geralmente enterrados. Esse tipo de prática era realizado pelo temor de saques e ataques, sendo mais comuns em períodos de instabilidade política e/ou guerras. Os tesouros são fontes essenciais para a numismática porque as moedas lá deixadas tiveram seu uso interrompido, o que diminui o desgaste e a corrosão, facilitando a limpeza e a análise das cunhagens. Moedas depositadas não intencionalmente são encontradas ao longo de vias e em espaços públicos no geral, sua presença nesses espaços pode ter sido causada pelo descuido ao guardar uma moeda na bolsa ou passar de uma mão para a outra. Geralmente, nesses casos, as moedas encontradas são de bronze, pois a falta das de

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prata e ouro seriam facilmente percebidas pelo dono que as procuraria devido ao seu alto valor, assim como o tamanho da mesma também atua a favor ou contra a sua perda (EVANS, 2013: 110-112). A circulação das moedas romanas é, sem dúvida, algo bastante significante ao se pensar o potencial comunicativo de suas cunhagens. Garantir que uma moeda vá, efetivamente, chegar a diferentes e distantes locais a fim de disseminar a mensagem pretendida, é algo complicado e muitas vezes incerto. Porém, temos informações suficientes que nos indiquem a circularidade necessária. Moedas eram utilizadas, no dia a dia, para duas finalidades básicas: comércio e pagamento de serviços. Com a atuação romana pela Itália e, posteriormente, pelo Mediterrâneo, as rotas comerciais terrestres e marítimas são asseguradas, o que impulsiona as trocas e permite que as moedas viagem longas distâncias. Além disso, os exércitos, em campanha ou aposentados, recebiam pagamentos em denários, e isso garante a presença e difusão de moedas ao longo das colônias, inicialmente italianas e depois ao longo do Império (POBJOY, 2006: 62; CARLAN, FUNARI, 2012: 31; EVANS, 2013: 114-116). Em Roma, a moedagem é tardia em comparação com outras regiões do Mediterrâneo. Enquanto a Lídia começa suas cunhagens no século VI e os gregos ainda no V, os romanos só vão encomendar suas primeiras moedas às cidades da península itálica ao fim do século IV. Esse início dos temas romanos na numismática aparece de forma bastante marcante, embora tímida, haja vista as produções de séculos posteriores. São presentes temas estrita e marcadamente representativos de um objeto oficial e identitário de Roma: efígies de divindades latinas ou romanizadas, como Jupiter, Minerva, Marte e, especialmente, Jano. Assim como temos, no século III, duas inscrições textuais, notadamente ROMANO (possivelmente uma abreviação para

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romanorum, dos romanos) e ROMA (POBJOY, 2006: 63-65; WILLIAMS, 2007: 143144). Em fins do século III, por volta do ano 211, Roma funda um sistema monetário próprio, centrado no denário de prata. Desse momento em diante, os temas presentes nas iconografias numismáticas sofreram mudanças marcantes: imagens de corpo inteiro de divindades aparecem, bem como passagens de mitos (e.g, Hércules derrotando os centauros, c.f, Cr. 39/1; Syd. 93) e imagens em cenas como triunfos de deuses (c.f, Cr. 28/3; Syd. 64ª). Os textos nas moedas também sofrem alterações, com as inscrições dos nomes dos tresuiri monetales (WILLIAMS, 2007: 144-145).

2.2. Imagens

Imagem é um termo derivado da palavra imago (pl. imagines), em latim, que designava a máscara mortuária, geralmente feita de cera, que representava os antepassados nas procissões fúnebres (pompa funebris). Essas máscaras, ao representarem os mortos, reconduziam-os à vida, ao presente, diante dos olhos de todos que as (os) viam (FAVRO, JOHANSON, 2010: 12). Representação, portanto, é um termo chave para a compreensão do que enunciamos como imagem. Um objeto, uma pessoa, um animal, ou qualquer outro elemento existente no mundo inteligível é representado quando o mesmo não está presente (JOLY, 2007: 42-43). Re-presentar é, em suma, trazer ao agora o que aqui não está, ou seja, é um signo formado por linhas, cores e volumes que remete a algo

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inteligível para seus observadores a partir de semelhanças entre a representação e o representado. Dividimos os signos em três tipos: ícone, indício e símbolo. Utilizaremos aqui a definição de Martine Joly para os tipos: O ícone corresponde à classe dos signos cujo significante mantém uma relação de analogia com aquilo que ele representa, ou seja, com o seu referente. Um desenho figurativo,

uma

fotografia,

uma

imagem

de

síntese

representando uma arvore ou uma casa são ícones na medida em que eles se assemelham a uma árvore ou a uma casa. (...) O indício corresponde à classe dos signos que mantém uma relação causal de contigüidade física com aquilo que eles representam. É o caso dos signos ditos naturais como a palidez para a fadiga, o fumo para o fogo, a nuvem para a chuva, mas também a pegada deixada por um caminhante na areia ou pelo pneu de um carro na lama. Por fim, o símbolo corresponde à classe de signos que mantém com o seu referente uma relação de convenção. Os símbolos clássicos, tais como as bandeiras para os países ou a pomba para a paz, entram nesta categoria (JOLY, 2007: 38-39, grifo nosso).

Abordaremos, para esse trabalho, os signa correspondentes a ícones e, posteriormente, símbolos. A iconografia, como o sufixo oriundo do verbo grego graphein, que significa ―escrever‖, sugere, se baseia no ato de descrever uma imagem a partir da análise de seus ícones. Segundo Erwin Panofsky, ―Iconografia é um ramo da história da arte que trata do tema ou da mensagem das obras de arte em contraposição à forma‖ (PANOFSKY,

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2002: 47). Por forma, podemos entender o conjunto de linhas, cores e volumes que compõe uma imagem. O tema, por sua vez, vai além, ao perceber o referente em que o ícone se estrutura por analogia, dando-lhe vida no mundo inteligível (PANOFSKY, 2002: 47-48). Para fins metodológicos, utilizamos a proposta Iconográfica e Iconológica de Erwin Panofsky17, a qual estabelece três níveis de leitura das imagens: no primeiro, chamado de descrição pré-iconográfica, os ícones são reconhecidos separadamente e reconhecidos enquanto objetos, pessoas e animais; no segundo momento, temos a análise iconográfica, onde é identificado o ―significado convencional‖ dos símbolos; e, por fim, a interpretação iconológica, que se volta para o ‗significado intrínseco‖, ―para os princípios subjacentes que revelam a atitude básica de uma nação, um período, uma classe, uma crença religiosa ou filosófica‖ (PANOFSKY, 2002; BURKE, 2004). As mensagens presentes nas imagens só são passíveis de interpretação, portanto, quando conhecemos os símbolos que as formam, pois são parte de uma cultura e não pode ser compreendidas sem um conhecimento da mesma – para interpretar a mensagem é necessário familiarizar-se com os códigos culturais. Nos estudos das imagens romanas, ou seja, dos seus códigos culturais representados por meio de ícones e símbolos, que são nossos objetos de análise, buscamos compreender, sobretudo, como a produção romana conseguiu coadunar sua produção artística com o crescente império (HÖLSCHER, 2004: 125). Para tal, centraremos nossa abordagem nas imagens de âmbito religioso pela sua central e fundamental expressão nas cunhagens romanas.

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PANOFSKY, Erwin. Iconologia e Iconografia. O significado nas artes visuais. São Paulo: Perspectiva, 2002.

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O uso da religião nas representações em moedas é largamente difundido desde o início das cunhagens romanas. Divindades (c.f, Cr. 1/1, Syd. 51), instrumentos de uso ritual, como lituus e patera (c.f, Cr. 456/1a. Syd. 1027; Cr. 462/1b, Syd. 1054), e templos (c.f, RIC 69b, BMC 369) são parte da expressão religiosa presente nas moedas que se difundiam por todo o Mediterrâneo antigo. Concentrando nosso enfoque nas representações de divindades, percebemos um complexo e intenso jogo de ícones e símbolos na forma como os deuses e deusas são concebidos. Sendo uma sociedade de culto a seres antropomórficos, Roma produzia suas estátuas divinas com corpos humanos, diferenciando, em linhas gerais, o sexo das divindades. A definição de qual deus ou deusa cada imagem representa é marcada a partir de signos específicos associados ao seu simulacrum18. As imagens das divindades, desta forma, são compostas de ícones, como homem (divindade masculina) e mulher (divindade feminina), e símbolos, como coroa de louros (vitória, êxito) e coruja (sabedoria). A análise da representação de um deus ou de uma deusa em moedas requer o conhecimento semântico de cada signa e, em termos panofskianos, a interpretação iconológica das suas intenções de comunicação a partir do contexto de produção e do tema presente na cunhagem. No próximo capítulo apresentaremos, enfim, Dea Roma, uma deusa romana que aparece nas moedas desde o século III, e analisaremos as representações dessa divindade para tentar compreender as intenções de comunicação dos romanos durante o

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―A estátua de um deus (ou deusa), às vezes utilizada como recipiente para culto, permanecendo no lugar da divindade‖ (STEWART, 2004: 186).

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processo de expansão para fora da Itália, em especial com as Guerras Púnicas19 e as Guerras Macedônicas20.

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Foram três guerras contra Cartago, cidade do norte da África. A primeira entre 264 e 241, a segunda entre 218 e 201 e a terceira entre 149 e 146, terminando com a conquista romana sobre Cartago e a completa destruição da cidade. 20 Um conjunto de quatro guerras contra a Macedônia e as cidades da península grega que ela controlava desde a expansão de Alexandre, o Grande. A primeira durou de 214 até 205, a segunda de 200 a 196, a terceira Guerra Macedônica de 172 a 168, a quarta de 150 a 148, terminando com a conquista romana sobre a Grécia peninsular e a Macedônia e a completa destruição de Corinto.

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3. DEA ROMA: A PERSONIFICAÇÃO DA VRBS

Neste capítulo iremos, num primeiro momento, buscar compreender quem é Dea Roma, a personificação da cidade de Roma. Em seguida, analisaremos o corpus documental proposto para esse trabalho: dez moedas datáveis dos séculos III 21 e II nas quais Dea Roma é representada no anverso e/ou no reverso.

3.1 A deusa

As religiões antigas possuíam uma íntima e direta relação entre culto e espaço. As divindades habitavam lugares, como cidades, montes, rios, bosques e templos, e a construção de seus mitos, hinos e representações dialoga, enaltece, cria e recria os relevos e as cidades na antiguidade e as relações entre os grupos humanos e esses locais. Em Roma não foi diferente. Religião romana, como nos aponta Jörg Rüpke, ―é uma abreviação para sinais, práticas e tradições religiosas na cidade de Roma‖ (RÜPKE, 2007: p. 1). Uma das principais divindades romanas, sobretudo nos processos de expansão e conquista de cidades, é o genius. Genius, pl. genii, é o protetor de uma pessoa, sua essência divina, constituindo a personalidade divinizada dos indivíduos ao momento de seus nascimentos (FERRI, 2010, 164; CASANOVA, 2014, 52), e sua outra tipologia, genius loci, se refere a personificação ou essência divina de um lugar. O genius não era

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Todas as datas estão no período a.E.C. (antes da Era Comum). Quando ocorrer alguma referência ao período E.C. (Era Comum), isto será indicado.

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uma força geradora, mas uma entidade que existia ao momento que qualquer coisa era criada, como o nascimento de uma pessoa, a constituição de um grupo humano, a criação de uma cidade ou a edificação de um prédio, tratava-se, portanto, de uma essência física, ou espiritual, gerada a partir da criação, e que possuía a tutela desse lugar, coisa, pessoa ou grupo (BODEL, 2008: 211). Ao chegar a outra cidade, os romanos buscavam se referir à divindade tutelar do local, especialmente para convidá-la a se mudar para Roma. Nas palavras de Claudia Beltrão, Os inimigos também tinham seus deuses e, através deste rito, os romanos convidavam as divindades de seus adversários para virem à Roma, apoiando a causa romana. Para lhes convidar (euocare), o celebrante realizava a acclamatio, oferecia sacrifícios e fazia promessas solenes à divindade que se queria atrair. A euocatio era um antigo ritual, realizado no acampamento militar romano, que prometia domicílio e/ou culto, em Roma, a divindades de povos inimigos (BELTRÃO, 2010: 53).

A fórmula ritual para o convite feito à divindade tutelar da cidade inimiga chegou até nós através de Macróbio, que escreve o que teria sido o carmen euocationis realizado na terceira Guerra Púnica para trazer a divindade cartaginesa para Roma. Seja um deus ou uma deusa que tem a tutela da cidade e do povo de Cartago, e também a ti, em especial, que recebeste a tutela da cidade deste povo dirijo-te as minhas orações, venerote e suplico-te o favor que abandoneis o povo e a cidade Cartagineses, os seus locais e templos sagrados, que entregueis a sua cidade e que partais sem eles e que inicieis o seu medo, terror e esquecimento; revelados sejais vindos a Roma, para

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mim e para os meus, e aprovai e aceitai os vossos espaços e templos sagrados na nossa cidade; manifestai a vossa vontade a mim, ao povo romano e aos meus soldados para que saibamos e compreendamos. Se assim fizerdes, eu faço voto que lhe dedicarei templos e jogos 22 (Mac. Sat. III 9, 7-8).

Através de promessas de templos, jogos e culto, os romanos convidavam (e convenciam) as divindades das cidades inimigas a se mudarem para Roma, abandonando suas cidades originais e seus povos. Roma, enquanto uma cidade, também possuía uma divindade tutelar. Porém, por temor a uma possível euocatio, seu nome era um segredo, constituindo um crime pronunciá-lo. Concordamos, portanto, com o historiador Giorgio Ferri, ao pensarmos que a divindade patrona da cidade de Roma pode ser um genius, mais especificamente o genius urbis Romae (FERRI, 2010: 197). A prática religiosa romana referente a esse tipo de divindade é bastante clara ao definir que não é, em absoluto, necessário conhecer o nome do genius, afinal ele é sempre acompanhado da partícula ―de‖, ou seja, genius do paterfamilias, genius da cidade de Roma, genius do povo romano, e isso garante o segredo desejado. E continuamos com Ferri Primeiramente, é certo que o genius era um deus: genius est deus23. (...) o único ser divino ao qual pode ser atribuída uma

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Macr. Sat. III 9, 7-8: Si deus, si dea est, cui populus civitasque Carthaginiensis est in tutela, teque maxime, ille qui urbis huius populique tutelam recepisti, precor venerorque veniamque a vobis peto, ut vos populum civitatemque Carthaginiensem deseratis, loca templa sacra urbemque relinquatis, absque his abeatis, eique populo civitati metum formidinem oblivionem iniciatis, proditique Romam ad me meosque veniatis, nostraque vobis loca templa sacra urbs acceptior probatiorque sit, mihique populoque Romano militibusque meis praepositi sitis, ut sciamus intellegamusque. Si ita feceritis, voveo vobis templa ludosque facturum. 23 Censorin. De die Nat. III 1: o genius é um deus.

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presença no sítio de Roma desde a origem; de fato, com base na concepção romana referente à categoria dos genii, desde o ―nascimento‖ da cidade ele (o genius) conferiu à urbs seu bem definido ―caráter‖, a sua ―personalidade‖. (...) O genius urbis Romae existe desde quando existe a cidade, é a sua divindade tutelar ―pontual‖ e ―primordial‖. (...) o genius urbis Romae é dito siue mas siue femina24. Essa informação traz imediatamente à memória o siue deus siue dea, a fórmula ―cautelar‖ presente no carmen euocationis, o qual, como já vimos, o genius é particularmente identificado enquanto divindade ―geral‖ da cidade (FERRI, 2010: 221-222).

O genius urbis Romae, portanto, é a divindade de Roma. Dea Roma, por sua vez, é entendida por nós como o simulacrum dessa divindade. É a deusa tutelar da cidade de Roma, representada em meios imagéticos e literários, e difundida por todo o Império com culto público, geralmente dentro dos fóruns provinciais (BEARD, NORTH, PRICE, 1998: 158-160, 353-355). Dea Roma é, portanto, deusa, personificação e símbolo, ao mesmo tempo, funcionando com um culto 25 a ela enquanto personificação divina da cidade de Roma e símbolo primordial da urbs.

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Ferri se refere a uma passagem de Sérvio que diz ―No Capitólio foi consagrado um clipeus, cuja inscrição era: genio urbis Romae siue mas siue femina‖ – Et in Capitolio fuit clipeus consecratus, cui inscriptum erat: genio urbis Romae siue mas siue femina (Serv. Ad Aen. II 351). 25 O primeiro templo a Dea Roma na cidade de Roma é do século I E.C., erigido pelo Imperador Adriano.

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3.2 As representações

Ao longo do século III, podemos identificar duas fases de representações de Dea Roma nas cunhagens. No início, os símbolos atribuídos à imagem remetem a uma proposta de paz, e a cidade de Roma é apresentada como vitoriosa e produtiva. Concomitantemente, Roma enfrentava diversas batalhas e as vencia, dominando povos vizinhos e itálicos, inicialmente. Por isso, Dea Roma foi vinculada a símbolos que reforçassem aspectos sociais, militares e religiosos, a fim de indicar a prosperidade da cidade, o êxito militar em suas campanhas e a bona fortuna do solo Romanum, obtida pelos antepassados, garantida e preservada pelos atuais cidadãos.

Moeda 1: Cr. 21/1. Moeda/tipo: As. Origem: Roma ou sul da Itália. Anverso: Efígie de Dea Roma. Reverso: Efígie de Dea Roma. Datável: 275-270.

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Moeda 2: Cr. 17/1. Moeda/tipo: AE-Litra. Origem: Roma. Anverso: Efígie de Dea Roma. Reverso: Cabeça de cavalo. Inscrição no anverso: ROMANO. Inscrição no reverso: ROMANO. Datável: 269.

Moeda 3: Cr. 22/1. Syd. 21. Moeda/tipo: Didrachma. Origem: Roma ou sul da Itália. Anverso: Efígie de Dea Roma; cachorro. Reverso: Vitória segurando um ramo de palmeira. Inscrição no reverso: ROMANO. Datável: 265-242.

Moeda 4: Cr. 24/2; Syd. 58; BMC 1. Moeda/tipo: AE-Dupondius. Origem: Roma. Anverso: Efígie de Dea Roma. Reverso: Roda de seis aros. Datável: 265-242.

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Moeda 5: Cr. 24/3; Syd. 86; Haeb. pl. 24, 6. Moeda/tipo: As. Origem: Roma. Anverso: Efígie de Dea Roma. Reverso: Roda de seis aros. Período: 265-242.

Moeda 6: Cr. 26/4; Syd. 22; BMC. 44. Moeda/tipo: Meia-litra. Origem: Roma. Anverso: Efígie de Dea Roma. Reverso: Cachorro andando. Inscrição no reverso: ROMA. Datável: 234-231.

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Moeda 7: Cr. 38/6; BMC 88. Moeda/tipo: AE-Uncia. Origem: Roma. Anverso: Efígie de Dea Roma. Reverso: Proa de navio. Inscrição no reverso: ROMA. Datável: 217-215.

Podemos perceber que, no início, Dea Roma era vinculada aos símbolos que definiam a cidade de Roma, como o cavalo, a roda e a proa de navio (moedas 2, 4, 5, e 7), ou seja, ao grupo de signa que representavam e caracterizavam a urbs, temos Roma sendo a eles relacionada. Observamos também que essa relação se repete em diversos níveis de cunhagens, tendo o mesmo modelo sido utilizado para diferentes moedas (números I e II nas moedas 4 e 5), o que indica um esforço por parte do Senado em reiterar essa vinculação. Concomitantemente, Roma enfrentava diversas batalhas e as vencia, dominando povos vizinhos e itálicos, inicialmente. Por isso, Roma foi vinculada a símbolos que reforçassem aspectos sociais, militares e religiosos que indicassem a prosperidade da cidade, o êxito militar em suas campanhas e a bona fortuna do solo Romanum, obtida pelos antepassados, garantida e preservada pelos atuais cidadãos (moedas 3 e 6). Nas últimas décadas do século III, Roma enfrentou Cartago pela segunda vez, na chamada Segunda Guerra Púnica (218-201). Esse conflito provocou e desencadeou diversas mudanças na cidade romana, inclusive na imagética de Roma. O caráter largamente social e próspero que se queria e reproduzia é divido com, ou mesmo substituído por, signa militares, o que indica a importância dessa guerra e, portanto, a necessidade de um maior aparato para derrotar Cartago, como a manutenção de aliados e o afastamento de novos inimigos. Durante a Primeira Guerra Púnica (264-241) e no período entre esta e a Segunda (218-201), podemos ver uma representação imagética da personificação da cidade de

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Roma voltada ao ―interior‖ da cidade, ou seja, ao âmbito social. O elmo frígio (moedas 3 e 6) é associado como um símbolo de liberdade e prosperidade, de acordo com o dicionário de símbolos de Chevalier e Gheerbrant, enquanto a Victoria26 (moeda 3) é uma deusa alada relacionada com o êxito militar, as palmas são referentes a essa deusa e o cachorro (moeda 6) é interpretado como os deuses Lares27, divindades ligadas à terra e aos antepassados. Uma vinculação entre o elmo frígio (moedas 3 e 6), a deusa Victoria (moeda 3) e os Lares (moeda 6) nos submete a um estado próspero e profícuo para o povo romano, embora saibamos que nesse período Roma estava passando por guerras, reformas internas e com uma grande entrada de pessoas, divindades, ritos, rituais, etc. na cidade. Podemos depreender, portanto, que, mesmo não estando em um tempo pacífico, a imagem que se quer passar, neste momento, da cidade de Roma e, assim sendo, da personificação da mesma, é tranquila, vitoriosa e produtiva.

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Vitória, Victoria, divindade feminina alada que representa o êxito militar. É associada à Niké grega. Lares, divindades relacionadas à terra dos ancestrais, às casas e aos caminhos. Existiam diferentes Lares, de acordo com suas localizações, como os Compitales, referentes às encruzilhadas, Viales, às estradas, entre outros. 27

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Moeda 8: Cr. 44/5; Syd. 140; Haeb. pl. X, 22. Moeda/tipo: Denarius. 140. Origem: Sul da Itália ou Sicília. Anverso: Efígie de Dea Roma. Reverso: Dioscuri galopando. Inscrição no reverso: ROMA. Datável: 211.

Moeda 9: Cr. 44/6; Syd. 169. Moeda/tipo: AR-Quinarius. Origem: Sul da Itália ou Sicília. Anverso: Efígie de Dea Roma. Reverso: Dioscuri galopando. Inscrição no reverso: ROMA. Datável: 211.

Com o início da Segunda Guerra Púnica, as representações da personificação divina da cidade de Roma sofrem visíveis alterações. Os ―signa sociais‖ que acompanhavam as cunhagens numismáticas de Dea Roma são substituídos por símbolos guerreiros. A análise iconológica dessa composição imagética nos permite compreender uma mudança significativa nos interesses romanos face ao enfrentamento bélico contra Cartago: Roma precisava se mostrar forte e preparada para as cidades aliadas, para as cidades inimigas e para as cidades ―periféricas‖ a esse conflito. A proa de navio (moeda 7) é relacionada e enquadra o conjunto de símbolos que representam a cidade de Roma, assim como a loba, a roda, entre outros. O início da sua veiculação em meios numismáticos remonta ao final do terceiro século, cerca do ano 225, ou seja, no período entre a Primeira e a Segunda Guerra Púnica, quando ocorre um reforço e um aperfeiçoamento da marinha romana.

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Os Dioscuri (moeda 8) são divindades de origem grega relacionadas à guerra e sua adoção como patronos do exército romano é presente nas moedas desde o início do século III, quando aparecem com a forma de Jano 28, ou seja, duas faces imberbes. Porém, ao término desde século, no período da Segunda Guerra Púnica, cerca do ano 211, eles aparecem inteiros, armados e montados em seus cavalos. A mudança na iconografia de Dea Roma e das divindades presentes nas moedas onde ela aparece é notória. Um pouco antes do início da Segunda Guerra Púnica (mas com movimentações desde o término da Primeira) a cidade de Roma passa por grandes mudanças no âmbito militar (aqui enfocaremos este, porém em diversos outros ocorreram mudanças), principalmente no aprimoramento do exército, como podemos ver na imagética dos Dioscuri29, a qual os coloca como imponentes e grandiosos no campo de batalha, e da criação de uma marinha, com a devida especialização da guerra e do poder bélico navais. Percebemos, dessa forma, a intensificação dos elementos militares nas representações iconográficas da personificação divina da cidade de Roma. Com um início social e próspero, os interesses comunicativos romanos sofreram alterações ao término do século III a.E.C., face à Segunda Guerra Púnica, que resultaram numa Dea Roma mais guerreira nas cunhagens desse período.

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Jano, Ianus, divindade latina representada por homem com duas faces barbadas e é associado à passagem do tempo; ao passado e ao futuro. O mês de Janeiro, o primeiro do ano, tem seu nome por causa desse deus. 29 Dioscuri, sing. Dioscurus, divindades gregas patronas do exército romano. Castor e Pollux, os Dioscuri, são irmãos, filhos de Zeus, sendo o primeiro um deus e o segundo mortal. Quando Pollux morreu, Castor pediu a seu pai que retirasse sua divindade em troca da vida de seu irmão, fazendo com que os dois continuassem suas mortais vidas juntos. Segundo a lenda, os Dioscuri auxiliaram Roma na Batalha do Lago Régulo e garantiram sua vitória, tornando-se, assim, os patronos do exército romano.

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Moeda 10: Cr. 287/1; Syd. 530; BMC 562. Moeda/tipo: Denarius. Origem: Roma. Anverso: Efígie de Dea Roma com elmo coríntio. Reverso: Dea Roma sentada sob uma pilha de escudos, usando um elmo coríntio e segurando uma lança d.; pássaros voando; elmo; loba alimentando os gêmeos. Inscrição no anverso: ROMA. Datável: 115-114.

Após as Guerras Púnicas, Roma inicia sua campanha para o oeste (península ibérica e sul das Gálias) e para o leste (Grécia, Anatólia, etc.). Ao longo do século II, diversas cidades são combatidas, dominadas e saqueadas, levando os espólios, parte dos mais importantes e famosos produtos da cultura mediterrânica, para a urbs, e os apresentando em grandes e pomposos triunfos. Neste momento, observamos uma Dea Roma inédita: não apenas sua efígie é representada, mas o corpo inteiro. E sua postura bélica é reforçada por elmos militares, lanças, pilhas de escudos e armaduras (onde ela confortavelmente se senta), adicionando, ainda, um caráter predestinado ao seu simulacrum, no momento em que signa de momentos célebres e míticos, como a fundação da cidade (e.g, a loba amamentando os gêmeos e os pássaros do prodígio de Rômulo) são incorporados a ela (moeda 10).

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Podemos afirmar, dessa forma, que os séculos III e II foram importantes para a história de Roma e do Ocidente por fornecer as bases necessárias para a experiência imperialista romana. Roma precisou de meios para expandir sua cultura e modo de vida, o que podemos chamar de romanização. Com a iconografia de Dea Roma não foi diferente, alterando sua representação visual de aspectos sociais para um caráter mais agressivo-militar. ―Por essa razão, a deusa se constituiu num reduto de características e símbolos mais frequentemente associados com as origens e com as divindades cívicas‖ (FERRI, 2010: 226). Seu simulacrum, com atributos divinos, também estava em pleno processo de construção, aprimoramento e consolidação, refletindo os ideais desejados e configurando mensagens e imagens aos povos antigos.

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Conclusão

Nesta monografia buscamos analisar os mecanismos de comunicação de Roma com as demais cidades e povos do Mediterrâneo. Para tal, iniciamos o texto com um panorama dos séculos III e II a.E.C. a fim de compreender a urbs nesse momento de muita incerteza. As fronteiras estão se ampliando ao passo que os romanos estão atuando e conquistando diversas cidades, inicialmente no Lácio, depois ao longo da península itálica e, então, ao longo do Mediterrâneo. Internamente, Roma também está em constante mudança. Cada vez mais pessoas estão migrando para a cidade romana e isso leva a alterações nos mais diversos âmbitos: estradas são abertas e aquedutos são construídos a fim de integrar essas novas pessoas, assim como os rituais e cultos foram incorporados ou reformulados para assegurar o bom funcionamento da urbs. A documentação utilizada – moedas – exigiu que nos debruçássemos sobre os aportes teóricos e metodológicos concernentes à numismática e à iconografia. Definimos, então, as moedas como parte dos objetos que representam a identidade romana e, além disso, um meio de comunicação sem precedentes, pois, por percorrerem grandes distâncias e serem utilizadas diariamente, estavam, gradualmente, presentes na vida de todo o Mediterrâneo antigo. As imagens nelas cunhadas, através de ícones e símbolos, transmitiam mensagens e marcavam as intenções de comunicação dos romanos. Dea Roma, o simulacrum do genius urbis Romae, é a divindade tutelar da cidade romana e funcionava, nas suas representações em moedas, como o real interesse de Roma frente ao Mediterrâneo. A análise das cunhagens com a presença dessa deusa,

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portanto, é capaz de nos dar indícios acerca das intenções romanas face ao mundo antigo. Podemos identificar, dessa forma, duas fases nas cunhagens durante o século III a.E.C.: antes da Segunda Guerra Púnica e durante esta. No primeiro momento, os signa veiculados junto à imagem de Dea Roma podem ser interpretados iconologicamente como símbolos de prosperidade e bonança. Já durante o segundo confronto com Cartago, percebemos uma mudança significante ao passo que identificamos uma militarização da imagem de Dea Roma com a presença de ícones vinculados à guerra. No século II a.E.C., a representação de Dea Roma tem mais uma significativa mudança. Com a vitória sobre Cartago e sobre as cidades gregas, Roma se vê como potência dominante no Mediterrâneo e vincula à deusa símbolos associados às origens da cidade, sobretudo à fundação da urbs.

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Apêndice – fichas metodológicas da documentação numismática 1) Moeda/tipo: As. Datável: 275-270 a.E.C. Localização: Roma ou sul da Itália. Anverso: Efígie de Dea Roma com elmo d.. Reverso: Efígie de Dea Roma com elmo e.. Cr. 21/1. Unidades sintagmáticas Signo – Intenção de comunicação Efígie de Dea Roma – personificação da cidade de Roma Interpretação Início das cunhagens com Dea Roma. Sua dupla representação, em ambos os lados (anverso e reverso), marcam, de maneira pontual e significativa – Roma possui uma cara. 2) Moeda/tipo: AE-Litra. Período: 269 a.E.C. Localização: Roma Anverso: Efígie de Dea Roma com elmo d.. Reverso: Cabeça de cavalo. Inscrição no anverso: ROMANO. Inscrição no reverso: ROMANO. Cr. 17/1g. Unidades sintagmáticas Signo – Intenção de comunicação Efígie de Dea Roma – personificação da cidade de Roma. Cabeça de cavalo – cidade de Roma. Interpretação O cavalo é um símbolo representante da cidade de Roma, sua associação com Dea Roma é importante para a inclusão desta com o conjunto de signa relativos à urbs.

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3) Moeda/tipo: Didrachma. Período: 265-242 a.E.C. Localização: Roma ou alguma cidade no sul da Itália. Anverso: Efígie de Dea Roma com elmo frígio d.; cachorro. Reverso: Victoria segurando um ramo de palmas preso ao solo d.; I. Inscrição no reverso: ROMANO. Cr. 22/1; Syd. 21. Unidades sintagmáticas Signo – Intenção de comunicação Efígie de Dea Roma – personificação da cidade de Roma Elmo frígio – prosperidade Cachorro – Lares Victoria – êxito militar Palmas – relacionado com a Victoria Interpretação Roma começa a tomar características tanto militares, com as palmas e sua associação com Victoria, quanto sócio-religiosas, com os Lares, divindades ligadas à terra e aos antepassados, e o elmo frígio, símbolo de prosperidade. 4) Moeda/tipo: AE-Dupondius. Período: 265-242 a.E.C. Localização: Roma. Anverso: Efígie de Dea Roma d.; II. Reverso: Roda com seis aros; II. Cr. 24/2; Syd. 58; BMC 1. Unidades sintagmáticas Signo – Intenção de comunicação Efígie de Dea Roma – personificação da cidade de Roma Roda – cidade de Roma Interpretação A roda é um símbolo representante da cidade de Roma, sua associação com Dea Roma é importante para a inclusão desta com o conjunto de signa relativos à urbs.

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5) Moeda/tipo: As. Período: 265-242 a.E.C. Localização: Roma. Anverso: Efígie de Dea Roma d.; I. Reverso: Roda com seis aros; I. Cr. 24/3; Syd. 86; Haeb. pl. 24, 6. Unidades sintagmáticas Signo – Intenção de comunicação Efígie de Dea Roma – personificação da cidade de Roma Roda – cidade de Roma Interpretação A roda é um símbolo representante da cidade de Roma, sua associação com Dea Roma é importante para a inclusão desta com o conjunto de signa relativos à urbs. 6) Moeda/tipo: Meia-Litra. Período: 234-231 a.E.C. Localização: Roma. Anverso: Efígie de Dea Roma com elmo frígio d.. Reverso: Cachorro andando. Inscrição no reverso: ROMA. Cr. 26/4; Syd. 22; BMC. 44. Unidades sintagmáticas Signo – Intenção de comunicação Efígie de Dea Roma – personificação da cidade de Roma Elmo frígio – prosperidade Cachorro – Lares Interpretação A vinculação de Dea Roma com os Lares, usando um elmo frígio, permite uma interpretação da prosperidade romana relacionada com a terra dos ancestrais, o que reitera um caráter de predestinação.

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7) Moeda/tipo: AE-Uncia. Período: 217-215 a.E.C. Localização: Roma. Anverso: Efígie de Dea Roma e.. Reverso: Proa d.. Inscrição no reverso: ROMA. Cr. 38/6; BMC 88. Unidades sintagmáticas Signo – Intenção de comunicação Efígie de Dea Roma – personificação da cidade de Roma Proa – cidade de Roma Interpretação A proa é um símbolo representante da cidade de Roma, sua associação com Dea Roma é importante para a inclusão desta com o conjunto de signa relativos à urbs. 8) Moeda/tipo: Denarius. Período: 211 a.E.C. Localização: Sul da Itália ou Sicília. Anverso: Efígie de Dea Roma d.; X. Reverso: Dioscuri galopando. Inscrição no reverso: ROMA. Cr. 44/5; Syd. 140; Haeb. pl. X, 22. Unidades sintagmáticas Signo – Intenção de comunicação Cabeça de Roma – personificação da cidade de Roma Dioscuri – divindades militares Interpretação Os Dioscuri são divindades de origem grega relacionadas com as campanhas militares e tornam-se patronas do exército romano, sua vinculação com Dea Roma marca o início da militarização iconográfica no simulacrum desta persona.

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9) Moeda/tipo: AR-Quinarius. Período: 211 a.E.C. Localização: Sul da Itália ou Sicília. Anverso: Efígie de Dea Roma d.; V. Reverso: Dioscuri galopando. Inscrição no reverso: ROMA. Cr. 44/6; Syd. 169. Unidades sintagmáticas Signo – Intenção de comunicação Efígie de Dea Roma – personificação da cidade de Roma Dioscuri – divindades militares Interpretação Os Dioscuri são divindades de origem grega relacionadas com as campanhas militares e tornam-se patronas do exército romano, sua vinculação com Dea Roma marca o início da militarização iconográfica no simulacrum desta persona. 10) Moeda/tipo: Denarius. Período: 115-114 a.E.C. Localização: Roma.. Anverso: Efígie de Dea Roma com um elmo coríntio d.; X. Reverso: Roma, sentada sob uma pilha de escudos, usando um elmo coríntio e segurando uma lança d.; pássaros voando e. e d.; elmo; loba alimentando os gêmeos. Inscrição no anverso: ROMA. Cr. 287/1; Syd. 530; BMC 562. Unidades sintagmáticas Signo – Intenção de comunicação Cabeça de Roma – personificação da cidade de Roma Elmo coríntio – elmo da cidade de Corinto Pilha de escudos – defesa inimiga Lança – símbolo militar e fálico (apotropaico) Pássaros voando – augúrio de Rômulo Loba com os gêmeos – fundação da cidade de Roma Interpretação Ratificação do poderio de Roma, do sucesso militar, social e religioso da cidade desde a sua fundação.

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