Ebook interativo de histórias infantis: a potencialidade expressiva das narrativas digitais / Children\'s Interactive ebook: the expressive potential of digital storytelling

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Ebook interativo de histórias infantis: a potencialidade expressiva das narrativas digitais Deglaucy Jorge Teixeira (UFSC) – [email protected] Berenice Santos Gonçalves (UFSC) – [email protected] Resumo: O advento das novas mídias trouxe mudanças significativas no contexto das tecnologias de informação e comunicação. No âmbito das tecnologias empregadas para contar histórias, destacando as histórias infantis, o livro pode se apresentar em formato digital. Diferente dos tipos tradicionais de narrativas impressas, no livro digital as histórias podem ser contadas com a integração de um maior número de mídias, tais como texto, imagem, animação e som, em ambiente interativo e não linear. Neste contexto é possível confundir a ficção infantil em formato digital interativo com um videogame, denomina-la livro-jogo ou ainda, produzí-la em versão digitalizada – simulacro de uma obra impressa. O objetivo deste estudo foi categorizar esta nova narrativa na perspectiva do discurso, para que escritores, roteiristas, profissionais de tecnologia, educadores e até o mercado editorial possam desenvolver conteúdos coerentes e de acordo com as potencialidades das novas mídias - meio que se expande com a popularização dos dispositivos móveis nas mãos dos pequenos usuários/leitores. Esta pesquisa foi desenvolvida por meio de uma revisão da literatura relacionada ao conceito de ebook interativo, aos princípios das novas mídias e ao estudo da narrativa digital interativa. Em seguida, afim de evidenciar as características deste tipo de ebook, fez-se uma análise descritiva de exemplares vencedores do Bologna Ragazzi Digital Award e do Digital Book Awards de 2015. Como resultado, de acordo com suas características, o ebook interativo de histórias infantis pode ser definido como uma narrativa digital interativa, possibilitando assim, sua produção e estudos futuros no universo das narrativas digitais. Palavras-chave: Ebook interativo infantil; Novas mídias; Narrativas digitais interativas. Abstract: The advent of new media has brought significant changes in the context of information and communication technologies. The field of technology used for storytelling, highlighting children's stories, the book can be presented in digital format. Unlike traditional types of printed storytelling in the digital book stories can be told with the integration of a greater number of media such as text, image, animation and sound, interactive environment and nonlinear. In this context it is possible to confuse the children's fiction in interactive digital format with a video game, called it Gamebook or even produce it in “scanned” version - simulacrum of a printed work. The objective of this study was to categorize this new narrative in speech perspective, for writers, writers, technologists, educators and to the publishing market can develop consistent and in accordance with the potential of new media content - means that expands with popularity of mobile devices in the hands of small users/readers. This research was developed through a literature review on the concept of interactive ebook, the principles of new media and the study of interactive digital storytelling. Then, in order to highlight the characteristics of this type of ebook, there was a descriptive analysis of winners copies of the Bologna Ragazzi Digital Award and the Digital Book Awards 2015. The result, according to its characteristics, the interactive children's stories ebook can be defined as an interactive digital storytelling, thus enabling their production and future studies in the world of digital storytelling. Keywords: Children's interactive ebooks; New medias; Interactive digital storytelling.

Para referenciar: TEIXEIRA, Deglaucy J.; GONÇALVES, Berenice S. Ebook interativo de histórias infantis: a potencialidade expressiva das o narrativas digitais. In 1 congresso internacional de novas narrativas : encontro de narrativas de comunicações e artes / Grupo de Estudos de Novas Narrativas (Organização) – São Paulo : ECA/USP, 2015.

1. Introdução As novas mídias potencializaram as atuais formas de narrativas. Antes, as mídias tradicionais necessitavam de um suporte, tal como a película para o cinema. Agora, devido aos conteúdos digitalizados, este suporte praticamente desaparece. Diferente dos tipos tradicionais de narrativas impressas, no ebook interativo as histórias podem ser contadas com a integração de um maior número de mídias, tais como texto, imagem, animação e som, em ambiente interativo e não linear. Diante de tantos recursos, esta nova narrativa traz algumas discussões quanto a sua categoria. É possível confundí-la com um videogame ou denomina-la como “livro-jogo”, “animação interativa”, “livro animado” ou ainda, como uma versão digitalizada do livro – simulacro de uma obra impressa. A falta de identidade desta narrativa pode impactar seu sistema produtivo, distributivo e principalmente o sub aproveitamento das potencialidades midiáticas possibilitadas pelo ambiente digital. Por meio de uma revisão da literatura reuniu-se estudos sobre ebook interativo como suporte de leitura multimídia, desvinculado de sua forma material, estudos recentes sobre as características do ebook interativo infantil em formato de software, princípios das novas mídias (nova mídia ou mídia digital) e explorou-se a narrativa digital interativa a partir do discurso (expressão narrativa). Prosseguindo com estudos específicos de narrativas em ambiente digital interativo. Com base nessa revisão literária, fez-se uma análise descritiva de dois ebooks interativos vencedores de prêmios de repercussão mundial, utilizando-os como exemplares com crivo de qualidade com o objetivo de posicionar esta nova narrativa em uma categoria específica. O resultado mostrou que, além de configurar-se com uma nova mídia, esta narrativa, presente em ebook interativo de história infantil, pode ser categorizada dentro do universo das narrativas digitais interativas. 2. Ebook interativo infantil Ao longo da história, o desenvolvimento tecnológico permitiu organizar conteúdos informacionais em diversos suportes, tais como pedra, argila, madeira, couro, papel e, recentemente, em formato digital.

No caso do livro impresso, o conteúdo está tão intrínseco ao suporte que ambos podem ser denominados como livro. A denominação do livro em formato digital traz uma ligação direta à sua representação em suporte de papel, ou seja, ebook – onde “e” refere-se a mídia eletrônica (digital) e o termo “book”, a organização da informação como livro. No entanto, apesar de referenciar ao suporte impresso, existem muitos livros existentes apenas em formato digital. É importante destacar que o artefato digital trouxe uma ruptura tecnológica do livro como único conceito para suporte e conteúdo informacional. Segundo Chartier (1999), o livro objeto desvincula-se da sua forma material, apresentando-se em uma organização de conteúdo que não é, de forma alguma, a mesma percebida pelos leitores do livro ao longo das últimas gerações. Indicando, assim, uma revolução nas estruturas do suporte material para a escrita e nas experiências de leitura. Diante desse contexto, a fim de compreender a especificidade do livro digital interativo para criança, é fundamental perceber o livro por meio de concepções mais abrangentes. O livro não pode ficar, unicamente, limitado a uma estrutura física ou representacional como um objeto. Assim, mais que um objeto, o livro é uma obra que se forma por meio de um conjunto de textos, imagens e outras mídias (dados) com uma extensão determinada que uma vez organizados (informação), são geralmente destinados a um grande público (usuários/leitores). E o suporte pode ser qualquer superfície que permita transmissão do conteúdo de forma clara e apropriada a determinado público (MARTÍNEZ, 2014). De acordo com Flatschart (2014), o livro digital (livro eletrônico, e-book, eBook, ebook, ou e-edition) é uma publicação em formato digital, que pode ser lida em dispositivos computacionais (suportes), podendo conter textos escritos, imagens e outros recursos, bem como multimídia e interatividade. As potencialidades específicas dos suportes para o livro digital trazem mudanças também no processo de organização de seus elementos constitutivos, uma vez que os dispositivos eletrônicos para leitura dos ebooks permitem uma série de configurações e interferências no conteúdo destes. Em um livro digital infantil, por exemplo, é necessário considerar os aspectos básicos de configuração da narrativa, como ela é constituída e como o significado é articulado por meio de várias mídias para que haja uma interação efetiva.

O livro digital interativo em formato de software, ou seja um aplicativo (book app), é o mais adequado para livro digital infantil, pois projetado como programa executável, permite maior flexibilidade para relacionar mídias e interatividade em seu conteúdo, onde o usuário/leitor pode interagir com links, alterar, emendar, sair de um texto, acompanhar a leitura com palavras em destaque, mudar o idioma do texto escrito e narrado, navegar de forma não linear entre objetos, personagens, sumários visuais, games, animações, som e vídeos. A partir do avanço das tecnologias digitais portáteis como tablets e smartphones, os ebooks interativos de histórias infantis vem se apropriando das qualidades do ambiente digital conforme as potencialidades interativas permitidas pelo sistema operacional e pelo dispositivo, tais como sensores de movimento, de orientação, de localização, interação com câmera e a possibilidade de tocar e arrastar com o dedo, tecnologia touchscreen que se tornou mais atrativa que a movimentação de objetos mediada pelo mouse ou pelo teclado (TEIXEIRA, 2015). Estes ebooks interativos estão mesclando características do livro tradicional infantil, videogame e animação, pois permitem a criação de histórias mais complexas, com caminhos alternativos e recursos interativos. De acordo com Stichnothe (2014), no momento presente é importante que se faça um estudo crítico e profundo na perspectiva de uma literatura emergente, que pode ser avaliada do ponto de vista das narrativas digitais interativas e da teoria das mídias. Considerando, principalmente, a forma como estes livros aplicativos trabalham a narrativa no âmbito das novas mídias, com representações visuais, verbais e sonoras. 3. Novas mídias Segundo Manovich (2001), nova mídia é a convergência das mídias a partir do computador para distribuir e exibir conteúdo, além de produzí-lo. Um texto distribuído em computador, como o livro digital, é considerado uma nova mídia, enquanto o mesmo texto em livro impresso não o é. Isso se justifica pelo fato das mídias analógicas (mídias tradicionais) necessitarem de um suporte material específico, como o disco de vinil para o som e a película para a fotografia e cinema. Nas mídias digitais (nova mídia), este suporte físico praticamente desaparece e os dados são convertidos em sequência numérica, dados digitais (MARTINO, 2014).

O uso do computador por meio da digitalização de dados afetou todos os estágios da comunicação, tais como seu acesso, manipulação, armazenamento e distribuição. Além de mudanças nos tipos de mídias como textos, imagem fixa e em movimento, som e configuração espacial, todas se tornando editáveis, distribuídas e exibidas de forma computacional. Neste cenário, de acordo com Manovich (2001), as novas mídias podem ser caracterizadas por meio de cinco princípios, a saber: Representação numérica, Modularidade, Automação, Variabilidade e Transcodificação, explicados a seguir: a) Representação numérica: todos os objetos desta nova mídia, quer criados ou apenas convertidos no meio computacional, são compostos por códigos digitais binários representados por zeros e uns. Estes códigos descrevem o conteúdo por meio de equações matemáticas, tornando-se algoritmos manipuláveis. O processo de tornar a mídia programável é denominado digitalização. No entanto, quando este objeto é criado diretamente no computador, sua forma original já é numérica; b) Modularidade: também chamado de estrutura fractal da nova mídia. Onde objetos de mídias como imagens, sons, formas ou configurações são representados

conjuntamente

em

um

objeto

maior

sem

perder

sua

independência. Possibilitando, assim, modificá-los separadamente. A internet, por exemplo, é completamente modular, com vários sites, cada um com elementos independentes, podendo ser extraídos para compor outros objetos de mídia. c) Automação: a representação numérica e a modularidade permitem a automação de várias operações envolvendo criação de mídias, manipulação e acesso. Removendo a intencionalidade humana, pelo menos em parte, do processo criativo. d) Variabilidade: os objetos das novas mídias são mutáveis, com organização variada e potencialidades para existirem em diferentes versões. Este princípio é mais uma consequência da representação numérica e da modularidade. Estas novas versões são, geralmente, organizadas pelo computador. Como um template de páginas de internet, que é gerado em um conjunto de dados cuja versão customizada é criada mediante a entrada de dados pelo usuário.

e) Transcodificação: este princípio está relacionado às consequências da digitalização da mídia. Como códigos binários, as mídias apresentam uma organização estruturada que fazem sentido ao usuário humano – objetos e imagens reconhecíveis; textos gramaticalmente consistentes; espaços virtuais definidos por sistema de coordenadas cartesianas. De um lado, um nível de representação pertence à cultura humana; e do outro, uma representação legível para máquina, com números codificando valores cromáticos e seus pixels. É nesta dimensão que existe o diálogo entre computadores. Assim, a nova mídia constitui-se de dois níveis: a camada cultural e a camada computacional. Exemplos de camada cultural são as histórias, enredos, narrativas e dramatizações. E a camada computacional apresenta-se como: escolhas e combinações; funções e variabilidade; linguagem computacional e estrutura de dados. Com base nestes princípios é possível constatar que as histórias estruturadas em suportes digitais, ou seja, na categoria das novas mídias, carecem de estudos específicos e ambientados no universo das narrativas digitais. 3. Narrativa digital interativa Contar histórias é uma atividade praticada pelos povos através de várias gerações. Todos contam/escrevem ou ouvem/leem narrativas em vários suportes: novela de TV, filme de cinema, peça de teatro, notícia de jornal, livro, gibi, desenho animado etc. (GANCHO, 2006). O termo narrativa pode ser utilizado para designar o próprio ato de contar histórias: a narração; o conteúdo deste ato; ou ainda, como modo do discurso. A história em si é o conjunto de acontecimentos narrados e a forma como são narrados denomina-se enredo. Logo, segundo Nogueira (2010), narrativa é o conjunto composto de história, enredo e narração. Neste contexto, a narração pode acontecer de forma verbal - a narração em si e por meio de interpretação com gestos e diálogos - a narração dramática. Como o foco deste estudo é o discurso, ou seja, a forma como é contada a história, a narração, e não o seu significado, optou-se por assumir a palavra “narrativa” como equivalente à narração dramática.

Chatman (1980), defende que cada história é composta por duas partes: a história em si, uma série de acontecimentos com os elementos existentes da cena (personagens e itens do cenário) e o discurso, ou seja, a forma (estrutura narrativa) e as mídias utilizadas para comunicar o conteúdo. Sendo assim, a história é “o que” se narra e o discurso é “como” se narra (ver Figura 1). Figura 1 – Composição da narrativa

Fonte: Chatman citado por Teixeira (2015)

Neste cenário, de acordo com a Figura 1, destacando o eixo do discurso da narrativa, o advento das novas mídias oferece oportunidade para pensar e reconsiderar os elementos da narrativa. Além dos novos artefatos digitais, que permitem a integração de mídias e interatividade como atributos especiais para contar histórias, possibilitando assim, uma narrativa não linear e mais participativa, com um papel mais ativo do leitor. As narrativas digitais são histórias contadas por meio das novas mídias, ou seja, utilizando ferramentas digitais (ALEXANDER, 2011). Sendo assim, é possível exemplificar estas narrativas como uma simples apresentação em power point ou um videogame com recurso mais avançados, cada um com suas devidas plataformas e especificidade midiáticas. De acordo com Crawford (2005), essencialmente uma narrativa digital não é interativa. A interatividade é a principal diferença que distingue uma narrativa digital interativa, onde o usuário/leitor se depara com uma rede de possibilidades, podendo afetar, escolher caminhos e

até alterar o enredo. Caso que acontece em videogames e, recentemente, nos ebooks interativos infantis. No contexto dos entretenimentos de história tradicional, a narrativa geralmente se apresenta de forma linear, ou seja, os eventos são sequencialmente organizados, fixos e progressivos. Obras interativas, ao contrário, permitem ao usuário/leitor tecer outro caminho por meio de elementos interativos junto ao enredo central (MILLER, 2014). A interatividade em narrativas digitais está envolvida diretamente com vários conceitos, tais como engajamento, imersão, participação, responsividade e reação. A interatividade resulta em um aumento contínuo da participação do leitor, funcionando como um canal de comunicação bidirecional enquanto que a interação é o processo de relacionamento que dita comunicação, ou o contrário, a comunicação que dita um processo de relacionamento (MEADOWS, 2003). A expansão da história em múltiplas possibilidades para escolha do leitor, por mais perturbadora que seja, deve ser interpretada como um convite do autor para o leitor participar do processo criativo e pode aumentar o envolvimento narrativo e estimular o leitor a imaginar-se como autor. Isso já acontece em espetáculos teatrais de improvisação, onde grupos de atores pedem sugestões a expectadores e oferecem-lhes o prazer da performance com a satisfação de participar do processo criativo (MURRAY, 2003). Em uma narrativa que acontece em ambiente digital, movida por recursos interativos, Murray (2003) preferiu utilizar os termos “multisequencial” e “multiforme” em detrimento da expressão “não linear” para destacar as diferentes navegabilidades possíveis, significativas e bem definidas, em arranjo fixo de eventos. Embora a multisequencialidade se destaque, Miller (2014) classificou esta e outras características como sempre presentes e frequentes em narrativas digitais, a saber: Características das narrativas digitais sempre presentes: a) São sempre narrativas, pois envolvem uma série de acontecimentos dramáticos ligados, com o intuito de contar uma história; b) Geralmente contêm personagens que só podem existir em mídia digital, como aqueles controlados pelo usuário ou pelo computador; c) São interativas: o usuário pode controlar ou impactar aspectos da história;

d) Não lineares: eventos ou cenas não acontecem em ordem fixa e, geralmente, os personagens não se encontram em pontos fixos; e) Profundamente imersivas: puxam o leitor/usuário para dentro da história; f) Participativas: o leitor/usuário participa da história; g) Navegáveis: o usuário pode criar seu próprio caminho dentro da história ou no ambiente virtual. Características das narrativas digitais frequentemente presentes: a) Quebrar a quarta parede1: comunicação do usuário com o personagem ou o personagem se comporta como uma pessoa real; b) Misturar ficção com realidade; c) Incluir sistema de premiação e pontuação; d) Pode ser multissensorial; e) Permitir que o usuário crie um avatar2 e o controle; f) Oferecer possibilidades de compartilhar experiências (tais como em rede social); g) Colocar uma série de desafios para o personagem; h) Incluir elementos de game bem definidos, dentro ou fora da narrativa, tais como: vencer, apostar, regras, alto nível de habilidade, espaço definido para jogo, envolver o usuário em comportamento de risco, tempo pré-definido, requer uso de estratégias, jogo em equipe, lidar com adversário, superar obstáculos, diferentes aparências de avatares etc. A narrativa digital interativa nasce em torno dos papéis e funções dos personagens para criar um sistema dramático mais compreensível. Ao manter uma estrutura narrativa baseada em funções e papéis, não quer dizer que a história sempre irá se repetir, pois diferentes autores podem flexioná-la, novas realidades sociais podem surgir, diferentes aspectos da experiência humana podem ser explorados para o público, além das potencialidades de

1

Quarta parede funciona como uma parede imaginária que separa o público na plateia dos atores no palco (NOGUEIRA, 2010). 2 Representação do usuário por uma imagem ou um corpo animado que o represente em sua navegação (ROCHA, 2010).

affordances, ou seja, a forma como o ambiente comunica as possibilidades de ações para usuário, e representações computacionais. Em narrativa interativa o usuário/leitor pode perceber que está criando ou influenciando um enredo dramático por meio de suas ações, seja assumindo o controle como personagem principal seja enviando comandos para elementos autônomos (RIEDL, 2012). 4. Procedimentos metodológicos A partir de uma pesquisa aplicada com base exploratória e abordagem qualitativa, este estudo buscou se familiarizar com o problema, tendo em vista o aprimoramento de ideias e descobertas (GIL, 2007). Inicialmente selecionou-se os exemplares para o estudo: ebooks interativos infantis vencedores do Bologna Ragazzi Digital Award e do Digital Book Awards de 2015. Respectivamente: My Very Hungry Caterpillar de Eric Carle (distribuído pela App store) e Loose Strands (distribuído pela App store, Amazon e Google play).

Em seguida fez-se uma descrição formal dessas obras quanto ao discurso da narrativa, ou seja, a forma de expressão do conteúdo comuns em narrativas digitais e ao uso das novas mídias. Por fim foi elaborado um quadro com as características pertinentes às narrativas digitais interativas segundo Miller (2014) frente às respectivas obras para então classifica-las quanto a estas características. 5. Análises e discussões O primeiro book app a ser analisado foi My Very Hungry Caterpillar de Eric Carle é uma versão de um clássico infantil da década de 1960, agora produzido pela StoryToys Apps. Este ebook incorpora o conteúdo visual com o uso de atividades lúdicas na história da metamorfose de uma lagarta (Figura 2), integrando os elementos das novas mídias, tal como ilustrações 3D com efeitos sonoros, tema musical e animação. A narrativa visual, sem texto ou narração, é controlada pela interatividade do leitor com a personagem principal.

Figura 2 – Telas do capturada do book app My Very Hungry Caterpillar

Fonte: Imagens capturada pelo autor

Em seguida analisou-se o ebook Loose Strands, produzido por Darnedsock, conta a história de Roland, um menino de 9 anos que vive em uma barbearia - uma espécie de prisão onde quase tudo é feito de cabelo. Nesta história, o leitor controla a aventura de Roland, de forma não linear quanto a narrativa e a navegação, em busca de um novo mundo. Este book app resgata a estratégia de contar histórias dos livros-jogos das décadas de 1980 e 1990, onde o leitor pode escolher entre dois caminhos em determinados estágios da história. Aliado às potencialidades das novas mídia é possível gravar o percurso criado pelo leitor, acompanhar ou revisitar o que já foi lido em um mapa de navegação e ainda encontrar surpresas animadas com efeitos sonoros e temas musicais. Figura 3 – Telas do capturada do book app Loose Strands

Fonte: Imagens capturada pelo autor

Após estabelecer os ebooks analisados como integrantes das novas mídias e passiveis de serem categorizados a partir das novas mídias, em se tratando do ambiente digital, foi

elaborado um quadro com as características de narrativas digitais a fim de analisá-los nessa perspectiva (ver Quadro 1). Quadro 1 – Análise dos livros digitais interativos quanto às características de narrativa digital Características sempre presentes em narrativas digitais (Miller, 2014) 1 Narrativa 2 Personagens possíveis apenas em de ambiente digital 3 Interatividade 4 Não linear

5 6 7

Características de ebooks interativos de histórias infantis Sim Sim Sim

Ebooks interativos de histórias infantis analisados My Very Hungry Caterpillar Sim Sim, as ações da personagem são decorrentes da interatividade do usuário/leitor Sim Sim, é possível mudar a ordem de leitura

Loose Strands Sim Sim, as ações da personagem são decorrentes da interatividade do usuário/leitor

Sim Sim, é possível mudar a ordem de leitura e escolher (multisequen- Sim caminhos diferentes para cialidade) continuar a leitura Imersivo Sim, o desenvolvimento da Sim, o desenvolvimento da Sim história necessita da ação história necessita da ação do do usuário/leitor usuário/leitor Participativa Sim Sim Sim Navegável Sim Sim Sim Fonte: Elaborado pelo autor a partir dos estudos de narrativa digital de Miller (2014)

Na busca de categorizar essa nova narrativa que se apresenta no formato de ebook interativo infantil esta pesquisa mostrou que, de acordo com o discurso da narrativa, o ebook interativo, contemplam todas as características necessárias para que se configurem como uma narrativa digital interativa (MILLER, 2014). Quanto aos ebooks analisados, percebeu-se que existem outras características frequentemente encontradas em narrativas digitais interativas. No entanto, características como regras, resultados variáveis e quantificáveis, valorização dos resultados, esforço do jogador, apego ao resultado e consequências negociáveis, quando agrupados uma única narrativa digital interativa, trata-se de um vídeo game (JULL, 2003) e não um ebook interativo, caso não evidenciado entre os exemplares analisados. 6. Considerações finais De acordo com a cinco princípios das novas mídias foi possível identificar as principais características dos ebooks interativos infantis, tais como a representação numérica, identificada pelo próprio artefato em formato de mídia programável; a modularidade, mostrando-se como a possibilidade de integrar diversos tipos de mídias em um conteúdo; a

automação, permitindo acionar e manipular animações já programadas; a variabilidade, referindo-se às possibilidades de navegação do usuário/leitor e ao uso e adaptação de modelos estruturais (templates) em diferentes histórias; e a transcodificação, representada por um sistema programado em linguagem de computação que se apresenta como narrativa para o usuário/leitor. Desta forma, classificados dentro dos princípios das novas mídias, os ebooks interativos de histórias infantis se apropriaram das características dos ambientes digitais. De acordo com a forma de expressão da história, estes ebooks podem ser categorizados como um tipo de narrativa digital, trazendo em evidência suas principais características, tais como presença de narrativa,

personagens

possíveis

apenas

em

ambiente

digital,

interatividade,

multisequencialidade, imersão, participação e navegação. Essas características foram percebidas nos exemplares analisados. Mostrando também que, assim como os videogames, os ebooks interativos de histórias infantis fazem parte do universo das narrativas digitais interativas. Com isso, será possível direcionar o design de narrativas para ebooks interativos de histórias infantis de acordo com as teorias das narrativas digitais, possibilitando assim, novas estratégias de formatação do conteúdo midiático que não se limitarão aos clássicos processos de produção dos livros infantis tradicionais e possibilitando futuros estudos na perspectiva do discurso da narrativa digital. Agradecimento À CAPES pelo apoio financeiro e ao Hiperlab/UFSC pela infraestrutura. REFERÊNCIAS ALEXANDER, Bryan. The New Digital Storytelling: Creating Narratives with New Media: Creating Narratives with New Media. ABC-CLIO, 2011. CRAWFORD, Chris. Chris Crawford on interactive storytelling. California [ebook]. New Riders Games, 2005. CHARTIER, Roger. A aventura do livro: do leitor ao navegador. Tradução Reginaldo de Morais. São Paulo: Unesp, 1999. CHATMAN, Seymour Benjamin. Story and discourse: Narrative structure in fiction and film. Londres: Cornell University Press, 1980.

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