Design e moda: processos e métodos no cenário contemporâneo

June 3, 2017 | Autor: Lílian Lago | Categoria: Design, Moda, Processos e métodos
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DESIGN E MODA: PROCESSOS E MÉTODOS NO CENÁRIO  CONTEMPORÂNEO  LÍLIAN LAGO1, MÔNICA MOURA2  1

 Universidade Estadual Paulista ‐ UNESP ‐ PPG Design, Mestranda ‐  [email protected] 

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 Universidade Estadual Paulista – UNESP – PPG Design, Dra. ‐ [email protected] 

    Resumo: A contemporaneidade reforça a importância dos papéis do design e da moda como criadores de  artefatos por meio dos quais nos comunicamos ou expressamos. Mediante a revisão de literatura e análises  qualitativas, o trabalho apresenta um breve panorama sobre os processos e métodos de design e moda e a  forma como estes estão inter‐relacionados no cenário contemporâneo, apontando possibilidades de  integração e troca de saberes entre as áreas. Na contemporaneidade, o processo ganha lugar de destaque  por gerar maior valor e ampliar a significação do artefato.    Palavras‐chave: design, moda, processos, métodos   

1. Introdução  Este  artigo  é  parte  do  resultado  de  uma  pesquisa  de  abordagem  qualitativa  que  aplicou  revisão  de  literatura e análise das teorias relacionadas ao desenvolvimento  de produtos ‐ processos e métodos ‐ de  design  e  moda.  Para  tanto  foram  selecionados  5  autores  considerados  referência  no  ensino  e  prática  do  design  e  da  moda  no  cenário  brasileiro:  Löbach  (2001),  Baxter  (1998),  Bürdek  (2006),  Moraes  (2010)  e  Sanches‐Montemezzo (2003; 2008).   Löbach é  um pesquisador e designer alemão e despontou como expoentes nos anos 1970 junto à escola  funcionalista. Seu livro foi publicado no Brasil em 2001. Baxter é pesquisador membro do Design Research  Center  da  Universidade  de  Brunel,  Londres,  e  teve  seu  livro  publicado  em  1995  na  Inglaterra  e  1998  no  Brasil. Bürdek é ex‐aluno da HfG Ulm e professor de uma escola de design alemã. Seu livro foi publicado em  1991  e  uma  nova  versão  revista  e  atualizada  chegou  ao  Brasil  em  2006.  Moraes  é  um  designer  e  pesquisador  brasileiro  que  teve  a  oportunidade  de  entrar  em  contato  com  as  questões  metaprojetuais  estudadas  por  alguns  dos  professores  do  Instituto  Politecnico  di  Milano  durante  sua  estadia  para  o  doutorado.  Acompanhando  a  evolução  do  metaprojeto,  Moraes  lançou  seu  livro  sobre  o  tema  em  2010.  Sanches‐Montemezzo é designer, pesquisadora de design e moda e consultora. Pesquisa a metodologia do  projeto para desenvolvimento de produtos de moda. Suas obras tomadas como referência para este estudo  são Sanches‐Montemezzo (2003; 2008).   Löbach e Bürdek compartilham o contexto do design nos 1970, apesar da obra de Bürdek (2006) apresentar  propostas mais recentes nesta atualização. Baxter, assim como os autores citados, compartilha do contexto  europeu desenvolvido e industrial. Moraes, em meados dos anos 2000, vivenciou a evolução da pesquisa  sobre  o  metaprojeto,  modelo  dinâmico  desenvolvido  justamente  para  lidar  com  a  complexidade  contemporânea,  na  Itália  e  trouxe  seus  estudos  para  o  Brasil.  Sanches‐Montemezzo  (2003;  2008)  compartilha  do  cenário  contemporâneo,  que  exige  a  pesquisa  e  a  interpretação  de  contextos  para  o  atendimento aos aspectos semânticos tanto quanto o atendimento aos aspectos técnicos.  O  objetivo  desde  trabalho  é  apresentar  um  breve  panorama  sobre  os  processos  e  métodos  de  design  e  moda e a forma como estes estão inter‐relacionados no cenário contemporâneo, apontando possibilidades  de integração e troca de saberes entre o design e a moda.   

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2. O design e a moda  Lipovestky  e  Serroy  (2011)  intitulam  o  período  pós‐moderno  como  “hipermoderno”  –  caracterizado  pela  hipertrofia deste tempo, um “mundo hiper, no qual o homem, à medida que tem mais, e mesmo demais,  chega  a  se  perguntar  se  tem  melhor”  (p.  22).  As  escolhas  do  indivíduo  são  livres  e  subjetivas,  inclusive  aquelas relacionadas ao consumo. O poder de alcance e rapidez de circulação das mídias e da publicidade  tem  relação  direta  com  este  fenômeno.  Todos  os  campos  pertencentes  à  sociedade  atual  estão  sob  a  influência  das  novas  tecnologias  de  informação  e  de  comunicação,  caracterizando  esta  sociedade  como  “informacional”,  mesmo  que  num  formato  de  comunicação  “desmassificada”,  onde  os  meios  de  comunicação precisam se voltar para nichos de mercado cada vez mais específicos. A comunicação reforça  a valorização da estética, que passou a predominar no cotidiano contemporâneo. A importância da estética  se  relaciona  diretamente  com  a  criatividade  e  com  a  ascensão  dos  segmentos  considerados  criativos  –  comunicação, design, moda e arte.   Bomfim  (2014)  afirma  que  o  design  é  uma  atividade  de  configuração  de  objetos  de  usos  e  sistemas  de  informação.  Assim  como  qualquer  outra  atividade  do  trabalho  social,  o  design  é  orientado  pelo  que  determinam  as  instituições  sociais  vigentes  –  seus  objetivos  de  natureza  ideológica,  política,  social,  econômica, entre outros. Para Bonsiepe (2011) “o designer possibilita novas experiências na vida cotidiana  numa  sociedade  –  experiências  no  uso  de  produtos,  signos,  serviços,  inclusive  experiências  de  caráter  estético que, por sua vez dependem de uma dinâmica sociocultural” (p. 230).  A  moda  e  o  design  têm  forte  papel  no  contexto  contemporâneo,  pois  é  por  meio  de  objetos  que  nos  informamos,  nos  comunicamos  e  nos  expressamos,  estejam  eles  no  ambiente,  no  espaço  público  ou  privado, no transporte, nas redes ou no próprio corpo. São produtos construídos por estruturas objetivas e  lógicas, mas que possuem alta carga simbólica e subjetiva (MOURA e CASTILHO, 2013).  Moura  (2008)  afirma  que  “a  moda  é  uma  importante  área  de  produção  e  expressão  da  cultura  contemporânea.  Tanto  apresenta  reflexos  e  referências  da  sociedade  quanto  dos  usos  e  costumes  do  cotidiano.  A  dinâmica  da  moda  permite  refletir,  criar,  participar,  interagir,  disseminar  estes  costumes.  Portanto, o desenvolvimento e a expressão da moda ocorrem a partir das inter‐relações entre a criação, a  cultura  e  a  tecnologia,  bem  como  dos  aspectos  históricos,  sociopolíticos  e  econômicos”  (p.  37).    Para  a  autora, a moda também se refere ao modo como as pessoas utilizam os objetos escolhidos por elas para  compor  seu  estilo  de  vida,  que  vai  além  do  vestir.  Objetos  estes  que  são  gerados  por  um  mercado  ou  indústria de moda. O design exerce a atividade de configurar objetos de uso e sistemas de informação. A  moda também configura objetos de uso – desenvolvimento de peças e coleções – e, mesmo que de forma  indireta,  produz  sistemas  de  informação.  Sanches‐Montemezzo  (2003)  argumenta  que  se  a  concepção  destes  produtos  de  moda  se  apropria  da  interpretação  de  fatores  sociais,  antropológicos,  ecológicos,  ergonômicos,  tecnológicos  e  econômicos,  juntamente  com  às  necessidades  e  desejos  do  público  consumidor,  tal  processo  “se  encaixa  perfeitamente  na  conduta  criativa  de  resolução  de  problemas  de  design” (p. 52).  O design se apropria do panorama cultural, social, econômico e ambiental para propor soluções inovadoras  para determinadas demandas a fim de melhor a qualidade de vida  do ser humano. Ele atua por meio da  integração  e  das  relações  entre  o  próprio  design,  a  tecnologia,  a  inovação,  a  experimentação  e  a  multiplicidade. Desta forma, tanto os objetos criados a partir do design ou da moda existem devido à dois  caminhos distintos: o da expressão, significação e inovação, que vai além das relações mercadológicas; e o  do  circuito  industrial  e  comercial  que  atende  à  demanda  de  consumo  do  sistema  capitalista  (MOURA,  2008).  Para  Moraes  (2008),  independentemente  do  viés  do  produto  de  design  ou  de  moda,  é  necessário  que  as  referências  locais  e  culturais  daquele  contexto  sejam  pesquisadas,  interpretadas  e  decodificadas  como elementos de possível aplicação em projetos. 

     

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3. Processos e métodos  A prática projetual do período moderno era vista como processo decisório e de resolução de problemas.  Aspectos  técnicos  eram  melhor  considerados  do  que  aspectos  semânticos.  O  desenvolvimento  da  metodologia  de  design  tem  origem  nos  anos  1960,  especialmente  na  Escola  de  Design  de  Ulm,  devido  à  realidade  vivenciada  pelos  designers  nas  indústrias.  Alexander  (1964  apud  BÜRDEK,  2006)  cita  4  argumentos  para  a  existência  da  metodologia  de  projeto:  complexidade  dos  projetos  exigia  mais  do  que  intuição para sua solução; volume de informações a serem coletadas e manipuladas; volume de problemas  dentro  do  projeto;    crescente  particularidade  de  cada  projeto,  que  tornava  cada  vez  mais  raro  poder  se  valer  de  experiências  anteriores.  Para van  der  Linden  (2012),  o  conceito  de  complexidade  sempre  esteve  presente  no  discurso  projetual  de  forma  quantitativa.  No  cenário  atual,  a  complexidade  vai  além  de  aspectos quantitativos, e até qualitativos, “a noção de complexidade envolve a convivência com paradoxos,  como a ordem e a desordem atuando de forma autogenerativa“ (p. 88).  Na  contemporaneidade,  busca‐se  o  equilíbrio  entre  os  aspectos  técnicos  e  semânticos  dos  artefatos  (BONSIEPE,  2011).  O  design  contemporâneo  rompe  fronteiras  e  reintegra  diversas  áreas,  desde  as  mais  próximas  –  arte,  arquitetura,  engenharia,  moda,  sustentabilidade  –,  até  as  mais  distantes,  como  física  e  biotecnologia.  A  contemporaneidade  exige  que  se  conheça  contextos,  movimentos  sociais,  culturais  e  políticos, que se perceba formas de criação, expressão e comunicação e que o processo de projetar pense o  ser  humano,  trajetórias,  referências,  capacidade  de  transformação  e  adaptação  ao  contexto  (MOURA,  2011).  Torna‐se  fundamental  a  derrubada  de  barreiras  entre  os  campos  de  criação  e  projeto,  a  integração,  a  multidisciplinaridade para a expansão da reflexão e da ação na moda, no design e nos outros campos que  propiciem  a  interdisciplinaridade  (MOURA,  2008).  A  utilização  de  processos  e  métodos  de  design  para  o  desenvolvimento de produtos de moda ainda não está consolidada nas escolas ou empresas. No entanto, a  sistematização do processo criativo pode auxiliar na atividade projetual (SANCHES‐MONTEMEZZO, 2008). 

3.1

O método de Löbach 

O método de Löbach (2001) é voltado aos processos industriais. O autor vê o designer como um produtor  de  ideias  que  colhe  informações  e  as  utiliza  na  solução  de  problemas.  O  processo  de  design  deve  ser  criativo tanto quanto ele deve solucionar problemas. Para tanto, a definição clara do problema é o primeiro  passo. No cenário descrito pelo autor, a liderança da empresa e seus especialistas de mercado costumam  não  incluir  o  designer  na  tarefa  de  percepção  do  problema.  Ao  designer  é  entregue  a  tarefa  de  “propor  solução em forma de produto, para um determinado problema“ (p. 143). Seu método consiste em 4 fases  distintas:   a)  Preparação:  análise  do  problema  de  design,  reconhecimento,  coleta  e  análise  de  informações  sobre  a  necessidade.  b)  Geração:  geração  de  alternativas  para  o  problema  a  partir  da  escolha  dos  métodos  de  solução  de  problemas e produção de ideias.  c) Avaliação: avaliação das alternativas de design mediante critérios. A melhor solução é escolhida, ou as  melhores combinadas numa nova solução, e as características são incorporadas ao novo produto.  d)  Realização:  projeto  mecânico  e  estrutural,  configuração  dos  detalhes,  desenvolvimento  de  modelos.  A  alternativa deve ser revista e aperfeiçoada mais uma vez.  Todavia,  o  processo  permite  o  retorno  a  fases  anteriores  para  correção  de  inconsistências  ou  aprimoramento. Na prática do processo industrial, algumas fases podem acontecer simultaneamente.  Löbach  (2001)  enfatiza  que  o  designer  deve  ter  amplo  conhecimento  do  processo  produtivo  –  conhecimentos  sobre  o  problema  que  irá  resolver,  o  usuário  que  será  beneficiado,  patentes,  normas,  distribuição,  montagem,  manutenção  e  documentação.  Percebe‐se,  então,  a  necessidade  de  conhecimentos  específicos  dos  processos  industriais,  que  são  geralmente  coordenados  por  outros       

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  profissionais dentro da fábrica. 

3.2

O método de Baxter 

Baxter (1998) aponta a necessidade de pesquisa, planejamento e controle rígidos sempre direcionados ao  desenvolvimento  de  produtos  orientados  para  o  consumidor.  Para  ele,  o  desenvolvimento  de  novos  produtos (DNP) é multifatorial e seu sucesso ou fracasso depende da análise de diversos fatores internos  (logística, montagem, etc) e externos (durabilidade, preço, etc). A forma como será conduzido o processo  durante  todo  o  seu  desenvolvimento  é  que  trará  maiores  chances  de  sucesso  ao  novo  produto.  O  autor  acredita  que  o  DNP  deve  ser  regido  por  um  método  sistemático  e  ter  uma  abordagem  interdisciplinar  –  design,  engenharia,  marketing,  entre  outras  áreas  relacionadas.  Tal  processo  se  aproxima  de  uma  metodologia de gerenciamento de projetos. Seu processo compreende 4 fases:  a)  Oportunidade  de  negócio:  exploração  de  ideias  para  primeiro  teste  de  mercado.  Se  a  proposta  for  aprovada, segue‐se para segunda fase.  b)  Especificação  do  projeto:  coleta  de  dados  teóricos  e  de  mercado.  Projeto  conceitual:  geração  de  conceitos. O  conceito é submetido a um segundo teste de  mercado. Se aprovado, segue‐se para terceira  fase.  c) Projeto de configuração: geração de mais alternativas, desta vez levando em conta as aplicações práticas.  Alterações no projeto são comuns, o que acarreta o retorno a uma ou duas fases e a revisão daquelas. Com  a  configuração  do  produto  definida,  a  melhor  alternativa  é  selecionada  de  acordo  com  os  critérios  especificados e encaminhada para o terceiro teste de mercado. Se aprovada, segue‐se para a quarta fase.  d) Projeto detalhado: desenhos do produto e seus componentes, construção de um protótipo. Projeto para  fabricação: definição dos parâmetros para processo de produção.  Etapas e atividades não seguem uma linha reta, pois avanços e retornos estão previstos no processo, já que  uma  decisão  pode  afetar  uma  alternativa  anteriormente  adotada. “O  proceso  decisório  é    estruturado  e  ordenado,  mas  nada  indica  que  as  atividades  geradoras  dessas  decisões  tambem  devam  seguir  a  mesma  estrutura“ (p. 16).  

3.3

O método de Bürdek 

Bürdek  (2006)  caracteriza  seu  modelo  do  processo  de  design  como  um  sistema  de  manipulação  de  informações onde é possível “realimentar” (feedback) suas fases e tornar o processo de projeto não‐linear.  Apesar  de  ter  estabelecido  orientações  básicas  de  projeto,  o  autor  afirma  que  é  a  complexidade  do  problema que determina o repertório metodológico a ser utilizado. Para o autor, o processo de design se  divide em 6 fases:  a) Problematização  b) Análise da situação corrente  c) Definição do problema e definição de metas  d) Projeto de conceitos  e construção de alternativas  e) Valorização e precisão de alternativas  f) Planejamento do desenvolvimento e de produção  No  entanto,  a  ênfase  de  sua  publicação  não  está  na  descrição  detalhada  do  processo,  mas  sim  na  apresentação  de  novos  métodos  que  surgiram  a  partir  do  anos  1990  e  se  distanciam  da  linearidade  do  processo  de  projeto  para  buscar  necessidades  e  desejos  dos  usuários.  Os  métodos  apontados  são:  Mind  Mapping (mapas mentais que auxiliam na estruturação de problemas), Cenários (auxiliam na investigação  de modos de vida futuros), Mood Charts (painéis imagéticos que detalham o universo de interesse), Grupo‐ alvo  (observação  e  análise  qualitativa,  com  devido  suporte  das  ciências  sociais,  para  obtenção  de  informação sobre determinado nicho),  Clínica de Produtos (apresentação de produtos para avaliação dos       

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  "testadores",  outro  método  que  também  conta  o  suporte  das  ciências  sociais),  Usabilidade  (avaliação  do  desempenho de interfaces junto ao usuário), Design Não‐Intencional (avaliação da utilização de produtos  após sua aquisição).  Bürdek (2006) aponta a evolução do pensamento de projeto, que antes se atentava apenas às exigências  práticas  (ergonômicas,  construtivas,  produtivas,  etc)  e  hoje,  o  designer  passa  a  se  preocupar  em  compor  contextos e cenários que ajudem a configurar o produto, pois a configuração vai além da forma. No lugar  de: “Como as coisas são feitas?” devemos dizer agora: “O que significam as coisas para nós?” (p. 258).  3.4

O metaprojeto por Moraes 

Moraes  (2010)  apresenta  o  conceito  por  meio  do  significado  do  verbete:  “que  vai  além  do  projeto,  que  transcende o projeto, que faz reflexão crítica e reflexiva sobre o próprio projeto” (p. 28). O metaprojeto é  uma plataforma de conhecimentos que nasceu da necessidade de orientar e sustentar a atividade projetual  no cenário atual –  complexo, fluído e dinâmico. É a  ideação e organização  do processo de pesquisa  e de  projeto, fase de observação da realidade e de modelação sintética da realidade observada. Ele não substitui  métodos projetuais tradicionais, mas se porta como suporte, definindo o percurso do projeto considerando  o  contexto.  Seu  formato  é  dimensionado  de  acordo  com  a  complexidade  do  projeto,  sendo  um  modelo  dinâmico de construção e verificações contínuas. Sua construção é mais intensa durante as fases iniciais e  durante  as  fases  intermediárias  e  finais  do  projeto  são  realizadas  verificações  por  meio  de  feedbacks.  O  modelo  é  flexível  e  permite  reverter  decisões  sem  prejuízos.  Nele  também  são  abordados  conteúdos  imateriais e intangíveis ‐ mediação entre significado do produto (conceito) e sua significância (valor). Sua  aplicação  “auxilia  na  compreensão  das  profundas  transformações tecnológicas,  produtivas  e  de  consumo  contemporâneas  por  meio  do  design”  (p.  32).  Seus  aspectos  componentes  se  comportam  numa  relação  biunívoca,  direta  e  circundante  entre  eles,  não  havendo  uma  sequência  única  ou  linear.  Estes  devem  ser  explorados e até ampliados de acordo com a demanda do projeto.  a) Aspectos produtivos e tecnológicos: tecnologia produtiva, materiais, interação.  b)  Aspectos  tipológicos  ergonômicos  e  formais:  fatores  cognitivos,  otimização  da  relação  homem/espaço/produto.  c) Aspectos mercadológicos: visão, concept, identidade, missão, posicionamento estratégico.  d) Aspectos socioculturais: ética, estética, cultura, território, cultura material.  e) Sistema produto/design: estratégia que determina a interação entre produto, comunicação, mercado e  serviço.  f) Sustentabilidade ambiental: materiais e processos de baixo impacto ambiental, consideração do ciclo de  vida do produto.  O  output  do  metaprojeto  é  um  sistema  de  conhecimentos  prévios,  articulado  e  complexo,  que  serve  de  guia durante o processo projetual. 

3.5

O método de Sanches‐Montemezzo 

Sanches‐Montemezzo  (2003;  2008)  propõe  uma  estrutura  projetual  para  o  desenvolvimento  de  produtos  de  moda  formada  por  uma  cadeia  de  operações  que  produz  informações,  sempre  seguidas  de  análise,  síntese e avaliação. Sua proposta de estruturação do processo se baseia nos conceitos de desenvolvimento  de  produtos  de  Baxter  (1998)  e  Löbach  (2001).  O  método  não  pretende  ser  um  modelo  rígido  de  procedimentos ou uma “receita de fazer produtos de moda”, mas sim um guia de desenvolvimento. Para a  autora,  “as  ferramentas  de  projeto  irão  promover  a  sistematização  do  processo  criativo  e  sua  interação  com o mercado e sistemas produtivos“ (2008, p. 294). O processo é dividido em 4 fases:  a)  Planejamento:  coleta  e  análise  de  informações.  A  análise  auxilia  na  delimitação  das  características  necessárias  àquele  conjunto  de  produtos  –  direcionamento  mercadológico,  metas  técnicas,  funcionas  e  estéticas.       

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  b)  Geração  de  alternativas:  materialização  das  ideias  sobre  possibilidades  de  produtos.  O  conceito  é  transformado  em  elementos  compositivos  para  a  configuração  dos  produtos  e  são  definidos  materiais  e  tecnologias.  c)  Avaliação  e  detalhamento:  seleção  das  alternativas  mais  adequadas  para  a  coleção.  O  detalhamento  inclui preparação das fichas técnicas, desenvolvimento de modelagens, protótipos de teste para avaliações  de usabilidade, técnico‐produtivas e comerciais;  d)  Produção:  refinamento  do  projeto  para  produção  seriada.  Protótipos  de  teste  são  corrigidos  e  adequados para que fichas técnicas e peças pilotos sejam geradas e guiem a produção.  Na prática, as fases do processo podem se mesclar, assim como a revisão de resultados e retorno a uma  fase  anterior  para  correção  de  pontos  inconsistentes  de  acordo  com  o  planejamento.  É  essencial  que  as  análises  e  avaliações  sempre  caminhem  para  uma  solução  coerente,  sendo  guiadas  por  metas  claras  a  serem atingidas.  O designer de moda não é diretamente responsável por todas as etapas do processo, desde a concepção  até a produção. Etapas como compra de matéria‐prima, embalagens, publicidades e propaganda, estratégia  de vendas, entre outras, são de responsabilidade de outros profissionais e setores, apesar da importância  de  serem  acompanhadas  pelo  designer.  Assim  como  o  acompanhamento  da  comercialização  do  produto  pode  fornecer  informações  essenciais  para  o  desenvolvimento  de  novos  produtos.  A  busca  e  a  interpretação  do  contexto  são  pré‐requisitos  para  a  criação  de  produtos  de  moda  “atrativos  e  eficazes,  segundo parâmetros técnicos, econômicos, mercadológicos e, principalmente, humanos e sociais“ (p. 301). 

4. Discussão  O processo de design de Löbach (2001) não contempla todas as fases da vida de um artefato. Ele tem início  a  partir  de  uma  necessidade  já  problematizada  por  terceiros  e  se  encerra  na  fase  de  realização.  Desta  forma, não contempla a percepção do problema, não acompanha e analisa a experiência de uso ou orienta  o  descarte  deste  artefato  –  fases  importantes  e  que  passaram  a  ser  exploradas  apenas  na  contemporaneidade. De forma semelhante, o processo de desenvolvimento de produtos de Baxter (1998)  se encerra no protótipo de produção.   Apesar  do  modelo  de  processo  de  design  de  Bürdek  (2006)  ir  apenas  até  a  fase  de  planejamento  do  desenvolvimento  e  de  produção,  não  alcançando  as  fases  de  uso  e  descarte,  os  métodos  propostos  pelo  autor  são  adequados  para  as  fases  consideradas  e  não  consideradas  em  seu  processo  de  design.  Estes  métodos representam parte da gama de métodos contemporâneos utilizados para se compreender melhor  o  usuário.  Os  métodos  de  Clínica  de  Produtos  e  Design  Não‐Intencional  têm  importância  especial  por  coletarem informações relacionadas à percepção do uso em situação de teste e em situação real relevantes  para  se  retroalimentar  o  processo  de  design,  tanto  no  aprimoramento  dos  produtos  ainda  em  desenvolvimento  quanto  no  aprimoramento  de  produtos  a  serem  desenvolvidos  posteriormente.  A  importância do diálogo com as ciências sociais também é nítida.  No  metaprojeto  de  Moraes  (2010),  todas  as  fases  do  ciclo  de  vida  do  produto  são  atendidas.  A  reflexão  proporcionada  influencia  desde  a  tarefa  percepção  do  problema  até  a  projeção  do  uso  e  descarte,  enxergando o produto/sistema/serviço como um projeto existente também fora do contexto da fábrica. O  metaprojeto  se  caracteriza  plenamente  como  uma  disciplina  contemporânea,  que  propõe  o  exercício  de  projeto  como  uma  atividade  também  reflexiva,  que  apesar  de  levar  em  conta  a  dimensão  produtiva  e  mercadológica,  não  deixa  de  lado  os  aspectos  socioculturais,  ergonômicos  e  sustentáveis,  voltando  o  usuário ao centro do projeto.  Assim como acontece nos processos de Löbach (2001) e Baxter (1998), o processo de design de moda de  Sanches‐Montemezzo  (2003;  2008)  também  não  contempla  todas  as  fases  da  vida  de  um  artefato,  entretanto a autora menciona a importância de, ao menos, acompanhar de forma paralela os profissionais  e responsáveis pela outras atividades do processo produtivo.        

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5. Considerações finais  O  crescente  volume  de  informações  e  os  problemas  cada  vez  mais  transversais  exigem  conjunção  dos  saberes  e  ação  coletiva  para  se  alcançar  soluções  inovadoras.  Design  e  moda  não  desenvolvem  produtos  sozinhos e precisam do intercâmbio de informações e da interação com outras áreas para tal, assim como  da investigação do contexto que cerca o usuário e do acompanhamento do uso e do descarte do produto.  Os  processos  de  Löbach  (2001)  e  Baxter  (1998)  têm  características  funcionalistas  e  tentam  solucionar  problemas  isolados.  Bürdek  (2006)  já  apresenta  métodos  contemporâneos,  alguns  inclusive  oriundos  das  ciências sociais, e que trazem o usuário inserido em seu contexto para o centro do projeto. Moraes (2010)  apresenta  o  metaprojeto  como  uma  alternativa  interessante  para  a  demanda  de  interpretação  da  complexidade  contemporânea  a  ser  utilizada  junto  a  um  método  convencional  de  desenvolvimento  de  produto,  como  os  de  Löbach  (2001)  e  Baxter  (1998).  Grande  parte  da  produção  de  artefatos  de  moda  é  industrial. Sanches‐Montemezzo (2003; 2008) carrega boa parte da sistemática de Löbach (2001) e Baxter  (1998)  para  descrever  seu  método.  No  entanto,  a  autora  reforça  a  importância  da  pesquisa  e  da  interpretação de contextos para atender, principalmente, aos aspectos semânticos, tarefa que pode vir a  ser cumprida com o metaprojeto de Moraes (2010).  Na contemporaneidade, especialmente devido a diluição de fronteiras entre áreas e segmentos, torna‐se  importante  o  estudo  a  respeito  dos  processos  e  métodos  já  desenvolvidos.  O  processo,  na  concepção  contemporânea, ganhou lugar de destaque, onde não importa somente o resultado final do produto e sim  seu  processo,  fato  que  gera  maior  valor  e  cria  uma  rede  de  significados  do  produto  que  vão  além  dos  materiais, das formas e tecnologias empregadas ou do estilo abordado. Passa a ter mais destaque a ação  do criador/designer, expressa pelo processo de criação e produção gerando a ampliação da significação que  o objeto, produto ou peça desenvolvida por uma determinada área.   A  integração  dos  processos  e  métodos  do  design  e  da  moda  vem  a ampliar  e  fortalecer  o  saber  de  cada  uma  dessas  áreas  que,  mediante  a  atuação  interdisciplinar,  possibilitam  maior  valorização  dos  produtos,  muito além do seu entorno, construindo os sentidos do simbólico e da significação.      

Agradecimentos  Os autores agradecem à CAPES pela bolsa de mestrado demanda social. 

  Referências  Baxter, M., 1998. Projeto do produto: guia prático para o desenvolvimento de novos produtos. São Paulo: Blücher.  Bomfim, G. A., 2014. Epistemologia do design. In: Couto, R. M. de S.; Farbiaz, J. de L.; Novaes, L. Gustavo Amarante  Bomfim: uma coletânea. Rio de Janeiro: Rio Books, pp. 111‐126.  Bonsiepe, G., 2011. Design, cultura e sociedade. São Paulo: Blücher.  Bürdek, B., 2006. Design: História, Teoria e Prática do Design de Produtos. São Paulo: Blücher.  Lipovetsky, G.; Serroy, J., 2011. A cultura‐mundo: resposta a uma sociedade desorientada. São Paulo: Companhia das  Letras.  Löbach, B. 2001. Desenho industrial: bases para a configuração dos produtos industriais. São Paulo: Blücher.  Moraes, D. de, 2008. Moda, design e complexidade. In: Pires, D. B. Design de Moda: olhares diversos. Barueri: Estação  das Letras e Cores, pp.155‐161. 

     

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  Moraes, D. de, 2010. Metaprojeto: o design do design. São Paulo: Blucher.  Moura, M., 2008. A moda entre a arte e o design. In: Pires, D. B. Design de Moda: olhares diversos. Barueri: Estação  das Letras e Cores, pp.37‐73.  Moura, M., 2011.  Interdisciplinaridades no Design Contemporâneo. In: Menezes, M; Paschoarelli, L. C.; Moura, M.  Metodologias em design: inter‐relações. Bauru: FAAC/Unesp, pp.255‐275.  Moura, M.; Castilho, K., 2013. Moda e design: linguagens contemporâneas na construção teórica e crítica.  Contemporânea [online] Available at:  [Acessed 24 november 2015].  van der Linden, J. C. S. Lacerda, A. P., 2012. Metodologia projetual em tempos de complexidade. In: Martins, R. F. de  F.; van der Linden, J. C. S. Pelos caminhos do design: metodologia de projeto. Londrina: EDUEL, pp.83‐150.  Sanches‐Montemezzo, M. C. F., 2003. Diretrizes metodológicas para o projeto de produtos de moda no âmbito  acadêmico. M.D. Universidade Estadual Paulista Júlio de Mesquita Filho.  Sanches‐Montemezzo, M. C. F., 2008. Projetando moda: diretrizes para a concepção de produtos. In: Pires, D. B.  Design de Moda: olhares diversos. Barueri: Estação das Letras e Cores, pp.289‐301. 

     

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