DISCURSO UTOPIA E REALIDADE

October 15, 2017 | Autor: Emilio Sarde | Categoria: Political Economy, História
Share Embed


Descrição do Produto

DISCURSO UTOPIA E REALIDADE Emílio Sarde Neto

A doutrina de segurança nacional expurgou dos países latino-americanos temas e conceitos de grande significação social e política que foram desgastados por usos e abusos da política burguesa internacional. Participação e desenvolvimento, como fez menção José Marques Melo (1989), são temas que voltam com assiduidade a serem escutados da boca dos dirigentes políticos, economistas e líderes sociais. Tais temas não são de grande relevância para a comunicação social vigente, pois as mesmas estão submetidas ao imperialismo burguês que não tem interesse no surgimento da valorização política, pois exigiria não só a teoria, mas a prática. O discurso ideológico da política vigente encobre o verdadeiro significado dos temas. Tais discursos são sustentados pelo aparato da indústria cultural e através dos meios de massa comerciais que somente transmitem aquilo que julgam necessários a seus interesses de classe, como disse esbravejando e ameaçando o então presidente Fernando Henrique Cardoso quando da recusa da entrada da carne bovina brasileira nos países europeus por suspeita de contaminação com a vaca louca “se eles acham que nossas vacas estão loucas e é guerra que eles querem então [...]”, como se as vacas pertencessem a todo o povo e não a uma minoria detentora do poder e das vacas. A comunicação popular como vivência cultural na América Latina introduz rupturas no discurso ideológico dominante, no qual a comunicação massiva comercial é suporte principal. Esse processo de ruptura implica no aglutinamento de perspectivas e valores que formam parte do projeto cultural do povo, desencadeando vários movimentos de resistência à “cultura ideal perfeita” proposta pelos nossos governantes. Novos conceitos são empregados ao se falar em desenvolvimento, deixando para trás aqueles velhos conceitos empregados ainda na época da Guerra Fria que possuíam um sentido inteiramente econômico, pois novos são os conceitos empregados na América Latina sobre o discurso de modernização e do ponto de vista prático. É o discurso de que tudo é possível, e o meio mais eficiente de servir e ser servido. 1

Através dos meios de comunicação é que se propagam de forma permanente as propostas de convencimento dos latino-americanos, cada dia mais castigados pelas suas condições de vida decorrentes de uma política característica de povo dominado, para que eles abram os olhos para a suposta realidade de seus países subdesenvolvidos que terão possibilidades de desenvolver-se modernamente, somente estando sujeitos aos auspícios e responsabilidades da comunidade internacional, pagando as dividas externas que seriam responsáveis pelas “evoluções” socioeconômicas de seus respectivos países. Existem regras que devem ser seguidas, pois somente assim serão abertas as portas da modernidade, essas regras implicam no achatamento do aparelho do Estado, uma maior eficiência aplicada em todos os níveis produtivos, redução do déficit fiscal entre outras receitas ditas capazes de modificar as crises. A assimilação tecnológica das sociedades desenvolvidas mediante a gestão e o empurrão do capital privado seria no discurso das classes dominantes a única forma possível de desenvolvimento. Contudo, se forem rejeitadas as regras, Tio Sam ficará muito chateado podendo com um piscar de olhos condenar todo um povo ao ostracismo e a marginalização. Em síntese o que nos está sendo proposto é que aceitemos essa presumida realidade, e que devemos ser resignados e humildes aceitando nossa condição atual de servos, em função de um suposto desenvolvimento baseado na modernização que marginaliza e oprime a maior parte das populações. “Mas para que pular a cerca, sendo que a porteira está aberta...”, varias são as formas de se justificar esse discurso, mas pouco se menciona sobre a queda sem fim da qualidade de vida que sofre a população através desse vagaroso processo de deterioração social. O desenvolvimento modernizador proposto pelo sistema internacional vigente mesmo que não pregue a desumanização submete o cumprimento das aspirações humanas. Não tem espaço nesse plano para uma sociedade utópica que tem o humano como centro, que busca uma realização da pessoa, a partir de seus próprios valores culturais. O discurso político que é também a mensagem dos meios de comunicação maciços e comerciais se carrega de discursos para exilar qualquer alternativa ou proposta que possa rapidamente ser catalogada de irresponsável e contrária ao interesse social.

2

No campo da política como no da produção de mensagens culturais, há uma carência enorme de participação efetiva, devido inicialmente a própria desunião das massas exploradas e dos detentores do discurso político de oposição, e quando há propostas comunicacionais e culturais não passam de simples paródias participativas.

Referência MARQUES MELO, José. Comunicação na América Latina Desenvolvimento e Crise. Cap. IX: Utopia e Realidade na Comunicação Popular. São Paulo: Papirus, 1989. CARDOSO, Ciro Flamarion \ Brignoli, Héctor Pérez. História Econômica da América Latina. Cap. IV: Economia de exportação. Rio de Janeiro: Graal Editora, 1979.

3

Lihat lebih banyak...

Comentários

Copyright © 2017 DADOSPDF Inc.