Dissertação de Mestrado

July 15, 2017 | Autor: João Vitor Santos | Categoria: Narrative Theory, Television, Comunicacion Social, Jornalismo, Narrativa, Televisão
Share Embed


Descrição do Produto

UNIVERSIDADE DO VALE DO RIO DOS SINOS – UNISINOS UNIDADE ACADÊMICA DE PESQUISA E PÓS-GRADUAÇÃO PROGRAMA DE PÓS-GRADUAÇÃO EM COMUNICAÇÃO NÍVEL MESTRADO

JOÃO VITOR DOS SANTOS

O MUNDO POSSÍVEL DO JN: A narrativa “do que mais importante aconteceu no dia no Brasil e no mundo”

SÃO LEOPOLDO 2013

JOÃO VITOR DOS SANTOS

O MUNDO POSSÍVEL DO JN: A narrativa “do que mais importante aconteceu no dia no Brasil e no mundo”

Dissertação apresentada como requisito parcial para a obtenção do título de Mestre em Comunicação, pelo Programa de PósGraduação em Comunicação pela Universidade do Vale do Rio dos Sinos UNISINOS Orientadora: Profª. Drª. Beatriz Marocco

SÃO LEOPOLDO 2013

S237m

Santos, João Vitor dos O mundo possível do JN: a narrativa “do que mais importante aconteceu no dia no Brasil e no mundo” / por João Vitor dos Santos. -- São Leopoldo, 2013. 384 f. : il. color. ; 30 cm. Dissertação (mestrado) – Universidade do Vale do Rio dos Sinos, Programa de Pós-Graduação em Ciências da Comunicação, São Leopoldo, RS, 2013. Orientação: Profª. Drª. Beatriz Marocco, Ciências da Comunicação. 1.Telejornalismo. 2.Jornal Nacional (Programa de televisão). 3.Linguagem jornalística. 4.Reportagens e repórteres. 5.Comunicação de massa. I.Marocco, Beatriz. II.Título. CDU 070:654.197 070.41 659.3(81) Catalogação na publicação: Bibliotecária Carla Maria Goulart de Moraes – CRB 10/1252

Para meus pais, Ana Maria e Nadir, que sempre me inspiraram a trabalhar para buscar o de que melhor a vida pode oferecer, sem medir esforços para realizar sonhos. Para minha amada Caroline, que sempre me fez encarar os desafios de frente, mas também sempre soube me resgatar e mostrar que lá fora há um sol a iluminar nossas vidas. Para minha irmã, Daiana, que me faz pensar em responsabilidade, já que há sempre alguém a observar e “imitar” seus movimentos. Para aqueles que acreditam num jornalismo melhor, mais igual, mais plural, que ensina e aprende através da constituição de seu mundo e não apenas construa um mundo espetacular que mascara e defende interesses de poucos.

AGRADECIMENTOS Ao fim desse caminho, visualizo o processo de pesquisa como um processo de descobertas. Começo meu percurso como alguém que olha ao mundo a sua volta e busca entender. Termino o percurso com a certeza de que primeiro é necessário que o pesquisar descubra a si mesmo, entenda seus processos e só depois incursione por esse mundo que lhe desperta inquietação. Ao longo desses pouco mais de dois anos de pesquisa, agentes foram fundamentais para essa construção. O primeiro deles é a professora Christa Berger, minha orientadora do trabalho de conclusão no curso de Jornalismo e professora no Programa de Pós-Graduação. Com toda delicadeza que lhe é peculiar, a professora Christa, mostrou-me, ainda na época da Graduação, a importância por refletir sobre o que produzimos enquanto jornalistas e analisar cada movimento de forma crítica. Foi ela que também me mostrou o quanto é preciso lutar para não se deixar seduzir pelo que se ama e pelo que gosta. Hoje, percebo que a paixão nos move, mas, por vezes, pode promover cegueiras que nos impedem olhar adiante e de fato crescer. Da época da graduação, agradeço também a professora Jiani Bonin. Foi ela que me apresentou o processo de pesquisa pela primeira vez e a feitura de uma publicação científica. Agradeço ao Programa de Pós-Graduação em Comunicação Social da Unisinos pela acolhida que recebei de professores e funcionários quando meu projeto de pesquisa ainda era só uma ideia. Da mesma forma, agradeço a Coordenação de Aperfeiçoamento de Pessoal de Nível Superior, a Capes, por ter financiado todos meus estudos no Mestrado e viabilizado a pesquisa. Num país que visa o crescimento, não só econômico, as agências de fomento à pesquisa tem papel fundamental. Já dentro do processo de construção de minha pesquisa nas disciplinas do Mestrado, não posso deixar de agradecer aos professores. Meu muito obrigado a dedicação de José Luiz Braga, que em duas disciplina foi incansável no exercício de ensinar a pensar no processo de pesquisa. Também foram valiosos todos seus apontamentos que aprimoraram a pesquisa. A Antônio Fausto Neto, agradeço as provocações e inquietações que trouxe em suas aulas. Foram elas que me fizeram despertar e olhar para uma “sociedade em vias de midiatização”. Juntamente com Pe. Pedro Gilberto Gomes foi incansável em discutir um conceito ainda em formação. Sem eles, jamais teria dado o ganho que imagino ter dado à pesquisa, atentando ao que acredito – e sigo fielmente com eles – ser uma nova era: a da sociedade em pleno processo de midiatização. Ao professor Fabrício Silveira, agradeço a dedicação e empenho na

apresentação de teorias da Comunicação. E, claro, jamais poderei esquecer a compreensão para com minhas reuniões de orientação. Como divide o gabinete com minha orientadora, muitas vezes foi forçado a ouvir meus devaneios e a opinar sobre nossas visões sobre o processo de produção da narrativa jornalística. Por fim, destaco os trabalhos dos professores Suzana Kilpp; que me inspirou na busca de um método e estimulou a manifestar o que de fato “me toca” enquanto pesquisador; e Gustavo Fisher; que me orientou na observação metodológica do audiovisual e me fez olhar as tantas percepções que o televisual me incitava. Cito, ainda, outro agente que foi fundamental na constituição de minha pesquisa e de meu desenvolvimento pessoal: o Grupo de Pesquisa em Jornalismo, o GPJor da Unisinos. Lembro de nossas reuniões com imenso carinho e respeito. Para mim, foram momentos solenes que aprendi a ser observador do jornalismo, bem como a encarar de forma crítica e reflexiva seus processos. Muito desses encontros estão materializados na pesquisa, outros ainda mais impregnados em mim. Jamais farei ou consumirei jornalismo da mesma forma, depois de passar pelos nossos encontros. Em retribuição ao carinho e atenção dos professores coordenadores e a todos os mestres, doutores, colegas mestrandos e doutorandos e convidados cito dois nomes: o professor Ronaldo Henn, que representa a dedicação e empenho dos coordenadores do grupo em desenvolver a pesquisa da prática jornalística; e a colega Angela Zamin, que sempre teve muita atenção e compreensão com os recém-chegados aspirantes a pesquisadores – em especial os regressos do mercado de redações – auxiliando em dúvidas e sempre alçando mão de sua vivência para acalmar-nos em momentos mais angustiantes. Também fazem parte dessa pesquisa e de todo o meu processo os colegas do PPG COM da turma de 2011. Nossos momentos de bate-papo, descontração, desabafos e troca de experiências foram bálsamos nesse processo de aprendizagem e descobrimentos. Para pontuar, destaco três nomes que me acompanham até hoje: Felipe Vieiro, Kellen Hoehr e Karine Veira. A esses, antes desconhecidos, depois colegas de aula e de grupo de pesquisa e agora amigos, desejo sucesso externando toda minha gratidão. Por fim, chego a dois nomes em especial: o de minha orientadora Beatriz Marocco e de minha amiga e orientadora informal Marcia Veiga da Silva. Foi Beatriz que me acompanhou em toda essa jornada. Agradeço toda paciência e dedicação e forma como sempre conduziu nosso trabalho. A liberdade que me deu desde o início foi a semente e o fomento para a pesquisa. Foi tão importante quanto suas orientações mais rígidas no que diz respeito a métodos, procedimentos e edição de textos científico, manifestados no momento exato e com precisão cirúrgica. À Beatriz também agradeço o estímulo à pesquisa em comunicação e prática jornalística. Seu entusiasmo é contagiante e me faz perceber que é

preciso continuar problematizando, estudando e refletindo a prática jornalística para a constituição de uma prática mais igual e para um jornalismo que de fato sirva ao público. Bia, obrigado pelo respeito às minhas ideias, concepções e carinho na hora de me ajudar a transformar tudo em elementos da pesquisa. A amiga Marcia Veiga da Silva está na contabilidade dos ganhos com a pesquisa. Não com o compromisso de orientadora, mas de amiga, sempre me ajudou a entender o que me cegava. Foi aprendendo a olhar o outro pela vivência de Marcia que desvelei o que estava diante de mim e não enxergava. Vi o que não via, ouvi o que achava que ouvia e percebi que pouco dava voz a quem achava que dava: ao diferente. Como se não bastasse, esteve, ainda, sempre presente me alcançando bibliografia e ainda se dispondo a discutir conceitos e ideias que constavam nos materiais. Ouvir Marcia, ler sua produção é abrir o horizonte para pensar outro jornalismo. Por fim, agradeço a todos os colegas de redação e amigos que ouviram minhas ideias e com quem dividi muitas das descobertas da pesquisa. Muito, mas muito obrigado a todos vocês.

RESUMO A presente pesquisa observa como se desenvolve a narrativa no telejornal, a partir da eclosão de acontecimentos. Na amostra de cinco edições, de maio de 2011, do Jornal Nacional, observa-se a constituição de mundos narrados a partir de um jornalismo de televisão. Para isso, são constituídas grades de entendimento que organizam os movimentos do objeto empírico em diferentes níveis, da forma ao conteúdo. Conceitos como vivência e experiência, realidade e ficção, entre outros, são acionados para entender um mundo constituído pela narrativa telejornalística do JN. Ao final do percurso de pesquisa se descortina “O MUNDO POSSÍVEL DO JN: A narrativa ‘do que mais importante aconteceu no dia no Brasil e no Mundo’” como a constituição de uma realidade que se situa num entremeio entre realidade e ficção, sustentada não pela experiência de um agente, mas pela vivência de todos que constituem o processo produtivo em telejornalismo, baseados em princípios do televisual e do jornalismo.

Palavras-chave: telejornalismo. Narrativa jornalística. Jornal Nacional. Televisão. Jornalismo.

ABSTRACT The research study how is unfolding the narrative in the TV news from the incident coming to light. In the sample of Five edictions, may 2011, of Jornal Nacional, observes the constitution reported worlds from the television jornalism. For that, are constituted understanding screen that organize the chages of the empiric object in different levels, from the structure to the tenor. Ideas as experience of life and knowledge, realness and fiction, and others, are added to understand a world build for the jornalism report of JN. At the endo f the resarch journey, appears “THE POSSIBLE WORLD OF JN: the report of the most important event in the Brazilian and World Day” like the constitution of a reality between the realness and fiction. This constitution isn’t supported by the agent experience, but for the living experience of all that build the TV jornalism produtive process based on jornalism and television facts.

Keywords: TV Jornalism, Jornalistic Report, Jornal Nacional, Television, Jornalism

LISTA DE FIGURAS Figura 1 - Grupo é formado para caçar o Caboclo ................................................................... 27 Figura 2 - Repórter fecha os olhos e muda entonação quando fala no choro de Lula .................. 30 Figura 3 - Repórter na subida do morro se insere na narrativa também de forma visual ......... 33 Figura 4 - repórteres dividem reportagem e constituem representações disso ......................... 36 Figura 5 - frame de exemplo de nota pelada ilustrada.............................................................. 60 Figura 6 - sequência de nota coberta estendida ........................................................................ 60 Figura 7 - Na sequência, o idoso é agredido e depois atropelado pelos assaltantes ................. 77 Figura 8 - Mulher mostra na parede nível d’água dentro de casa............................................. 78 Figura 9 - expressão de Bonner no momento da correção ....................................................... 90 Figura 10 - repórter entra ao vivo de shopping ........................................................................ 92 Figura 11 - reportagem recupera momento em que notícia é dada .......................................... 93 Figura 12 - Repórter em relato pessoal fala da casa de Bin Laden ........................................ 102 Figura 13 - imagem captada pela emissora na forma padrão ................................................. 112 Figura 14 - Bin Laden em imagem já usada em TV do oriente.............................................. 113 Figura 15 - Logomarca indica quando imagem é de arquivo ................................................. 113 Figura 16 - Logomarca padrão identifica imagens exclusivas ............................................... 114 Figura 17 - a qualidade e o movimento revelam imagens amadoras...................................... 115 Figura 18 - Policia do RJ divulga imagens que levaram a prisões ......................................... 116 Figura 19 - câmeras instaladas em caça acompanham voo .................................................... 117 Figura 20 - imagem não exclusiva da casa em reportagem na segunda ................................. 118 Figura 21 - imagem exclusiva da casa em reportagem na terça ............................................. 119 Figura 22 - imagem de outra reportagem com a pecuarista ................................................... 120 Figura 23 - câmera imita visão de quem observa pela janela do carro ................................... 121 Figura 24 - simulação da entrada de soltados na casa de Osama ........................................... 122 Figura 25 - reprodução de fragmento de diário de campo do autor ....................................... 192

LISTA DE TABELAS Tabela 1 – Tempos de blocos do Jornal Nacional na semana analisada .................................. 54 Tabela 2– (fragmento) Inserção das notícias em espaços do telejornal ................................... 74

SUMÁRIO 1 INTRODUÇÃO ................................................................................................................... 13 2 DA DESCOBERTA DO TEMA À CONCEPÇÃO DA PESQUISA .............................. 19 2.1 SEGUINDO UM CAMINHO PARA ALÉM DA “OBJETIVIDADE“ ............................ 20 2.2 A INTERPRETAÇÃO COMPONDO O RELATO JORNALÍSTICO.............................. 24 2.3 TELEVISÃO ...................................................................................................................... 37 2.3.1 O Telejornalismo e o Jornal Nacional ......................................................................... 40 2.3.2 O Acontecimento ........................................................................................................... 43 3 UM MAPA PARA FUGIR DA TENSÕES E CHEGAR NA TRILHA DAS RESPOSTAS ........................................................................................................................... 45 3.1 REVISANDO VELHOS CAMINHOS E PREPARANDO A INCURSÃO POR NOVOS46 4 UM MAPA EM CHEQUE OU UM MÉTODO EM MOVIMENTO ............................. 47 4.1 A PESQUISA EM SUMÁRIO ........................................................................................... 48 5 PROCEDIMENTOS METODOLÓGICOS ..................................................................... 52 5.1 O PROGRAMA CHAMADO JORNAL NACIONAL NA GRADE DA TV GLOBO .... 52 5.2 O JORNAL NACIONAL E SEUS ESPAÇOS .................................................................. 53 5.3 O MAPA ANALÍTICO ...................................................................................................... 56 5.3.1 Formatos ......................................................................................................................... 57 5.3.2 Tipos da Notícia ............................................................................................................. 65 5.3.3 Editorias ......................................................................................................................... 68 5.3.4 Inserção .......................................................................................................................... 71 5.3.5 Os Acontecimentos ........................................................................................................ 76 5.3.6 Narrativas ....................................................................................................................... 82 5.3.7 Intervenção do Apresentador ....................................................................................... 86 5.3.8 Tempo da Ação .............................................................................................................. 91 5.4 MAPA DA COMPOSIÇÃO NARRATIVA COMPLEXA – REPORTAGEM ................ 97 5.4.1 Tipos de Reportagens .................................................................................................... 97 5.4.2 Movimentos do Discurso ............................................................................................. 101 5.4.2.1 Operação Experiência Memória ................................................................................. 101 5.4.2.2 Operação Objetiva de Reconstituição......................................................................... 102 5.4.2.3 Operação Interpretativa .............................................................................................. 102 5.4.2.4 Operação de Autorreferencialidade ............................................................................ 103 5.4.2.5 Imagens ....................................................................................................................... 111

5.4.2.5.1 Padrão ..................................................................................................................... 112 5.4.2.5.2 Midiatizadas ............................................................................................................ 112 5.4.2.5.3 Autorreferente e de Arquivo .................................................................................... 113 5.4.2.5.4 Exclusivas ................................................................................................................ 114 5.4.2.5.5 Amadoras ................................................................................................................. 114 5.4.2.5.6 Oficiais .................................................................................................................... 115 5.4.2.5.7 Simulacro de Ação ................................................................................................... 116 5.4.2.6 Personagens e Fontes ................................................................................................. 123 5.4.2.6.1 Oficiais .................................................................................................................... 124 5.4.2.6.2 Especialistas ............................................................................................................ 124 5.4.2.6.3 Personagens ............................................................................................................ 124 5.4.2.7 Quanto a Apresentação da Fonte ................................................................................ 127 5.4.2.7.1 Referentes ................................................................................................................ 128 5.4.2.7.2 Testemunho .............................................................................................................. 128 5.5 CATALOGAÇÃO, TABULAÇÃO E ANÁLISE DE DADOS. COMO SE DERAM? . 133 6 CONSIDERAÇÕES FINAIS ............................................................................................ 134 REFERÊNCIAS ................................................................................................................... 144 APÊNDICE A – FORMATOS ............................................................................................ 151 APÊNDICE B – TIPOS DE NOTÍCIA .............................................................................. 152 APÊNDICE C - EDITORIAS.............................................................................................. 153 APÊNDICE D – INSERÇÃO .............................................................................................. 154 APÊNDICE E - ACONTECIMENTO................................................................................ 155 APÊNDICE F - NARRATIVAS .......................................................................................... 156 APÊNDICE G - INTERVENÇÃO DO APRESENTADOR ............................................. 157 APÊNDICE H - TIPOS DE AÇÃO .................................................................................... 158 APÊNDICE I - MOVIMENTOS DO DISCURSO ............................................................ 159 APÊNDICE J - TEMPORALIDADE ................................................................................. 160 APÊNDICE K - IMAGENS ................................................................................................. 161 APÊNDICE L - PERSONAGENS/FONTES ..................................................................... 162 APÊNDICE M - APRESENTAÇÃO DAS FONTES ........................................................ 163 APÊNDICE N - AÇÃO DO APRESENTADOR ............................................................... 164 APÊNDICE O - TRANSCRIÇÃO PESQUISA EXPLORATÓRIA ............................... 165 APÊNDICE P - REPRODUÇÃO DE DIÁRIO DE CAMPO ........................................... 192

13

1 INTRODUÇÃO A presente pesquisa é resultado de um trabalho que iniciou com questões, reflexões e até provocações que desde a década de 90 me acompanham. Foi o período em que comecei e ler, buscar saber mais sobre o jornalismo com o interesse de jovem que busca uma carreira a seguir. Depois de definitivamente saber que não seria feliz nas Ciências Biológicas, Química ou mundo da Veterinária, acabei sendo levado a descobrir o mundo do Direito. Era a indicação de professores do Ensino Médio e de familiares pelo fato de que “gostava de falar, discutir, argumentar”. Não foi preciso muitas leituras sobre a carreira jurídica para chegar à conclusão de que não sentia nenhum encanto pela área. Então, descobri que a possibilidade de viver muitas vidas me deslumbrava. Conhecer pessoas e lugares que jamais conheceria se fosse qualquer outra coisa se não jornalista. E mais: exerceria o que mais me encanta nessa profissão que, o “ofício de contar histórias”. Assim, entro nos anos 2000 como calouro na Faculdade de Jornalismo. E, de imediato, o primeiro choque: jornalista não escreve histórias e, sim, notícias. A diferença traz toda a sua carga de discussões sobre imparcialidade e visão do próprio jornalismo enquanto espelho de uma realidade. O jornalista vai ao campo como um agente que coleta indícios de uma realidade, junta esses elementos como num mosaico e reconstitui essa realidade, faz o relato. Essa construção – que ainda era defendida por alguns na época (BARBEIRO; LIMA, 2002; ERBOLATO, 2000) - nunca me agradou, ainda mais sendo obrigado a usar o cabresto da máxima de que jornalista não tem opinião. Faz o relato do acontecimento sem deixar suas marcas. Porém, enquanto essas inquietações me corroíam, o pragmatismo e as técnicas de produção em jornalismo me absorviam e encantavam. Ainda no segundo ano de faculdade, ingresso como estagiário pela primeira vez em uma redação. Era a recém-fundada TV Cultura de Montenegro, no Rio Grande do Sul. Uma das afiliadas da então TV Cultura de São Paulo e mantida pela Fundação de Artes de Montenegro, a Fundarte. À medida em que mergulhava na prática com sede de aprender jornalismo, fui apostando num desenvolvimento técnico e, como não poderia ser diferente, pragmático sobre o “fazer jornalismo”. Hoje, olhando para esse processo, vejo em minha história pessoal funcionar a ideia de que “[...] o saber jornalístico se materializa no âmbito da prática”. (MAROCCO, 2012, p. 242). E, talvez por isso, o jovem “foca” se sente inebriado pela prática, encarando o processo de aprendizagem do “fazer jornalismo” de forma muito mais pragmática do que reflexiva. Como destaca Marocco (2012, p. 70), “[...] o jornalista vive um processo ininterrupto de transmissão do conhecimento em que primeiro

14

aprende a se virar naturalmente neste novo ambiente, quando chega à redação, e depois ensina, repete o mesmo que aprendeu e pôs em circulação para os iniciantes”. Assim, inebriado e seguindo esse fluxo de aprendizagem, passei por redações de jornais, emissoras e rádio e televisão, com ainda rápidas incursões em produção ditas multimídias, visando produção para Internet. Tudo isso indo de pequenos a grandes veículos de comunicação, desde referências na cidade da Montenegro até o estado do Rio Grande do Sul e Brasil. Embora não menos apaixonado pelo jornalismo, o passar dos anos me fazia sentir o peso desse cabresto que no começo nem chegava a incomodar. Depois de dez anos de redação, senti o começo da inversão de papeis. Deixo um pouco de ser o jornalista que recebe os ensinamentos de redação e passa a propagar seus valores. Sinto isso muito claro bem no início de 2010, quando ainda atuava da Rádio Gaúcha e desenvolvia outros projetos no Grupo RBS. É a época em que as velhas inquietações voltam e tornaram-se insuportáveis. A sede era agora por uma reflexão mais densa sobre o “fazer jornalismo”. Sentia-me incomodado com a repetição de movimentos pragmáticos sem tensões maiores. Foi o período que, dentro da redação, me vi envolvido em desafios de desenvolver novos projetos e conceber produções de jornalismo que trouxesse algo de novo. Paralelo a isso, percebia que aquela máxima de apagar as pegadas do jornalista enquanto agente da mídia ia se esvaindo em meio ao novo e inquieto meio que via se agitar ao meu redor. A discussão em torno da objetividade passou a um segundo plano e, ao que parecia, os modos de produção estavam se alterando. Acredito que tudo influenciado pela sociedade da informação, que encontra na Internet o terreno fértil para mudar toda a ambiência não só de produção em jornalismo, mas também da relação entre as pessoas. Mais tarde, fui percebendo que essas minhas impressões em torno do que entendida como sociedade da informação dizia respeito, na verdade, a outro conceito: o de midiatização. Este conceito, entre outros, realoca a posição dos agentes midiáticos, entre eles o jornalismo. Muda-se a relação entre sociedade e seus meios. Todo o sistema de comunicação está situado numa grande ambiência, chamada de midiatização. Trata-se de uma nova ordem de tecnologias transformadas em meios, através de processos intensos e acelerados, que repercutem não só na esfera específica dos meios de comunicação, mas na relação destes com as instituições e com os atores sociais, produzindo uma espécie de nova ambiência. A sociedade é atravessada por fluxos, dispositivos e estratégias midiáticas, permeadas por uma cultura midiática. Estamos, portanto, inseridos nessa ambiência, reunindo processos, produtos e operações de comunicação distintas. As mídias tradicionais integram, por sua vez, um sistema produtivo nos moldes de uma economia clássica. Em função da

15 ascensão das convergências tecnológicas, ocorre a emergência de novos meios, estimulados pela existência de novos circuitos. (FAUSTO NETO, 2008)1.

E, talvez, mobilizado por essa ascensão da tecnologia percebia que não era só os jornalistas e as grandes empresas de comunicação que faziam jornalismo. Blogs e informativos de empresas, clubes, sociedade organizada e mesmo pessoas independentes faziam circular a sua informação diretamente na rede. E mais: percebia que o jornalismo clássico detectava isso e promovia certa agitação e, por interferência dessa ideia de midiatização, não representava mais um modelo asséptico de jornalismo, em que o agente jornalista tem suas marcas apagadas como justificativa de estratégia de objetividade. Questões como essa foram latejando em mim ao longo do ano e culminaram, no fim de 2010, na decisão de me incursionar pelo mundo da pesquisa acadêmica em comunicação. Sentia a necessidade de pensar, estudar, refletir sobre quem é o jornalista que operacionaliza a construção das notícias nos tempos de hoje, em que sociedade e meios reconfiguram suas posições. O meu interesse pessoal pela televisão me fez também mais atento para o que, despretensiosamente, via como mudanças na forma de narrar nas notícias no telejornal. O jornalista passa a se colocar como uma espécie de narrador ativo nas suas produções que, em TV, tem nuances claras de espetáculo. (GOFFMAN, 1985). E a TV ainda tem terreno fértil para uma verdadeira encenação da realidade – talvez interpretação -, seja exagerando importância ao acontecimento ou no tom trágico da dramatização. (BOURDIEU, 1997). Assim, comecei a observar o que, na época, considerava transbordamentos da experiência do jornalista, impressões pessoais no texto das notícias. As notícias que antes via com assepsia, sem opinião e reconstituição objetiva da realidade, não apareciam mais dessa forma. E as questões foram amadurecendo ao longo de todo ano de 2011, período em que mergulhei nas disciplinas do Programa de Pós-Graduação em Comunicação Social da Unisinos. Os encontros, trabalhos e discussões do Grupo de Pesquisa em Jornalismo, o GPJor, do PPGCOM da Unisinos também lapidaram as questões que chegaram ao fim desse ano com aspirações de projeto de pesquisa. Ciente de que o jornalista é um agente ativo na constituição de notícias numa sociedade em vias de midiatização (FAUSTO NETO, 2008), apreendi o Jornal Nacional como observável para a pesquisa. E partindo do pressuposto de que quero observar as ações do jornalista enquanto narrador, constituidor da notícias, com o objetivo de entender que narrativa é essa, olho para a construção da narrativa jornalística – já que toda narrativa

1

Em entrevista a revista IHU On Line.

16

decorre de um narrador (BENJAMIN, 1994) – dentro do JN, na busca de indícios que possibilitem entender que narrativa é essa que parece valorizar a experiência do narrador/jornalista. Se quero observar a narrativa e seu narrador, associo-me a ideia de que observar quem narra (o jornalista/o narrador) e o como narra (a narrativa). E se toda narrativa é proferida por um narrador, esse, no caso do jornalismo, narra o acontecimento que passa a ser entendido como narrativa jornalística2. Por fim, afasto-me de discussões sobre imparcialidade e objetividade no jornalismo a partir do instante que concebo as notícias como construções narrativas sobre o acontecimento. Afinal, também creio que todo o narrador, aquele que narra, tem algum propósito de narrar e que nenhuma é de fato concebida com ingenuidade. (MOTTA, 2007) Impregnado com certezas de que o agente jornalista coloca tudo que viveu nas suas produções de notícias, jogo-me na elaboração do projeto de pesquisa e submissão à banca de qualificação. De concreto, apresento o problema de pesquisa: “que narrativa é essa do Jornal Nacional que incide no acontecimento e quais os sentidos que movimenta na construção do relato do que mais importante aconteceu no Brasil e no mundo?”; e o recorte do observável: uma semana, seis edições do Jornal Nacional. Como minha construção, ainda sem mergulhar densamente no empírico, levo a suposição que a narrativa do JN traz consigo a experiência do (dos) narrador (es) que a conceberam. E na Qualificação do projeto de pesquisa percebo que fui longe demais na ideia de jornalista enquanto narrador de notícias, numa – supunha eu – atualização do conceito de Benjamin. Levado pelo meu próprio método de observação – ainda não posto à prova na própria pesquisa, à época do exame de qualificação – detectei essa suposta experiência do jornalista em seu texto e contaminei o próprio texto da qualificação com impressões que julgava como certezas. Concebi claramente uma fronteira borrada entre ficção, o conto, o romance, e a realidade, o texto jornalístico, a notícia. Do exame de qualificação ficou a certeza de que conceitos precisavam ser revistos. Entre eles a concepção de ficção e do próprio jornalismo e a narrativa em cada um desses espaços. É assim, mais intensamente a partir de meados de 2012, que as observações da pesquisa e a feitura de seu relatório se desenvolvem mais claramente, chegando a esse texto final que busca entender uma nova configuração da narrativa jornalística a partir da observação de suas manifestações num telejornalismo de referência. Não é um produto 2

Motta (2007) entende que a narrativa é uma forma de traduzir conhecimento, seja a forma objetiva ou subjetiva, em relatos. Ou seja, é na narrativa que as experiências e acontecimentos (ou fatos) se articulam numa temporalidade criando certa lógica e sentido. “A partir dos enunciados narrativos somos capazes de colocar as coisas em relação com as outras em uma ordem e perspectiva, em um desenrolar lógico e cronológico. É assim que compreendemos a maioria das coisas do mundo”. (MOTTA, 2007, p. 143).

17

acabado e sim um caminho percorrido. No entanto, não é qualquer caminho. É um percurso possível a partir das inquietações do pesquisador, cristalizadas num problema de pesquisa que observa um objeto empírico através de grades de entendimentos3. O resultado, a dissertação de mestrado “O MUNDO POSSÍVEL DO JN – a narrativa ‘do que mais importante aconteceu no dia no Brasil e no mundo’”, é apresentada aqui em duas partes. A primeira, que compreende os capítulos “2”, “3” e “4”, é mais teórica. Apresenta e trabalha conceitos-chave - constituindo os meus próprios - para o desenvolvimento da pesquisa. Entre eles: ficção (AUGÉ, 2001) e jornalismo; narrativa (RICOEUR, 2010) e relato jornalístico (a notícia) (ALSINA, 209); (MOTTA, 2007; 2006); o televisual (KILPP, 2012) e o jornalismo inserido nesse mundo. Ainda apresenta outros descobertos nessa etapa – como a guinada subjetiva (SARLO, 2005), (SERELLE, 2009); notícias do fantástico (MOTTA, 2006); vivência e experiência (BENJAMIN, 1994; VOGEL; SILVA, 2012); e mundo possível (LEAL; JÁCOME, 2011; LEIBNIZ apud STRATHERN, 2002), além de trazer o observável a partir do objeto empírico e a constituição do problema da pesquisa. Por fim, chega a concepção metodológica. É a partir da construção das molduras de Kilpp (2010) como procedimento metodológico e também influenciado pela análise pragmática da narrativa jornalística de Motta (2007) que chego a constituição de um método próprio que melhor serve à pesquisa: a constituição e articulação de grades de entendimento. Essas, por sua vez, orientam a observação – sua operacionalização será demonstrada no decorrer do relatório de pesquisa. Na segunda parte, que compreende os capítulos “5” e “6”, o objeto é dissecado. O primeiro movimento, do capítulo “5”, é o mais denso da pesquisa. Apresenta o Jornal Nacional e demonstra como foi orientada sua observação à luz do problema de pesquisa e através das grades de entendimento. As grades de entendimento apresentam o Jornal Nacional em níveis, focando a observação em itens como: tipos de notícias apresentadas; movimentos narrativos; inferência de repórter e apresentador na narrativa da notícia; fontes utilizadas, imagens e textos apresentados pelo telejornal, entre outros. Os movimentos dentro dos níveis são descritos e analisados pelo pesquisador. Depois, as observações e inferências são expostas nesse mesmo capítulo do relatório. Isso, até chegar ao último movimento desta pesquisa. É na etapa denominada “Considerações Finais” que um entendimento do mundo telejornalístico 3

Por outra forma, seria o que Kilpp (2010) entende como “molduras” numa Ethicidade. Para ela, há inúmeras molduras possíveis pelas quais se pode observar um objeto. É o conjunto dessas molduras que forma a Ethicidade. Cabe ao pesquisador, motivado por seu objeto, problema e a própria pesquisa articular as molduras na busca pelo conhecimento do objeto. Para a constituição de minhas grades de entendimento, busco inspiração na constituição das molduras de Kilpp (2010) enquanto procedimento metodológico.

18

constituído pelo Jornal Nacional é apresentado como mundo possível. No fechamento do relatório da pesquisa, demonstro e analiso como se dá a narrativa do Jornal Nacional na constituição de mundo possível e como isso mexe com a prática e o produto final de um programa de televisão de cunho jornalístico. Acreditando na máxima de Suzana Kilpp, repetida nas aulas de Pesquisa do Audiovisual, do PPG COM Unisinos, de que “não basta se ter um método, é preciso ser o método”4 e nas ideias trazidas por autores como Augé, Motta, Serelle, Alsina e Vogel sobre a forma como o jornalista traz sua vivência na composição da narrativa da notícia ainda apresento no relatório de pesquisa a secção de apêndices como marcas minhas do percurso. Através deles, apresento toda tabulação de dados constituída a partir das grades de entendimento, a transcrição da pesquisa exploratória e também uma reprodução de fragmentos do diário de campo. Esse último, bloco de anotações manuscrito que me acompanhou ao longo de toda a jornada da pesquisa. É assim, enquanto pesquisador e também jornalista, que quero mostrar, expor minhas pegadas impregnadas de vivência em todo percurso da pesquisa. A quem enquanto jornalista busca uma reflexão sobre a prática, em especial a de telejornalismo, a quem enquanto pesquisador busca mais da prática de pesquisa em comunicação e, em especial, a quem, de qualquer natureza, sente-se curioso e busca novos caminhos através da reflexão e pesquisa, convido para trilhar comigo o caminho por esse bosque.

4

Informação verbal.

19

2 DA DESCOBERTA DO TEMA À CONCEPÇÃO DA PESQUISA O que me afeta é a narrativa, a forma de contar histórias. O que me desperta – ainda mais – a curiosidade em saber como se dá a construção das narrativas sobre “o que de mais importante aconteceu no Brasil e no mundo naquele dia” através do olhar do JN. Poderia incursionar em leituras da própria emissora atrás de minha resposta. Afinal de contas, a Rede Globo já produziu pelo menos três grandes livros que contam a história do JN. Neles, princípios, valores e critérios de noticiabilidade, além de princípios editoriais, foram postos. No entanto, além de serem publicações promocionais – no sentido de promover, enaltecer o programa – a prática do jornalismo é demonstrada de forma reducionista, quase que como receita de bolo. Além disso, questões e tensões que colocam o jornalismo e a televisão numa fronteira borrada entre ficção e não-ficção passam ao largo. É preciso que seja observada essa construção narrativa que o JN faz sobre o que julga “mais importante” a partir de uma perspectiva que centra o olhar nessa fronteira borrada, encarando a ficção como própria da narrativa jornalística (AUGÉ, 2009) uma forma de objetivar o mundo que passa diante de si. Talvez a dinâmica de produções em TV, por mobilizar longos processos e grandes equipes, não permita chegar a um narrador. Bonner não chega a um número, apenas cita cerca de 600 equipes completas (de produtores, a repórteres, cinegrafistas, e editores) trabalhando diariamente no jornalismo da Rede Globo, distribuídas nas redações de suas 121 emissoras afiliadas no Brasil, além das sucursais internacionais. Uma conta que passa de 4.500 profissionais envolvidos nesse processo todo o dia. Isso tudo me enrola, atrapalha e faz pensar: coisa absurda buscar “O Narrador” do JN. Seria aquele o agente capaz de impor sua narrativa ao que mais importante aconteceu naquele dia. E se falo em narrativa, não posso excluir a figura desse narrador. Neste cenário, o problema de pesquisa se configura da seguinte forma: afinal de contas, quem é o narrador das histórias contadas pelo Jornal Nacional? Como conduz essa narrativa – que artifícios e exercícios usa para construção de mundo – até sua materialização? Qual sua relação com a narrativa posta? Como já destaquei, o processo produtivo da prática jornalística em televisão é uma das formas de construção mais compartilhadas por uma equipe. Talvez, seja necessário um exercício de análise mais denso para buscar uma espécie de coro de narrativas que dão força a uma e assim chegar a uma voz de narrador sustentada por varias vozes. Assim, reformaria o problema com base neste sujeito quase indeterminado na seguinte questão, baseada na frase

20

que funciona como slogan do Jornal Nacional1: que narrativa é essa do Jornal Nacional que incide no acontecimento e quais os sentidos que movimenta na construção do relato do que mais importante aconteceu no Brasil e no mundo? Como serei guiado por esses caminhos? Por óbvio, necessitarei de um mapa. Não significa que será possível seguir as inscrições que já estão desenhadas à risca. Afinal de contas, um mapa epistemológico traça um caminho já percorrido e coisas já desvendadas. Para se chegar a outro ponto e fazer novas descobertas é necessário tomar o mapa como base. A partir dele ir avançando, mas traçando o próprio caminho. Ao fim da jornada – espero – ter meu próprio mapa. Assim, sigo o caminho já desvendado e vivendo a experiência desse caminhar busco respostas para minhas inquietações. 2.1 SEGUINDO UM CAMINHO PARA ALÉM DA “OBJETIVIDADE“ Como Alsina (2009, p. 238) destaca, “o conceito de objetividade jornalística, apesar de diversas críticas que recebeu, continua sendo um dos elementos-chave para compreender a ideologia que o modelo liberal da imprensa mantém”. Esse conceito de objetividade não tem sido imutável ao longo dos anos. É que para Alsina (2009), a objetividade é um bem que pode ser alcançado. Porém, reconhece que é de acesso difícil. E sobre essa dificuldade elenca vários motivos que vão desde o âmbito do jornalista até a própria natureza dos fatos. (SCHUDSON, 1978 apud ALSINA, 2009). Gomis (1992, p. 12) também trata de objetividade através do que chama de “construção social dos meios”. É que, para ele, o jornalismo nada mais é do que “um método de interpretação sucessiva da realidade social”. (GOMIS, 1992, p. 12 e 14). O que me parece muito mais interessante do que correr atrás de uma ideia de objetividade que se esvai em qualquer tensão. Trabalhar a ideia de “interpretação da realidade social” não descarta a ideia de objetividade. Entretanto traz a discussão para outro nível. Já que essa realidade é lida e apreendida a partir do regime discursivo do jornalismo, esse que tem no seu “como contar” a própria ideia de ficção, parto da ideia de interpretação como uma espécie de versão da realidade e que está sendo operada pelo jornalista. Associar à ideia de interpretação não é pensar em menor ou maior grau de objetividade. É simplesmente considerar que a realidade

1

A frase original é “o Jornal Nacional tem por objetivo mostrar aquilo que de mais importante aconteceu no Brasil e no Mundo naquele dia, com isenção, pluralidade, clareza e correção”. (BONNER, 2009, p. 17). Ao longo de todo o livro Jornal Nacional Modo de Fazer, o autor e editor-chefe do telejornal recupera a frase, por vezes com algumas variações. A estratégia é clara: tornar esse objetivo como uma máxima, quase que como um mantra, que baliza todos os demais princípios editoriais do programa.

21

foi vista e ficcionalizada discursivamente a partir de um determinador lugar, onde está esse jornalista. O que não quer dizer que não haja tensão. Há, inclusive, uma entrada mais consistente na minha proposta de análise. Ainda assim, é possível questionar se a objetividade não poderia ser associada à ideia de puro tratamento de dados, que o próprio “tratar” os dados implica numa interpretação. Objetiva é claro, mas ainda é interpretação. Tratar dados é isso: lê-los e interpretá-los. Assim mesmo, com toda essa discussão que tivemos sobre a ideia de interpretação. Dados revelam cenários, são textos. Cenários, textos que podem ser lidos e interpretados por vários ângulos – ou níveis. A leitura que se faz desses cenários é uma composição que pode ser tomada objetiva, mas ainda sob a ação da interpretação. Afinal de contas, não é porque está buscando esteio nos dados que o devaneio não se dá. Acontece sim, no limite permissível e muito alinhado com a ideia de Eco, mas se dá. Esse lugar de fala é representativo não só pela inserção desse profissional no mundo do jornalismo. Tem muito a ver com o próprio mundo social em que esse jornalista/jornalismo está inserido. E é através desse jornalismo que se escuta falas muito interessantes que mostram como atende aos valores e desejos sociais mais cristalizados. Se um povo tem uma visão preconceituosa disfarçada de politicamente correta de homossexuais, velhos, doentes e prostitutas, é inevitável que o jornalismo reproduza essa postura. Afinal de contas, ele está no estofo social e bebe dos mesmos valores. São vários e interessantes os estudos nesse sentido. Um deles consta na dissertação de Mestrado de Silva (2010), Masculino, o Gênero do Jornalismo: um estudo sobre os modos de produção da notícia. A pesquisadora incursionou na redação de um programa de televisão para observar a prática jornalística em movimento. Das inúmeras constatações que fez através de um estudo etnográfico, chamo atenção para o ponto: o trabalho do jornalista reflete sua visão diante do mundo que o cerca. Silva (2010) destaca que durante as reuniões de pauta do programa em estudo2, era possível se perceber que só viraria pauta – e mais adiante assunto do programa – algo que correspondesse a uma série de pré-requisitos que “[...] visava contemplar o estilo das matérias a compor o perfil do programa”. (SILVA, 2010, p. 134). Só que não era só isso. Ao longo de sua incursão, via se materializar em pautas os desejos e percepções de mundo do (os) jornalista (as).

2

O programa estudado por Silva (2010) se trata de um telejornal. Sua rotina produtiva evidencia semelhanças com o Jornal Nacional. E constato isso a partir da análise de dados do próprio texto do telejornal.

22 Com o tempo, percebi que os gostos pessoais, visões de mundo e valores mais próximos das identidades sociais dos jornalistas eram fatores que apareciam nas disputas, argumentações e até mesmo serviam de filtro nessas escolhas. Esses gostos, decorrentes da subjetividade dos interlocutores, eram também elementos que pesavam na seleção das pautas. E muitas vezes essas visões de mundo apareciam como parte dos valores-notícia [...]. A subjetividade no processo seletivo desvelarase pela manifestação do gosto pessoal como justificativa de seleção de uma pauta. (SILVA, 2010, p. 134).

E Silva (2010) demonstra isso na prática, com dois exemplos em seu estudo. São diálogos que tem com um jornalista em que usa o pseudônimo Kauã para identificá-lo. A situação é descrita no Diário de Campo que norteia a pesquisa. Ela encaminha uma sugestão de pauta sobre o caso de um casal de lésbicas que tinha tido uma filha biológica. Quando ele abre o e-mail e vê do que se trata, diz: a palavra é não! Não gosto disso. E deleta a mensagem. Fiquei meio atônita com a forma que ele reagiu, pois ele parece realmente incomodado com o tipo de assunto, manifestando o desgosto inclusive na entonação da voz e na expressão do rosto. (DC, 17/03/09). (SILVA, 2010, p. 135, grifo do autor).

Mais adiante, Silva (2010) relata mais um diálogo com Kauã em seu Diário de Campo. Ele evidencia sua predileção pelo esporte e ainda, enaltece a prática do jiu-jitsu – modalidade que se diz feliz por estar praticando há mais de um ano. Certa vez, o jornalista acaba inserindo o assunto como pauta do programa. Interessante observar como a defesa do tema se dá durante uma reunião com mais jornalistas do programa. A ideia de Kauã é questionada pelos colegas. Antônio pergunta: o esporte vai dar essa notícia? Kauã responde que não. Samuel, em tom jocoso: é tão bom que o esporte não vai dar. Kauã diz para ele que amanhã na TVCom vão entrevistar alguém dessa competição, utilizando-se desse argumento na tentativa de demonstrar que havia importância nesse fato, ao contrário do que sugeriam os colegas. Kauã argumenta que notão sobre jiu-jitsu está no mesmo nível de notão sobre hipismo [...]. Antônio comenta com Leandra (editora plantonista do dia) que está em dúvida sobre essa matéria do jiu-jitsu. Leandra diz que acha que jiu-jitsu é mais popular do que o hipismo. [...] [um tempo depois] Antônio pergunta para Kauã porque está sem voz. Kauã responde que está assim de tanto torcer pelo campeonato de jiu-jitsu. Antônio pergunta: mas tu faz jiu-jitsu? Kauã responde que sim. Antônio, rindo, fala: ah, então eu entendi porque o interesse em colocar essa matéria. [...]. (SILVA, 2010, p. 136, grifo do autor).

Silva (2010) ainda segue detalhando que a matéria vai ao ar. Seja no primeiro ou no segundo exemplo, o que fica claro e ainda comprovado na prática é que as visões de mundo, objeções e predileções dos jornalistas compõem o mundo que criam através de seu trabalho. A partir do estudo de Silva (2010) entendo, por exemplo, que no mundo de Kauã, não existe casamento entre lésbicas e muito menos a concepção de filho biológico, por mais que se tente

23

dar um caráter científico ao acontecimento. Agora, competições de lutas estão presentes no seu mundo. Logo, no seu programa essas visões de mundo serão repetidas. Será esse um mundo real que nos cerca ou cerca – ao menos – o jornalismo? Ou será o mundo que cerca a vida de Kauã? Ao menos a mim, o que já está mais do que provado é o fato da interpretação feita do mundo não ser nada além do que afeta e desperta interesse no narrador. Para ele, é só isso que importa na concepção de sua narrativa. Voltemos um pouco à concepção de “interpretação da realidade”. É possível perceber como essa ideia de objetividade, que associa o relato descritivo ao imparcial e objetivo, pode já operar dentro de uma ideia que afasta o sentido de relato descritivo puro e sem opinião. Ou seja, sem a posição do sujeito. Busco em Alsina (2009) esse movimento de readequação ao conceito de objetividade para levar até outro movimento que interessa observar: a operação do jornalista na composição de sua interpretação da realidade. Um fenômeno jornalístico genuinamente norte-americano, e que justamente levou a crise dos anos de 1970 ao próprio conceito de objetividade, é o denominado “novo jornalismo”. Esse é um jornalismo muito mais subjetivo. Dentro da estrutura narrativa, o aspecto de anedota, torna-se o leitmotiv, inverte-se a ordem da exposição da notícia e aumenta o interesse pelos pequenos fatos em lugar de grandes acontecimentos. O que é quotidiano vai se estendendo dentro do objetivo de interesse jornalístico. A imaginação volta a ter novamente a importância jornalística que precisa ter. Utiliza-se tanto a realidade quanto a ficção. O produto final costuma ser reportagens fragmentadas na sua estrutura e com grande intencionalidade literária. (ALSINA, 2009, p. 241, grifo do autor).

Observe como já vamos deixando em segundo plano essa tensão inicial e outra começa a surgir. Já deve ter percebido a que objetividade estou me referindo. Vimos, ainda, que para não escorregar na ideia de objetividade adotei a concepção de “interpretação da realidade”. Assim, começamos a olhar para dentro dessa prática. É de fato o fazer, tecer essa interpretação. Alsina (2009) volta lá no movimento do novo jornalismo para demonstrar essa reconfiguração na concepção de jornalismo. Quando faz isso, valoriza o agente interpretador. Ou seja, o jornalista. E está feita a tensão. Já que a operação interpretativa está na mão do agente e, como diz Alsina (2009, p. 240), “[...] imaginação volta a ter novamente a importância jornalística que precisa ter. Utiliza-se tanto a realidade quanto a ficção”. Em diversas obras, Eco trata a interpretação como uma ação individual. Embora Eco (2005) reconheça que haja uma valorização excessiva na ação do intérprete – enquanto agente que interpreta o texto – não desconsidera que a interpretação voa ao vento de quem lê o texto. É bem o princípio de sua reflexão em Obra Aberta (ECO, 1962). Agora, é importante reiterar que Eco (1962), nessa Obra, fala de uma interpretação – enquanto dotação de sentido – a

24

partir de um texto. Algo que reforça a máxima de que um texto pode ter várias interpretações, mas não qualquer interpretação que esteja desconexa com ele. Como se a legitimidade da interpretação se desse a partir do instante em que encontro no próprio texto “provas” que legitimam a interpretação. (ECO, 1962). Afinal, existem critérios para limitar a interpretação. Caso contrário, um texto, “[...] depois de separado de seu autor e das circunstâncias de criação, flutuaria num vácuo”. (ECO, 1962, p. 48). Agora, é certo que assim há uma infinidade de níveis de interpretação que podem ser percorridas por quem toma contato com um texto, acontecimento ou seja lá o que for. Ainda com Eco (1962, p. 45): “O texto é um universo aberto em que o intérprete pode descobrir infinitas interconexões”. Quero destacar que essas conexões são constituídas e descobertas de forma muito particular na relação que se tem – enquanto leitor – com o texto. Ou seja, a partir de Eco (1962, 2005), nessa composição de um entendimento sobre interpretação, coloco essa interpretação como uma ação que vem depois da experiência – que trabalharemos o conceito mais adiante. 2.2 A INTERPRETAÇÃO COMPONDO O RELATO JORNALÍSTICO Imaginemos um exemplo clássico: a composição de um personagem dentro de um relato jornalístico. Acreditava que ouvindo esse indivíduo – seja o doente que sofre na fila em busca de atendimento médico ou o atleta que com muito treino conquista o lugar mais alto no pódio – estaria personificando com um exemplo prático – e real – o quanto aquele acontecimento é verdadeiro. Mas quando ele passa por mim – e por minha interpretação – operacionalizo a composição do relato de forma muito similar ao contador de causos. Destaco o espetacular ou dramático na fala do personagem para dar mais ou menos tom de espetáculo ou drama a história que narro. E aqui entra algo que faz essa história se diferenciar de qualquer outra forma de contá-la em outro campo. Tudo isso leva a entender como o exercício da prática faz com que o jornalista préconceba a constituição de seus personagens mesmo antes do contato com eles. Por exemplo, mesmo sem nunca ter conversado com algum usuário do Sistema Único de Saúde, ele “sabe” da ineficiência de todo o sistema. Quando em contato com os “personagens” para a matéria, essa “verdade” tão consolidada por outras reportagens – e pela prática jornalística – o cegará e não lhe permitirá ver realmente o que o usuário tem a dizer. Por outra forma, é como se fizesse várias perguntas e só de fato ouvisse as que reiteram a verdade de um serviço ineficiente e fruto de reclamação de todos. O curioso é que observar como, muitas vezes, a

25

construção de um personagem se dá antes mesmo de ter contato com ele. Ou seja, como se de forma abstrata ele já existisse. Preciso apenas de um corpo para dar cara e o personificar. É mais ou menos nessa linha que encontro similaridade entre minha construção e o pensamento de Medina (2003, p. 130), quando ela afirma que Quando se constrói um personagem ou uma história de vida, as fronteiras do real e do imaginário se diluem. O método de um questionário em uma entrevista com a pré-pauta estabelecida tem resultados previsíveis. Cai por terra a assepsia racionalista na interpretação humana criadora de um encontro sem cartas marcadas. Também a crença de um rigor profissional que chegue ao retrato objetivo da realidade, em última instância à verdade, só persiste em mentes arrogantes.

A partir de uma leitura de Medina (2003), tendo a afirmar que a subjetividade é inerente à prática jornalística. Pois o que dá corpo à subjetividade é a ação da interpretação. É como se fosse o molho que dá substância ao prato servido. É através dela que apreendemos o acontecimento e o relatamos. A própria Medina (2003, p. 93) diz que é “[...] preciso romper com as rotinas industriais de produção da notícia [...] [para que o] cotidiano se presentifique” no relato. E fazer isso é como passar de um momento que busca apagar a subjetividade a outro que deixa clara toda sua incidência. O movimento, como descreve Medina (2003, p. 93), vai [...] da objetividade esquemática e burocrática de uma notícia à complexa e surpreendente subjetividade dos que vivem aqueles acontecimentos. Da fragmentação das ações humanas à sua contextualização na rede de forças que lhe é subjacente. De um aleatório de um momento avulso, à trama de tempos que afloram no presente.

E fazer isso é costurar histórias. Como? Seguindo com Medina (2003), agindo através da interpretação que dota de sentido e relação as histórias do cotidiano. Afinal de contas, “[...] a distância que existe entre a realidade objetiva e a representação dessa realidade é percorrida pelo esforço de interpretação”. (MEDINA, 2003, p. 125). O que quero destacar é que não há como pensar na composição do relato jornalístico sem levar em conta a subjetividade inerente à interpretação. O narrador, em jornalismo, é o próprio jornalista que interpreta o acontecimento para depois narrá-lo. Volto a Alsina (2009, p. 213) que defende que o “[...] funcionalismo propiciaria a ideia de que o jornalista cumpre uma função profissional, que é de selecionar a informação do dia partindo de critérios profissionais”. Alsina (2009) usa o verbo “propiciaria”. Ele dá todo o sentido de instabilidade da frase. Ou seja, seguindo, o jornalista “selecionaria” e “narraria” a informação do dia.

26

O que Alsina (2009) propõe é ir além da visão funcionalista. Ora, dizer que o jornalista “seleciona” e “narra” notícia poderia ser bem aceito numa visão reducionista de todo o processo de produção. Processo que revela estar presente quando diz: “[...] partindo de critérios profissionais”. (ALSINA, 2009, p. 213). É preciso entrar nesses “critérios”. Jornalista está inserido nos meios de comunicação, e os meios “[...] não só transmitem informação, mas também são agentes políticos que estão comprometidos com a realidade social”. (ALSINA, 2009, p. 214). O jornalista incorpora esse papel, sendo ele um agente dos meios e sujeito de práticas específicas – as jornalísticas. É assim que Alsina (2009) apresenta um cenário onde três perspectivas se configuram quando se trata do profissionalismo jornalístico: a dos funcionalistas, que vêm o jornalista como selecionador; a dos críticos, que vêm o jornalista como um defensor e ainda – a que mais me agrada – a perspectiva que coloca o jornalista como produtor de uma realidade social. Os funcionalistas ninam o povo, para que não acorde, os críticos procuram acordar a consciência do cidadão, e a perspectiva interpretativa analisa como é que o povo dorme. Portanto, a perspectiva interpretativa observa o jornalista como um construtor da realidade a partir de uma institucionalização do seu próprio papel e de determinados mecanismos de produção. (ALSINA, 2009. p. 214)

O que me interessa nesse instante é demonstrar como é plausível pensar que o jornalista pode sim ser um agente que operacionaliza textos num espírito de concepção muito similar ao da construção de narrativas de ficção sobre um mundo possível3. Augé (2001) tensiona o conceito de ficção, ampliando seu espectro de significação. Expondo a ambiguidade da palavra “ficção”, destaca que A simple vista, la noción de ficción es uma muestra de ambivalência. El diccionario le reconoce como primer significado el de mentira, poniéndolo a la noción de verdad. Pero le reconoce, también, como segundo significado el de invención, imaginación, oponiéndolo al realidad. (AUGÉ, 2001, p. 9).

Embora sempre tenhamos muito clara essa noção de mentira, não podemos desconsiderar que ficção também está para invenção e imaginação. O que, necessariamente, não quer dizer que se esteja falando em mentira. É como se criasse aquele vácuo entre a verdade e a verdade possível para aquele instante. A reportagem do Jornal Nacional, que foi

3

A primeira vez que tomo contato com a ideia de “mundo possível” é no Encontro da Compós de 2011, em trabalho apresentado no GT de estudos sobre a televisão. O conceito é trabalhado por Bruno Leal de Souza e Phellipy Pereira Jacome e será melhor discutido por mim mais adiante.

27

ao ar em 25 de junho de 2011, conta a história de um mistério que cerca uma pequena cidade do interior de Minas Gerais4. Figura 1 - Grupo é formado para caçar o Caboclo

Fonte: Caçada... (2011)

Essa reportagem é ou não prima irmã de um bom causo? O que operacionaliza o causo são mesmos elementos que operacionalizam essa reportagem. Pois bem, voltemos para as apropriações a partir de Augé (2001). A historinha do Caboclo d’água é “invenção, imaginação”. E, acredite, é jornalismo. Por mais espetacular que parece a história, ela suscita algo que realmente acontece na comunidade. Todos estão comentando as ações do Caboclo. Há relatos, indícios e até provas de sua suposta passagem pelas propriedades. O que o jornalismo faz, aqui, é dar forma ao causo e, tentar, interpretar o acontecimento. Dá forma como constrói sua narrativa dá mais crédito à história, embora sempre traga elementos que suscitam a dúvida: será que existe? A resposta pouco importa, já que o acontecimento é a dúvida, os comentários que geram a partir do causo. É isso que é interpretado pelo jornalismo. A história pode não ser real, mas também pode ser. Afinal de contas, ela foi apresentada dentro desse espaço de mundo possível. Uma espécie de ficção que orbita entre o possível e o impossível. Se para você a história é absurda, tente falar com alguns dos personagens da reportagem. Eles são reais e seus relatos também. O exemplo serve também para comprovar uma dúvida suscitada por Augé (2001, p. 9) “¿Estamos hoy em dia viviendo ficciones?”. A resposta é tão dúbia quanto a existência do Caboclo: “si e no”. Para Augé (2001), seria difícil saber o que é mentira ou invenção se isso esta em todas as partes. É claro que pode haver intenção nessas construções e interpretações. Mas – aqui eu – posso crer que o grau e o teor da interpretação de um acontecimento vão

4

A reportagem completa está disponível no site do JN, em .

28

depender do lugar de fala do narrador, ou de quem apreende o acontecimento. Augé (2001) destaca ainda que, hoje em dia, nos sistemas de informação, é quase impossível se detectar quem são esses agentes, os responsáveis, os autores, os iniciadores. O que está em jogo é o próprio sistema. Só mais um detalhe: guardemos com clareza essa percepção de Augé (2001). Mais adiante, será interessante para pensarmos na ideia de narrador. A reportagem sobre o Caboclo mineiro desperta essa inquietação sobre a construção do relato que realmente causa esse embaralhamento entre real e ficcional. Motta (2006) trabalha com esse tipo de relato que, pela natureza tão insólita do acontecimento, provoca questionamentos sobre se de fato é ou não um relato jornalístico. São as notícias do fantástico5. Desde já, permito pontuar que para o autor – assim como para mim – isso é jornalismo. Motta (2006) reconhece que o jornalismo tem essa empáfia questionadora, a ponto de dizer que só trata do fantástico com o intuito de desmistificar, questionar ou até debochar. Mas ele prova que, na prática o fantástico está muito presente no jornalismo. Ora, não é difícil aceitar que o jornalismo tem profunda atração pelo insólito, curioso. E a justificativa para isso fica clara quando falamos em valor-notícia. Que, aliás, para Motta (2006) é o que sustenta um fato como notícia. Que, por sua vez é [...] um relato sobre coisas que ocorrem no mundo, mas não é qualquer relato. Ela tem uma especificidade, opera com a exceção e com a inversão: a continuidade dos fatos não seduz a notícia, ela só interessa pela ruptura ou transgressão da normalidade. Se não há exceção, não há notícia. (MOTTA, 2006, p. 10).

Seguindo com Motta (2006), conclui-se que o jornalismo tem essa queda pelo diferente, o inverossímil e até pelo aberrante. Agora, é curioso ver como o jornalismo opera na construção de notícias do fantástico. São aquelas que de tão insólitas e até ambíguas fogem à linguagem descritiva dura para ser reproduzida enquanto um relato. Ou seja, se usasse a narrativa reta e objetiva, não daria conta de descrever ou constituir uma narrativa que abrangesse aquele 5

Notícia do fantástico é um conceito trabalhado pelo autor. Chega até ele a partir de outros conceitos sobre o fantástico, enquanto experiência estética. Experiência essa que está muito mais para manifestações em que a subjetividade ganha força, como nas artes, por serem o espaço em que há claramente efeitos, sentimentos, relações cognitivas entre quem produz e quem aprecia a obra. Toma como fantástico, apoiado leituras de diversas áreas, acontecimentos inusitados, insólitos que por natureza causem sentimentos como estranheza, surpresa, quase sempre carregados de emoção e até doses de apreensão. Porém, na visada do jornalismo, ao autor interessa esse fantástico “[...] na medida em que elementos de sua estética se manifestam em processos comunicativos jornalísticos onde pode haver intenção de causar certos estados de ânimo (‘efeitos’ cognitivos) em um sujeito interpretante” (MOTTA, 2006, p. 55). Pela forma como trabalha o conceito de notícia do fantástico, o melhor exemplo seriam notícias sobre acontecimentos que dão conta de manifestações religiosas, fenômenos sobrenaturais, aparecimento de criaturas inóspitas como ET’s, monstros, etc. Histórias que na frieza da linguagem objetiva seria possível concluir que não existe. Mas o efeito que traz e o próprio relato dos envolvidos põem em cheque conclusões dos mais adeptos da assepsia objetiva da realidade do mundo, causando, no mínimo, dúvida e inquietação. A reportagem sobre o Caboclo é um belo exemplo de notícia do fantástico.

29

acontecimento. De tão diferente e inusitada essa história – como a do Caboclo – atrai a atenção do jornalista. Só que para dar conta dela, precisa “[...] dar um tratamento linguístico mais livre, o texto ganha mais licença poética e a notícia derrapa para o campo do mistério e evoca, ainda que brevemente, o efeito do fantástico” (MOTTA, 2006, p. 10). Neste ponto é importante questionar: é só nas notícias que mexem com essa estética do fantástico que se pode detectar a dubiedade na construção da narrativa e o embaralhamento entre ficcional e o real? Isso por conta da liberdade poética, quase que necessária para dar conta de um acontecimento tão inusitado e ímpar. É isso? Em parte sim, mas precisamos fazer um atravessamento – e até uma justificativa. Olhar para as notícias do fantástico é interessante por ter manifestado ali de forma muito clara e evidente as operações de linguagem que são feitas pelo jornalista. Afinal de contas, “[...] é nos limites do jornalismo, atraído pela força do insólito, que os jornalistas experimentam, cedem à força mitopoética e realizam criativos jogos de linguagem”. (MOTTA, 2006, p. 10) que vão muito além do duro relato objetivo, descritivo e etc. Assim, sou parceiro do autor em acreditar que isso – a articulação de jogos de linguagem – ocorre em todas as operações do jornalismo que, por essência, visam criar uma narrativa sobre o acontecimento. Porque escolher o fantástico, uma manifestação por natureza subjetiva, mais próxima das expressões artística que as manifestações objetivas do jornalismo? Precisamente por isto: a presença do fantástico (ou de manifestação semelhante) leva os enunciados noticiosos a derrapar para as subjetividades. É nessas fronteiras que o jornalismo parece ceder e abandonar a sua racionalidade, submetendo-se à fábula e aos mitos, impregnando-se dos mistérios do inefável e do absurdo. (MOTTA, 2006, p. 10).

É claro que isso fica mais claro nas notícias do fantástico, mas não significa que essa escorregada não ocorra nas demais notícias. Como já observamos, há sempre certo grau de invenção. Por vezes maior, por vezes menor. Por isso o trabalho se Motta (2006, p. 12) se torna interessante e soma-se a minha pesquisa por tomar “[...] a estética do fantástico como referência para realizar um estudo da notícia enquanto processo ou experiência cognitiva”. Na reportagem sobre o Caboclo as “escorregadas” se dão no subterfúgio do caráter inusitado do acontecimento. Agora, veja como, de forma muito sutil, certas operações aparecem na matéria sobre o câncer do ex-presidente Lula. E refiro-me em específico ao trecho da reportagem que, no boletim de passagem do repórter, o texto diz: Assim que recebeu a notícia do doutor Roberto Kalil Filho, coordenador da equipe médica, o ex-presidente chorou. Foram cinco meses de tratamento intensivo que

30 incluiu três ciclos de quimioterapia e 33 sessões de radioterapia. A partir de maio, o ex-presidente vai fazer avaliações trimestrais. (TUMOR..., 2012). 6

Figura 2 - Repórter fecha os olhos e muda entonação quando fala no choro de Lula

Fonte: Tumor... (2012)

Ao jornalista, muito provavelmente, chega o relato de que Lula chorou ao receber a notícia. Lembremos que TV é imagem e que, por sua vez, imagem é informação. A emissora não tem essa imagem, mas a informação é significativa e de difícil descrição. Talvez, nem quem já viveu o drama de lutar contra um câncer consiga traduzir através da linguagem o sentimento, a sensação que o toma ao ser informado que venceu a batalha contra a doença. Mas veja o dilema que se encontra o jornalista: tal informação é fundamental para aproximar a notícia das pessoas e atingir assim o que, no jargão, se tipifica como humanização da matéria. A saída encontrada nesse caso foi operar a narrativa num tom dramático através da construção do texto e a leitura, entonação e interpretação dada a ele. Não se pode dizer que houve licença poética na feitura do texto. É o contexto para além da linguagem escrita que dá o tom emotivo da situação que o jornalismo, por seus recursos e operações, tenta traduzir para um tipo muito específico de linguagem: a sua, a jornalística Augé (2001) destaca que o que está em jogo não é tipificar como mentira ou verdade. Não haveria razão para se considerar as notícias puramente falsas e inventadas. Em seu próprio livro ele comprova isso ao trazer a história de como foram narrados desde grandes eventos esportivos, a morte da princesa Diana, a morte de John John, até o funeral de Philippe Yacé. Afinal, como no exemplo da história do Caboclo, todos os relatos estão ancorados num mundo real, com relatos e afetações vivos. 6

A reportagem completa está disponível no site do JN, em .

31

E diz Augé (2001, p. 10): “Además, el doblete mentira/verdad no da cuenta de las noticias o de las opiniones que transitan por la prensa y los otros medios de comunicación: no habría ninguma razón para considerar-las pura y simplesmente falsa y engañosas”. Augé (2001) ainda fala da dificuldade de se identificar os agentes iniciadores, os construtores dessas narrativas com vistas ficcionais. Sempre que trabalhei com essa ideia de narrativa, tinha claro que se falava nisso precisa existir um narrador. Afinal de contas, se algo é narrado se tem necessariamente alguém que narra. Neste ponto é quase que obrigação recuperar o célebre conceito de narrador de Walter Benjamin. De imediato, Benjamin (1985) aponta algo que vai à direção de Eco sobre a ideia de narrador. Defende que “[...] narrador não está de fato presente entre nós, em sua atualidade viva. Ele é algo distante e que se distancia ainda mais”. (BENJAMIN, 1985, p. 197). Ou seja, pode ser visto como aquele agente entre o autor e o leitor, num outro mundo. Só que para Benjamin (1985) a narrativa está vinculada profundamente com a experiência. O narrador é aquele que vive a experiência e a conta – oralmente – depois. E mais: para ele, a narrativa está em baixa. “Uma das causas desse fenômeno é óbvia: as ações da experiência estão em baixa”. (BENJAMIN, 1985, p. 198). Isso coloca Benjamin (1985) mais distante de Eco. Até porque, ele acusa o romance. “O primeiro indício de evolução que vai culminar na morte da narrativa é o surgimento do romance no início do período moderno”. (BENJAMIN, 1985, p. 201). O surgimento da imprensa acaba tendo parte disso, pois é ela que traz a capacidade de multiplicar os volumes que tem suas histórias não mais ancoradas na tradição oral e da experiência. Benjamin (1985) entende que a poesia épica materializa a narrativa, por trazer a experiência através da história oral. O que tendeu a desaparecer com a ascensão do romance impresso. O problema todo é que não se pode ignorar o conceito de Benjamin sobre o narrador. Conceito que ainda o coloca em choque quando aproximamos das ideias de práticas do jornalista trabalhados por Alsina (2009). O jornalista trabalha com informação difundida através da imprensa. E sobre isso, Benjamin (1985, p. 202-203) sentencia: [...] verificamos que com a consolidação da burguesia – da qual a imprensa, no alto capitalismo, é um dos instrumentos mais importantes – destacou-se uma forma de comunicação que, por mais antigas que fossem suas origens, nunca havia influenciado decisivamente a forma épica. Agora ela exerce essa influência. Ela é tão estranha a narrativa como o romance, mas é mais ameaçadora e, de resto, provoca uma crise no próprio romance. Essa nova forma de comunicação é a informação. [...] a informação aspira uma verificação imediata. Antes de mais nada, ela precisa ser compreensível “em si e para si”. Muitas vezes não é mais exata do que os relatos antigos. Porém, enquanto esses relatos recorriam freqüentemente ao miraculoso, é

32 indispensável que a informação seja plausível. Nisso ela é incompatível com o espírito da narrativa.

Os conceitos e apropriações postos por Benjamin (1985) são duros. Essa própria dureza pede que se leve essa percepção até objetos empíricos. É justamente nesse movimento de aproximação do empírico que percebo um estranhamento e, por consequência, uma tensão. Embora seja verdade que a informação tratada pelo jornalismo dentro do JN se faça numa necessidade de compreensão “em si e para si” – entre outras questões postas por Benjamin (1985) – há um estranhamento quando se tenta parear a forma como o telejornal trata a experiência e a forma como autor sentencia o fim dela na imprensa. Porém, também reconheço que uma apropriação direta dos conceitos de Benjamin (1985) para o empírico do jornalismo deixa vácuos, caminhos não percorridos. O resultado pode ser a construção de impressões que além de reduzirem o célebre conceito de narrador forçam encaixes duros para a compreensão do objeto da pesquisa. A vontade de não abandonar Benjamin me levou até outras leituras que fazem esse atravessamento com mais propriedade e preenchem as lacunas deixadas nessa aproximação com os materiais do telejornalismo. Uma delas é a que faço do trabalho de Vogel e Silva (2012). Partindo de Benjamin, Vogel e Silva (2012) trabalham os conceitos de vivência e experiência. Mais adiante, voltarei a esses conceitos. Importante, pelo menos agora, é compreender que as autoras tratam a vivência com algo muito mais próximo do jornalismo. A experiência continua estreitamente relacionada à ideia de narrador Benjaminiano. No jornalismo, o que ocorre é uma manifestação narrativa a partir da vivência da vivência de alguém – o jornalista. A diferença é que seu relato está impregnado da experiência da vivência no contato com o acontecimento e não numa experiência constituída ao longo de tempos. Se fôssemos buscar um telejornalismo de anos atrás veríamos certa assepsia no relato informativo. Operação que de fato jogava no lixo qualquer tipo de vivência do narrador – ou repórter/jornalista. Os personagens eram postos como cases ou exemplos. Com isso, a sua vivência no contato com o acontecimento era reduzida. O jornalista – embora saibamos da pouca eficácia disso – insistia muito mais em operações que apagassem suas marcas ao longo na produção da notícia. Como narrador, ausentava-se e dissimulava parra inebriar as marcas de sua experiência. No entanto, hoje, o que primeiro me chama atenção nas operações do telejornalismo é o contrário. Percebo uma necessidade de inserir o jornalista no processo, imprimindo e – muitas vezes – até forjando suas marcas no processo produtivo. Não sei bem a partir de

33

quando e nem onde, mas percebo que hoje o jornalista deixa mais os cases de lado e passa viver determinadas situações para compor seu relato. Isso pode ser constatado, por exemplo, na reportagem que fala do arsenal de bandidos encontrado em favelas ocupadas pela polícia no Rio de Janeiro7. Figura 3 - Repórter na subida do morro se insere na narrativa também de forma visual

Fonte: Policiais... (2011)

Ainda na chamada da matéria há intenção de expor marcas do processo de produção. A operação fica evidente quando se destaca frases como “a repórter Lilia Teles acompanhou uma equipe de elite da Polícia Militar na Rocinha”. Ou, ainda, dentro da reportagem quando se tem a imagem da repórter – devidamente paramentada com colete à prova de balas, numa ruela da favela – dentro de um cenário que descreve. O fato tem significância e sua presença ali deixa marcas no texto. Uma parte complicada do trabalho dos policiais é a entrada nos becos da Rocinha, que lembram um labirinto. Eles chegam até os locais com denúncias de moradores, que apontam esconderijos de traficantes, drogas e armas. Mas sempre existe o risco de uma armadilha no meio do caminho, como uma granada pronta para explodir. (POLICIAIS..., 2011).

Uma análise mais profunda pode buscar outras respostas, mas a operação que quer trazer à tona a vivência aparece superficialmente. Mais do que isso, é um movimento que coloca o repórter dentro de cena. Estratégia ou não para compor uma realidade televisiva pouca importa. Ao menos a mim, fica claro que incursões como essa em objetos empíricos provocam tensionamentos com a ideia de Benjamin (1985) atravessada por Vogel e Silva 7

A reportagem completa está disponível no site do JN, em .

34

(2012). Mas, a vivência a que o repórter é submetido seria uma espécie de atualização da experiência de Benjamim passada pelo telejornalismo atual? Serelle (2009), quando tece sua reflexão no que chama de guinada subjetiva no jornalismo, coloca o conceito de narrador em um lugar mais confortável que cria ainda consistência ao aproximar da prática jornalista. Ele reconhece que algo novo se insurge no jornalismo e o “eu” enquanto narrador passa a ter certa aceitação. A recuperação do ‘eu’ em narrativas jornalísticas contemporâneas, embora estas sejam, ainda, manifestações um tanto pontuais para constituírem tendência, concebe um modo de relação com a circunstância em que o sujeito, implicado naquilo que conta, confere ao relato o efeito de verdade principalmente pelo testemunho, desvelando, pela assunção da subjetividade e da afetividade, filigranas do outro, que normalmente escapam à percepção objetiva, e, por vezes, revindicando, de modo engajado, a intervenção na realidade imediata. (SERELLE, p. 34, 2009).

E depois de reconhecer essa diferença, Serelle (2009) faz uma leitura de Benjamim que também serve à presente pesquisa. Cria uma espécie de lugar onde o conceito cabe num entremeio entre “o narrador” e a prática do jornalista. Alsina (2009) destaca que: [...] se, à primeira vista, essas narrativas parecem reproduzir os tipos clássicos dos narradores benjaminianos – o marinheiro e o camponês, distanciados no espaço e no tempo, respectivamente (cf. BENJAMIN, 1994) -, elas são, na verdade, histórias de modelo romântico – realista, que mais denunciam, pela perplexidade, como já dito, pela cisão entre alma e ação (ou interioridade e mundo), nos termos de Lukács (2000), do que ensejam possibilidade prática de um ‘bom conselho’. (SERELLE, 2004, p. 34).

Ou seja, ver o jornalista enquanto narrador que vivencia algo para então narrar a sua relação com aquilo parece ser o que vejo em movimento no empírico. Uma espécie de leitura adaptada do conceito de Benjamim, que sinto bem mais próximo do que busco. Esse narrador não é o sábio que passa o ensinamento ou o “bom conselho” para a geração mais nova, mas sim aquele que vai ao campo e se deixa tocar pelos ambientes, vozes, cores, sabores e emoções do acontecimento. Depois, volta e cria a sua narrativa do acontecimento tendo vivido as suas próprias afetações. Isso enriquece o relato, que não está mais baseado na assepsia forjada na observação e anunciada com ares de objetividade e nem constitui seu trabalho a partir de uma ideia de experiência e sim de vivência. Serelle (2009) ainda recorda que o apagamento desses passos do jornalista narrador afasta o jornalismo da subjetividade de forma maquínica – usa até o exemplo da fotografia que, na sua história, buscou certo desenvolvimento que faz desaparecer as marcas do fotógrafo na composição e apreensão do momento capturado no clique.

35 Embora presente no início da reportagem, esse narrador-sujeito rareou-se, no jornalismo moderno, em função da objetividade que se constituiu valor basilar, ético do campo, que passou também a explorar economicamente a noção (feições de neutralidade e independência, em oposição às de partidarismo, alcançam, em tese, público mais abrangente)8. A narrativa jornalística estabeleceu-se no século XX (embora a concepção data do final do Oitocentos) por meio de uma técnica própria, aliando determinado esquema de seleção e disposição de informação ao afastamento do enunciador, cuja objetividade épica, à guisa da historiografia positivista e da voga realista – naturalista oitocentista, faz com que o evento pareça contar a si mesmo. (SERELLE, 2009, p. 36).

O narrador que apaga suas marcas está agindo conforme sua orientação de valores. Logo, fazendo o momento inverso, daquele que deixa suas marcas expostas em todo o trajeto. No fim das contas, faz pensar que estará fazendo o mesmo e ainda mais: deixando suas opções às claras. Nisso também compactuo com a leitura que Serelle (2009) faz de Zola (1995, p. 24). Ele usa o autor - que originalmente vai no romance - para entender a necessidade desse movimento de um narrador que vai a campo e busca uma experiência para ser inserida na narrativa que compuser. Serelle (2009) lembra que [...] se um romancista pretendia escrever acerca do mundo do teatro, exemplificou Zola, ele deveria reunir documentos, entrevistas os mais bem informados na matéria, colecionar expressões, passar noites num camarim de uma atriz, enfim, ficar impregnado do máximo possível daquele ambiente para que o romance se estabelecesse por si mesmo. (SERELLE, 2009, p. 36).

Um pouco disso é feito no movimento do new jornalism, ainda na versão norteamericana da década de 60. Serelle também reconhece que são movimentos que fazem essa volta, quase que como um resgate à narração em primeira pessoa. No entanto, essa ânsia de objetividade na feitura das notícias diárias faz o jornalismo criar corpo nessa vontade de contar histórias abstraindo-se enquanto agente que se envolve no acontecimento – nem que seja para depreender depoimento de terceiros e reproduzi-los. Com isso, a ideia de narrativa passa a ser tomada como o contrário da ideia de realidade. Isso porque se entende que toda aquela engenhoca que se move quando falo em narrativa. Se falo em narrativa, falo em narrador. Se falo em narrador, falo na figura de alguém que conta alguma coisa de algum lugar. Lugar esse que tem significado quando apreende uma realidade a ser narrada, ou transformada em narrativa. Pensamento incrustado no jornalismo do século XX, que não via – ou vê – sua prática como uma prática de narrativa.

8

Recupero a nota original do autor que diz que “essa foi a lógica, de acordo com Costa (2009), para o desenvolvimento dos jornais de Adolph Ochs, nos EUA, no final do Oitocentos. A passagem da gazeta de opiniões para o jornal de notícias fundamentou-se no preceito de que” (p.35) quando menos partido tomasse da notícia, mais valor de independência teria.

36 [...] teóricos da descontinuidade, entre eles Hayden White (1998) e Louis Mink (1998), colocaram em relevo os aspectos factícios de todo relato – interessava a eles notadamente aquelas narrativas sob o regime da veracidade. Para White a narrativa não somente urdidura (emplotment), mas distorção imposta como instrumento de poder e manipulação. Caberia, portanto, ao intelectual, desnudar os artefatos e matrizes constituinte de todo o relato, evitando, assim, que as narrativas se degenerassem em mitos, isto é, fossem recebidas sem a consciência de sua ficcionalidade. (SERELLE, 2009, p. 38).

Foi nesse ritmo, que de forma muito similar a minhas inquietações quanto a esses movimentos diferentes do telejornalismo, que Serelle (2009) se apropriou de produções jornalísticas que trazem o relato em primeira pessoa. Relato esse que é constituído de forma que só pode ser através desse movimento narrativo. É quando um repórter toma uma realidade a partir de sua experiência, como ocorre na reportagem que abre o Jornal Nacional de 23 de abril de 20129. Dois repórteres narram o problema do trânsito na grande cidade de São Paulo a partir de sua experiência. É como se fosse um teste. Contar esse teste só terá caráter de realidade e vivência se forem usadas construções como as apresentadas: “eu vou de carro, vou enfrentar esse trânsito todo” ou “eu vou de transporte público. Aliás, deixa eu correr. Se não, perco meu trem”. Figura 4 - repórteres dividem reportagem e constituem representações disso

Fonte: SP...2012

A construção dessa reportagem a partir da vivência dos próprios jornalistas e da narrativa que fazem partindo dessa situação é, para mim, a explicação prática do conceito de

9

Reportagem completa disponível em g1.globo.com/jornal-nacional/noticia/2012/04/equipes-do-jn-fazem-testede-mobilidade-urbana-em-sao-paulo.html, acessado em 24 de abril de 2012.

37

guinada subjetiva10 trabalhada por Serelle (2009). Se o repórter deixa o lugar de observador, passa a ser ele mesmo o personagem da ação a ser narrada. Logo, está assim colocando em jogo critérios claramente subjetivos. E quais seriam? No caso da reportagem do Jornal Nacional, o próprio estranhamento de repórteres com uma situação que, apesar de cotidiana, causa espanto. Então, expõem-se à vivência e o que sentem nesse percurso e o que os afeta tornam-se ingrediente para personificar a situação vivida por milhões de pessoas. E tanto essa afetação quando a memória dessa vivência na hora da edição da matéria mexe com coisas, sentimentos, sensações, apreensões, questionamentos que não tem lógica. Pertencem ao repórter enquanto um ser pensante. São as “arestas” referidas por Serelle (2009) pelas quais o jornalismo sai do relato maquínico, frio e objetivo e entra nessa nova experimentação textual, virando a mesa da objetividade e pondo à prova a subjetividade. Neste cenário, vêm à tona, como dissemos, a principio na condição de arestas, uma série de relatos jornalísticos em primeira pessoa, em que a perspectiva do sujeito não apenas molda a matéria narrada, mas a própria experiência do narrador torna-se parte do fato a ser comunicado. Podemos apreender essas manifestações como relatos resultantes , no jornalismo, da guinada subjetiva, que, principalmente a partir da década de 1970, deu a voz, por meio do testemunho, àqueles até então excluídos dos discursos majoritários. (SERELLE, 2009, p. 39).

2.3 TELEVISÃO A televisão ocupa uma posição invejável no corpo social. E, como já vimos, dentro dela é possível encontrar operações e reconstituições de mundos que vão do ficcional ao nãoficcional. São os filmes, telenovelas, animações e o telejornal. Machado (2005) usa o pensamento de Bakhtin para entrar na discussão sobre o conceito de gêneros. Para Machado (2005), o pensador russo é o que melhor define gênero quando se quer trabalhar com produtos da cultura contemporânea, como o audiovisual e a televisão, embora não tenha pensado esse

10

O conceito de Serelle (2009) tem origem em Sarlo (2005) e seu giro subjetivo. É uma espécie de derivação do giro linguístico. A autora trabalha a ideia de reconstituição de um passado por formas diferentes das operadas convencionalmente pela academia. Essas formas dão voz a personagens que ficam à margem dos relatos cristalizados como fontes institucionais e relatos objetivos, sem ação do sujeito. Depois de passar por caminhos que vão desde a sociologia, linguística até a própria história, Sarlo traz um método que revoluciona não só por ouvir pessoas que viveram um passado, mas que não o manifestaram na constituição de um discurso de história de um período. Também por levar em consideração locais, ambientes e as próprias experiências de vida de pessoas que, por exemplo, estiveram num tempo de guerra ou forte ditadura. Esse método é um mergulho na subjetividade e ainda traz o relato constituído numa reprodução de fala em primeira pessoa. Quando esse agente faz o relato, traz nele todas as afetações e experiências tão individuais, num típico relato de vida. “ [...] la revaloración de la primera persona como punto de vista, la revalorización de uma dimensión subjetiva [...]” (SARLO, 2005, p.21). Essa forma havia sido experimentada já pela literatura. Daí o giro linguístico já trabalhado nos anos 60, que culminou no contemporâneo giro subjetivo. (SARLO, 2005, p. 17 – 23).

38

conceito diretamente para esses produtos – tendo ele diretamente aplicado a linguística. Sendo assim, atravessado por uma interpretação de Bakhtin, Machado entende gênero como [...]uma força aglutinadora e estabilizadora dentro de uma determinada linguagem, um certo modo de organizar ideias, meios e recursos expressivos, suficientemente estratificado numa cultura, de modo a garantir a comunicabilidade dos produtos e a continuidade dessa forma junto às comunidades futuras. Num certo sentido, é o gênero que orienta toda a linguagem no âmbito de um determinado meio, pois é nele que se manifestam as tendências expressivas mais estáveis e mais organizadas da evolução de um meio, acumuladas ao longo de varias gerações de enunciadores. (MACHADO, 2005, p. 68).

Ou seja, quando falamos que algo pertence ao gênero televisivo estamos dizendo que aquele produto reza determinada cartilha para ser visto como tal11. Não importa se é telejornal ou telenovela. Para ser “tele” precisa responder a determinados critérios para pertencer ao gênero televisivo. E isso torna os produtos similares e facilmente identificáveis como produto de televisão. Sei que um telejornal é um programa de TV, por exemplo, porque vem cortado em blocos. Entre um e outro há os chamados breaks comerciais, os anúncios. O que divide o conteúdo editorial do comercial são as vinhetas de passagem. Logo, se for assistir isso numa sala de cinema, saberei que não é documentário por estar embalado nessa roupa de gênero televisivo. Um filme, por exemplo, se torna um programa de televisão assim que é cortado em blocos, separado por comerciais. Aonde quero chegar com isso? A compreensão de que tanto telenovela, programa de auditório ou telejornal são irmãos enquanto gênero televisivo por usar essa mesma roupa televisual. Só que essa roupa televisual é mais do que isso. Ou melhor, não é só marcação gráfica ou temporal. A cartilha do televisivo também provoca certo embaçamento entre o mundo de dentro e o de fora da TV. É assim que chegamos a concepção de Kilpp (2003) sobre o gênero televisivo nesse particular. Para a autora, “a tevê moldura gênero de tal forma que, ao final, dá origem a um gênero televisivo; e mais do que relativizar as noção de ‘real’ e ‘ficcional’, o gênero televisivo participa da dissolução de certos mundos e da instauração de novos”. (KILPP, 2003, p. 8) E veja só como podemos sentir uma natureza muito similar entre os gêneros televisivos e jornalísticos. Já destaquei a que concebo tudo que está dentro da TV como um grande gênero televisivo. E esse gênero, por vezes, borra limites entre o ficcional e o nãoficcional. Também já destaquei que o jornalismo opera muito mais numa interpretação de 11

Baseado no conceito de ficção de Foucault (1996), entendo que telenovela e telejornal operam com a ficção dentro de um regime discursivo próprio. Além disso, há elementos nos meandros desse discurso que se assemelham. Ambos são frutos de televisão, que, por sua vez, tem um próprio regime discursivo.

39

acontecimentos, operando num regime discursivo muito próprio, implantando ficção ao acontecimento no momento de narrá-lo. Ou seja, cria mundos a partir de suas percepções que nem sempre é de fato a correspondência do “real”. Lembro da frase de Chesterton12, que ouvi outro dia em um programa de entrevistas. “o jornalismo é popular, mas é popular principalmente como ficção. A vida é um mundo, e a vida vista nos jornais é outro”. Por isso, penso que misturar – ou aproximar, se preferir – esses gêneros é trilhar um mundo de entremeio entre ficcional e não-ficcional, tanto por estar trabalhando com TV como por estar olhando através do jornalismo e seu discurso de ficção para com o acontecimento. Assim, para mim, trabalhar com o jornalismo de televisão é trabalhar com um gênero do jornalismo que talvez seja o que mais coteje as produções ficcionais – que não quer dizer que não haja esse cotejamento em outras formas de jornalismo. Afinal, é dentro do fluxo televisivo que se encontra tanto o telejornal como a telenovela. E nesse mesmo fluxo, a concepção do televisual se dá a partir de influências mútuas entre gêneros. Jost (2009) destaca que gêneros televisivos, da televisão, podem ser interpretados em três mundos: o real, o fictício e o lúdico. Ou seja, é possível se ver um telejornal – enquanto gênero do jornalismo – para além de uma representação de mundo real. Claro que ainda precisamos apurar melhor e explorar com vastidão o que de fato pode haver entre esse ficcional e o não-ficcional. Porém, desde já, encontro um conceito que, por hora, parece me agradar: o de “mundo possível”, trabalhado por Souza e Jácome (2011). Como os próprios autores destacam, essa ideia de “mundo possível” deriva do pensamento de Leibniz aplicado a lógica (SOUZA, e JÀCOME, 2011, p. 9). Agora, é importante uma rápida passada por esse pensamento para entender a lógica do possível, mas não real. Strathern (2002) evidencia esse pensamento de Leibniz pela matemática. O princípio da contradição estabeleceu os fundamentos tanto para a matemática como para tudo que é logicamente possível. No entanto, só porque algo é logicamente possível não significa que realmente aconteça. (STRATHERN, 2002, p. 24).

É na contradição entre o que é possível e o que é impossível que se cria certo mundo de permissividade. Por exemplo, homens não voam, é impossível. Porém, numa fábula, isso é possível. A mesma permissividade existe também dentro do gênero televisivo. Só lá, por exemplo, é possível se ver um homem voando. Agora, misturemos a permissividade ao 12

O programa a que me refiro é um dos episódios da temporada de 2011 de Marília Gabriela Entrevista. Foi a fase em que começava minhas formulações mais concretas da pesquisa e me chamou atenção quando a apresentadora citou Gilberto Keith Chesterton. Britânico londrino, foi escritor, jornalista, historiador e biógrafo. Viveu na Inglaterra até pouco mais de 60 anos, falecendo em 1874, segundo referência do próprio programa.

40

gênero jornalístico. Num escândalo político, certo ministro é acusado de lesar os cofres públicos. A lógica diz que é possível e o jornalismo reconstitui elementos que sustentam essa lógica. Só que isso não significa que de fato isso aconteceu. Aconteceu dentro da construção dessa lógica no jornalismo, o que de fato não garante que aconteceu de fato. É como se esse fato estivesse entre um acontecimento possível, mas não real. Leal e Jácome (2011) fazem um atravessamento do pensamento que pode facilitar a compreensão. [...] interessa, para a associação entre ficção e mundo possível, o fato dos mundos ficcionais serem repletos de qualidades, de atributos, constituindo-se como construtos culturais postos em cena pelas diversas obras de linguagem. O possível, portanto, não é então uma operação estritamente lógica, mas uma virtualidade posta em cena pelas diversas referências presentes nos textos. (LEAL; JÁCOME, 2011, p. 10).

A mim, por hora, interessa colocar essa ideia de mundo possível num vazio que até então existe entre o que é ficção e o que é não-ficção. Talvez, pudesse cunhar um conceito próprio, como o de ficção permissiva. Mas, como a lógica é a mesma, prefiro seguir com essa tipificação de mundo possível. O que importa é entender que esse mundo possível é fruto de uma construção lógica, baseada em fatos e dando lastro ao acontecimento. Trazendo para a prática jornalística, vejo essa concepção em Alsina, quando traz a ideia de que a notícia “é uma representação da realidade quotidiana, produzida institucionalmente e que se manifesta na construção de um mundo possível”. (ALSINA, 2009, p. 299). De forma muito semelhante aquela concepção de Jost (2009), Alsina (2009) trata a “construção de um mundo possível” como produto da articulação entre três mundos: o real, o de referência e o possível (Alsina, 2009, p. 303). 2.3.1 O Telejornalismo e o Jornal Nacional Olhar para o fluxo televisivo e para seus produtos é interessante a partir do instante em que se concebe a TV como um palco, em que tudo precisará passar por certas operações para se fixar nesse fluxo. Quantas e quais são as operações ainda não sei precisar. Só sei que uma delas é essa constituição de mundo televisivo – ou mundo possível para a lógica da TV – pelo qual o próprio jornalismo tem de passar para se inserir nessa órbita. Por isso o que me instiga é a investigação sobre a construção narrativa do telejornalismo, ou, se preferir, narrativa do jornalismo de televisão.

41

O jornalismo – seja na TV, impresso, ou no que for – opera numa lógica empresarial padrão. Até porque, é um negócio e precisa dar lucro às empresas. É preciso se ter um discurso que faça eco na audiência e que construa uma credibilidade através do contrato pragmático fiduciário (ALSINA, 2009, p. 10), quando o leitor confere credibilidade ao que é dito. Essas lógicas empresariam se somam ao regime jornalístico13. Embora, a interpretação faça parte de um conjunto de ações na relação emissor e receptor que confere essa credibilidade ao que é posto. E, por isso, consome mais essa informação e confere mais credibilidade a ela e assim por diante. Como se a credibilidade brotasse a partir da relação entre emissor e receptor. Daí a importância da inelegibilidade entre os dois. Tamanha credibilidade agrega valor ao jornalismo como produto, tornando-o mais vendável. Quando se fala em padrão na televisão brasileira, é impossível não se levar em conta os números de audiência da TV Globo. Segundo informações do Ibope veiculadas pelo Jornal Folha de São Paulo14, em junho de 2011, a Globo tinha um dos seus piores números desde o início da pesquisa de audiência na década de 70. Ainda assim, batia 17 pontos do Ibope. Dez a mais do que a segunda colocada, a Record, com 7,5 pontos. É essa uma das formas de instaurar um discurso hegemônico e que solidifica seus padrões como algo a ser seguido. São muitos os programas líderes de audiência da emissora. Mas o que interessa é olhar a partir dos programas de telejornalismo. O mais antigo e um dos de maior audiência e impacto no próprio meio é o Jornal Nacional. Entre abril e julho de 2011, o telejornal passou de 31 pontos no Ibope15. Em 2011, o JN venceu o Emmy com a cobertura que deu a ocupação do Complexo de Favelas do Alemão no Rio de Janeiro. Além disso, em nove anos foi finalista do Emmy por sete vezes16. Modelo que serve de padrão para os demais telejornais da emissora, o JN é o carro-chefe da Globo. Sua primeira edição foi ao ar em 1º de setembro de 1969, sob o comando de Armando Nogueira. O programa foi tido como o primeiro telejornal 13

Berger (1997), em “Do Jornalismo: toda notícia que couber, o leitor apreciar e o anunciante aprovar, a gente publica”, demonstra muito bem a equação que o jornalismo desenvolve para levar para rua a narrativa de acontecimento. Não basta que o acontecimento se enquadre na concepção do que é notícia. Tem, ainda, de estar em sintonia com o – discurso, valores de – seu público e ainda não pode ferir os interesses de seus outros clientes, os anunciantes. Analogicamente, é como se servisse a três senhores: o jornalístico, sustentado pela sua prática; o leitor, sustentado por seu valores; e o anunciado, sustentado nos seus interesses. 14 Reportagem completa disponível em www1.folha.uol.com.br/ilustrada/937535-globo-registra-o-menor-ibopepara-o-mes-de-junho-desde-1970.shtml, acessado em 19/11/2011. 15 Segundo informações do colunista Ricardo Feltrin do Portal F5, da versão On-line do Jornal Folha de São Paulo, disponível em f5.folha.uol.com.br/colunistas/ricardofeltrin/956858-ibope-do-jn-sobe-em-sao-paulojornal-da-record-cai.shtml, acessado em 19/11/2011. 16 Segundo reportagem do próprio telejornal, disponível em g1.globo.com/jornalnacional/noticia/2011/09/jornal-nacional-vence-emmy-por-cobertura-da-ocupacao-do-alemao.html, acessada em 19/11/2011.

42

transmitido em rede nacional do Brasil. Muito em função da tecnologia da época. Era o inicio da era dos satélites que integrariam o mundo. Em 1965 nascia a TV Globo e, no mesmo ano, a Empresa Brasileira de Telecomunicações, a Embratel. Com isso se aliou tecnologia e geração de conteúdo ligando – via satélite – unidades da federação. Só é preciso destacar um detalhe: o JN não foi o primeiro telejornal da Globo. O Tele Globo foi ao ar em 1965, ainda muito parecido com noticiários de rádio. A emissora ainda teve o Ultranotícias – muito parecido com o Repórter Esso, da TV Tupi – também ao velho estilo do apresentador lendo notícias diante das câmeras. Alguma coisa mudou quando em 1967 nascia o Jornal da Globo, extinto em 69 para dar lugar ao JN. É o Jornal Nacional que, mais tarde, consolida-se como líder de audiência e uma referência no telejornalismo brasileiro. (MEMÓRIA GLOBO, 2004, p. 17 – 34) Remonto à discussão sobre os gêneros televisual e telejornalístico para demonstrar que o “cruzamento” dos dois sai o gênero telejornalístico. Algo que reza a cartilha do televisual e também do jornalismo. Pois Bonner (2009) – editor-chefe, ou simplesmente o “chefe”, do JN – encaixa o Jornal Nacional exatamente dentro desse espaço, sintetizando e exemplificando nosso conceito de telejornalístico. O que reforça minha opção pela escolha do programa como objeto de estudo. Nas palavras do editor: O Jornal Nacional é um programa jornalístico de televisão. Por ser jornalístico, apresenta temas comuns aos jornais impressos, aos programas jornalísticos de rádio, aos sites da internet voltados para notícias e, em parte, às revistas semanais de informação. Por ser um programa de televisão, procura apresentar esses temas com uma linguagem apropriada ao veículo: com um texto claro, para ser compreendido ao ser ouvido uma única vez, ilustrado por imagens que despertam o interesse do público por eles – mesmo que não sejam temas de apelo popular imediato. (BONNER, 2009, p. 13).

Além disso, olhar para os movimentos e operações na forma de narrar histórias do cotidiano nesse telejornal se torna interessante pelo fato de que, quando práticas chegam ao JN, são consideradas cristalizadas. Isso é, significa que muitas de suas práticas já percorreram e foram testadas em outros jornais da emissora e até da concorrência. Aliás, digo que o Jornal Nacional tem o objetivo de narrar o cotidiano me baseando em mais uma leitura que faço de Bonner. Pois, como diz, “o Jornal Nacional tem por objetivo mostrar aquilo que de mais importante aconteceu no Brasil e no mundo naquele dia” (BONNER, 2009, p. 17). É sabido que outros telejornais da emissora são espaços mais dados a experimentação. Mexer no JN é como mexer num gigante, em que um simples movimento de braço pode causar grande

43

estardalhaço. Haja vista todo o alarde em torno da saída de Fátima Bernardes e a entrada de Patrícia Poeta na apresentação do programa17. 2.3.2 O Acontecimento Para Rodrigues (1996), “é acontecimento tudo aquilo que irrompe na superfície lisa da história dentre uma multiplicidade aleatória de fatos virtuais” (RODRIGUES, 1996, p. 27). Quéré, citado por Rebelo, buscando definir o acontecimento, inclusive diz que “o passado e o futuro servem para interpretar e para controlar o presente” (QUÉRÉ apud REBELO, 2006, p. 62). Rebelo (2006) também trata da questão e segue com Quéré numa definição ampla do acontecimento como aquilo que “opera numa ruptura inesperada na ordem das coisas” (REBELO, 2006, p. 17). E ele ainda completa o conceito acionando Romano (1999): “Na feliz expressão de Claude Romano, o acontecimento abre uma falha na minha própria aventura” (ROMANO, 1999, apud REBELLO, 2006, p.17). Ou seja, “provoca um corte na trama dos nossos hábitos, das nossas rotinas diárias, dos nossos projetos, das nossas recordações” (REBELLO, 2006, p.17). Porém, apenas a definição de acontecimento não basta, já que tratamos de jornalismo. Por isso, ainda com Rodrigues (1996), fechado mais o conceito, indo mais fundo e recortando apenas o conceito de acontecimento jornalístico. [...] O acontecimento jornalístico é, por conseguinte, um acontecimento de natureza especial, distinguindo-se do número indeterminado dos acontecimentos possíveis em função de uma classificação ou de uma ordem ditada pela lei das probabilidades, sendo inversamente proporcional à probabilidade da ocorrência. Neste sentido, faz parte de um conjunto relativamente restrito que pertence a um universo muito vasto. Todos os fatos regidos por causalidades facilmente determináveis ficam fora de seu alcance, ao passo que o acontecimento jornalístico irrompe sem nexo aparentemente nem causa conhecida e é, por isso notável, digno de ser registrado na memória. (RODRIGUES, 1996, p. 27).

Ou seja, para o autor, não é qualquer acontecimento que tem o mesmo status de acontecimento jornalístico. É nele que presenciamos de forma mais clara esse binômio acontecimento e narrativa, ainda seguindo na lógica de Rebello (2006, p. 15 – 19). Para esse

17

Em dezembro de 2011, a emissora anuncia de forma solene a troca das apresentadoras. A Rede Globo chegou a organizar uma entrevista coletiva e a saída de Fátima teve direito a homenagens como conteúdos do telejornal falando de sua carreira e relação com o programa. Na chegada, Patrícia teve direito a entrevista na bancada antes de assumir o posto. Os detalhes dos bastidores podem ser acessados do portal F5, canal de entretenimento da versão online do Jornal Folha de São Paulo, disponível em f5.folha.uol.com.br/televisao/1015340-fatima-bernardes-faz-reportagem-sobre-ela-mesma-no-jornalnacional.shtml, acessado em fevereiro de 2012.

44

autor, as “narrativas mediatizáveis são as únicas suscetíveis de transportar o acontecimento para lá dos limites da comunidade onde ele emergiu” (REBELLO, 2006, p. 18). Se tomar o acontecimento jornalístico como um acontecimento transposto pela ação dos media, também me aproximo à ideia de Augé (2001) que trata de acontecimento mediático. Para ele, a expressão é atual e reporta a uma espécie de pleonasmo. Destaca que sempre temos essa impressão de que algo está ocorrendo em algum lugar porque estamos informados por ele. E surge a questão: Desde ese momento nos perguntamos (aunque la respuesta sea incierta) qué distancia tomar, qué punto de vista hay que retener, qué oreja hay que tapar para discernir, detrás del estrépito y el estruendo de la actualidad, el ropaje dissimulado y los cuchicheos de la historia en marcha. (AUGÉ, 2001, p. 15).

Realmente a tarefa não é fácil. Saber o que é e o que não é ficção dentro de um acontecimento mediático, nessa narrativa inserida dentro do espaço de um mundo possível. Até porque, como o próprio Augé (2001) já havia suscitado, é difícil entender também quem é o agente que começa, desencadeia o processo. Algo tão complicado quanto separar dentro dessa narrativa o que é ficção – se é que é possível fazer isso.

45

3 UM MAPA PARA FUGIR DA TENSÕES E CHEGAR NA TRILHA DAS RESPOSTAS O mapa é o método. A questão toda passa a ser que mapa seguir. É dele que devo partir para forjar o meu próprio mapa/método que, por sua vez, servirá apenas para buscar as respostas e inquietações desse pesquisador à luz desse problema de pesquisa. Até agora, os movimentos da pesquisa tendem a apontar que o melhor método que dê conta de minhas necessidades é inspirado nas molduras que formam ethicidades, a partir de uma leitura de Kilpp (2010). As ethicidades atualizam-se em diferentes molduras e moldurações, e seus sentidos são negociados (emoldurados) em diferentes instâncias entre emissor e receptor (ou consumidor, ou espectador, tanto faz), que ainda compartilham, de modo desigual e diferenciado – mas minimamente – de certos imaginários que tornam os sentidos comunicáveis. (KILPP, 2010, p. 18).

Concebo esta proposta de ethicidade a partir de subjetividades virtuais que passo a perceber através da atualização que se dá em diversas molduras. Como se a ethicidade se desse a partir da construção de várias molduras. Essas molduras são os recortes e enquadramentos que dou ao meu olhar sobre o objeto. Para entender este princípio é preciso entrar nele numa espécie de decomposição até chegar às molduras. Claro, à minha leitura de que ethicidade se dá a partir da ação de várias molduras. São os eixos das molduras, moldurações e emolduramentos trazidos pela autora. As molduras são entendidas como aqueles quadros ou territórios de significação que, na TV, encontram-se em geral sobrepostas. As moldurações são procedimentos de ordem técnica e estética que realizam certas montagens no interior das molduras. E os emolduramentos são agenciamentos dos sentidos, que são pessoal e culturalmente referenciados. Como as molduras e as moldurações procede-se a uma oferta de sentidos. (KILPP, 2010, p.18).

Ou seja, as molduras são os quadros pelos quais posso destinar meu olhar sobre a TV. Optar pela ideia de ethicidades não significa aplicação dura sobre meus materiais. A partir dessa ideia de Kilpp devo inventar meu método. A proximidade com essa leitura de método se dá por sentir a necessidade de observar o Jornal Nacional através de molduras. Cada uma dessas molduras são como elementos, seções do mapa que, por sua vez, orienta o olhar do pesquisador sobre o objeto. O funcionamento das molduras se dá na espécie de camadas do mapa. É quando enquadro o olhar e observo os movimentos do objeto dentro dessa camada. Por exemplo: quando observo o tipo de imagem usada no Jornal Nacional estou observando

46

esse produto televisual pela moldura das imagens televisivas. Eis uma camada do mapa. Já, quando observo a ação do narrador, olho pela moldura da narrativa inserindo minha observação na mesma camada. O mesmo ocorre quando observo a ação do apresentador e do repórter na narrativa. Ainda posso olhar a inserção, ordem das notícias, dentro do telejornal. Esta aí mais uma moldura e uma camada do mapa. Cada uma dessas camadas do mapa deverá ser constituída a partir de provocações do próprio objeto. Nesse momento, a única luz que guia a observação é o problema da pesquisa. Será necessário observações sistematizadas do corpus para apreender manifestações do Jornal Nacional e só então constituir molduras pelas quais o olhar passará a ser guiado. É assim que encerro a primeira etapa da pesquisa e inicio uma nova, incursionando mais densamente sobre o corpus, o objeto de observação da pesquisa. 3.1 REVISANDO VELHOS CAMINHOS E PREPARANDO A INCURSÃO POR NOVOS Em meu caso específico, o exercício primeiro é pela narrativa – que deve, em algum momento, ser sustentada por um narrador ou, ao menos, pela busca de um. Imagino que entendendo o funcionamento dessa narrativa posso chegar ao narrador – ou narradores – que a fazem ser o que é. Assim, suponho que seja possível observar a lógica da prática jornalística através da materialização de seu produto final. No caso, vale destacar, a narrativa telejornalística do Jornal Nacional. Mas isso é apenas uma moldura possível pela qual se pode observar. Se o lugar de fala de um narrador significa para uma narrativa, as diversas molduras que se sobrepõem ao objeto também são significativas. Ou seja, preciso também olhar através de outros recortes que dão significado ao que de fato é o Jornal Nacional como concebemos hoje. E nisso implica olhar para ele dentro da moldura do fluxo televisivo da programação. Daí o meu desejo de pensar o jornalismo como algo que opera na construção de um mundo. Mundo esse que pode não estar nem todo no mundo real e nem todo num ficcional. Faço, assim, essa proposta de deslocamento tendo no princípio metodológico um mapa para a construção de um novo traçado que deve me guiar com um mundo ainda não desvendado. O mundo de um jornalismo que se permite orbitar tanto entre ficcionalidade permissiva e realidade persuadida. Ou seja, o mundo possível do telejornalismo.

47

4 UM MAPA EM CHEQUE OU UM MÉTODO EM MOVIMENTO Se vou observar movimentos de acontecimentos, preciso observar algumas edições. Opto por seis edições sequenciais por materializarem o desenrolar de uma semana. E escolho em específico a semana da morte de Bin Laden por ter dentro dela a eclosão e o movimento de um grande acontecimento, bem como o aparecimento de outros – habituais, talvez, com matérias de cotidiano - e os deslocamentos que ocorrem à medida que a semana vai acontecendo. Com o empírico na mão e o problema a iluminar, resta agora fazer o método trabalhar como aliado nessa busca por respostas que a pesquisa suscita. Mas como? Bem, a primeira coisa que fica clara é que esse é um trabalho que se baseia na lógica da análise de conteúdo em jornalismo (HERSCOVITZ, 2007)22. E olho para esse conteúdo através do caso específico da narrativa do Jornal Nacional. Para começar a entrar no exemplo e entendê-lo, é preciso observar elementos que chamo de elementos externos e em fluxo. É o primeiro movimento de análise em que será necessário ver como o Jornal Nacional se coloca no fluxo televisivo enquanto programa. Olhar para isso é ver o que esta posto antes e depois dele em fluxo na emissora. Ver qual a relação dele para com outros produtos semelhantes da empresa. Por outra forma, quais as semelhanças e dissonâncias nas suas narrativas de notícias e a de outros telejornais da emissora. Feito isso, é hora de entrar no movimento que chamo de dissecação do caso, fazendo uma espécie de observação em camadas através de grades de entendimento. É hora de buscar através da pesquisa exploratória todos os movimentos possíveis de serem apreendidos pelo pesquisador no objeto empírico. É hora de assistir ao recorte do corpus e deixar que o empírico fale. Apontamentos e mais apontamentos feitos pelo pesquisador são necessários para descrever analiticamente o uso da linguagem telejornalística na constituição da narrativa. De posse dessa descrição – que disseca e destaca elementos desse telejornal – é hora de partir para a análise propriamente dita, a que prefiro chamar de narrativa em movimento. A 22

Segundo Herscovitz (2007), “a análise de conteúdo pode ser empregada em estudos exploratórios” (p.127). Por isso, posso afirmar que a pesquisa nasce da observação empírica, passa pela pesquisa exploratório e depois ainda é submetida a observação sistematiza de forma muito similar a reflexão do autor sobre essa forma de análise. Como pesquisador, também acolho essa lógica assumindo uma postura como de detetive “em busca de pistas que desvendem os significados aparentes e/ou implícitos dos signos [e em especial no meu caso] das narrativas jornalísticas , expondo tendências, interesses, conflitos, ambigüidades ou ideologias presentes nos materiais analisados” (HERSCOVITZ, 2007, p.127). Herscovitz ainda sintetiza a aplicação de seu método aos destacar que “Harold Lasswell (1927) definiu o paradigma operacional da análise de conteúdo”. Paradigma que nasceu focado na propaganda, iluminada pela questão: diz o que, pra quem em que medida e com que efeito? E no jornalismo, Herscovitz traduz o paradigma de Lasswell da seguinte forma: “o que diz a mídia, para quem, em que medida e com que efeito?” (HERSCOVITZ, 2007,p.127)

48

densidade desse movimento é grande e ainda há necessidade de movimentos pequenos que sustentem o maior. O primeiro deles é mapear e catalogar os acontecimentos que são ofertados. Depois, é hora de observar os movimentos da narrativa que dão sentido a esse acontecimento. É quando mais quadros devem ser compostos, já que a narrativa que me refiro – o conceito que constitui até aqui – envolve questões como guinada subjetiva e evidência das marcas do narrador na feitura da história a ser contada. Será necessário fazer um mapa desses movimentos que querem fazer do relato jornalístico mais do que um relato em si e sim uma experiência dividida com o espectador. Aqui faço uma ressalva. Quase falo em mapear, não estou querendo cartografar e sim emoldurar. Por isso, embora reconheça a necessidade de criação de categorias, não as tenho de forma clara ainda. Penso que para fazer o emolduramento através da narrativa será necessário observar o que se dá entre as molduras que sustentam aquele enquanto um quadro narrativo. É ver, por exemplo, como trabalho com a ideia da experiência do narrador e da própria guinada subjetiva trazida por Serelle (2009). Por fim, é dada a hora de mexer com os agenciamentos suscitados no problema. De posse desses mapas de acontecimentos e operações narrativas é hora de analisar o que agenciam quando se movimentam entre essas duas molduras. É ver, por exemplo, como a morte de Bin Laden se dá enquanto narrativa do Jornal Nacional sobre a morte do líder da Al Qaeda. Observando essa constituição de narrativa, suponho que fique evidente o que é destacado na história e, logo, tomado como mais importante. Levando em conta que essa operação se dá em cada uma das notícias veiculadas, poderei mapear e perceber o que de mais importante o JN vê em cada acontecimento e como o narrativiza. Pronto esse cenário, afastome do particular de cada história contada e repito o procedimento tendo como moldura não as notícias e sim o noticiário como um todo. Se tudo der certo nesse plano de voo, chego ao que o JN constitui como mais importante no Brasil e no mundo naquela semana e como atribuiu valor e significado a isso. Ou, se preferir, como o JN apreendeu e narrou uma semana no Brasil e no mundo. 4.1 A PESQUISA EM SUMÁRIO Até agora, a pesquisa se movimentou ainda como constituição de cenários e apresentação do problema proposto. A partir daqui, com base em toda a fundamentação teórica e constituição de cenário inauguro um novo momento da pesquisa. É chegada hora de um mergulho profundo na observação. Para marcar bem essa transição, recapitulo o caminho

49

percorrido e projeto as novas incursões. Sendo assim, agora, concebo a pesquisa nessa organização: a) constituição de cenário: é o momento em que apresento esse cenário propriamente dito. Muito disso já foi feito até aqui – em especial lá nas nossas primeiras páginas. É quando apresento a ideia de que algo está em movimento na forma de contar notícias em televisão. Tensões sobre jornalismo e televisão são postos a fim de mostrar o quanto o telejornalismo contemporâneo traz esse caráter dialógico, levando sempre em conta a experiência de um enunciador e tratando fatos do cotidiano com se tecesse uma grande narrativa de seu mundo; b) descrição do caso: é a hora de falar do Jornal Nacional. Em essência, é também um pouco do que fizemos até aqui. Justificativas e argumentos sobre a escolha do caso e o recorte também cabem nesse momento. Porém, não se limita apenas a isso. É aqui que será apresentada a pesquisa exploratória que norteia as análises. É como se ela fosse o material bruto levantado a partir da observação do empírico. E é bruto mesmo, pois a partir dela que ocorrem os dissecamentos e a separação de material para análise e interpretação. Como até agora apenas falamos nessa exploratória e não a apresentei, permito-me uma pequena mostra das anotações do caderno de campo que trazem as apreensões do pesquisador a respeito do empírico; Descrição da pesquisa exploratória realizada durante a semana em que Osama Bin Laden foi morto. Seis edições do Jornal Nacional, de 2 a 7 de maio de 2011. Na edição de segunda-feira o telejornal apresenta uma configuração completamente diferente. A trilha é alterada, os acordos não estendidos e mostrados de forma completa, ainda há valorização dos acordes orquestrados. Um dia depois da ação do Estados Unidos que matou o Líder da Al Qaeda, Osama Bin Laden, o telejornal se apresenta como um registro histórico. Já na escalada e na abertura quer traz elementos que propõem já uma reconstrução de todos os momentos que levaram até esse acontecimento da morte. Quer ainda projetar como fica o mundo a partir de agora. Ou seja, quer apresentar elementos de passado, presente e futuro para reconstruir e interpretar esse acontecimento da morte de Bin Laden Transcrição da escalada: Bonner: 2 de maior de 2011. Imagens de americanos comemorando nas ruas Fátima: Depois da morte de Bin Laden, o presidente americano Barack Obama afirma que o mundo é um lugar melhor e mais seguro. Imagens de Obama em seu pronunciamento Bonner: Nossos repórteres mostram os detalhes da operação policial contra o líder da Al Qaeda. Imagem do Google Maps localizando a casa onde Bin Laden estava Fátima: De que forma ela influencia a eleição americana do ano que vem? Bonner: As imagens do local onde o terrorista foi atacado. Imagens do quarta e da cama suja de sangue. Fátima: O que dizem os especialistas sobre o futuro da organização que ele criou. Bonner: As reações de chefes de estado em todo o planeta. Fátima: O Brasil manifesta preocupação com represálias em formas de atentados.

50 Imagens do ataque as Torres Gêmeas. Bonner (em off): E se solidariza com as vítimas de 11 de setembro. Fátima: 2 de maio de 2011. Bonner: O Jornal Nacional está começando agora. Vinheta de abertura e trilha completas. Fim da escalada. Começa o telejornal. Depois do boa noite, os apresentadores em plano aberto começam o que pode ser visto como um diálogo. Enquanto ele fala, ela olha para ele mexe a cabeça em sinal de concordância. Eles falam ao telespectador que está do outro lado. É uma interação. Um recurso para colocar o espectador nessa conversa a três. O apresentador faz uma breve descrição destacando que a morte de Bin Laden foi assunto entre líderes de estado do mundo todo, além de políticos e cidadãos comuns. E divide o texto em jogral com a apresentadora. É parte da cabeça para chamar o primeiro VT. Esse de autoria do repórter Luis Fernando Silva Pino, de Washington. Ela chama: a notícia da morte foi dada oficialmente pelo presidente dos Estados Unidos Barack Obama há 20 horas. E os detalhes desse pronunciamento histórico está na reportagem de Luis Fernando Silva Pinto. A matéria abre com imagens de Obama em seu pronunciamento. O objetivo é reconstruir a história de forma cronológica. Toma o pronunciamento como instantes do acontecimento. É a partir dali que o fato se dá por conhecido e começam a se desdobrar todas as conseqüências. Pontos do discurso da destacados, em especial quando são apresentadas as justificativas.O que dá uma quebra nessa reconstrução cronológica dos fatos e o destaque que dá no instante em que a notícia é a dada. Faz um corte, uma ruptura na narrativa. Como se abrisse um parêntese e dissesse vamos ver como nós aqui no Brasil soubemos da notícia. É mais ou menos assim que o texto se desenrola. A notícia foi dada num plantão da TV Globo, depois do Fantástico.... Entra a vinheta tradicional do plantão e uma ilustração dos apresentadores Patrícia Poeta e Zeca Camargo. É um fragmento do boletim do vivo passado por eles. Os dois, ao vivo, demonstram preocupação. Ela dá a hora e diz que se tem a informação da morte e que, em instantes, o presidente dos Estados Unidos vai fazer um pronunciamento oficial. Depois disso, a narrativa reconstrói o que acontece. Sempre a partir da fala de Obama. Traz ainda a chefe de estado Hillary Clinton e líderes da Câmara americana. O objetivo é mostrar que enaltecem Obama e sua ação e depreciam o Talibã e suas posturas. Um dos líderes democratas chegam a selar o dia como marco histórico. O VT segue mostrando Obama uma dia depois da operação cumprindo sua agenda de compromissos, mas sempre referendando e comentando – sem outros detalhes – a ação do dia anterior. O VT ainda destaca que pegar Bin Laden foi promessa de campanha de Obama. As imagens são sempre bem ilustrativas e referendam o texto sem ser repetitivas, num pelo exemplo de construção televisiva que alia imagens e texto. O VT ainda leva o repórter para o Marco Zero, onde estavam as torres e destacando a reação de famílias de vítimas. O repórter volta ao vivo, num stand up, que serve como complemento de uma matéria. Ele não é chamado pelos apresentadores. Entra direto, como se ele mesmo fizesse um pé de sua matéria. No texto desse boletim, destaca que a oposição ao presidente também reconheceu o feito e até elogiou. Destaca que Obama vinha sofrendo críticas e que teve até mesmo sua nacionalidade questionada. No texto, ainda pondera que não há eleição ganha, mas que não há como não se ver Obama como um dos favoritos. Os apresentadores encerram a participação com o que chamo de costura do ao vivo. Algo bem tradicional. Conversa com o repórter, agradece e, ainda, quando volta para eles, o apresentador diz: esse o repórter Luis Fernando Silva Pinto ao vivo de Washington. Isso é recorrente em muitas participações de repórteres ao vivo. (SANTOS, 2011).23

23

Os erros de digitação são mantidos propositalmente pelo autor. São pistas que revelam o instante da observação.

51

c) catalogação e interpretação de dados: é o movimento de que falo mais detalhadamente ao longo de todo o capítulo 6 desse texto. É o momento de brincar com as molduras constituídas a partir das visadas teóricas. Elas que darão suporte para que eu possa interpretar os fenômenos descritos na pesquisa exploratória, relacionando-os com todo esse arcabouço teórico e o empírico nos pontos em que se tocam, são mexidos e estimulados mutuamente; d) considerações finais: como não poderia ser diferente, esse último movimento deve funcionar quase que como um relatório final da pesquisa. Ou, como prefiro encarar, a narrativa de um passeio por um bosque chamado pesquisa. Não sei ainda ao certo, mas imagino que só nesse momento terei o mapa de todo esse passeio pronto. Mapa, que por sinal, servirá apenas para um passeio no mesmo bosque, à luz dos mesmos problemas – é preciso sempre ter isso muito claro. É nesse último movimento que pretendo constituir também, claramente, a resposta – ou o mais próximo que possa chegar dela – ao problema que norteia a pesquisa. Se não conseguir responder que narrativa é essa do JN sobre o que de mais importante aconteceu no Brasil e no mundo? Espero chegar ao menos a compreensão mais clara do que compreende todo o processo de acolhimento de um acontecimento sob o guarda-chuva da lógica de operação do telejornalismo, enquanto agenciador de sentidos sob a lógica dos gêneros telejornalísticos e televisuais.

Depois de um longo e exaustivo caminho até aqui, trouxe você leitor a um ponto cego dentro da mata. A partir daqui, tudo é desconhecido. Precisamos construir e projetar mapas com base em tudo que vimos – e caminhos que ensaiamos e projetamos – até agora para ver o que há nesse emaranhado de galhos e mato. É a partir de agora que passo a relatar os procedimentos e descobertas feitas ao longo desse último ano e quem dizem respeito aos itens b, c e d desse sumário de pesquisa.

52

5 PROCEDIMENTOS METODOLÓGICOS Entremos, então, em contato com o objeto empírico seguindo os procedimentos metodológicos e análise propostos para a pesquisa. 5.1 O PROGRAMA CHAMADO JORNAL NACIONAL NA GRADE DA TV GLOBO O Jornal Nacional é o carro-chefe do jornalismo da TV Globo. O programa vai ao ar de segunda a sábado, atualmente às 20h30min. O horário em que vai ao ar tem sofrido algumas variações nos últimos anos, em especial em períodos eleitorais – em função da propaganda eleitoral gratuita – ou mesmo por ajustes na grade da emissora. O certo é que, ao longo de anos, não tem começado antes das 20 horas ou depois das 20h30min. Observando a grade de programação da Globo1, a partir de inferência minha, percebo o JN como um marco no início da programação adulta. Ele vem precedido de duas telenovelas, com classificação etária baixa. Em geral com conteúdo livre ou, no máximo, não recomendado para menores de dez anos2. Entre as telenovelas há ainda telejornais locais, de afiliadas da Rede Globo. Esses têm um tempo liquido de produção que varia entre 15 e 20 minutos3. O Jornal Nacional trata os assuntos do dia com mais densidade e profundidade que os telejornais locais, como, por exemplo, o RBS Notícias da RBS TV no Rio Grande do Sul e o RJ TV Segunda Edição da Globo Rio. O que fica evidente na observação é que o fator tempo é decisivo para isso, já que o JN conta com mais espaço dentro da grade de programação. Em geral, são 45 minutos de tempo bruto. Algo que circula em torno de 30 minutos de produção líquida, descontando os intervalos comerciais. A partir do JN, por volta das 21 horas, inicia-se a programação reservada para maiores de 14 anos. O próprio telejornal começa numa faixa horária que tem classificação para maiores de 12 anos. A telenovela que sucede o telejornal é também a de maior destaque na grade de programação, com um público-alvo mais adulto, como fica claro pela classificação do Ministério da Justiça. Depois, a programação varia de acordo com o dia da semana entre seriados nacionais, programas de entrevistas e bate-papo, humor, filmes e transmissões de jogos de futebol. A Rede Globo tem, ainda, três telejornais muito parecidos com o JN, transmitidos em rede e pautando-se em notícias “do Brasil e do mundo”. O Bom Dia Brasil, que vai ao ar por 1

Disponível em http://redeglobo.globo.com/programacao Segundo critério classificatório do Ministério da Justiça. 3 Dados constatados a partir da observação do pesquisador. 2

53

volta das 7h30min, é destinado a tratar das primeiras notícias do dia com destaque e também repercutir o que de mais importante aconteceu na madrugada. No meio do dia, por volta da 13h30min, entra no ar o Jornal Hoje. A pauta é voltada para o noticiário da manhã, projeção da tarde e muito serviço e utilidades domésticas. Já no início da madrugada, por volta de meia-noite, o Jornal da Globo repassa rapidamente os fatos do dia, com ênfase na economia, política, cultura, novidades tecnológicas, entre outros4. Completando ainda sua grade de jornalismo, a TV Globo conta com jornais locais em três edições – no fim da tarde, por volta de meio-dia e no início da manhã, ainda antes do Bom Dia Brasil – e mais duas edições de um informativo com perfil distinto dos telejornais. É o Globo Notícia, classificado pela emissora como Boletim Jornalístico. Com tempo muito curto, no máximo cinco minutos, resume o que há de factual naquele período. Vai ao ar no meio da manhã, entre 9h30min e 10h, e entre o meio e o final da tarde, entre 17h30 e 18 horas. Além disso, há programas jornalísticos semanais. Porém, abro mão de citá-los e observá-los por não serem telejornais diários ou, ainda, por apresentarem uma segmentação muito restritiva, como AutoEsporte e Globo Rural. 5.2 O JORNAL NACIONAL E SEUS ESPAÇOS Tomando a observação sistemática do corpus de pesquisa, verifico que o telejornal tem sempre entre três e cinco blocos em cada edição. O primeiro é regularmente o maior, tem entre 10 e 13 minutos. O tempo de cada bloco vai diminuindo e o último chega a ter entre dois e quatro minutos. Na tabela 1, que funciona como uma das grades de entendimento, são apresentados os tempos – em minutos – em cada um dos blocos, em cada um dos dias da semana, bem como o tempo total de cada edição. O objetivo não é trazer aqui dados quantitativos tabulados de forma fria. Ao longo de todo o trabalho de observação durante a pesquisa – inclusive de outras edições, vistas de forma desordenada e aleatória – percebi que o exercício se faz necessário porque o tempo do telejornal influencia diretamente no seu texto. Ou seja, em dias de edições menores, o texto é curto e o mais resumido possível, abarcando apenas os acontecimentos – factuais – do dia. Do mesmo modo que em edições maiores há textos mais trabalhados e assuntos que vão além dos acontecimentos do dia5. 4

Observações constituídas a partir da rápida análise feita pelo pesquisador nos telejornais, observando-os ao longo de uma semana e também consultando o site de cada um deles, disponíveis através do portal http://redeglobo.globo.com. 5 Rezende (2000) já adota exercício semelhante em sua pesquisa “Telejornalismo no Brasil – um perfil editorial”. Assim como o autor, entendo que uma das estratégias para melhor perceber e descobrir movimentos dentro de um telejornal é: 1) observação sistematizada dos materiais. 2) catalogação a partir da observação sistematizada.

54

Dia

Tabela 1 – Tempos de blocos do Jornal Nacional na semana analisada B1 B2 B3 B4 B5 Total

Segunda

13’15”

8’

9’38”

4’22”

3’11”

38’43”

Terça

11’44”

7’39”

5’59”

6’44”

2’35”

35’08”

Quarta

9’24”

4’49”

3’52”

-

-

18’08”

Quinta

11’19”

11’51”

5’08”

4’22”

-

33’06”

Sexta

11’50”

9’29”

5’12”

6’35”

-

33’01”

Sábado

10’57

6’32”

5’39”

3’11”

4’08

30’45”

Fonte: Elaborada pelo autor

Numa rápida observação nas semanas que sucederam o recorte de pesquisa, percebo basicamente a mesma operação. Nas segundas, terças e sábados há mais blocos. Embora, muitas vezes, a edição de quinta possa ter um tempo total maior do que a de sábado, mesmo com um bloco a menos. O certo é que a edição de quarta é sempre a menor em tempo e em número de blocos. Observando a grade de programação, é possível fazer uma inferência. É o dia em que há transmissão de jogos de futebol. Numa rápida incursão pela grade semanal da emissora6, constata-se que a telenovela que vem depois do Jornal Nacional também tem seu tempo total reduzido. Ela tem entre 15 e 20 minutos menos – considerando a hora que consta, na grade, seu início e a hora que consta o início do programa que vem na sequência, sem excluir o tempo das janelas comerciais – se comparado com os outros dias. Isso porque os jogos tem de iniciar muito próximo das 22 horas, conforme acordos de transmissões assinados entre emissoras e entidades que organizam as competições. Ainda na semana que tomo como objeto de análise, percebo que a edição de segunda é significativamente maior do que as demais. Levando em consideração que essa é a primeira edição do JN que vai tratar da morte de Osama Bin Laden, que muda sua trilha de abertura, deixando-a com ar solene e considerando até mesmo a densidade das reportagens e a ampla abordagem de um só tema é fácil supor que isso se dá por ser esta uma das situações em que o telejornal assume sua importância histórica, descolando muito claramente aquela das demais edições. Bonner (2009) não esconde que o telejornal está preocupado com as chamadas Para a catalogação, acolho, ainda, duas estratégias de Rezende: a transcrição de textos do telejornal e a constituição de tabelas que auxiliam na visualização de incidência e na constituição de cenários. 6 Disponível em http://redeglobo.globo.com/programacao.html

55

grandes notícias, aquelas que tomam conta do noticiário, não só pela relevância e impacto que podem ter, mas também pelo papel documental que o Jornal Nacional pode ter ao cristalizar narrativas sobre esses acontecimentos. Fatos dessa magnitude não apenas tem lugar assegurado no noticiário – mas também ocupam muito mais tempo que os demais numa edição. Porque a relevância absoluta deles esmaga notícias que, até então, tinham peso suficiente para garantir presença no espelho. Na seleção de assuntos, é preciso considerá-los, todos, sob uma perspectiva histórica, e se perguntar: daqui a 50 anos, o que é que um telespectador buscará na edição do JN que estaremos exibindo hoje? A resposta poderá derrubar notícias de grande abrangência ou gravidade, mas de relevância histórica menor, num dia como o da eleição do primeiro presidente negro dos Estados Unidos. (BONNER, 2009, p. 99)

No primeiro bloco, na abertura do telejornal, é sempre posta a grande notícia da edição. É o factual mais forte ou mesmo a reportagem da atualidade de maior impacto. No sábado, 7 de maio de 2011, por exemplo, depois de dias de notícias sem destaque, a morte de Bin Laden voltou a abrir o JN. Imagens do líder da Al Qaeda assistindo a ele mesmo em noticiários de TV foram divulgadas. Esta foi a história mais quente – no jargão jornalístico – e por isso foi conferida a ela esse lugar. Na sexta, dia 6, uma reportagem sobre o aumento da inflação toma esse lugar. Nesse mesmo dia, índices que comprovam isso foram divulgados e o ministro da Fazenda, Guido Mantega, fez um pronunciamento conciliatório em que deixou claro que, para o Governo Federal, tudo permanece sob controle. Na quinta, dia 5, a notícia sobre o resgate do corpo de um dos ocupantes do voo da Air France que caiu no mar em junho de 2009, com 228 pessoas a bordo e que fazia a rota Rio de Janeiro – Paris, ocupou esse espaço. Depois, em cada bloco, a lógica é ter ao menos uma reportagem de destaque. É sempre ela que abre o bloco e organiza as demais notícias que orbitam em torno dela. Na quarta, dia 4, o bloco dois, por exemplo, abre com reportagens sobre alagamentos em estados do norte do Brasil, passa pela previsão do tempo e encerra com uma nota coberta sobre a reconciliação de facções palestinas que viviam em conflito no Egito. As notícias ou reportagens mais leves vão ficando para o final da edição, junto com as notícias do mundo esportivo. No sábado, a última notícia trata do fim de semana de decisão em campeonatos regionais de futebol, os estaduais. Na sexta, uma reportagem que homenageia o ex-jogador Pelé, para marcar alguns exemplos. Essas reportagens que encerram o JN diariamente fazem parte do que chamo efeito boa noite, a partir de uma leitura de Souza (1984). É a preocupação de encerrar o telejornal com notícias mais leves, surgida ainda na

56

época da criação do programa, como lembra Souza ao reconstituir as falas do criador do JN, Armando Nogueira. O autor explica que Nogueira tinha uma preocupação em diferenciar, o máximo possível, o telejornalismo da Globo do modelo criado e consagrado pelo então famoso Repórter Esso. Quando ainda trabalhava em telejornais anteriores ao JN, Nogueira quis fugir da rotina de dar, no encerramento, a notícia mais forte do dia. Assim, trouxe para esse espaço as notícias mais leves, deixando as pesadas para o início da edição. 5.3 O MAPA ANALÍTICO O mapa analítico é a base para orientação, catalogação e dissecação de elementos manifestados pelo objeto de pesquisa nessa lógica de grades de entendimento. Cada elemento do mapa foi desvelado a partir da observação de manifestações nas ordens de forma e conteúdo do próprio objeto. É operando com essas duas instâncias que busco direcionar o olhar. Cada uma dessas categorias e níveis foram concebidos a partir da observação de certa incidência no caso. A mim, essas operações ficaram claras a partir da pesquisa exploratória e outras duas observações sistemáticas dos movimentos no empírico. Na primeira observação, ainda como exploratória me dediquei a assistir todo o corpus recortado em três dias, anotando de forma despretensiosa o que chamava a atenção. Nas outras duas observações, o tempo foi estendido para quatro dias. Isso porque parava, avançava e retrocedia em movimentos que me incitavam uma reflexão. A primeira observação foi em meados de julho de 2011. As outras duas ocorreram em maio e, depois, em julho de 2012. Os registros ainda exploratórios foram feitos num arquivo de editor de texto. Já nas outras observações, percebi que era mais confortável usar um caderno de anotações. Isso permitiu que tivesse a atenção focada nos movimento da tela, ainda que parasse a reprodução a cada instante para reflexões e anotações mais longas. Nesse caderno, segui destacando e até transcrevendo elementos que vão desde enquadramentos e movimentos de câmeras a textos dos repórteres. Em nenhum dos dois casos, a semana do JN foi assistida sem interrupções, de uma só vez. Depois, transcrevi as observações feitas a punho para o editor de texto. Exercício que incitou novas observações, à medida que mexia com a memória ao percorrer meus apontamentos. Ainda na concepção do mapa, usei o que chamo de materiais acessórios, como o site da TV Globo e publicações sobre o JN. São esses materiais que me auxiliam na compreensão do que é o telejornal. Depois, guiado pelo mapa, volto para o empírico, em mais uma

57

observação de cada movimento dentro do corpus, na busca pela resposta ao problema da pesquisa. Observação essa que ocorreu de 15 de outubro a 26 de novembro de 2012. Os elementos do mapa foram importantes para desvelar incidências de operações que apresentavam significância pela repetição e ou manifestavam estranheza ao gênero telejornalístico clássico. No entanto, é preciso destacar que a análise com base no mapa e através das categorias contidas nele já constitui um terceiro momento de entrada no objeto – o primeiro foi a pesquisa exploratória e o segundo as observações sistematizadas. Assim, apresento o mapa e a lógica de cada um de seus elementos e categorias, bem como a observação desses elementos em movimento no objeto. 5.3.1 Formatos O primeiro nível do mapa visa identificar formatos da notícia em telejornalismo. Ou seja, num telejornal, a notícia é apresentada na forma de “reportagem”, “nota pelada”, “nota coberta” ou intervenção ao vivo de repórter, o chamado simplesmente “vivo”, e a entrevista7. É dessa forma que a maioria dos manuais de telejornalismo organizam as notícias a partir de seus formatos. Alguns divergem na nomenclatura, mas, se parearmos os conceitos, é possível inferir que falam basicamente sobre os mesmos gêneros. Observando os telejornais e também o que tenho visto circular dentro da redação da RBS TV e TV COM, constato que até hoje se segue mais ou menos a mesma linha. O que me faz aceitar o detalhamento que Maciel (1995) faz e, a partir daí, fazer meu acréscimo nos conceitos com base na observação da prática8 e do próprio objeto de pesquisa. Para Maciel (1995), “os jornalistas que trabalham em televisão lidam no dia a dia da redação, basicamente com quatro formas de apresentação da notícia: a nota ao vivo, a nota coberta, o boletim ou stand-up, gravado ou ao vivo, a reportagem” (p.48). O que conceitua como nota ao vivo, é o que chamo de “nota pelada”9. Como Maciel (1995), entendo que é a forma mais simples de apresentação da notícia em TV. Nela, o apresentador permanece em quadro enquanto lê o texto do editor, sem utilização de imagens. Minha divergência com o 7

A entrevista é levada em consideração tanto pela descrição como elemento de notícia em telejornalismo como também por ser citada por Bonner (2009) como algo presente no Jornal Nacional. No entanto, não há densidade de análise dessa manifestação já que no recorte do corpus ela não aparece. Sendo assim, é tomada como inferência na construção de uma lógica própria do JN por um viés muito mais conceitual do que empírico. 8 Ainda inserido nesse ambiente de redação, faço frequentemente esse exercício – embora que de forma empírica e não-sistematizada – de parear os conceitos com o que usualmente se faz e se diz sobre o que se faz dentro do ambiente de redação. Isso envolve, por exemplo, como vejo funcionando dentro da redação as formas – e conceitos sobre elas – de apresentação de notícias em telejornais. 9 Pelada por que nela não há imagens – “pelada” de imagens. No jargão, ouve-se a expressão e por isso preferi acolher aqui.

58

Maciel (1995) é quando sentencia que “essa forma de apresentação de notícia não tem menos importância que as outras” (p.49). E ele defende a posição ao afirmar que esse tipo de nota é usado em três momentos: “para suprir a falta de imagens da notícia; para dar mais ritmo ao telejornal, já que a nota ao vivo é sempre mais curta que a reportagem; nos casos em que há imagens, mas que por um motivo ou outro não chegaram ainda até a emissora” (MACIEL, 1995, p.49). Observando o empírico, constato que o uso dessa nota se dá em outras circunstâncias. Além disso, em TV, o espaço de uma notícia é medida em tempo. Sendo assim, a notícia mais importante tem mais espaço e, logo, tempo maior no telejornal. A nota pelada, ou ao vivo, só terá uma maior importância quando algo acontecer e logo em seguida se veicular a notícia, num espírito de “algo de última hora”. Que é mais ou menos que se enquadra no argumento de Maciel ao considerar que é possível haver imagens, mas que por qualquer motivo não se tem as imagens no instante em que se precisa veicular. Assistindo informalmente a telejornais e mesmo observando sistematicamente o objeto de pesquisa, observo as manifestações de nota pelada quando algo é menor dentro do menu de notícias do telejornal e é de fato algo que aconteceu já com o jornal no ar e que, pela relevância do valor-notícia, deve ser veiculado antes de se ter imagens na mão. Já sobre a “nota coberta”, segundo Maciel (1995) É a forma mais simples de apresentação de notícia com imagem em televisão. A nota coberta, normalmente, é formada por duas partes, uma em harmonia com a outra e um texto com sequência lógica, mas também dividido em duas partes: cabeça – texto que corresponde ao lead do jornal impresso, e que é lido pelo apresentador em quadro; off – a narração do apresentador ou do repórter feita enquanto as imagens da notícia são exibidas na tela. (MACIEL, 1995, p.52)

E, no empírico, vejo esse conceito se manifestar exatamente dessa forma. O boletim de stand-up10 de Maciel é denominado em redações como vivo, ou participação ao vivo do repórter. Ele reconhece essa forma como “a notícia de televisão completa, apresentada e sustentada pelo repórter” (Maciel, 1995, p.56). Isso porque quem lê a notícia é o repórter. O apresentador lê uma chamada e entra o repórter fazendo toda a narrativa desse acontecimento jornalístico. O repórter permanece em quadro. Pode haver movimentos de câmera, ilustrações com imagens e mesmo a inserção de sonoras11, mas o quadro final é sempre no repórter. Maciel explica que essa entrada do repórter pode se dar de 10

11

“O boletim de stand-up tem esse nome, herdado do inglês, porque o repórter fica em pé durante toda a narrativa” (MACIEL, 1995, p.57). Sonora é um trecho muito curto de uma entrevista usado apenas para ilustrar e sustentar uma informação que está sendo passada.

59

forma gravada ou mesmo ao vivo. Maciel (2005) reconhece que “a entrada ao vivo valoriza o telejornal por apresentar uma notícia no momento em que ela está ocorrendo” (p.57). Por isso, essa forma de apresentação de notícia acaba sendo mais utilizada quando se quer esse efeito. A forma gravada acaba, muitas vezes, dando espaço para nota coberta. Talvez, seja por isso que o boletim de stand-up acabou apelidado de boletim ao vivo, e depois só vivo, e assim, na prática, atualizando um conceito. A reportagem é entendida com a forma mais completa e complexa de notícia (GENRO FILHO, 1987; LAGE, 2006; 2008; MEDINA, 2003). E em TV, ocorre o mesmo (BARBEIRO; LIMA, 2002; MACIEL, 1995). No entanto, uma reportagem engendra muitos elementos. “Tem texto, imagens, presença do apresentador, do repórter e de entrevistados” (MACIEL, 1995). Para conceituar uma reportagem no corpo de um telejornal, acolho o conceito de Maciel, que diz que “em geral mais longa, a reportagem incorpora todas as outras formas de apresentação da notícia em suas cinco partes básicas: cabeça, off, boletim, sonora e pé” (MACIEL, 1995, p.60). Mais adiante, voltarei a falar densamente sobre a reportagem. O importante, agora, é que fique claro que adoto esse conceito como o de reportagem por constatar no objeto empírico e na observação despretensiosa de outros telejornais esta formulação de Maciel sobre a reportagem viva e em movimento tal qual ele descreve. Durante pesquisa exploratória, em julho de 2011, observei que no Jornal Nacional há, ainda, certas derivações desses formatos que não cabem nesses conceitos. A nota pelada, por exemplo, pode contar com o apoio de gráficos e ilustrações. Foi observando essa manifestação que julguei necessário criar a forma “nota pelada ilustrada”. Entendo que o descolamento da forma tradicional se faz necessário porque a definição de Maciel (1995) – mesmo adaptada por mim – de texto lido pelo apresentador sem imagens ilustrativas não dá conta dessa manifestação. Embora seja uma notícia lida pelo apresentador – e o mesmo seja mantido em quadro – há inserção de recursos gráficos que apoiam e ilustram o texto. Cria-se uma espécie de entremeio ente a “nota pelada” e a “nota coberta”.

60

Figura 5 - frame de exemplo de nota pelada ilustrada

Fonte: Preço...2011 Operação similar se dá com uma manifestação que, pelo conceito clássico em telejornalismo de Maciel (1995), situa-se entre a “nota coberta” e a “reportagem”. É quando o apresentador inicia a leitura de uma notícia com ilustração de imagens, mas há uma quebra nessa “nota coberta” com a inserção de uma sonora. Assim, como no caso anterior, é necessária a criação de outra tipologia, complexificando a apresentada por Maciel: a “nota coberta estendida”.

Figura 6 - sequência de nota coberta estendida

Fonte: No Penúltimo...2011 Há, ainda, outra manifestação em que é necessária criação de categoria específica. É a “chamada institucional”. Ela se dá quando uma chamada de outros programas jornalísticos – em geral, não telejornais – da grade da TV Globo estão inseridas dentro do conteúdo editorial do JN. São as chamadas de programas como Profissão Repórter, Globo Mar, Globo Repórter e Fantástico, por exemplo. As chamadas se dão na forma de notas cobertas estendidas, notas cobertas ou vivo. Porém, é necessário seu descolamento desses formatos por entendê-los como conteúdo autorreferente – e até publicitário – da emissora. É possível que se possa pensar que, se o JN traz o que de mais importante aconteceu no Brasil e no Mundo, o referido programa na chamada é tido algo importante naquele dia. Porém, para analisar tal

61

manifestação teria de me ater com mais vagar a movimentos autoenunciativos da emissora. Levando em conta, até mesmo, as inserções em outros espaços. Como o objetivo aqui é observar a narrativa JN sobre o que destaca como mais importante jornalisticamente no dia, opto com separar essas peças como algo publicitário-institucional. É bem verdade que tal manifestação dá margem a várias análises tanto de caráter publicitário como jornalístico, levando em conta a fronteira entre editorial e publicitário. Assim como o caráter institucionalizado e autorreferente da TV Globo. No entanto, são reflexões que fogem – e até dispersam – do problema de pesquisa aqui proposto. Sendo assim, opto por apenas catalogar essas manifestações como marcação no corpus de algo a que não deverei me deter analiticamente na presente pesquisa. É uma operação semelhante a que faço com as peças publicitárias inseridas no espaço comercial entre os blocos do JN. Sei que existem, posso referi-las, mas não serão objeto de análise. Assim, observando toda a semana do Jornal Nacional, percebi a grande ocorrência de reportagens. É delas a maior parte do telejornal. Em 61 ocorrências ao longo de seis edições, chega a marca de 60.803 minutos de reportagens. Ou seja, são quase 17 horas. A segunda maior ocorrência chega a 14 minutos. São 10 ocorrências de vivos. A terceira marca fica com a nota coberta. São oito minutos e 40 segundos e 19 ocorrências de nota coberta. Depois, vem a nota pelada ilustrada com dez ocorrências – seis minutos – , as chamadas institucionais – que são descartadas do objeto de análise – com quatro minutos e 32 segundos somando as cinco ocorrências na semana, três minutos de nota coberta estendida – três ocorrências – , finalizando com dois minutos e 40 segundos divididos em sete ocorrências de nota pelada. O tempo das reportagens do JN varia entre um minuto até quase cinco minutos12. Os vivos tem tempo variado entre 45 segundos até um minuto e 40, mas ficam sempre na faixa de um minuto, um minuto e 20 segundos. Já as notas coberta nunca chegam a um minuto. A maior tem 48 segundo, mas o tempo médio é de 30 segundos. Situação similar se dá com a nota pelada ilustrada, sempre abaixo de um minuto. Porém, como tem a inserção de mais elementos do que a nota coberta, tem um tempo médio pouco maior, por volta de 40 segundos – chegando a casos de 54 segundos. A nota coberta estendida chega a atingir um minuto, tendo o tempo médio na marca dos 50 segundos. A maior nota pelada tem 32 segundos e, no geral, oscila em 20 segundos.

12

Destaca-se que para mensurar o tempo de uma reportagem são levados em consideração os três elementos da reportagem: a cabeça ou manchete, a reportagem propriamente dita e a nota pé, quando ocorre.

62

Tão importante quanto mensurar cada um dos formatos em minutos13 é observar o número de ocorrências. Em dias de edição menor, por exemplo, as reportagens perdem espaço para notas rápidas – coberta, peladas, estendidas ou ilustradas. São indicativos que apontam para uma estratégia de levar ao ar um número maior de notícias em menos tempo. Para obter os dados e compor o mapa, foi necessário cronometrar cada uma das ocorrências de cada um dos formatos. Depois, tabelando cada uma das informações nas grades de entendimento para chegar a números totais por formatos a cada edição e ao longo da semana. O uso de tabelas na pesquisa também foi adotado para visualizar maiores e menores ocorrências, bem como tempo médio de cada uma delas. A reportagem é espaço nobre do telejornalismo – assim como no jornalismo de um modo geral. Assim, é natural que o assunto de maior destaque no dia seja apresentado através de reportagens. Na segunda-feira, a de maior destaque é o anúncio da morte da Bin Laden. Ela tem quatro minutos e 18 segundo. É um tempo considerável para reportagens se levarmos em conta que a maioria delas na amostra de análise varia entre um minuto e meio e dois. As reportagens de maior densidade na semana variam entre três e quatro minutos e pouco. Já as que são anunciadas como especiais – aquela em que o apresentador anuncia como especial ou são colocadas em locais nobre do JN, com chamadas que a valorizam ao longo da edição – ultrapassam a barreira dos quatro minutos. Observa-se que essa notícia da morte de Bin Laden é a de maior repercussão na semana – chega a haver atualização diária desse acontecimento. Porém, não é a que tem mais tempo ao longo das seis edições. Ela é superada por uma reportagem da edição de quintafeira, que chega a quatro minutos e 54 segundos. Em mais uma edição do projeto JN no Ar, a repórter Lília Teles vai até cidades de Pernambuco que sofrem com alagamentos. Seu passeio tem por objetivo mostrar o drama das famílias que vivem naquela região. A notícia de que o estado vinha sofrendo com fortes chuvas já havia sido veiculada na edição anterior. Na dessa quinta-feira, além da atualização das informações, a narrativa dramática das histórias das vítimas atualiza o acontecimento. Essa reportagem ainda tem outra curiosidade: o apresentador faz a chamada e a repórter entra ao vivo. É como se estivesse complementando a cabeça lida pelo apresentador e introduzindo sua própria matéria. Nesse um minuto e um segundo de stand-up ao vivo, a repórter narra o que sentiu e viveu em meio a experiência de 13

A unidade de referência de tempo em telejornalismo é sempre em minutos. Quanto se tem algo inferior a um minuto, usa-se a unidade de segundos para evitar frações de minutos inferiores a um. O pesquisador observa essa regra impressa no discurso das práticas de redação tanto pela usa dessa norma dentro da redação da RBS TV, como em manuais de redação em telejornalismo. Não é regra escrita ou determinada, apenas consolidada pela prática usual.

63

ter passado por locais alagados e conversado com pessoas que vivem o drama de enfrentar as cheias. Mais adiante, voltaremos a essa inferência. No entanto, sinalizo, ainda numa comparação com a primeira reportagem do JN na semana que trata da morte de Bin Laden. Essa que fala das cheias tem como elementos da narrativa a vivência do contato com um acontecimento e expõe isso no texto – e imagens – da reportagem. Já na sobre a morte, a experiência do contato com o acontecimento se dilui. Ainda comparando acontecimento e o tempo das reportagens sobre ele, destaco os quatro minutos e 42 segundos da reportagem – é uma das maiores da amostra – que fala que a ação dos Estados Unidos em território paquistanês que terminou com a morte de Bin Laden não foi a primeira do governo norteamericano em terras estrangeiras. No ar na terça-feira, como uma narrativa histórica, recupera outras ações dos Estados Unidos. Em contraponto, destaco que a menor reportagem da semana tem um minuto e oito segundos. Ela vai ao ar na terça-feira e apresenta pela primeira vez na semana os problemas causados pelas cheias em Pernambuco. Os exemplos expostos são indicativos, ainda preliminares, de que o JN valoriza as narrativas muito particulares de acontecimentos. As que apenas contam o que aconteceu tem tempo menor das que o JN faz movimentos – analíticos ou meramente interpretativos – para compor uma narrativa. Isso se dá nas notícias em desdobramentos quando os próprios desdobramentos originam reportagens maiores do que as que contam o acontecimento inicial. Ao fim do mapeamento, constatei a pouca incidência da nota pelada ilustrada – dez ocorrências. O que levou a questionamentos sobre a necessidade da adoção dessa variação de nota pelada. Porém, observando atentamente cada uma delas, percebe-se a necessidade de apoio e ilustrações. O exemplo mais claro são os indicadores do mercado financeiro, que tem cerca de 20 segundos. Apenas ler os números causaria confusão, além de não responder ao quesito tão particular do telejornalismo que é o de mostrar imagens que apoiem ou sustentem a compreensão do texto. Em outro exemplo, o apresentador lê nota sobre pesquisa que aponta diminuição na relação entre ricos e pobres. Os dados, números da pesquisa, são apresentados na ilustração que divide espaço na tela com o apresentador e, ao mesmo tempo, sustenta sua informação. A previsão do tempo é outro exemplo. Tendo e média cerca de 50 segundos, a apresentadora do quadro conta com o apoio dos mapas para mostrar as variações do clima. Numa leitura em on, fica caracteriza uma nota, que não é coberta porque a apresentadora segue sempre em quadro, mas há apoio de imagens e ilustrações. Sendo assim, apesar de menos incidentes, identifico na amostra particularidades que justificam a adoção dessa variação – formato – de nota pelada.

64

Percebo situação similar na nota coberta estendida. Para melhor compreendê-la, fixo em mais um exemplo. Um vereador de cidade do interior de Goiás presta homenagem a Bin Laden durante sessão oficial do Legislativo14. A nota tem um minuto, traz a reprodução em áudio da fala do vereador e depois uma sonora sua com a justificativa da sua proposta. Não é possível considerar essa uma manifestação da forma reportagem. Não há presença do repórter, o apresentador conduz toda narrativa com apoio de imagens. No entanto, diferente da nota coberta há ainda a incidência de dois elementos que são mais do que imagens que sustam o texto – a reprodução do áudio e a sonora. São o próprio texto – ou ao menos parte dele – interferindo diretamente na narrativa já que o apresentador não fala na homenagem. De certa forma ele a mostra, bem como a justificativa do vereador. Mais adiante também destacarei com mais vagar a questão da temporalidade das narrativas. Ainda assim, aqui, julgo necessário destacar a variação de tempo dos vivos. Normalmente usados para veiculação de notícias que ainda estão em desdobramento – na segunda-feira, repórter entra ao vivo de Washington num vivo de 45 segundo apara atualizar a situação de momento e a movimentação na Casa Branca – chegam a ter quase um minuto e meio. O repórter Marcus Losekan, por exemplo, faz um vivo de um minuto e 24 segundos, no dia 3, terça-feira, quando chega até a casa de Bin Laden. Vindo de uma reportagem gravada do mesmo repórter, o apresentador o chama para uma espécie de atualização interativa. Embora não tenha nenhuma informação de última hora para atualizar, o repórter o faz valorizando seu relato pessoal, quase que como bastidor. Funciona ainda como algo que não chega a ser um pé da matéria anterior e nem a chamada da próxima, já que entra na sequencia reportagem do mesmo repórter. É a ligação entre as reportagens que vai além de notas dos apresentadores e valoriza a vivência do repórter. É quase como se o repórter fosse entrevistado. No sábado, repórter entra ao vivo de shopping center para falar das compras do dia das mães. Mas do que dar a situação do momento e atualizada do corre-corre para as compras de última hora, ele insere a sua vivência na narrativa da notícia, até mesmo com perguntas do apresentador que mais soam como entrevista ao próprio repórter15.

14

Nota coberta estendida foi ao ar no dia 04/05/2011, quarta-feira, um dos dias de tempo menor de telejornal. Ainda antes de encerrar a unidade, é preciso que deixe claro: as edições do JN constituem um verdadeiro mosaico de matérias, em termo de formas como as notícias são apresentadas. Aqui, não estou analisando como se formaliza esse mosaico e as implicações que a edição configura em termos de produção de sentido. 15

65

5.3.2 Tipos da Notícia No que diz respeito aos tipos de assuntos que sustentam as notícias no telejornal, Bonner (2009) sugere duas ordens: assuntos factuais ou da atualidade. Entende que se enquadram como factuais os acontecimentos que surgiram desde a última edição e que tem urgência de ir ao ar. Já o segundo grupo, de atualidade, diz respeito aos assuntos de cotidiano, num recorte temporal que pode ser entendido como o atual, um período presente estendido. Fazem parte desse grupo de assuntos os “que não ocorreram apenas desde a última edição, mas têm ocorrido, estão ocorrendo, e que podem ser publicados hoje, como poderiam ter sido divulgados ontem, e não perderiam o sentido se fossem exibidos amanhã ou depois porque são atuais, mas não urgentes” (BONNER, 2009, p.19). Bonner (2009) ainda aponta que o JN tem forte vocação para tratar mais de assuntos factuais. Mas destaca, ainda, que os temas de atualidade são bem-vindos por permitir “ao público enxergar mais amplamente o momento que o mundo e o país atravessam” (BONNER, 2009, p.19). Como exemplo de não factuais toma o aumento de venda de computadores nos últimos três anos no Brasil; mudança de perfil socioeconômico numa determinada região, entre outros. Como factuais, entendo aquilo que aconteceu naquele dia. E, mesmo nos exemplos acima, se fossem referentes a dados divulgados naquele dia, poderiam, então, ser considerados factuais.16 No JN, como já vimos anteriormente, na reportagem sobre o caboclo mineiro, cabem as “notícias do fantástico”. Já conceito de factual é, portanto, adequado para notícias relacionadas a acontecimentos eclodidos naquele dia, ou recentemente e que operem ainda num tempo presente. Ou seja, são notícias sobre acontecimento que só tem espaço no corpo do telejornal – e também só fazem sentido enquanto notícia – se forem veiculados naquele dia. Como notícias da atualidade sigo com Bonner ao entender que são aquelas que tratam de temas mais analíticos e abrangentes que ajudam a entender uma realidade, mas que não estão necessariamente ancoradas num acontecimento daquele dia, numa temporalidade mais flutuante e que pode referir-se a um fato mais distante do presente. No entanto, abro uma fissura no conceito, que é mais genérico, para catalogar com essa tipologia somente notícias que visam análise e/ou aprofundamento de temas. Nas notícias que destacam histórias de 16

Reconheço similaridade no relato de Tuchman (1978) quando trabalha tipologias de notícias a partir da perspectiva dos produtores da notícia, os jornalistas. Com o objetivo de organizar essa tipologia de tal forma que a aplicação na pesquisa seja mais ampla, vai, a partir dos relatos dos jornalistas, constituindo suas próprias categorias de notícia. Chega a noticia blanda, que seria de atualidade, e a noticia dura, o factual. Além disso, chega a tipologias como: noticia súbita, a inesperada; noticia en desarrollo, que vai acontecendo enquanto é narrada, e noticia de sequencia, quando fatos novos atualizem o primeiro acontecimento. Meu exercício aqui é claramente inspirado em Tuchman para, a partir dos meus materiais e do que há de conhecimento sobre eles, tensionar tipificações já postas e conceber outras com aplicabilidade mais ampla à pesquisa.

66

personagens – e tem só nisso a razão de existir – ou que contam histórias pitorescas, opto pela tipificação de Motta. Ao longo de toda amostra cataloguei 109 notícias classificada nessas três tipificações. A maior incidência, 91, são notícias factuais. A segunda maior incidência são relacionadas a atualidade, 15 ocorrências, seguida de três ocorrências de notícias relacionadas ao fantástico. As edições do início da semana são marcadas pelas notícias factuais. Na segunda-feira, são 17 contra apenas uma da atualidade. Observo que a única da atualidade busca um contexto para o acontecimento mais imediato, a morte de Bin Laden. Essa reportagem da atualidade remonta como foi o atentando de 11 de setembro e como o Jornal Nacional narrou esse acontecimento. Também é possível constatar que, de modo geral, as notícias factuais estão sempre mais perto da abertura do telejornal. Em toda a semana, apenas a edição de sexta-feira não tem na sua abertura uma notícia factual. O assunto da abertura desse dia que foge a exceção trata da inflação. Os dados revelam que a inflação ultrapassou a meta do governo, mas o ministro da Fazenda contemporiza afirmando que o pior já passou. Essa reportagem não demonstra estar ancorada em algo do factual, mas sim atual. Não há referência clara de dados que tenham sido divulgados naquele dia ou mesmo de que a fala do ministro tenha ocorrida naquela tarde e com esse único objetivo de amenizar a revelação desse dado. A reportagem demonstra muito mais o tratamento de assunto que se vive nos tempos, no dias, de hoje do que somente no hoje, no agora. Daí, o fato de considerar essa uma reportagem presa no mundo da atualidade. Observo, ainda, que as notícias da atualidade ocupam espaços que, ou sobram em função da falta de factuais – e, nesse caso, o jornal não pode ser reduzido e reportagens devem ser previamente preparadas – ou quando são necessárias para aprofundamento de assuntos que podem ajudar na compreensão de assuntos factuais. Um exemplo desse segundo caso é a mesma reportagem de segunda-feira que referi. Ela reconta o atentado de 11 de setembro a partir de como o JN da época cotou esse acontecimento. Pelo encadeamento das reportagens que a antecedem e sucedem, é possível constatar que se a reportagem não estivesse ali não comprometeria a veiculação de informações sobre a morte de Bin Laden. O que ela traz, na verdade, é uma contextualização e aprofundamento maior. A edição de sábado também se presta a observações de como as notícias da atualidade ocupam espaços deixados pelas da factualidade. Enquanto que nos demais dias as atuais surgem em dois, três, no máximo quatro casos, no sábado está presente em cinco ocasiões. Uma delas é sobre operação da Polícia Federal, que descobre nova rota do tráfico internacional de drogas que passa pelo Pantanal. A notícia é exclusiva, porém, a apuração e

67

nem mesmo a descoberta da PF se deu naquele dia. Embora não seja possível identificar quando exatamente o fato eclode, tem-se logo a impressão de que não faria diferença – em termos de atualidade – se a notícia não fosse ao ar no sábado e sim só na segunda. Tão pouco se já tivesse sido veiculada na sexta, até mesmo porque o assunto foi acessado com exclusividade pela equipe do JN. É importante destacar que a maioria das notícias da atualidade não são suítes17 de assuntos já tratados. Pelo contrário. Se a suíte é a atualização de um acontecimento primeiro através desse novo, a notícia passa a ser factual já que naquele dia um novo acontecimento se deu, mesmo que o segundo tenha relação de continuidade com o primeiro. Por exemplo: na edição de sábado, o JN abre com reportagem que traz a notícia de que os Estados Unidos divulgam imagens de Bin Laden assistindo a si em imagens de televisão. Por óbvio que essa é uma forma de se continuar falando de Bin Laden e que é um acontecimento que atualiza o primeiro, ou seja, é notícia em sequência. E é factual – e não da atualidade – porque nesse dia, 7 de maio, os EUA divulgaram as imagens. Fato do dia, acontecimento do hoje atualizando acontecimento de cinco dias atrás. E um clássico exemplo de notícia da atualidade é o veiculado na sexta-feira. A reportagem destaca que os homossexuais vêm conquistado espaço também no mercado consumidor, sendo clientes fiéis e que já contam com produtos especialmente destinado a esse consumidor. Não há factualidade na divulgação dos dados. A relação com os dias atuais se dá pelo fato de que dias antes o Supremo Tribunal Federal reconhecera a união homoafetiva. O que, necessariamente, não é fator determinando para a veiculação da reportagem na sexta-feira, não havendo perdas se fosse divulgada no sábado ou no mesmo dia do anuncio do STF. Já pela pouca incidência da dimensão do fantástico é possível concluir que este ocupa um espaço deixado primeiro pelas notícias factuais e depois pelas da atualidade. No entanto, enquanto as notícias da atualidade têm essa preocupação com reconstituição de um cenário presente em desenvolvimento, com dados, números ou informações que dêem essa ideia de continuidade, as outras são histórias prosaicas, que constituem uma lógica única em si e para si que permite a qualquer leitor a sua compreensão, o fait divers barthesiano. O que sustenta as notícias desse tipo na amostra é a curiosidade, a individualidade, embora simples, situação que narra. Um exemplo é a reportagem que conta a história da primeira mulher a pilotar um jato de guerra da Força Aérea Brasileira, veiculada na sexta-feira. Poderia até ser uma história

17

Entendo como Suíte o que Tuchman (1978) denomina como “notícias em sequência”, série de relatos sobre um mesmo tema baseado em acontecimentos que ocorrem durante um período. Como se o primeiro acontecimento seguisse acontecendo a partir de novos acontecimentos que atualizam o anterior.

68

considerada factual, se o destaque da narrativa fosse o quando ela pilotou o avião. Mas, não é isso que ocorre. A história dessa personagem, a doçura feminina em meio ao duro e belicoso ambiente das forças armadas é que são valorizados – e por isso dão sentido – à história contada. Ainda, antes de encerrar as observações sobre os tipos de notícias, destaco nesse os quadros fixos diários. São eles: previsão do tempo e mercado financeiro. Considero as informações ali contidas como factuais por serem apoiadas em dados apurados que são relacionados somente àquele dia. A previsão do tempo de ontem, por exemplo, não tem sentido hoje. Assim como não tem sentido veicular os dados do mercado financeiro de ontem hoje. Isso, de certa forma, contribui ainda mais para o elevado número de ocorrências de notícias factuais, já quase todos os dias – a exceção é a edição especial de segunda-feira – esses dois quadros estão presentes. 5.3.3 Editorias De um modo geral, o jornalismo contemporâneo costuma seguir o princípio de se organizar por editorias, agrupando notícias que têm assuntos similares. Em telejornalismo, a lógica também é a mesma: agrupam-se assuntos de política, economia, esporte, entre outros. Dentro da estrutura organizacional da equipe de produção do Jornal Nacional há editorias de Geral, Política, Economia e Internacional18. Ao todo, seis editores trabalham nessas seções, orientados por um editor-chefe, um editor-chefe adjunto e, ainda, um editor executivo (BONNER, 2009). Pelos movimentos do próprio objeto, constato que a divisão feita pela redação de forma pragmática pode ser reconfigurada para melhor entender o objeto. Observo que é possível fazer um agrupamento mais amplo, levando em conta a incidência de determinados assuntos no corpus. O próprio Bonner (2009), ao explicar cada uma das editorias, deixa clara uma noção comum entre os editores em jornalismo de modo geral: a de que a editoria de geral é tudo que não couber nas demais. Assim, vejo a necessidade de organizar os assuntos tratados pelo telejornal em seis editorias: política, economia, cotidiano (que ainda é subdivida em geral e crime), esportes, variedades e internacional. A primeira editoria abarca assuntos de política nacional e também local quando, quando na política local houver algo que possa repercutir nacionalmente. A 18

Segundo a informação apurada pelo autor junto a direção da RBS TV, além da editoria de esporte que, pela organização da TV Globo, corresponde a uma divisão à parte. Há, inclusive, um diretor específico da Central Globo de Esporte (CGESP) diferente do comandante da Central Globo de Jornalismo (CGJ). Como afiliada Globo, RBS TV segue o mesmo modelo.

69

editoria de economia envolve desde ações de governo na área, economia doméstica e indicadores financeiros. Esporte compreende basicamente futebol, mas também abre espaço para outras modalidades contanto que tenham ancoragem no factual. Ou seja, uma competição de tênis, por exemplo, só terá espaço se ocorreu naquele dia. Em variedades, cabem as notícias de celebridades ou da área artístico-cultural. São desde mortes, casamentos, até lançamentos de filmes, exposições e peças de teatro. As notícias internacionais são geradas a partir de acontecimentos fora do país e trazidas por correspondentes ou agências internacionais. Ou seja, se a notícia é como os brasileiros viram a morte de Bin Laden, por exemplo, eu não a considero como internacional. Isso porque o acontecimento que atualiza é a reação dos brasileiros, aqui ou fora do Brasil, a um acontecimento de fora do país. As notícias que cabem debaixo do guarda-chuva do cotidiano são as que envolvem crimes, problemas e ou acontecimentos de cidades, retratos de histórias pitorescas e tudo aquilo que foi relacionado ao dia-a-dia e que não couber nas demais editorias. Ainda na pesquisa exploratório, em julho de 2011, percebo grande ocorrência de notícias na editoria de internacional. São 47. Antes de levar em conta o dado numérico, é importante que pontue que essa é a semana de um grande acontecimento na área internacional. Além de esse acontecimento ter atualizações diárias, teve uma edição com todos os conteúdos relacionadas à morte de Bin Laden. Isso faz aumentar as ocorrências de notícias nessa área. Ainda preliminarmente, posso inferir que isso é algo que pode se repetir em outras editorias, quando se referir ao acontecimento que teve destaque na semana. Apenas como dado comparativo19, observo a semana entre 12 e 17 de novembro de 2012. Foi um período em que facções criminosas do estado de São Paulo vinham promovendo ataques a policiais militares. No estado de Santa Catarina, também houve atentados orquestrados por líderes de facções criminosas que estão em penitenciárias catarinenses – a diferença é que em Santa Catarina os ataques são a ônibus de transporte urbano e alguns de turismo20. Segundo os critérios de classificação da pesquisa, são 20 ocorrências relacionadas a esse assunto. O número é bem inferior as 47 ocorrências de internacional da semana recortada como amostra para análise. Porém, o número não é somente de ocorrências relacionadas à morte de Bin Laden – embora realmente seja a maioria, com 37. Nesse grupo de 47 também estão todas as outras notícias internacionais que foram trazidas pelo JN da semana. Na semana de 12 a 17 de novembro de 2012, as ocorrências de notícias da editorial de cotidiano, em especial na 19

Para fazer essa comparação, em 18 de novembro de 2012, fui ao acervo do Jornal Nacional, disponível em sua página na internet – WWW.g1.com.br/jn 20 As reportagens sobre os ataques em novembro de 2012 estão disponíveis no acervo da página do Jornal Nacional na internet – WWW.g1.com.br/jn.

70

secção de crime, têm a maior incidência. Mais adiante abordarei novamente as editorias que têm maior incidência de notícias na semana. Porém, desde já, é possível constatar que o grande acontecimento da semana acaba reverberando como “a notícia em sequência”, tendo outros acontecimentos atualizando o grande acontecimento registrado pelo Jornal Nacional. Voltando à semana recortada como amostra para análise, constato que a segunda maior ocorrência é na editoria de cotidiano. São 3721, sendo 29 ainda classificadas na subdivisão geral e outras oito na denominada como crime. Observo que o Jornal Nacional, como o jornalismo de um modo geral, detém-se em acontecimentos da vida cotidiana como histórias pitorescas, crimes e mesmo assuntos mais comportamentais e de análise da sociedade contemporânea que normalmente surgem a partir da divulgação de pesquisas. Outras 11 ocorrências na editoria de economia também podem ser vistas com esse viés. A maioria delas trata de aumentos de preços, comportamento de consumo, mercado de trabalho e geração de emprego, novas indústrias ou postos de trabalho e mesmo indicadores que, de modo ou outro, acabam impactando no dia a dia das pessoas. As notícias de editorias mais leves vem logo depois da economia. Esportes com seis e variedades com cinco. No esporte, a esmagadora maioria das ocorrências diz respeito ao futebol. São três relacionadas a esse esporte. As outras três dizem respeito ao voleibol – jogadora que se recupera de acidente com ônibus do time –, alpinismo – dois brasileiros chegam ao topo do Monte Everest – e natação – jovem azarão ganha do grande campeão numa das competições mais importantes da modalidade no Brasil. Todas as ocorrências de assuntos relacionados ao esporte se dão numa relação bem estreita com a factualidade. Futebol tem grande destaque na segunda-feira – com o rescaldo das competições do fim de semana22 -, no sábado – antecipando como foram as rodadas de sábado e o que esperar das de domingo –, na quarta – com informações da rodada que se dá naquela noite – e na quinta, com os resultados da rodada de quarta. As outras modalidades esportivas aparecem quando o resultado é surpreendente ou inusitado e se de fato é uma grande competição. Por fim, a menor incidência na semana de análise é da editoria de política, com apenas três notícias. Em geral, notícias de política estão sempre muito presas a factualidade. Sejam relacionados a escândalos políticos ou mesmo projetos de grande repercussão que tenham 21

Faz parte desse número o quadro da previsão do tempo, tendo cinco ocorrências na semana. Opto por catalogá-lo nesse grupo porque, usualmente no jornalismo, está inserido em meio a reportagens de cotidiano. 22 Essa constatação não se confirma na semana de análise, pois a edição de segunda é especial sobre a morte de Bin Laden. No entanto, ela se sustenta na observação de semanas de Jornais Nacionais. E mais: é possível se concluir que o futebol só não está na segunda-feira da semana de análise dada a edição especial.

71

sido aprovados pela Câmara ou Senado. Usualmente o JN produz reportagens da atualidade dentro da editoria de política, mas somente em épocas muito específicas. Como o projeto JN no Ar, desenvolvido em época eleitoral ou projeto anterior, o Caravana JN. 5.3.4 Inserção Bonner (2009) reitera alguns critérios que o norteiam na hora de determinar quando uma informação deve estar na abertura, no meio ou no encerramento do telejornal. Em geral, as editorias não possuem ordem fixa e vão se articulando ao sabor dos acontecimentos do dia. Seu objetivo é sempre “apresentar notícias em seu contexto, organizadas numa sequencia lógica, que facilite a compreensão pelo maior número possível de pessoas” (BONNER, 2009, p.104). E o que determina essa lógica é mesmo os acontecimentos tidos como factuais já que, segundo Bonner, eles ocupam de 70 a 80% do tempo de uma edição normal. Significa que o assunto factual mais forte do dia, ou de maior relevância23 estará na abertura e será o primeiro assunto. A partir daí, os demais assuntos se organizam a partir do acontecimento que foi escolhido para abertura. Depois da sequência de notícias factuais, vem as categorizadas como da atualidade, as de esporte e, de modo geral as mais leves, sem a densidade do hard news24. Esse princípio, de abrir o telejornal com um factual forte e encerrar com soft news25, como já mencionei - foi criado ainda na época de formatação do JN. Ou melhor, ainda antes do próprio Jornal Nacional. O jornalista Armando Nogueira leva o título de criador do JN, mas ainda antes de 1969, quando o telejornal vai ao ar, ele já atuava como líder no jornalismo da Globo. E com o objetivo de diferenciar a edição do noticiário da Globo dos demais ele quis inovar. O antigo Repórter Esso do Rádio foi levado para TV e com ele todo seu princípio editorial. Para o Esso, a notícia mais importante do dia fechava o “jornal”. Na busca de uma linguagem própria, Nogueira buscou exatamente o contrário.

23

Bonner (2009) fala em “temas factuais de maior relevância ou relevância mais óbvia” (p.109). Porém, não deixa verdadeiramente claro quais as notícias entram nesse roal. O que posso inferir tanto pela leitura como pela observação do objeto é que essas seriam as notícias cujos critérios de noticiabilidade não seriam questionados por ninguém. Ou seja, atenderia plenamente as exigências de ser um tema de interesse nacional, ou de grande parte do país, que afeta um grande número de pessoas ou, ainda, que surpreenda e subverta certa lógica habitual. Quando ocorre algo diferente do que naturalmente se esperava. 24 Tuchman (1978) entende como hard news notícias mais recentes, factuais e de cunho social, que se resignam à dimensão dos acontecimentos. 25 Em contraposição ao hard news, Tuchman (1978) trabalha com o conceito de soft news. São as ocorrências de notícias menos relevantes, nas quais o jornalista teria uma maior liberdade na narrativa dos fatos. Em certa medida, tem similaridade ao conceito de Bonner (2009) de notícias da atualidade, assim como o factual de Bonner está para o hard news de Tuchman.

72 O “boa noite” é o encerramento do Jornal. Nasceu da preocupação de Armando Nogueira em diferenciar, o mais possível, o telejornalismo da Globo do modelo criado e consagrado pelo então famosos Repórter Esso. Ainda nos tempos do Jornal da Globo, Armando quis fugir da rotina de dar, no encerramento, a notícia mais forte do dia, como fazia o Esso. E o “boa noite” transferiu-se para o Jornal Nacional. [...] Buscava-se informação de conteúdo lírico, pitoresco ou dramático, tratada de forma a não levar ao espectador as angústias das “manchetonas”, mas momentos de esperança, de serenidade e de bom humor. [...] passam e repassam, todos eles (os profissionais da redação), as notícias do dia, até chegar à seleção de assuntos para encerrar o Jornal. Nem sempre é um texto. Pode ser também uma imagem, em movimento ou quadro parado, desde que essa imagem tenha força para enternecer e descontrair o telespectador, àquela altura já carregado de informações fortes, sérias ou simplesmente rotineiras. O esquema idealizado por Armando Nogueira aperfeiçoou-se, no correr do tempo, e hoje é uma das mais importantes marcas do Jornal Nacional. (SOUZA, 1984, p. 78-79)

Assim, o que já foi dito sobre o telejornal confere com o que observamos. São os quatro lugares de significância: abertura do telejornal, fechamento do telejornal e abertura de bloco. As notícias que não tiverem predicados para ocupar esses lugares, acabam no quarto lugar, como uma espécie de diluição no corpo do JN. Para facilitar o mapeamento, sigo o mesmo critério para criar as categorias de inserção como: de abertura do JN; de fechamento do JN; de abertura de bloco; de diluição. O espaço mais nobre do Jornal Nacional é a abertura do telejornal. Das seis edições, quatro abrem com notícias relacionadas a morte de Bin Laden. É mais um dado que faz crer que esse é, de fato e na visão do JN, o acontecimento mais importante da semana. A duas únicas situações em que o telejornal não abre com notícias sobre acontecimentos que atualizam a morte de Bin Laden é na quinta-feira e na sexta-feira. No primeiro dia, o destaque da edição fica por conta da notícia de que foi resgatado o primeiro corpo de vítima do voo do Air France, que fazia a rota Rio de Janeiro – Paris e caiu no oceano. Nesse segundo dia, o destaque vem da editoria de economia. É uma reportagem a partir do dado que o a inflação do país já superou a meta do governo e, ainda assim, o ministro da Fazenda Guido Mantega diz que está tudo sob controle. Na sexta-feira, a morte de Bin Laden aparece com uma reportagem de um minuto e 40 segundos, narrando que, no Oriente, entre muçulmanos, há manifestações contra a morte de Bin Laden. A notícia está em espaço de diluição. Pouco antes, mas ainda em espaço de diluição há reportagem de quase três minutos e meio que narra encontro do presidente Obama com militares que participaram da operação que levou o líder terrorista à morte. E no mesmo dia e no mesmo bloco há reportagem de dois minutos e 19 segundos que diz que a Al Qaeda reconheceu a morte de seu líder. Essa reportagem está na abertura de bloco.

73

Já na quinta-feira, há uma grande reportagem, de quatro minutos e 42 segundos que narra: a ação dos Estados Unidos no Paquistão não foi a primeira do tipo em território estrangeiro. Está inserida no espaço de diluição. Ela é precedida por reportagem que narra as homenagens feitas por Obama aos mortos no atentado de 11 de setembro. Antes, ainda, há reportagem do enviado especial Marcos Losekan, inserida na diluição, que traz mais detalhes da casa em que morava Bin Laden. Ao todo, são 79 notícias em espaço de diluição e 20 em abertura de bloco. As notícias de abertura de bloco são as que dão o norte para edição do telejornal. Ao lado delas, se organizam notícias por similaridade. Sendo assim, tem uma função parecida com a notícia de abertura de editoria, espaço nobre no jornalismo impresso. Porém, reitero, o JN não tem a mesma lógica porque essa organização nem sempre é assim. Assistindo as edições, constato uma organização que leva a cada bloco uma notícia de grande relevância – segundo critérios jornalísticos e, em especial, telejornalísticos do JN. Como exemplo, o fragmento da tabela 2 a seguir, ou a grade de entendimento que diz respeito à edição de quarta-feira.

74

Data

Tabela 2– (fragmento) Inserção das notícias em espaços do telejornal Abertura Fechamento Abertura Título telej. telej. bloco

Diluição

04/05/2011 Obama decide que fotos X de Bin Laden morto não serão divulgadas Primeiro

ministro

X

paquistanês defende país de críticas sobre não saber que Bin Laden estava no Paquistão X

Nº de mortos na operação virou

motivo

de

discordância entre EUA e Paquistão. Vereador de cidade de

X

interior de Goiás presta homenagem a Bin Laden 5 cidades da região do Amazonas situação

X

decretam de

emergência

pelas cheias Em PE há mortes e 11 mil

X

famílias deixaras as casas Anúncio de que JN no Ar

X

vai para a região atingida pelas cheias Previsão do tempo

X (continua)

75 (conclusão)

Data

Abertura telej.

Título

Fechamento telej.

Abertura bloco

04/05/2011 Reconciliação de facções

Diluição X

palestinas no Egito Brasileiros já pagaram R$

X

500 bi em impostos CCJ da Câmara aprova prazo credores

mínimo

X

para

registrarem

devedores em serviços de proteção ao crédito Sobra mais dinheiro ao brasileiro,

mas

X

estão

gastando mais e poupando menos Mercado financeiro

X

Cantor Marroni deixa o

X

hospital Santos empata em 0X0 com América do México Fonte: Elaborado pelo autor

X

76

Com relação às notícias de encerramento do telejornal, constato na prática o exercício de encerrar com algo mais leve. Na quarta-feira, é futebol. Santos empata em zero a zero com o América do México. Na sexta-feira, um fait divers com sotaques da editoria de esporte: reportagem que narra a história de um festival de cinema de Pernambuco que homenageia o ex-jogador de futebol Pelé com exibição de filmes que contam com a participação do atleta. No sábado, o encerramento do JN é feito com reportagem que narra as expectativas do domingo de decisão no Campeonato Brasileiro de Futebol. Já na terça-feira, o encerramento fica com a reportagem da boa notícia que trata da recuperação da jogadora de vôlei Stacy, que se recupera depois de acidente com ônibus da equipe. O diferente fica por conta da segunda-feira, edição especial do JN sobre a morte de Bin Laden, que encerra com a notícia de que as embaixadas norte-americanas estão com a segurança reforçada. No entanto, o apresentador encerra a edição de forma solene dizendo que chega ao fim “uma edição histórica do Jornal Nacional”. O que, de certa forma, reitera a explicação de porque nesse dia os padrões são deixados de lado. A edição de quinta-feira também encerra de forma diferente: com o quadro dos indicadores financeiros. 5.3.5 Os Acontecimentos São várias as propostas de classificações de acontecimento. Berger e Tavares (2010) localizam dois tipos de acontecimentos: acontecimentos imprevistos e acontecimentos previstos.

Os

imprevistos

compreendem

conceitos

de

microacontecimentos,

macroacontecimentos e mega-acontecimentos (SANTOS, 2006), grandes e pequenos acontecimentos (MIRANDA, 2005), acontecimento acidente (CHARAUDEAU, 2006), cênicos, dramatúrgicos, experenciados, acontecimento réplicas ou reduzidos (BABOLANÇA, 2008), não-acontecimento (AUGÉ, 2001; MORIN, 1995) e acontecimentos inesperados (TUCHMAN, 1983). Sobre os previstos, listam os conceitos de acontecimentos rotina (MOLOTCH, LESTER, 1996), acontecimentos programados (CHARAUDEAU, 2006; DAYAN,

KATZ,

1995),

acontecimentos

suscitados

(BABO-LANÇA,

2008;

CHARAUDEAU, 2006), pseudoacontecimentos (BABO-LANÇA, 2008; BOORSTIN, 1961), acontecimentos/eventos interpretados e acontecimentos/eventos encenados (ECO, 1984), acontecimentos pré-determinados, em desenvolvimento e esperados (TUCHMAN, 1983). Opto por fazer uma releitura do mapa proposto por Berger e Tavares. Ou seja, classifico as notícias que aparecem no Jornal Nacional sob a ótica de acontecimentos de dois tipos: construídos ou provocados e reconstituídos. É mais uma camada de análise do mapa

77

que julgo necessária por entender que o tipo de acontecimento selecionado pelo JN tem significância na sua construção “do que mais importante aconteceu no Brasil e no mundo”. O objetivo não é contrapor conceitos já trazidos, mas sim trazer outro olhar sobre o telejornal. Para entender a ordem dos construídos ou provocados, tomo como conceitos acionadores os de Babo-Lança (2008), quando fala em acontecimentos cênicos e experenciados. Para a autora, os acontecimentos cênicos são aqueles que [...] pela sua natureza retêm a atenção pública e impõe-se em razão de seu valor simbólico. Abalam a moral social ou fazem parte dos problemas de sociedade que interessam aos media e cuja tematização está ligada à centralidade do tema e à capacidade de lhe dar destaque necessário pela maneira de o formular e de o desenvolver, de modo a chamar a atenção e, sobretudo, de modo a prolongá-lo em notícias subseqüentes, coma trama, actores, papéis e uma intriga. (BABO-LANÇA, 2008, p.7)

Ou seja, são aqueles acontecimentos que tem na sua própria natureza elementos tão espetaculares que um simples relato testemunhal já choca. São aquelas situações em que tanto jornalista como leigos pensam: “nossa! Parece cena de filme”1. É, por exemplo, o caso do aposentado que teve o carro roubado e ainda foi agredido e espancado pelos criminosos em Porto Alegre, na noite de 13 de setembro de 2012. A cena – real – é captada por câmeras de seguranças e, assim, constitui a matéria-prima perfeita para o acontecimento cênico que é tomado pelos media – em especial a TV – e tem sua reprodução e desdobramentos postos ao público com cara de espetáculo2. Figura 7 - Na sequência, o idoso é agredido e depois atropelado pelos assaltantes

Fonte: Idoso...2012 Babo-Lança (2008) destaca que todos os acontecimentos de certa forma são mais ou menos sentidos por alguém. Ainda assim, fala nos acontecimentos experienciados, “nos quais 1

São esses acontecimentos que dão origem ao que considero na pesquisa como notícias fait-divers. O telejornal Jornal do Almoço, da RBS TV – afiliada Globo – da manhã seguinte ao fato toma o acontecimento e constitui não só uma narrativa sobre ele, como também gera uma narrativa sobre a violência urbana e o medo das pessoa que vivem naquela rua e que sofrem com a falta de segurança. O material está disponível em: http://globotv.globo.com/rbs-rs/jornal-do-almoco/v/idoso-tem-carro-roubado-e-e-atropelado-por-assaltantes-emporto-alegre/2139532/ 2

78

é intenso o grau de ligação das significações daquilo que acontece à provação e à vivência na experiência pública dos actores” (p.7). São aqueles em que a experiência de ter sentido o acontecimento na pele se eleva ao próprio acontecimento. Quando “a noção do acontecimento do ‘acontecer’ ao ‘acontecer a’ (cf. Quere, 2005) e do acontecimento notícia, segundo critérios de noticiabilidade, ao acontecer vivido e sofrido, ao suportar ou padecer” (BABOLANÇA, 2008, p.7). Um exemplo são as cheias no nordeste do Brasil, ocorridas em maio de 2011, e que servem matéria-prima para a reportagem de Lilia Teles no Jornal Nacional3. Um dia antes, o próprio JN noticia as cheias e os estragos que trazem a população. Nesse dia, a repórter vai até o local não mais para construir uma reportagem sobre a cheia. Ela tece, na verdade, um texto sobre os efeitos dos alagamentos na vida das pessoas. Antes, a notícia era da cheia e de seus estragos. Agora, o drama de quem vive ali e sente na pele esses estragos é que ganha esse status, atualizando a primeira notícia. Figura 8 - Mulher mostra na parede nível d’água dentro de casa

Fonte: JN...2011 Assim, o acontecimento construído ou provocado são aqueles acontecimentos cênicos que são tomados não por quem vive o acontecimento, o experiencia, mas pelo jornalista que se joga numa incursão por algo que se sabe que acontece e ali testa sua experiência, numa narrativa cênica e com ares de espetáculo. No empírico, identifico como os casos em que o jornalista foi uma espécie de agente que promoveu o acontecimento. É algo que, embora esteja ali presente na realidade social, só se deu enquanto acontecimento jornalístico com ação direta do jornalista que não só constitui a narrativa do acontecimento, mas vai lá e, ainda antes, experiência o mesmo. Um exemplo bem clássico é a reportagem que abre o Jornal

3

A reportagem está no corpus de análise recortado pelo pesquisador. Faz parte da edição do dia 05/05/2011.

79

Nacional de 23 de abril de 20124. Àquela que tratamos anteriormente, em que dois repórteres narram o problema do trânsito na cidade de São Paulo a partir da experiência deles, já que um se desloca de carro e o outro de transporte público e narram tudo para o espectador. Como acontecimento reconstituído, entendo todos aqueles que são recuperadas através da narrativa da notícia. Podem ser acontecimentos de rotina, programados ou não. O que importa é identificar esses acontecimentos como algo que aconteceu jornalisticamente como uma notícia e tem na própria notícia a reconstituição do fato ocorrido. Por outra, são aqueles em que o jornalista só entrou em ação no momento de reconstituir esse tipo de acontecimento através da narrativa jornalística que opera para conferir sentido ao acontecimento enquanto notícia. Para sustentá-lo, sigo no conceito de Rodrigues (1996)5 sobre acontecimento jornalístico. É o caso mais simples e corriqueiro. Algo acontece, o jornalista vai até lá, recolhe depoimentos e cria sua narrativa do acontecimento seguindo a cartilha dos media. O Jornal Nacional se anuncia como um telejornal com raízes fortes na factualidade – que de certa forma já pudemos constar na observação. Logo, supõe-se uma predisposição para narrativas de reconstrução de acontecimentos. Na análise do material empírico percebo a confirmação dessa suposição. Ao longo de toda a semana, foram 96 ocorrências de narrativas a partir de acontecimentos reconstituídos, enquanto que na ordem dos constituídos e provocados apreendo apenas 16 ocorrências. Isso é, das 112 narrativas constituídas pelo Jornal Nacional em um semana, apenas 16 tem dotam de sentido acontecimentos que foram provocados pelo JN. É preciso que reconheça que, de imediato, acreditava que, na maioria das ocasiões, o telejornal constituía acontecimentos. Propunha tensões a partir de acontecimentos que já não tem mais tanta força pela factualidade. Por exemplo, o caso do trânsito na cidade de São Paulo, quando os repórteres testam o transporte público. Já é dado como senso comum a dificuldade diária de se deslocar dentro da cidade. Porém, quando o JN propõe uma ação – um teste – e incursiona para a discussão já posta com outra abordagem está requentando algo “já dito” e servindo à audiência através de sua narrativa com tom de novidade. A amostra dissecada prova o contrário. A maioria absoluta dos acontecimentos narrados pelo Jornal Nacional se dão por fatores alheios à concepção – e ações como a descrita anteriormente – do

4

Reportagem completa disponível em g1.globo.com/jornal-nacional/noticia/2012/04/equipes-do-jn-fazem-testede-mobilidade-urbana-em-sao-paulo.html, acessado em 24 de abril de 2012. 5 “Acontecimento jornalístico é [...] de natureza especial, distinguindo-se do número indeterminado dos acontecimentos possíveis em função de uma classificação ou de uma ordem ditada pela lei das probabilidades, sendo inversamente proporcional à probabilidade da ocorrência” (RODRIGUES, 1996, p. 27).

80

programa. O telejornal passa a agir no instante em que “colhe” esses acontecimentos e busca sentido através de uma narrativa muito própria. Embora, reitero, aqui não seja o espaço para análises mais conclusivas, é preciso que registre esse avanço da pesquisa. Se o JN toma a maioria de acontecimentos que se dão de forma natural – ou indiferente a sua razão – não significa que o não programa provoque tensões e crie situações em que o acontecer rompe uma superfície lisa a fim de expor movimentos de ideias e tensões. Isso se dá no próprio espaço do telejornalismo. O que preocupa a pesquisa, no entanto, mais do que uma tipologia de acontecimentos são os movimentos da narrativa e não somente o tipo de acontecimento que é captado pelo JN. O que não significa que essa camada de observação do objeto tenha sido em vão. É nela que identifico o menu de acontecimentos elencados pelo JN, bem como sua natureza. Durante momentos da pesquisa, fui levado a crer que era preciso entender porque o telejornal escolhe um e deixa outros acontecimentos à margem de suas edições. Afinal, qual seria a linha de corte? Mas, voltando ao objeto iluminado pelo problema da pesquisa, me deparo com a dificuldade de identificar quais acontecimentos na época foram deixados de lado pelo JN6. Por isso, passa a fazer ainda mais sentido não buscar o que ficou além, mas olhar para que o está dentro da constituição do que mais importante aconteceu no Brasil e no mundo segundo um movimento narrativo do Jornal Nacional. E assim sendo, numa olhada geral sobre os 96 acontecimentos reconstituídos, constato que o JN responde a premissa básica do jornalismo: contar, reconstituir histórias na forma de notícias. A grande maioria desses casos demonstra isso. Ainda assim, há casos específicos que requerem algumas considerações. Um deles é a reportagem sobre a primeira mulher a pilotar um jato de guerra da Força Aérea Brasileira, que foi ao ar na edição de quarta-feira, 05/05/2011. Não há dúvidas de que esse é um acontecimento reconstituído, já que não foi o JN que o provocou. A militar, indiferente ao desejo do telejornal, preparou-se para esse momento e realizou a operação que a inseriu na história das Forças Armadas Brasileiras. Porém, - e aqui permito uma olhada para o movimento narrativo - , é interessante observar como a ação se dá. O JN se insere como voyeur desse acontecimento. A impressão que se tem é a de que o acontecimento vai de fato acontecendo ao longo da narrativa. Diferente da ideia

6

Tal movimento requer outra pesquisa já que, por exemplo, seria necessário catalogar que outros acontecimentos fora registrados pela imprensa e deixados de fora do JN. E mais: como mensurar isso? Estudo comparado com outro telejornal? Com outras fontes? Tenho dúvidas sobre a eficiência de tal procedimento para responder o problema específico dessa pesquisa. A constituição de mundo através da constituição da narrativa sobre o acontecimento ainda me parece responder melhor à pesquisa.

81

de que algo acontece e depois o jornalismo vai até lá e reconstitui, nesse caso o acontecimento parece ir se constituindo diante da câmera e do olhar JN. É claro, não é preciso ser um grande entendedor de práticas jornalísticas para entender como situações se dão. É comum a imprensa ser avisada sobre determinados acontecimentos programados para que os acompanhe no momento em que de fato acontecem. Nesse caso, o próprio jornalismo passa a ser testemunha do acontecimento, podendo depois contar através de sua vivência, de seu contato com o acontecimento. Diferente de quando algo acontece alheio à sua presença e tem de reconstituir o que houve através de testemunho – vivência – de quem de fato viu o desenrolar do acontecimento. É como se um acontecimento – que iria acontecer de qualquer forma – fosse congelado numa linha temporal imaginária e só fosse realmente posto em ação no instante em que o jornalismo estivesse com as lentes voltada para ele. Assim, a jovem piloto que voaria pela primeira vez no caça da FAB o faz com o testemunho midiático. O efeito final é como se o JN estivesse contando uma história de dentro do próprio fluxo do acontecer – no sentido de acontecimento em desenvolvimento – do próprio acontecimento. Assim, considero esse o típico acontecimento reconstituído midiaticamente. Afinal, assim como não se pode negar que é um acontecimento alheio à ação do JN, não se pode deixar de levar em conta que para a constituição dessa narrativa foi necessária uma intervenção contundente do telejornal durante o acontecer. Um exemplo são as câmeras instaladas dentro do avião e a própria lente que acompanha a jovem a todo instante. Ou alguém teria alguma dúvida de que ela se portaria diferente distante das lentes? Seja por ação de direção dos media ou por timidez ou mesmo vaidade da jovem, a ação seria outra sem as câmeras e o testemunho do JN. E, por óbvio, a narrativa também seria outra. Permito-me, ainda, algumas considerações sobre os acontecimentos provocados. Alguns deles se dão num movimento de atualização da morte de Bin Laden. A chegada do repórter do JN no Paquistão dias depois da morte de Bin Laden faz um movimento diferente do caso da piloto da FAB. Aqui, o acontecimento já aconteceu. O JN chega lá e quer imprimir a sua visão sobre algo que já aconteceu e está no mundo como uma notícia em desenvolvimento, sendo atualizada a cada novo acontecimento. O telejornal torna a chegada de sua equipe junto à casa de Bin Laden um acontecimento. Lá, o repórter faz pouco mais do que tocar o muro da casa, falar com vizinhos e recontar e mostrar algo que já é dado como público. Nesse caso, é a impressão dele – enquanto um agente do JN – que importa e que se anuncia como algo novo à grande narrativa que vem se desenvolvendo. Além disso, percebese ao longo da semana que as informações que traz de lá tem pouco ou quase nenhum

82

diferencial ao que vem sendo tornado público através das próprias agências de notícias. Assim, se o acontecimento é o repórter do JN no Paquistão, é também um exemplo de acontecimento constituído e provocado pelo telejornal. Situação similar se dá quando a reportagem do JN vai até a região norte com a equipe do projeto JN no ar. As cheias, os dramas das famílias já vinham acontecendo há mais dias. Inclusive, o próprio telejornal já informara um dia antes. O que torna a chegada do JN no Ar na região o próprio acontecimento. É o mesmo sentido do repórter no Paquistão: ir até lá para ver e sentir o que estão vivenciando para depois constituir a narrativa através da vivência tão particular do contato com um acontecimento em desenvolvimento. São esses alguns dos 16 casos catalogadas como acontecimentos constituídos ou provocados pelo JN. 5.3.6 Narrativas No que diz respeito à forma de narrativa empregada nas notícias constatei, a partir de minha observação, a recorrência de alguns tipos. Foi observando esses tipos e a repetição deles que constituí as categorias de formas narrativas. Quando me refiro à forma narrativa estou apenas levando em conta a forma como a história – ou a notícia, no caso – é contada. É um movimento muito mais de observação de texto – televisual – e de como é conduzido. Assim, tipifico de duas formas: narrativa de aprofundamento, que ainda pode ser de aprofundamento técnico ou apenas de interpretação, ou narrativa simples. Seguindo minha observação, identifico que o primeiro caso compreende as narrativas que vão além do relato. A operação do enunciador revela que não trarão um relato simples, que não contarão nada de novo. É algo já contado e que o enunciador – o repórter ou o próprio JN – irá fundo na busca de dotação de sentido. E isso pode se dar de ordem técnica – quando se busca a explicação para uma ação, invenção, lei ou procedimento, por exemplo – ou de ordem interpretativa – nesse caso a opinião é que confere o sentido, sem a necessidade de algo técnico ou científico para sustentar, como no caso em que parlamentares de oposição criticam ou agem a partir de uma ação do governo. Ainda sobre as narrativas, permito-me uma fissura aqui. Entendendo que todas as manifestações dentro do JN podem ser classificadas, encaixadas, em um dos dois tipos. Porém, reconheço que todas as manifestações de notícias classificadas como reportagem merecem uma atenção especial. Por isso, criei mais um mapa de análise para elas em particular. É o que chamo de mapa de composição narrativa complexa, que detalharei mais adiante. Por hora, quero destacar que qualquer manifestação do JN poder ser uma narrativa

83

simples ou de aprofundamento. Sendo enquadrada em qualquer um dos dois tipos, a narrativa ainda pode ser de composição complexa, ser reportagem. Nesse caso, extraio esse corpus da amostra maior e me detenho a uma apreciação a partir de outro mapa, muito mais específico. E voltando para essa camada da observação, constato 68 ocorrências de narrativas de composição simples contra 41 de aprofundamento técnico ou interpretação. Mais uma vez, a análise fornece elementos que aproximam da autoenunciação do Jornal Nacional como um telejornal apoiado na factualidade. Se algo se dá, acontece, uma narrativa simples tem – no mínimo – a função de contar a história, narrar o que aconteceu, de forma sintética. Muitas das manifestações de narrativa simples se dão em notas, nos seus variados tipos. O pouco tempo para veicular a notícia requer um relato em síntese, de forma superficial. Assim, em notas, é necessário que em poucas linhas se narre o acontecimento. É mais ou menos o que se dá na nota coberta estendida sobre o nadador revelação que supera o campeão Cesar Cielo numa importante competição nacional. Mas não quer dizer que a forma narrativa simples não esteja presente em textos maiores, como as reportagens. A reportagem contida na edição de sábado, que lembra que a tragédia de Realengo, no Rio de Janeiro, completa um mês, é um exemplo de reportagem de narrativa simples. Nela, não há especialistas ou mesmo jornalistas trazendo análises mais densas sobre o ocorrido. Manifestações na escola Tasso da Silveira e uma missa são as atividades em memória das crianças assassinadas pelo ex-aluno do mesmo colégio. Como não poderia ser diferente, a emoção de familiares e amigos nas duas atividades é muito grande. A reportagem que narra essas atividades é objetiva por simplesmente reconstruir como foi o dia que lembrou um mês da tragédia, sem análise e algo mais denso. O que não quer dizer que o texto não traga apelos emotivos. Além do texto e das falas que são inseridas, a reportagem flerta com o drama em meio a dor. Seja por artifícios estilísticos textuais ou ritmo narrativo, a matéria traz sim memórias de dor e luta. Mas, porém, num relato simples que conta como as pessoas envolvidas nesse drama lembraram um mês do ocorrido. Em vários momentos distintos, no desenvolvimento das narrativas, é possível destacar a necessidade do JN em imprimir sua marca. Como se tivesse um carimbo de autorreferencialidade pontuando autoridade e legitimidade de narrador para contar suas histórias. Isso fica muito claro em manifestações narrativas de aprofundamento. Mas também está presente em manifestações simples. É o caso da notícia veiculada em 06/05/2011, sextafeira, que diz: subiu para oito o número de municípios em situação de emergência por causa das chuvas em Pernambuco. É uma nota curta que, em essência, traz apenas essa informação.

84

Ainda assim, no texto, abre-se espaço para referir que, na edição anterior, a região foi visitada pelo projeto JN no Ar. Reconheço que a voz pessoal é muito mais ativa em telejornalismo do que, por exemplo, no jornalismo impresso. Weaver (1999) destaca que “o estilo narrativo da notícia de televisão é o pólo oposto daquele que incorpora as convenções da escrita para o jornal. É, sobretudo, uma voz pessoal que diz as notícias do dia na televisão” (p.301). Ou seja, sempre se tem o efeito de que repórter ou apresentador é alguém ativo que nos conta algo. Isso já imprime certa permissividade de posição do narrador que se coloca – suas ideias, expressões e valores – muito mais do que no impresso. “Algumas vezes esse narrador pessoal fará uma referência de passagem ao processo de cobertura da estória. De facto, quase não há um momento na estória televisiva em que o olhar, a voz, a maneira, o pensar e a personalidade do repórter-narrador não esteja visível e audivelmente presente” (p.301). No entanto, apesar disso, o JN busca sempre imprimir a sua marca no próprio texto televisivo. Claro exemplo é o projeto JN no Ar que vai a lugares que já são notícias para promover outro contato do repórter-narrador com o acontecimento. E, assim, constituir uma narrativa ainda mais pessoal. Outros indícios também deixam clara essa vontade/necessidade de imprimir seu carimbo. Ao final da edição de segunda-feira, o apresentador encerra o telejornal com o texto: “está terminando aqui essa edição de 2 de maior de 2011. Uma edição histórica do Jornal Nacional. Você terá outras notícias no Jornal da Globo, logo depois de Tela Quente”. E na terça-feira, a primeira manchete da escalada é: “o Jornal Nacional vai à casa onde morreu Bin Laden”. São dois exemplos de referências. Ao longo da semana surgem outras. Narrativas simples de acontecimentos também são postos, talvez, como propulsores de ideias e valores. Cito duas notícias, veiculadas na edição de sexta-feira. Uma delas destaca que a Sociedade Interamericana de Imprensa fala em cerceamento à liberdade de imprensa na Argentina devido ações do governo de Cristina Kirchner. Na outra, destaca que a União Européia impõe novas sanções à Síria. Nos dois casos, o relato sobre o acontecimento é objetivo. No entanto, é preciso que se olhe o contexto que se tem para sentir as sutilezas na subjetividade. No caso da Argentina, é sabido que qualquer movimento de controle sobre a imprensa em qualquer lugar do mundo não agrada nenhum veículo de comunicação. Isso garante que qualquer insinuação desse tipo ganha espaço nos noticiários. Não é preciso que se dê alerta ou se analise as consequências. A notícia “servida” em meio a outras já tem sua significância: se está ali é porque é importante, mesmo que seja narrada de forma simples. A outra, já sugere reações contra a Síria, quem vem aparecendo frequentemente nos noticiários

85

como a próxima zona de conflito a ser atacada. Nessa semana, tem mais significância ainda, já que o grande desafio de “derrubar” Bin Laden já foi atingido. Apresentando realidades reconstituídas dessa forma soam quase que como justificativa para, quem sabe, ações americanas em território sírio. Há casos em que a sutileza da subjetividade sofre escorregões e quase queda. A mesma edição traz reportagem destacando que, no oriente, entre muçulmanos, há manifestações contrárias à morte de Bin Laden. Reportagem desse tipo, de partidários de Bin Laden, só surge na sexta-feira. Pode soar algo como “demoramos, mas nós mostramos que tem gente no mundo que não concorda”. Só que a reportagem não se limita a essa sutileza. O repórter usa textos em que sua entonação suscita opinião e o próprio texto deixa marcas nessas manifestações como marginais e “não corretas”. Eles diz: “Aquino Paquistão, a onda de manifestações foi convocada pelo maioor e maaaiis influente partido muçulmano do país [...]”7. Mesmo se deixarmos de lado o significado literal, é impossível que não se reconheça que as palavras “convocada” e “manifestação” não combinam. Uma traz a ideia de obrigação, recrutamento e a outra de contrariedade de ideia, oposição. Ainda usa o texto: “bandeíiras americanas foram queimadas e cartazes do terrorista Osama Bin Laden foram espalhados”. Ou seja, símbolo de uma nação destruída e imagens de terrorista venerado. E tal artifício de texto articulado com entonação para suscitar opinião é frequentemente usado. Há o caso do vereador de cidade do interior de Goiás que homenageia Bin Laden morto e é apresentado com estranhamento e ridicularização expostos subliminarmente no texto. Isso a tal ponto de que no fim da nota da nota o vereador aparece praticamente se desculpando – reportagem veiculada quarta-feira, dia 4. Outro exemplo é a reportagem do mesmo dia que revela que os brasileiros já haviam pago 50 bilhões de reais em impostos. Não há a frase “nossa, que absurdo” no texto da reportagem, mas a construção da narrativa, embora objetiva, passa claramente essa ideia. As narrativas de aprofundamento têm apresentação bastante variada. Pode ser como no caso do vivo do repórter Luis Fernando Silva Pinto na segunda-feira, dia 2, quando entra depois de reportagem com opinião apresentada como contexto para dotação de sentido – mas é só opinião. Ou, ainda, pode ser experiência memória como a reportagem do mesmo dia que narra como o JN contou a história dos atentados de 11 de setembro. Há a experiência pessoal dos repórteres, quando trazem referências de suas próprias vivências. É o caso da repórter Giuliana Morrone que diz, durante boletim, expressões como “eu moro aqui perto (...) eu

7

Usando a repetição de letras, tento representar textualmente a entonação.

86

ouvia muito barulho (...)”. Em outros casos, busca essa experiência nos personagens, nas fontes e mesmo em especialistas. No aprofundamento, identifico narrativas que sustentam teses. É o caso da reportagem que diz que toda segurança está reforçada, mas que poucas pessoas mudam sua rotina em Nova Iorque. Parece ser uma reportagem em que se imaginou tal situação e a equipe de reportagem para na rua para comprovar. Às vezes realmente prova, mas nem sempre é assim. As fontes, de um modo geral, só aparecem quando se quer que defendam um valor. Quando começam a surgir questionamentos sobre a morte de Bin Laden, especialistas aparecem para referendar e lançar essas dúvidas. E, claro, há notícias e reportagens baseadas na interpretação das fontes. Por fim, destaco as manifestações em que o telejornal busca densidade e aprofundamento no relato da vivência. E para isso, aposta em ir fundo na notícia. É o caso da jovem piloto da FAB, quando no caso a vivência não é sua, ou no caso do JN no Ar. Nesse projeto, toda a vivência e a experiência da equipe do programa que visita o local dá o tom para a reportagem. 5.3.7 Intervenção do Apresentador Também me interessa mapear de que forma aparece a intervenção do apresentador nas notícias que passam por ele nas diversas formas. Weaver (1999), ao tratar do repórter de TV, destaca que “este indivíduo está constantemente à vista, impondo a sua pessoa e personalidade quase que continuamente na narrativa” (p.301). Entendo que o mesmo pode ser considerado com relação ao apresentador, que tem sua figura ainda mais exposta. No caso das notas, por exemplo, o repórter não aparece. Porém, o apresentador está sempre lá. Há ainda uma diferença significativa que precisa ser levada em conta quando se trata do apresentador de telejornal. Há tempos a figura do locutor de notícias tem sido deixada de lado e passar a exercer o papel de âncora (BARBEIRO, LIMA, 2002). Em essência, a diferença está na postura desse apresentador. O âncora vai além do texto lido e se coloca muito mais na apresentação. Na polifonia de vozes de um telejornal8, ele sobressai com intervenções e vai desde opinativas as interpretativas (MACHADO, 2005).

8

Machado (2005) entende que a ação de editores, diretores, repórteres e apresentadores, além das próprias orientações editoriais da emissora e do telejornal, cria uma espécie de polifonia de vozes no telejornal.

87

Fechini (2008) observa o que chama de “nova retórica dos telejornais” (p. 2) buscando através da figura do apresentador entender um telejornal em que sua voz e suas posições sobressaem-se. Hoje, é cada vez mais fácil apontar apresentadores de telejornais que esbravejam contra os políticos ou criticam duramente as instituições cobrando “soluções” em nome do “povo”, evidenciando com clareza posturas ideológicas. Há ainda outros que, assumindo um estilo mais descontraído, fazem brincadeiras com a equipe e o próprio espectador, revelam situações do seu cotidiano (a reação que tiveram com a vacina conta gripe, por exemplo), comportamentos privados (o que faz quando está de folga, por exemplo) e gostos individuais (o time pelo qual torce, por exemplo) em meio aos comentários feitos às reportagens apresentadas pelo telejornal. (FACHINE, 2008, p.2)

Observando o empírico, percebo que as manifestações no Jornal Nacional se dão ainda numa outra forma, mais discreta. No entanto, reconheço os apresentadores como âncorasnarradores (FACHINE, 2008). Para observar essa intervenção do apresentador, atenho-me na manifestação do texto já finalizado e levado ao ar enquanto “o texto” do Jornal Nacional já acabado. Não levo em conta as operações dentro da redação. Tomo como elemento de observações todo e qualquer movimento do apresentador no vídeo. São as intervenções desse apresentador em dois lugares muito específicos da reportagem: na cabeça – a chamada, manchete da reportagem – ou no pé – a nota pé, que complementa e acrescenta uma informação ou somente opinião. Também levo em conta a forma como ele mesmo lê e conduz algumas notícias através das notas, que ficam sob sua responsabilidade9. Assim, a partir de minha observação entendo que tais intervenções podem ser de três tipos no Jornal Nacional: anunciativa, quando simplesmente anuncia a manchete ou lê o texto objetivamente; contextualizadora, quando traz informação complementar para compor um cenário e só então trazer a manchete ou o texto da nota que quer destacar; analítica, quando é de opinião pura e simples, constituindo claramente sua opinião sobre o que é apresentado. Nesse último caso, não há informação significativa. O ponto alto da intervenção é mesmo “o que ele pensa”. A maior parte das intervenções feitas pelo apresentador se dá na forma anunciativa, 68 ocorrências. É a menor interferência do apresentador, lendo apenas a chamada da notícia. No entanto, vale destacar que há casos em que a própria chamada da notícia, embora muito direta, quase mínima, traz de certa forma o contexto. É o caso das relacionadas à morte de Bin Laden 9

Os apresentadores do Jornal Nacional são vistos como estrelas, também mexendo com o imaginário do público por – ainda nessa época – serem um casal: Fátima Bernardes e Willian Bonner (HAGEN, 2006). Embora não desconsidere essa visada, procuro passar essa fronteira do mítico em torno da figura dos dois e observar a ação enquanto aparesentadores.

88

ou forte chuvas. Como são apresentadas uma em seguida da outra, o contexto fica claro mesmo que não haja sequer uma inferência além do texto que realmente chama a notícia que será posta. Em outros casos, o texto é muito direto e curto, mas a entonação manifesta o tom de opinião. No dia 04/05, quarta-feira, notícia narra a história de que está sobrando mais dinheiro ao brasileiro. Porém, está gastando mais e poupando menos. A própria entonação na expressão “estão gastando mais e, - pausa, seguida de movimento com a caça que indica contraposição e de algo não positivo – poupaandu mênus”10 já evidencia a opinião ou posicionamento do apresentador. Ou seja, isso não é algo positivo. Já a segunda maior incidência é na forma contextualizadora, 27 ocorrências. Ocorrem mesmo em notas, como na edição de sábado, dia 07/05. Ainda antes de ler a notícia propriamente dita sobre o feito de dois brasileiros que chegam ao topo do Monte Everest, há uma contextualização sobre quem são os atletas e o que significa para o esporte essa conquista. Há, ainda, o caso em que apresenta o tema numa forma de introdução à notícia que virá. Tomo como exemplo reportagem veiculada na mesma edição. Ela mostra a experiência da Prefeitura de São Paulo em reutilizar entulho de demolição de prédios como matéria-prima para a pavimentação de ruas. Antes de fazer a chamada da matéria, o texto da cabeça destaca que se geram milhões de toneladas de entulho e não se sabe como reaproveitar. É como a construção de um cenário e, depois, apresentação de case que pode mudar essa realidade. Também em reportagens, a apresentação contextualizadora pode levar de um enfoque a outro de um mesmo tema. Ainda na edição de sábado, é apresentada reportagem sobre festival de cinema de Pernambuco que tem como homenageado o ex-jogador de futebol Pelé. Na chamada, destaca a iniciativa e o fato peculiar do ex-jogador ter participado de muitos filmes. Porém, no pé da reportagem, o apresentador anuncia que no programa Esporte Espetacular do dia seguinte será apresentada uma entrevista exclusiva com Pelé. Ele anuncia que a entrevista completa, de que a reportagem trouxe fragmentos, será apresentada na íntegra e o atleta falará mais do que sua experiência participando de filmes. As intervenções que tomo como contextualizadoras não ocorrem somente na cabeça ou pé das reportagens e notas. Há casos em que o apresentador participa da entrada ao vivo do repórter fazendo questionamentos. As perguntinhas não trazem uma densa contextualização, mas, de qualquer forma, quebram com o padrão de que repórter despejar as informações de forma unilateral. É o caso da entrada do repórter Cesar Menezes ao vivo de um shopping Center, na edição de sábado. A fala do repórter é interrompida por questões dos dois

10

Na ortografia e na descrição dos movimentos da cabeça do apresentador busco representar a entonação.

89

apresentadores que – inferência minha – assumem um papel de quem faz as perguntas que o espectador gostaria de fazer. Esse padrão ocorre na semana durante entradas do repórter Marcos Losekann no Paquistão, além de outros repórteres que entram de bases no exterior como Luis Fernando Silva Pinto, Marcos Uchoa e Pedro Bassan. Frases que denunciam autorreferencialidade também estão presentes. Na edição de sexta-feira, 06/05, notícia destaca que subiu para 18 o número de municípios em situação de emergência em função das chuvas em Pernambuco. No meio das informações dessa chamada, há a referência de que ontem, ou na edição anterior, a equipe do JN no Ar esteve na região. Relações entre reportagens também se dão nessa forma de intervenção do apresentador. O exemplo é a edição de sexta. Uma narrativa que revela que homossexuais são vistos como fortes consumidores, dispostos a gastar mais do que heterossexuais. A reportagem quer falar em direitos iguais e parte da notícia de que o Supremo Tribunal Federal reconheceu a união homoafetiva – notícia da edição anterior e referida na cabeça dessa reportagem. Na sequencia, vem a reportagem que conta a história da jovem militar que se torna a primeira mulher a pilotar jato de guerra da FAB. Entre uma reportagem e outra, o apresentador busca relação entre assuntos criando uma contextualização através da expressão: “e uma outra barreira sexual foi quebrada”. Ainda, ao longo da semana, e especial em notícias relacionadas com a morte de Bin Laden, é demonstrada essa vontade de relacionar notícias que vem em sequência. Ainda sobre a notícia do reconhecimento da união entre homossexuais, na edição de quinta-feira, 05/05, a contextualização se dá na forma de explicação. Mais do que ler a chamada da reportagem que traz a notícia, o apresentador traz uma espécie de dotação de sentido, explicação da notícia. O texto da cabeça da reportagem é o seguinte: Fátima: O Supremo Tribunal Federal reconheceu hoje ooficialmente os diretos dos casais hômossexuais que vívem em união es-tá-vel. Bonner: E esse julgamento histórico vai servir de báse para futúras decisões da Justiça.11

Por fim, as intervenções analíticas se dão em 11 ocorrências. São nessas ocorrências em que a opinião fica mais clara textualmente ou a entonação e expressão facial são tão gritantes que denunciam a análise/opinião. Na forma contextualizadora a expressão e entonação são mais sutis e buscam marcar uma ideia introdutória do que a notícia deve passar. Nesse caso, agora, é pura dotação de sentido e opinião, com pouca informação relevante. É o

11

Tendo reproduzir na ortografia um pouco da entonação dada na leitura das frases.

90

caso da nota coberta estendida que vai ao ar na edição de sábado, 07/05, quando um nadador revelação vence Cesar Cielo numa disputa. O apresentador revela sua surpresa tanto pela expressão como pela entonação. Ainda, quando corta de volta para o estúdio, a apresentadora exclama com admiração, antes de iniciar a leitura de seu texto: “Nossa!”. No último bloco da edição do dia 06/05, sexta-feira, uma intervenção é curiosa. O apresentador reconhece um erro grotesco de número na reportagem sobre a primeira mulher a pilotar um caça da FAB. O apresentador não só mostra e corrige o erro. Ele traz expressões e entonações que expõe o JN como algo suscetível a erros. Mas a forma coloquial e com ares de cumplicidade com o espectador conduzem a errata de forma a “sensibilizar” o espectador a “perdoar” o erro. Mesmo no texto lido por Bonner é possível reconhecer o que destaco. No começo dessa edição do Jornal Nacional, nós mostramos a reportagem sobre a tenente Carla Borges, da Força Aérea Brasileira, a primeira brasileira a pilotar um jato de caça, e nós dissemos que ela chegou a 67 mil metros de altitude. Teria sido sensacional! Ela teria entrado em órbita. Na verdade, ela voou a seis mil e 700 metros de altitude. Erramos. E erramos feio.

Figura 9 - expressão de Bonner no momento da correção

Fonte: Correção...2011 Nas demais ocorrências desse tipo, a ação interpretativa/opinativa fica mesmo sempre evidente a partir da entonação e das expressões dos apresentadores. Há momentos de interação com repórteres que também revelam tomada de posição na forma como as questões são feitas. É o caso da interação em um dos vivos do repórter Marcos Losekan, quando ainda permanecia no Paquistão. As questões trazidas pelo apresentador funcionam sempre como um norte para condução da forma como a notícia vai ser contada. É o que acontece na edição do dia 3, terça-feira. Além de enaltecer a “façanha” do JN de ter enviados especiais no Paquistão, a fala do apresentador e suas questões montam uma espécie de eixo – de posições – em que o

91

repórter circulará a todo instante na forma como dará as notícias. E isso se dá por conta de questões do tipo “você percebeu...”, “o que viu...”, “como foi...” e daí por diante. 5.3.8 Tempo da Ação É quando observo a ação principal da notícia. Ela leva a notícia para uma espécie de linha de tempo. Linha essa muito particular, que não opera com passado, presente e futuro. Dalmonte (2009) dedica-se a esse tempo jornalístico e chega ao que chama de triplo presente, como forma de entender diferentes tempos verbais dentro desse que é o presente jornalístico. O presente das coisas passadas refere-se à concepção histórica, que, em sentido amplo, deve ser revisitada, pois é a historicidade dos fatos que agrega sentido, atualizando o ocorrido, que pode ser apresentado e reinvestido de significados. O presente das coisas presentes é o fato enquanto tal; é o anúncio ou apresentação de um acontecimento. O presente das coisas futuras refere-se à influência no porvir que o acontecimento narrado pode fazer ressoar. O evento narrado é capaz de antecipar realidades, que podem ou não se concretizar, mas a ideia da previsibilidade lança o leitor num movimento de espera, com base nas expectativas apresentadas. (DALMONTE, 2009, p. 339)

No corpus do Jornal Nacional, percebo a necessidade de fazer uma interpretação de Dalmonte constituindo assim minha visão sobre essa temporalidade na narrativa do telejornal. Constato que a ação se apresenta como: presente, passado remoto e passado imediato. Presente se constitui quando é uma notícia narrada sobre um acontecimento que ainda está fixo no agora, hoje, aqui. É o relato daquilo que está acontecendo. É algo que ainda não chegou ao fim e ainda desenrola-se no agora. São aqueles casos em que, embora a reportagem tenha de ser fechada ao longo da tarde e abarcando apenas os acontecimentos daquele tempo, o desfecho do acontecimento principal – aquele que sustente a reportagem e que tem status de acontecimento jornalístico – ainda não se deu. Nessas reportagens, sempre é necessária uma nota que atualiza o acontecimento trazendo o relato do como se desenrola naquele instante. É, por exemplo, o caso do repórter que entra ao vivo do shopping – que ainda está aberto – falando das compras para o dia das mães12.

12

É semelhante a noticia en desarrollo, trabalhada por Tuchman (1978) quando se refere à notícia de algo que ainda está em desenvolvimento.

92

Figura 10 - repórter entra ao vivo de shopping

Fonte: Movimento...2011 O passado remoto é quando a notícia se dá a partir de um acontecimento que está fixo num passado distante, para os padrões do jornalismo. Seria o ontem, o mês passado, aquele dia, ou algo que aconteceu há certo tempo. Embora adote o termo remoto, não significa que é reportagem de notícia velha – como se diz no jargão – e que aconteceu há muito tempo. As reportagens do Jornal Nacional, na maioria das vezes, são de acontecimentos que se deram entre o fim da edição de ontem do telejornal e a edição de hoje. Nesse caso, trato dos acontecimentos que se deram mais próximo do final da edição de ontem do que do início da de hoje. Ou, ainda, aquelas mais contextualizadoras, que buscam um entendimento maior sobre algo da atualidade ou mesmo de um acontecimento já noticiado anteriormente. Pode ser um índice que foi divulgado já mais tarde e mesmo o caso da morte de Bin Laden que teve sua primeira informação dada pela TV Globo na noite de domingo. A matéria que abriu o JN de segunda-feira, falava de uma morte já ocorrida – e noticiada. Porém, o enfoque atualizador do acontecimento não era a morte em si, mas como se soube da morte no Brasil.

93

Figura 11 - reportagem recupera momento em que notícia é dada

Fonte: A Morte...2011 O passado imediato está manifestado na notícia de algo que aconteceu há pouco tempo, na manhã de hoje, na tarde, não agora, mais ainda hoje. Esse caso abarca as notícias basicamente do factual, o mais quente e hard news daquele dia. Por óbvio, também são os acontecimentos que estão muito mais próximos do início da edição de hoje. É o que aconteceu agora à tarde, no fim da manhã, há poucas horas. Compreendem as notícias que tem de ser dadas logo, pois, do contrário, perdem a atualidade e ficam velhas. De outra forma: são as reportagens ou notas que querem dar conta do instante que o acontecimento eclode. Nessa linha de tempo que concebi para a pesquisa através da observação do empírico, de imediato, percebe-se movimentos curiosos. Na primeira edição, a especial que recupera a morte de Bin Laden, há seis notícias inseridas nessa temporalidade que denomino passado remoto, enquanto as outras dez ocorrências alternam entre o presente e o passado imediato. Ao longo da semana, as relacionadas ao passado remoto diminuem e quem ganha espaço são as ancoradas num passado imediato e até mais num tempo presente. Na edição de sábado, última da amostra, as ocorrências de passado remoto caem para apenas duas. Ou seja, já é possível inferir que o JN só busca acontecimento em tempo mais distante – que ocorrem há mais tempo – quando o acontecimento for realmente grande e com grande status, como foi a morte de Bin Laden. Mas antes de seguir com inferência, voltemos para o que diz o corpus sob essa perspectiva da temporalidade. O maior número de ocorrências são as relacionadas ao passado imediato, 64. O segundo tempo verbal é o presente, com a metade do anterior, cerca de 30. No passado remoto, as ocorrências caem ainda mais, fechando em 16 ocorrências. Embora maioria, as ocorrências inseridas no passado imediato são as de compreensão mais fácil e

94

também identificáveis de forma quase imediata. Além de maioria, essas notícias a partir de acontecimentos recentes marcam muito claramente sua temporalidade. É o que em jornalismo é muito valorizado, o novo, o inédito até então. E por isso perpassa as mais variadas editorias, como no esporte quando o atleta azarão vence na competição, a prisão de traficantes pela Polícia Federal, até as mortes em acidentes ou homicídios ocorridas nesse espaço temporal de um passado bem próximo. Ainda dentro do bojo das notícias em passado imediato, acrescento quadros como indicadores do mercado financeiro. Assim o faço por entender que aqueles números e cotações dizem respeito a algo que aconteceu – os quantificou, mensurou, apurou – num tempo não tão distante do atual. Há, ainda, discussões e assuntos que são inseridos entre os debates mais antigos. É o caso da união homoafetiva. Embora seja um assunto há muito debatido, é inserido na notícia do dia 05/05, quinta-feira, como num passado imediato. Isso porque toda a discussão e debate se dá a partir da decisão do STF de reconhecer a união, acontecimento de um passado recente. Em outros casos, a inserção temporal só é percebida fora do corpo da matéria. Está na cabeça, na chamada ou até mesmo no contexto do bloco e do fluxo da semana. É o caso de reportagem que vai ao ar também na quinta-feira, que se anuncia com mais detalhes da casa onde morava Bin Laden. A morte, a vida dele na casa e a própria descoberta da mesma já estão no passado remoto. Na condução da reportagem, talvez por pura estratégia narrativa, não fica claro esse tempo tão passado. A história é contada sem muita referência, mostrando a casa e detalhando a ação e a vida lá dentro. A mesma matéria poderia ter ido ao ar na segunda-feira ou até no sábado que não a descontextualizaria ou perderia o sentido com relação ao tempo desse acontecimento. Porém, o que me faz entender que essa notícia está criada a partir de um acontecimento do passado imediato é o que está na cabeça e no contexto das notícias em sequência sobre a morte do líder terrorista: a criação se dá a partir da sentença de que “hoje foram revelados novos detalhes da casa”. Inclusive, esse jogo de palavra parece traduzir esse tempo tão comum no jornalismo e tão difícil de inserir numa linha de tempo convencional, como passado, presente e futuro. Parece que a palavra “hoje” aliada com verbo no passado, “foram”, gera erro de concordância e até dúvida. Afinal, esse hoje é hoje no agora ou no logo ali na tarde antes do telejornal? Dúvida só esclarecida se conhecermos – ou ao menos formos acostumados – com essas temporalidades voláteis no jornalismo, o chamado presente jornalístico. Num outra reportagem, sobre as comemorações nos Estados Unidos pela morte de Bin Laden – do dia 02/05, segunda-feira – o acontecimento que dá o start na reportagem é de um

95

passado remoto: a morte e as comemorações dos inimigos. Isso fica evidente pela edição que mostra que logo depois de confirmada a execução, os norte-americanos de todo o mundo vibraram. Todas as ações da noite anterior são destacadas, mas, a reportagem vai a um passado mais próximo para narrar como está sendo a segunda-feira depois da morte e as manifestações de satisfação da população. Assim, na reportagem vê-se que o acontecimento dominante está no passado do hoje, do dia – passado recente – e ao mesmo tempo na noite, no ontem – passado remoto. Nas 30 ocorrências do presente fica claro que há um acontecimento que está “acontecendo”. Algo que segue acontecendo enquanto a notícia é transmitida. Um exemplo bem simples: começa a venda de ingresso para o Rock in Rio – notícia veiculada no sábado, dia 07/05. Ou seja, os ingressos começaram a ser vendidos e seguem em venda. É uma espécie de present continuous do inglês. A ação começou num passado próximo e continua acontecendo. E essa temporalidade está tanto ligados as notícias factuais como as da atualidade. É o caso dos ingressos que começaram a ser vendidos, no “hoje”, e também da prefeitura de São Paulo que começa a usar escombros de prédios para pavimentar ruas – algo que não fica claro se começou no “hoje” ou no “ontem”, mas que segue em desenvolvimento. Aliás, esse formato da temporalidade da pesquisa tem também similaridade com a notícia em sequência de Tuchman (1978). Algumas tem no seu “continuar acontecendo” a necessidade de nova notícia com caráter atualizador. O exemplo são as cheias em Pernambuco que mesmo depois de noticiadas servem de pauta para o projeto JN no Ar que vai viver aquele drama e, mesmo assim, volta a ter espaço como notícia no sábado, dia 07/05, mostrando o trabalho que voluntários “vem desenvolvendo” para auxiliar as famílias atingidas. As águas começam a baixar e as pessoas começam a voltar para casa e constatam que perderam muito. Os voluntários entram em ação e auxiliam essas pessoas. É o acontecimento que atualiza as cheias que começaram a aparecer lá no início da semana e que seguiram em desenvolvimento como notícias sempre em desenvolvimento através de narrativas de acontecimentos alicerçado na temporalidade do presente. Por falar em alagamentos, lembro de outro quadro que insiro nessa temporalidade presente: a previsão do tempo. Poderia até afirmar que se trata de uma notícia para o futuro, já que é uma previsão do que ainda está por vir. É o mesmo caso da reportagem da sexta-feira, dia 06/05, em que o ministro diz que o pior já passou, embora a inflação tenha superado a meta. Embora a fala do ministro tenha ocorrido hoje, antes, no passado imediato, a reportagem se refere a algo que vem acontecendo. Essa constatação mostra que a inflação não superou a meta e ponto, vem superando, ela não para. E o ministro diz que piorar não vai. Ou

96

seja, dá uma previsão. Porém, tanto o ministro da Fazenda Guido Mantega quanto o quadro da previsão do tempo falam do “há de vir” num tempo do “hoje”. Ou seja, hoje, agora, nesse momento, o que vem se desenvolvendo mostra que o futuro será como dizem. Não foi algo dito no passado e lá ficou congelado. Pode até ter sido falado lá, mas é sobre algo que vem acontecendo e, claro, projeta um futuro. As entradas ao vivo, de modo geral, também se estabelecem nesse tempo presente. Pela lógica, a entrada ao vivo é necessária para que se tenha a notícia em desenvolvimento mais atual possível. Como se fosse um narrador de uma partida de futebol, que vai tecendo sua narrativa de algo que está acontecendo. É o caso do vivo de Cesar Menezes na edição de sábado no shopping. O fato de o repórter estar no shopping naquela mesma noite, ao vivo, dá legitimidade para afirmar que o movimento de clientes comprando presentes na noite que antecede o Dia das Mães “é” grande. Pode até ir ao passado – como foi – e referir outros momentos do dia, mas o vivo dá legitimidade ao que narra. Assim também são os vivos de segunda-feira, 02/05, quando repórteres entram falando das reações de países sobre a morte de Bin Laden naquele momento. No entanto, há vivos muito particulares que fogem à regra. É o caso de alguns de Marcos Losekan no Paquistão e de alguns de Lila Teles no JN no Ar. Sim, eles referem algo que seguem acontecendo, em desenvolvimento. Porém, a narrativa trata em específico da vivência que tiveram quando tomaram contato com o acontecimento. Os tempos verbais, inclusive, estão no passado. São os “eu vi”, “senti”, “toquei”, “conheci”, “conversei”, entre outros. Já as notícias sobre acontecimentos fixados num passado remoto só aparecem se o fato for de fato muito importante, inusitado ou surpreendente. Além da maioria das reportagens do início da semana sobre a morte de Bin Laden, cito o exemplo da denúncia que foi ao ar na edição de sexta-feira, com atualização no sábado: mulher que fazia safáris em área de preservação no Pantanal de Mato Grosso. Quando os safáris ocorriam não fica claro, é um passado. E mesmo quando a reportagem de sábado atualiza a denúncia, dizendo que ela pode ter multa milionária, a maior parte da narrativa é apoiada nas imagens que detalham a ação durante os safáris. Há casos em que a temporalidade é muito difícil que ser identificada. A primeira reportagem sobre os safáris tem um pouco disso. Mas a que revela que a Polícia Federal descobriu nova rota do tráfico internacional de drogas é ainda mais difusa. Não aparece em nenhum momento quando a rota foi descoberta. Já foi descoberta e não vem sendo mais utilizada, mas quando isso ocorre é difícil identificar. Nesses casos, opto por catalogar no passado acreditando que se estivesse apoiado na factualidade isso estaria bem claro no texto

97

da narrativa como está em outros casos. Talvez, seja uma estratégia para valorizar o fato e não o tempo, o caráter de novidade e base no agora, para dar peso à notícia. 5.4 MAPA DA COMPOSIÇÃO NARRATIVA COMPLEXA – REPORTAGEM Constato nas reportagens do JN o que chamo de composição narrativa complexa. Isso porque é sustentada através de operações específicas, tanto de forma como de conteúdo. A reportagem em si, em qualquer veículo que estiver inserida, engendra uma complexidade de tal forma que só a sua análise renderia uma pesquisa. Porém, aqui opto em olhar para todas as manifestações de notícias no JN. O que não quer dizer que não reconheça a reportagem como o espaço mais complexo e nobre de apresentação de notícias. E é por reconhecer isso que a descolo do mapa inicial para observar seus movimentos com mais vagar. Esse é o momento em que concebo o mapa da composição narrativa complexa. Tomo a reportagem como uma narrativa complexa por trazer misturados vários elementos. Texto, imagens, efeitos sonoros e visuais, além de fragmentos de entrevistas são articulados através da edição. Seguindo a mesma lógica do mapa anterior, constituo as categorias de forma e de conteúdo a partir da ocorrência no corpus recortado na pesquisa. Com o intuito de aprofundar esses movimentos crio, ainda, subcategorias dentro dessa grande categoria reportagem JN. 5.4.1 Tipos de Reportagens A tipificação de reportagem é um exercício extenso. Além disso, são muitas as formas de catalogação. No entanto, embora não esteja aqui fazendo um estudo sobre a tipologia de reportagens, considero importante olhar como as reportagens do Jornal Nacional se agrupam com relação à forma como são constituídas e apresentadas. Sodré e Ferrari (1986) destacam que “a prática contemporânea do jornalismo (escrito, radiofônico ou televisual) comporta uma variedade muito grande de tipos ou modelos de reportagem” (p.45). E para simplificar e evitar catalogações extensas, sigo com os autores que propõem três modelos fundamentais: reportagem de fatos (fact-story); reportagem de ação (action-story); reportagem documental (quote-story). A reportagem de fatos corresponde ao modelo mais direto de texto. Na apresentação de uma narrativa muito simples, é o “relato objetivo dos acontecimentos” (SODRÉ, FERRARI, 1986). Se formos falar em jornalismo impresso, é modelo de pirâmide invertida

98

seguido à risca. “Em reportagens televisivas, quando se cobrem grandes acontecimentos, a edição parte do anúncio do fato (a exemplo do lide da notícia), mas pode fazer de cada flash uma pequena notícia independente” (SODRÉ, FERRARI, 1986, p.45). No objeto, o exemplo mais claro é a primeira reportagem da semana, que abre a edição de segunda-feira, e traz o relato do fato “Bin Laden é morto durante operação de militares dos Estados Unidos”. A reportagem descreve a operação a partir do instante em que a notícia é tornada pública pelo presidente Barack Obama. A reportagem é quase que um grande índice mostrando como se projetam (projetariam) os desdobramentos desse anúncio. Cada flash ou elemento dessa grande reportagem acaba – ou na mesma edição ou ao longo da semana – desdobrando-se em novas reportagens que buscam apontar questões que vão surgindo. Como o próprio nome já diz, a reportagem de ação “é o relato mais ou menos movimentado” (SODRÉ, FERRARI, 1986). Diferente de um romance, por exemplo, começa pelo clímax da história, o fato mais importante. Depois, vai descendo ao relato minucioso de detalhes. “O importante, nessas reportagens, é o desenrolar dos acontecimentos de maneira enunciante, próximo do leitor, que fica envolvido com a visualização das cenas, como num filme” (SODRÉ, FERRARI, 1986, p.52). E o repórter se coloca dentro dessa narrativa como parte ativa. Assim, passa a ter significância a sua presença ali e o relato que ele constitui a partir de sua vivência. “Na TV, o repórter participa da ação e deixa de ser um mero observador, para tornar-se parte da narrativa” (SODRÉ, FERRARI, 1986, p.52). É o caso da reportagem de Lilia Teles no projeto JN no Ar, a chegada de Marcos Losekan junto à casa de Bin Laden, mas também de reportagens menores – em tempo – na amostra do telejornal, como a que narra a ação de voluntário para auxiliar os desabrigados, vítimas das chuvas em Pernambuco. Na reportagem documental, o relato “apresenta os elementos de maneira objetiva, acompanhado de citações que complementem e esclarecem o assunto tratado” (SODRÉ, FERRARI, 1986, p.64). É a busca do contexto histórico, “é expositiva e aproxima-se da pesquisa. Às vezes, tem caráter denunciante. Mas, na maioria dos casos, apoiada em outros que lhe conferem fundamentação, adquire cunho pedagógico e se pronuncia a respeito do tema em questão” (SODRÉ, FERRARI, 1986, p.64). Sodré e Ferrari (1986) ainda destacam que é um tipo mais comum “nos documentários de televisão ou no cinema”. Porém, observo que pode estar presente em pequenas reportagens do cotidiano. No corpus da pesquisa, exemplifico tanto com as reportagens que buscam explicar quem era Bin Laden, como nas que trata da relação dele com os Estados Unidos, e das operações norte-americanas em

99

território estrangeiro, mas também a que denuncia safáris no Pantanal ou outra rota do tráfico internacional de drogas que passa pelo Brasil. Marocco (2009) também traz uma tipificação de reportagens, na discussão sobre as contribuições de Foucault e de sua “reportagem de ideias” para o jornalismo. Trata da reportagem investigativa, interpretativa, literária e de precisão. É outra catalogação que funciona se confrontada com as manifestações do objetivo da pesquisa. No entanto, por entender que a reportagem investigativa, interpretativa e literária podem estar no guardachuva do conceito de reportagem de ação; a reportagem de precisão dentro da ideia de reportagem de fatos; e a literária, como em parte das outras, podem também caber no conceito de documental, opto pela classificação mais geral de Sodré e Ferrari (1986). Também, porque, os próprios autores reconhecem que a tabulação fria de reportagem em tipos pré-concebidos não deve ser levada à risca, já que muitas reportagens – e percebo isso no empírico – podem ter contato com mais de um tipo. Evidentemente, os modelos não são rígidos: é possível haver combinações. Para quebrar a frieza da reportagem documental, por exemplo, e captar o interesse do leitor para o assunto, muitas vezes usam-se recursos de action-story ou da fact-story. (SODRE; FERREIRA, 1986, p.57).

E para que não ocorram longas classificações e reportagens enquadradas em mais de um tipo – o que pode alongar e até confundir a pesquisa nessa camada de observação – opto por catalogar a reportagem de acordo com o tipo predominante na reportagem. É um procedimento para facilitar e objetivar a pesquisa, o que não significa que reportagens do JN possam transitar e trazer elementos de mais de um tipo. São 31 ocorrências de reportagens de fatos. Em geral, são reportagens que estão num espaço de diluição do telejornal. Embora reconheça que as reportagens constituem narrativas diretas de acontecimentos e articulação de seus, não quer dizer que não haja intencionalidade. A própria articulação dos fatos entre si já tem sua significância. Um exemplo é a reportagem que abre o Jornal Nacional no dia 6. Apresenta o fato de que a inflação ultrapassou a meta, mas ministro diz que o pior já passou. A narrativa é simples, apresentando fatos que a sustentem. No entanto, na forma como as vozes e os fatos são organizados na reportagem, a impressão que se tem é que há um desejo de confirmar a tese que apresenta na narrativa através dos fatos e das fontes, que passam a ser tensionados dentro dessa organização. Ainda destaco um dado significativo. O grande número de reportagens de fatos mostra que o JN está realmente preocupado em dar vazão em assuntos que são presos ao factual – norteia-se pela factualidade dos fatos. Curioso também é observar como o JN faz a reconstituição dos

100

acontecimentos a partir do ordenamento dos fatos. A reportagem que abre a semana é um exemplo. A notícia – de que Bin Laden havia sido morto – já era conhecida. Era fato. Porém, para trazê-lo, foi necessário um reordenamento de outros fatos que, articulados dão forma para a narrativa. Uma reportagem de fatos pode ser só apresentação de fatos, mas também é defesa de ideias e valores. O que irá distinguir uma ação de outra é como esses fatos são narrados. A reação no Oriente a morte do líder terrorista é apresentada através de fatos que mostram que embora aja reação, o “certo” é aceitar essa morte como derrota de terrorista na luta contra o terror, ou a vitória entre o bem e o mal. A segunda maior ocorrência são as reportagens de ação – 17 ao todo. Nesse grupo estão as reportagens em que o repórter se insere como personagem da ação, como no caso da chegada de Losekan à casa onde vivia Bin Laden, e as que a própria narrativa remonta ação, como no caso das imagens que mostram safáris que eram promovidos em fazenda do Pantanal. A forma narrativa dessa reportagem é que dá o tom e remonta toda a ação. Muitas dessas histórias são contadas em espaço de diluição no JN. Ainda assim, são tidas como espaços nobres, já que seu tempo é sempre maior do que a maioria das reportagens de fatos. Ou seja, posso inferir que a maioria das reportagens do JN é de fatos e que o segundo grupo são reportagens que apresentam algum diferencial. Esse diferencial está na forma de narrar – com ação – que se dá de várias formas como a presença do repórter como agente da ação, imagens amadoras e de simulacro de ação e movimentos de câmera de um modo geral que traz ação. As histórias começam com o fato mais relevante, que representa também a maior ação e, depois, desenvolve-se apresentando os fatos menores que sustentam a narrativa em detalhes. Por fim, o grupo das reportagens documentais, com 12 ocorrências. Como tais, considero aquelas que apresentam histórias diferenciadas e que poderiam, por exemplo, serem congeladas no tempo e reapresentadas novamente sem grandes perdas na questão da atualidade. O exemplo fica por conta da reportagem que conta a história do jogador de futebol Pelé também como ator em filmes. A plasticidade dessas histórias é diferente, com iluminação e áudio mais bem afinados para a captação. É possível entender o porquê de poucas ocorrências. Imagina-se que a produção seja bem mais complicada. Mas não é só isso que atribuo a pouca ocorrência – uma média de duas reportagens desse tipo por dia. Na verdade, observo que fazem parte desse grupo as reportagens que buscam explicar fatos de forma mais extensa, com certo grau de aprofundamento que é maior do que nas demais reportagens. Em geral, são notícias da atualidade que geram esse tipo de reportagem. A baixa incidência leva à suposição de que há uma predisposição menor para tratar de temas que não sejam ligados a

101

factualidade, acontecimentos do dia. Embora, a qualidade dessas reportagens documentais ocupe bons espaços – em termos de tempo – dentro do telejornal. São elas que – a sua maneira – acabam trazendo um pouco mais de profundidade aos assuntos das reportagens do JN. É o caso de pesquisa e estudos, como a do Dnit – na edição de sábado que apresenta o estado com rodoviárias em que ocorrem mais mortes – que é apresentada e interpretada em movimentos mais explicativos e interpretativos do que simplesmente anunciativos. 5.4.2 Movimentos do Discurso Nesse item, o objetivo é observar como o discurso é apresentado pelo jornalista. Ainda, para que fique claro, destaco que opto pela expressão discurso porque, como já referi anteriormente, parto da premissa de que ele dá sustentação à narrativa. Esse discurso, por sua vez, é constituído, no jornalismo a partir de operações que agem sobre a vivência de agentes envolvidos no acontecimento, acrescentando a vivência do próprio jornalista enquanto articulador de uma narrativa sobre todas essas vivências. Assim, dá origem a uma narrativa de experiência. Tais conceitos de vivência e experiência são originalmente trabalhados por Vogel e Silva (2012), a partir de Benjamin, e me auxiliam na concepção dessa operação dentro do jornalismo. A vivência, nessa perspectiva conceitual, é aquilo que fazemos de grande parte de nosso tempo, em geral tomado por um contínuo de atividades, nas condições contemporâneas da vida produtiva. A vivência se dá, assim, na exposição radical aos estímulos do presente (...) Já a experiência resulta quando aquilo que vivemos pode ser transmitido aos outros na forma de um saber. A vivência pode se tornar experiência apenas se for transmitida, compartilhada, de modo que não se pode pensar numa experiência individual. Toda experiência, na proposição benjaminiana, é necessariamente compartilhada. Enquanto a vivência, que não se distingue plenamente do grande e infinito murmúrio do presente, mantém pessoas e coletividades absortas e mesmo alienadas. (VOGEL e SILVA, 2012, p.179)

Voltando ao objeto, observo a incidência de operações nos movimentos do discurso e as organizo da seguinte forma: operação experiência memória; operação objetiva de reconstituição; operação interpretativa e de autorreferencialidade. 5.4.2.1 Operação Experiência Memória É quando o repórter traz como fio condutor da história a sua experiência pessoal. E não necessariamente diz respeito a uma experiência vivida até os dias de hoje. Pode ser, simplesmente, sua experiência em tomar contato com as narrativas de acontecimentos que

102

sustentam a história, a leitura que faz delas e articulação e interpretação de todas, tomando para si a figura de um narrador que articula tudo numa operação discursiva. É, por exemplo, o repórter que traz no seu discurso a própria vivência de como percebe a casa em que Bin Laden viveu. É sua vivência em contemplar o lugar, todo o ambiente, elevada ao status de experiência descrita na linguagem televisual. Figura 12 - Repórter em relato pessoal fala da casa de Bin Laden

Fonte: Bin Laden...2011 5.4.2.2 Operação Objetiva de Reconstituição Nesse caso, o discurso é dado de forma muito sucinta, apenas narrando os fatos numa ordem cronológica. Nele, o jornalista apresenta apenas a ação principal. É o que aconteceu. Os relatos – quando aparecem – são todos dispostos de forma perfilada, constituindo uma ideia de que ali somente se está fazendo uma reconstituição do que aconteceu. O relato do repórter é apagado, sucumbindo a apenas um texto articulado entre as vozes que trazem seu relato. Embora reconheça que mesmo nesses casos há nos subterrâneos operações que na edição articulam certas lógicas que defendem ideias e posicionamentos. Mas, nesse momento, não me permito interpretações e avaliações de formas como a edição dita reta e objetiva pode engendrar mecanismos que subliminarmente expõe valores e visões de mundo. Lembro que esse ainda é um movimento de catalogação. 5.4.2.3 Operação Interpretativa É uma categoria que surge de uma espécie de cruzamento das duas anteriores. Aqui, o repórter traz suas visões de mundo também. Porém, não as apresenta de forma tão visceral.

103

Não cabem verbos nas conjugações como percebi, entendi, senti, descobri. Ele usa da apresentação do relato direto, aquele que apenas reconta o fato, e a partir daí tece sua teia interpretativa. É como se justificasse os fatos – ou a forma que ao apresenta – a partir de uma dotação de sentido que faz deles. Por exemplo: “um homem roubou um carro e a polícia o prendeu e levou direto para cadeia sem que prestasse depoimento”. Eis o relato reto e objetivo. “A rapidez com que foi encarcerado se justifica pela periculosidade do elemento, já que vem praticando esse crime há meses”. Eis a sua interpretação, posto com o objetivo de dotar – ainda mais – de sentido uma narrativa já engendrada, tendo como ponto alto a marcação que faz na leitura dos fatos. 5.4.2.4 Operação de Autorreferencialidade É similar ao relato experiência memória. Porém, no primeiro, o repórter conta a história a partir do acionamento de sua memória. Lá, estão contidas as impressões e os sentimentos que visitou ao se entregar ao exercício da reportagem para contar aquele acontecimento. Muito mais claramente são as impressões pessoais que emergem, o que no caso da Autorreferencialidade, se dá de outra forma. Aqui, o telejornal é dado como experiência. A diferença está no fato de que a experiência não é tratada como memória de um indivíduo, mas se um produto telejornalístico. Nesses relatos, há expressões do tipo: na cidade visitada ontem pelo Jornal Nacional, a situação piorou, ou, ainda, o Jornal Nacional já havia flagrado situação semelhante em... A contextualização tem como base seu próprio arquivo, sua memória. E isso é sempre dado como algo concreto que se perfila aos demais dados e relatos que se entrelaçam para sustentar a reportagem. Nessa observação dos tipos de discurso empregados há, pela primeira vez na pesquisa, um empate entre os tipos. São 26 ocorrências de movimentos de um discurso em que prevalece uma narrativa de interpretação e também 26 ocorrências de movimentos objetivos de reconstituição. Depois deles, há apenas sete ocorrências em que a experiência memória dá o tom da narrativa e uma em que a autorreferencialidade está no centro. Numa rápida inferência, observo que o Jornal Nacional constitui narrativas suportadas tanto por discursos interpretativos quando por outros objetivos e de reconstrução. Ou, por outra forma, observo que o JN reconstrói tantas histórias de forma objetiva como interpretativa. Dentro desses movimentos interpretativos, levo em conta até mesmo a análise de dados. É claro que nem sempre é o telejornal em si que faz a análise. Acaba se apoiando na ação interpretativa de especialistas. No entanto, é evidente que a filiação a determinados

104

especialistas revela uma posição interpretativa. Afinal, como já destaquei, o JN traz para si discursos de técnicos e especialistas que são similares aos seus próprios. Assim, através dos recursos de edição, fontes – especialistas ou não – passam a representar a posição, e muitas vezes até mesmo a “tese”, do telejornal sobre determinadas questões. Um exemplo bem simples em que os dados são dotados de sentido de forma interpretativa é a reportagem de sábado que apresenta estudo do Dnit. Ela aponta o estado que, proporcionalmente, tem o maior número de mortes nas estradas. Esses números revelam que o estado é Santa Catarina. Isso é irrevogável e está nos números. Agora, quando o telejornal parte dos números e busca explicação para os dados está incursionando pelo mundo da interpretação. É o que faz nessa reportagem ouvindo especialistas e até alguns personagens, mas sempre a partir de sua leitura desses mesmos dados. O resultado é que a “tese” de que a malha rodoviária muito sinuosa e com poucos investimentos em duplicação e melhoramento das vias de um modo geral é o principal causador dos acidentes. Curioso observar como a “tese” interpretativa dos dados vai aparecendo ao longo da reportagem. A repórter traz o posicionamento e o especialista entra funcionando como algo que referenda tal posição. Para evidenciar isso, aqui, reproduzi o texto da reportagem. Apresentador: um estudo do Dnit, o Departamento Nacional de Infraestrutura e Transportes apontou o estado que registra, proporcionalmente, o maior número de mortes nas estradas. O resultado surpreendeu. Repórter em off: sexta-feira, entre seis e sete horas da noite (imagem de rodovias movimentadas). É neste dia da semana e nessa hora que acontece a maioria dos acidentes nas estradas de Santa Catarina. Repórter na passagem: (está na beira de uma estrada, com movimento de carrso ao fundo). Apesar de ter uma das menores malhas rodoviárias, Santa Catarina é o estado com trânsito mais violento do Brasil. Um estudo feito pelo Departamento Nacional de Infraestrutura de Transportes mostrou que aqui, no ano passado, (câmera faz movimento. Repórter sai de quadro e entrada toma conta da tela) aconteceu em média (entra arte sobre imagem da estradas destacando os números) uma morte a casa seis quilômetros. Em segundo ficou o Paraná com uma morte a casa oito quilômetros, seguido por Minas Gerais e a Bahia (os números desses últimos estados só aparecem na arte). Repórter em off: curvas perigosas, poucas retas, muitos morros (imagens mostram estradas em curvas e com pista simples). Este retrato das estradas de Santa Catarina explica em parte o grande número de mortes nas rodovias do estado (imagem de um carro todo destruído depois de um acidente). Mas não é só isso (voltam imagens das estradas de pista simples e movimentadas). As pistas da maioria das rodovias federais que cortam Santa Catarina não são duplicadas. E isso aumenta a gravidade dos acidentes. Especialista: (está na beira de uma estrada com imagens de rodovia ao fundo) Em pista simples, os acidentes são mais graves porque as batidas são de frente, ocasionando sempre mortes. Repórter em off: as condições das estradas deixam o trânsito mais perigoso (imagens de estradas de pista simples movimentadas), mas ainda é a imprudência que (imagem de motociclista cortando congestionando entre caminhões. Ele segue pelo acostamento) provoca maioria das mortes. No ano passado, foram 562 (entra arte sobre imagem de estrada) em todo estado.

105 Policial rodoviário: (também na margem de rodovia) certamente o fator humano ainda deixa muito a desejar. (vai para off com imagens de rodovias sobre ele. Um carro ultrapassado os outros pelo acostamento) É fundamental que cada cidadão faça sua parte e adote uma postura mais prudente e responsável no trânsito.

Outro exemplo de movimento interpretativo é a reportagem que vai ao ar também no sábado. Ainda na sexta-feira, o JN apresentou uma denúncia de que uma fazendeira promovia safáris e caçadas a animais silvestres do Pantanal de Mato Grosso. Na reportagem de sábado, a notícia é atualizada, destacando que a “mulher flagrada fazendo safáris pode levar multa milionária. Polícia investiga o caso”. Toda essa reportagem é apoiada na posição e opinião de especialistas que dotam de sentido essa ocorrência. São agentes da polícia e mesmo ambientalistas que assistem a reportagem e dão seu veredito. A reportagem chega a mostrar cenas de especialistas dentro de um ambiente da emissora, provavelmente numa ilha de edição, assistindo à reportagem. Mais do que atualizar o acontecimento primeiro com seus desdobramentos, o texto claramente legitima um discurso que não é seu mas que, pela lógica e dinâmica do veículo, é tomado como seu. Na reportagem que abre a edição de sábado – governo dos Estados Unidos divulga vídeos em que Bin Laden aparece se assistindo na TV – há outra demonstração do processo interpretativo. As imagens e o que os elas representam foi divulgado a um grupo seleto de jornalistas. Até onde se pode inferir, os jornalistas do JN não estavam nesse grupo. Ou seja, a divulgação das imagens e de suas representações são feitas de segunda mão, a partir do que esse grupo de jornalistas relatou. Além disso, o próprio grupo tem a possibilidade de relatar apenas o que viu – os vídeos sem áudios – e o que o governo norte-americano atribuiu de sentido a eles. Assim, de maneira até abrupta e mais claramente impositiva, o discurso do governo norte-americano se faz legítimo pela voz dos jornalistas e do próprio JN. O restante da reportagem mostra que estão sendo analisados todos os materiais apreendidos na casa no dia do ataque. O objetivo é descobrir outros planos de atentados. Ou seja, tudo orbitando num só discurso, tomado como única verdade e, ainda, redistribuído aqui no Brasil na mesma forma que nos Estados Unidos: argumentos para provar e justificar a ação que acabou com a morte de Bin Laden. No futebol, o movimento interpretativo também surge. As notícias vão sempre além de resultados. Após rodadas de campeonatos, a repercussão dos resultados é o que menos importa. Nesses casos, há liberdade para interpretação. Quem fala e faz as constatações nem sempre são fontes. O próprio JN passa a dotar de sentido os números e fatos. Um exemplo é a reportagem de sexta-feira. Em mais uma rodada de disputas, o destaque é para Flamengo e

106

Coritiba. Os clubes funcionam como dois grandes cases para se falar como foi a última rodada. Apresentadora: o Flamengo foi surpreendido em casa ontem à noite pelo Ceará. E a rodada da Copa do Brasil confirmou a fase impressionante também do Coritiba, que aplicou também uma goleada histórica no Palmeiras. Repórter: (em off com imagens da torcedores na rua) o torcedor precisa das duas mãos para mostrar o placar (número seis feito com os dedos). Sonora de torcedor: a gente esperava goleada, mas não de seis a zero. Repórter: (em off com imagens do jogo) resultado que nem os jogadores mais otimistas esperavam. Sonora jogador: o nosso pensamento era dois a zero, três a zero. Repórter: (em off com imagens do jogo) o zagueiro Emerson abriu o placar e, antes do intervalo, o Coritiba já vencia por três a zero. No segundo tempo, foram mais três. Seis a zero. Sonora goleiro do Palmeiras: nos falaram que os caras estavam desanimados, mas podia ter me falando na concentração. Daí eu não tinha entrado num jogo desses. Repórter: (em off com imagens do jogo) o coritba chegou a 24 vitórias seguidas. Recorde no futebol brasileiro. A última justamente sobre o antigo recordista brasileiro, o Palmeira. Em 1996 tinha vencido 21 jogos seguidos. Passagem da repórter: no próximo jogo contra o Palmeiras em São Paulo, o Coritiba garante vaga na semi-final da Copa do Brasil mesmo com uma derrota de até cinco a zero. Se perder por seis a zero, leva a disputa para os pênaltis. Mas ninguém quer falar em derrota, depois de 24 vitórias seguidas. Sonora técnico do Coritiba: ta bem encaminhado, mas nos temos que nos preparar, até porque a gente tem a intenção de seguir vencendo. Repórter: (em off com imagens do jogo do Flamengo) No Rio, o Flamengo também entrou em campo invicto. 25 jogos no ano, nenhuma derrota e campeão carioca. Mas o Ceará não se intimidou. Marcelo Nicasso e Geraldo fizeram dois a zero. O gol de Vanderlei diminuiu o prejuízo, mas não a bronca da torcida. Quatro vaias para o time. Até para Ronaldinho Gaúcho. Sonora Roladinho: é a primeira vez que isso acontece desde que eu cheguei. As vaias vieram para toda equipe. Agora a equipe tem que ‘tar’ unida ‘pra’ gente dar a volta por cima. Sonora técnico do Ceará: nós ‘tamus’ enfrentando uma equipe forte. Nada melhor do que você levar vitória, mas sabendo obviamente que não tem nada decidido ainda. Repórter: (em off com imagens do jogo) até porque a missão do Flamengo não é tão difícil quanto a do Palmeiras. (encerra com imagens de menininha fazendo sinal de seis com a mão).

Observa-se no texto a pura dotação de sentido, ou livre interpretação, de fatos e resultados de jogos que ocorreram na noite passada. As sonoras são complementares à “ideia” da reportagem. Em nenhum momento elas sustentam a argumentação. Na verdade, fazem parte dela. Vistas assim, como são postas, não há como pensar diferente e não concordar com a “tese” apresentada pela reportagem. Operação muito similar ocorre também em edições que sucedem grandes rodadas de campeonatos. Em geral nas quartas e sábados. É quando a projeção dá a livre interpretação trazendo um contexto muito maior as informações de agenda de jogos. Pinça-se os jogos mais decisivos e a expectativa, como cada time entra em campo, passam a ser os elementos que são o enfoque à notícia.

107

Reportagens que buscam esclarecer fatos ou simplesmente apresentar algo que não é conhecido do público também caem nesses movimentos interpretativos. É o caso de mais uma reportagem da edição de sexta-feira. A notícia é o encontro do presidente Obama com militares que estiveram na operação que matou Bin Laden. Mas a reportagem parte disso e vai além, querendo explicar quem são os homens da elite das forças armadas norte-americanas. Explica que tipo de homens são, como é o treinamento, um pouco da história deles e de suas operações. Com o detalhe de que não apresenta as fontes de informação, nem mesmo quando faz o resgate da história. A impressão que se tem é de que conta a própria história, a sua leitura dela. Como se fosse o detentor dela mesma, o dono da versão histórica oficial. Outras reportagens com o mesmo intuito de explicar, esclarecer e apresentar o desconhecido adotam as mesmas operações. Na edição de quinta-feira, temos outro exemplo clássico. A chamada da reportagem diz que “a correção da tabela do Imposto de Renda abaixo da inflação tem custado muito aos brasileiros”. É como se fosse a “tese”, “ideia” da reportagem. Desde a chamada é apresentada a realidade e a verdade que quer constituir. A partir daí, todos os movimentos da reportagem, textos, imagens, sonoras, especialistas e fontes ouvidas, são articulados para reforçar a tese. Na edição, como a notícia é apresentada, tem-se a impressão de que não há outra conclusão – ou versão – possível. Na reportagem abre com imagens de trabalhadores vendo o contracheque e reclamando dos descontos do Imposto de Renda. Repórter faz a passagem no meio da fábrica, dizendo que a rotina de trabalho é alterada. Muita gente não quer mais fazer hora extra, pois sabe que os descontos serão grandes. Sonoras reforçam a constatação. Em off, a repórter justifica porque os descontos são altos com dados objetivos e claros, mas muito bem articulados a esse contexto. Tudo com auxílio e de exemplos e simulações demonstrados em arte. Especialista entra em sonora como que para referendar cada posição da explicação anterior. E a reportagem encerra-se com trabalhadora destacando que se os descontos fossem investidos para eles e devolvidos depois, “seria bem melhor”. As reportagens sobre as cheias no norte do país, que são veiculadas nas edições do meio da semana, e inclui o projeto JN no Ar, são outro exemplo. Poderia ali, ao recontar o drama de quem vive a situação das cheias e apresentar os dados de forma mais direta através da descrição. Porém, na maioria dos casos, o repórter acaba se inserindo nesse contexto e busca uma vivência daquela situação que é revelada em seu texto. É um exercício por vezes redundante, já que as imagens dizem muito sobre a situação. Mesmo assim, a reportagem busca interpretar o que se passa naquele instante. Na reportagem de quinta-feira, que fala das cinco cidades da região do Amazonas que estão em situação de emergência em decorrência

108

das cheias, a repórter anda de canoa, sobe em uma das casas e “sente” a dificuldade de quem faz isso diariamente e ainda tem de ficar isolado em palafitas cercadas por água. O que me parece é que, com esses movimentos interpretativos, a narrativa buscar colocar uma espécie de cabresto no espectador, para que tenha a conclusão já projetada para ele, trazendo já um enfoque com o que ele poderia “sentir” estando naquela situação. Nas reportagens do início da semana, em que há grande concentração e desdobramentos de atualizações do acontecimento “morte de Bin Laden” as operações são as mesmas. A diferença está mesmo no tema das reportagens. Quando Marcus Losekann vai até a casa onde o terrorista foi morto, reitera operações interpretativas como se inserir num contexto, vivenciar experiências de quem esta por ali e passar isso para o espectador de forma unilateral. As fontes são sempre apresentadas para referendar teses e ideias das reportagens. A cada novo fato, nova articulação. Poucas são as fontes que analisam a questão pelo contraditório, tem quase sempre a versão – de fontes – norte-americanas como a oficial e a mais correta. Agora, se falamos em posições, discursos e legitimidade de falas é quase inevitável cairmos em questões como: e a imparcialidade jornalística? A legitimação de posições é estratégica para o jornalismo e apresentar o contraditório é uma forma de provar isso, embora se observe que o contraditório não tem o mesmo espaço que o discurso heterogêneo, ou o tomada como da maioria. Isso fica claro quando observo a reportagem que abre a edição de quinta-feira. A notícia, o acontecimento atualizador são as questões levantadas sobre a legitimidade da ação governo dos Estados Unidos orquestrada de forma unilateral e que não deu a Bin Laden nem o direito de ser julgado, além de ter agido em território estrangeiro sem o conhecimento do governo paquistanês. A reportagem reconstitui detalhes de outras operações e de falas do presidente Obama sobre um possível ataque aos terroristas. Um especialista é apresentado como defensor da ação. Ele recebe a repórter em seu escritório e fala em imagens padrões com tradução de sua fala feita pela própria repórter. Responde, ainda, cada um dos pontos que questionam a legitimidade da ação. Uma outra especialista defende a captura de Bin Laden em vida. Defensora de direitos humanos, ela fala por imagem de webcam. Ou seja, não estava facilmente acessível. Em função da qualidade de imagens, fica pouco em quadro. Tem sua imagem coberta por outras similares em termos de qualidade, mas que mostram o interior da casa de Bin Laden. Embora defenda essa posição, a repórter sempre se apóia na dúvida da entrevista, dizendo que poderia estar certa essa operação. A impressão que se tem é de um contraditório instável. Para ela, Bin Laden deveria ter sido capturado vivo, com a chance de se entregar, mas talvez essa ação possa ainda justificar por

109

que isso não foi feito. Uma terceira fonte especialista é apresentada. É uma autoridade de direitos humanos, apresentada em imagens-padrão e em muitos planos. Ela diz que a quantidade de versões sobre a operação dificultam uma avaliação se haveria a chance de capturar o líder da Al Qaeda vivo ou se a ordem era mesmo para execução. E por isso pede mais informações ao governo. E a reportagem encerra com a frase da repórter atribuindo a uma tradução da entrevistada: “mas, independentemente disso, ela diz que a ausência de Bin Laden faz o planeta um lugar mais seguro”13. Já a maioria dos movimentos mais diretos de reconstituição traz de fato uma narrativa simples. O fato é apresentado, dotando de sentido o acontecimento de forma muito simples e sintética, informativa, basicamente narrando. Porém, há casos em que poderiam ser vistos como interpretativos. É como a reportagem de segunda-feira, que fala da reação dos governos sul-americanos à morte de Bin Laden. Opto por considerar operações similares como objetivas por trazerem o relato de determinada aposição. Não é interpretativo porque não busca auxiliar na compreensão de um fato. Há apenas um registro de como determinados países vêem o acontecimento. A condução do texto é toda nesse sentido: narrar, contar, como os sul-americanos receberam a notícia e como lidam com ela. Essa operação ocorre em reportagens de outros temas também. Em certos casos aparecem tons interpretativos, mas estão apenas na articulação do repórter. Ainda assim, de forma muito pequena. É o caso de mais uma reportagem de segunda-feira, que trata do clima de luta contra o terrorismo no Oriente Médio. Como a maior parte do texto articula descrição e relatos, passo a considerar objetivo de reconstituição. O mesmo ocorre mais no meio da semana que conta da manifestação de muçulmanos contra a morte de Bin Laden. Há nuances interpretativas na ligação de textos do repórter, mas muito pequenos se comparados com o contexto da reportagem. Outras reportagens apresentam o que chamo de texto mais humanizado, próximo do new jornalism. São textos com mais sonoridade e não com expressões complexas, com ares 13

Meditsch (2012) debruça-se sobre acontecimentos relacionados ao atentado de 11 de setembro – em geral fatos que ocorreram depois, narrados em notícias distribuídas por jornais de referência nos EUA em março de 2012 – para entender como as notícias são “ao mesmo tempo condicionadas e direcionadas ao contexto em que são produzidas” (p.131). Ou seja, ele percebe a ausência de princípios básicos no jornalismo como verificação, imparcialidade e o poder de fiscalização do jornalismo como fruto de um contexto nacionalista exacerbado. O jornalismo não encontra eco em uma sociedade que apóia cegamente a chamada “guerra ao terror”. Em decorrência disso, aceita apenas vozes que reforçam os EUA como país “que ilumina o mundo” e “é líder na luta contra o terrorismo”. Na palavras do autor, “o contexto sociocultural do nacionalismo norte-americano, exacerbado após 11 de setembro, não permite, obstaculariza ou pelo menos desencoraja uma postura independente na cobertura dos assuntos militares em que o país está envolvido” (p. 145). Cegueira essa que acaba se refletindo da narrativa do Jornal Nacional que acaba reforçando e referendando um discurso nacionalista norte-americano. Tudo que se insurja a esse discurso aparece de forma muito tímida e dosada na narrativa, numa clara influência do jornalismo produzido nos contexto dos Estados Unidos.

110

de poesia e muita sensibilidade. É o caso da repórter que fala da ação dos voluntários que ajudam as famílias atingidas pelas chuvas em Pernambuco, que foi ao ar no sábado. Embora a edição articule texto, imagens e sonoras de forma a incitar emocionalidade, ainda o faz dentro de um limite descritivo. Como se buscasse na riqueza da descrição elementos que emocionem e toquem o espectador. É possível que se considere – e concordo – uma espécie de operação interpretativa, mas como o texto não abre espaço para impressões de vivências de fontes ou repórteres e mesmo brincadeiras, sendo ancorado firmemente na descrição, opto por uma catalogação como objetiva de reconstituição. É o mesmo que ocorre na reportagem de sábado que lembra um mês do ataque na escola de Realengo, no Rio de Janeiro. Embora pequenas em número – apenas sete –, as ocorrências de experiência memória são interessantes de serem observadas. Ainda quando da composição dos mapas, não havia tomando contato com o conceito de vivência, trabalhado por Vogel e Silva (2007)14. O que me faz crer, agora, que essa ideia de vivência caiba melhor nessa categoria de operação. Um exemplo dessa operação é a reportagem de sexta-feira, que trata do primeiro voo de uma mulher numa aeronave de guerra da FAB. Mais do que contar a história dessa jovem e de sua façanha, a reportagem se insere como agente da ação. Acompanha o voo no instante do “acontecer”, conduzindo tudo numa narrativa que valoriza a sua vivência de estar ali, dividindo com a jovem aquele instante. A ação se desenvolve durante a narrativa, que perde a ideia de reconstituição e assume uma ideia de vivência narrada em tempo real. Claro, o efeito é de simulacro, colocando-a ainda mais distante da ideia de narrativa de reconstituição, tipificando claramente como reportagem de ação. Na reportagem que narra a visita de Obama ao memorial das torres gêmeas em Nova Iorque há um efeito muito similar. A narrativa coloca-se quase que como um voyeur. A visita já aconteceu, portanto não é ação desenvolvida em simulacro de tempo real. Mas passa a ideia de que a câmera, como um olhar do espectador, acompanhou todos os passos da visita do presidente e as manifestações que geravam. Ideia que ainda é mais reforçada quando a repórter faz seu boletim passagem e o presidente passa por ela como imagem de fundo. O efeito é uma espécie de carimbo que mostra que, de fato, a visita foi toda acompanhada e observada, em mais um exemplo de reportagem de ação, a partir do fato testemunhal que é destacado.

14

Para as autoras, vivência é quando, por exemplo, o repórter vai a campo e traz em seu relato de reportagem elementos que fazem parte do que ele viveu no contato com aquele acontecimento. A ideia de experiência está mais próximo do conceito benjaminiano.

111

No projeto JN no Ar a vivência do repórter é elevada à enésima potência. O recurso aparece em muitas reportagens do JN – como a que marca a chegada de Losekann ao Paquistão – em menor ou maior grau. Mas, no JN no Ar, o espaço é todo para isso. A reportagem entra na história, experimenta e não se limita a ver apenas. Na hora de narrar, não apenas mostra ou descreve, evidencia o que sentiu e sempre faz esse exercício de se colocar dentro da ação como um agente ativamente participativo. É curioso observar como não traz fatores atualizadores do acontecimento se apresentasse uma reportagem convencional, objetiva e descritiva. O tom fica mesmo por conta da exploração daquele acontecimento enquanto algo vivenciável pelo próprio telejornalismo. Há, também, certa demonstração de poder quando se anuncia como um recurso que vai aonde puder com seu avião em busca de aprofundamentos e experiências em acontecimentos do cotidiano. Por fim, destaco o movimento de autorreferencialidade. Essa ocorrência se dá na quinta-feira, na reportagem que trata dos detalhes da casa onde viveu Bin Laden. O repórter está no centro da operação narrativa. Desde a cabeça da reportagem, o apresentador anuncia que os repórteres do JN buscam detalhes da casa. Na verdade, detalhes novos não surgem. Apenas uma narrativa que reconstitui o ambiente, o lugar e as pessoas de onde a casa está inserida. Isso já havia sido feito pelo próprio JN em outras reportagens, muitas nem especificamente sobre a casa. O diferente agora – se é que há – é o fato de uma equipe do JN circular na vizinhança e reconstituir esse cenário, com elementos da sua vivência, o ato de passar por ali. Há, inclusive passagem do repórter junto ao muro, mostrando medidores de energia e usando isso como recurso para revelar detalhes da disposição dos cômodos da casa. Informação que se tinha e que poderia ser transmitida a quilômetros da casa, sem necessariamente ter de tocar no muro e nos medidores de energia elétrica. 5.4.2.5 Imagens A recorrência de imagens de forma e aparência muito similares ao longo do corpus me fez pensar: que tipo de imagens são levadas ao ar no Jornal Nacional? Levando em consideração que a questão tem significância no percurso para atender as demandas do problema da pesquisa, decidi observar também essa recorrência constituindo as categorias padrão, midiatizadas, autorreferente e de arquivo, exclusivas, amadoras, simulacro de ação e oficiais.

112

5.4.2.5.1 Padrão São as que tipicamente vimos em televisão, nos telejornais e demais programas. É uma imagem plasticamente limpa, sem movimentos ou com pouco movimento de câmera. Para simplificar, é aquela imagem bem padrão quase que como uma fotografia em que os elementos ali dentro estão em movimento. Embora não esteja tão interessado em planos e enquadramentos específicos, entendo que essa categoria inclui planos mais abertos. Percebese que essas imagens são captadas pela emissora e tem um alto padrão de qualidade. Figura 13 - imagem captada pela emissora na forma padrão

Fonte: Obama...2011 5.4.2.5.2 Midiatizadas Essas são aquelas que estão sendo reutilizadas. São imagens que já foram usadas por outras emissoras e que, muito provavelmente, chegam até a redação através das agências de notícia ou pela compra direta. Como critério para identificação dessas imagens, observo a sinalização de logomarca da emissora de origem e/ou créditos em geradores de caracteres que creditam a origem da imagem. Parto do pressuposto da legislação sobre o direito a propriedade de imagem de quem as captou. Caso haja alguma infração a regra, assim como o espectador leigo, não tenho como identificar.

113

Figura 14 - Bin Laden em imagem já usada em TV do oriente

Fonte: QUEM...2011 5.4.2.5.3 Autorreferente e de Arquivo São as imagens já utilizadas, mas pela TV Globo. Identifico-as sempre através da logomarca que sinaliza que é uma imagem de arquivo. Pode, ainda, ser uma imagem da imagem veiculada pela TV, como no caso da reprodução do Plantão dado pela emissora quando foi confirmada a morte de Bin Laden. Figura 15 - Logomarca indica quando imagem é de arquivo

Fonte: A AÇÃO...2011

114

5.4.2.5.4 Exclusivas Como o nome já sugere, são as obtidas com exclusividade pela TV Globo. A identificação delas se dá também como logomarca específica, mas também com referencial textual na locução em off do repórter. Figura 16 - Logomarca padrão identifica imagens exclusivas

Fonte: BIN LADEN...2011 5.4.2.5.5 Amadoras São as captadas por cinegrafistas amadores e que apresentam padrão estético ruim, por vezes, escuras, com movimentos bruscos e chuviscos. Além dos cinegrafistas amadores, em geral os telespectadores que enviam as imagens à redação, também incluo nesse grupo as imagens feitas pela emissora, mas que apresentam certa similaridade no padrão estético apresentada pelas captadas pelos amadores. Podem ser originárias de câmeras escondidas ou com problema de enquadramento, foco ou iluminação.

115

Figura 17 - a qualidade e o movimento revelam imagens amadoras

Fonte: MAIS...2011 5.4.2.5.6 Oficiais Essas imagens apresentam variados padrões estéticos. São as imagens fornecidas por órgãos oficiais como governos, polícias ou agentes de fiscalização. Podem até ter similaridade com imagens amadoras. Porém, opto por não enquadrar no mesmo grupo porque, embora tenha sido captada com padrão estético amador, não foi engendrada e preparada como quando um amador perceber algo inusitado e que capta a imagem como flagrante, mesmo que provocado. Além disso, essas imagens em geral são distribuídas a várias emissoras. E se não são, de qualquer forma revelam o laço estreito da redação com essa organização.

116

Figura 18 - Policia do RJ divulga imagens que levaram a prisões

Fonte: POLÍCIA...12 5.4.2.5.7 Simulacro de Ação As imagens também possuem apresentação estética variada. Elas remontam a uma ação que se desenrola diante das lentes da câmera. Por vezes, apresentam movimentos bruscos e descontinuados. Como se o cinegrafias corresse atrás de um bandido junto com os policiais, mimetizando a visão que o espectador teria se estivesse ali junto do grupo. São imagens que também captam ação, como se tudo estivesse ocorrendo naquele instante, bem ali diante da câmera. É sabido que nem sempre a imagem é de fato o que parece ser. Policiais perfilados se preparando para subir numa favela, por exemplo, podem estar se preparando para a ação. No entanto, também já podem estar mais do que preparados e repetem os movimentos para que sejam captados. Como não é possível identificar uma ou outra sem estar presente no instante da captação, opto por colocar as duas debaixo dessa ideia de simulacro de ação.

117

Figura 19 - câmeras instaladas em caça acompanham voo

Fonte: PELA...2011 Antes de quantificar e detalhar as ocorrências em cada um dos tipos de imagens é importante destacar o principal critério adotado no momento da catalogação. Sempre que percebia a incidência de um tipo de imagem, marcava na tabela de análise. Isso significa que uma mesma reportagem tem mais de um tipo de imagens, já que levo em conta todos os tipos que aparecem nela e não somente o preponderante. Isso também explica o grande número de ocorrência de imagens padrão – 57 em toda a amostra de análise. Observei, ainda, que nenhuma reportagem se dá sem a presença de imagens-padrão. Elas ocorrem ao menos em momentos de fazer a ligação entre outros tipos de imagens ou nas passagens de repórteres. São elas também que tem esse caráter organizador na narrativa telejornalística. Quando ocorrem, o texto e as informações captadas pelas imagens passam a ter papel de destaque, sendo ainda mais valorizados. A segunda maior ocorrência – 23 casos – é de imagens midiatizadas, que tem a veiculação numa espécie de segunda mão. É um indício de que nem todas as imagens veiculadas pelo JN são de fato captadas para esse fim. Na verdade, muitas são trazidas à tona na forma de reutilizações. Nessa semana de análise, observo que muitas delas são de agências internacionais e dão conta de mostrar imagens que circulam em pouca quantidade. É o caso do interior da casa de Bin Laden. Além de aparecerem em diversas reportagens ao longo da semana, observo que se repetem em diferentes telejornais da Globo e em outras emissoras. O mesmo ocorre com imagens de Bin Laden vivo e de outros momentos da operação divulgados pelo governo norte-americano – além do caso das imagens de Bin Laden assistindo a si mesmo numa pequena televisão. Isso demonstra que muito das imagens usadas para narrar a morte de Bin Laden são captadas e distribuídas por duas fontes, em primeiro lugar pelo governo dos Estados Unidos e depois pela imprensa norte-americana. A essa constatação, ainda incluo outra inferência. As imagens padrão que são usadas para narrar acontecimentos que atualizam o acontecimento morte de Bin Laden seguem a mesma orientação. Ou seja, embora captadas e veiculadas em

118

primeira mão ainda tem aparência estética muito similar às veiculadas por agências e pela própria TV norte-americana. Para constatar isso, basta um rápido exercício: observe as reportagens do primeiro dia que se apóiam muito nas imagens midiatizadas. Depois, observe o padrão estético das imagens nas reportagens de Marcus Losekann. São realmente muito similares. O enquadramento aberto valoriza o cenário e, sempre que possível, o movimento de pessoas e agentes nas cenas. Nenhuma imagem produzida pela equipe do Jornal Nacional subverte qualquer lógica já apresenta e sequer traz, de fato, algo novo em termos de imagens que revelam. Claro, a isso também podem ser atribuídos os padrões e planos de captação de imagem em telejornalismo. De qualquer forma, a semelhança entre elas é realmente grande, vistas assim, poderia-se afirmar que são as mesmas imagem, apenas com variações de quadros. Figura 20 - imagem não exclusiva da casa em reportagem na segunda

Fonte: COMO...2011

119

Figura 21 - imagem exclusiva da casa em reportagem na terça

Fonte: MAIS...2011 A terceira maior incidência – com 19 ocorrências – é de imagens de arquivo. Seu papel e função dentro da narrativa telejornalística é muito similar às das imagens midiatizadas. São trazidas à veiculação depois de já terem sido usadas em algum momento. A diferença é de que essas são apenas da emissora. Além disso, quando a logomarca arquivo é acionada no canto direito da tela, aciona-se também um ícone de memória. Às vezes, ele chega a funcionar para recuperar momentos de histórias já contadas. Um exemplo é a reportagem que denuncia safáris no Pantanal. Em outro momento, o JN já usara imagens daquela mesma fazendeira mostrando uma postura completamente diferente. Na época, posava como defensora de projeto de preservação da onça-pintada. Isso é destacado no texto da reportagem, que usa imagens da época com o selo de “arquivo”. Assim, aciona-se junto com a logomarca uma ideia de memória.

120

Figura 22 - imagem de outra reportagem com a pecuarista

Fonte: IBAMA...2011 As imagens amadoras, que são catalogadas em 17 ocorrências, evidenciam o instante do flagrante. Elas conferem ainda mais legitimidade à narrativa quando aparecem e retratam momentos que não seriam possíveis de retratar com todos os equipamentos necessários para uma captação de alto padrão. Em geral, o flagrante contido nelas é tão forte que até problemas de iluminação, foco, entre outros, são plenamente aceitáveis. É o caso das imagens internas da casa de Bin Laden logo depois da ação dos soldados americanos. Uma sociedade em vias de midiatização gera conteúdos e os coloca em circulação (FAUSTO NETO, 2008). Teoria plenamente aceitável se trazida para o universo da imagem já que hoje dispositivos móveis como telefones celulares e câmeras fotográficas portáteis, cada vez mais populares, são capazes de fazer vídeo com qualidade aceitável. Porém, mais do que isso, diante da prática jornalística sou tentado a observar o espaço que se abre no produto do telejornalismo para essas imagens. Observe como mesmo quando a equipe do Jornal Nacional chega à casa de Bin Laden e capta suas próprias imagens não abandona as feitas ainda de forma amadora. O mesmo ocorre com as que revelam safáris em pleno Pantanal e com as que revelam a descoberta da Polícia Federal de uma nova rota do tráfico de drogas que passa pelo Brasil. Entendo que a significância das imagens é tamanha que não nos permite que sejam deixadas de lado. Mas o que chama atenção é o espaço que se abre para elas. Ao mesmo tempo que mostram o flagrante do acontecer de determinado acontecimento, demonstram que o jornalismo não foi capaz de fazer suas captações em padrões convencionais. Curioso que mais do que desqualificar ou minimizar a importância do jornalismo, passa a se enaltecer a operação do jornalista que insere ao seu discurso imagens que sequer foram captadas dentro

121

da lógica ou programação jornalística. É como se qualquer um fosse de fato capaz de captar as imagens e colocá-las em circulação. Porém, ninguém é tão capaz de conferir um discurso de credibilidade aquelas imagens do que o jornalismo, ao fazer delas também parte de seu discurso. Mas qual seria a imagem dentro do discurso do telejornalismo capaz de competir com as imagens amadoras? Claro, excluindo-se os flagrantes captados pelos próprios repórteres cinematográficos. São as imagens que representam – ou até imitam – movimentos de ação e que aqui na pesquisa chamo de imagens de simulacro de ação. Na amostra do corpus analisado essas imagens aparecem em sete ocasiões. Em geral, são aquelas em que parecem levar o espectador para dentro do furacão, no momento da ação, como se a lente da câmera fosse a retina do olho do espectador. E pode ser das mais simples, como na reportagem de sábado sobre o estudo do Dnit e as rodovias de Santa Catarina. Na reportagem, uma câmera é posta na janela de um carro em movimento e flagra imprudências de outros motoristas. Os enquadramentos e movimentos da câmera imitam o olhar de uma pessoa observando através da janela do carro tais movimentos. Figura 23 - câmera imita visão de quem observa pela janela do carro

Fonte: ESTUDO...2011 Outro exemplo que já destacamos é o caso da primeira mulher a pilotar avião de guerra da FAB. Câmeras instaladas na cabine da piloto parecem levar o espectador junto nesse primeiro voo. Há, ainda, as imagens como do projeto JN no Ar que trazem passeios e ângulos que colocam o espectador dentro d’água, ou na reportagem sobre as cheias na região amazônica em que a câmera vai dentro de um barquinho como se levasse o espectador. No início da semana, reportagens sobre a comemoração de norte-americanos pela morte de Bin

122

Laden trazem também imagens com ângulos que colocam quem assiste a reportagem dentro da ação, em meio àquelas pessoas. Todos os tipos de imagens buscam conferir legitimidade ao discurso testemunhal do jornalismo. Uma narrativa de acontecimento que conta com esse tipo de imagens parece estar mais próxima do instante do acontecer. Continua sendo o jornalismo reconstituidor de acontecimentos através de relatos, mas com imagens que aproxima mais a narrativa do acontecendo. O resultado final é a impressão de que se tem um telejornalismo menos feito de relato e mais de testemunho. O que suponho ser só impressão, já que as imagens funcionam como simulacro, são preparadas para espreitar o acontecimento ou dizem respeito a um enquadramento em flagrante de um acontecimento passado, já acontecido. Ainda sobre as imagens de simulacro de ação destaco o papel das simulações através de artes em gráficos de animação. Eles ocupam o espaço da falta de imagens, quando é necessário reconstituir momentos muito específicos de ação. Funcionam como se fossem simuladores que reconstituem momentos. No entanto, é importante que não se perca de vista que os simuladores são construídos a partir de versões e de relatos. No corpus da pesquisa, um exemplo é a reportagem que vai ao ar no dia 05/05, quinta-feira. Ela traz mais uma versão sobre a operação norte-americana e a morte de Bin Laden. Os gráficos simulam situações de acordo com esses novos relatos que surgem. Figura 24 - simulação da entrada de soltados na casa de Osama

Fonte: MAIS UMA...2011 Os outros dois tipos de imagens, as exclusivas e as oficiais, tem o mesmo número de ocorrências – cinco cada uma. Há casos em que as imagens exclusivas são também imagens amadoras, como no caso dos safáris no Pantanal. Outros casos são os de caráter mais referenciais, como as imagens da casa de Bin Laden no Paquistão captadas pela equipe do

123

Jornal Nacional. São aquelas imagens que, como já destaquei, pouco agregam em termos de novidade sobre o acontecimento, mas demonstram poder da emissora por ter enviado para lá seus correspondentes que vão atrás de visões individuais dos acontecimentos. As oficiais são de flagrantes, portanto, muito similares às amadoras. A diferença é que são captadas por órgão oficiais e distribuídas por eles mesmos. É o caso das imagens de Bin Laden assistindo a si mesmo na televisão. Ou, ainda, são imagens de momentos solenes como a de sessões do Senado ou do Supremo Tribunal Federal. Numa reportagem sobre medidas provisórias, são usadas imagens da sessão do Senado fornecidas pela TV Senado. E, também, a sessão que concedeu direitos a casais homoafetivos é recontada a partir de imagens oficiais captadas pelo Supremo Tribunal Federal – a TV Justiça. E no que diz respeito ao empírico, percebo que até agora que o grande objetivo é buscar imagens que se aproximem o mais possível do instante do acontecimento. Daí, a valorização das imagens de simulacro de ação, amadoras e as oficiais que captam o instante ou instantes próximos ao acontecimento. É claro que o telejornalismo busca ferramentas para ser gerador dessas imagens. No entanto, o que constato com maior evidência, é a necessidade de ser detentor de imagens, não importando quem as gerou. O que o telejornalismo do JN parece valorizar é a articulação das imagens que mais legitimam sua narrativa sobre o acontecimento. 5.4.2.6 Personagens e Fontes Já apresentei anteriormente a noção que constituí de jornalismo, enquanto articulador de experiências a partir de vivências. Assim como a noção de narrativa. Porém, considero necessário que recupere aqui dois pontos importantes de meu entendimento sobre os dois conceitos. O primeiro é o de que o jornalismo se faz a partir da vivência – do jornalista - e através da vivência de quem de fato viveu, de alguma forma, o acontecimento. O segundo é de que a narrativa é o que confere sentido ao acontecimento. Ou seja, a vivência de alguém sobre algo é a narrativa que constitui sentido a esse acontecimento. Pareando essas duas ideias, chego à seguinte construção: são as fontes que conferem sentido narrativo ao acontecimento e o relatam ao jornalista. São elas – e todas as suas versões e visões – a base para o desenvolvimento do trabalho jornalístico. Por isso, aqui, falando de reportagem, resolvi olhar com mais vagar para as fontes do jornalismo do JN e mapeá-las. É bem verdade que a fonte está presente em todas as manifestações da notícia no telejornal. No entanto, é na reportagem que vemos o produto dessa relação jornalista e fonte como resultado final

124

personificado. Ou seja, é na reportagem que a fonte aparece. Sim, está na nota pelada, coberta ou vivo. Mas ela tem cara, aparece e fala somente na reportagem. Por isso, aqui, abro essa frente de observação. E nos movimento do empírico, percebo que elas podem ser de três ordens: oficiais, especialistas e personagens. Ainda, no meandro de cada categoria, identifico uma variação que me parece interessante observar. Vejo que as fontes podem ser referentes ou de testemunho. 5.4.2.6.1 Oficiais Como o próprio nome diz, são aquelas que têm legitimidade e lhes é conferida autoridade de lugar de fala no corpo da reportagem. É o governo que fala sobre a inflação, a prefeitura sobre o buraco de rua, nações sobre suas relações comerciais, enfim, todos aqueles que desfrutam de um status na organização social. É quase que o mesmo status que lhe é conferido no desenvolvimento da reportagem. 5.4.2.6.2 Especialistas São os entendidos no assunto. Sua fala não tem a outorga de ser autoridade oficial, mas são estudiosos do assunto e o conhecem em profundidade. Vão desde os mais técnicos e graduados como economistas, doutores do direito, pesquisadores, analistas, entre outros, até os mais inseridos na realidade do estofo social, como o gerente de loja que percebe o aumento nas vendas, mas também sabe justificar e defender a ideia do surgimento de uma fenômeno, ou o professor em sala de aula que sabe porque as crianças não entendem matemática. Poderia, inclusive, analogicamente à pesquisa científica, dizer que os especialistas podem ser do mundo teórico e epistemológico ou prático e empírico. 5.4.2.6.3 Personagens É o que no jargão jornalístico conhecemos como case, o caso. São as pessoas que vivem a história que está sendo contada e servem como um exemplo prático daquela manifestação. Vai desde a dona de casa que percebe que a inflação sobe porque os preços aumentam no supermercado, o menino que tem dificuldade de aprender matemática e a família que foi ao shopping fazer compras e aproveitar a liquidação da estação.

125

A maioria das fontes catalogadas em todo o corpus da pesquisa é do tipo oficiais. Chega a 47 ocorrências. Em muitas situações é essa fonte que pauta a notícia, como no caso da pesquisa do Dnit que revela o estado que tem, proporcionalmente, o maior número de mortes em rodovias federais. Outro exemplo é a reportagem de sexta-feira, que apresenta o mercado de consumo de homossexuais. A fonte oficial, nesse caso, é a pesquisa que revela esses dados. Em outras situações, há contraposição entre fontes oficiais. É claro, como fontes oficiais entendo aquela que responde oficialmente por organismo organizado, não somente governos e instituições. É o caso da reportagem que foi ao ar em 06/05, na sexta-feira. Nela, Al Qaeda fala enquanto fonte oficial de organização terrorista. Reconhece a morte de Bin Laden e faz novas ameaças aos Estados Unidos, que responde como fonte oficial de um governo. Mas há também casos – e muitos – em que as fontes usadas para contar a história são de mesma natureza, ou mesmo lado, no jargão jornalístico. As primeiras notícias sobre a morte de Bin Laden tomam somente como fontes o governo norte-americano. Depois, aos poucos, outras vozes oficiais, como ONU e governo paquistanês, começam a ter voz. Algumas narrativas são constituídas com poucas evidências das fontes. É o que caso de reportagem de quinta-feira, que revela mais dados sobre a casa onde vivia Bin Laden. Todo texto da reportagem se desenvolve sem revelar quem é a fonte dessas informações. Apenas a cabeça e o pé referem à fonte. E na mesma edição, outra reportagem fala “em nova versão sobre a morte de Bin Laden”, mas sequer é atribuída a alguém essa nova versão. Nem mesmo o vazio, “fontes oficiais”, “fontes da Casa Branca” ou mesmo “a imprensa norte-americana”, usadas muitas outras vezes. Em outras, como na segunda reportagem da edição de segundafeira, tece narrativas sem citar fonte qualquer. A reportagem tem o intuito de mostrar quem era Bin Laden. Várias informações dão dadas como verdades absolutas, sem sequer creditar de onde surgiu a informação. E se as fontes oficiais aparecem em maior número, as de menor número são os especialistas. Algumas referendam versões de fontes oficiais ou percepções defendidas pela narrativa. Mais uma vez, é o caso da reportagem sobre a pesquisa do Dnit e o número de mortes em estradas de Santa Catarina. Outras surgem para aprofundar e elucidar situações. O exemplo é a reportagem que destaca que a mulher flagrada promovendo safáris no Pantanal pode levar multa milionária. A constatação é feitas por autoridades fiscalizadoras e organismos ambientais depois de assistirem novamente a reportagem com a denúncia, veiculada no dia anterior. Ou como na de sexta-feira, que narra a apreensão da polícia de São

126

Paulo de outro tipo de droga, o oxi. O especialista surge para explicar a composição da droga e os efeitos no organismo humano. Os personagens ou cases estão em 32 ocorrências. Com operação similar a dos especialistas, eles dão corpo e cara para notícia. É como se o especialista fosse o elemento a trazer a explicação e o personagem o exemplo em si. Em telejornalismo, é muito comum o uso do personagem como caráter humanizador da notícia. É vista também, na prática jornalística, como a voz da audiência na própria notícia. Nessa semana do JN, ela aparece muito como ilustração e exemplificação. Assim, apóia e até dá o tom da reportagem. Na edição de sábado, por exemplo, estão presentes na reportagem que fala da decisão de campeonatos estaduais, que relembra um mês da tragédia de Realengo, na que fala da ação dos voluntários para as vítimas das chuvas em Pernambuco. Como destaquei quando falei em movimentos do discurso na composição da narrativa, os personagens também têm esse caráter de legitimar a ideia que a notícia está tentando passar e para isso é necessário um encaixe perfeito nas falas. A reportagem que abre a edição de sexta-feira destaca que a inflação ultrapassa a meta do governo, mas o ministro diz que o pior já passou. Observe como a narrativa é toda contada a partir do supermercado e através de personagens. Afinal, é lá que as “pessoas comuns” sentem a inflação. Apresentador: nos últimos 12 meses, a inflação medida pelo principal índice do Brasil, o IPCA, ultrapassou a meta estabelecida pelo governo para 2011. Apresentadora: e diante da preocupação que esse número provocou, o ministro Guido Mantega, da Fazenda, disse que o pior já passou. Repórter em off: (imagens de supermercado) na hora das compras, é a palavra mais lembrada. Sonora personagem: a inflação, né?! Repórter em off: o IPCA de abril ficou em zero vircula 77 por cento. Em março, 0 virgula 79. Os combustíveis foram os grandes vilões. Com a alta de preço do etanol e da gasolina, o que se gastava para encher o tanque já não é mais suficiente. Sonora de personagem no posto de combustível: “tava” dando na base dos 120 (Reais). Agora, ta na base dos 140, 145. Repórter em off: os alimentos também subiram. Mas menos do que no mês passado. Personagem no supermercado: não ta subindo tanto, mas continua em alta. Repórter em off: a meta da inflação para 2011 é de quatro e meio por cento. Com uma tolerância de dois pontos percentuais para cima chega a seis e meio por cento.

127 Mas o acumulado da inflação nos últimos 12 meses ficou em seis virgula 51 e ultrapassou o chamado teto da meta. Passagem da repórter: desde junho de 2005, esse índice não ultrapassava o teto da meta de inflação. E essa alta vem num momento em que o governo lança mão de várias medidas para conter o aumento de preços. A taxa de justos vem subindo, os empréstimos e financiamentos estão mais caros. O que dificulta a situação de empresas e faz os brasileiros pensarem mais na hora de gastar. Repórter em off: só esse ano, a taxa básica de juros da economia, a Selic, teve três aumentos, depois de seis meses estável. O imposto que incide sobre operações financeiras, como o chefe especial, por exemplo, dobrou de um e meio para três por cento ao ano no mês passado. O ministro da Fazenda afirmou que o pior momento está sendo deixado para trás. Sonora ministro Mantega: o preço do etanol ao produtor já caiu bastante e logo mais chegará na bomba de gasolina. Nós já podemos respirar, em maio, com, esperando uma inflação de IPCAem torno de 045, 050. Repórter em off: para este economista, o impacto das medidas para conter a inflação não é imediato. Sonora especialista: nós temos uma inflação que parte dela vem de produtos de alimentos, vamos dizer, não tem o controle direto. E parte vem dos serviços que é um pouco do resultado desse crescimento com distribuição de renda. As pessoas estão querendo consumir mais. Eu acho que nós vamos ter uma desaceleração fechando o ano em torno de seis e dois, seis e três e no ano que vem ficaremos um pouco abaixo, mas não chegaremos a quatro e meio. Repórter em off: para dona Berta (a mesma da primeira frase da reportagem) a meta é fazer o dinheiro da aposentadoria render até o fim do mês. E não está dando para cumprir. Personagem: faço umas comprinhas e acabou. O resto do mês tem que se virar de alguma forma, fazer um serviço extra, alguma coisa para poder ter um dinheiro.

A reportagem citada acima, além do encaixe e de articulação dos personagens a fim de referendar a ideia da reportagem, também evidencia como mais de um tipo de fontes pode articular dentro da reportagem. O exemplo cabe, ainda, para demonstrar o funcionamento desses três tipos de fontes detectados ao longo do corpus de análise da pesquisa. 5.4.2.7 Quanto a Apresentação da Fonte Como destaquei, observo também que há uma variação quanto a apresentação da fonte dentro das reportagens do JN. Além de ser oficial, especialista ou personagem, a fonte pode aparecer de duas formas: referente ou testemunhal.

128

5.4.2.7.1 Referentes São as fontes que não aparecem, mas são citadas. Não há sonoras e nem imagens dessas fontes. Na maioria dos casos, nem sequer nomes. Porém, há referência a elas no texto da reportagem. Podem ser os analistas do mercado financeiro, grevistas, ou seja, um grupo maior, ou mesmo citação genérica de dados, pesquisas eleitorais apontam, indicadores internacionais, etc. Para mim, interessa observar o uso desse primeiro grupo já que o segundo em geral é marcação de dados frios – que poderiam aparecer com referencia correta. 5.4.2.7.2 Testemunho É quando a fonte tem cara e fala na reportagem. É o especialista que explica o dado, o ministro que disseca o novo pacote econômico do governo ou mesmo o case que está situando o seu caso dentro da história. No entanto, quero fazer apenas mais uma ponderação. Há situações em que o case é a reportagem. Um exemplo é o ex-jogador de futebol Pelé recordando suas participações em filmes. Claramente é um exemplo de fonte personagem. Porém, se ele fala na reportagem, tem voz sobre a especificidade desse assunto num tempo presente – como é o caso – é fonte de testemunho. Se só aparecem imagens dele, é citado, mas sem fala ativa é de referência. Na maioria das ocorrências, as fontes são testemunhais. Significa que em 48 situações a fonte fala ou aparece, tem nome. É mais do que o dobro das 23 ocorrências em que a fonte é apenas referida, quando apenas lhe é creditada uma informação. São indicativos claros de que as narrativas do JN sobre acontecimentos são, como todo jornalismo, apoiadas em relatos. Como vimos em camadas de análise anteriores, uma mesma reportagem pode conter tanto fontes referentes como testemunhais. É o caso da reportagem de sábado que trata de dados do Dnit que apontam as estradas federais de Santa Catarina como as que, proporcionalmente tem o maior número de mortes. O Dnit enquanto fonte da informação é apenas referida. Ninguém representando o órgão ou pesquisa fala. Já os especialistas da matéria são testemunhais, pois literalmente falam na matéria e são devidamente creditados. Operação muito similar se dá em reportagem que narra o encontro do presidente Barack Obama com militares que participaram da ação que matou Bin Laden. Os soldados propriamente ditos e as informações históricas aparecem apenas com referência. A única fonte que realmente é testemunhal nessa reportagem é Obama, presidente dos Estados Unidos. Ainda na sexta-feira, reportagem revela que a organização Al Qaeda reconhece a morte de seu

129

líder e faz novas ameaças aos Estados Unidos. Essa organização não tem voz, nem presença testemunhal, resignando-se apenas a referências as suas informações. O movimento e a intencionalidade parecem claros: dar cobertura às ações da Al Qaeda, mas sem dar a fonte e espaço a organização terrorista que ameaça o mundo todo. Já as reportagens baseadas em pesquisas, de modo geral, buscam testemunhos que auxiliem na compreensão e dotação de sentidos às informações que são reveladas na constatação fria dos números da pesquisa. É o caso da reportagem que demonstra em números o quanto os homossexuais são consumidores ativos. A pesquisa, os números, é a referente. É a partir dela que a narrativa se desenvolve. Mas é nos personagens e na sua apresentação testemunhal que as informações passam a ter sentido. Reportagens com caráter histórico também partem de pesquisa, só que de outra natureza, mais documental. Na que lembra que a ação dos EUA em território paquistanês não foi a primeira em território estrangeiro, os acontecimentos históricos são trazidos apenas como referência. Em geral, são fontes oficiais que fornecem as informações. Testemunho pode até ocorrer por representantes de governos ou dirigentes de órgãos detentores da informação ou pesquisa. Mas, em geral, são personagens ou especialistas que têm o intuito de esclarecer e até exemplificar determinadas situações. O que se percebe nessa escolha entre uma fonte testemunhal ou referente é o peso que quer se dar a quem passa a informação. Se a fonte for referente, em geral, não precisa ser tão específica. Pode ser o governo norte-americano, a imprensa britânica, soldados norteamericanos no Afeganistão, ou até ainda mais genéricas como fontes da Casa Branca, informantes infiltrados e etc. Até porque essa fonte não tem cara. A informação é mais valiosa. Já na testemunhal, a fonte tem valor e precisar ter voz ativa e cara para ter ainda mais peso na história. Ela legitima e especifica a origem da informação. É apresentada com cargo e nome completos sem generalidades. Há situações em que, na composição narrativa, é possível optar entre uso de fontes referentes ou testemunhais. Não vejo problema em optar por uma ou outra. Embora tragam conduções de textos narrativos de forma diferentes, o importante é deixar claro a quem é atribuída à informação. Coisa que muitas vezes não acontece. É o caso da reportagem que vai ao ar dia 3/05, terça-feira. Ela promete revelar novos detalhes da operação de investigação que acabou na morte de Bin Laden. Ninguém fala na matéria ou tem frases e informações claramente atribuídas a alguém. É preciso rever a reportagem com muita atenção para se inferir que as informações transmitidas ali são de autoridades norte-americanas. Quando não se tem a creditação da fonte, a impressão que se tem é que essa é uma verdade consolidada.

130

Algo que já é dado e estabelecido. Quando digo que “Bin Laden é capturado e morto” essa passa a ser uma verdade estabelecida. Embora haja dúvida, internamente se sabe que é verdadeiramente morto. Agora, quando digo que “Bin Laden é capturado e morto, segundo o exército dos Estados Unidos”, deixo pistas que o exército está dizendo, mas que não é irrefutável e, ainda, pode haver alguém que diga o contrário. Por fim, destaco duas reportagens muito específicas. A primeira é baseada na fonte testemunhal. Na verdade, uma única fonte testemunhal, o repórter Edney Silvestre. Ele traz suas memórias como memórias do próprio JN para relembrar como foi o atentado de 11 de setembro. Em outra reportagem, que vem na sequência dessa mesma edição de segunda-feira, conta como o Serviço Secreto dos Estados Unidos descobriu o esconderijo de Bin Laden. Observe no texto o papel da fonte nessa primeira reportagem. Apresentador: e o mundo nunca mais foi o mesmo, depois daquele 11 de setembro. O Jornal Nacional daquela noite mostra claramente porque. Apresentadora: quem relembra é Edney Silvestre que, na época, era correspondente em Nova Yorque. Repórter em off: um boing cruza o céu azul de Manhattan e entra no World Trade Center, com 92 pessoas à bordo. Eram oito e 46 da manhã em Nova Iorque. O avião tinha sido seqüestrado em Boston. 17 minutos depois, um outro boing, também seqüestrado em Boston, é lançado contra a segunda torre. Quase atravessa o prédio. Bombeiros e policiais se apressam para tentar salvar vidas. Das janelas, pedidos de socorro. Depois, o desespero e os saltos para a morte. Dezenas. O repórter cinematográfico Orlando Moreira registra a fuga da área do atentado. Choro, gritos, correria. Eu estava lá. Reprodução da passagem do repórter à época: toda essa área próxima ao atentado ficou fechada. Lá onde estavam os prédios do World Trade Center só fumaça. Os dois edifícios de 110 andares vieram abaixo após as explosões. Repórter em off: a torre sul foi a primeira. Às dez e 28 da manhã, os 110 andares da torre norte também desmoronaram. Mais de duas mil e 600 pessoas morrem. Inclusive, bombeiros e policiais que estavam ali lutando para salvar vidas. Em Washington, um outro boing é jogado contra o Pentágono. O centro das decisões militares dos Estados Unidos. Foi pouco depois das nove e meia da manhã. 184 mortes entre passageiros e funcionários do Pentágono. Reprodução da passagem do repórter Luis Fernando Silva Pinto à época: o coração das Forças Aramadas foi atingido. A capital desse país é muito mais vulnerável do que os cidadãos podiam imaginar. Repórter em off: o então presidente Jorge Bush então reconhecia: era o maior atentado terrorista da história. Um outro avião, seqüestrado no aeroporto de Pittsburg cai na Pensilvânia, derrubado pelos próprios passageiros que se rebelaram contra os terroristas. Ninguém sobreviveu. O espaço aéreo dos Estados Unidos foi fechado. Em Nova Iorque, o sistema de transportes parou de funcionar. Pontes e viadutos foram interditados.

131 Recuperação de passagem do repórter Jorge Pontual à época: Times Square, aqui em Nova Iorque, parou. As pessoas andam de um lado para outro na rua, em estado de choque. Repórter em off: ao longo de toda a edição do Jornal Nacional, Zeleide Silva atualizava, ao vivo, as informações. Recuperação de vivo de Zeleide à época: algumas linha do metro já estão funcionando. Túneis e pontes foram liberados. Repórter em off: mas a grande dúvida continuava: de onde partira a ordem para os atentados daquela terça-feira? Ao final do Jornal Nacional, Zeleide Silva trouxe a informação. Reprodução de outro vivo de Zileide à época: a inteligência americana conseguiu interceptar mensagens de Osama Bin Laden sobre os ataques. Essa é a última informação, que nós estamos acabando de receber aqui no escritório da Globo em Nova Iorque. Repórter em off: ontem, primeiro de maio, a cassada a Osama Bin Laden terminou. O terrorista foi morto em seu refúgio, no Paquistão. Passagem atual de Edney: Osama Bin Laden morreu, mas o terrorismo ainda preocupa os Estados Unidos. O Departamento de Estado Americano fez um alerta a todos os seus cidadãos, onde quer que esteja, para que ajam com cautela e que mantenham contato com suas embaixadas e consolados que continuaram funcionando normalmente. Apresentadora: três brasileiros morreram nas torres gêmeas no atentado de 2001.15

Aqui, estamos olhando como uma fonte testemunhal é apresentada. Mas o exemplo tem ainda maior significância. A reportagem poderia ter sido toda construída com pessoas que vivem ou viveram lá naquela época, costurando as falas com os fatos através de texto de repórter. Da mesma forma, seria uma reportagem com fontes testemunhais. Mas, aqui, o JN quebra uma das máximas do jornalismo. Narra em primeira pessoa e traz a sua memória – através da memória do repórter – para contar um fato do passado e que foi conteúdo de suas reportagens. As implicações dessa mudança de postura anda não sei avaliar, mas, com certeza, é um ponto que ainda voltarei à reflexão na pesquisa. Vejamos, agora, o segundo exemplo, da reportagem em que a fonte é referente, as autoridades americanas. Porém, isso só é possível constatar depois de ver atentamente os movimentos do texto. Num primeiro momento, a impressão que se tem é de que sequer há fonte na reportagem. Apresentadora: o criminoso mais procurado do mundo estava numa cidade do Paquistão que abriga uma base militar. E foi seguindo um mensageiro, durante 15

Erros de ortografia e digitação são mantidos como no instante de registro no diário de campo.

132 quatro anos, que o Serviço Secreto Americano descobriu onde Bin Laden se escondia. Repórter em off: nem nas montanhas no Afeganistão, nem nas cavernas do Paquistão. Osama Bin Laden vivia nos arredores de Abbottabad, a 100 quilômetros de Islamabad, capital do Paquistão. Uma cidade com 90 mil habitantes. Destino turístico no verão. Mas para chegar até lá, o Serviço de Inteligência Americano seguiu mensageiros de Bin Laden. Passagem do repórter: a operação começou em 2007. Os agentes da CIA, ali do comando do Pentágono, identificaram um homem de confiança do terrorista. Dois anos depois, os locais de atuação desse mensageiro, já estavam mapeados. Repórter em off: um deles chamou atenção. Uma casa oito vezes maior do que as da vizinhança, com muros de até cinco metros de altura e arame farpado, poucas janelas, sem internet e nem telefone, onde todo o lixo era queimado num espaço ao lado. Em agosto do ano passado, os agentes da CIA se convenceram que ali vivia o terrorista tão procurado. Passagem do repórter: nos últimos oito meses, Barack Obama se reuniu cinco vezes aqui na Casa Branca com a cúpula do Serviço de Inteligência para tratar do assunto. Até que, na última sexta-feira, o presidente americano autorizou a operação. A ideia era bombardear o local onde estava Osama Bin Laden. Barack Obama não deixou porque muitos civis poderiam ser mortos. Repórter em off: entraram em ação os navy seals, a tropa da marinha que atua no ar, no mar e na terra. É considerada a mais preparada Forças Armadas dos Estados Unidos. No começo da madrugada de segunda-feira, horário paquistanês, sem o governo local saber, dois helicópteros americanos sobrevoaram a casa. Pelo menos 20 militares desceram e invadiram o esconderijo. Houve tiroteio. Essas imagens mostram o interior da casa. Morreram o mensageiro, o irmão dele, o filho de Osama Bin Laden e uma mulher que seria uma das esposas do terrorista, usada como escudo por ele. Em seguida, Osama Bin Laden levou um tiro na cabeça e morreu. Passagem do repórter: segundo o Pentágono, o corpo de Osama Bin Laden foi colocado num helicóptero e levado para uma base americana no Afeganistão. Lá, foi coletada uma amostra de sangue para ser comparada com uma amostra do sangue da irmã do terrorista. Os exames de DNA mostraram que o corpo era de Bin Laden. Depois, segundo as autoridades daqui, o corpo foi tratado seguindo os preceitos da religião islâmica. Teria sido lavado e enrolado num pano branco, antes de ser lançado no mar da Arábia. Repórter em off: segundo a religião islâmica, os funerais devem ser feitos até 24 horas depois da morte. Ainda, segundo as autoridades americanas, não haveria tempo para escolher um lugar para enterrá-lo, sem desrespeitar esse prazo. E assim, os Estados Unidos evitaram a criação de um local que atraísse seguidores de Bin Laden.

É importante perceber esses movimentos. Detecta-se que somente na segunda metade da reportagem fica clara de ontem partem as informações para o texto. Também, é preciso que se destaque as imagens que contribuam para esse entendimento de que as informações são de

133

fontes norte-americanas. Todas as passagens são feitas diante de símbolos do governo dos Estados Unidos. 5.5 CATALOGAÇÃO, TABULAÇÃO E ANÁLISE DE DADOS. COMO SE DERAM? Depois de ter constituído o mapa e cada uma dos seus elementos, foi necessário voltar ao empírico para observar e catalogar a incidência dos elementos descritos no mapa em movimento no objeto. Com objetivo de organizar sistematicamente a observação, optei por um catálogo em tabelas. No entanto, reitero que não foi um exercício de quantificação e sim uma forma de tabulação dos dados. Depois de alguns experimentos realizados entre 9 e 15 de setembro de 2012, constatei que a catalogação e tabulação dos dados em tabelas facilitam uma observação mais clara. Cheguei a tentar abandonar tabelas e fazer descrições – em texto corrido – de cada uma das edições do recorte da pesquisa. Não considerei eficiente porque, além de gerar grandes textos, muito semelhantes às transcrições já feitas, dificultavam uma visualização mais ampla a fim de constituir e identificar cenários e movimentos. Foi assim, que chegou a esse formato apresentado a partir de minhas tabelas os mapas descritos nos itens C, que compreende o Jornal Nacional como um todo, e D, que dá tratamento especial às composições narrativas complexas, às reportagens, do telejornal.

134

6 CONSIDERAÇÕES FINAIS Esse mergulho na forma de narrar do Jornal Nacional desconstruiu algumas formulações surgidas ainda na fase de elaboração da pesquisa. Fase em que olhava para o objeto apenas como telespectador, embora já sentindo dúvidas e provocações, no início de 2011. A primeira formulação diz respeito ao lugar do jornalista enquanto narrador de uma experiência. Acreditava que o telejornalismo buscava um diferencial para sua narrativa deixando para trás estratégias que buscavam o apagamento do percurso do repórter na elaboração de seu texto. Estava ele, o jornalista, abrindo caminho para a manifestação clara de sua experiência. Uma das primeiras tensões da pesquisa se deu justamente nesse ponto. Aproximando-me do conceito Benjaminiano de narrador não foi difícil perceber que o que estava manifesto ali no texto do Jornal Nacional não era a experiência tal qual supunha. No entanto, ainda ficava claro que o telejornalismo buscava uma aproximação com o público em estratégias que vão além da coloquialidade na forma de narrar e operações já consolidadas pela prática jornalística. Se toda a narrativa é a manifestação de determinada visão de mundo, lugar de fala, posição e inserção no estofo temporal e social, não é difícil aceitar que cada um sempre terá a sua narrativa, ou versão, sobre determinado acontecimento. Motta (2007) trata a narrativa como forma de traduzir conhecimento em relatos. “A partir dos enunciados narrativos somos capazes de colocar as coisas em relação umas com as outras em ordem e perspectiva” (MOTTA, 2007, p.143). E o estado da narratividade, que impregna “a forma narrativa de contar”, é a qualidade de descrever algo através de uma sucessão de estados de transformações. “É a enunciação dos estados de transformação que organiza o discurso narrativo, produz significação e dá sentido às coisas e aos nossos atos” (MOTTA, 2007, p.143). E, ainda, numa leitura de Gergen (1996), afirma que “nossa biografia, por exemplo, não é apenas uma autopercepção de nosso eu. Ser um eu com passado e futuro não é ser um agente independente, mas estar imerso em relações, sequencias globais dirigidas a metas” (MOTTA; 2007. p-143-144), o que faz todo esse eu estar presente na “hora de narrar”. E olhando o jornalismo enquanto narrativa observo a mesma operação. Pude perceber isso na observação do Jornal Nacional. Agora, falando em prática jornalística, é preciso que se entenda que essa forma de narrar é particular. Há um modus operandi no jornalismo que viabiliza a sua forma de contar histórias – valorização do novo, do inédito, etc. Quando se fala ainda telejornalismo é preciso entender que além de toda a forma jornalística ainda cabe a forma do televisual, com toda a sua complexidade muito própria na forma de narrar. No

135

televisual, por exemplo, a narrativa não se dá sem imagens e até há uma supervalorização dessas imagens que, em geral, são submetidas à edição. Além de outros fatores como a oralidade do texto, com informações sempre de forma muito resumida, entre outros. Narrativas são visões particulares de mundo e formas de apreender um acontecimento e o transmitir na forma do relato (MOTTA, 1997). No caso telejornalismo, ainda mergulhado na forma dos relatos tanto televisuais quando jornalísticos. Essas narrativas ecoam, ou seja, encontram similaridade e identificação com públicos. Isso reforça a ideia de que toda a narrativa é apoiada em discursos, sejam específicos como o do telejornalismo ou mais amplos como os da sociedade em que esse telejornalismo está inserido. Agora, trabalhar o texto do Jornal Nacional como uma narrativa é não deixar de lado a posição do jornalista que, no texto, deixa evidente suas marcas. Até aqui, fica fácil apreender que a narrativa que incide sobre o acontecimento é a própria e particular desse telejornal – como processo final de todo uma prática de produção. Mas que narrativa é essa? Eis uma das questões postas no problema da pesquisa. No percurso, olho para a narrativa, mas não para o narrador e sim para uma espécie de “vivenciador” observando essa semana do Jornal Nacional – que vai de 2 a 7 de maio de 2011 – por períodos ao longo de 2011 e 2012. É operacionalizando o atravessamento que Vogel e Silva (2012) fazem no conceito de Benjamin sobre o narrador que começo a entender que nesse processo há o afloramento da vivência e não de uma experiência propriamente dita. São as marcas vividas pelo jornalista no contato com o acontecimento, ou mesmo com as narrativas que já se dão sobre ele, que aparecem no texto como estratégia de aproximação e fidelização com o público. É a saída para expor o processo produtivo e formação dessa narrativa jornalística para fazer o público estar cada vez mais inserido como parte do que é narrado. E diante dessa estratégia, surge uma ideia do que implica no “como deve funcionar” essa narrativa na relação com o espectador. Ou seja, ela precisa encontrar eco nos discursos do público. A vivência deve ser algo inusitado, mas que não cause estranhamento ou ainda sentimentos como pavor ou rejeição. E mais: a narrativa deve seguir a máxima de apresentar o assunto, problematizar e trazer a solução num caso em si e para si, proporcionando a “compreensão” da história narrada a partir dela e nela mesma, fazendo assim com que qualquer leitor apreenda os discursos que sustentam a narrativa e suas visões e verdade proferidas. Assim, depois desse percurso e da reflexão a partir do problema da pesquisa - “que narrativa é essa do Jornal Nacional que incide no acontecimento e quais os sentidos que

136

movimenta na construção do relato do que mais importante aconteceu no Brasil e no mundo?” - chego a uma formulação: a narrativa do Jornal Nacional acolhe narrativas, endossa discursos e os refere na composição de sua narrativa. A construção fica clara depois de observar os movimentos de diversas notícias do JN ao longo da semana de análise. A própria morte de Bin Laden surge com um discurso norte-americano que celebra o fim da era de um líder terrorista. Quase que repetindo o que já vem sendo dito por outros telejornais e agências de notícias, a edição de segunda-feira do JN se anuncia como histórica e promete detalhar a narrativa dessa morte. O que faz, na verdade, é reconstituir um mosaico ainda cheio de falhas a partir de um lugar de fala: o das fontes norte-americanas. No dia seguinte, na terça-feira, o JN apresenta como diferencial a chegada de suas equipes no cenário da morte de Bin Laden. A narrativa não apresenta o contraditório ou muda o lugar de fala. Segue a mesma “inspiração” discursiva. O diferencial apresentado fica por conta, apenas, da exposição da viviência do repórter que chega no campo. É como se a jornada dele para chegar próximo ao muro da casa de Bin Laden trouxesse uma maior aproximação com o acontecimento do que tudo que já vinha sendo feito (o efeito de real). O mesmo é operacionalizado nas reportagens do JN no Ar sobre as cheias no norte e nordeste do país. Num dia, a notícia, reportagem1 sobre o acontecimento. No segundo, a reportagem sobre a reportagem. Ou a vivência da repórter no contato com as pessoas que vivem o drama das cheias e sua própria impressão diante do fenômeno. São elementos que dão pistas sobre que narrativa é essa. Uma narrativa que busca sensibilização a partir da narrativa da vivência de quem colhe o acontecimento e o traduz para o discurso jornalístico. E não é para qualquer jornalismo que a tradução se dá. É para um jornalismo de televisão, o televisual. O que faz com que o narrador apóie seu texto nas imagens e na tensão quase que dramática. Observando a forma como as informações são veiculadas no telejornal se percebe que a incidência ou não de imagens confere grau diferente de importância ao que está sendo narrado. Notas peladas são notícias menores, apenas em texto lido pelo apresentador. Notas cobertas um pouco mais importantes, já que tem imagens que ilustram o texto e, assim, pode-lhes ser destinado mais tempo no telejornal. Por fim, a reportagem, com muito mais imagens e tempo no telejornal, mergulhadas em texto estritamente apoiado nas imagens. Mesmo em edições menores do JN, como a de quarta-feira, as imagens continuam ocupando sua posição de destaque no programa. Com telejornal reduzido, a maioria das

1

Lembrando que, baseado na prática exercida pelo JN, tomo reportagem como um tipo de notícia. Ainda com os princípios do telejornal, tudo que está contido nele é notícia. Notícias que podem aparecer na forma de reportagem, nota coberta, nota pela, entre outras.

137

notícias são convertidas em notas, mas, na maioria, cobertas. Ou seja, dá-se várias pequenas notas, mas sempre seguindo as bases do televisual. O papel crucial das imagens e a busca pela sua valorização faz entender que, ao menos em TV, todo o jornalismo tem aproximação com o fantástico (MOTTA, 2006). É um mundo do surpreendente que se abre a partir de um texto que narra em cima de imagens um acontecimento, dando a ele ares de espetáculo. Observando os recursos usados nas reportagens sobre a morte de Bin Laden se tem ideia de o quanto esse acontecimento é tomado num palco do fantástico. Narrativa composta apenas a partir de imagens de agências, constituição de gráficos e simulação que buscam entender a operação – mesmo que contada apenas de um lugar de fala – vivências efêmeras de repórter no contato com o ambiente em que se deu a operação e por aí vai. Mesmo nas primeiras reportagens da semana sobre o assunto, a ideia é aproximar o espectador da história através da narrativa e das imagens. Talvez, isso leve o repórter Rodrigo Boccardi para um boletim de passagem diante da Casa Branca afirmando que “aqui eram tomadas as decisões”. O fato dele estar diante da Casa Branca não o deixa mais perto das decisões. Isso só é aceitável se acatar que essa é produção de telejornalismo. Assim, somos quase que intencionalmente iludidos pela ideia de que o simples fato de o repórter se colocar diante da Casa Branca o deixa verdadeiramente mais perto das decisões, podendo apreendê-las com mais exatidão. É nesse instante que começo a ver no empírico a ideia de mundo possível dentro de uma lógica muito própria da televisão. A necessidade de imagens e de relatos apoiados em vivências leva o narrador a simulações. Mas não são quaisquer simulações. São simulações apresentadas com um “que” de verdade, ou seja, simulações possíveis. Como nem sempre é possível testemunhar a eclosão dos acontecimentos com as lentes do jornalismo, adota-se dois procedimentos: a) produz-se um acontecimento – na verdade se faz uma reconstituição de algo que aconteceu ou “combina” para que o fato aconteça diante das câmeras – ou se busca reconstituições através de relatos. Esses relatos podem aparecer na forma de relatos de testemunhas, as fontes, ou podem ainda inspirar outras produções do jornalismo que, necessariamente, não precise indicar a fonte. São produções como infográficos e imagens de simulação constituídos a partir do relato das fontes; - um exemplo: o voo da primeira mulher em grande caça da Força Aérea Brasileira. Para o telespectador mais desatento, o voo de estréia se deu quase que por acaso, diante das câmeras. Na verdade, a prática de jornalismo me permite observar que

138

tudo aquilo foi produzido. Ou seja, ela fez seu primeiro voo depois de combinado com a equipe do JN. O acontecimento vai se desenvolvendo e sendo flagrado; b) no segundo caso, o acontecimento já aconteceu e por isso é hora de acionar o relato. Só através dele – e baseado nele – será possível se constituir uma narrativa do acontecimento já inserido na temporalidade do passado. Porém, as inclinações desse relato vão influenciar a narrativa inevitavelmente; - exemplo: a da edição de sábado sobre imagens de Bin Laden assistindo a si mesmo na televisão. As imagens são de segunda mão, repassadas pela autoridade norte-americana, que já envia junto toda uma dotação de sentido às agências internacionais. O jornalismo faz o seu relato a partir de outros – ou outro, nesse caso – e tentar reconstituir o “já acontecido”.

Colocar a narrativa do telejornalismo nesse entremeio entre a ficção e descrição direta de realidade, em especial o caso do Jornal Nacional, é aceitar que histórias são constituídas a partir de um lugar muito específico de fala. Olhar para o jornalismo de televisão é olhar para a constituição de mundo possível sob todas as lógicas de narrativa, permeada pelas do jornalismo – já que não são quaisquer narrativas – e ainda pelas da TV. E como o JN constitui esse mundo? A partir de que? Como observei na pesquisa, em muito através do relato das fontes. São elas que dão sustentação ao relato jornalístico. Se são aparentes, falam e aparecem na narrativa, legitimam o discurso que sustenta a narrativa, com fiadores de um mundo possível. Se não são aparentes, são referidas, inspiram o relato que se constitui a partir dele. É o caso das inúmeras reportagens sobre a morte de Bin Laden que citam “fontes americanas”, “governo paquistanês”, “militares”, etc. Nos movimentos da narrativa do Jornal Nacional também se pode perceber o papel das fontes. São elas que incitam e apóiam as “teses” das reportagens. Aquela lógica, muitas vezes consolidada pela prática e pela vivência do jornalista narrador. É o caso da reportagem de economia que apresenta a tese: inflação subindo, pessoas percebendo isso no supermercado, mas o governo diz que está tudo bem. Fontes que, visivelmente, se articulam a partir de uma ideia pré-concebida de reportagem. O problema que observo no trato com as fontes vai além. Mistura ainda a vivência do jornalista no relato. Se antes as fontes serviam como testemunho, exemplo para o que vinha sendo dito no texto, agora, detendo-me nessa semana analisada – de 2 a 7 de maio de 2011 percebo que elas podem ser deixadas de lado já que o jornalista vivência algo e depois narra. Por um lado, fica evidente que essa é uma tomada de posição que tem cara e lugar de fala. Por outro, reduz ainda mais a problematização da pauta sem sequer preocupar-se com ao menos

139

uma opinião adversa. O jornalista fonte pode incorrer em imprecisões que se constituem apenas na exposição de uma vivência. E, além disso, como no caso das fontes apresentadas de forma reducionista, apenas reitera uma verdade já estabelecida pela prática. É o exemplo dos repórteres que “testam” o trânsito de São Paulo2. É sabido que de carro se leva muito tempo em deslocamentos e que, talvez, via transporte público isso possa ser mais ou menos demorado, embora muito mais cansativo e desgastante. Os repórteres vão lá e comprovam isso. A forma segue reducionista tentando resolver o caso, apresentar o problema, desenvolvêlo e concluí-lo numa lógica muito rápida para que a narrativa dê conta de apresentar conclusão e solução dentro do mesmo caso. Acaba não problematizando a questão do sucateamento e do mau serviço prestado pelo transporte público ou a deficiente infraestrutura viária. No entanto, na pesquisa pude comprovar que o jornalismo não abandona a fonte na composição de seu relato. Embora abra mais espaço para sua vivência, também segue usando fontes como referências. Até porque são elas que, em sua maioria, são os que testemunham da instante da eclosão dos acontecimentos. A pesquisa comprova que o Jornal Nacional é um programa essencialmente baseado na factualidade dos acontecimentos. Isso faz com que seja necessário ouvir fontes para compor o que aconteceu naquele dia, já que o JN não pode estar a todo instante no Brasil e no mundo. Observo esse movimento narrativo de relato de vivência e criação de mundos em espaços permissivos para a realidade televisiva e o próprio aproveitamento de fontes como estratégia para a subsistência do programa. Afinal, apoiando numa lógica de Alsina (2009), creio que o contrato fiduciário se dá a partir do momento em que o JN conquista público, ganha fontes, agrega valor ao seu produto que o torna vendável3. A aproximação com o público se dá na mesma proporção em que é aberto espaço para fontes e que as vivências, por mais óbvias que passam ser, passam a ser evidenciadas no processo produtivo da narrativa no telejornal. Outra formulação que tinha presente lá no início da pesquisa, no primeiro trimestre de 2011 e ao longo desse tempo a própria pesquisa acabou desconstruindo é a intervenção dos apresentadores nos assuntos tratados. Tomando os apresentadores como vitrines do telejornal, imaginava que suas intervenções fossem apontadas como tendências que orientariam a 2

O exemplo é constituído na página 36. Na reportagem, dois repórteres partem de um mesmo ponto da cidade de São Paulo e partem para outro mesmo ponto. Um segue usando o transporte público e o outro de carro. A intenção é observar como é a viagem e quem leva mais tempo. 3 Um exemplo bem simples do valor de mercado (publicitário) se pode ter observando os tipos de produtos anunciados em suas grades comerciais: são bancos, produtos alimentícios, bebidas, roupas, produtos de limpeza, automóveis, supermercados, produtos de saúde e beleza e até serviços como viagens. A diversidade de produtos é representativa da diversidade de público diante da tela na hora do JN.

140

compreensão do telespectador. No entanto, percebo que a maiores das ações deles na leitura do texto do telejornal se dão de forma complementar seja lendo as chamadas, as manchetes, cabeças, das matérias ou seja complementando as informações em notas pé. É bem verdade que brincadeiras, expressões faciais e entonação dão certo tom de opinião e dotação de sentido ao que vem sendo lido. Mas a concepção é ainda mais complexa por isso. Passa por toda essa lógica de constituição de mundo. As histórias do JN são narrativas, construções de mundo a partir de discursos, atravessadas pelas lógicas do jornalismo e da televisualidade. Ou seja, a pesquisa vai além da busca pelo binômio informação X opinião. Ela apreende que as histórias são concebidas a partir da constituição própria desse mundo telejornalístico. Voltando ao problema da pesquisa. “que narrativa é essa do Jornal Nacional que incide no acontecimento e quais os sentidos que movimenta na construção do relato do que mais importante aconteceu no Brasil e no mundo?”, vislumbro um caminho que pode ser seguido na busca por uma resposta possível. A narrativa do Jornal Nacional que incide sobre o acontecimento é constituída a partir da lógica telejornalística, que constitui um mundo possível, na composição de textos que dão conta de narrar o acontecimento. Como toda narrativa, é visão de mundo, mas que funciona segundo princípios do televisual e do jornalismo – com base no fantástico, no inusitado, no que sensibiliza, com grande apoio nas edição de imagens e na coloquialidade de um texto falado que aproxima o espectador provoca identificação, entre outros sentimentos. O resultado é a constituição de um mundo possível dentro dessa lógica. Não é a verdade do acontecimento e nem a invenção de um relato a partir dele. É a materialização do acontecimento segundo os procedimentos da prática telejornalística. Os sentidos que movimenta dizem respeito aos discursos que sustentam a narrativa. No JN, está sim contido todo o discurso da prática jornalística. Mas vai além, trazendo valor e importância ao que, além de inusitado, surpreendente – enfim, jornalístico - aconteceu num recorte temporal de um dia, ou o dia. Isso implica dizer que o aconteceu hoje é mais importante do que poderá acontecer amanhã e muito mais do que aconteceu ontem. A prospecção no JN só se dará na falta de ocorrências do dia. Algo que busque uma contextualização um pouco maior no dia só se dará a partir de grandes acontecimentos, como as cheias que devastam estados e a morte de Bin Laden. A memória só será suscitada a partir de algo que seja importante para auxiliar na compreensão do agora no tempo presente. E os discursos particulares em cada narrativa reforçam máximas e verdades solidificadas no estofo social. Não trazem abordagens amplas, polifonia de vozes ou algo que subverta e impacte na lógica social. É mais do mesmo, como a movimentação no shopping na véspera do dia das

141

mães, os voluntários auxiliando os desabrigados e aí por diante. O novo fica por conta do ineditismo e pela reducionista compreensão dos fatos que dão conta naquele acontecimento, narrando vivências – de jornalistas e fontes – muito reducionistas e na busca pelo desfecho sempre no tempo presente, muito distante da ideia Benjaminiana. E o que, segundo o JN, é considerado “o que mais importante aconteceu no Brasil e no muno”? Tudo aquilo que aconteceu no recorte temporal de um dia, que vai do final de uma edição ao início da outra – o que num fim de semana implica, por exemplo, o resto da noite de sábado, o dia e a noite de domingo e o dia de segunda-feira. Precisa, ainda, ser passível de identificação com o público. Isso seja pela surpresa, comoção ou mesmo revolta que possa causar. A história tem ainda de ser televisual, deve-se ser imagens que sustentam histórias se não espetaculares por completo, que tenham apenas uma “que” de espetáculo. Que possam ser narradas a partir dos relatos de vivências, dando cor e corpo ao fato. Em parte isso explica o grande número de reportagens de geral. As notícias de política estão na narrativa do que mais importante aconteceu só quando causam revolta, forem denuncistas ou surpreender a lógica da ideia que se tem de políticos enquanto agentes que tiram proveito de qualquer situação. As de economia terão espaço se forem ligadas diretamente com o cotidiano do público. Ou seja, se um grande números de pessoas for diretamente afetado pelos acontecimentos. Nas de internacional a lógica é a de buscar a visão nacionalista, bem “brazuca”, daquilo que as agências e canais internacionais estão falando. No fim dessa longa jornada, não posso deixar de manifestar certa decepção. Supunha que o telejornalismo entrava numa nova fase, valorizando o narrador e o eu jornalista. Depurando tudo que vi, descobri e constitui até agora, reconheço que há certa mudança e valorização do jornalista enquanto narrador. Porém, muito mais próximo a concepção de Serelle (2009) do que a minha inicial. A guinada subjetiva se dá a partir da valorização do relato da vivência e não da experiência. Não há a transferência de saberes, o ensinar, e sim a efemeridade do simples contar o que viu. O processo muda sim. O jornalista assume o papel de constituidor de mundo e não de relator ou algo que funcione como espelho da realidade do mundo, tendo um só como verdade. E louvo a isso, o avanço do debate sobre objetividade que ganha outro status. Porém, a efemeridade do espetáculo continua sendo a grande sacada do telejornalismo. Se vai a campo, o jornalista abre espaço para o seu relato e até ouve pessoas que lá vivem. Mas a necessidade de compreensão do agora para o agora o coloca dentro do turbilhão de uma rotina produtiva que não permite reflexões mais densas. O resultado é que passa a repetir realidades já proferidas, agregando apenas as pegadas de sua vivência no processo produtivo. Só quem já tinha voz e vinha falando segue em evidência. O que fica

142

claro na maioria das reportagens sobre a morte de Bin Laden. O relato de um só lado, das fontes norte-americanas, é levado a público. Discussões mais densas que questionam a operação dos Estados Unidos só são postas depois que muita já foi dito, e ainda é posto em tom de dúvida. Quando a equipe do JN chega no Paquistão estão em busca de sua visão sobre como foi a operação e como vivia Bin Laden naquele lugar. Para isso, segue as mesmas práticas que vinham sendo exercidas e não ouve de fato outras vozes que lá se encontram. O que achava eu, enquanto analista, ser um avanço no telejornalismo, a valorização do eu e do relato da viviência, se constitui muito mais como uma estratégia de aproximação e fidelização da audiência – reforçado pelas falas do próprio editor Willian Bonner em seu livro sobre o telejornal. É claro que há conquistas nisso, como por exemplo o que já destaquei do fato de se aceitar muito mais o produto do jornalismo como uma realidade constituída e não como a realidade.O que fica é que o caminho para a polifonia de vozes e versões mais amplas sobre acontecimento ainda é algo que não percebo nesse telejornalismo. Assim, exercitando um movimento de distanciamento da pesquisa, hoje, em janeiro de 2013, tendo a observar todo o percurso da pesquisa de forma mais distante. Com isso, percebo – e destaco – três avanços significativos nessa jornada: a) passo a compreender a narrativa do jornalismo numa espécie de entremeio, um lugar, entre narrativa de ficção e a narrativa de relatório, meramente descritiva e com texto direto e objetivo. Agora, aceito e entendo o jornalismo a partir dessa nova perspectiva que se abre a mim, a de narrativa de entremeio. Isso leva a minha discussão para outras perspectivas e abre novos caminhos para reflexão tendo sempre como partida essa concepção de narrativa jornalística, inspirada essencialmente nas lógicas de Alsina (2009) e Auge (2001). b) se entendo o jornalismo como uma lógica própria – que valoriza o novo, o espetacular, o inédito, o que sensibiliza, etc – entendo também que o televisual tem também sua narrativa particular. Nela, estão contidos princípios como a serialização, fragmentação, preenchida pelos intervalos comerciais, linguagem essencialmente apóia na imagem e com texto que serve de referência e apoio da própria imagem. Cruzando as duas formas, materializo o conceito de telejornalismo (televisual + jornalismo). Sendo assim, a forma de se constituir um mundo telejornalismo – como verificado nos estudos da narrativa do Jornal Nacional – acolhe acontecimentos que tem esse potencial telejornalístico e os narrativiza dentro dessa lógica. Como está nesse entremeio, acaba produzindo imagens e textos que só cabem naquele acontecimento narrado em específico. E mais: sabe-se

143

que ali não é reconstituição fiel do que aconteceu e sim uma reconstituição com toda permissividade possível para uma narrativa telejornalística. Assim, aproximome da ideia de que o telejornalismo tem em sua narrativa a constituição de um mundo possível, que é só é possível dentro da narrativa que dá a partir daquele acontecimento em específico. Além de Leal e Jacome (2011), constituo essa perspectiva a partir de lógicas de Serelle (2009) e Motta (1997) (2006). c) e para narrar histórias a partir de princípios telejornalísticos e garantir o sucesso desse “espetáculo”, apela-se para a emoção contada não só através de personagens mas do que viveu o próprio jornalista que toma uma papel de narrador. Os indícios é de que seja essa mais uma estratégia de fidelização (Alsina, 2009) e aproximação com a audiência. (Serelle, 2009) (Fausto, 2008). E para chegar a esse ponto, traduz o conceito de narrador de Benjamin muito mais para um vivenciar, não aquele que traz consigo a experiência em sua essência, mas sim a sua vivência no contrato e trato com o acontecimento e na tessitura da narrativa dele. Para essa formulação ainda alio a discussão que Vogel e Silva (2012) a partir dos conceitos Benjaminianos de vivência e experiência.

Numa volta ao problema da pesquisa, observo que a narrativa do Jornal Nacional acolhe acontecimentos que melhor sirvam a lógica do televisual e jornalístico. A partir daí, constituem mundo possível partir de vivências do próprio jornalista. Tudo, claro, a partir de acontecimento que já tenha em sua essência esse potencial. Logo, a narrativa do Jornal Nacional elenca assuntos que considera “o que de mais importante aconteceu no Brasil e no mundo” a partir dessas suas lógicas. Assim, fecho a pesquisa na abertura de outras perspectivas e projeções de novos caminhos. Contudo, já tendo claro que, na verdade, o Jornal Nacional conta diariamente o que de mais importante aconteceu num mundo e num Brasil possível. Ou, se preferir, conta é o que aconteceu possivelmente. Não que seja só isso que aconteceu. É o que aconteceu e o que o JN considerou o mais importante. Ou fatos podem ter acontecido, mas que foram ignorados pelo JN, talvez, por entender que não são “dignos” de uma narrativa telejornalística nos padrões do Jornal Nacional.

144

REFERÊNCIAS A AÇÃO dos EUA no Paquistão ñ foi a 1ª dos EUA em território estrangeiro. Jornal Nacional, Rio de Janeiro: TV Globo, 05 maio 2011. Telejornal. 4min42s. A MORTE do responsável pelo maior atentado da história foi o assunto hoje. Jornal Nacional, Rio de Janeiro: TV Globo, 2 maio de 2011. Telejornal. 4min10s. A OPERAÇÃO em que Bin Laden não foi a primeira em que militares do Estados Unidos invadiram território estrangeiro. Jornal Nacional, Rio de Janeiro: TV Globo, 5 maio de 2011. Telejornal. 4min40s. AUGÉ, Marc. Ficciones de fin de siglo. Barcelona: Gedisa Ediorial, 2001. 189 p. BABO-LANÇA, Isabel. Reprodutibilidade do acontecimento na ordem institucional. Conferência de Abertura do I Colóquio de Imagem e Sociedade. Belo Horizonte: UFMG, 2008. BARBEIRO, Heródoto e LIMA, Paulo Rodolfo de. Manual de telejornalismo: os segredos na notícia na TV. Rio de Janeiro: Campus, 2002. 252 p. BARTHES, Roland. Structure du fait divers. In: Essais Critiques. Paris: Seuil, 1964. 288p. BENJAMIN, Walter. Magia e técnica, arte e política: ensaios sobre literatura e história da cultura. 7. ed. São Paulo: Brasiliense, 1985. 253 p. BERGER, Christa. Do Jornalismo: toda notícia que couber, o leitor apreciar e o anunciante aprovar, a gente publica. In: MOUILLAUD, Maurice; PORTO, Sérgio Dayrell. O jornal: da forma ao sentido. Brasília: Paralelo 15, 1997, p. 273 – 284. BERGER, Christa; TAVARES, Frederico M. B. Tipologias de acontecimento jornalísticos. In: BENETTI, Márcia; FONSECA, Virginia Pradelina da Silveira (Org.). Jornalismo e acontecimento: mapeamentos críticos. Florianópolis: Insular, 2010. p. 121-142. BERGSON, Henri. O pensamento e o movente. São Paulo: Martins Fontes, 2006. p. 27-102 BERNARDO, Fernanda. Mal de hospitalidade. In: NASCIMENTO, Evandro (Org.). Jacques Derrida: pensar a desconstrução. São Paulo: Estação Liberdade, 2004. p. 175-206. BIN LADEN se escondia em meio a soltados e quartéis no Paquistão. Jornal Nacional, Rio de Janeiro: TV Globo, 03 maio 2011. Telejornal. 2min18s. BONNER, William. Jornal Nacional – Modo de Fazer. Rio de Janeiro: Globo, 2009, 244p. BOURDIEU, Pierre. Sobre a televisão. Rio de Janeiro: Zahar, 1992.

CAÇADA a animal misterioso movimenta cidade do interior de Minas Gerais. Jornal Nacional, Rio de Janeiro: TV Globo, 25 maio de 2011. Telejornal. 3min40s CAÇADA a animal misterioso movimenta cidade no interior de Minas Gerais. Jornal Nacional. Rio de Janeiro: TV Globo, 26 jun. 2011. Telejornal. 3min12s. Disponível em:

145

. Acesso em: 05 mar. 2012. CEBRÍAN, Juan Luis. O pianista no bordel. Tradução: Eliana Aguiar. Rio de Janeiro: Objetiva, 2010. 168 p. CHAPARRO, Manuel Carlos. Sotaques d’aquém e d’além mar: travessias para uma nova teoria de gêneros jornalísticos. São Paulo: Summus, 2008. 239 p. COMO serviço secreto dos EUA descobriu o esconderijo de Bin Laden. Jornal Nacional, Rio de Janeiro: TV Globo, 02 maio 2011. Telejornal. 3min05s. DALMONTE, Edson Fernando. Presente: o tempo do jornalismo e seus desdobramentos. História. São Paulo. V.29, n. 1, p. 328 – 344, 2010. Disponível em < http://www.scielo.br/scielo.php?script=sci_arttext&pid=S010190742010000100019&lng=pt&nrm=iso> Acesso em: 20 mar 2012. DELEUZE, Gilles. “A concepção da diferença em Bergson”. In: DELEUZE, Gilles. A ilha deserta e outros textos. Trad. Lia Guarino. São Paulo: Iluminuras, 2006. DELEUZE, Gilles. Bergsonismo. São Paulo: Ed. 34, 1999. p. 7-26. DEPOIS da morte de Bin Laden, até hoje, tem surgido versões sobre a operação no Paquistão. Jornal Nacional, Rio de Janeiro: TV Globo, 5 maio de 2011. Telejornal. 2min12s. ECO, Umberto. Interpretação e superinterpretação. São Paulo: Martins Fontes, 2005. 184 p. ECO, Umberto. Seis passeios pelos bosques da ficção. São Paulo: Companhia das Letras, 1932. 158 p. ERBOLATO, Mário. Técnicas de codificação em jornalismo. São Paulo: Ática, 2000. 251 p. ESTA edição do Jornal Nacional começa com a participação de nossos enviados especiais ao país onde foi morto o terrorista Osama Bin Laden. Jornal Nacional, Rio de Janeiro: TV Globo, 3 maio de 2011. Telejornal. 3min45s. ESTUDO do Dnit aponta que estado, proporcionalmente, tem o maior número de motes nas estradas. Jornal Nacional, Rio de Janeiro: TV Globo, 07 maio 2011. Telejornal. 1min39s. FÁTIMA Bernardes faz reportagem sobre ela mesma no Jornal Nacional. 01 dez. 2011. Disponível em: . Acesso em: 5 fev. 2012. FAUSTO NETO, Antônio. Descentramento do lugar do jornalismo. [14 maio 2008]. Entrevistadoras: Alessandra Barros, Patrícia Fachim. Disponível em < http://www.ihuonline.unisinos.br/index.php?option=com_content&view=article&id=1709&se cao=254>. Acesso em: 20 agosto 2012. Entrevista concedida a Revista IHU On Line. FAUSTO NETO, Antônio. Fragmentos de uma “analítica” da midiatização. In: MATRIZES; n. 2, abril de 2008. p 89 -105.

146

FAUTO NETO, Antônio. Midiatização prática social, prática de sentido. Papper. Encontro da Rede Prosul “Comunicação e Processos Sociais”. Unisinos, PPGC, São Leopoldo, 2008. FECHINE, Yvana. A nova retórica dos telejornais. Uma discussão sobre o éthos dos apresentadores. Artigo apresentado ao GT Estudos em Jornalismo do XVII Econtro da Compós. São Paulo. 15 p. Disponível em: . Acesso em: 15 dez. 2012. FELTIN, Ricardo. Globo registra o menor Ibope para o mês de junho desde 1970. São Paulo, 01 jul. 2011. Disponível em: . Acesso em: 19 nov. 2011. FELTRIN, Ricardo. Ibope do “JN” sobe em São Paulo; “Jornal da Record” cai. São Paulo, 9 ago. 2011. Disponível em: . Acesso em: 19 nov. 2011. FOUCAULT, Michel. La transfábula. In: FOUCAULT, Michel. E leguaje y literatura. Barcelona: Paidós, 1996. p. 213-221. FRANÇA, Vera V. O “popular” na TV e a chave de leitura dos gêneros. In: GOMES, Itania Maria Mota (Org.). Televisão e realidade. Salvador: EDUFBA, 2009. p. 223-239. GENRO FILHO, Adelmo. O segredo da pirâmide: para uma teoria marxista do jornalismo. Porto Alegre: Tchê, 1987. 206 p. GOFFMAN, Erving. A representação do eu na vida cotidiana. Petrópolis: Vozes, 2009.

GOMIS, Lorenzo. Teoria del periodismo: cómo se forma el presente. Barcelona: Paidós Ibérica, 1991. p. 11-25. HERSCOVITZ, Heloiza Golbspan. Análise de conteúdo em jornalismo. In: BENETTI, Márcia; LAGO, Cláudia (orgs.). Metodologia de Pesquisa em Jornalismo. Petrópolis, RJ: Vozes, 2007, p.123 – 142. IBAMA e Polícia Federal investigam a existência de safáris no Pantanal. Jornal Nacional, Rio de Janeiro: TV Globo, 06 maio 2011. Telejornal. 2min10s. IDOSO tem carro roubado e é atropelado por assaltantes em Porto Alegre. Jornal do Almoço, Porto Alegre: RBS TV, 14 setembro de 2012. Telejornal. 4min34s. Disponível em: . Acesso em: 15 set. 2012. JN no ar foi a Pernambuco mostrar a situação de cidades atingidas pela chuva. Jornal Nacional, Rio de Janeiro: TV Globo, 5 maio de 2011. Telejornal. 4min40s. JORNAL Nacional vence Emmy por cobertura da ocupação do Alemão. Jornal Nacional. Rio de Janeiro: TV Globo, 27 set. 2011. Telejornal. 4min48s. Disponível em: . Acesso em: 19 nov. 2011. JOST, François. O que significa falar de “realidade” em televisão. In: GOMES, Itania Maria Mota (Org.). Televisão e realidade. Salvador: EDUFBA, 2009. p. 13-30.

147

KILPP, Suzana. A traição das imagens. Porto Alegre: Entremeios, 2010. p. 13-29. KILPP, Suzana. Programas televisivos. Revista Eletrônica Sessões do Imaginário – Famecos – PUCRS, Porto Alegre, ano 8, n. 10, nov. 2003. Disponível em: . Aceso em: 13 fev. 2012. LAGE, Nilson. A reportagem: teoria e técnica de entrevista e pesquisa jornalística. Rio de Janeiro: Record, 2008. 197 p. LEAL, Bruno Souza; JÁCOME, Phellipy Pereira. Mundos possíveis entre a ficção e a “nãoficção”: aproximações à realidade televisiva. Artigo apresentado ao GT Estudos de Televisão do XX Encontro da Compôs. Porto Alegre. 16 p. 2011. Disponível em: . Acesso em: 13 jun. 2011. LIMA, Edvaldo Pereira. O Jornalismo literário – o legado de ontem. Caderno de Comunicação Serie Estudos, Rio de Janeiro, v. 7, n. 7. p. 9-13, ago. 2003. Disponível em: . Acesso em: 21 ago 2005. MACHADO, Arlindo. A televisão levada a sério. São Paulo: Senac, 2005. 241 p. MACIEL, Pedro. Jornalismo de televisão: normas práticas. Porto Alegre: Sagra Luzatto, 1995, 116p. MAIS detalhes da casa onde vivia Bin Laden. Jornal Nacional, Rio de Janeiro: TV Globo, 05 maio 2011. Telejornal. 2mi359s. MAIS UMA versão sobre a morte de Bin Laden. Jornal Nacional, Rio de Janeiro: TV Globo, 05 maio 2011. Telejornal. 2min12s. MAROCCO, Beatriz. O jornalista e a prática. São Leopoldo: Editora Unisinos, 2012. 245 p. MAROCCO, Beatriz. Prostitutas, jogadores, pobres e vagabundos no discurso jornalístico. São Leopoldo: Editora Unisinos, 2004. 125 p. MAROCCO, Beatriz. Reportagem de ideias, uma contribuição de Foucault ao jornalismo. Revista Galáxia, São Paulo: n.18, p. 168 – 179, dez 2009. MARQUES, Francisca Ester de Sá. O processo de televizamento do texto jornalístico. In: MOUILLAUD, Maurice; PORTO, Sérgio Dayrell. O jornal: da forma ao sentido. Brasília: Paralelo 15, 1997, p. 525 – 539. MEDINA, Cremilda. A arte de tecer o presente. São Paulo: Summus, 2003. 156 p. MEDITSCH, Eduardo. Consentimento para matar: o contexto sociocultural como substrato do acontecimento na cobertura de guerra da imprensa norte-americana. In: MAROCCO, Beatriz; BERGER, Christa; HENN, Ronaldo (orgs.). Jornalismo e Acontecimento – Vol. 3. Diante da Morte. Florianópolis, SC: Insular, 2012, p.131 – 148 MEMÓRIA GLOBO. Jornal Nacional – a notícia faz história. Rio de Janeiro: Jorge Zahar, 2004. 406 p.

148

MINISTÉRIO DA JUSTIÇA. Portaria Nº 796, de 8 de setembro de 2000. Brasília, DF, 8 de setembro de 200. Disponível em < portal.mj.gov.br/main.asp?View={274605FA-A50E-4541-

9BBE-09F131CBF9B6}> Acesso em: 10 set. 2012. MOTTA, Luiz Gonzaga. Análise pragmática da narrativa jornalística. In: BENETTI, Márcia; LAGO, Cláudia (orgs.). Metodologia de Pesquisa em Jornalismo. Petrópolis, RJ: Vozes, 2007, p.143– 167. MOTTA, Luiz Gonzaga. Análise pragmática da narrativa jornalística. In: BENETTI, Marcia; LAGO, Cláudia. (Org.). Metodologia de pesquisa em jornalismo. Petrópolis, RJ: Vozes, 2007. p. 143–167. MOTTA, Luiz Gonzaga. Notícias do fantástico. São Leopoldo: Editora Unisinos, 2006. 268p. MOTTA, Luiz Gonzaga. Teoria da Notícia: as relações entre o real e o simbólico. In: MOUILLAUD, Maurice e PORTO, Sérgio Dayrell (orgs.). O jornal: da forma ao sentido Brasília: Paralelo 15, 1997, p. 305 – 319. MOVIMENTO intenso no comércio nesta véspera do Dia das Mães. Jornal Nacional, Rio de Janeiro: TV Globo, 7 maio de 2011. Telejornal. 1min48s. NO PENÚLTIMO dia do Troféu Maria Lenk, nadador revelação vence Cesar Cielo. Jornal Nacional, Rio de Janeiro: TV Globo, 7 maio de 2011. Telejornal. 1min. NOS ESTADOS UNIDOS, o presidente Barack Obama prestou homenagem as vítimas do atentado de 2001 em Nova Iorque. Jornal Nacional, Rio de Janeiro: TV Globo, 5 maio de 2011. Telejornal. 2min6s. OBAMA presta homenagem às vítimas do 11 de setembro em Nova Iorque. Jornal Nacional, Rio de Janeiro: TV Globo, 05 maio 2011. Telejornal 4min42s. PEDRO Bial. Marília Gabriela Entrevista. Temporada 1, episódio 13. Rio de Janeiro: GNT, 30 abril de 2011. Programa de TV. 1h40min. Disponível em: . Acesso em: 10 set. 2011. PELA primeira vez, mulher pilota jato de guerra da FAB. Jornal Nacional, Rio de Janeiro: TV Globo, 06 maio 2011. Telejornal. 2min13s. PELA primeira vez, um brasileira pilotou um jato de guerra da Força Aérea Brasileira. Jornal Nacional, Rio de Janeiro: TV Globo, 6 maio de 2011. Telejornal. 2min7s. POLÍCIA do Rio de Janeiro divulga imagens que levaram a prisão de traficantes n favela carioca. Jornal Nacional, Rio de Janeiro: TV Globo, 06 setembro 2012. Telejornal. 2min07s. POLÍCIA do Rio de Janeiro prende ex-presidente da associação de moradores da rocinha. Jornal Nacional, Rio de Janeiro: tv globo, 2 dezembro de 2011. telejornal. 5min. disponível em: < http://g1.globo.com/jornal-nacional/noticia/2011/12/policia-do-rj-prende-ex-presidenteda-associacao-de-moradores-da-rocinha.html >. acesso em: 15 set. 2012.

149

POLICIAIS descobrem arsenal do tráfico em comunidades retomadas do Rio de Janeiro. Jornal Nacional, Rio de Janeiro: TV Globo. 14 novembro de 2011. Telejornal. 3min33s. g1.globo.com/jornal-nacional/noticia/2011/11/policiais-descobrem-arsenal-do-trafico-emcomunidades-retomadas-do-rj.html. Acessado em: 20 nov. 2011. PREÇO do barril de petróleo caiu quase 9%. Jornal Nacional, Rio de Janeiro: TV Globo, 5 maio de 2011. Telejornal. 10s. Presente: o tempo do jornalismo e seus desdobramentos Edson Fernando DALMONTE. ((é do site da sielo. Segue link, tem de ver como faz a citação. http://www.scielo.br/scielo.php?pid=S0101-90742010000100019&script=sci_arttext PROGRAMAÇÃO.

Rede

Globo

de

Televisão.

Disponível

em

<

http://redeglobo.globo.com/programacao.html>. Acesso em: 1 set. 2012. QUEM era Osama Bin Laden. Jornal Nacional, Rio de Janeiro: TV Globo, 02 maio 2011. Telejornal. 2min49s. QUESADA, Montse. Periodismo de Sucesos. Madri: Editorial Síntesis, 2007, 229p. REBELO, José. Apresentação. Trajectos – Revista de Comunicação, Cultura e Educação, Lisboa, n. 6, p. 55-58, 2005. REBELO, José. Prolegómenos à narativa mediática do acontecimento.Trajectos – Revista de Comunicação, Cultura e Educação, Lisboa, n. 8-9, p. 17-27, 2006. REZENDE, Guilherme Jorge de. Telejornalismo no Brasil – um perfil editorial. São Paulo: Summus, 2000, 289p. RICOEUR, Paul. Tempo e narrativa. São Paulo: WMF Martins Fontes, 2010. 1208 p. RODRIGO ALSINA, Miguel. A construção da notícia. Petrópolis – RJ: Vozes, 2009. 351 p. RODRIGUES, Adriano Duarte. O Acontecimento. In: TRAQUINA, Nelson (Org.). Jornalismo: questões, teorias e “estórias”.Lisboa: Vega, 1999. p. 27-33. ROMANO, Claud. L’événement et le monde. França: Puf, 1996. p. 1-12. SANTOS, João Vitor. Diário da pesquisa exploratória. Porto Alegre, 24 jul. 2011. Documento não publicado. SARLO, Beatriz. Tiempo passado: cultura de la memoria y giro subjetivo: uma discusión. Argentina: Siglo XXI, 2005. 166p. SERELLE, Marcio. Jornalismo e guinada subjetiva. Estudos em Jornalismo e Mídia, Florianópolis, ano 6, n. 2, p. 33-44, jul./dez. 2009. SILVA, Márcia Veiga da. Masculino, o gênero do jornalismo: um estudo sobre os modos de produção das notícias. 2010. 249 f. Dissertação (Mestrado em Comunicação) – Programa de Pós-Graduação de Comunicação e Informação da Faculdade de Biblioteconomia e Comunicação. Universidade Federal do Rio Grande do Sul, Porto Alegre, RS, 2010.

150

SILVA, Marconi Oliveira da. A notícia como narrativa e discurso. Estudos em Jornalismo e Mídia, São Paulo, v. 4, n. 1, p. 49-64, set. 2007. SODRÉ, Muniz; FERRARI, Maria Helena. Técnica de Reportagem – notas sobre a narrativa jornalística. São Paulo: Summus, 1986, 141p. SOUZA, Cláudio Mello e. 15 Anos de história. Rio de Janeiro: Editora Globo, 1984. 351 p. SP: JN compara tempo gasto com carro e transporte público na ‘hora do rush’. Jornal Nacional. Rio de Janeiro: TV Globo, 23 abril de 2012. Telejornal. 4min20s. SP: JN compara tempo gasto com carro e transporte público na ‘hora do rush’. Jornal Nacional, Rio de Janeiro: TV Globo. 23 abr. 2012. Telejornal. 4min20s. Disponível em: . Acesso em: 24 abr. 2012. STRATHERN, Paul. Leibniz em 90 minutos. Rio de Janeiro: Jorge Zahar, 2002. 72 p. TUCHMAN, Gaye. La prodicción de la noticia. Barcelona: GG MassMedia, 1978, 265p. TUMOR na laringe de Lula desapareceu, anunciam médicos. Jornal Nacional, Rio de Janeiro: TV Globo, 28 março de 2012. Telejornal. 1min16s. Disponível em: . Acesso em: 29 mar. 2012. VOGEL, Daisi; SILVA, Gislene. Imagens da morte na primeira página. In: MAROCCO, Beatriz; BERGER, Christa; HENN, Ronaldo (orgs.). Jornalismo e Acontecimento – Vol. 3. Diante da Morte. Florianópolis, SC: Insular, 2012, p.169 – 184. WEAVER, Paul H., As notícias de jornal e as notícias de televisão. In: TRAQUINA, Nelson. Jornalismo: questões, teorias e “estórias”. Lisboa: Veja, 1999, p. 294 – 305.

151

APÊNDICE A – FORMATOS Data

Nota pelada

Nota pelada

Nota

Nota coberta

ilustrada

coberta

estendida

Vivo

Reportagem

Chamada institucional

02/05/2011

-

-

1

-

6

11

-

03/05/2011

-

3

2

1

2

12

1

04/05/2011

2

2

4

1

1

5

-

05/05/2011

-

3

3

-

-

12

1

06/05/2011

3

1

4

-

-

12

1

07/05/2011

-

-

5

1

1

9

2

Total

5 (2’40”)

9 (6’)

19 (8’40”)

3 (3’)

10 (14’)

61 (60.803’)

5 (4’32”)

Fonte: Elaborada pelo autor

152 APÊNDICE B – TIPOS DE NOTÍCIA

Data

Factuais

da Atualidade

Faits-Divers

02/05/2011

17

1

-

03/05/2011

19

1

1

04/05/2011

13

2

-

05/05/2011

13

4

-

06/05/2011

16

2

2

07/05/2011

13

5

Total

91

15

Fonte: Elaborada pelo autor

3

153 APÊNDICE C - EDITORIAS

Data

Política

Economia

Cotidiano

Esportes

Variedades

Internacional

-

-

-

Geral

Crime

-

-

-

02/05/2011

1

-

1

-

-

-

16

03/05/2011

1

4

-

1

1

1

11

04/05/2011

2

2

6

-

1

-

3

05/05/2011

2

06/05/2011

-

07/05/2011

-

Total

3

3

5 2

6 1

11

1

29

Fonte: Elaborada pelo autor

3

-

1

4

2

4 8

6

6

3 5

2 47

6 3

154 APÊNDICE D – INSERÇÃO

Data

Abertura telej.

Fechamento telej.

Abertura bloco

Diluição

02/05/2011

1

1

4

12

03/05/2011

1

1

4

16

04/05/2011

1

1

2

11

05/05/2011

1

1

3

12

06/05/2011

1

1

3

15

07/05/2011

1

1

4

12

Total

6

6

20

79

Fonte: Elaborada pelo autor

155 APÊNDICE E - ACONTECIMENTO

Data

Constituídos ou provocados

Reconstituídos

02/05/2011

1

17

03/05/2011

3

18

04/05/2011

1

14

05/05/2011

4

13

06/05/2011

3

17

07/05/2011

3

16

Total

16

96

Fonte: Elaborada pelo autor

156 APÊNDICE F - NARRATIVAS

Data

Aprofundamento técnicos/interpretação

Simples

02/05/2011

9

8

03/05/2011

6

15

04/05/2011

5

10

05/05/2011

7

9

06/05/2011

8

12

07/05/2011

5

13

Total

41

68

Fonte: Elaborada pelo autor

157 APÊNDICE G - INTERVENÇÃO DO APRESENTADOR

Data

Anunciativa

Contextualizadora

Analítica

02/05/2011

9

5

5

03/05/2011

12

3

2

04/05/2011

11

4

1

05/05/2011

9

6

1

06/05/2011

12

6

1

07/05/2011

14

3

1

Total

68

27

11

Fonte: Elaborada pelo autor

158 APÊNDICE H - TIPOS DE AÇÃO

Data

Presente

Passado remoto

Passado imediato

02/05/2011

5

6

8

03/05/2011

3

3

15

04/05/2011

5

-

10

05/05/2011

5

2

10

06/05/2011

5

3

12

07/05/2011

7

2

9

Total

30

16

64

Fonte: Elaborada pelo autor

159 APÊNDICE I - MOVIMENTOS DO DISCURSO

Data

Experiência

Objetiva de

Interpretativa

Autorreferencialidade

memória

reconstituição

02/05/2011

2

6

4

-

03/05/2011

2

7

3

-

04/05/2011

-

-

5

-

05/05/2011

2

5

3

1

06/05/2011

1

5

6

-

07/05/2011

-

5

4

-

Total

7

26

26

1

Fonte: Elaborada pelo autor

160 APÊNDICE J - TEMPORALIDADE

Data

Presente

Passado remoto

Passado imediato

02/05/2011

-

5

7

03/05/2011

-

3

9

04/05/2011

2

-

3

05/05/2011

3

2

6

06/05/2011

2

3

7

07/05/2011

4

2

1

Total

11

15

33

Fonte: Elaborada pelo autor

161 APÊNDICE K - IMAGENS

Data

Padrão

Midiatizadas

Amadoras

Autorreferentes/ar

Exclusivas

quivo

Simulacro

Oficiais

de ação

02/05/2011

8

7

2

5

-

1

1

03/05/2011

12

3

2

5

-

-

1

04/05/2011

5

2

2

-

1

1

-

05/05/2011

11

5

4

3

1

2

1

06/05/2011

12

5

4

4

1

1

-

07/05/2011

9

1

3

2

1

2

4

Total

57

23

17

19

5

7

5

Fonte: Elaborada pelo autor

162 APÊNDICE L - PERSONAGENS/FONTES

Data

Oficiais

Especialistas

Personagens

02/05/2011

7

1

5

03/05/2011

8

-

5

04/05/2011

4

2

3

05/05/2011

10

2

7

06/05/2011

10

2

7

07/05/2011

7

3

3

Total

47

10

32

Fonte: Elaborada pelo autor

163 APÊNDICE M - APRESENTAÇÃO DAS FONTES

Data

Referente

Testemunhal

02/05/2011

2

9

03/05/2011

4

9

04/05/2011

2

6

05/05/2011

6

8

06/05/2011

6

9

07/05/2011

3

7

Total

23

48

Fonte: Elaborada pelo autor

164 APÊNDICE N - AÇÃO DO APRESENTADOR

Data

Anunciativa

Contextualizadora

Analítica/opinativa

02/05/2011

6

3

2

03/05/2011

8

2

-

04/05/2011

5

1

-

05/05/2011

3

7

-

06/05/2011

8

3

1

07/05/2011

8

1

-

Total

38

17

3

165

APÊNDICE O - TRANSCRIÇÃO PESQUISA EXPLORATÓRIA Descrição da pesquisa exploratória realizada durante a semana em que Osama Bin Laden foi morto. Seis edições do Jornal Nacional, de 2 a 7 de maio de 2011.

Na edição de segunda-feira o telejornal apresenta uma configuração completamente diferente. A trilha é alterada, os acordos não estendidos e mostrados de forma completa, ainda há valorização dos acordes orquestrados. Um dia depois da ação do Estados Unidos que matou o Líder da Al Qaeda, Osama Bin Laden, o telejornal se apresenta como um registro histórico. Já na escalada e na abertura quer traz elementos que propõem já uma reconstrução de todos os momentos que levaram até esse acontecimento da morte. Quer ainda projetar como fica o mundo a partir de agora. Ou seja, quer apresentar elementos de passado, presente e futuro para reconstruir e interpretar esse acontecimento da morte de Bin Laden

Transcrição da escalada: Bonner: 2 de maior de 2011. Imagens de americanos comemorando nas ruas Fátima: Depois da morte de Bin Laden, o presidente americano Barack Obama afirma que o mundo é um lugar melhor e mais seguro. Imagens de Obama em seu pronunciamento Bonner: Nossos repórteres mostram os detalhes da operação policial contra o líder da Al Qaeda. Imagem do Google Maps localizando a casa onde Bin Laden estava Fátima: De que forma ela influencia a eleição americana do ano que vem? Bonner: As imagens do local onde o terrorista foi atacado. Imagens do quarta e da cama suja de sangue. Fátima: O que dizem os especialistas sobre o futuro da organização que ele criou. Bonner: As reações de chefes de estado em todo o planeta. Fátima: O Brasil manifesta preocupação com represálias em formas de atentados. Imagens do ataque as Torres Gêmeas. Bonner (em off): E se solidariza com as vítimas de 11 de setembro. Fátima: 2 de maio de 2011. Bonner: O Jornal Nacional está começando agora. Vinheta de abertura e trilha completas.

166

Fim da escalada. Começa o telejornal. Depois do boa noite, os apresentadores em plano aberto começam o que pode ser visto como um diálogo. Enquanto ele fala, ela olha para ele mexe a cabeça em sinal de concordância. Eles falam ao telespectador que está do outro lado. É uma interação. Um recurso para colocar o espectador nessa conversa a três. O apresentador faz uma breve descrição destacando que a morte de Bin Laden foi assunto entre líderes de estado do mundo todo, além de políticos e cidadãos comuns. E divide o texto em jogral com a apresentadora. É parte da cabeça para chamar o primeiro VT. Esse de autoria do repórter Luis Fernando Silva Pino, de Washington. Ela chama: a notícia da morte foi dada oficialmente pelo presidente dos Estados Unidos Barack Obama há 20 horas. E os detalhes desse pronunciamento histórico está na reportagem de Luis Fernando Silva Pinto. A matéria abre com imagens de Obama em seu pronunciamento. O objetivo é reconstruir a história de forma cronológica. Toma o pronunciamento como instantes do acontecimento. É a partir dali que o fato se dá por conhecido e começam a se desdobrar todas as conseqüências. Pontos do discurso da destacados, em especial quando são apresentadas as justificativas.O que dá uma quebra nessa reconstrução cronológica dos fatos e o destaque que dá no instante em que a notícia é a dada. Faz um corte, uma ruptura na narrativa. Como se abrisse um parêntese e dissesse vamos ver como nós aqui no Brasil soubemos da notícia. É mais ou menos assim que o texto se desenrola. A notícia foi dada num plantão da TV Globo, depois do Fantástico.... Entra a vinheta tradicional do plantão e uma ilustração dos apresentadores Patrícia Poeta e Zeca Camargo. É um fragmento do boletim do vivo passado por eles. Os dois, ao vivo, demonstram preocupação. Ela dá a hora e diz que se tem a informação da morte e que, em instantes, o presidente dos Estados Unidos vai fazer um pronunciamento oficial. Depois disso, a narrativa reconstrói o que acontece. Sempre a partir da fala de Obama. Traz ainda a chefe de estado Hillary Clinton e líderes da Câmara americana. O objetivo é mostrar que enaltecem Obama e sua ação e depreciam o Talibã e suas posturas. Um dos líderes democratas chegam a selar o dia como marco histórico. O VT segue mostrando Obama uma dia depois da operação cumprindo sua agenda de compromissos, mas sempre referendando e comentando – sem outros detalhes – a ação do dia anterior. O VT ainda destaca que pegar Bin Laden foi promessa de campanha de Obama. As imagens são sempre bem ilustrativas e referendam o texto sem ser repetitivas, num pelo exemplo de construção televisiva que alia imagens e texto. O VT ainda leva o repórter para o Marco Zero, onde estavam as torres e destacando a reação de famílias de vítimas.

167

O repórter volta ao vivo, num stand up, que serve como complemento de uma matéria. Ele não é chamado pelos apresentadores. Entra direto, como se ele mesmo fizesse um pé de sua matéria. No texto desse boletim, destaca que a oposição ao presidente também reconheceu o feito e até elogiou. Destaca que Obama vinha sofrendo críticas e que teve até mesmo sua nacionalidade questionada. No texto, ainda pondera que não há eleição ganha, mas que não há como não se ver Obama como um dos favoritos. Os apresentadores encerram a participação com o que chamo de costura do ao vivo. Algo bem tradicional. Conversa com o repórter, agradece e, ainda, quando volta para eles, o apresentador diz: esse o repórter Luis Fernando Silva Pinto ao vivo de Washington. Isso é recorrente em muitas participações de repórteres ao vivo. O destaque que dou é que os apresentadores abandonam por completo o pé. Todas as informações adicional, que serviram como pé, são dadas pelo próprio repórter. Com um outro detalhe: há nuances de interpretação. O repórter se coloca no texto, como o agente que esteve envolvido ativamente na construção daquela narrativa. E ainda abusa em elementos interpretativos, como no exemplo da frase: Barack Obama tem um crédito enorme. E ele tem o hábito de não desperdiçar o crédito que ganha com o eleitorado...ele nem precisa ter pressa para colher os frutos, pois isso já começou a acontecer. Ou, ainda: não existe eleição impossível de se perder. Mas ele, já era o candidato favorito. Agora, fica numa posição muito melhor. A apresentadora também agradece e começa a dar o texto da cabeça de outra matéria. Vale destacar esse texto. Em geral, as cabeças das matérias do JN não são simples chamadas. Há uma contextualização com o material que veio antes, mesmo que seja de editoria e assunto diferentes. Há sempre uma inclinação e o uso de expressões e, enquanto isso, e falando em, entre outras que sempre dão a idéia de ligação. Nesse caso, como o assunto é o mesmo, a própria continuidade e entonação dão a idéia de ligação e continuidade. O texto é o seguinte: Luis Fernando Silva Pinto, obrigado, falando ao vivo de Washington. Osama Bin Laden foi caçado por mais uma década por planejar atentados sangrentos contra alvos americanos. Quem mostra é a correspondente Elaine Bast. A repórter recupera a vida de Bin Laden. Ela começa destacando porque ele foi perseguido e começa lembrando sua trajetória desde sua origem, em família rica. Depois, fatos históricos de guerras e confrontos no oriente vão se misturando a história dele. Tudo é construído como uma espécie de linha do tempo. Datas e dados relevantes – como número de mortos em atentados, locais, etc – não ficam apenas no texto em off da repórter. São evidenciados com um texto em arte que sobrepõe as imagens. As imagens que usa são ilustrativas a cada momento que fala. A história segue até o momento em que o então

168

presidente Bill Clinton o considera inimigo dos EUA. Mapas também se fundem as imagens para dar a idéia exata de localização onde acontecem cada um dos fatos destacados nessa linha do tempo. Segue a história com mais vagar passando pelo 11 de setembro e pela invasão do Afeganistão. A passagem da repórter é posta no fim da matéria. Ou seja, perde aí muitas características do chamado boletim de passagem. O texto é apresentado como uma espécie de fecho da matéria. Como no exemplo anterior, mas com um pouco mesmo de voz ativa e tom autoral. Na volta para no estúdio, o apresentador faz mais uma daquelas emendas. A repórter encerra dizendo que desde então – da invasão do Afeganistão, depois do 11 de setembro – Bin Laden vem sendo procurador e que, volta e meia, te divulgados suas mensagens pela internet ou através da TV Árabe. O apresentador, antes de seguir no texto, completa: e o mundo nunca mais foi o mesmo. É como se dissesse: depois disso tudo que você viu, ou relembrou, o mundo nunca mais foi o mesmo. Usa essa frase também como introdução para o próximo VT. Esse, recupera e atualiza a edição do JN de 11 de setembro de 2001. No texto do apresentador: o Jornal Nacional daquela noite mostra claramente porque – o mundo nunca mais foi o mesmo. O repórter Edney Silvestre, que era correspondente em Nova York naquela época relembra. O VT abre com imagens do atentado as Torres Gêmeas e o repórter reconstrói a história daquele dia. Não é um simples contar a história. A narrativa desse VT quer mostrar como a história do atentado foi contada pelo Jornal Nacional. E por isso o texto do repórter é atualizado, narrado em tempo presente. E o tom autoral é muito forte. É repórter é como alguém que esteve lá e relembra como foi ter estado ali e, mais, ter construído uma narrativa sobre isso. A história do atentado é contada com a marcação de um relógio que surge no canto superior direito da tela, marcando o momento exato em que cada coisa vai acontecendo. Referencias a si, como a expressão e eu estava lá, e ao trabalho do colega cinegrafista são dadas a todo instante. Ainda no seu texto: o repórter cinematográfico Orlando Moreira registra a fuga da área do atentado. Nas imagens em movimento, pessoas correndo de ao fundo uma gigantesca nuvem de poeira. Entra uma passagem do repórter, mas é posta como passagem e sim como ilustração. Na verdade, é a recuperação da passagem que fez na época. No GC (Gerador de Caracteres) há o nome do repórter e a inscrição Nova York – 11/09/2001. E a narrativa sobre a narrativa criada para contar a história do ataque segue. Sempre é usado o marcador do relógio e os números – como os de morte – são sempre destacados e sobrepostos nas imagens. A história também fala do ataque ao Pentágono, lembrando que quem esteve lá foi o repórter Luis Fernando Silva Pinto. Uma passagem dele é recuperada bem aos moldes da

169

de Edney. A diferente é que nessa a inscrição abaixo do nome marca Washington – 11/09/2001. A história segue com relato de familiares de vítimas da época e a palavra de autoridades como o próprio presidente Bush. Segue falando ainda do avião que caiu na Pensilvânia e dos efeitos e as conseqüências depois dos atentados em Nova York. Recupera mais uma passagem com as inscrições do local e da data. Desta vez, é de Jorge Pontual em Time Square. A narrativa relembra, ainda, que ao longo de todo o Jornal Nacional desse dia a repórter Zileide Silva trazia informações ao vivo do local aonde estavam as Torres Gêmeas. Em seu texto, Edney lembra que naquela noite tudo ainda era dúvida sobe quem havia feito aquilo tudo. E no seu texto: mas a grande dúvida ainda persistia. De onde partiram as ordens para o ataque daquela terça-feira? Ao final do Jornal Nacional, Zileide Silva trouxe a informação. Nesse momento, entre o boletim transmitido ao vivo da época. A repórter diz: a inteligência americana conseguiu interceptar mensagem deeeeeee Ozzzammaaa Binn Ladenn sobre os ataques. Essa é a última informação de estamos acabando de receber no escritório da Globo aqui em Nova York. A repórter demonstra que não conhecia o texto e inclusive titubeia na leitura. Ao fim, como que se justificando, diz que é uma ultima informação. E o VT é encaminhado para o fim, marcando a data em que o terrorista foi morto. A matéria encerra com uma passagem

- daquelas de fim de matéria – do repórter na frente do

Consulado Americano no Rio de Janeiro. No texto, diz que todos os americanos em todo o mundo estão em alerta temendo uma reação. Aqui, a apresentadora faz um pé. Ele é bem característico da definição de pé em telejornalismo: uma informação complementar, apenas. Ela diz: três brasileiros morreram nas Torres Gêmeas de Nova York no atentado de 2001. Encerra o bloco e encaminham a vinheta de a seguir. Chama para detalhes da operação e as comemorações dos americanos.

O bloco dois é aberto com a matéria que destaca como transcorreu a operação que resultou na morte do terrorista. O texto narra como eram feitas as buscas e como chegaram ao informante, o tal mensageiro. Depois, descreve como esse mensageiro acabou levando – aparentemente sem querer – o exército americano até a casa de Bin Laden. A passagem do repórter é feita em Washington. É bem característica como um boletim de passagem. Ele liga um enfoque da matéria ao outro, como se estivesse puxando outro assunto. Nesse boletim, fala do mensageiro como que num movimento para entrar mais fundo na história desse personagem e de como ele levou até a casa. E é isso que a matéria segue fazendo, contando a história do mensageiro. O boletim de passagem assume sua função de ligar um assunto ao

170

outro, introduzir um viés. O repórter Rodrigo Bocardi volta para mais uma passagem. Desta vez, na frente da Casa Branca. Mais uma vez, cumpre com a definição clássica de boletim de passagem. O enfoque da história passa ser o que se passava dentro da sede do governo. No texto do repórter: nos último oito meses, Barack Obana se reuniu cinco vezes, aqui na Casa Branca, com a cúpula do Serviço de Inteligência para tratar do assunto. Até que, na última sexta feira, o presidente americano autorizou a operação. A idéia era bombardear o local onde estava Osama Bin Laden. Barack Obama não deixou, porque muitos civis poderiam ser mortos. E a partir daí, seu texto, já em off, fala da ação dos Navy Seals e também define quem são esses militares. Usa animação para mostrar então como esses homens agiram, imagens do interior da casa e segue para mais uma passagem. Essa, mais uma vez clássica, marca outra entra ou movimento do texto. Agora, o repórter introdução para o assunto o que fizeram com o corpo do terrorista. A explicação e suas justificativas seguem no texto em off. De volta ao estúdio, o apresentador agora chama para um VT que traz o relato de como os americanos receberam a notícia. Vale destacar que há sempre aquela costura textual entre uma matéria e outra. Depois de tudo que aconteceu, milhares de americanos comemoraram. E a repórter Giuliana Morrone conta como foi. E ela descreve todas essas reação desde uma torcida que acompanha um jogo até as manifestações nas ruas de Nova York. Para referendar a explosão de euforia que tomou a noite, recupera o boletim da repórter Elaine Blast que foi transmitido ao vivo. A ilustração segue a mesma lógica da recuperação feita da inserção ao vivo de Patrícia Poeta e Zeca Camargo e de todas as outras recuperadas por Edney Silvestre. Depois, Giuliana usa uma passagem sua atual para mostrar como estava a movimentação ainda no outro dia – tempo presente, fala do hoje. A passagem cumpre a missão clássica, pois destaca que enfoque passa a ser as histórias das pessoas que passam por ali e da relação delas com tudo que acontece. Usa cases, muitos, até mesmo um brasileiro que esteve lá em 2001, no dia do atentado e agora volta. Destaque sempre para as comemorações, histórias de familiares de vítimas e a segurança reforçada. Fecha o VT mostrando que em meio a tudo isso a vida segue. Para isso, usa um turista turco que, alheio a tudo, pede informações sobre a cidade para um guarda. Depois do VT, a repórter é chamada ao vivo do Marco Zero. Ela atualiza as informações, mas, aqui, usa muita o caráter autoral e narrativa em primeira pessoa. Faz referências a helicópteros que sobrevoam a área naquele momento e completa: eu que moro aqui perto tenho ouvido barulho contínuo de helicóptero, sirenes....Tudo para seguir destacando que o policiamento segue reforçado. De novidade, traz a divulgação das fotos em que aparece a cúpula do governo no momento em que soubera da morte. As fotos são

171

mostradas em ilustração ao seu texto. Traz o texto literal da mensagem recebida por Obama, que avisava da morte. Finaliza dizendo que o presidente deve ir ao Marco Zero para prestar suas homenagens. O apresentador agradece e faz a clássica interação do ao vivo e interage com a apresentadora através de olhares e movimentos. Faz ainda um comentário de que pouco a pouco vão surgindo imagens desse momento histórico. É a conversa a três já referida, já numa chamada de a seguir.

No bloco seguinte, chama um VT destacando a postura do Brasil. A matéria abre falando da atenção das embaixadas do mundo todo. Entra passagem de Cristina Serra na frente do Itamaray, cumprindo a definição clássica e levando a atenção para o alerta nas embaixadas brasileiras. É o que introduz uma sonora do ministro de Relações Exteriores Antônio Patriota. Em outra sonora é destaca a posição do Brasil de condenar o terrorismo e de estar sensibilizado com as vítimas dos atentados. Chamada para outro VT de repercussão na América Latina. Sempre com a ligação e visão autoral. Dessa vez com expressões como agora, em Buenos Aires e alguns países vizinhos nossos. O destaque é mesmo o posicionamento dos países latinos. A voz discordante do apoio aos EUA vem do governo de Hugo Chávez que não apóia. Segue destacando o apoio de outros países. O último referido é a Argentina. Talvez para justificar sua passagem que entra agora e é feita de Buenos Aires. É clássica, já que ele introduz na história outros países como Chile e Uruguai, que viram a ação como uma vitória contra o terror. De volta ao estúdio, a apresentadora destaca que o primeiro país a apoiar os Estados Unidos na Guerra ao Terror foi a Inglaterra. E por isso, chama de lá ao vivo o repórter Pedro Bassan. Ele narra como o governo de lá recebeu a notícia e seu posicionamento. Usa ilustrações e também linguagem autoral em seu texto quando fala coisas como aqui na Inglaterra já era madrugada. Isso para justificar porque os jornais do dia não dão destaque para o fato. E, ainda, eu já tenho aqui, quando mostra a capa dos jornais do outro dia que aí trazem destaque para a morte de Bin Laden. Apresentador agradece, classicamente naquela interação ao vivo, e chama VT de Roma. O enfoque é a manifestação de líderes de países europeus. Mais uma vez o caráter autoral na frase quem mostra agora é a repórter Ilze Scamparine. Ela narra a reação de líderes da União Européia e de alguns países e dá destaque para Sílvio Berlusconi na Itália. Isso faz numa passagem de fim de matéria. O que já prefiro chamar de pé de repórter. Sem muito caráter autoral. A não ser as referencias em texto e imagem de que está na Itália.

172

Apresentadora dá uma nota sobre a fala de Hillary Clinton sobre a relação com o Paquistão. Já é uma mistura para a chamada do VT que fala do Paquistão. O VT fala da importância que os EUA vê nessa aliança que tem com o Paquistão. Nesse país, pessoas relata não ter a mesma certeza de que essa aliança é benéfica e cobram o aparecimento do corpo. Um relato história sobre as relações do EUA com Paquistão é trazido. A passagem é feita de Paris e ao fim da matéria. O repórter Marcus Uchoa usa opinião e caráter autoral para dizer o quanto é embaraçoso para o Paquistão os Estados Unidos encontrar Bin Laden perto de uma base militar. No estúdio, o apresentador destaca que os EUA ainda não decidiram que se vão ou não mostrar fotos do corpo. Tudo no plano aberto e com a interação tripla. É quando chama também chama Uchoa ao vivo. Pergunta qual a posição do governo Frances e como está a situação em Paris naquele momento. Atualiza e diz que estão em alerta, mas desde os inícios do conflito na Síria. Usa opinião em frases como é bom não ouvir mais essa voz, quando fala de mensagens de Bin Laden que davam conta de atentados na França. Apresentadores chamam o a seguir. Na abertura para o bloco quantro, o destaque é para um VT que fala das reações no mundo árabe. Repórter traz a visão dessas pessoas a morte, sempre com ilustrações de personagens. Traz o contraditório, já que a visão posta não é de total aprovação. Faz uma passagem clássica, relacionando os grupos ativistas Hamas e Fatah. O VT segue com esse enfoque até o fim. O repórter Carlos de Lannoy também é chamado ao vivo. Ele é questionado sobre de que forma morte altera a rotina na vida dos israelenses, já que ele está em Jerusalém. Ele atualiza, sem opinião e o caráter autoral se limita ao fato de estar naquela base presenciando o que acontece por lá. Na costura do apresentador para seguir para outros VT, o apresentador diz que o Jornal Nacional segue indo do Oriente Médio para o Extremo Oriente. É a forma de relacionar com a repercussão na China e no Japão. O repórter Roberto Kovalic é chamado ao vivo. Ele diz que a China ainda não se pronunciou, mas que o Japão apóia a operação americana. Aqui ocorre algo interessante. O repórter entra através de uma conexão via internet. Isso já tem mudado o padrão do JN. Via Internet, a imagem e o áudio são inferiores. Isso não é mais preocupação e tem havia entrada desse tipo bem freqüentes, especialmente as do Extremo Oriente. Ou seja, peca-se na qualidade, mas ganha-se na atualização ao vivo e na força da presença. Pois nesse caso, a conexão cai. No meio do boletim, o repórter some. Os apresentadores tem de explicar o que houve. A imagem volta para os dois, que observavam as informações do repórter. Essa justificativa se dá tranqüila, com tom informal, ou, como

173

prefiro, de conversa com o telespectador. Veja o texto que é dado com os dois apresentadores em quadro. Eles falam de lado para câmera, muito mais um de frente para o outro. Fátima: uma pena. Ai, infelizmente, nós perdemos o contato. Mas, certamente, todos os países que já passaram por atentados terroristas estão hoje se sentido mais aliviados, mesmo sabendo que os ataques da rede Al Qaeda pode vir acontecer a provavelmente o farão. Bonner: É verdade. Eles viram-se de frente para a Câmera e ela encaminha a chamada do a seguir. Único destaque de fora do caso, é o acidente com o cantor da dupla Cláudio e Marroni. O próximo bloco volta falando desse acidente. É apenas uma nota coberta, noticiando de fora muito objetiva que o cantor sofreu um acidente de helicóptero e atualizando seu estado de saúde. O apresentador avisa: E de volta ao noticiário internacional...É a introdução para chamar um VT sobre o medo de novos atentados nos Estados Unidos. A matéria segue falando do medo e do estado de alerta. Entra uma passagem clássica destacando que a opinião de especialistas. Seguem sonoras desses especialistas. Aqui é usado um elemento bem comum. Enquanto fala do especialista, usa imagens deles alternadas com a imagem do repórter falando com ele. O texto não tem muito mais do que isso de autoral e já enseja falando como fica o futuro da organização Al Qaeda depois da morte de Bin Laden. Depois disso, o jornal chega ao fim. A trilha é rodada por completa, assim com o roal de créditos e o travel completo da câmera pela redação. Destaco o texto de Willian Bonner. Está terminando essa edição de 2 de maio de 2011, uma edição histórica do Jornal Nacional. Você terá outras notícias logo mais no Jornal da Globo, depois de Tela Quente. Boa noite.

Como o apresentador mesmo falou, esse foi um jornal diferente. Todo a sua configuração padrão foi alterada. Não houve quadros como Mercado Financeiro ou Previsão do Tempo. O Jornal usa, além de VT’s, notas pelas e cobertas, além de ilustrações de notas cobertas com sonoras. Esses três elementos desapareceram também. Há apenas Vt’s grandes, ou bem maiores que os habituais do programa. Em todos há, mesmo que de forma pequena, caráter autoral e relato de repórter. O mesmo se dá em quase todos os textos e interações entre os apresentadores. Isso sem falar nos acordes completos da trilha característica, que também ganham um tom mais orquestral. Todos movimentos para deixar o Jornal com esse tom histórico e autoral. A partir de terça, embora a pauta continue sendo dominada por esse grande

174

fato, o JN reassume sua configuração normal e passa a usar todos os elementos que compõe seu estilo de narrativa, que se anuncia como um resumo do dia que se encerra.

Na escalada de terça, destaque para os desdobramentos de Bin Laden. Porém, também é referida a caixa preta do voo da Air France que é encontrada e os critérios que o Governo Federal anunciar para determinar e auxiliar quem vive na extrema pobreza. Trilha perde tom orquestral e a vinheta e movimentos de câmera na abertura parecem normais. Na primeira matéria, lá está o caráter autoral. Essa edição do Jornal Nacional abre com a participação de nossos enviados ao país em que foi morto Bin Laden. E a chamada para o repórter Marcos Losekan entrar ao vivo. Ele traz um relato repórter, detalhando todas as dificuldades de se chegar até ali. Usa coisas do tipo eu e o cinegrafista Sérgio Gilz percorremos de carro, erra o nome da cidade de em que Osama foi morto e, bem natural, busca apoio de seu papel. E segue: a gente fica se perguntando como ele conseguiu chegar até aquela cidade, passando por várias barreiras do exército, o check points, que revistam tudo. Como um homem daquela estatura, ele tinha quase dois metros de altura, conseguiu passar sem ser notado...Confirma que as pessoas da vizinhança realmente não sabia de nada. Atualiza como está a casa e diz que nós conseguimos chegar e tocar o muro. É a deixa ara seu próprio VT. E nesse VT narra como a notícia de que aquela era a casa Bin Laden alterou com a rotina de toda a vizinhança e atualiza como aquele local segue sendo vigiado fortemente. Numa primeira passagem, se coloca na frente da casa e introduz o assunto de que o exército paquistanês não sabia da existência dele ali, mesmo sendo próximo de4 seus quartéis. Chega a ouvir algumas pessoas ligadas ao exército que confirmam a informação, assim como civis e estrangeiros que passavam por ali. Numa outra passagem, chama atenção para as características da casa, através de um movimento de câmera que faz. Chama atenção para os muros altos e diz que o que despertou curiosidade era o fato de a moradia não ter internet ou qualquer conexão com o mundo exterior. As passagens são padrões, embora tentem dar ainda mais força para o efeito estamos aqui. Em um dos pontos do texto, diz que o exército paquistanês entra e sai da casa a todo instante e que peritos trabalham na identificação de provas e demais objetos que estão na casa. A narrativa desses pontos se dá em muito em primeira pessoa, como quando usa nós testemunhamos. Voltamos ao estúdio e o apresentador volta a chamar o repórter ao vivo, que é submetido a uma espécie de entrevista. Ou seja, ele passar a ser ator ativo da narrativa pelo simples fatos de estar presente naquele local e ter a faculdades de contar a história que se passa diante de seus olhos. Nas respostas, usa expressões como eu mesmo fiquei estarrecido. É dessa entrevista que sai a deixa para ais um

175

VT. Neste, as autoridades do Paquistão justificam e voltam a afirmar que, de fato, não sabiam da existência de Bin Laden ali. Na matéria há uma passagem que introduz a versão do ministério de relações exteriores do Paquistão. A narrativa começa a evidenciar a reprovação da operação e o medo de paquistaneses de que os EUA passem a fazer incursões no país à revelia. O VT segue trazendo a versão de vários líderes locais que, chegam até a questionar a veracidade da operação. O clima político no Afeganistão e o medo de represálias do Talibã também são trazidos à tona. O apresentador então chama outro VT – mas sempre fazendo a costura e num diálogo triplo com o plano aberto e os dois apresentadores em quadro. É trazida a versão da Casa Branca, que tenta mais uma vez minimizar os conflitos e arranhões que possam ter partido da relação entre Estados Unidos e Paquistão. Há uma detalhamento de que objetos da casa estão sendo periciados e que já se inicia a caçada pelo então substituto de Bin Laden. Na passagem do repórter Luis Fernando Silva Pinto, destaca que ainda há dúvidas sobre a divulgação das imagens do corpo de Bin Laden. E destaca o medo do que essas imagens possam incitar. Depois disso, o off mostra líderes republicanos e democratas aplaudindo Obama, numa idéia de que apesar das divergências nos bastidores da operação, ele está forte politicamente entre oposição e situação. No estúdio, o a seguir destaca os bastidores da operação. E o bloco abre com um VT anuncia como novos detalhes da operação. Lembre-se que, desde o primeiro dia fala-se em detalhes da operação. Giuliana Morrone reconta toda a história da operação realmente com mais detalhes. Surgem novos personagens e cenários que levam até o mensageiro. Na sua passagem, no terreno neutro de Nova York, destaca que as investigações vão avançando e relembra tudo que teria ocorrido até o dia da invasão nos bastidores, até que a ordem para invadir fosse dada. Essa passagem cumpre a função básica – embora seja mais longa do que o comum - , já que a partir disso entra nos detalhes das idas e vindas daquele dia. Lembra, por exemplo, que a entrada chegou a ser adiada porque o tempo não estava ajudando. Apresentadora chama outro VT, mas de forma bem objetiva. Nele, há a detalhes de que a Casa Branca corrigiu algumas informações. Ele narra o que se passava dentro da cúpula do governo momento a momento que antecedia a operação. É a primeira diferença do VT anterior. É como se contasse a mesma história, só que de outros ponto de vista. No caso, de dentro da Casa Branca. Usa simulações para reconstituir a invasão e dá detalhes de quem estava em cada cômodo da casa de Bin Laden. E um detalhe importante: reconta o papel da mulher de Bin Laden. Aqui, é apresentada a versão de que ela investiu contra os militares e por isso foi baleada. E não que ele a teria usado como escudo humano pelo terrorista. Explica

176

detalhadamente o que foi feito com o corpo, com ênfase aos rituais islâmicos que teriam sido respeitados, até ser jogado ao mar. Fotos dos bastidores na Casa Branca são costuradas e meio a narrativa para mosrar o que se passava lá em meio a ação no Paquistão. Partes da coletiva do porta-voz do governo são usadas com a tradução em português sobreposta ao áudio original. A passagem do repórter é na frente da Casa Branca. O VT é de assunto controverso e polêmica. Quase nada de autoral ou interpretativo é usado. A não ser expressões do tipo antes de fazer o anúncio oficial aqui da Casa Branca. É mais um movimento para tentar descrever os bastidores. No texto em off, segue recontando os bastidores até o anúncio e em paralelo o que ia sendo feito com o corpo do terrorista. Apresentador chama um VT sobre a rotina em Nova York nesse segundo dia depois da operação. A construção da reportagem é de como a vida segue passando em torno ao Marco Zero e que o policiamento esta sempre atento. A passagem é feita dentro para Estação de Trem Central de Nova York. Ambiente é valorizado, já que a intenção é mostrar que em locais de grande movimentação há muita concentração de policiais. Passagem padrão já que o movimento da matéria passa a ser mostrar a segurança em estações de trem e até dentro de vagões do metrô. Fala de Time Square e da segurança por lá. Encerra o VT com imagens de uma banda tocando numa estação de trem. A intenção é mostrar que a vida vai voltando ao normal, reforçado pela frase assim todos tentam retornar à rotina. Na chamada de a seguir, destaque para a desconfiança dos europeus com relação ao Paquistão. O bloco se inicia co o grande plano aberto e com a frase do apresentador: a gente viu, logo na abertura do Jornal Nacional dessa noite, na reportagem do Marcus Losekan e doooo Sérgio Gilz que o local em que o Bin Laden se escondia era cercado de quartéis. Evidentemente por isso toodo mundo se pergunta como foi que o terrorista mais procurado do muundo conseguiu se esconder ali Durant tantos anos. E a apresentadora segue: a correspondente Ilze Scamparini mostra a desconfiança dos líderes da Europa com relação ao governo paquistanês. Aqui há o belo exemplo da coloquialidade e do diálogo a três. Ele se expressa muito, entoa e estica letras nas palavras, mexe os braços. Ela, ao lado faz sinais de positivo com a cabeça até sua entrada no que é de fato a chamada da matéria. O VT começa com depoimentos de líderes europeus, que evidenciam toda essa desconfiança. Mostra ainda a segurança reforçada na Europa e fala da manifestação da China que condena o terrorismo, mas apóia o governo paquistanês na sua supremacia. Na sua passagem de fim de matéria destaca que a União Européia foi condenada porque apoiar a morte de Bin Laden, mesmo que os preceitos europeus digam que um criminoso deva ser

177

julgado e condenado. Típica passagem de fim de matéria bem comum em matérias dessa repórter. É o que chamo do pé de repórter. O apresentador chama para VT que traz detalhes da situação no Oriente. E com a referência é o que mostra de Israel nosso correspondente Carlos de Lannoy. E a narrativa dessa matéria percorre o oriente atualizando a situação por lá. Na sua passagem, em Jerusalém, trata do posicionamento do governo israelense e relaciona com os conflito e questões políticas que emergem da Faixa de Gaza. Passagem de fim de matéria, como no VT anterior. Apresentadora chama um novo VT sobre um atentado no Marrocos que põe a Al Qaeda como suspeita. Como informa nosso enviado especial Marcus Uchoa. Contextualiza o local e a área aonde aconteceu o atentado, lembra que isso ali é muito comum. Faz a passagem na praça turística onde ocorreu o atentado. A câmera faz movimentos. Começa aberta, passa por um detalhe que destaca no texto e segue para a direita até encontra ele o colocá-lo em foco. Não há cortes nas imagens. Ele atualiza a situação de mortos e feridos e põe interpretação ao dizer que a praça não foi escolhida ao acaso. Segue o off dizendo que o governo considera sim Al Qaeda como culpada pelo atentado. Embora não haja reivindicação do atentado. Ouve personagem e destaca o impacto de tudo isso na vida e na economia daquelas daquele lugar e daquelas pessoas. Na chamada do a seguir, destaca para as ações do governo brasileiro no combate a miséria extrema e para a caixa preta do voo da Air France que caiu no mar. Bloco abre com nota pelada sobre a revisão de pena dos acusados pela morte da menina Isabella Nardoni. Nota-se que assim como o jornal vai retomando todos seus elementos característicos, outras notícias vão encontrando espaço. Há apenas uma troca de câmera para quebra do texto que está sendo lido por Bonner. Ele agora dá uma nota coberta sobre a caixa preta do avião da Air France que é encontrado. Agora, Fátima faz a chamada para o VT com dados sobre a extrema pobreza no Brasil e que apresenta ações para contê-la. E aqui temos um VT clássico do JN quando se trata de um assunto factual. A repórter abre falando de dados divulgados sobre a pobreza extrema. Na passagem, destaca que fatores que além da renda definem quem vive em pobreza extrema. A câmara que está fechada nela abre para dar espaço na direita. Ali, entra um gráfico destacando alguns números citados no texto. A passagem é padrão já que o movimento a partir dali é entrar nesses dados. Dados esses que são apresentados em gráficos que também anunciam as ações do governo. A ministra da Desigualdade Social Tereza Campello também aparece em sonora. O apresentador segue no mesmo assunto ando uma nota pelada de uma pesquisa da Fundação Getúlio Vargas que fala

178

sobre o poder de compra. Um espaço e na seqüência uma arte se na direita para apontar números apresentados no texto. Depois disso, mercado financeiro sé apresentado no mesmo formato, o que é bem característico em todas as edições. No plano aberto a apresentadora chama para matéria das fortes chuvas no norte e nordeste do país. Mais um VT característico de notícias factuais fortes. Mostram o desespero de vítimas e a situação do local. A repórter faz uma passagem curiosa, bem ao estilo repórter em ação. Está no meio de uma região alagada, em meio a chuva de capa de chuva e com água nos pés. Segue o VT contando as histórias de pessoas que vivem naquela região em que está a repórter. Vinheta característica da previsão do tempo e o boletim do tempo entram na sequência, com destaque para norte e nordeste. De volta ao plano aberto, é dada nota sobre o Dia Internacional de Liberdade de Imprensa. Além das ilustrações da nota coberta, entra uma sonora de Merval Pereira, jornalista da casa que participou do encontro. Mais uma nota coberta. Desta vez é lida pela apresentadora e é sobre a venda de ingressos e mais serviços do Rock In Rio. Apresentadora faz outra prática bem comum no telejornal: chama para mais informações no site do JN. O último bloco volta ser mais característico. É nele que são trazidas as notícias do esporte. A apresentadora chama VT com a história de uma jogadora de vôlei que se feriu num acidente de ônibus com a equipe de seu time. VT simples, recupera a história do acidente para introduzir e valorizar a fala da atleta. Na passagem, a repórter introduz para a fala da atleta, dizendo que ela fala pela primeira vez e agradece o carinho. A intenção é mostrar que ela está bem e que já trabalha na recuperação para voltar para as quadras. Apresentadora dá um pé bem característico atualizando o estado de saúde da jogadora. Apresentador faz chama para a atração do dia do programa Profissão Repórter. É outra prática bem comum. Sempre é chamada uma atração de jornalismo e entra um clique como que um trailler do que vai ter tema do programa. Na volta desse clipe, dá o horário do profissão repórter e encaminha o encerramento. Pronto. A partir de aqui, como veremos, o JN reassume sua configuração padrão. Usa elementos de caráter autoral e referencialidades, mas em escalas e proporções diferentes como veremos nas edições que virão.

Na escalada de quarta, destaque para a polêmica da veiculação ou não de fotos de Bin Laden morto. Mas, tudo parece bem diluído em meio há vários outros destaques do dia. Fazendo referencia ao nome do repórter Rodrigo Bocardi, faz a chamada para o VT que diz que Barack Obama não autorizou a divulgação das fotos de Bin Laden morto. O VT traz o porta voz da presidência e todo o relato dos argumento. Texto objetivo, fazendo apenas

179

o relato. Na passagem, o repórter leva para outro ponto da matéria: a invasão do território paquistanês. A narrativa passa a seguir essa inclinação. O demonstra que a passagem é bem característica. Matéria segue falando da aliança Estados Unidos e Paquistão e como esse ocorrido pode deixar essa relação. Texto basicamente narrando os fatos sem fator autoral. Apresentadora chama para VT para a posição do Paquistão e para a rotina lá no entorno da casa. Mais uma vez a referencialidade ao repórter Marcos Losekan que está lá. A matéria fala de como era a rotina da casa e da discordância de pessoas de lá sobre o que está sendo chamado de inoperância do Paquistão. Já que ou se sabia que ele estava lá e não se agiu ou se era tão incompetente que sequer se imaginou que estava por ali. Na passagem chama para a fala das autoridades, que se defendem. Matéria segue nessa linha e ele ainda ouve o embaixador do Brasil no Paquistão. Apresentador chama VT sobre a divergência na informação sobre o número de mortos e feridos na operação. Matéria abre apresentado essa divergência de informações e nessa passagem chama para os objetos que foram apreendidos na casa e liga para a questão da mulher de Bin Laden que segue ferido e sob proteção paquistanesa. Há uma nota atualizando as fotos e situação das vítimas que estavam na casa. Com a marcação do apresentador aqui no Brasil, introduz a história de um vereador que propõe homenagem a Bin Laden morto durante a sessão de uma Câmara de Vereadores de cidade do interior de Goiás. O áudio é recuperado. Depois, em nota, apresentador diz que vereador quis se explicar. Entra apenas a sonora do vereador com sua versão. Apresentadora segue dando nota do posicionamento do presidente dessa Câmara e chama para o a seguir. O bloco abre com chamada para um VT das cheias no norte e nordeste do Brasil. VT factual característico. Usa mapas e dados das cheias entremeados com personagens que são vítimas das cheias. Na passagem, mais um exemplo de repórter em ação. A repórter aparece dentro de uma canoa, se aproximando de uma casa. No texto: para se aproximar das casas de ribeirinho só mesmo assim, de barco. A repórter segue narrando que vai se aproximar da casa, pois falava com uma mulher à distância que tem outra preocupação. Ela diz que quer chegar bem perto para saber que preocupação é essa. A canoa chega e a repórter, com dificuldade sobe na varanda da casa. Há um pequeno corte, bem suave, como se acelerando a subida da repórter. A repórter pergunta a mulher então qual é sua preocupação. Ela diz que é que as crianças caiam na água. A ação que transcorre e a narração da repórter se dá em segundos, mas há uma espécie de dramatização e, claro, cheio de expectativa. O que a mulher quer dizer? Vai pedir ajuda? A repórter vai até lá? Vai conseguir subir na varanda e ver o que a mulher quer? Depois de revelado tudo isso passagem se mostra inserida na lógica de uma

180

passagem, Não é padrão por apresentar toda essa ação, mas a partir disso leva o enfoque para as criança se esse risco de que caiam na água. Mostra até mesmo que as escolas estão fechadas para evitar a circulação dos pequenos. Depois desse VT roda vinheta do JN no ar. Esse é um projeto que se dá em três fases. Mais adiante, ao longo pesquisa vou destaca-lo como agente que leva o jornal para perto do espectador. Agora, limito-me a descrever como ele aparece nessa semana de amostra. A repórter Lilia Telles é chama para uma participação ao vivo. Ela está no aeroporto do Rio de Janeiro, na frente do avião do projeto, se preparando para ir até ess região castigada pelas chuvas. A repórter dialoga com os apresentadores e destaca movimento testemunhais que ainda virão na próxima edição. Ela diz coisas como como você viu na reportagem anterior e ainda nós vamos até lá mostrar. Na volta para o estúdio, apresentadora agradece a repórter, deseja boa viagem Lília, como quem deseja a uma amiga e chama a previsão do tempo. Padrão e com destaque para a situação no norte e nordeste. Apresentador dá nota coberta sobre os grupos Hamas e Fatah no Egito e encaminha o a seguir. Terceiro bloco abre com nota coberta sobre recorde na arrecadação de impostos no Brasil, com destaque para o Impostômetros. Equipamento instalado na Associação Comercial de São Paulo que conta o quanto já se arrecado de impostos no Brasil. Dá ainda uma nota pelada sobre projeto de correção do imposto de renda que tramita na Câmara Federal. Chamada para um VT que traz dados de pesquisa que revelam que as famílias estão poupando cada vez menos. Também é um outro tipo de VT bem característico do JN. Eles apresentam dados de uma pesquisa que foi divulgada no dia a partir de referenciais em personagens, os cases. Nesse caso, a história começa a ser contada a partir de vários pequenos depoimentos de pessoas na rua que reconhecem que ao poupam e que preferem comprar algo com o dinheiro que sobra. Na passagem a repórter apresenta a pesquisa relacionando que ela reconhece o que se passa na rua. É um movimento que dá vida e crédito a pesquisa e ainda a torna mais compreensível e palatável ao espectador. Assim, em off, entra nos dados da pesquisa que são apresentados através de gráficos. Ouve especialista que interpreta a pesquisa e outra que recomenda que se economize e que dá a entender que o indicativa da pesquisa não é um bom sinal. Para referendar o segundo especialista, ouve uma pessoa qualquer na rua dizendo que é possível se fazer economia com sobras do orçamento. O texto desse VT é fluido e cada movimento desses é bem costurado com expressões coloquiais como esse economista, é isso que a pesquisa revela, para a dona fulana. Depois desse VT, é apresentado o mercado financeiro de sua forma padrão.

181

Apresentador dá nota coberta sobre a saída do cantor Marroni do hospital. Depois, o esporte. A apresentadora dá nota coberta sobre os jogos que vão acontecer na noite. E o jornal é finalizado. Atento para um detalhe: nesse dia, Fátima Bernardes não está no jornal. Apesar de reconhecer a importância do casal titular na narrativa do JN, deve-se também levar em consideração que a ausência dela não representou uma grande mudança de postura e ou discurso.

No jornal de quinta, a evidencia de que as notícias se tornam mais variadas a casa dia, embora os desdobramentos da morte de Bin Laden ainda sigam entre as manchetes. Na escalada, a visita e Obama ao Marco Zero, o reconhecimento da união gay no Brasil, cheias no norte de nordeste e a separação de divisão do Pará em três estados e ainda o primeiro corpo do voo da Air France resgatado. Essa é a notícia que abre o telejornal. O resgate desse primeiro corpo é contado a partir da visão e da expectativa das famílias de outras vítimas. Outra marca do JN. A matéria já abre com os familiares dotando de significado e narrativisando esse acontecimento. Aos poucos, esses depoimentos vão se misturando as informações num texto muito bem fluido. Na passagem, feita pelo repórter Marcos Uchoa em Paris, destaca para a retirada desse primeiro corpo e para as incertezas sobre a retirada de novos corpos. É uma das passagens de fim de matéria, que faz uma amarração final no texto com um pouco de interpretação. No texto: Esse foi apenas o primeiro corpo, mas mais de 170 ainda não foram encontrados. A polícia francesa hoje parece tentar moderar a esperança das famílias. Eles disseram “essa é uma operação complexa e as condições técnicas para a retirada dos corpos são altamente incertas”. Em plano aberto e em jogral, os apresentadores chama um VT. Ele dá destaque sobre a primeira entrada na Usina de Fokoshima no Japão. Ela, destaca que o direto da empresa foi hostilizado. O VT segue essa mesma lógica. O que divide as duas abordagens do mesmo assunto é a passagem. Até ela, é falada de como os diretores foram hostilizados e como receberam isso com resignação. A partir dela, destaque aqui para como foi a entrada na usina pela primeira vez. Temos aqui um clássico exemplo de passagem, fazendo a ligação. Depois disso, vinheta do JN no Ar e a conversa entre os apresentadores em plano aberto e a repórter Lília Telles, que agora fala do nordeste. Nessa conversa, ela faz um relato em primeira pessoa das coisas que viu e ouvir. Bem ao tipo relato repórter. Com o avião ao fundo, forja expressões como foi um dia de muito trabalho e contamos com o apoio da TV Local, afiliada..., e ainda você vai ver detalhes desse esforço em conjunto agora. É a deixa

182

para a entrada de seu VT. Começa pelas histórias de alagamento em diferentes pontos. Faz uma passagem sobre um rodovia alagada, sempre destacando muito o cenário. Nessa construção, como veremos, as inúmeras passagens fazem a costura e dão a idéia de movimento. Como se a repórter fosse realmente passando e conduzindo o espectador por diferentes pontos e momentos da narrativa. Recurso muito usado em matérias especiais. A história segue mostrando imagens e mais imagens de alagamentos, número e índices destacados em arte e depoimentos de fontes oficiais. Até agora, os transtornos são coletivos. Agora, faz uma passagem bem ao estilo vem comigo. É quando a repórter vai caminhando e a câmera a segue num movimento como se fosse levar o espectador junto, num olhar atento conduzo pela repórter. É assim que entra na casa de uma das vítimas. O local está completamente alagado. A partir dali, começa a narrar o drama de quem perdeu seus bens. No texto desse vem comigo: A gente vai entrando na casa de dona Maria e ela ta mostrando até aonde a água atingiu aqui. Sobe som com a voz de dona Maria: oi aqui oh. 70 centímetros (mostrando a marca na parede). E da outra vez foi maior ainda, oh. Até aqui em cima (mostrando uma outra marca mais antiga e mais alta). Voz da repórter com imagem em movimento da casa com água: a casa ta toda cheia d’água. Voz de dona Maria enquanto é mostrada a imagem de móveis amontoados e de um garoto mexendo em cima de um armário: tudo cheio d’água aí oh.Oia só como ta minhas coisas. Tudo aí entrevado. Imagem do diálogo de dona Maria e da repórter no corredor da casa com água pela canela: a gente não pode nem comprar umas coisinhas. Quando compra umas coisinhas, oia aí oh (aponta para a água). A sequência se dá em vários momentos e há cortes. Porém, os movimentos, por vezes descompassados da câmera, os fazem ser percebidos como parte desses movimentos. E a repórter passa para outra passagem em outro pronto de outra rodoviária. Cenário valorizado de novo. Mais histórias e dramas de dificuldades e perdas. A repórter volta a aparecer com água no joelho. Diz que quer ir até a casa de outra vítima, mas não pode. A água já está no joelho e na frente tem de a ser mais funda ainda. No texto: Olha, com essa correnteza aqui fica impossível chegar até aquela casa ali. A idéia era mostrar os móveis da dona Nicinha (a personagem que encontrou nesse outro ponto), mas a água aqui já bate no meu joelho. Ali pra frente sobe e quase cobre a pessoa. Então, já não dá pra chegar até ali. E o rio continua subindo porque, olha só (aponta para o céu), a chuva

183

voltou. Atento que esse tipo de texto, narrando a ação presente, é dito ao improviso, sem roteiro. O nexo e o roteiro da narrativa se dá na ilha de edição, quando se junta os pontos dessas passagens com as imagens e histórias coletadas no local. Essa matéria ainda faz referência de que há mais material no site do JN. Isso através de uma arte que surge no canto inferior da tela. De volta ao estúdio, o apresentador chama um VT específico sobre o estado de Alagoas, já que a história anterior se passava em Pernambuco. Ele tem tom teatral nas expressões que faz e na entonação que dá as palavras. Essa matéria não traz tanto a presença do repórter e tem uma construção mais clássica e simples. Ele faz a passagem dentro d’água como forma de costura mais e mais histórias de alagamento e perdas. A previsão do tempo vem colada. O próximo bloco abre em plano aberto e em jogral entre os apresentadores falando das diferentes versões que começa a surgir sobre o que realmente aconteceu na operação que terminou na morte de Bin Laden. O VT abre falando de mais uma versão contada a partir de fontes não reveladas do governo americano. Versão é matarializada através da ação de simulações de ilustrações. Texto em narrativa cronológica do momento da invasão. A passagem é simples, com a informação de que o Pentágono não quer comentar essa versão. VT segue. Apresentadores voltam em plano aberto e dizem que no Paquistão surgiu ainda outra versão e chama a matéria do repórter Marcus Losekan, que ainda está lá. Ele fala de detalhes da casa e de como o exército do Paquistão vigia a casa. Fala de planos de demolição da casa. Na passagem, bem perto do muro, mostra medidores de energia e diz que a casa era dividida em quatro partes. Passagem tem um pouco de vem comigo e repórter em ação. Nela ainda da detalhes de quantas pessoas viviam na casa e aonde ficava a família de Bin Laden. No texto, seguem e off com relatos de visinhos que nada desconfiavam. Fala ainda da versão do exército, acusado de ineficiente pelos estados Unidos. Ainda traz informações de que ninguém estava armado na casa e que não houve resistência. Na palavra do exército, ainda ameaçou cortar relações com os EUA caso façam outra operação do tipo sem informar o governo do Paquistão. Em nota, a apresentado diz que o governo dos EUA qurem manter alinaças com o Paquistão. O apresentador chama para VT que narra as homenagens prestadas por Obama no Marco Zero em Nova York. O VT vai na história cronológica e na passagem faz relação com a operação no Paquistão. Segue falando da operação e da recursão que deve dentro do EUA, ouvindo especialistas do dois lados. O apresentador dá a cotação do Barril de Petróleo e chama o a seguir com a união gay reconhecida no Brasil.

184

No plano aberto e em jogral, chamam para o VT da união gay. Ele simplesmente narra como foi a sessão do Supremo Tribunal Federal que reconheceu a união. Traz depoimentos de ministros e na contramão desse reconhecimento, apenas o advogado que representava a Igreja Católica. Na passagem, a repórter dá apenas os próximos passos e o que precisa ser feito para que cada casal tenha reconhecida sua união. O texto é simples e objetivo. Sem posicionamento e interpretações. Seguindo com política, o apresentador chama VT sobre movimento que se dá no Congresso contra as MP’s. É um VT que representa o padrão das matérias de política do JN. O tema é apresentado, diz-se de onde partiu a discussão e apresenta opiniões de lado a lado. Na passagem, explica o que é uma MP e o que a lei diz sobre elas. A partir daí, entra nas matérias que tramitam em MP. O texto é simples, objetivo e sem interpretação nem mesmo na passagem. Ouso a classificá-lo como apenas informativo. De volta ao estúdio, apresentadora dá nota coberta sobre a aprovação de consulta através de plebiscito que pretende dividir o Pará em Três estados. No texto do a seguir, em jogral, falam numa injustiça ao trabalhador e uma tímida correção na Tabela do Imposto de Renda. Esse último bloco da quinta, abre com nota coberta sobre acidente de trânsito que teve como mortos e feridos uma equipe de uma TV afiliada a Globo. Mais uma nota coberta sobre a prisão de uma quadrilha que traficava cocaína em vários estados. É em geral como apresentam ocorrências policias e acidentes de menor impacto. O texto, como em geral nos dois tipos de nota, é bem objetivo e informativo. Em plano aberto e em jogral chama o VT sobre a correção da tabela do imposto de renda. É feita uma relação com a edição anterior do JN. No texto: Bonner: o Jornal nacional de ontem mostrou aqui..... (recupera a nota coberta que deu sobre o recorde na arrecadação de impostos medida no Impostômetro). Fátima: e nessa bolada está a arrecadação do Imposto de Renda (Daí entra na chamada do VT que diz que é necessária uma correção mais justa já que atualmente está custando muito ao trabalhador). O VT é um daqueles que usa cases e várias historinhas para apresentar um tempo mais denso, que vai sendo apresentado em meio a esses exemplos. A primeira cena são trabalhadores e a frase em off :é só abrir o contracheque que o humor muda. Entra o personagem dizendo que os descontos de IR são cada vez maiores. Na passagem, há movimento de câmera e a repórter caminha dentro de uma fábrica. Ela diz que esses descontos mexem na rotina das fábricas e que muitos trabalhadores não querem fazer hora

185

extra por que os descontos aumentam na mesma proporção. Um case reforça essa afirmação. Com ajuda de arte, explica como oi desconto aumenta e como a falta de uma correção apropriada prejudica o trabalhador. Um especialista surge para dar crédito às explicações. Terminado o VT, são apresentados os números do mercado financeiro dentro do padrão. A última ação do jornal é chamar o clipe da atração Globo Mar e encaminhar o encerramento.

Na sexta-feira, os destaques da escalada são ainda mais variados e a escalada seguem bem dentro dos padrões. A primeira matéria é um VT e ele fala sobre o aumento na inflação e as ações do governo para contê-la. Mais uma vez, o assunto é introduzindo através de personagens que ajudam a legitimar o assunto e introdução a constatação: as coisas estão subindo, portanto, estamos tendo inflação. Graças e artes ilustram os números de quanto está a inflação e ainda demonstram o quanto já passou da meta estipulada pelo governo. A passagem da repórter é feita num shopping center. Ela relaciona o consumo a taxas de juros e ações do governo e, claro, com aumento da inflação. Aqui, atento para um detalhe: nesse tipo de matéria, o repórter enquanto personagem não aparece. Nem mesmo em interpretações no texto. Se ocorrem e quando ocorrem, são mínimos. O repórter nesses casos é tido muito mais como um apresentador do tema, dos personagens e costurador dessas histórias na grande narrativa da matéria. No caso dessa matéria, a repórter é Mônica Teixeira. São dela, normalmente as matérias de economia. Mas isso não é regra. Além das matérias de economia, matérias que trazem dados de pesquisa ou algum outro tipo de explicação para assunto mais amplo que não seja explicável apenas pelas histórias de personagens é tratada assim. Exceção, ainda, para as reportagens de política e especiais. Então, nessa matéria da inflação, a sonora é padrão é introdução gráficos que explicam as ações do governo, bem como a fala do ministro da Fazenda na forma de sonoras. Depois, é trazido um especialista para fazer suas constatações e a matéria encerra com um case. Voltando a trazer a narrativa para personagens reais. No texto: Repórter: para dona Berta, a meta (brincando com a meta de inflação que é bem usada no texto em off e referida nas sonoras do ministros e do especialista) é fazer o dinheiro da aposentadoria chegar até o fim do mês. E não está dando pra cumprir. Sonora de dona Berta: faço umas comprinhas e acabou. O resto do mês tem que se virar com alguma coisa, fazer um serviço extra. Fazer alguma coisa pra ter dinheiro. Em jogral, o casal agora recuperada – como já fez em outras edições nessa semana - a decisão do STF sobre a união gay. Agora, chamam para uma matéria suitada que mostra como

186

o mercado voltado para o público gay vem crescendo. É um outro assunto que tem o mesmo tratamento da matéria anterior. O centro da matéria são os dados de uma pesquisa que mostra que o consumo do público gay vem crescendo. Na cabeça, os apresentadores relacionam com o fato do reconhecimento da união gay no Brasil. O VT segue usando dados, personagens e especialistas para referendar o que diz a pesquisa. Se na matéria anterior o pano de fundo de toca a construção era “olha as coisas estão subindo, temos inflação, o que o governo está fazendo?”, nessa o pano de fundo é “ontem eles tiveram a união reconhecida. Mas veja como os gays são importantes na economia e como já mexem com o mercado”. O VT, então, abre com o case de um jovem. No texto, algumas brincadeirinhas – que podem ser questionadas – mas que não chegam ao ponto de grande interpretações e caráter autoral trazidos a tona em matérias especiais. Talvez, nesses casos, a interpretação na construção total da narrativa em que pequenos detalhes não dão lá grande sinais de caráter autoral. Isso só se percebe no contexto do todo. É possível se interpretar que, como o repórter enquanto personagem desaparece, a edição fica com cara de interpretação do jornal e não de quem apresenta a matéria. Vejamos no texto. Repórter: Consumo sem culpa. Sonora do jovem: (ninguém, diz, mas o contexto demonstra que é ele o personagem gay) eu gasto muito indo a bons restaurantes, indo muito a a baladas, também costumo gastar muito com roupa. Repórter: Bom para o mercado. Comércio, bancos e empresas de cartão de crédito perceberam que os homossexuais tem um bom potencial de consumo para ser explorado. Tanto que pesquisas são contratadas para descobrir os hábitos de investimento e consumo desse público. Dá pra entender porque. Segue com uma arte apresentando dados de uma pesquisa que mostra o perfil de consumo e o quanto gastam. A passagem é feita numa livraria e a repórter destaca que os livros estão nessa lista de gastos. A introdução para o case de uma livraria que está atenta para esse público. Depois, ainda é usada a sonora do gerente do local. O apresentador chama um outro VT fazendo a ligação. Nessa semana uma outra barreira sexual foi quebrada. É a introdução para a chamada de um VT que conta a história da primeira mulher a comando uma aeronave da FAB. É um tipo de matéria recorrente, com o foco principal na história de vida do personagem. A matéria tem apelo emotivo e o texto brinca com isso. O repórter usa o texto interpretativo, tenciona e, por vezes, até impõe sua presença na narrativa. Mas ainda não chega a ser no grau que se dá numa matéria especial.

187

A narrativa começa apresentando a personagem, a principal da história toda. São sonoras imagens dela, num movimento de construir a idéia de quem é essa pessoa. Na passagem, há exemplo de movimento grande de câmera e estilo repórter em ação. A repórter caminha num angar entre os aviões, até a personagem surge e começa a entrevista. Como a cena não é inusitada, um flagrante e nem tem carga dramática, soa como teatralidade. Uma encenação ou, se preferir, uma combinação. A personagem se prepara e a equipe também para acompanhar esse primeiro voo comandando esse avião importante. Aí também há teatralidade, embora não explícita. Ora, o voo não ia acontecer enquanto a equipe ia passando. Toda a equipe foi avisada e combinado de acompanhar a personagem em casa passo desse dia tão importante. Visto assim, parece óbvio. Mas como a narrativa é construída, com as combinaçõezinhas, esses fatores são postos alheios a história. Olhando-se apenas a narrativa, com os elementos ali postos, sem interpretações de fatores alheios, tem-se sim a impressão que tudo passa ali naturalmente diante das câmeras. E para aumentar esse tom de realidade, a repórter ainda faz a seguinte marcação de poder e veracidade no texto: com quatro microcâmeras instaladas no jato de Carla (a personagem) e com nosso cinegrafista em outro avião, registramos a missão da tenente...E todo o voo é registrado com dados e números. O texto segue fouxo, descontraído, com brincadeiras às rotinas e rituais desse tipo de voo de estréia. Quando pousa é recebida pela banca da Força Aérea. Ajeita o cabelo antes de descer. E na tradição da força do batismo (quando o piloto passa por uma jato de água e toma um banho) inaugura uma nova etapa na Força Aérea Brasileira. O texto literal é simples, mas no contexto da narrativa traz consigo outros significados. Como, por exemplo, esse batismo não é só dela, mas de toda a FAB que, inaugura uma nova etapa. De volta para os apresentadores, a chamada agora é para um VT sobre desarmamento. O factual mais uma vez diluído nas histórias de personagens. A história é o lançamento de mais uma campanha de desarmamento. Desta vez, antecipada pela tragédia de Realengo. A campanha e todo o seu procedimento é apresentado em meio a recuperação da história do massacre e aos personagens que também pertencem aquela história que surgem agora como personagens que lutam pelo desarmamento. Outros personagens também são trazidos, como fontes oficiais e pessoas que decidem entregar suas armas. Há um pouco de encenação na entrega de armas e na destruição, supostamente flagradas pelas câmeras. O próximo VT fala do surgimento de uma outra droga, o Oxi. Apresenta a droga numa narrativa que começa a partir de uma apreensão. O texto é objetivo sem cases e apenas com

188

especialistas e fontes oficiais. A passagem serve de ligação entre a explicação da polícia e de médicos. O assunto Bin Laden é trazido nessa edição só agora. O que puxa o VT é o factual de que a organização Al Qaeda reconhece a morte dele e volta a ameaçar os EUA. A narrativa se desenrola em meio as atividades de Obama durante o dia, em meio a condecorações a soltados envolvidos na operação e que atuaram no Afeganistão. Toda a operação é trazida para anarrativa para explicar o papel desses militares condecorados e apresenta a definição dos nave seals. Matéria com bem menos fator autoral e interpretação do que as apresentadas no início da semana. Depois, a apresentadora chama outro VT sobre as manifestações na sextafeira no Oriente. Dia sagrado para os muçulmanos. É a matéria de Marcos Losekan e Sérgio Gilz que seguem por lá. Atualiza as manifestações do mundo árabe e cita a situação no Paquistão. Na passagem, destaca a ação de um avião americano não tripulado que fez ataque naquele dia. A matéria encerra com muita interpretação dentro de uma passagem de fim de matéria. No texto: ... é a primeira ação desse tipo desde a morte de Bin Laden. O que pode aumentar muito a tensão entre os dois países. (EUA e Paquistão). Esse bloco encerra com um VT do corresponde de Jerusalém sobre os confrontos na Síria. Texto mais informativo menos interpretativo. O terceiro bloco abre com um VT sobre safáris ilegais no Pantanal. A matéria tem caráter de denúncia exclusiva, apesar de o assunto ter vindo à tona a partir de operação da Polícia Federal. A repórter começa narrando descritivamente duas caçadas. As imagens foram apreendidas pela PF na operação. A personagem, apresentada como vilã, é uma ambientalista. O texto faz referência que ela já havia sido personagem em uma matéria do JN há anos como uma fazendeiras disposta a preservar as onças do Pantanal. Na passagem, introduz a operação da PF. É só aí que fica clara a operação e o destino de cada um a dessas pessoas envolvidas. Traz depoimentos que representam os dois lados, as duas versões da denúncia. A apresentadora dá nota coberta atualizando as cheias no norte e nordeste. A nota é objetiva, ao não ser pela referência uma das cidades que mostramos ontem. Cola a previsão do tempo. O apresentador segue com nota coberta sobre desligamento de usinas nucleares no Japão. Mais uma nota pelada sobre a retirada de mais um corpo dos escombros do avião da Air France. Chamada para clipe do Globo Repórter. Mais uma vez, o último bloco é do esporte. Em jogral de plano aberto chama para VT de jogo da noite anterior. Os VT’s de esporte são sempre parecidos. Há descontração no texto, brincadeiras, cases com sonoras de torcedores, jogadores ou até dirigentes e os gols

189

recuperados. As passagens, em geral, serve para projetar o que vem à frente para o time. Em geral, o próximo desafio ou jogo. Depois disso, o apresentador faz uma correção. Há uma informação equivocada que foi dada na reportagem sobre a primeira mulher a pilotar um determinado tipo de avião da Força Aérea. Mesmo assim, assumindo o erro, o apresentador não abre mão da coloquialidade. O que não minimiza o erro. Porém, faz com que o espectador aceite, já que assumiu de maneira tão humilde e despojada. No texto dele: No começo desta edição do Jornal Nacional nós mostramos a reportagem sobre a tenente Carla Borges, da Força Aérea Brasileira. A primeira brasileira a pilotar um jato de caça. E nós dissemos que ela chegou a 67 mil metros de altitude. Teria sido sensacional! Ela teria entrado em órbita, né?! Na verdade, ela voou a seis mil e 700 metros de altitude. (Franze a testa, torcer a boca e sinaliza com a cabeça em sinal de sim) Erramos! E erramos feio. Um suspiro profundo e segue, na mesma câmera, e dá uma nota coberta sobre uma ação do Projeto Amigos da Escola. Em nota coberta, a apresentadora registra duas novas atrações confirmadas para o Rock In Rio e recupera todas as demais já confirmadas. Em jogral, chama um VT sobre um festival de cinema em Recife que homenageia Pelé por ter participado de vários filmes, nacionais e internacionais, como ator. Mais uma reportagem com o foco no personagem. Mostra ele recebendo o prêmio, recupera cenas dele de filme, repórter faz a passagem na frente de uma tela de cinema e introduz as sonoras de Pelé. Tudo num clima de descontração e texto frouxo, como os de esporte. A matéria encerra com uma brincadeira, quando Pelé diz que se dá nota 8 como ator. Volta para apresentadores sorrindo que dão mais uma nota pelada avisando que mais da entrevista com Pelé vai estar no Esporte Espetacular domingo e encaminham o encerramento.

A edição de sábado não tem os apresentadores titulares. Porém, em nada altera os elementos do telejornal. Nesse observado, os interinos são Cristiane Pelajo e Heraldo Pereira. E apresentam mais uma escalada surtida. A notícia do dia é a divulgação de vídeos em que aparecem Bin Laden assistindo TV. É esse o VT de abertura, chamado em jogral. O texto é mais reto e objetivo e diz que a divulgação partiu do Pentágono. Ela chama outro VT sobre o dia de protestos no mundo árabe. A matéria é descritiva e centra realmente nos protestos. Na passagem do repórter, em Jerusalém, introduz e relaciona com os protestos e conflitos na sempre tensa Faixa de Gaza.

190

O apresentador segue com uma nota coberta sobre a queda de um avião na Indonésia. A apresentadora chama um VT sobre a descoberta de uma nova rota para o tráfico internacional de drogas que passa por dentro do Pantanal. A matéria conta detalhes da operação. Chamo a atenção somente para a passagem. Ela tem movimento de câmera e de personagens. É o estilo repórter em ação no meio de um campo entre policiais correndo. Há teatralidade. Ao menos até o momento em que o repórter Jonas Campos diz já no próximo off: os policiais nos levaram até uma fazenda onde foram encontrados 60 quilos de cocaína no ano passado. O próximo VT é chamado pelo apresentador. É uma suíte da matéria da noite anterior que falava de safáris clandestino no Pantanal. Há uma atualização, mas o foco está na opinião de ambientalistas. Eles assistem a reportagem anterior e condenam as atitudes. Um detalhe: aqui não há teatralidade. Fica claro na narrativa que os ambientalistas foram chamados para assistir a reportagem e fazerem suas ponderações. O segundo bloco abre com uma chamada ao vivo para um repórter que está num shopping center. É véspera do dia das mães e a intenção é dar detalhes da movimentação. A apresentadora chama o repórter sorrindo em plano aberto e pergunta: Cezar (Menezes, o repórter), conta pra gente: tem muito filho atrasadinho por aí? Ele responde e traz as informações em tom de entrevista. É perguntado sobre comércio de rua, fala disso enquanto são recuperadas imagens gravadas durante o dia. Os apresentadores agradecem a participação ao vivo, no estilo característico. Da alegria para a seriedade. O semblante muda e chama um VT sobre as chuvas do norte e nordeste. Não há ligação e relações no texto. O VT é de atualização, mas com o enfoque no trabalho dos voluntários. Texto mais leva e emotivo e passagem em meio ao trabalho dos voluntários e com expressões como trabalho de formiguinha. Previsão do tempo cola na sequencia. Apresentadora volta e chama VT sobre as homenagens às vítimas ao atentado de Realengo que completa um mês. O texto é emotivo e dramático. Recupera algumas vítimas e mostra que pais estão sofrendo, mas tentam tocar a vida. É um misto de dor e vontade de vencer. A passagem é feita durante uma missa, com o altar ao fundo e o áudio ambiente bem alto. A repórter introduz a fala do arcebispos na missa, encerrando o dia de homenagens. No penúltimo bloco, o apresentador chama VT sobre pesquisa de estados com mais acidentes. O estado é Santa Catarina e é fechado pelo repórter de lá. A matérian é mais fria e não tem todo aquele apelo de personagens costurando a história. É como se o Estado fosse o grande case, trazendo apenas fala de autoridades e especialistas. Na sequencia, ela chama VT sobre a chacina de adolescentes em São Paulo. Matéria objetiva e sem muito apelo dramático.

191

A situação por si só já é um drama. O próximo VT é sobre a reutilização de entulhos. É bem como as matérias nos eixos de personagem, só que aqui o eixo não é uma pessoa. O personagem é a iniciativa. São apresentados cases, exemplos e especialistas em um texto leve e descompromissado. Depois, no plano aberto, fazem um bate-papo ao vivo com os apresentadores do Fantástico sobre as atrações do programa. Como em todos os vivos, agradecem ao fim. No último bloco, o esporte e assuntos leves. Começa com nota coberta do início da venda de ingressos para o Rock In Rio. Ele chama para uma matéria de um nadador revelação que consegue ganhar do campeão Cesar Ciello em uma das provas. Matéria com texto divertido e que consegue captar em sonoras a felicidade do jovem pela vitória e a surpresa do próprio Ciello. O jovem serve como próprio personagem da matéria, que tem a atualização dos resultados co apenas um detalhe menor. A única diferença é n apresentação. Poderia ser um VT, mas é lido pelo apresentador como nota coberta e entram as ilustrações de sonoras. Há uma nota coberta sobre a morte do médico Lídio Toledo, que teve sua carreira ligada ao futebol. Depois, a apresentadora chama um VT sobre as finais dos campeonatos estaduais. O texto brinca e vai costurando a situação do cenário de cada uma das finais. Depois disso, o jornal é encerrado com o boa noite dele. Ela quebra e diz: uma boa noite, um ótimo domingo e um feliz Dia das mães.

192

APÊNDICE P - REPRODUÇÃO DE DIÁRIO DE CAMPO

Figura 25 - reprodução de fragmento de diário de campo do autor

Lihat lebih banyak...

Comentários

Copyright © 2017 DADOSPDF Inc.