Desigualdades Sociais e a (Des)Igualdade de Oportunidades

September 23, 2017 | Autor: Diana Dias | Categoria: Music Education, Social Studies Education
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- Mestrado em Ensino da Música Unidade Curricular de Análise Social da Educação Ano Letivo de 2012/2013

Docente: Prof. Bruno Dionísio Discente: Diana Raquel da Silva Dias

Castelo Branco, 12 de Janeiro de 2013

Análise Social de Educação Escola Superior de Artes Aplicadas de Castelo Branco - ESART

Índice Introdução ..................................................................................................................................................2 A Justiça Escolar e a Igualdade de Oportunidades .........................................................................................3 . Caminhos Para Uma Escola Eficaz .........................................................................................................4 . Que Saída Para os Vencidos? ................................................................................................................5 Em Busca de um Modelo de Escola Eficaz ....................................................................................................6 . Críticas e Justificações ao Modelo Escolar Eficaz .....................................................................................6 As Políticas Educativas e a Interculturalidade ................................................................................................7 . Estereótipos no Meio Escolar .................................................................................................................8 Contrastes Sociais: Favorecidos vs. Desfavorecidos ......................................................................................9 . Escolas de Elite.....................................................................................................................................9 . Escolas em território marginalizados .................................................................................................... 10 . Comparação de realidades .................................................................................................................. 11 Conclusão ............................................................................................................................................... 13 Bibliografia............................................................................................................................................... 14 Declaração .................................................................................................. Erro! Marcador não definido.

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Introdução “(…) as politicas educativas começam a responder à ideia de crise e ineficácia da educação nacional refrescando as alternativas. A passagem de um desígnio nacional da garantia da igualdade universal de oportunidades para a necessidade de descentralização e de assunção de compromissos locais traz consigo um renovamento do debate em torno da missão da escola de massas agora virada para ideia de justiça escolar: da igualdade à equidade, da igualdade às desigualdades justas, passando pela distinção entre desigualdade e diferença”. Dionísio (2010: 312)

Este trabalho foi realizado no âmbito da Unidade Curricular de Análise Social da Educação, levando-me a um profunda pesquisa das problemáticas sociológicas em contextos escolar. Após uma pesquisa inicial, escolhi o tema das desigualdades sociais no meio escolar como ponto de partida para a recensão. De seguida, foram escolhidos dois textos disponibilizados pelo docente e outros dois pesquisados por mim, em publicações de referência. Os primeiros são textos de Dubet e de Bruno Dionísio, que falam respetivamente, da escola justa e da escola eficaz. Os segundos são textos de Marta Araújo e de Maria Quaresma, em que o primeiro trata da interculturalidade e das políticas educativas em Portugal para uma escola justa, e o segundo trata das realidades escolares em contextos sociais opostos. O trabalho apresenta-se estruturado em quatro partes: - A Justiça Escolar e a Igualdade de Oportunidades; - Em Busca de um Modelo de Escola Eficaz; - As Políticas Educativas e a interculturalidade; - Contrastes Sociais: Favorecidos vs. Desfavorecidos. Na conclusão é feita uma breve reflexão critica pessoal tendo em conta a pesquisa efetuada.

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A Justiça Escolar e a Igualdade de Oportunidades Os conceitos de igualdade e justiça escolar não são muito claros, sendo a definição do que será uma escola justa bastante complexa e ambígua: uma meritocracia (liderança baseada no mérito) escolar justa não garante a diminuição das desigualdades; a preocupação com a integração social dos alunos tem grande probabilidade de confirmar o seu destino social; a busca de um mínimo comum arrisca-se a limitar a expressão dos talentos; uma escola preocupada com a singularidade dos indivíduos age contra a cultura comum que uma escola deve transmitir, e que também é uma forma de justiça. Não há então uma só solução mas sim uma combinação de escolhas, embora que limitadas. A sociedade escolheu o mérito como princípio essencial de justiça: a escola é justa porque todos podem obter sucesso conforme o seu trabalho e as suas qualidades. Este conceito sempre foi limitado pois, ainda hoje, o “berço” continua a ditar consideravelmente o percurso escolar dos alunos. A igualdade de oportunidades meritocrática supõe igualdade de acesso. Nos países modernizados e ricos, este princípio foi implantado com o alongamento da escolaridade obrigatória e uma notável abertura do ensino secundário e superior. Apesar do acesso garantido, a escola não se tornou mais justa devido à redução da diferença dos resultados favoráveis entre categorias sociais, mas sim porque permitiu que todos os alunos pudessem entrar na mesma competição. Assim, todos os alunos têm possibilidade de alcançar a excelência e entrar nas áreas de maior prestígio. Ainda assim, este modelo apresenta grandes dificuldades: - A abertura de uma competição escolar objetiva não elimina as desigualdades. Desde o início os mais favorecidos têm vantagens decisivas. As desigualdades sociais pesam muito nas desigualdades escolares; - Este modelo de igualdade de oportunidades pressupõe uma oferta escolar perfeitamente igual e objetiva, ignorando as desigualdades sociais dos alunos. Isto não é a realidade, a escola trata menos bem os alunos menos favorecidos, não sendo a competição perfeitamente justa. Quanto mais favorecido é o meio de origem do aluno, maior é a sua probabilidade de uma educação melhor, de conseguir uma melhor formação e mais oportunidades profissionais; - A escola meritocrática atrai alunos mais fracos para uma competição da qual são excluídos. Isto é cruel, pois a escola torna-se o principal agente de seleção escolar e social, legitimando as desigualdades sociais; - Este modelo de igualdade de oportunidades pressupõe que todos os alunos sejam envolvidos na mesma competição e sejam submetidos às mesmas provas. Mas, aqui, as diferenças aprofundam-se rapidamente. Os alunos que não conseguem competir são postos de parte, marginalizados em círculos diferenciados, enfraquecendo. Pode-se então afirmar que o sistema meritocrático cria enormes desigualdades entre alunos bons e os menos bons.

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Apesar destas considerações, o modelo de escola justa com base no mérito não pode ser abandonado. Numa sociedade democrática, o mérito pessoal é a única forma de construir desigualdades justas e legítimas. Para que isso aconteça é necessário assegurar a existência de igualdade de ofertas escolares de modo a evitar a parcialidade dos encaminhamentos de trajetórias, benefícios e cumplicidades evidentes entre a escola e determinados grupos sociais. É também evidente que ainda estamos longe da igualdade de oportunidades, sendo oferecidos sistemas escolares diferentes e desiguais aos diferentes grupos sociais. Mas, mesmo que o sistema meritocrático seja aperfeiçoado, tem os seus próprios limites intrínsecos, pois o seu ponto fraco reside no facto de produzir mais vencidos que vencedores. Não se pode ignorar que a igualdade de acesso supõe uma grande redução das desigualdades sociais, mas, sozinha, nenhuma escola consegue criar uma sociedade mais igualitária. Para a escola ser mais justa seria preciso que esta tivesse em conta as desigualdades reais e procurasse de certa forma compensá-las – princípio da discriminação positiva. Esta discriminação tem um aspeto negativo, pois de um lado temos escolas elitistas, e do outro as escolas desfavorecidas. A melhor maneira de combater este fenómeno passa pela introdução de mecanismos compensatórios eficazes e centrados nos alunos e no seu trabalho. Apesar disso, é de notar a ocorrência de três fenómenos relativos à justiça distributiva: há resistência por parte dos alunos a quem o sistema meritocrático beneficia; estes dispositivos têm influência limitada e não conseguem alterar a produção das desigualdades escolares; os grupos sociais mais mal posicionados em relação à escola, que deveriam defender estes ideais, não têm capacidade para defendê-los. Um outro ponto de destaque tem a ver com o facto de que uma escola justa deveria garantir a proteção e o mínimo de recursos aos mais desfavorecidos, garantindo também limites mínimos abaixo dos quais ninguém deveria ficar. Segundo Dubet (2004), citando Rawls, “(…) as desigualdades são aceitáveis, ou mesmo justas, quando não pioram as condições dos mais fracos”. O sistema justo não é o que reduz as desigualdades entre os melhores e os piores, mas sim o que garante aquisições e competências elementares aos alunos menos bons e menos favorecidos. Desta forma, os programas de escolaridade obrigatória devem ser definidos a partir das exigências comuns garantidas a todos. . Caminhos Para Uma Escola Eficaz A escola tem como objetivo oferecer diplomas a todos os alunos, podendo considerar-se que estes têm um valor utilitário, pois fixam o nível e as oportunidades de emprego pretendidos por cada indivíduo. Mas, uma das grandes causas de injustiça reside no facto de que uns diplomas têm grande utilidade, enquanto outros não têm nenhuma.

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Imaginar que todos os diplomas têm a mesma utilidade é fictício, sendo alarmante que alguns dos diplomas de cursos de formação geral mais fraca não oferecem nem uma profissão, nem um nível de qualificação capaz de fazer diferença no mercado de trabalho. A ligação entre formação e emprego é complexa, não sendo possível afirmar que a escola está na origem do desemprego dos jovens, mas também não é totalmente inocente. Há cursos secundários e superiores que são uma grande fachada, para onde são lançados os alunos com falta de opções. É uma grande injustiça deixar os alunos envolverem-se em formações desprovidas de utilidade social. Um sistema justo é aquele que assegura uma certa independência entre as diversas esferas (económica, social, escolar, política, cultural). É preciso ter em conta o efeito das desigualdades concebidas pela escola sobre as desigualdades sociais – uma escola justa não pretende fazer a triagem dos indivíduos de forma definitiva, permitindo aos que fracassaram ou saíram ter uma nova oportunidade. A escola atual exerce uma enorme influência sobre o destino dos indivíduos, tornando-a injusta, pois as suas próprias desigualdades têm menos impacto na vida social, da mesma forma que as desigualdades sociais se refletem menos na escola. Desta forma, uma escola menos ligada à formação de elites e menos estigmatizante para os alunos fracos, terá efeitos sociais menos injustos. . Que Saída Para os Vencidos? O objetivo de que todos tenham sucesso é inalcançável, pois vai contra os princípios escolares meritocráticos. Mas, uma escola justa reconhece-se pelo bom tratamento dos vencidos, preservando a sua dignidade e igualdade de princípios com os outros. Isto supõe dois grandes tipos de ação: revalorização do ensino técnico e profissional e um interesse maior pelos gostos dos alunos e pelos seus talentos; Afirmação do papel educativo da escola. Os vencidos serão mais bem tratados quando se pensar que a escola deve educar todos os alunos independentemente do seu desempenho escolar, quando os alunos e as suas famílias se associarem à vida da escola e quando os alunos forem tratados como indivíduos em evolução. O modelo de escola meritocrático pode ser considerado justo, apesar deste modelo de competição justa estar longe da sua plenitude, sendo necessário aperfeiçoá-lo. Mas, é imprescindível ter em conta as suas limitações e contradições, pois anula outras definições de justiça igualmente desejáveis. É importante introduzir a discriminação positiva para assegurar maior igualdade de oportunidades, garantindo o acesso a bens escolares fundamentais, ou seja, a um mínimo escolar. Deve também zelar para que as desigualdades escolares não produzam demasiadas desigualdades sociais.

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Em Busca de um Modelo de Escola Eficaz Atualmente vivenciamos uma crise escolar, podendo ser variadas as justificações para este facto. Devido a esta variedade de respostas, a escola contemporânea é então atravessada por diversos princípios de justiça, que muitas vezes são contraditórios ou incompatíveis entre si. Desta forma, a crise escolar nas sociedades modernas é em parte resultado das dificuldades de um consenso em torno da orientação escolar mais justa. Os especialistas em orientação escolar e profissional trabalham com os estudantes num momento bastante crítico – o final da escolaridade obrigatória, onde se faz a realização da escolha do prosseguimento de estudo (via de ensino regular, curso profissional) ou da entrada para o mundo de trabalho. Desta feita, os especialistas são muitas vezes confrontados com diferentes sentidos de justiça escolar, colidindo frequentemente a sua orientação escolar que considera mais justa, com o sentido de justiça defendido pelos estudantes, suas famílias e outros agentes escolares. Tomando por referência o “modelo industrial”, em que o principio de justiça se baseia na eficácia escolar, apresentar-se-ão justificações e críticas ao modelo e uma reflexão sobre as consequências que a pluralidade de sentidos de justiça tem no quotidiano escolar dos profissionais de orientação das escolas publicas portuguesas. . Críticas e Justificações ao Modelo Escolar Eficaz Em Portugal, as políticas educativas estão carregadas de justificações industriais e mercantis, tendo surgido nos últimos anos inúmeros estudos sobre a excelência escolar e sobre os casos singulares de estabelecimentos de ensino inseridos em contextos sociais desfavorecidos. Os resultados destes estudos geram debates sobre a eficácia diferencial, característica das escolas com estudantes de igual composição social. A europa ocidental viu surguir entre na década de 60, a denuncia da injustiça do funcionamento do sistema de ensino. Na tentativa de uma igualdade universal de oportunidades, a escola produzia desigualdades escolares e sociais, convertendo a herança cultural em mérito ou insucesso escolar. Esta crítica abalou de modo profundo a explicação das desigualdades escolares com base nos dons, aptidões e inteligência hereditária. Desta forma, nos anos de 60, houve uma interpretação das desigualdades escolares com referência a características sociais e culturais. Segundo Dionísio (2010) “as desigualdades escolares seriam tão mais fortes quanto maior fosse o desfasamento entre a socialização familiar, habitus cultural transportado pelo aluno, e os códigos e habitus considerados legítimos pela instituição escolar”. Estas teorias vieram fomentar

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as críticas ao caracter elitista da escola por parte das classes médias emergentes, e levaram à renovação da constituição das políticas educativas racionais e da formação de professores. A igualdade de oportunidades é uma utopia: o ensino massificado não promove a mobilidade social, e, as elites sociais têm estratégias que as tornam imunes aos efeitos indesejáveis da massificação. Assim, segundo a visão do modelo de escola eficaz, a igualdade de oportunidades leva a um decréscimo da qualidade, tornando-se retrógrado e desajustado para a sociedade atual. Neste âmbito, a concorrência informada é a melhor forma de prestar um bom serviço público de educação. Mas, desta forma, a escola também se torna injusta por tratar os desiguais de uma forma tal, que pode ser cruelmente igualitária. O futuro dos jovens estudantes envolve diversos fatores: espectativas dos estudantes e famílias, orientações do estabelecimento de ensino e diretrizes das políticas educativas. Estes, em conjunto com os diferentes sentidos de justiça, tornam difícil a tarefa de gestão entre a orientação justa dos alunos e os próprios conceitos de justiça dos orientadores. A grande dificuldade está em garantir a igualdade de oportunidades, o reconhecimento do mérito escolar e a promoção na autonomia da construção do futuro. Segundo Dionísio (2010: 314) «A “forma escolar” ajudou a construir estas três “promessas” – igualdade, mérito e autonomia (…). Mas os profissionais de orientação escolar enfrentam o “obstáculo” do seu cumprimento a partir do momento em que, nas situações escolares concretas, se experimenta a tirania, ou melhor, o não reconhecimento de um princípio de justiça escolar face a um outro, tornando-se difícil conciliar sentidos de justiça altamente incompatíveis»

As Políticas Educativas e a Interculturalidade Nos últimos tempos verifica-se que as sociedades são cada vez mais multiculturais, englobando um grande diversidade de grupos étnicos, culturas e perceções do mundo. Devido a este facto surgem duas problemáticas: o combate às desigualdades e a acomodação da diferença cultural, que agora se começa a sentir em Portugal. O princípio do reconhecimento passou a estar incluído na noção de justiça social de forma a possibilitar igualdade aos cidadãos de origens étnicas minoritárias. Assim, é necessário o desenvolvimento de um conceito de cidadania para criar condições de integração ás comunidades minoritárias com diferenças culturais. As desigualdades incidem na garantia ou não de direitos desses cidadãos tais como: educação e igualdade de oportunidades. Hoje as relações sociais são complexas e diferem as representações e interpretações do mundo, em que se valoriza, determinadas culturas e se desvalorizam outras, originando marginalidade e perda de identidade

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cultural, seno preciso o reconhecimento da diferença, em especial na educação, visto o insucesso escolar estar a afetar alunos de origens étnicas minoritárias. Cabe à sociologia da educação e suas políticas o reconhecimento para ajudar a superar as desigualdades em contexto escolar. O direitos do homem referem que: “Todos os indivíduos são iguais perante a lei”, pilares para uma sociedade justa, com iguais condições para o desenvolvimento de capacidades de todas as pessoas. No entanto continuam a sobressair injustiças referentes às minorias étnicas, com base nas suas condições socioeconómicas e dominação da cultura hegemónica. É de extrema importância para o ser humano a construção da sua identidade, para poder ser reconhecido pela cultura dominante. Sem esse reconhecimento não haverá realização da plena cidadania, tornando-se este fundamental num ambiente escolar, defendendo a diferença e combatendo a inferioridade e a descaracterização de todos aqueles que têm origens étnicas minoritárias. . Estereótipos no Meio Escolar Em Portugal algumas etnias minoritárias apresentam níveis de aproveitamento escolar inferiores aos dos seus colegas, não tendo o estado desenvolvido iniciativas para colmatar essas desigualdades, bem como, a exclusão social e escolar. Isto pode produzir efeitos negativos, conduzindo a uma hierarquização das diferente etnias e promovendo imagens preconceituosas e estereotipadas que poderão agravar o princípio do reconhecimento e marginalizar determinadas culturas. A diversidade étnica afigura-se como um dilema para o sistema educativo, pelo facto de uma escola igualitária ter de reconhecer e respeitar as especificidades culturais, tendo sido atribuído à escola um papel menor na atenuação das desigualdades sociais, onde são racializados os problemas educativos. Os estereótipos sobre certas minorias étnicas conduzem a baixas expectativas e são motivo de insucesso escolar. As políticas educativas portuguesas têm sido insensíveis à “cor”, não tendo o cuidado sobre a diversidade cultural e étnica dos alunos, não havendo referências a esta problemática na “Proposta da Lei de Bases da Educação”. Um estudo do ministério da educação feito em 2003 indica que o abandono escolar atinge desproporcionalmente os alunos oriundos de famílias com níveis de instrução mais baixos. A desracialização das políticas educativas portuguesas pode dever-se a dois motivos: ao mito do antirracismo português, e, à identidade nacional portuguesa ter sido edificada com base na sua história colonial, favorável à miscigenação, mantendo o mito de que os portugueses não são um povo racista.

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Os projetos de educação intercultural dirigem-se sobretudo a alunos de origens étnicas minoritárias e a sua intervenção incide nas áreas não curriculares ficando a cargo dos professores. Aqui o Estado desresponsabiliza-se e as medidas são deixadas à “boa vontade” de cada um que as trabalha.

Contrastes Sociais: Favorecidos vs. Desfavorecidos O sistema educativo centralizado português leva à competição entre estabelecimentos de ensino, promovendo o desenvolvimento de estratégias localizadas de adaptação aos diferentes públicos. De seguida comparar-se-ão os resultados de duas realidades diferentes, obtidos através de “estudos de caso” em organizações escolares portuguesas, em que o objetivo é verificar quais as principais diferenças do sistema educativo com públicos de extremidades da estrutura socioeconómica: - As representações e vivências de alunos e pais sobre o trabalho e a cultura escolar em escolas privadas, frequentadas por classes dominantes (uma laica e uma religiosa); - O impacto do programa Territórios Educativos de Intervenção Prioritária (TEIP) em sete agrupamentos de escolas, situados em contextos sociais marginalizados. . Escolas de Elite Vários estudos apontam que as diferentes disposições dos alunos face à escola derivam do seu contexto de socialização familiar, mas também das suas vivências quotidianas na escola. A família é importante no desenvolvimento de disposições favoráveis à adesão a projetos escolares, mas também, é importante o efeito da própria escola. Enquanto a família molda as disposições e o desempenho escolar através da transmissão dos conhecimentos, a escola influi no sucesso escolar dos alunos através de fatores como a eficácia das práticas pedagógicas, a qualidade do ambiente de aprendizagem e a manutenção do clima escolar ordeiro e seguro. Quando escola e família partilham o mesmo ideal formativo expetativas de sucesso, com um projeto escolar assente nos valores de exigência, rigor e autodisciplina, estão reunidas as condições propícias para a atribuição de sentidos positivos à escola por parte dos jovens. Isto acontece nas escolas privadas em estudo, cujo projeto de formação dos alunos engloba a vertente social, pessoal e religiosa no colégio confessional; e a vertente humana, académica e cívica no colégio laico. Estes são frequentados por alunos maioritariamente provenientes da burguesia, com baixas taxas de repetência, que frequentam o colégio desde o infantário ou do 1º ciclo e com irmão na mesma escola, cujos pais também frequentaram o mesmo colégio (tradição familiar). A quase totalidade dos pais possui formação de grau superior e idealizam um percurso escolar de sucesso idêntico para os seus filhos. Segundo dados do estudo, os pais afirmam que os

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filhos têm direito a delinear o seu próprio percurso de vida, desejando que adquiram capacidade de autorregulação e de cooperação. Segundo os autores Kellerhals e Montandon, referenciados por Quaresma (2012: 28), estes são os traços que caracterizam o modelo educativo das famílias cultural e socialmente mais capitalizadas. Outro aspeto interessante tem a ver com o desapego das vantagens materiais dos cursos escolhidos pelos alunos, que vão de encontro ao investimento numa educação de excelência, que acreditam ser um acesso direto ao destinos profissionais mais prestigiados e bem remunerados. Isto tem a ver com a posição familiar socioeconómica consolidada que salvaguarda a mobilidade dos filhos para estatutos sociais inferiores, independentemente da opção profissional. Estas metas são o reflexo da confluência das culturas escolares e familiares. Os pais dos alunos transmitem-lhes os valores de mérito, esforço e trabalho, advertindo-os para os custos do facilitismo e imediatismo na competição pelas melhores classificações escolares, sinónimo de acesso ao ensino superior mais prestigiado. Nos colégios privados, a indisciplina não é regra, mas sim exceção. A importância da obediência e cumprimento de regras estão bem intrincados, como preparação para a vida social e profissional. Os jovens pautam pelo seu comportamento e respeito pela disciplina, normas cívicas e acatamento de ordens, quer dentro da sala de aula, quer no espaço escolar. A grande diferença entre os dois sistemas de ensino (publico e privado) reside na disciplina e cumprimento de regras. . Escolas em Territórios Marginalizados A povoação das escolas ao abrigo do programa TEIP é representada predominantemente por famílias com carências de recursos básicos, quotidianos desestruturados, fraco domínio da língua portuguesa, pouco acompanhamento dos filhos e baixas expetativas escolares. Estes traços são apresentados como principal justificação para os altos níveis de indisciplina e insucesso escolar. As condições familiares são heterogéneas, sendo na sua maioria compostas por família nuclear, com ambos os pais trabalhadores assalariados desqualificados (maioria frequentaram o ensino básico até ao 9º ano), com baixo rendimento salarial, sendo muitos alunos abrangidos pelo apoio escolar. A maioria dos pais afirma preocupar-se com o desempenho escolar dos filhos, atribuindo as suas dificuldades de aprendizagem à falta de estudo ou à ausência de método de estudo. Quanto aos alunos, relativamente às suas expetativas de futuro, muitos deles afirmam desejar prosseguir estudos superiores e poucos almejam o mestrado ou o doutoramento. Estas expetativas são menos presentes em alunos que já reprovaram algum ano escolar. É geral a dificuldade de compreensão do próprio sistema de ensino secundário e superior e a sua relação com o mercado de trabalho. Neste ponto, é comum encontrar alunos que desejam licenciar-se, mas indicam como profissões pretendidas cozinheiro, bombeiro,

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cabeleireiro (profissões que não exigem estudos superiores), havendo também alunos que apesar de quererem ser médicos ou advogados, não pretendem seguir estudos superiores. Os pais têm em comum o desejo de os filhos prosseguirem estudos até onde puderem alcançar. Quanto às estratégias escolares, há um enfoque na inclusão de crianças e jovens através do combate ao abandono, insucesso e indisciplina escolar. Estas estratégias raramente são entendidas a longo prazo. Desta forma, todos os recursos técnicos, docentes e de formação cívica são incumbidos da gestão quotidiana da pacificação e regulação do comportamento dos alunos, influenciando de forma decisiva alguns percursos de vida. Foi criada uma política nacional que transformou significativamente estes contextos socioeducativos – a criação de ofertas curriculares alternativas para alunos com insucesso repetido e em risco de abandono no 3º ciclo (7º ao 9º ano), de cariz vocacional e que englobam um estágio numa empresa local. Estas são soluções muito valorizadas pelos alunos neste contexto por terem uma vertente pedagógica mais prática e ao mesmo tempo, darem formação em contexto de trabalho. Mas, esta iniciativa tem alguns problemas: as áreas vocacionais não são escolhidas pelos alunos ou pelas famílias; as parcerias com as empresas são frágeis, garantindo apenas os estágios; incerteza da percentagem de alunos que se conseguem integrar efetivamente no mercado de trabalho; alguns dos alunos que têm sucesso querem prosseguir estudos, mas as escolas não promovem a continuidade a nível curricular. . Comparação de realidades Os colégios privados focam-se no futuro dos jovens. Nas escolas abrangidas pelo programa TEIP, o futuro é literalmente “engolido” pelas urgências presentes, na medida em que têm uma cultura imediatista e convival que vivencia o espaço escolar como um espaço de diversão com amigos e fuga a quotidianos difíceis, desprezando o seu papel na formação pessoal e profissional. Os espaços sociais nas escolas, geralmente pensados como complementares, refletem o modo específico como os jovens vivenciam a escola – nas escolas socialmente desfavorecidas, a verdadeira vida ocorre nos intervalos e recreios, ao passo que as aulas se tornam secundárias. Os alunos das escolas TEIP descrevem a indisciplina como o resultado do carácter demasiado conflituoso ou passivo de alguns colegas, professores ou diretores. Saliente-se que nestes contextos também existem alunos aplicados e disciplinados, geralmente formados numa ética do trabalho por famílias humildes e trabalhadoras, apoiados por professores dedicados e diligentes. Muitas vezes conseguem desenvolver percursos académicos longos, superando o ciclo de privações da sua comunidade. A escola pública constitui para os jovens em contextos desfavorecidos um espaço central de socialização e de construção da identidade.

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Em ambos os contextos, a socialização escolar ocupa lugar central. O que cimenta as fronteiras sociais já existentes é a construção coletiva de distintos sentidos para a escola. Nas classes sociais altas, há uma postura individual de sobrevalorização da instituição. Nos territórios educativos de intervenção prioritária, a socialização escolar passa por domesticar e pacificar através do investimento na prevenção e na mediação, enfatizando o profissionalismo dos trabalhadores sociais.

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Conclusão A luta pela igualdade de oportunidades não é recente, mas continua a ser um tema bastante atual e controverso. Os ideais de uma escola justa e eficaz para todos são uma utopia, pois a diversidade económica, social e cultural torna difícil encontrar o conceito certo de justiça aplicável ao meio educativo. Não é possível, no seio de um sistema educativo baseado no mérito, que todos saiam vencedores. O que é necessário é criar estratégias para integrar os vencidos na competição escolar, de modo a que não se sintam excluídos da sociedade e da escola. É verdade que o meio social de origem é, em certa medida, limitador do (in)sucesso escolar, mas não é o único fator que o influencia. Também é certo que a escola deveria dissolver essas desigualdades sociais de partida, mas a maior parte das vezes potencia-as, tornando-as em desigualdades escolares. Ainda há muito a fazer para que um dia haja um sistema escolar em que todos tenham a mesma igualdade de oportunidades e de acesso à educação. O grande problema está nas desigualdades que se desenvolvem fora do contexto escolar, que direta ou indiretamente influenciam o desenvolvimento do percurso académico. Quando se conseguirem “eliminar” essas desigualdades, todos terão o mesmo acesso à educação e aos recursos educativos. Quem sabe se um dia isso acontecerá?

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Bibliografia - ARAÚJO, Marta e PEREIRA, Marcus (2004), Interculturalidade e políticas educativas em Portugal: reflexões à luz de uma versão pluralista de justiça social, Coimbra, Centro de Estudos Sociais, Universidade de Coimbra; - DIONÍSIO, Bruno (2010), “O paradigma da escola eficaz entre a crítica e a apropriação social”, Sociologia: Revista do Departamento de Sociologia da FLUP, Vol. XX, 305 – 316; - DUBET, François (2004), “o que é uma escola justa?”, Cadernos de Pesquisa, Vol. 34, Nº 123, 539 – 555; -QUARESMA, Maria et al (2012), “Mundos à parte? Os sentidos da escola em meios sociais contrastantes”, Sociologia, Problemas e Práticas, Nº 70, 25 – 43.

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