DESIGN E MODA: PROCESSOS E MÉTODOS NO CENÁRIO CONTEMPORÂNEO LÍLIAN LAGO1, MÔNICA MOURA2 1
Universidade Estadual Paulista ‐ UNESP ‐ PPG Design, Mestranda ‐
[email protected]
2
Universidade Estadual Paulista – UNESP – PPG Design, Dra. ‐
[email protected]
Resumo: A contemporaneidade reforça a importância dos papéis do design e da moda como criadores de artefatos por meio dos quais nos comunicamos ou expressamos. Mediante a revisão de literatura e análises qualitativas, o trabalho apresenta um breve panorama sobre os processos e métodos de design e moda e a forma como estes estão inter‐relacionados no cenário contemporâneo, apontando possibilidades de integração e troca de saberes entre as áreas. Na contemporaneidade, o processo ganha lugar de destaque por gerar maior valor e ampliar a significação do artefato. Palavras‐chave: design, moda, processos, métodos
1. Introdução Este artigo é parte do resultado de uma pesquisa de abordagem qualitativa que aplicou revisão de literatura e análise das teorias relacionadas ao desenvolvimento de produtos ‐ processos e métodos ‐ de design e moda. Para tanto foram selecionados 5 autores considerados referência no ensino e prática do design e da moda no cenário brasileiro: Löbach (2001), Baxter (1998), Bürdek (2006), Moraes (2010) e Sanches‐Montemezzo (2003; 2008). Löbach é um pesquisador e designer alemão e despontou como expoentes nos anos 1970 junto à escola funcionalista. Seu livro foi publicado no Brasil em 2001. Baxter é pesquisador membro do Design Research Center da Universidade de Brunel, Londres, e teve seu livro publicado em 1995 na Inglaterra e 1998 no Brasil. Bürdek é ex‐aluno da HfG Ulm e professor de uma escola de design alemã. Seu livro foi publicado em 1991 e uma nova versão revista e atualizada chegou ao Brasil em 2006. Moraes é um designer e pesquisador brasileiro que teve a oportunidade de entrar em contato com as questões metaprojetuais estudadas por alguns dos professores do Instituto Politecnico di Milano durante sua estadia para o doutorado. Acompanhando a evolução do metaprojeto, Moraes lançou seu livro sobre o tema em 2010. Sanches‐Montemezzo é designer, pesquisadora de design e moda e consultora. Pesquisa a metodologia do projeto para desenvolvimento de produtos de moda. Suas obras tomadas como referência para este estudo são Sanches‐Montemezzo (2003; 2008). Löbach e Bürdek compartilham o contexto do design nos 1970, apesar da obra de Bürdek (2006) apresentar propostas mais recentes nesta atualização. Baxter, assim como os autores citados, compartilha do contexto europeu desenvolvido e industrial. Moraes, em meados dos anos 2000, vivenciou a evolução da pesquisa sobre o metaprojeto, modelo dinâmico desenvolvido justamente para lidar com a complexidade contemporânea, na Itália e trouxe seus estudos para o Brasil. Sanches‐Montemezzo (2003; 2008) compartilha do cenário contemporâneo, que exige a pesquisa e a interpretação de contextos para o atendimento aos aspectos semânticos tanto quanto o atendimento aos aspectos técnicos. O objetivo desde trabalho é apresentar um breve panorama sobre os processos e métodos de design e moda e a forma como estes estão inter‐relacionados no cenário contemporâneo, apontando possibilidades de integração e troca de saberes entre o design e a moda.
CIMODE 2016 - 3º Congresso Internacional de Moda e Design | ISBN 978-972-8692-93-3
2297
2. O design e a moda Lipovestky e Serroy (2011) intitulam o período pós‐moderno como “hipermoderno” – caracterizado pela hipertrofia deste tempo, um “mundo hiper, no qual o homem, à medida que tem mais, e mesmo demais, chega a se perguntar se tem melhor” (p. 22). As escolhas do indivíduo são livres e subjetivas, inclusive aquelas relacionadas ao consumo. O poder de alcance e rapidez de circulação das mídias e da publicidade tem relação direta com este fenômeno. Todos os campos pertencentes à sociedade atual estão sob a influência das novas tecnologias de informação e de comunicação, caracterizando esta sociedade como “informacional”, mesmo que num formato de comunicação “desmassificada”, onde os meios de comunicação precisam se voltar para nichos de mercado cada vez mais específicos. A comunicação reforça a valorização da estética, que passou a predominar no cotidiano contemporâneo. A importância da estética se relaciona diretamente com a criatividade e com a ascensão dos segmentos considerados criativos – comunicação, design, moda e arte. Bomfim (2014) afirma que o design é uma atividade de configuração de objetos de usos e sistemas de informação. Assim como qualquer outra atividade do trabalho social, o design é orientado pelo que determinam as instituições sociais vigentes – seus objetivos de natureza ideológica, política, social, econômica, entre outros. Para Bonsiepe (2011) “o designer possibilita novas experiências na vida cotidiana numa sociedade – experiências no uso de produtos, signos, serviços, inclusive experiências de caráter estético que, por sua vez dependem de uma dinâmica sociocultural” (p. 230). A moda e o design têm forte papel no contexto contemporâneo, pois é por meio de objetos que nos informamos, nos comunicamos e nos expressamos, estejam eles no ambiente, no espaço público ou privado, no transporte, nas redes ou no próprio corpo. São produtos construídos por estruturas objetivas e lógicas, mas que possuem alta carga simbólica e subjetiva (MOURA e CASTILHO, 2013). Moura (2008) afirma que “a moda é uma importante área de produção e expressão da cultura contemporânea. Tanto apresenta reflexos e referências da sociedade quanto dos usos e costumes do cotidiano. A dinâmica da moda permite refletir, criar, participar, interagir, disseminar estes costumes. Portanto, o desenvolvimento e a expressão da moda ocorrem a partir das inter‐relações entre a criação, a cultura e a tecnologia, bem como dos aspectos históricos, sociopolíticos e econômicos” (p. 37). Para a autora, a moda também se refere ao modo como as pessoas utilizam os objetos escolhidos por elas para compor seu estilo de vida, que vai além do vestir. Objetos estes que são gerados por um mercado ou indústria de moda. O design exerce a atividade de configurar objetos de uso e sistemas de informação. A moda também configura objetos de uso – desenvolvimento de peças e coleções – e, mesmo que de forma indireta, produz sistemas de informação. Sanches‐Montemezzo (2003) argumenta que se a concepção destes produtos de moda se apropria da interpretação de fatores sociais, antropológicos, ecológicos, ergonômicos, tecnológicos e econômicos, juntamente com às necessidades e desejos do público consumidor, tal processo “se encaixa perfeitamente na conduta criativa de resolução de problemas de design” (p. 52). O design se apropria do panorama cultural, social, econômico e ambiental para propor soluções inovadoras para determinadas demandas a fim de melhor a qualidade de vida do ser humano. Ele atua por meio da integração e das relações entre o próprio design, a tecnologia, a inovação, a experimentação e a multiplicidade. Desta forma, tanto os objetos criados a partir do design ou da moda existem devido à dois caminhos distintos: o da expressão, significação e inovação, que vai além das relações mercadológicas; e o do circuito industrial e comercial que atende à demanda de consumo do sistema capitalista (MOURA, 2008). Para Moraes (2008), independentemente do viés do produto de design ou de moda, é necessário que as referências locais e culturais daquele contexto sejam pesquisadas, interpretadas e decodificadas como elementos de possível aplicação em projetos.
CIMODE 2016 - 3º Congresso Internacional de Moda e Design | ISBN 978-972-8692-93-3
2298
3. Processos e métodos A prática projetual do período moderno era vista como processo decisório e de resolução de problemas. Aspectos técnicos eram melhor considerados do que aspectos semânticos. O desenvolvimento da metodologia de design tem origem nos anos 1960, especialmente na Escola de Design de Ulm, devido à realidade vivenciada pelos designers nas indústrias. Alexander (1964 apud BÜRDEK, 2006) cita 4 argumentos para a existência da metodologia de projeto: complexidade dos projetos exigia mais do que intuição para sua solução; volume de informações a serem coletadas e manipuladas; volume de problemas dentro do projeto; crescente particularidade de cada projeto, que tornava cada vez mais raro poder se valer de experiências anteriores. Para van der Linden (2012), o conceito de complexidade sempre esteve presente no discurso projetual de forma quantitativa. No cenário atual, a complexidade vai além de aspectos quantitativos, e até qualitativos, “a noção de complexidade envolve a convivência com paradoxos, como a ordem e a desordem atuando de forma autogenerativa“ (p. 88). Na contemporaneidade, busca‐se o equilíbrio entre os aspectos técnicos e semânticos dos artefatos (BONSIEPE, 2011). O design contemporâneo rompe fronteiras e reintegra diversas áreas, desde as mais próximas – arte, arquitetura, engenharia, moda, sustentabilidade –, até as mais distantes, como física e biotecnologia. A contemporaneidade exige que se conheça contextos, movimentos sociais, culturais e políticos, que se perceba formas de criação, expressão e comunicação e que o processo de projetar pense o ser humano, trajetórias, referências, capacidade de transformação e adaptação ao contexto (MOURA, 2011). Torna‐se fundamental a derrubada de barreiras entre os campos de criação e projeto, a integração, a multidisciplinaridade para a expansão da reflexão e da ação na moda, no design e nos outros campos que propiciem a interdisciplinaridade (MOURA, 2008). A utilização de processos e métodos de design para o desenvolvimento de produtos de moda ainda não está consolidada nas escolas ou empresas. No entanto, a sistematização do processo criativo pode auxiliar na atividade projetual (SANCHES‐MONTEMEZZO, 2008).
3.1
O método de Löbach
O método de Löbach (2001) é voltado aos processos industriais. O autor vê o designer como um produtor de ideias que colhe informações e as utiliza na solução de problemas. O processo de design deve ser criativo tanto quanto ele deve solucionar problemas. Para tanto, a definição clara do problema é o primeiro passo. No cenário descrito pelo autor, a liderança da empresa e seus especialistas de mercado costumam não incluir o designer na tarefa de percepção do problema. Ao designer é entregue a tarefa de “propor solução em forma de produto, para um determinado problema“ (p. 143). Seu método consiste em 4 fases distintas: a) Preparação: análise do problema de design, reconhecimento, coleta e análise de informações sobre a necessidade. b) Geração: geração de alternativas para o problema a partir da escolha dos métodos de solução de problemas e produção de ideias. c) Avaliação: avaliação das alternativas de design mediante critérios. A melhor solução é escolhida, ou as melhores combinadas numa nova solução, e as características são incorporadas ao novo produto. d) Realização: projeto mecânico e estrutural, configuração dos detalhes, desenvolvimento de modelos. A alternativa deve ser revista e aperfeiçoada mais uma vez. Todavia, o processo permite o retorno a fases anteriores para correção de inconsistências ou aprimoramento. Na prática do processo industrial, algumas fases podem acontecer simultaneamente. Löbach (2001) enfatiza que o designer deve ter amplo conhecimento do processo produtivo – conhecimentos sobre o problema que irá resolver, o usuário que será beneficiado, patentes, normas, distribuição, montagem, manutenção e documentação. Percebe‐se, então, a necessidade de conhecimentos específicos dos processos industriais, que são geralmente coordenados por outros
CIMODE 2016 - 3º Congresso Internacional de Moda e Design | ISBN 978-972-8692-93-3
2299
profissionais dentro da fábrica.
3.2
O método de Baxter
Baxter (1998) aponta a necessidade de pesquisa, planejamento e controle rígidos sempre direcionados ao desenvolvimento de produtos orientados para o consumidor. Para ele, o desenvolvimento de novos produtos (DNP) é multifatorial e seu sucesso ou fracasso depende da análise de diversos fatores internos (logística, montagem, etc) e externos (durabilidade, preço, etc). A forma como será conduzido o processo durante todo o seu desenvolvimento é que trará maiores chances de sucesso ao novo produto. O autor acredita que o DNP deve ser regido por um método sistemático e ter uma abordagem interdisciplinar – design, engenharia, marketing, entre outras áreas relacionadas. Tal processo se aproxima de uma metodologia de gerenciamento de projetos. Seu processo compreende 4 fases: a) Oportunidade de negócio: exploração de ideias para primeiro teste de mercado. Se a proposta for aprovada, segue‐se para segunda fase. b) Especificação do projeto: coleta de dados teóricos e de mercado. Projeto conceitual: geração de conceitos. O conceito é submetido a um segundo teste de mercado. Se aprovado, segue‐se para terceira fase. c) Projeto de configuração: geração de mais alternativas, desta vez levando em conta as aplicações práticas. Alterações no projeto são comuns, o que acarreta o retorno a uma ou duas fases e a revisão daquelas. Com a configuração do produto definida, a melhor alternativa é selecionada de acordo com os critérios especificados e encaminhada para o terceiro teste de mercado. Se aprovada, segue‐se para a quarta fase. d) Projeto detalhado: desenhos do produto e seus componentes, construção de um protótipo. Projeto para fabricação: definição dos parâmetros para processo de produção. Etapas e atividades não seguem uma linha reta, pois avanços e retornos estão previstos no processo, já que uma decisão pode afetar uma alternativa anteriormente adotada. “O proceso decisório é estruturado e ordenado, mas nada indica que as atividades geradoras dessas decisões tambem devam seguir a mesma estrutura“ (p. 16).
3.3
O método de Bürdek
Bürdek (2006) caracteriza seu modelo do processo de design como um sistema de manipulação de informações onde é possível “realimentar” (feedback) suas fases e tornar o processo de projeto não‐linear. Apesar de ter estabelecido orientações básicas de projeto, o autor afirma que é a complexidade do problema que determina o repertório metodológico a ser utilizado. Para o autor, o processo de design se divide em 6 fases: a) Problematização b) Análise da situação corrente c) Definição do problema e definição de metas d) Projeto de conceitos e construção de alternativas e) Valorização e precisão de alternativas f) Planejamento do desenvolvimento e de produção No entanto, a ênfase de sua publicação não está na descrição detalhada do processo, mas sim na apresentação de novos métodos que surgiram a partir do anos 1990 e se distanciam da linearidade do processo de projeto para buscar necessidades e desejos dos usuários. Os métodos apontados são: Mind Mapping (mapas mentais que auxiliam na estruturação de problemas), Cenários (auxiliam na investigação de modos de vida futuros), Mood Charts (painéis imagéticos que detalham o universo de interesse), Grupo‐ alvo (observação e análise qualitativa, com devido suporte das ciências sociais, para obtenção de informação sobre determinado nicho), Clínica de Produtos (apresentação de produtos para avaliação dos
CIMODE 2016 - 3º Congresso Internacional de Moda e Design | ISBN 978-972-8692-93-3
2300
"testadores", outro método que também conta o suporte das ciências sociais), Usabilidade (avaliação do desempenho de interfaces junto ao usuário), Design Não‐Intencional (avaliação da utilização de produtos após sua aquisição). Bürdek (2006) aponta a evolução do pensamento de projeto, que antes se atentava apenas às exigências práticas (ergonômicas, construtivas, produtivas, etc) e hoje, o designer passa a se preocupar em compor contextos e cenários que ajudem a configurar o produto, pois a configuração vai além da forma. No lugar de: “Como as coisas são feitas?” devemos dizer agora: “O que significam as coisas para nós?” (p. 258). 3.4
O metaprojeto por Moraes
Moraes (2010) apresenta o conceito por meio do significado do verbete: “que vai além do projeto, que transcende o projeto, que faz reflexão crítica e reflexiva sobre o próprio projeto” (p. 28). O metaprojeto é uma plataforma de conhecimentos que nasceu da necessidade de orientar e sustentar a atividade projetual no cenário atual – complexo, fluído e dinâmico. É a ideação e organização do processo de pesquisa e de projeto, fase de observação da realidade e de modelação sintética da realidade observada. Ele não substitui métodos projetuais tradicionais, mas se porta como suporte, definindo o percurso do projeto considerando o contexto. Seu formato é dimensionado de acordo com a complexidade do projeto, sendo um modelo dinâmico de construção e verificações contínuas. Sua construção é mais intensa durante as fases iniciais e durante as fases intermediárias e finais do projeto são realizadas verificações por meio de feedbacks. O modelo é flexível e permite reverter decisões sem prejuízos. Nele também são abordados conteúdos imateriais e intangíveis ‐ mediação entre significado do produto (conceito) e sua significância (valor). Sua aplicação “auxilia na compreensão das profundas transformações tecnológicas, produtivas e de consumo contemporâneas por meio do design” (p. 32). Seus aspectos componentes se comportam numa relação biunívoca, direta e circundante entre eles, não havendo uma sequência única ou linear. Estes devem ser explorados e até ampliados de acordo com a demanda do projeto. a) Aspectos produtivos e tecnológicos: tecnologia produtiva, materiais, interação. b) Aspectos tipológicos ergonômicos e formais: fatores cognitivos, otimização da relação homem/espaço/produto. c) Aspectos mercadológicos: visão, concept, identidade, missão, posicionamento estratégico. d) Aspectos socioculturais: ética, estética, cultura, território, cultura material. e) Sistema produto/design: estratégia que determina a interação entre produto, comunicação, mercado e serviço. f) Sustentabilidade ambiental: materiais e processos de baixo impacto ambiental, consideração do ciclo de vida do produto. O output do metaprojeto é um sistema de conhecimentos prévios, articulado e complexo, que serve de guia durante o processo projetual.
3.5
O método de Sanches‐Montemezzo
Sanches‐Montemezzo (2003; 2008) propõe uma estrutura projetual para o desenvolvimento de produtos de moda formada por uma cadeia de operações que produz informações, sempre seguidas de análise, síntese e avaliação. Sua proposta de estruturação do processo se baseia nos conceitos de desenvolvimento de produtos de Baxter (1998) e Löbach (2001). O método não pretende ser um modelo rígido de procedimentos ou uma “receita de fazer produtos de moda”, mas sim um guia de desenvolvimento. Para a autora, “as ferramentas de projeto irão promover a sistematização do processo criativo e sua interação com o mercado e sistemas produtivos“ (2008, p. 294). O processo é dividido em 4 fases: a) Planejamento: coleta e análise de informações. A análise auxilia na delimitação das características necessárias àquele conjunto de produtos – direcionamento mercadológico, metas técnicas, funcionas e estéticas.
CIMODE 2016 - 3º Congresso Internacional de Moda e Design | ISBN 978-972-8692-93-3
2301
b) Geração de alternativas: materialização das ideias sobre possibilidades de produtos. O conceito é transformado em elementos compositivos para a configuração dos produtos e são definidos materiais e tecnologias. c) Avaliação e detalhamento: seleção das alternativas mais adequadas para a coleção. O detalhamento inclui preparação das fichas técnicas, desenvolvimento de modelagens, protótipos de teste para avaliações de usabilidade, técnico‐produtivas e comerciais; d) Produção: refinamento do projeto para produção seriada. Protótipos de teste são corrigidos e adequados para que fichas técnicas e peças pilotos sejam geradas e guiem a produção. Na prática, as fases do processo podem se mesclar, assim como a revisão de resultados e retorno a uma fase anterior para correção de pontos inconsistentes de acordo com o planejamento. É essencial que as análises e avaliações sempre caminhem para uma solução coerente, sendo guiadas por metas claras a serem atingidas. O designer de moda não é diretamente responsável por todas as etapas do processo, desde a concepção até a produção. Etapas como compra de matéria‐prima, embalagens, publicidades e propaganda, estratégia de vendas, entre outras, são de responsabilidade de outros profissionais e setores, apesar da importância de serem acompanhadas pelo designer. Assim como o acompanhamento da comercialização do produto pode fornecer informações essenciais para o desenvolvimento de novos produtos. A busca e a interpretação do contexto são pré‐requisitos para a criação de produtos de moda “atrativos e eficazes, segundo parâmetros técnicos, econômicos, mercadológicos e, principalmente, humanos e sociais“ (p. 301).
4. Discussão O processo de design de Löbach (2001) não contempla todas as fases da vida de um artefato. Ele tem início a partir de uma necessidade já problematizada por terceiros e se encerra na fase de realização. Desta forma, não contempla a percepção do problema, não acompanha e analisa a experiência de uso ou orienta o descarte deste artefato – fases importantes e que passaram a ser exploradas apenas na contemporaneidade. De forma semelhante, o processo de desenvolvimento de produtos de Baxter (1998) se encerra no protótipo de produção. Apesar do modelo de processo de design de Bürdek (2006) ir apenas até a fase de planejamento do desenvolvimento e de produção, não alcançando as fases de uso e descarte, os métodos propostos pelo autor são adequados para as fases consideradas e não consideradas em seu processo de design. Estes métodos representam parte da gama de métodos contemporâneos utilizados para se compreender melhor o usuário. Os métodos de Clínica de Produtos e Design Não‐Intencional têm importância especial por coletarem informações relacionadas à percepção do uso em situação de teste e em situação real relevantes para se retroalimentar o processo de design, tanto no aprimoramento dos produtos ainda em desenvolvimento quanto no aprimoramento de produtos a serem desenvolvidos posteriormente. A importância do diálogo com as ciências sociais também é nítida. No metaprojeto de Moraes (2010), todas as fases do ciclo de vida do produto são atendidas. A reflexão proporcionada influencia desde a tarefa percepção do problema até a projeção do uso e descarte, enxergando o produto/sistema/serviço como um projeto existente também fora do contexto da fábrica. O metaprojeto se caracteriza plenamente como uma disciplina contemporânea, que propõe o exercício de projeto como uma atividade também reflexiva, que apesar de levar em conta a dimensão produtiva e mercadológica, não deixa de lado os aspectos socioculturais, ergonômicos e sustentáveis, voltando o usuário ao centro do projeto. Assim como acontece nos processos de Löbach (2001) e Baxter (1998), o processo de design de moda de Sanches‐Montemezzo (2003; 2008) também não contempla todas as fases da vida de um artefato, entretanto a autora menciona a importância de, ao menos, acompanhar de forma paralela os profissionais e responsáveis pela outras atividades do processo produtivo.
CIMODE 2016 - 3º Congresso Internacional de Moda e Design | ISBN 978-972-8692-93-3
2302
5. Considerações finais O crescente volume de informações e os problemas cada vez mais transversais exigem conjunção dos saberes e ação coletiva para se alcançar soluções inovadoras. Design e moda não desenvolvem produtos sozinhos e precisam do intercâmbio de informações e da interação com outras áreas para tal, assim como da investigação do contexto que cerca o usuário e do acompanhamento do uso e do descarte do produto. Os processos de Löbach (2001) e Baxter (1998) têm características funcionalistas e tentam solucionar problemas isolados. Bürdek (2006) já apresenta métodos contemporâneos, alguns inclusive oriundos das ciências sociais, e que trazem o usuário inserido em seu contexto para o centro do projeto. Moraes (2010) apresenta o metaprojeto como uma alternativa interessante para a demanda de interpretação da complexidade contemporânea a ser utilizada junto a um método convencional de desenvolvimento de produto, como os de Löbach (2001) e Baxter (1998). Grande parte da produção de artefatos de moda é industrial. Sanches‐Montemezzo (2003; 2008) carrega boa parte da sistemática de Löbach (2001) e Baxter (1998) para descrever seu método. No entanto, a autora reforça a importância da pesquisa e da interpretação de contextos para atender, principalmente, aos aspectos semânticos, tarefa que pode vir a ser cumprida com o metaprojeto de Moraes (2010). Na contemporaneidade, especialmente devido a diluição de fronteiras entre áreas e segmentos, torna‐se importante o estudo a respeito dos processos e métodos já desenvolvidos. O processo, na concepção contemporânea, ganhou lugar de destaque, onde não importa somente o resultado final do produto e sim seu processo, fato que gera maior valor e cria uma rede de significados do produto que vão além dos materiais, das formas e tecnologias empregadas ou do estilo abordado. Passa a ter mais destaque a ação do criador/designer, expressa pelo processo de criação e produção gerando a ampliação da significação que o objeto, produto ou peça desenvolvida por uma determinada área. A integração dos processos e métodos do design e da moda vem a ampliar e fortalecer o saber de cada uma dessas áreas que, mediante a atuação interdisciplinar, possibilitam maior valorização dos produtos, muito além do seu entorno, construindo os sentidos do simbólico e da significação.
Agradecimentos Os autores agradecem à CAPES pela bolsa de mestrado demanda social.
Referências Baxter, M., 1998. Projeto do produto: guia prático para o desenvolvimento de novos produtos. São Paulo: Blücher. Bomfim, G. A., 2014. Epistemologia do design. In: Couto, R. M. de S.; Farbiaz, J. de L.; Novaes, L. Gustavo Amarante Bomfim: uma coletânea. Rio de Janeiro: Rio Books, pp. 111‐126. Bonsiepe, G., 2011. Design, cultura e sociedade. São Paulo: Blücher. Bürdek, B., 2006. Design: História, Teoria e Prática do Design de Produtos. São Paulo: Blücher. Lipovetsky, G.; Serroy, J., 2011. A cultura‐mundo: resposta a uma sociedade desorientada. São Paulo: Companhia das Letras. Löbach, B. 2001. Desenho industrial: bases para a configuração dos produtos industriais. São Paulo: Blücher. Moraes, D. de, 2008. Moda, design e complexidade. In: Pires, D. B. Design de Moda: olhares diversos. Barueri: Estação das Letras e Cores, pp.155‐161.
CIMODE 2016 - 3º Congresso Internacional de Moda e Design | ISBN 978-972-8692-93-3
2303
Moraes, D. de, 2010. Metaprojeto: o design do design. São Paulo: Blucher. Moura, M., 2008. A moda entre a arte e o design. In: Pires, D. B. Design de Moda: olhares diversos. Barueri: Estação das Letras e Cores, pp.37‐73. Moura, M., 2011. Interdisciplinaridades no Design Contemporâneo. In: Menezes, M; Paschoarelli, L. C.; Moura, M. Metodologias em design: inter‐relações. Bauru: FAAC/Unesp, pp.255‐275. Moura, M.; Castilho, K., 2013. Moda e design: linguagens contemporâneas na construção teórica e crítica. Contemporânea [online] Available at: [Acessed 24 november 2015]. van der Linden, J. C. S. Lacerda, A. P., 2012. Metodologia projetual em tempos de complexidade. In: Martins, R. F. de F.; van der Linden, J. C. S. Pelos caminhos do design: metodologia de projeto. Londrina: EDUEL, pp.83‐150. Sanches‐Montemezzo, M. C. F., 2003. Diretrizes metodológicas para o projeto de produtos de moda no âmbito acadêmico. M.D. Universidade Estadual Paulista Júlio de Mesquita Filho. Sanches‐Montemezzo, M. C. F., 2008. Projetando moda: diretrizes para a concepção de produtos. In: Pires, D. B. Design de Moda: olhares diversos. Barueri: Estação das Letras e Cores, pp.289‐301.
CIMODE 2016 - 3º Congresso Internacional de Moda e Design | ISBN 978-972-8692-93-3
2304