Design de jornais multiplataforma: delineando níveis de avaliação

May 31, 2017 | Autor: Ana Gruszynski | Categoria: Journalism, Web Design, Graphic Design, Editorial Design
Share Embed


Descrição do Produto

DE S I G N DE J O R N A IS M U LT I PL ATA FO R M A: DE LINE A NDO NÍV EIS DE AVA LIAÇÃO A PA RTIR DO E S T U DO DE ZE RO H O R A (ZH) Ana Gruszynski

A pesquisa O design da primeira página de jornais e as estratégias de comunicação visual multiplataforma: um estudo de edições de Zero Hora impressas, na tela do computador e em tablets (2012-2013)1 teve como objetivo geral identificar e analisar o papel do design na construção e consolidação da identidade de veículos jornalísticos de origem impressa que passaram a publicar edições em plataformas múltiplas. Nosso interesse voltou-se não apenas aos produtos finais publicados, como também no design integrado à organização dos profissionais na redação e aos fluxos de trabalho, à base tecnológica e princípios que orientam a atuação de um veículo vinculado a um conglomerado de comunicação (Grupo Rede Brasil Sul/RBS). Em uma primeira etapa da investigação, levantamos os dados gerais do meio através de pesquisa documental. Com base na Ferramenta para Catalogação de Cibermeios (Díaz Noci, 2011), adequamos alguns campos de coleta de dados conforme nosso objetivo e foco em apenas um periódico em seus distintos modos de publicação. Adaptamos especialmente os campos ligados à periodicidade e aos aspectos editoriais, buscando assim distinguir a oferta por distintas plataformas. Consideramos o período em que se iniciou a disponibilização em cada uma delas, o caráter de atualização e os modos de presença e organização básica dos conteúdos a partir das seções de primeiro nível. Tendo em vista que a iden1.   Pesquisa vinculada ao Laboratório de Edição, Cultura & Design (LEAD) – www.ufrgs.br/lead

tidade/marca do jornal foi construída a partir da versão em papel, optamos por também incorporá-la na avaliação para poder debater as distinções e aproximações entre as edições. O instrumento gerado consta na Figura 1.

Figura 1 – Roteiro para catalogar o cibermeio contemplando suas diferentes plataformas. Fonte: Díaz Noci, 2011, p.5-19, adaptado pela autora. 454

Ferramentas para Análise de Qualidade no Ciberjornalismo Volume 2: Aplicações

O período de estudo foi de 2012 a 2014, quando Zero Hora passou por diversas modificações que envolveram as esferas institucional, comercial e editorial, ligadas também àquela tecnológica. Estas representam dimensões que constituem a identidade do jornal. Para dar conta de estudar um objeto empírico em transformação, a triangulação metodológica foi fundamental. A observação realizada na redação integrada do jornal, a realização de entrevistas semiestruturadas com o editor-chefe e editores de capa e diagramação, o acompanhamento da Carta do editor referente à atuação do veículo no jornal impresso e junto ao Blog do editor no online, além da avaliação de edições exemplares, possibilitaram melhor compreender dinâmicas que envolvem o design. Assim, como procedimentos metodológicos, adotamos a pesquisa bibliográfica, a documental, a observação, entrevistas e avaliação de conteúdo de edições quanto aos aspectos relativos ao design. Design multidimensional: da superfície a estratégia Do projeto inicial orientado principalmente ao layout das capas/home pages, desdobramos outras perspectivas; da tabulação de características e recursos voltados ao detalhamento formal, partimos para uma visão relacional que nos permitiu avaliar e discutir como uma área específica de atuação (design) dentro da uma grande empresa jornalística se transforma articulada aos processos de convergência jornalística. Interessava-nos identificar estratégias que viabilizam que a identidade – baseada na credibilidade – construída pelo periódico a partir do impresso seja associada às edições digitais, gerando (ou não) iniciativas inovadoras. Vimos, ao longo do período analisado, o investimento realizado pelo veículo em uma série de reformulações na busca por renovar o contrato comunicacional com seus leitores estabelecido a partir do impresso. Foram reformulados e/ou criados serviços, produtos, seções etc., que buscaram proporcionar experiências distintas e complementares de leitura vinculadas à marca Zero Hora, disponíveis e acessíveis de modo diverso em função de particularidades de cada plataforma e seus espaços/situações de uso.

Design de jornais multiplataforma: delineando níveis de avaliação a partir do estudo de Zero Hora (ZH)

455

Na medida em que nossos dados empíricos eram levantados e nos voltávamos reiteradamente à revisão bibliográfica procurando dar conta de ancorar teoricamente nossas primeiras inferências, percebemos que se considerássemos o design apenas a partir do que é visível nas camadas mais superficiais das edições das capas/home pages, deixaríamos de abarcar seu papel integrado às diferentes frentes dos processos convergentes que estávamos observando. Nesse sentido, a obra Ferramentas para Análise da Qualidade no Ciberjornalismo em seu conjunto nos possibilitou uma visão geral sobre elementos que poderiam ser relevantes para orientar uma mudança de perspectiva. Os capítulos da obra, ao proporem ferramentas analíticas em torno de tópicos específicos, desdobravam níveis de avaliação de características particulares. Palomo, Quadros e Silva (2011) tratavam do design sob viés próximo ao que inicialmente planejamos, mas observamos que também outros autores apontavam elementos a ele relacionados – principalmente as ferramentas voltadas à hipertextualidade (Barbosa & Mielniczuk, 2011), interatividade (Meso, Natansohn, Palomo, & Quadros, 2011), multimidialidade (Masip, Micó, & Teixeira, 2011), base de dados (Barbosa, Machado, & Pereira, 2011) e memória (Palacios & Ribas, 2011). Optamos, então, por uma aproximação que permitisse identificar e sistematizar os âmbitos de cruzamento do design com eixos que perpassam a produção das edições, buscando perceber como elementos identitários visíveis na publicação estão imbricados às esferas anteriormente apontadas. No que diz respeito àquelas institucional e comercial, o roteiro presente na Figura 1 nos forneceu os principais dados. Para podermos apreender a esfera editorial e relacioná-la às demais, buscando ainda integrar aspectos do design que, como pontuamos anteriormente, estavam presentes em outras ferramentas além daquela que focava especificamente nele, nos baseamos em modelo elaborado por Garret (2011). Voltado ao desenvolvimento de projetos tendo em vista a experiência dos usuários na Web, o autor parte do princípio de que eles estão diante de novas experiências de leitura no ambiente digital. O processo de design proposto visa a assegurar que as várias possibilidades de ação dos usuários sejam geradas de modo consciente pelos profissionais, considerando as expectati-

456

Ferramentas para Análise de Qualidade no Ciberjornalismo Volume 2: Aplicações

vas dos interagentes a cada passo ao longo do percurso de desenvolvimento. Para isso, apresenta cinco níveis – ou planos – que formam camadas que delineiam possibilidades dessas experiências, que envolvem gradações de um plano mais abstrato a um mais concreto. Eles são denominados como estratégia, escopo, estrutura, esqueleto e superfície. A opção pelo modelo se justifica pela possibilidade de contemplar dimensões relativas aos projetos editorial, comercial e institucional, e permitir o estabelecimento de relações com demandas inerentes aos processos de convergência, entre outros aspectos. Viabiliza avaliar como planos e iniciativas que estabelecem diretrizes estratégicas se encontram dinamicamente relacionadas às definições formais das edições. Contudo, é justamente esse caráter dinâmico, que envolve muitas vezes a ausência de limites bem definidos, que representou nossa principal dificuldade no desenvolvimento da pesquisa, tanto no que se refere à observação do objeto empírico quanto à construção de um aparato teórico que permitisse apreendê-lo. Outro aspecto a mencionar nesse sentido é que a proposta de Garret (2011) está orientada para a criação de um produto e, em nosso caso, avaliamos um jornal com 50 anos de trajetória e que há 20 anos está presente na internet2. Portanto, organizamos as categorias a partir do produto pronto e dos dados coletados sobre o jornal, o que exigiu novamente colocar os dados empíricos em diálogo com a teoria, tensionando ambos em função do objetivo geral da pesquisa. Desdobramentos do design em esferas de construção identitária Ao explicitar os elementos presentes nos planos de seu modelo, Garret (2011) assinala as diferenças de nomenclatura em circulação que dificultam a construção de sua proposta. Aponta duas alternativas de aproximar-se da web: enquanto meio de informação ou como plataforma de funcionalidades, uma dualidade própria de produtos digitais.

2.   Cf. < http://migre.me/qfKpC > Acesso em 10. jun. 2015.

Design de jornais multiplataforma: delineando níveis de avaliação a partir do estudo de Zero Hora (ZH)

457

Assim, partindo do produto, a camada mais concreta é a superfície, cujas páginas se apresentam compostas de textos, imagens e outros elementos multimodais, que podem oferecer links para blocos de informação. No próximo nível temos o esqueleto que otimiza o posicionamento de botões, abas, imagens, blocos de texto etc. Ele representa a expressão concreta da estrutura e determina a disposição dos itens navegáveis, orientando os usuários entre categorias. A estrutura define como os usuários vão de uma página a outra, estabelecendo onde as categorias efetivamente estão, constituindo a articulação entre as diversas características formais e funcionais. Estas características formam o escopo da publicação, compreendendo seus conteúdos fundamentais e funções que o sistema deve oferecer. No nível da estratégia estão presentes os objetivos estabelecidos para a publicação e as demandas dos usuários, princípios que possibilitam a convergência de interesses (Figura 2).

Figura 2 – Elementos da experiência do usuário. Fonte: Garret, 2011, p.29.

458

Ferramentas para Análise de Qualidade no Ciberjornalismo Volume 2: Aplicações

Na segunda edição de seu livro, Garret (2011) sugere que os elementos da experiência do usuário podem ser relacionados a diferentes produtos. Entretanto, no domínio de cada um, existem especificidades: no caso de um jornal, há elementos próprios do impresso e do online, há plataformas diversificadas de acesso às edições digitais, bem como modos de como o impresso é disponibilizado online. Os roteiros iniciais que desenvolvemos para orientar a coleta de dados da pesquisa buscaram contemplar o que é comum e o que é singular em relação às diferentes plataformas de publicação. Como trabalhamos com um único veículo, há informações comuns, principalmente, relacionadas aos planos da estratégia e escopo. Porém, à medida que avançamos para os níveis mais concretos, entendemos ser produtivo efetuar a coleta de dados de cada plataforma singularmente para assim poder melhor comparar3. Temos o impresso e o online, este último que se desdobra em: (a) Desktop site (browsers); (b) Mobile site (browsers); (c) Aplicativo Tablet Android; (d) Aplicativo Ipad; (e) Aplicativo Smartphone Android; (f) Aplicativo Iphone, podendo também incluir o Kindle. Interessa verificar também se o impresso está disponível nas plataformas digitais e por meio de qual recurso. O modelo de Garret (2011) 4 indica elementos que se situam no desdobramento de cada plano, contudo, dada sua pretensão de ser aplicado ao design de diferentes produtos, não contempla especificidades que interessam ao ciberjornalismo. A ferramenta que propomos, assim, representa um primeiro esforço de nossa parte em realizar esse cruzamento. Não descrevemos aqui o que recobre cada item nominado, indicamos ao longo do texto ou nos roteiros os autores que orientaram nossas definições e que podem ser consultados. Trata-se de uma proposta que está sendo revisitada em novo projeto de pesquisa atualmente em fase inicial. Tendo no horizonte a meta de desdobrar os itens que sistematizamos nos níveis e categorias expostas

3.  A avaliação das edições exemplares pela pesquisa voltou-se ao Impresso, Desktop site (Mozilla Firefox); Aplicativo Ipad e Aplicativo Smarthphone Android, mas indicamos no texto as outras possibilidades disponíveis. 4.   Padovani, Spinillo e Gomes (2009) também se apropriam da sistematização de Garret para propor seu modelo descritivo-normativo para análise de websites.

Design de jornais multiplataforma: delineando níveis de avaliação a partir do estudo de Zero Hora (ZH)

459

nas Figuras 3 a 7, pretendemos aprofundar os tópicos especificando-os e explicitando-os detalhadamente. Ao fazer isso, será possível reformular categorias encaminhadas a partir do que foi possível identificar e avaliar no período de realização da investigação, dando continuidade ao processo que marcou a investigação: construir e reconstruir, tentando apreender um objeto em mutação contínua. Sugere-se que a utilização do instrumento proposto – que se desdobra em cinco planos – deve considerar o que é comum e o que é particular a cada plataforma. É produtiva, portanto, a aplicação para cada uma separadamente, conforme as que listamos anteriormente. O roteiro da Figura 1 possibilita levantar dados em sua maioria comuns. Nas edições digitais, sob o ponto de vista da funcionalidade, o design volta-se sobretudo para tarefas e etapas que os usuários percorrem no processo de interação, tendo como perspectiva como estes pensam a fim de completá-las. A publicação é planejada e desenvolvida como conjunto de ferramentas utilizadas para executar tarefas. Sob o ponto de vista da informação, o foco é como o conteúdo é percebido e entendido pelos usuários. Interessa viabilizar que os leitores encontrem, apreendam e possam dar sentido às informações (Garret, 2011). No nível de estratégia (Fig. 3) as esferas da funcionalidade e da informação compartilham interesses. Importa considerar aqui o que o produto oferece e qual interesse/função este pode ter para os leitores – objetivos do produto e necessidades do usuário. As edições online multiplataforma, embora tenham elementos em comum, podem atender a demandas distintas. Com o desenvolvimento do ciberjornalismo, vimos que a oferta de notícias nos aplicativos para celular (Canavilhas & Satuf, 2015; Palacios, Barbosa, Firmino, & Cunha, 2015), por exemplo, costumam priorizar informações para leitores que estão em trânsito, que são lidas rapidamente. Portanto, este nível permite também avaliar como o jornal pode ter objetivos dirigidos a cada plataforma, que, em seu conjunto, ofertam funcionalidades e conteúdos complementares.

460

Ferramentas para Análise de Qualidade no Ciberjornalismo Volume 2: Aplicações

Conhecer os leitores é, portanto, fundamental. Os estudos sobre usabilidade (Nielsen, 2000; Preece, Rogers, & Sharp, 2005; Royo, 2008) são relevantes no plano da estratégia e colocam os usuários no centro do planejamento. Para Preece et. al. (2005), as metas de usabilidade são: eficácia (o quanto um produto atende ao que se espera dele), eficiência (produtividade no uso); segurança (evita que o usuário cometa erros), utilidade (oferta adequada de funções), capacidade de aprendizagem (facilidade em aprender a usar) e capacidade de memorização (facilidade em lembrar-se de como utilizar), articulando funções e informações. Ao lidarmos com publicações que já possuem uma trajetória, interessa averiguar como é explicitado o contrato de comunicação do veículo para com seu público através das edições e ações promovidas pelo periódico, como este é mantido e renovado, como são aprendidas as demandas e interesses do público. Zero Hora, a partir de reforma editorial realizada em 2014 (Gruszynski, Lindemann, & Oliveira, 2014), (re) apresentou-se como em contínuo “estado beta”. Os níveis mais abstratos do desenvolvimento buscaram então acolher os aspectos que permitissem identificar traços identitários consolidados e aqueles em reformulação a partir de demandas por parte da empresa (institucional, comercial e editorial) e do público.

Design de jornais multiplataforma: delineando níveis de avaliação a partir do estudo de Zero Hora (ZH)

461

Figura 3 – Roteiro para avaliar o design no nível da estratégia. Fonte: Elaborado pela autora a partir de Garret (2011); Palacios (2011) e de dados da pesquisa.

462

Ferramentas para Análise de Qualidade no Ciberjornalismo Volume 2: Aplicações

A estratégia passa ao nível do escopo quando necessidades do usuário e objetivos do produto editorial se configuram em requisitos mais específicos. No âmbito da funcionalidade – especificações funcionais –, estão elementos que informam características que o sistema deve proporcionar, funções necessárias para realizar tarefas. No da informação – requisitos de conteúdo –, respondem-se às exigências de conteúdo, são listadas as principais informações que o usuário pode consultar em sua interação como o sistema. O projeto editorial assume especial importância nesse nível de definição. O diálogo entre as diferentes áreas (institucional, comercial, editorial, tecnológica etc.) e entre profissionais envolvidos no projeto é fundamental para que se chegue a essas definições, levando em conta também infraestrutura, organização dos profissionais, fluxos de trabalho, base tecnológica, investimentos financeiros, concorrência, relações com fornecedores e públicos externos, entre outros fatores que restringem ou ampliam as potencialidades produtivas e consequentemente do próprio produto. A adoção de Content Management System (CMS) desenvolvido para o veículo ou adquirido de outras empresas é uma opção para articular parte destas variadas esferas com base na natureza dos conteúdos, em arranjos que podem ter diferentes níveis de complexidade. No nível do escopo, o detalhamento exige maior precisão, uma vez que este direciona os contornos mais nítidos da publicação à medida que se avança do plano mais abstrato ao mais concreto.

Design de jornais multiplataforma: delineando níveis de avaliação a partir do estudo de Zero Hora (ZH)

463

Figura 4 – Roteiro para avaliar o design no nível escopo. Fonte: Elaborado pela autora a partir de Garret (2011); Palacios (2011) e de dados da pesquisa.

464

Ferramentas para Análise de Qualidade no Ciberjornalismo Volume 2: Aplicações

A estrutura se constitui a partir do escopo desdobrando-se no design de interação (funcionalidade), que define como o sistema atua em resposta aos usuários, possibilitando o estabelecimento de um modelo conceitual da publicação. A arquitetura da informação, por sua vez, diz respeito ao arranjo dos elementos de conteúdo no espaço informacional e prevê as conexões entre as unidades básicas da estrutura, os nós. Neste nível estão padrões e sequências por meio das quais opções são apresentadas aos leitores/usuários. Este plano torna evidente o quanto a terminologia utilizada na área do design (e outras envolvidas ao desenvolvimento) não é unânime, estando conceitos similares vinculados a distintos vocábulos ou conceitos distintos nomeados por uma mesma nomenclatura. Isso é aguçado pela sobreposição do entendimento dos produtos sob o ponto de vista da funcionalidade e da informação, assim como interesses próprios do campo jornalístico. Nesse sentido, reposicionamos em nossos roteiros elementos apresentados pelos autores das Ferramentas para a análise da qualidade no ciberjornalismo indicados anteriormente, como foi o caso, por exemplo, do foco dado à interação enquanto modos de participação dos leitores. Em nossa proposição, o termo interação vincula-se à estrutura e aos recursos de interatividade observados por Meso et. al. (2011) que foram deslocados para junto do escopo e distribuídos principalmente junto aos requisitos de conteúdo, com alguns itens posicionados junto às especificações funcionais. A ferramenta para análise da hipertextualidade (Barbosa & Mielniczuk, 2011) nos forneceu indicadores tanto para o plano da estrutura como do esqueleto, enquanto que aqueles da multimidialidade (Masip et. al., 2011) e do design (Palomo et. al., 2011) foram direcionados tanto ao plano do esqueleto como da superfície. Categorias propostas por Salaverría (2014) referentes à multimídia também foram utilizadas. Tratam-se de opções que revisitam as proposições dos autores a partir de uma perspectiva do design, como apontamos anteriormente, buscando elencar itens que abrangem o papel da atividade desde um plano mais abstrato a um mais concreto, este último habitualmente o mais associado ao que é atividade do design. O modelo conceitual é central para o design de interação. Ele envolve o letramento digital bem como o domínio de formas e recursos relativos ao letramento tradicional, com o manejo de seus respectivos dispositivos e Design de jornais multiplataforma: delineando níveis de avaliação a partir do estudo de Zero Hora (ZH)

465

convenções. Com o desenvolvimento do ciberjornalismo em suas diferentes gerações (Barbosa, 2008; Barbosa, Silva, Nogueira, & Almeida, 2013; Mielniczuk, 2003; Palacios & Machado, 2003), vimos o gradual afastamento do padrão dos jornais impressos em um movimento que propiciou que modelos conceituais fossem ganhando novos contornos, seja pelo uso de metáforas, como pela manutenção de convenções ou introdução de elementos inovadores. Podemos avaliar como estes modelos conceituais são aplicados ao conjunto do sistema ou a partes específicas dele, os estilos de diálogo utilizados em relação às atividades a serem realizadas (via menu, preenchimento de formulários etc.), observando a consistência entre os elementos com base em padrões, que permitem que os usuários se orientem no sistema, evitando erros e podendo recorrer a recursos de ajuda. No âmbito da arquitetura, a organização pode ser hierárquica (em árvore), matricial (permite que o usuário se mova de um nó a outro em duas ou mais dimensões), orgânica/aleatória (sem padrão de organização), ou sequencial (linear) (Garrett, 2011). Outros modos de especificar as estruturas podem ser encontrados em Brockman, Horton e Borck (1989); Kalbach (2009); Royo (2008). A especificação e organização detalhada dos conteúdos (seções, subseções etc.) são realizadas neste nível, observando-se a rotulagem (vocabulário controlado, metadados), hierarquia, agrupamentos entre itens e modalidades de conexão entre eles (perfil dos links utilizados). Estas determinações dimensionam a área ocupada pelo conjunto de conteúdos.

466

Ferramentas para Análise de Qualidade no Ciberjornalismo Volume 2: Aplicações

Figura 5 – Roteiro para avaliar o design no nível da estrutura. Fonte: Elaborado pela autora a partir de Garret (2011); Palacios (2011) e de dados da pesquisa.

É no plano do esqueleto que os limites entre os componentes são tênues, mais que em outros níveis, afirma Garret (2011). O design da informação perpassa as duas esferas e refere-se a como apresentar as informações para que as pessoas as compreendam mais facilmente. Estão presentes modalidades que buscam tornar os dados visíveis de modo a comunicar com maior eficácia. Consideramos aqui, por exemplo, tanto a opção por uma fotografia e/ou uma infografia, a sua articulação como elementos multimodais que podem melhor comunicar uma informação, bem como, dentro de cada modalidade, observamos se sua conformação favorece a construção dos significados desejados.

Design de jornais multiplataforma: delineando níveis de avaliação a partir do estudo de Zero Hora (ZH)

467

O esqueleto também inclui o design da interface, que organiza a estrutura de disposição dos elementos no espaço e estabelece convenções e metáforas que orientam o usuário na navegação. Os elementos da interface são distribuídos tendo em vista tarefas que o usuário poderá realizar, na expectativa que sejam compreendidos e utilizados com facilidade. Cybis (2003) apresenta classes de objetos de interação relacionados à interface. Neste nível levamos em consideração também o direcionamento dado a algumas plataformas de acesso a partir do design fixo, adaptativo ou responsivo. Projetos digitais recentes vêm adotando a perspectiva do mobile first, que visa a resolver primeiro o direcionamento aos dispositivos móveis que cada vez mais ganham espaço em termos de consumo de informações, para então definir o design destinado ao acesso via desktops. O design fixo, utilizado nas primeiras gerações do ciberjornalismo, veio gradualmente sendo deixado de lado, dando lugar a composições flexíveis, definidas com base em unidades relativas, que se adaptam aos dispositivos de acesso. Design adaptativo e design flexível servem ao princípio comum de criar layouts que possam se adequar aos dispositivos, mas no âmbito da programação há distinções entre ambos. Dependendo do projeto, um poderá ser mais adequado que outro. O design da navegação, em articulação com o arranjo dos elementos no layout, possibilita que os usuários se movam pela arquitetura da informação, indicando onde se encontram na publicação, onde estiveram e para onde podem ir. Abrangem-se links de navegação estrutural que revelam a estrutura do espaço de informação, permitindo aos usuários ir a outras partes. A explicitação de elementos ligados à navegação pode ser encontrada em Barbosa e Mielniczuk (2011) – com ênfase no hipertexto – e em Fleming (1998), Garret (2011), Kalbach (2009), Padovani e Moura (2008).

468

Ferramentas para Análise de Qualidade no Ciberjornalismo Volume 2: Aplicações

Figura 6 – Roteiro para avaliar o design no nível do esqueleto. Fonte: Elaborado pela autora a partir de Garret (2011); Palacios (2011) e de dados da pesquisa.

Design de jornais multiplataforma: delineando níveis de avaliação a partir do estudo de Zero Hora (ZH)

469

No nível da superfície, o design sensorial perpassa o produto como funcionalidade e como informação. Nele, conteúdo, funcionalidades e estética manifestam o que foi definido (ou não) nos demais níveis. É mais visível aqui a presença de elementos compositivos que ligam edições impressas e digitais como a marca, as cores institucionais, a tipografia, entre outros. A construção de templates, modelos predeterminados de distribuição de elementos no espaço compositivo, em que podem se utilizar também paletas de estilos para a formatação tipográfica e de outros objetos é fundamental para a construção da identidade da publicação neste nível, associada, sobretudo, ao visual, sem deixar de lado outros sentidos. Isso tem um papel importante nas rotinas e fluxos de trabalho na redação, quando vários profissionais trabalham simultaneamente em uma produção comum e sob a pressão do tempo. A marcação de conteúdos como tipos específicos de informação (títulos, corpo do texto, destaque etc.) permite acionar folhas de estilos tipográficos que podem direcionar a formatação conforme a plataforma a que o conteúdo se dirige. Caracterizam-se aqui detalhadamente os recursos sensíveis presentes no layout, discernindo particularidades dos elementos multimodais definidos junto do design da informação. Os capítulos referentes à multimidialidade (Masip et. al., 2011) e design (Palomo et. al., 2011) são especialmente úteis aqui para explicitar os itens dispostos no roteiro.

470

Ferramentas para Análise de Qualidade no Ciberjornalismo Volume 2: Aplicações

Figura 7 – Roteiro para avaliar o design no nível da superfície. Fonte: Elaborado pela autora a partir de Garret (2011; Palacios (2011) e de dados da pesquisa.

O entrelaçamento dos cinco planos possibilita evidenciar como decisões relativas aos níveis mais superficiais da publicação – esqueleto e superfície – podem, sob o ponto de vista da publicação, responder a demandas de qualificar a legibilidade do produto, mas gerar reações inesperadas por parte dos leitores, abalando em certa medida o contrato comunicacional estabelecido. No caso de ZH, poderíamos citar a situação inusitada acerca do deslocamento das palavras cruzadas para outra parte do jornal e a redução do corpo de seus tipos realizada na reforma de 2014. Dada a reação do público que se manifestou pelos canais de interação da publicação, ZH voltou atrás, “prestando contas” aos leitores e atendendo às solicitações em uma esfera que parecia de menor importância no conjunto de modificações editoriais.

Design de jornais multiplataforma: delineando níveis de avaliação a partir do estudo de Zero Hora (ZH)

471

Conclusões Os roteiros que produzimos resultam de tentativa de dar visibilidade aos diferentes aspectos do papel do design que envolvem a construção e consolidação da identidade de veículos jornalísticos de origem impressa que passaram a publicar edições em plataformas múltiplas. Como afirmamos anteriormente, mais do que nos aprofundarmos em determinados tópicos, nosso interesse foi identificar e propor uma sistematização de elementos em eixos que dinamizassem a análise. Partimos de ferramentas apresentadas na obra Ferramentas para análise de qualidade no ciberjornalismo e buscamos relações com proposta de Garret (2011), que considera a experiência dos usuários. Ao longo do percurso de pesquisa, os procedimentos metodológicos utilizados possibilitaram a coleta de dados relativos ao objeto empírico da pesquisa, permitindo que fossem introduzidos outros aspectos, que foram ponderados também a partir da experiência profissional e acadêmica do pesquisador. Enquadrar os vários elementos foi uma tarefa por vezes (quase) impossível, uma vez que os limites entre níveis e seus respectivos subníveis são tênues e se sobrepõem. Itens mencionados nos planos mais abstratos foram algumas vezes retomados naqueles mais concretos, ganhando contornos mais bem definidos. Assumiu-se assim o risco de lidar com um complexo emaranhado de termos, conceitos, perspectivas vindas de diferentes áreas do conhecimento e autores, entre outras dificuldades que se tornam visíveis em uma multiplicidade de elementos envolvidos e em torno dos quais a falta de consenso ainda parece ser preponderante. Isso reflete a dinâmica de campos em complexas, intensas e rápidas transformações e incide na construção de um objeto teórico de pesquisa articulado com um objeto empírico que, no caso de nossa investigação, passou por modificações significativas no período de 2012 a 2014. Os roteiros, assim, permitiram avaliar também em que esferas estas foram se dando e a que fatores estas estavam mais fortemente associadas; exigindo que fossem também reconsiderados, incluídos, deslocados e eliminados tópicos ao longo do processo. Nesse sentido, a triangulação meto-

472

Ferramentas para Análise de Qualidade no Ciberjornalismo Volume 2: Aplicações

dológica auxiliou significativamente a dinâmica do percurso de pesquisa. Entendemos que nossa proposição deve ser revista e aperfeiçoada, o que se pretende com novo projeto que se inicia e dá continuidade a este. No período e estado da arte em que se inscreveu, possibilitou atingir nosso objetivo. Entendemos ainda que, dependendo do interesse do pesquisador, é possível utilizar apenas o instrumento que se refere a algum dos planos – estratégia, escopo, estrutura, esqueleto e superfície –, e aqueles mais abstratos podem ser úteis também a focos que não sejam o design. No âmbito do projeto em design temos a iteração, isto é, fases podem se repetir em função do feedback obtido a cada etapa. Devido à necessidade de renovação contínua do contrato de comunicação dos veículos em relação aos seus públicos, procuramos evidenciar que o design não é apenas superfície, embora represente efetivamente elemento de maior visibilidade. Integrado ao veículo em suas esferas editoriais, comerciais, institucionais e fortemente vinculado ao desenvolvimento tecnológico, tem a potencialidade de tensionar a articulação entre os planos mais concretos e mais abstratos, conformando uma publicação em contínuo desenvolvimento e articulando seus elementos identitários. Originalmente produzido como parte de pesquisa vinculada ao Programa de Pós-graduação em Comunicação da Universidade Federal do Rio Grande do Sul, entre 2012-2014, contou com o apoio de bolsa de produtividade do CNPq.

Referências Barbosa, S. (2008). Modelo JDBD e o ciberjornalismo de quarta geração. Recuperado em 24 de janeiro de 2014, de http://migre.me/qhhSA Barbosa, S., & Mielniczuk, L. (2011). Ferramenta para Análise de Hipertextualidade em Cibermeios. In M. Palacios (Org.), Ferramentas para Análise de Qualidade em Ciberjornalismo. Vol. I/Modelos (pp.3750). Covilhã, Portugal: UBI /LabCom, Livros Labcom.

Design de jornais multiplataforma: delineando níveis de avaliação a partir do estudo de Zero Hora (ZH)

473

Barbosa, S.; Machado, E.; & Pereira, J. (2011). Ferramenta para Análise de Bases de Dados em Cibermeios. In M. Palacios (Org.), Ferramentas para Análise de Qualidade em Ciberjornalismo. Vol. I/Modelos (pp.167182). Covilhã, Portugal: UBI /LabCom, Livros Labcom. Barbosa, S, Silva, F.F., Nogueira, L, & Almeida, Y. (2013). A atuação jornalística em plataformas móveis. Estudo sobre produtos autóctones e a mudança no estatuto do jornalista. Brazilian Journalism Research, 9(2), 10-29. Brockman, R; Horton, W., & Borck, K. (1989). From Database to Hypertext via Eletronic Publishing: an Information Odissey. In E. Barret (Org.), The society of Text: Hypertext, Hypermedia and Social Construction of Information. (pp. 162-205). Cambriedge, MA: the MIT Press. Canavilhas, J. & Satuf, I. (Org.) (2015). Jornalismo para Dispositivos Móveis: produção, distribuição e consumo. Covilhã, Portugal: UBI /LabCom, Livros Labcom. Cybis, W. A. (2003). Engenharia de Usabilidade: Uma Abordagem Ergonômica. Florianópolis: Labiutil. Díaz Noci, J. (2011) Ferramenta para Catalogação de Cibermeios. In M. Palacios (Org.),  Ferramentas para Análise de Qualidade em Ciberjornalismo. Vol. I/Modelos (pp.5-19). Covilhã, Portugal: UBI / LabCom, Livros Labcom. Fleming, J. (1998). Web Navigation: Designing the User Experience. Cambriedge: O’Reilly. Garrett, J.J. (2011). The Elements of User Experience: User-Centered Design for the Web and Beyond. 2a. ed. Berkeley: New Riders. Gruszynski, A. C.;  Lindemann, C.; & OLIVEIRA, C. (2014). Virando-se por Leitores: A Reforma Editorial e Gráfica do Jornal Zero Hora no Cenário de Convergência. Anais do XXXVII Congresso Brasileiro de Ciências da Comunicação, 1 São Paulo: Intercom Sociedade Brasileira de Estudos Interdisciplinares da Comunicação. Kalbach, J. (2009). Design de Navegação Web. Porto Alegre: Bookman.

474

Ferramentas para Análise de Qualidade no Ciberjornalismo Volume 2: Aplicações

Masip, P., Micó, J. L., & Teixeira, T. (2011). Ferramenta para Análise de Multimidialidade em Cibermeios. In M. Palacios (Org.), Ferramentas para Análise de Qualidade em Ciberjornalismo. Vol. I/Modelos (pp.81129). Covilhã, Portugal: UBI /LabCom, Livros Labcom. Meso, K., Natansohn, G., Palomo, B., & Quadros, C. (2011). Ferramenta para Análise de Interatividade em Cibermeios. In M. Palacios (Org.), Ferramentas para Análise de Qualidade em Ciberjornalismo. Vol. I/ Modelos (pp.51-80). Covilhã, Portugal: UBI /LabCom, Livros Labcom. Mielniczuk, L. (2003). Jornalismo na Web: uma contribuição para o estudo do formato da notícia na escrita hipertextual. Tese de Doutorado, Faculdade de Comunicação, Universidade Federal da Bahia, Salvador. Nielsen, J. (2000). Projetando Websites. Rio de Janeiro: Elsevier. Padovani, S., & Moura, D. (2008). Navegação em Hipermídia: uma Abordagem Centrada no Usuário. Rio de Janeiro: Editora Ciência Moderna Ltda. Padovani, S., Spinillo, C.G., & Gomes, I.M.A. (2009). Desenvolvimento e aplicação de modelo descritivo-normativo para a análise de websites. Produção, 19(3), 514-528. Palacios, M., & Cunha, R. (2012). A Tactilidade em Dispositivos Móveis: Primeiras Reflexões e Ensaio de Tipologias. Contemporânea Comunicação e Cultura, 10(3), 668-685. Palacios, M., & Ribas, B. (2011). Ferramenta para Análise de Memória em Cibermeios. In M. Palacios (Org.), Ferramentas para Análise de Qualidade em Ciberjornalismo. Vol. I/Modelos (pp.183-205). Covilhã, Portugal: UBI /LabCom, Livros Labcom. Palacios, M., & Machado, E. (Org.). (2003). Modelos de jornalismo digital. Salvador: Edições GJOL, Editora Calandra. Palacios, M. (Org.). (2011). Ferramentas para Análise de Qualidade em Ciberjornalismo. Vol. I/Modelos. Covilhã, Portugal: UBI /LabCom, Livros Labcom. Palacios, M., Barbosa, S., Firmino, F., & Cunha, R. (2015). Mobile Journalism and Innovation: A Study on Content Formats of Autochthonous News Apps for Tablets. In J. M. A. Aguado, C. Feijóo, & I. J. Marínez. Emerging Perspectives on the Mobile Content Evolution. (pp.239-262). Hershey PA, USA: IGI Global. Design de jornais multiplataforma: delineando níveis de avaliação a partir do estudo de Zero Hora (ZH)

475

Palacios, M., Barbosa, S., Firmino, F., & Cunha, R. (2014). Aplicativos jornalísticos vespertinos para tablets. Sur le journalisme, 3(2), 40-55. Palomo, B., Quadros, I., & Silva, F. F. (2011). Ferramenta para Análise de Design em Cibermeios. In M. Palacios (Org.), Ferramentas para Análise de Qualidade em Ciberjornalismo. Vol. I/Modelos (pp.131-165). Covilhã, Portugal: UBI /LabCom, Livros Labcom. Preece, J., Rogers, Y., Sharp, H. (2005). Design de Interação: Além da Interação Homem-Computador. Porto Alegre: Bookman. Royo, J. (2008). Design Digital. São Paulo: Edições Rosari. Salaverría, R. (2014). Multimedialidade: Informar para cinco sentidos. In J. Canavilhas (Org.), Webjornalismo: 7 Caraterísticas que Marcam a Diferença. (pp.25-52). Covilhã, UBI, LabCom, Livros LabCom.

476

Ferramentas para Análise de Qualidade no Ciberjornalismo Volume 2: Aplicações

Lihat lebih banyak...

Comentários

Copyright © 2017 DADOSPDF Inc.