Diversas Cidadanias dentro da Diversidade: a Juventude Gay entre Escola e Culturas

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ATAS DO XII CONGRESSO DA SPCE, 2014

DIVERSAS CIDADANIAS DENTRO DA DIVERSIDADE: A JUVENTUDE GAY ENTRE ESCOLA E CULTURAS Hugo Santos [1], Manuela Ferreira [2], Sofia Marques da Silva [3] [1] Departamento das Ciências da Educação da Faculdade de Psicologia e Ciências da Educação da Universidade do Porto, Porto, [email protected] [2] Departamento das Ciências da Educação da Faculdade de Psicologia e Ciências da Educação da Universidade do Porto, Porto, [email protected] [3] Departamento das Ciências da Educação da Faculdade de Psicologia e Ciências da Educação da Universidade do Porto, Porto, [email protected] Resumo Cidadania continua hoje, apesar da polissemia e contestação, a ser uma dimensão desejada, abarcando direitos distintos (e.g., sexuais). Existe um entendimento geral, ora da educação como um direito humano universal, ora da escola como um local de atribuição de cidadanias diversas. Todavia, o fenómeno do “bullying homofóbico” tem questionado, quer as possibilidades cidadãs de jovens não-heterossexuais, quer o caráter seguro, inclusivo e pluralista desta instituição de educação formal, contexto historicamente difícil para este segmento. Perspetivas queer têm, contudo, contestado a posição marginal e estereotipada deste grupo, sendo preciso interseccionalizar vulnerabilidades. Foi a partir desta diversidade que, numa pesquisa de Mestrado, se quis auscultar as vozes de jovens rapazes não-heterossexuais no seu posicionamento, ora como alunos construindo identidades e cidadanias sexuais, ora como jovens produzindo particulares culturas, tentando compreender, através das experiências, percursos e vivências, modalidades de marginalização. O método principal foi a entrevista semiestruturada, em profundidade e com intenção biográfica, assumindo a metodologia um teor qualitativo. Simultaneamente, algumas reflexões referentes a encontros urbanos com os jovens conferiram à pesquisa um porte interculturalmente etnográfico. Na dualidade entre estrutura e agência, conclui-se que o panorama escolar é homofóbico. O insulto, mecanismo disciplinar das masculinidades, impossibilita uma construção identitária gay afirmativa e a cultura heterossexista, sob a alçada da negligência pedagógica e curricular, marca presença assídua e pontual. No entanto, cada grupo juvenil possui as suas estratégias de superação ou conformação (manobras), interconectadas com ideais-tipo de cidadania: cidadanias do faz-de-conta – jovens que privatizam a sua (homo)sexualidade, reproduzindo estereótipos redutores; cidadanias da respeitabilidade – jovens com capital cultural e estratagemas de apresentação e mobilidade; cidadanias subalternas – jovens que são contam histórias emotivas de agressão e desengajamento; cidadanias reclamadas – jovens envolvidos na comunidade gay e que, distanciando-se da imagem conveniente de vítima, operam parodicamente violências imaginadas contra o opressor.

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Introdução Nos últimos anos, o “bullying homofóbico” tem-se tornado um objeto mediático nos estudos educacionais (Rivers, 2012; UNESCO, 2012). Enquanto a teoria educacional tem alertado para a questão da homofobia nas escolas públicas desde da década 90 (Epstein & Johnson, 1998; Louro, 2000), as Ciências da Educação tem permanecida mudas em relação a este fenómeno, ao corpo e à sexualidade de forma geral (Silva, 2010). Esse foi o pretexto para uma pesquisa com jovens rapazes não-heterossexuais e as suas experiências escolares passadas procurando avaliar o grau de inclusividade ou marginalização das escolas públicas portuguesas. Os resultados revelam um panorama onde a homofobia marca presença assídua e pontual e os jovens revelam, por sua vez, manobras diferenciadas de lhe fazer frente que, distinguindo-se umas das outras, estão seguramente interseccionalizadas com os seus mundos culturais. 1. Enquadramento teórico 1.1 Algumas reflexões em torno do conceito de “cidadania sexual” A revindicação das pessoas LGBT (lésbicas, gays, bissexuais e transgénero) por direitos iguais em equiparação às pessoas heterossexuais tem invocado o conceito de “cidadania” e dirigido a atenção ao contrato social (Weeks, 1998). Essas reivindicações, obviamente, obrigaram a uma reformulação do conceito que abarcasse a sexualidade, dentro da qual, a particularidade da orientação sexual, ao mesmo tempo que lembrava as lacunas relativas à universalidade dos direitos humanos e básicos de lésbicas e gays, cuja violência, opressão, marginalização e estigma social claramente comprometiam. Não é de estranhar que o conceito de “cidadania sexual” tenha entrado, desde da última década, no léxico das ciências sociais e humanas (Weeks, 1998; Lees, 2000; Richardson, 2000). Mas o que quer dizer “cidadania sexual”? Diane Richardson (2000) refere como direitos sexuais, por exemplo, o direito à autodefinição e autoexpressão e o direito à escolha livre e consensual de parceiros/as. Ora, esses direitos sexuais dependem, em larga escala dos enquadramentos legais, com certeza, mas não se reduzem a eles, contemplando também consciência cívica (Weeks, 1998). Ora, o próprio conceito de “cidadania” é de definição complexa e tem nutrido várias tensões: pluralidade/homogeneidade, universalismo/diferencialismo, exclusão/inclusão (Magalhães & Stoer, 2005; Araújo, 2007; Menezes & Ferreira, 2012). Se para setores conservadores ser um “bom cidadão” significa ser heterossexual, para outros setores aceder à cidadania seria reconhecer outros grupos que foram esquecidos pela história em detrimento da sua identidade. Aliás, o que teve subjacente na Educação para a Cidadania e a sua implementação no contexto escolar, desde da Lei de Bases do Sistema Educativo, foi o princípio de uma cidadania cosmopolita onde ser bom cidadão/boa cidadã era, sobretudo, aceitar as diferenças como parte integrante do Outro (Menezes & Ferreira, 2012). Uma dessas tensões – menos conhecida, talvez – diz respeito a uma fractura interna dentro da própria comunidade LGBT. Ora, como tinham alertado Magalhães & Stoer (2005), à medida que se define quem entra na cidadania, estabelece-se, por oposição, quem fica de fora. A teoria queer ao incorrer numa crítica anti-essencialista contra as políticas universalistas, inclusivas e (neo)liberais de igualdade de direitos para pessoas 1575

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LGBT, tem apelado para a desconstrução da identidade gay (Weeks, 1998; Richardson, 2004). As exigências de respeitabilidade decorrente de uma aproximação estratégica do movimento à esfera pública e decisores políticos tem produzido “bons” cidadãos gays – os/as cidadãos/ãs que mais se aproximam das normas sociais e que interessam – e “maus” cidadãos gays – os responsáveis pelo grupo na sua totalidade não aceder a uma cidadania completa (Richardson, 2004). Esta dimensão é importante pois é demonstrativa como, dentro de um grupo, existe uma diversidade ímpar na qual múltiplas relações de poder transitam e através das quais múltiplas identidades e posicionamentos, opressões e privilégios se auto e/ou hetero exprimem e/ou inibem (interseccionalidade). 1.1 Cidadania sexual na escola A intersecção entre educação e cidadania é coextensiva à primeira formulação moderna do sistema escolar republicano enquanto o conhecemos hoje (Araújo, 2007). O mesmo é dizer que se se aceitar (ainda) uma conceptualização de cidadania à la Marshall (1950 [2009]) – que, como se sabe, apesar de contestada, mantêm um núcleo central respeitante à igualdade de direitos e deveres –, a educação, per si, porque se constitui como um direito humano universal, básico e fundamental, faz emergir a escola como um dispositivo institucional de elaboração de cidadanias futuras (Gordon, Holland & Lahelma, 2001) e também das suas possibilidades práticas e vividas in loco assim como das dinâmicas de consciencialização para a participação (Menezes & Ferreira, 2012), consoante o que os contextos históricos determinam o que cidadania é ou deve ser – determinando quem está dentro e fora –, o que, obviamente, nunca é algo consensual e finalizado. A escola parece ser, nos discursos políticos, enquanto primeiro espaço de socialização pública de crianças e jovens, o local por excelência de atribuição de cidadania (Gordon, et al., 2000) e capacitação para a ação (Menezes & Ferreira, 2012). O “bullying homofóbico” tem-se tornado, nos últimos anos, um objeto sociomediático (UNESCO, 2012). As Ciências da Educação em Portugal tem, contudo, negligenciando a sexualidade como uma dimensão relevante de investigação e intervenção (Lees, 2000; Silva, 2010; Santos, Fonseca & Araújo, 2012) e, sobretudo, as questões LGBT. Mas parece ser óbvio de como a violência homofóbica – enquanto bullying ou não – impede a igualdade de percurso destes/as jovens, o seu engajamento, sucesso e, sobretudo, inclusão numa instituição secular que se autoproclama “inclusiva”. Pesquisas tem demonstrado, claramente, que a escola é um lugar tendencialmente inseguro para estes jovens e que a propensão para desistirem ou abandonarem a escola é muito alta (cf. Rivers, 2012). Se se considerar, tal como Carlos Estevão (2006), de que a escola deve assegurar, antes de tudo, a dignidade humana, a escola fracassa quando negligencia a luta contra o bullying (em geral) e, em particular, o homofóbico (entre outros). Porque a homofobia funciona em termos de perceção de uma orientação sexual (e.g., através do comportamento de género), muitos/as jovens heterossexuais tornam-se também dela vítimas. Mas abordar a homofobia na escola num contexto contemporâneo de crise, trazendo para Portugal velhas e, ao mesmo tempo, recentes perspetivas, implica integrar algumas visões, quer consolidadas, quer pós-críticas sobre o fenómeno. Assim sendo, se é já um desígnio comum a presença assídua e pontual da homofobia nas escolas (Epstein & Johnson, 1998; Louro, 2000), porém, no plano juvenil, várias são as perspetivas – ainda 1576

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que marginais – que apelam para uma conceção menos negativa e vitimista da juventude não-heterossexual que, paradoxalmente, a Ciência tem ajudado a construir (Miceli, 2002; Rasmussen, Rofes & Talburt, 2004; Filax, 2006; Puar, 2010), criticando as conceções teóricas, metodologias utilizadas e resultados fatalistas. São estas inquietações teóricas que dão corpo às problematizações que sustentaram uma pesquisa de Mestrado anterior, justificada pela ausência e escassez de estudos sobre homofobia nas escolas em Portugal e, ao mesmo tempo, sobre culturas juvenis não-heterossexuais (cf. Santos, 2013). Metodologia A nossa pretensão inicial era simplesmente auscultar os jovens rapazes nãoheterossexuais, enquanto sujeitos educacionais discursivos (Miceli, 2002), sobre as suas experiências escolares com o objetivo de denunciar situações de bullying homofóbico e, portanto, estava-se interessado/a no denunciar das margens (Bourdieu, 2001). Nesse sentido, no postulado de que o objetivo procede o método, optou-se por entrevistas semiestruturadas e em profundidade, construídas com uma intenção biográfica, isto é, por grandes matrizes socializadoras (Lahire, 2003). Ainda que o interesse primordial se dirigisse para a dimensão “escola”, não se fechou a possibilidade de se considerar outras dimensões, outros discursos, outras margens. Ao considerar a “voz” como uma metáfora para a representação e participação – ou falta dela –, o estudo assumiu uma componente exclusivamente qualitativa no interior uma paradigma fenomenológicointerpretativo (Amado, 2013), coincidente com a tendência da Sociologia da Educação de interrogar os sujeitos “portadores de experiências significativas” (Silva, 2010: 81). O acesso aos jovens representou um dos primeiros desafios visto que se assumir como uma identidade que, à partida, não é visível ou reconhecida implica certas especificidades. Contactar uma associação LGBT pareceu-nos a solução mais prática. Contudo, os estudos sobre populações LGBT são muitas vezes criticados porque as populações mais fáceis para estudo são aquelas que se encontram, de alguma forma, vinculadas aos meios associativos e, por isso mesmo, porque se tratam de dispositivos que exigem algum capital cultural, tendem a ser de classe média (Rasmussen et al., 2004). Por isso mesmo, optou-se por uma estratégia de angariação “bricolágica”, incluindo, um café gay localizado no centro da cidade do Porto e as realidades virtuais (e.g., o “facebook”). Obviamente que, para entrar nesses universos, ser homossexual e ter experiência na participação comunitária é um elemento facilitador. Admite-se, tal como Bourdieu (2001), que é conveniente, inclusive, uma certa familiaridade do/a investigador/a com os sujeitos que investiga. Este processo levou-nos a um conjunto consolidado de 7 jovens rapazes principais com quem se foi pesquisando – rapazes porque há um certo conhecimento de que a homofobia os atinge mais fortemente. Sendo uma pesquisa qualitativa, generalizar não era uma preocupação. Ora, como se sabe, as ciências sociais e humanas lidam com objetos que interpelam o conhecimento que sobre eles ela própria produz. Por isso mesmo, questionar, a frio, jovens sobre processos de homofobia poderia ter como efeito perverso respostas politicamente corretas. Além disso, abordar assuntos de sexualidade e violência requeria um certo conhecimento e confiança. Por isso mesmo, foi-se marcando alguns encontros na associação e no café, de uma forma muito informal. Seguiu-se a estratégia de Gloria Filax (2006) em marcar encontros com jovens desta forma, reconhecendo o caráter deambulatório das culturas juvenis, especialmente urbanas (Silva, 2010). A pesquisa foi 1577

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assumindo contornos etnográficos e durou 6 meses. Foram escritas 30 notas de terreno e teve-se cuidados éticos como anonimato e confidencialidade. Todo o material foi analisado com recurso à análise de conteúdo (Amado, 2013). Uma análise mais cuidada revelou uma diferença entre aquilo que tendia a acontecer na escola – física, informal e formal (Gordon et al., 2000) – e a forma como os jovens interpretavam e, consequentemente, reagiam. Foi importante considerar-se a teoria da estruturação de Giddens (2003) que alega que a ação humana é sempre levada a cabo no interior de uma estrutura social, definida por um conjunto de normas, regras e/ou leis (panorama), que lhe procede e, simultaneamente, a influencia e a restrutura, modificando-a, contribuindo para o aparecimento emergente de novas disposições (manobras). Intersecções entre o teórico e o empírico: convecções e convicções Panorama Situações de bullying homofóbico são regulares na escola e elas assumem principalmente a forma do insulto, direto ou indireto. Partindo do pressuposto que existem importantes conexões entre o (comportamento de) género, corpóreo e público, e a orientação sexual privatizada (Butler, 1990 [1999], o discurso do “maricas” tem um peso estruturador na regulação das masculinidades (Kimmel & Mahler, 2003; Silva & Araújo, 2007), sem paralelo de modo análogo nas feminilidades: “Rodrigo: - O que eu estou a querer dizer é que não me chamavam os nomes por eu ser ou não homossexual mas porque faziam isso a todos. Era uma forma de insultar, percebes?” (Rodrigo, 23, entrevista). “Leandro: - Sim mas não é o caso do meu grupo de amigos mas tinha lá pessoas conhecidas que eram e são e que hoje eu sei que são mas na altura eram gozadas porque andavam assim, andavam assado, rebolavam-se assim, rebolavam-se assado. Faziam um tique com a mão e não sei o quê. Via-se, não era rejeição, era [pensa] insultar. Passavam e “olha o paneleiro!”, ora isto ora aquilo.” (Leandro, 20, entrevista). Não é só nas interações que formas de violência são visíveis mas também no silêncio institucional e negligente quer sobre os atos, quer sobre as possibilidades identitárias (Filax, 2006; Silva, Fonseca & Araújo, 2012), apesar do que se encontra expresso legalmente no decreto-lei de 2009. A invisibilidade vêm sobre a forma de uma “violência simbólica” (Bourdieu, 1999): “Francisco: - (…) Eu na altura, no secundário – por isso é que faço uma grande diferença –, eu fiz parte e fundei um movimento social que se chamava “SEXO” que lutava pela implementação de uma disciplina de educação sexual nas escolas e na altura a Presidente do Conselho Executivo e agora diretora, disse linearmente que essas questões não eram da responsabilidade da escola.” (Francisco, 21, entrevista). Nesta pesquisa de Mestrado, percebe-se que a escola é uma instituição que lida mal com a substância da sexualidade, principalmente aquela que foge aos seus padrões estruturadores, apesar de, simultaneamente, ser uma instituição altamente sexualizante onde juventude, cidadania e sexualidade se constituem coextensivamente (Rasmussen et 1578

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al., 2004). Apesar do panorama, vislumbra-se um horizonte de mudanças sociais que derivam de transformações políticas e mediáticas mais vastas. Manobras As formas de cidadania são tão plurais quanto a morfologia das práticas culturais que os jovens acionam na sua procura por dignidade (Silva, 2010) não havendo uma intangibilidade única quando se trata de denunciar o quanto a escola falha nesse processo de atribuição. Por efeitos de personalidade individual, quer pelas diversas práticas culturais, cada jovem tem formas peculiares de sentir, viver e expressar a suas experiências escolares, principalmente aquelas que às identificações sexuais dizem respeito (Weeks, 1998; Miceli, 2002). Tal não é negar o preconceito ou a violência mas sim entende-lo de uma forma multidimensional. Para o efeito, considerou-se a utilização de “retratos juvenis” (Lahire, 2004), a cada um associado uma forma particular de cidadania, que, se por um lado incorrem no perigo de cristalização essencialista, por outro lado (até mesmo oposto) procura contrariar um modo único de experienciar a discriminação. Cidadanias do faz de conta O Leandro (19) e o Manuel (17) são dois jovens de classe trabalhadora que conhecem percursos escolares marcados pelo absentismo e abandono precoce, não pela sua sexualidade mas pelo desejo de autonomia financeira. Na escola dizem não ter sofrido bullying pois ninguém sabia da sua sexualidade; uma sexualidade que privatizam com esforço e dedicação, no qual o comportamento de género é milimetricamente vigiado: “Hugo: - (…) Mas nunca foste gozado por seres bissexual? Manuel: - Não, porque nunca ninguém soube. Nunca andei por aí com um autocolante na testa “sou gay”, “sou bi”, sou “isto”, sou “aquilo”, sempre me comportei como um homem normal.” (Manuel, 17, entrevista). Mas não só privatizam a sua sexualidade, interpretando personagens heterossexuais, (passing) num contexto escolar de “sexual preassure” (Santos, Fonseca & Araújo, 2012), como eles próprios reproduzem um conjunto de estereótipos negativos sobre a norma, o desvio e sobre os outros. O próprio Leandro, em vez de ter sofrido bullying, admite ter ele próprio praticado bullying. “Leandro: - [sobre ser vítima de homofobia] No ciclo sim, até ao 9º ano passei alguns bocados, não é? Eu próprio fiz as minhas asneiras da juventude de hoje em dia mas no secundário… Não, eu nunca sofri bullying. Estava a falar que vi bullying, etc, etc, mas nunca passei por bullying. Se calhar eu é que fazia aos outros, infelizmente.” (Leandro, 20, entrevista). Ao contrário do discurso dominante, o Leandro não é, propriamente, uma vítima (pelo menos, óbvia) mas seguramente faz vítimas. Trata-se, pois, de um exemplo clássico de “homofobia interiorizada” (Borrillo, 2010) em que o sujeito, uma vez socializado por uma cultura heteronormativa, projeta contra os outros o preconceito que à sua identidade lhe é infligido. Bourdieu chama-lhe de “violência simbólica”: “(…) os homossexuais que, tendo sido necessariamente educados como heterossexuais, interiorizaram o ponto de vista dominante podem assumir esse ponto de vista sobre si 1579

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próprios (o que os vota a uma espécie de discordância cognitiva e avaliativa de molde a contribuir para a sua clarividência especial) e que compreendem o ponto de vista dos dominantes melhor do que estes últimos podem compreender sobre eles.” (Bourdieu, 1999: 27). São jovens que fazem uma separação distintiva entre (comportamento de) género e sexualidade; entre aquilo que são – gays normais (i.e., masculinos), mais aceitáveis aos olhos da sociedade – e os outros – as bichas (homens gays efeminados) que conspurcam a aceitação social do grupo minoritário –. “Manuel: - Txii, não gosto. Entrar lá [café gay] e ter aquele bichedo todo a olhar para mim. Não gosto. Ter aquelas bichas todas a olhar para mim? Naa. Incomoda-me!” (NT, 19-12-2012). Estes jovens não estão, por isso, excluídos da masculinidade hegemónica mas reproduzem-na por outros meios. A bicha representa aqui uma identidade hiperinvocada, que, tal como “o gay” para os heterossexuais, essencial, através do medo expurgatório fantasmagórico, para a (re)construção da masculinidade gay: “Leandro: - Andei muito tempo a querer enganar-me a mim próprio mas cheguei a um certo ponto e disse, “é isso que eu quero, é isso que eu vou seguir!”. Oh pá, tentei enrolar mesmo sabendo, por exemplo, eu namorava com uma rapariga e falava com rapazes, mudava os nomes no telemóvel, fazia mil e uma coisas para ninguém desconfiar, e é assim.” (Leandro, 20, entrevista). São jovens que crescem com uma noção da sua identidade como um estigma. Apesar de não terem sofrido, diretamente, bullying homofóbico, são submetidos a violências menos evidentes e, porém, tão ou mais poderosas. Cidadanias da respeitabilidade O Francisco (21) e o Rodrigo (23) são dois jovens posicionados na liderança de uma associação LGBT. São jovens de classe média que se vão desvendando aos poucos e cujos quotidianos são passados na associação, nomeadamente num projeto contra o bullying homofóbico (“Tudo Vai Melhorar”). Devido aos seus capitais culturais, as formas de resiliência psicológica à homofobia são mais fortes: Francisco: - Penso que não. Isto é [pensa] porque aí depende da pessoa também e depende do meio em que se vêm. Eu tive o alavanque dos meus pais, do meu background familiar. Eu vejo por outras pessoas que eram vítimas de bullying, não só homofóbico mas eram vítimas de bullying, mas que exatamente por isso o seu rendimento escolar era mais fraco (…)” (Francisco, 21, entrevista). Uma das manobras destes jovens fundamenta-se na estrutura associativa e nos capitais culturais que dela derivam. Se, por um lado, ela é fundamental para a mudança social, novas estruturas de poder emergem e se consolidam: a respeitabilidade. “Rodrigo: - Sim. Dever-se-ia ter cuidado com a imagem com que se passa nessas marchas. Mostrar mais seriedade. Ser homossexual não é assim tão diferente.” (Rodrigo, 23, entrevista). 1580

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“Homonormatividade” é um termo utilizado por Lisa Duggan (2004) para se referir à apropriação gay da heteronormatividade. É como se os gays absorvessem os padrões fictícios de uma heterossexualidade em potência e os integrassem de forma a querer ser integrados e tolerados: aqueles que dela estão mais próximos são “bons cidadãos” (Richardson, 2004). Cidadanias subalternas O Fábio (19), um jovem com uma masculinidade mais soft, foi o único jovem que revelou ter sido vítima direta de bullying homofóbico, o que o fez desistir da escola. A entrevista decorreu, numa fase inicial, com lágrimas detalhando o jovem a forma como era agredido: “Fábio: - Porque eu não gostava, a parte de eu entrar no balneário e eles mandarem aquelas bocas e eu ter que estar ali ao pé deles, não aguentava. Cheguei muitas vezes a evitar fazer a aula ou então entrava mais cedo para a aula para me equipar a ir diretamente para o ginásio e então tentava sair 5 minutos mais cedo para tomar banho antes deles, sempre tentar evitar estarmos todos em conjunto.” (Fábio, 19, entrevista). A homofobia é acionada performativamente no teatro interativa de operações da masculinidade (Silva & Araújo, 2007) e tem consequências negativas nos sujeitos. Aqui o bullying tem uma carga física, corpórea, um peso e uma marca estigmatizante que moldam a forma como o sujeito se engaja ou se afasta: “Fábio: - Sim. O polivalente. A minha escola era dividida por blocos: tinha o A, B e C, o átrio. Cada bloco tinha um átrio. Eu tentava sempre isolar-me mais um bocadinho para… Ou ficava à porta da sala, tinha sempre um banco para nos sentarmos. Eu tentava sempre ficar enquanto toda a gente ia para o átrio. Isolava-me sempre mais um bocadinho.” (Fábio, 19, entrevista). “Hugo: - Isso influenciou a que tu pensasses em abandonar a escola? Fábio: - Influenciou sem dúvida! Naquela altura sim. Eu sabia que tinha que passar por tudo mais um ano, era constrangedor.” (Fábio, 19, entrevista). Investigações demonstram que estes jovens estão mais propensos a abandonar a escola (Rivers, 2012; UNESCO, 2012). Cidadanias reclamadas O André (17) é um jovem que frequenta, com um grupo de amigos, um café gay na cidade do Porto. Com ele tem-se acesso a sociabilidades que naquele espaço têm lugar. A sua experiência na escola é mista. Por um lado, nos primeiros ciclos, a escola apresentava-se como um lugar impossível de estar; por outro lado, o secundário era um momento transfigurado de descoberta de si. Ainda assim, as formas de encarar o preconceito eram ostensivas: “André: - [André a descrever uma situação onde é vítima de bullying por parte de colegas na escola] De repente, um diz muito baixinho para que só eu pudesse ouvir, “isto aqui é só paneleiros!”, eu virei-me porque de certeza que era para mim, abanei-me 1581

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todo e disse-lhe, “pois sou paneleiro e adoro! Porquê? Algum problema?” (André, 17, entrevista). Neste episódio interativo narrado, o insulto atribuído é resinificado a partir dos seus próprios termos e posto em démarche a partir da afirmação identitária acompanhada de uma corporalidade genderizada. A “bicha”, apregoada nos estereótipos sociais, assume uma personificação real de forma a reivindicar o seu próprio lugar cidadão no mundo como uma perpétua reclamação – “cidadanias reclamadas” no dizer de Magalhães & Stoer (2005) –. Já que o corpo homossexual é o elemento da perturbação, o André será o elemento da perturbação até às últimas consequências: “André: [abana positivamente a cabeça] – Era… Ia ouvir e calar queres ver [o André fica nervoso]? Não engulo sapos e não devo nada a ninguém. Comigo é assim. Queres ser respeitado respeita os outros. Não levo desaforo para casa. Já levei, agora não levo.” (André, 17, entrevista). “Violência imaginada” é o que melhor descreve a estratégia deste jovem, como uma forma simbólica de rearticulação que devolve ao Outro opressor o estigma que ele próprio produz deixando à sua imaginação como seria se as coisas funcionassem ao contrário. Este, “"What if" denotes a potentiality, a possible reality that may only ever exist in the realm of representation but one which creates an "imagined violence" with real consequences and which corresponds only roughly to real violence and its imagined consequences.” (Halberstam, 1993: 190). “Hugo: - Nunca tiveste problemas ou tens no secundário? André: - Que me recorde não. Quase toda a gente sabia de mim. Os meus colegas sabem de mim. Amigas, amigos, toda a gente mesmo. Falam comigo, tratam-me da mesma forma. Nada a apontar. Inclusive elegeram-me para delegado de turma. Eu até acho que os professores sabem de mim [risos]. Hoje em dia não tenho qualquer tipo de problema, acho eu. Aceitam perfeitamente. Até brincam comigo…” (André, 17, Entrevista). Já não é uma masculinidade hegemónica, envergonhada e sufocante, habitual voz nos estudos sobre homofobia, a falar mas uma masculinidade queer cuja exibição assenta em “(…) performances that make visible the gaps and fissures of a binary system of gender norms and thus open them to the possibility of transformation.” (Landreau & Rodriguez, 2010: 3). Não sendo um mártir tradicional, o André acaba, pela revolta interiorizada, em se consistir como uma vítima menos óbvia. Kimmel & Mahler (2003), ao analisar as narrativas de jovens que entravam a matar em escolas e faculdades norteamericanas, referiam que esses jovens eram vítimas de bullying homofóbico e que o ato delinquente era uma forma de retaliação pela injustiça que sentiam (embora não verbalizando) ter sido vítimas. Esta injustiça é colmatada pela incursão em zonas comunitárias gays (e.g., cafés e bares), espaços de conforto e segurança quando outras instituições falham. “O André chega. Os seus amigos já estão em redor da mesa à sua espera. Quando chega faz uma pose e ouve os apupos. Gritam entre gargalhadas: - Diva! Estes pequenos momentos de paródia servem para descomprimir depois do André se sentar e exclamar visivelmente aborrecido: - que seca! Já não aguentava estar naquela merda de escola!” (NT, 05-01-2013). 1582

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Pais (2006) argumenta que são nestes espaços informais que os/as jovens aprendem formas não-convencionais de cidadania. A cultura juvenil é “um espaço significante com coerência suficiente para si para conseguir suportar, por vezes o insuportável, como a humilhação e o medo” (Silva, 2010: 95). O uso do universal feminino, a ironia, “o arraso”, a (homo)sexualização do espaço público e as realidades virtuais fazem parte das estratégias deste grupo em particular. Conclusão: Mesmo num panorama que cria condições para cidadanias marginais, os jovens não se deixam guiar por uma só versão. Há centros e margens que pululam a partir das suas experiências. Isto não significa que a homofobia na escola, num contexto onde uma narrativa de sucessos políticos e mediáticos LGBT parece emergir, acabou. Pelo contrário, a homofobia marca presença assídua e pontual nesta instituição que diz segura, pluralista e inclusiva. Todavia, estes jovens, recusando definir-se pelas experiências discriminatórias que os vitimiza, utilizam as suas (múltiplas) culturas como encontro e refúgio. Alerta-se para a necessidade de produzir conhecimento informado sobre os/as jovens nos seus mundos (Silva, 2010). A teoria educacional contemporânea precisa de possuir conhecimento sobre culturas juvenis específicas que as auxilie a um melhor entendimento para formular programas e práticas pela inclusão e, neste caso, contra o bullying e contra a homofobia, no postulado pragmático que a educação é sempre um meio de transformação social (Amado, 2013). Este estudo tinha como propósito gerar conhecimento transferível mas houveram algumas lacunas. Seria interessante, por exemplo, uma recriação desta pesquisa focando raparigas nãoheterossexuais ou pessoas heterossexuais vítimas de bullying homofóbico. Referências Bibliográficas Amado, J. (Coord.) (2013). Manual de Investigação Qualitativa em Educação. Coimbra: Imprensa da Universidade de Coimbra. Araújo, H. C. (2007). “Cidadania na sua polifonia: Debates nos estudos de educação feministas.”. In: Educação, Sociedade & Culturas, nº. 25, pp. 83-116. Borrillo, D. (2010). Homofobia. História e crítica de um preconceito. Belo Horizonte: Autêntica Editora. Bourdieu, P. (1999). A Dominação Masculina. Celta Editora: Oeiras. Bourdieu, P. (2001). “Compreender.”. In: A Miséria do Mundo, Petrópolis: Vozes, pp. 693-713. Butler, J. (1990 [1999]). Gender Trouble. Feminism and the Subversion of Identity. New York: Routledge. Duggan, L. (2004). The Twilight of Equality? Neoliberalism, Cultural Politics, and the Attack on Democracy. Boston: Beacon Press. Epstein, D. & Johnson, R. (1998). Schooling Sexualities. Buckingham: Open University Press. Estevão, C. (2006). “Educação, justiça e direitos humanos.”. In: Educação e Pesquisa, São Paulo, v.32, n.1, pp. 85-101. Filax, G. (2006). Queer Youth in the Province of the “Severely Normal”. Vancouver: UBC Press. Giddens, A. (2003). A Constituição da Sociedade. São Paulo: Martins Fontes. Gordon, T.; Holland, J. & Lahelma, E. (2000). “From pupil to citizen: a gendered route”. In Madeleine Arnot & Jo-Anne Dillabough (Eds.), Challenging 1583

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