Desenvolvimento de Sistema Computacional para auxílio ao Desenvolvimento da Audição em Crianças Escolares

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Desenvolvimento de Sistema Computacional para auxílio ao Desenvolvimento da Audição em Crianças Escolares Elisangela Maschio de Miranda1, Anita Maria da Rocha Fernandes1, Sheila Andreoli Balen2, Simone Mariotto Roggia2, Karla Jean Zimmerman2, Sinara dos Santos Hütner2, Willian Norberto Westphall, Raphael Poolney Teixeira de Jesus1, Mariane Perin da Silva2, Ademir Antonio Comerlatto Junior2 1

Laboratório de Inteligência Aplicada – LIA (UNIVALI) Rua Uruguai, 458 – Centro – CEP: 88302-202 – Itajaí - SC Telefone/Fax: (47) 3341-7863 2

Instituto de Fonoaudiologia (UNIVALI) Rua Uruguai, 458 – Centro – CEP: 88302-202 – Itajaí – SC {elis,anita.fernandes, sheilabalen, sinara, raphael_poolney}@univali.br, [email protected], [email protected], {simoneroggia, marianeperin, junior102pm}@yahoo.com.br

Abstract. SARDA was developed to reduce/eliminate the language and/or learning difficulties in children with hearing issues or auditive disturbs, as well to improve the development of hearing skills in listener children. This paper describes SARDA's development and the results in its application in the educational context. The same was applied in second grade students of a municipal school in Itajaí, SC and the results showed an increase in the abilities of integration and binaural separation measured by the alternate disyllable test, as well as phonological conscientiousness. Based in this preliminary results we can conclude that SARDA is a system that can be useful to teachers as an helpful instrument for the students development, promoting health and education for them. Keywords: Games, Auditory Rehabilitation, Hearing Loss. Resumo. O SARDA tem por objetivo reduzir/eliminar dificuldades de linguagem e/ou aprendizagem em crianças portadoras de distúrbios auditivos ou deficientes auditivos, bem como para promover o desenvolvimento de habilidades auditivas em crianças ouvintes. Este artigo descreve o desenvolvimento do SARDA e os resultados de sua aplicação no contexto educacional. O mesmo foi aplicado em alunos da segunda série de uma Escola Municipal em Itajaí, SC e observou-se na análise dos resultados melhora nas habilidades de integração e separação binaural medidas pelo teste de dissílabos alternados, bem como de consciência fonológica. Com base nestes resultados iniciais pode-se concluir que o SARDA é um sistema que poderá ser útil aos professores como um instrumento auxiliar para o desenvolvimento dos alunos, promovendo assim a saúde e educação das mesmas. Palavras-chave: Jogos, Reabilitação Auditiva, Perda Auditiva.

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1. Introdução A deficiência auditiva acomete 16,7% da população segundo dados do IBGE (2003). De acordo com Northen e Downs (2005), a perda auditiva é uma desvantagem, pois pode levar ao atraso no desenvolvimento da fala e da linguagem, problemas sociais e emocionais, bem como ao fracasso escolar. Os autores ainda destacam que todos esses problemas podem ser minimizados, pois um tratamento efetivo reduz significativamente a incapacidade da perda auditiva. Dentre os graus e tipos de deficiência auditiva existe uma preocupação referente às perdas auditivas leves e moderadas e aos distúrbios de processamento auditivo, pois são mais difíceis de serem detectados e pode gerar prejuízos ao desenvolvimento da audição, atenção, memória e linguagem das pessoas que as possuem, sendo que por vezes podem produzir impactos sociais, educacionais e psicológicos importantes. Os portadores de distúrbios do processamento auditivo apresentam limiares auditivos dentro dos padrões da normalidade, mas têm dificuldade em uma ou mais das habilidades auditivas: atenção seletiva e sustentada, memória de curto prazo e memória operacional, integração e separação binaural das informações. O não diagnóstico e tratamento destes casos pode acarretar várias dificuldades no processo escolar, sendo em grande parte o causador dos insucessos escolares. De acordo com Alves e Lemes (2005), crianças que possuem alguma deficiência auditiva necessitam de intervenção terapêutica formada por técnicas, estratégias e procedimentos que sejam transformadores, prazerosos e afetivos, o que faz com que a construção de um software interativo possa ser de grande utilidade para esta intervenção. Neste sentido, constata-se uma carência de recursos terapêuticos interativos apropriados à reabilitação e a educação dos distúrbios auditivos no Brasil e que também pudessem ser utilizados como agente de promoção da saúde auditiva. Assim, no contexto educacional, a aplicação do SARDA tem como objetivo auxiliar professores na promoção da saúde auditiva, visando desenvolver habilidades auditivas que são importantes para o processo educacional, pois crianças que apresentam refinada habilidade em localizar a fonte sonora, discriminar os sons da fala, atender seletivamente e de forma sustentada para a informação auditiva irão poder decodificar, reter e resgatar de forma mais eficiente as informações transmitidas pelos mesmos. O objetivo deste projeto foi desenvolver um Software Auxiliar na Reabilitação de Deficientes Auditivos (SARDA) baseado no software Fast Forword [Scientific Learning, 2005]. Nos Estados Unidos o software Fast Forword, desenvolvido pelos pesquisadores do Scientific Learning, tem sido amplamente utilizado, tanto no contexto terapêutico quanto no contexto educacional, para estimular o desenvolvimento das habilidades auditivas necessárias para a aprendizagem. O objetivo deste artigo é descrever o SARDA e os resultados obtidos pela sua aplicação no contexto educacional.

2. Metodologia A equipe de desenvolvimento do SARDA foi composta de pesquisadores das áreas de Ciência da Computação, Fonoaudiologia, Design e Jornalismo. A construção do software seguiu a seguinte metodologia: (i) levantamento de requisitos do software; XIX Simpósio Brasileiro de Informática na Educação (SBIE 2008)

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(ii) análise; (iii) projeto; (iv) implementação; (v) validação e testes; (vi) implantação. O SARDA foi desenvolvido utilizando PHP, JavaScript, PostgreSQL e Flash. O levantamento dos requisitos foi realizado durante reuniões entre os membros da equipe, a análise do software Fast Forword - de forma aprofundada - e de softwares nacionais de estímulo de habilidades auditivas, bem como estudo de artigos científicos na área de fonoaudiologia, com o objetivo de fundamentar teoricamente a escolha das habilidades auditivas a serem estimuladas pelo software. Mediante o estudo aprofundado do software Fast ForWord constatou-se que, considerando a faixa etária e as características das crianças a serem estimuladas com o SARDA, o módulo do Fast ForWord mais apropriado para a estimulação das habilidades auditivas seria o Fast ForWord Language. Este módulo contém exercícios que estimulam quatro áreas de habilidades primárias, ou seja, precisão de escuta, consciência fonológica, memória de trabalho e estruturas de linguagem [Scientific Learning 2005]. Com relação ao estudo de outros softwares que também estimulam habilidades auditivas, realizou-se uma análise dos softwares disponíveis no mercado nacional e internacional que utilizam estratégias relacionadas à estimulação da audição como auxílio para o desenvolvimento infantil. Os softwares foram analisados sob vários aspectos: tempo das atividades, tipos de atividades, criatividade dos cenários, cores, tipo de instruções utilizadas, forma de apresentação das respostas, voz dos personagens, entre outros. Os CDs analisados foram: Série do Coelho Sabido, Brincando com os Sons, Madeleine, Earobics 1 e 2. Todos os softwares nacionais analisados trabalham as habilidades referidas, mas o SARDA possui um diferencial importante: um banco de dados onde são guardadas as informações dos exames fonoaudiológicos realizados antes e depois do processo de estimulação, bem como o desempenho de cada criança nos jogos. Com estes dados em mãos os professores poderão acompanhar o desempenho de seus alunos, e ao verificar dificuldades encaminhar a um fonoaudiólogo para que o devido tratamento seja efetuado. A partir dos estudos feitos foram definidas as habilidades auditivas que seriam trabalhadas no SARDA, levando em consideração as características da população para a qual o software seria destinado, ou seja, crianças na faixa etária de sete a nove anos de idade. A partir das reuniões realizadas entre as equipes definiu-se que seriam implementados cinco jogos, inseridos em um portal web, e que haveriam quatro categorias de usuários: (i) administrador; (ii) fonoaudiólogo; (iii) professor; e (iv) criança. De acordo com a categoria do usuário, ele terá acesso a determinadas funcionalidades do sistema. Os professores podem selecionar se o aluno irá fazer todo um jogo primeiro e depois dar início a outro, ou se irá realizar a primeira fase de cada jogo, depois realizar a segunda fase de cada jogo, e assim sucessivamente, e também pode bloquear e desbloquear jogos. Já o fonoaudiólogo pode programar para que os jogos iniciem de qualquer fase, bem como bloquear e desbloquear os mesmos. O usuário administrador possui acesso a todos os parâmetros do sistema, mas não pode alterar exames cadastrados pelo fonoaudiólogo e nem alterar resultados dos jogos realizados pelas crianças. Os exames realizados nas crianças podem ser

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cadastrados e alterados somente pelo fonoaudiólogo, e o professor e administrador possuem somente direito a visualização destas informações. Além disso, o fonoaudiólogo pode cadastrar crianças que sejam suas pacientes, alterar seu próprio cadastro, mas não possui acesso aos dados de pacientes de outros fonoaudiólogos. O usuário fonoaudiólogo tem acesso ao cadastro de dados referentes à criança, tais como: a) aspectos de saúde em geral; desenvolvimento neuropsicomotor; de linguagem, auditivo e escolar, antecedentes familiares e psicopatológicos da criança; b) avaliação fonoaudiológica; c) avaliação audiológica básica, eletrofisiológica e do processamento auditivo. Também pode alterar parâmetros referentes ao jogo, que serão modificados de acordo com a avaliação realizada previamente pelo próprio fonoaudiólogo, podendo ser diferenciada de criança a criança. Já o usuário professor somente acessará o cadastro de seus alunos. Foram desenvolvidos relatórios que exibem a evolução dos pacientes/alunos nos jogos e qual a porcentagem de cada fase em que se encontram. Estes relatórios foram definidos pela equipe de fonoaudiologia, pois permitem que possa ser realizada uma análise de como está o comportamento de cada paciente em cada jogo, e assim verificar possíveis problemas auditivos que os mesmos possam ter, ou mesmo se os mesmos estão evoluindo nas habilidades auditivas estimuladas. Quanto aos jogos, eles estão situados em um parque ecológico, tendo como personagens principais um leão, um mico-leão, um jacaré, um tucano e um golfinho, além do menino sardentinho. Para a escolha dos animais foi aplicada uma pesquisa para 47 alunos da segunda série fundamental de uma escola municipal de Itajaí, em que eles deveriam escolher seis animais da seguinte lista: mico-leão, jacaré, tucano, girafa, golfinho, arara, leão, boto, gorila, tartaruga, onça, elefante, coruja e girafa. Ao todo, foram desenvolvidos seis jogos. O primeiro jogo denominado Procurando o Mico Mané (Figura 1) utiliza estímulos não verbais (tom puro na freqüência de 1000 Hz), com diferentes durações e intervalos entre os estímulos. A criança, usando fones de ouvido, tem que localizar em qual direção (esquerda ou direita) está sendo apresentado o estímulo. Neste jogo é trabalhada, principalmente, a habilidade auditiva de localização da fonte sonora. Esta habilidade está relacionada com a determinação da direção e distância a que o estímulo sonoro está em relação ao ouvinte. Ocorre, segundo Russo e Behlau (1993, p.2), a partir das diferenças interaurais de tempo, fase e intensidade dos estímulos sonoros que atingem as duas orelhas, havendo, portando, a necessidade de audição binaural. Segundo Boothroyd (1982), a habilidade de localização auditiva contribui com os processos de atenção auditiva e é determinada pelos mecanismos sensoriais e neurais da audição. Para que ela ocorra, requer a habilidade de interpretar diferenças sutis de intensidade, de espectro e de tempo de chegada dos sons às duas orelhas. Esta estratégia tem como personagem um mico leão dourado, que com o passar das etapas recebe prêmios temáticos da estratégia como uma prancha, um carro e um passeio para a praia.

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Figura 1. Tela do jogo Procurando o Mico Mané

No segundo jogo, Pulando com Dinho Golfinho (Figura 2), a criança tem que discriminar a freqüência do estímulo apresentado. Os tipos de sons utilizados serão estímulos não-verbais diferindo quanto à freqüência. Os níveis de dificuldade desta estratégia irão variar quanto à diferença entre as freqüências, bem como quanto ao intervalo entre os estímulos, conforme ordem crescente de dificuldade. Nesse jogo é trabalhada, principalmente, a habilidade auditiva de discriminação auditiva, que é definida por Russo e Behlau (1993, p.2) como o processo de diferenciação de sons acusticamente similares, mas com freqüência, duração e/ou intensidade diferentes. Por ser uma habilidade complexa dependem também de outras funções como a atenção, o conhecimento e a memória, sendo que o processo de discriminação só ocorre após o padrão ser internamente resintetizado, comparado com o modelo interno e então categorizado (PUPO, 1981, p.13). O personagem desta estratégia é um golfinho de água salgada que com o passar das etapas é presenteado com uma esposa e um filhote.

Figura 2. Tela do jogo Pulando com Dinho Golfinho

No terceiro jogo, Cantando com Tuca Tucano (Figura 3), a criança ouve um estímulo (som alvo) e em seguida tem que distinguir entre dois outros sons qual é igual ao som alvo apresentado. Serão utilizados estímulos verbais com estruturas silábicas diferentes – CVC, CCV, VCV. Inicialmente os estímulos verbais utilizados são expandidos, ou seja, aumentados em sua duração, passando progressivamente para a duração normal da fala. Nesta estratégia a principal habilidade auditiva requisitada é a discriminação auditiva para sons verbais. O personagem desta atividade é um tucano que com o passar das etapas ganha diferentes prêmios relacionados ao seu sonho: ser um cantor famoso.

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Figura 3. Tela do jogo Cantando com Tucano Tuca

No quarto jogo, Jogando com o Zé Jacaré (Figura 4), a temática é um jacaré jogador de futebol que é controlado pela criança. Dessa forma a criança tem que prestar atenção no estímulo que está sendo apresentado (o estímulo repete continuamente) e quando ouvir um estímulo diferente deve largar o mouse. Neste momento o animal chuta a bola. Se ela largar o mouse no momento certo marcará o gol, caso erre, a bola irá para fora. Os estímulos são verbais e os níveis de dificuldade da estratégia são determinados por encontros vocálicos, CVC e VCV com diferenças de ponto, modo e sonoridade dos fonemas. Nesta atividade está envolvida principalmente a habilidade de atenção sustentada. Russo e Santos (1993, p.96) definiram a atenção como sendo a habilidade para persistir ouvindo durante um período de tempo, focalizando a audição para um estímulo predeterminado. Envolve a monitorização do sinal acústico, priorizando-o em relação aos demais sinais competitivos a fim de que possa tornar-se significativo (Russo & Behlau, 1993), mesmo que o sujeito necessite manter sua atenção primária em outra modalidade sensorial (Pereira, 1993). O principal personagem desta tarefa é um jacaré, que tem como objetivo ser um jogador de futebol na copa do mundo.

Figura 4. Tela do jogo Jogando com o Zé Jacaré

O jogo denominado Correndo com leão Léo (Figura 5) têm como finalidade auxiliar a criança a desenvolver a atenção seletiva por meio de uma brincadeira em que a criança tem que detectar palavras, sentenças e rimas identificando-as nas opções apresentadas, isso em meio ao ruído competitivo. Estes estímulos verbais que são detectados têm variações de dificuldade caracterizadas por diferenças de ponto, modo e sonoridade dos fonemas. A dificuldade de ruído competitivo segue a temática de que Léo é um corredor de rally e estará correndo por diferentes pistas e, dessa forma, esses ruídos é uma das dificuldades manipuladas pelo software e encontradas pela criança. Outra dificuldade estará na diminuição da expansão do estímulo. De acordo com

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Atkinson et al. (2002) a atenção seletiva corresponde ao processo de seleção, ou seja, a capacidade de selecionar algumas informações para um exame mais detalhado e ignorar outras. O personagem desta estratégia é um leão piloto de corridas que com o passar do tempo conquista a fama ao ultrapassar os diferentes obstáculos.

Figura 5. Tela do jogo Correndo com Leão Léo

O último jogo, o Memória Animal (Figura 6), desenvolve a habilidade de memória auditiva, visto que neste jogo a criança conta apenas com estímulos auditivos. A tarefa a ser realizada consiste em formar o máximo de pares possíveis em menos tentativas. Os estímulos auditivos são verbais, variando entre as etapas em duração, sendo uma expansão de 100% na etapa inicial, 50% na fase intermediária e fala normal na etapa avançada. A dificuldade é dada apartir do número de cartas, que varia entre as fases em quatro, oito, doze e dezesseis cartas e também pela diferença entre os fonemas vocálicos da estrutura silábica consoante-vogal, tendo por base o valor da escala de sonoridade proposta por Selkirk (1984 apud Matzemauer, 2004). Os estímulos são compostos de consoante-vogal e a diferença entre os níveis é composta pelas características acústicas e articulatórias das vogais e consoantes do português. No caso dos fonemas consonantais, as diferenças são assinaladas pelo modo articulatório, ponto articulatório e sonoridade. No nível 1 a diferença silábica é marcada por fonemas consonantais que diferem quanto modo articulatório (plosivas x fricativas). No nível 2 a diferença silábica é marcada por fonemas consonantais que diferem quanto ao ponto articulatório (labial x dental/alveolar, labial x velar, dental/alveolar x velar, palato/alveolar x labial, dental/alveolar x palato/alveolar). No nível 3 a diferença silábica é marcada por fonemas consonantais que diferem quanto à sonoridade (surdos x sonoros). Neste jogo as crianças serão acompanhadas pelo mascote Sardentinho.

Figura 6. Tela do jogo Memória Animal

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3. Resultados Ao projetar o SARDA visualizou-se que a realidade do professor é de estar a frente de crianças, e o mesmo não tem conhecimento, muitas vezes, da presença ou não da deficiência auditiva, além do desconhecimento do tipo e grau da deficiência auditiva. Por outro lado, caso o mesmo tenha conhecimento da deficiência auditiva do seu aluno e das características dessa não poderá ter ações individualizadas a este educando em relação aos demais, tanto por questões da sua formação enquanto educador quanto pelas limitações do contexto de sala de aula. Deve-se frisar aqui que o software foi desenvolvido para auxiliar crianças com deficiência auditiva, que utilizem dispositivos eletrônicos (aparelho de amplificação sonora individual ou implante coclear) e que utilizem a linguagem oral como uma forma de comunicação. O SARDA é um instrumento a ser utilizado pelo professor também com crianças com audição normal, pois envolve o desenvolvimento de habilidades auditivas de localização da fonte sonora, discriminação auditiva, atenção seletiva e sustentada, bem como memória auditiva. Estas habilidades auditivas são desenvolvidas e aperfeiçoadas, sendo que a faixa etária de seis a oito anos que coincide com o início do processo escolar formal, é o período de pico neuromaturacional e psíquico da criança. Desta forma, o professor ao usar o SARDA poderá auxiliar a promover a saúde auditiva e de linguagem das crianças. A aplicação no contexto educacional foi com crianças da segunda série de uma escola municipal de Itajaí, com um número inicial de 20 crianças, sendo que nenhuma delas possuía deficiência auditiva. Este número, até o final, foi se modificando, pois algumas crianças trocaram de escola durante o processo, bem como chegaram novas crianças por transferência. A escola possuía 10 microcomputadores, então 10 crianças eram estimuladas enquanto as outras 10 realizavam atividades educacionais determinadas pela professora. As estimulações foram realizadas no período de dois meses, dois dias na semana, por 50 minutos. Antes da aplicação do software foram realizados os seguintes exames pelos pesquisadores fonoaudiológicos nas crianças: triagem audiométrica, timpanometria, teste de dissílabos alternados e o teste de Consciência Fonológica (CONFIAS). Após a aplicação do SARDA os exames foram reaplicados e foram constatados os seguintes resultados: • Diminuição da média de erros em todas as situações de escuta do teste de dissílabos alternados, demonstrando que o SARDA contribuiu para uma melhora nas habilidades de integração e separação binaural dos alunos. Estas habilidades estão diretamente envolvidas na eficácia e eficiência do processamento auditivo; • A Consciência Fonológica no nível de sílaba já apresentava desempenhos máximos antes da aplicação do SARDA, sendo a tarefa de identificação de rima, exclusão silábica e transposição silábica as que obtiveram maiores mudanças após o SARDA; e • Na consciência fonológica no nível fonêmico houve melhora no desempenho de exclusão e transposição fonêmica, sendo que as demais, exceto pelas

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habilidades de síntese e segmentação fonêmica, apresentavam praticamente o máximo de desempenho. Relacionado ao software, foi aplicado com as crianças que finalizaram a estimulação um questionário com perguntas relacionadas ao software, e obtiveram-se os resultados mostrados na Figura 7.

Legenda: 1. Você entendeu bem como jogar?

4. Você gostou dos personagens do jogo?

2. Você entendeu para que serviam os botões?

5. Você gostou das animações e dos desenhos?

3. Você entendeu a pontuação?

6. Você achou divertido jogar?

Figura 7. Percentual de resposta para cada pergunta do questionário aplicado com os alunos da segunda série de uma escola municipal de Itajaí.

Quando os alunos da segunda série foram questionados sobre qual o jogo que mais gostaram as mesmas responderam predominantemente ao jogo do “Correndo com o Leão Léo” e “Jogando com o Zé Jacaré”.

Figura 8. Percentual de resposta dos alunos da segunda série para cada item da pergunta 8 do questionário: Assinale o jogo que você mais dificuldade.

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Em relação aos jogos que apresentaram mais dificuldade a maior parte das crianças referiu-se ao jogo “Jogando com o Zé Jacaré”, porém houve uma distribuição da amostra de alunos entre todos os jogos, sendo que 5,3% disseram que não tiveram dificuldade em nenhum dos jogos (Figura 8). Estes podem ser considerados resultados iniciais, pois o SARDA apresenta possibilidades de aprimoramento e de foco, mas já pode-se verificar a melhora dos processo auditivo e na consciência fonológica nas crianças, o que evidencia que a aplicação do SARDA atingiu seu objetivo. Destaca-se que ao referir melhora no processamento auditivo significa apontar que as habilidades auditivas, em especial, relacionadas a eficácia e eficiência em processar diferentes estímulos simultaneamente, bem como o nível atencional para a informação auditiva foram aperfeiçoados. Por outro lado, a consciência fonológica é um dos processos cognitivos essenciais para o aprendizado da escrita. Assim, acredita-se que o SARDA possa otimizar o desenvolvimento destas habilidades fornecendo mais condições para que as crianças possam usufruir de outros momentos em sala de aula com o professor e, isso acabe por refletir em crianças com adequado aprendizado e, conseqüente, diminuição de problemas escolares, de leitura e escrita e de evasão escolar.

4. Conclusões No Brasil ainda há necessidade de se ter recursos interativos e atraentes as crianças e que as auxiliem a desenvolver as habilidades auditivas como recurso terapêutico e como recurso educacional. Por vezes observam-se as professoras de préescola e primeiras séries escolares auxiliando pouco no desenvolvimento destas habilidades auditivas. Isto não se deve em parte a poucas informações e problemas nos programas de capacitação de professores, porém também se deve a falta de recursos que instrumentalizem o professor para esta finalidade e prática. Este fator chega a ser um contra senso visto que as professoras requisitam da criança ao longo do período escolar cerca de 70 a 80% destas habilidades, isto é, a maior parte das informações transmitidas pelo professor em sala de aula é realizada por meio da voz falada com predominância de estímulos auditivos. Esses por sua vez, são temporários e abstratos e requerem o desenvolvimento eficaz da audição, atenção, processamento e memória. A aplicação do SARDA no contexto educacional apontou para um novo paradigma: o envolvimento da escola no desenvolvimento das habilidades auditivas auxiliando na promoção da saúde auditiva e, conseqüentemente, no desenvolvimento de linguagem e de aprendizagem. O relato dos professores e diretora na escola em que o SARDA foi aplicado foi reverberante no fato que “as crianças tornaram-se mais atentas”. Esta frase representa qualitativamente o avanço que o SARDA poderá propiciar as crianças com desenvolvimento escolar normal, e a possibilidade de aperfeiçoar sua atenção auditiva e com isso poder ter acesso as informações transmitidas pela professora em sala de aula. Houve alguns problemas no decorrer do processo de estimulação, como a troca da professora da escola, problemas na conexão de internet e transferência de alunos tanto para outras escolas como alunos novos chegando durante o processo de estimulação. Apesar disso, o SARDA mostrou-se como um novo instrumento disponível e acessível aos professores no intuito de auxiliar que as crianças tenham um melhor desenvolvimento escolar. XIX Simpósio Brasileiro de Informática na Educação (SBIE 2008)

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A ampliação na aplicação para outras escolas, pesquisa com outros alunos e professores e ajustes no SARDA poderão ser realizados para que ele possa ser de fato um instrumento presente de forma rotineira no projeto pedagógico das séries iniciais e contribuir para a educação e saúde das crianças em fase escolar.

5. Referências Alves, A.M.V.da S. and Lemes, V.A.M.P. (2005) “O poder da audição na construção da linguagem”. In: BEVILACQUA, M.C. and MORET, A.L.M. org. Deficiência auditiva: conversando com familiares e profissionais de saúde. São José dos Campos: Pulso. Atkinson, R. L. et al.(2002) “Introdução à psicologia de Hilgard”. Porto Alegre: Artmed. Boothroyd, A. (1982) “Hearing impairment in young children”. Englewood Cliffs: Prentice Hall Inc. IBGE. Censo demográfico. (2003) “Características gerais da população”. Rio de Janeiro. Matzenauer, C. L. B. (2004) “Bases para o entendimento da aquisição fonológica”. In: LAMPRECHT, R. R. org. Aquisição fonológica do português: perfil de desenvolvimento e subsídios para terapia. Porto Alegre: Artmed. Northern, J. L. Downs, M. P. (2005). “Audição na infância”. 5.ed. Rio de Janeiro: Guanabara Koogan. Pereira, L. D. (1993) “Processamento auditivo”. Temas sobre desenvolvimento, v.2, n.11. Pupo, A. (1983) “Alguns aspectos do processo de discriminação auditiva de sons da fala em crianças”. Dissertação (Mestrado em Ciências) - Pontifícia Universidade Católica de São Paulo, São Paulo. Russo, I. C. P.; Behlau, M. (1993) “Percepção da fala: análise acústica do Português Brasileiro”. São Paulo: Lovise. Scientific Learning. (2005) “Fast Forword”. Disponível em: http://www.scilearn.com. Acesso em: 10/06/2005. Temple. (2003) “Neural deficits in children with dislexia ameliorated by behavioral remediation: Evidence from functional MRI”. Proceedings of the National Academy of Sciences of the United States of America, v. 100, n. 5, p.2860-2865.

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