Eixo - O senhorio da terra

June 3, 2017 | Autor: Francisco Trindade | Categoria: Historia Economica, Aveiro, Historia Local, Historia Rural, História Local (Aveiro)
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Francisco Messias Trindade Ferreira

Eixo - O senhorio da terra ao longo do tempo



CITCEM/GHP; [email protected]; © 2016

Eixo - O senhorio da terra ao longo do tempo

O antigo concelho de Eixo passou por diversas mãos antes de chegar de forma definitiva à posse da Casa de Bragança. Nas constantes mudanças de senhorio incluíam-se também, e para além do antigo concelho os territórios que formariam o Almoxarifado de Eixo, as vilas e concelhos de Paus, Óis da Ribeira e Vilarinho do Bairro. Pode bem dizer-se que a sorte de uma significava o mesmo destino para as restantes. Recuando no tempo, porque é de alguma forma importante para perceber questões que se levantaram em já adiantado século XIX, encontramos no distante ano de 1324 as terras de Eixo, Óis da Ribeira e outras na posse da Ordem de S. João do Hospital ou Ordem de Malta. A sua posse resultara de uma doação feita pela condessa D. Leonor Afonso, viúva do conde D. Gonçalo Garcia de Sousa e filha ilegítima do rei D. Afonso III, já em tempo do rei D. Dinis. Este legado resultara da ausência de descendência por parte da doadora e da anuência por parte do monarca D. Dinis que autorizou a respectiva doação. É que “sendo a Ordem de Malta uma corporação de mão morta, e não podendo reter e conservar além de ano e dia os bens doados sem licença régia, conforme lei de amortização do próprio D. Dinis”1; pode daqui concluir-se que se tratavam de bens da Coroa. Em 1324, a 24 de Junho, por uma carta de confirmação de D. Dinis, este autoriza o escambo de propriedades entre a Ordem de Malta e o 3º conde de Barcelos2, D. Pedro Afonso3 (filho ilegítimo do rei D. Dinis e de D. Grácia Froes), na altura casado com D. Branca Peres

cf. José Correia de Miranda, Dissertação Histórico-Jurídica em defeza dos povos do extincto Almoxarifado d’Eixo, nas causas de foros e rações, que lhes move a Sereníssima Casa de Bragança, Porto, 1866, pág. 96. 2 Por este acto de permuta, a Ordem do Hospital entregava ao conde de Barcelos o lugar de Eixo, que recebera de D. Leonor Afonso, recebendo em troca da parte do conde de Barcelos o lugar de Montouto. Cf. António Gomes da Rocha Madahíl, Colectânea de Documentos Históricos, Edição da Câmara Municipal de Aveiro, 1959, Vol. I, pp. 120121. 3 D. Pedro Afonso, 3º conde de Barcelos (em 1314), e alferes-mor do reino, viu-se envolvido no conflito que opôs seu pai D. Dinis e seus meios-irmãos, D. Afonso príncipe herdeiro e Afonso Sanches também filho ilegítimo de D. Dinis e D. Aldonça Rodrigues de Talha. Por força desse envolvimento foi obrigado a exilar-se em Castela e seus bens foram alvo de confisco. Em 1322 obtido o perdão régio, e restituídos os títulos e bens, está de novo em Portugal onde, juntamente com a rainha Santa Isabel promoveu conversações de paz entre D. Dinis e o príncipe herdeiro D. Afonso. Após a morte do pai retirou-se para o seu paço em Lalim (Lamego). Homem culto, bisneto de Afonso X, o 1

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de Sousa, filha de Pedro Anes de Portel e Constança Mendes de Sousa, ligada à casa dos Sousa do Marnel, grandes proprietários na região do Vouga. Aqui se realça ter sido necessária a autorização régia para a realização desta permuta de propriedades, o que vem a reforçar a convicção de se estar na presença de bens da Coroa. Falecendo D. Pedro Afonso em 1354 sem deixar descendência quer do primeiro matrimónio com Branca Peres de Sousa4, nem do segundo com D. Maria Ximenes Coronel5, os seus bens regressaram à posse da Coroa, onde se conservaram por algum tempo. Sem data certa por ausência de documentação, Eixo aparece na posse do 4º conde de Barcelos, João Afonso Telo de Meneses (o conde velho, como ficou conhecido), que foi também o 1º conde de Ourém. Isto sabe-se por duas cartas de doação de D. Fernando. A primeira em 5 de Outubro de 1368 concede a este conde o lugar de Paus

“que he em riba de Vouga no julgado do dicto logo do Vouga com todas suas aldeãs e cazaes herdades e todas suas pertenças e entradas e sahidas resios montes e fontes rios e Ribeiras e pescarias e com toda a jurdiçaõ crime e cível mero e misto império e subbjecçom assi nas pessoas como nos beens qual ou quaes as o dicto conde há em Eixo e nos outros lugares de que he senhor…”;6

Sábio, desenvolveu até ao final da vida em 1354, uma intensa actividade literária. É autor da compilação de um Cancioneiro Geral da Lírica Trovadoresca Galego-Portuguesa, do Livro de Linhagens e ainda da Crónica Geral de Espanha de 1344. O Livro de Linhagens é mesmo considerado uma das obras mais importantes para o conhecimento da genealogia das famílias nobres portuguesas medievais. Cf. José Mattoso, 1096-1325, Dois séculos de vicissitudes políticas, in Historia de Portugal, dir. de José Mattoso, Vol. II, Lisboa, Círculo de Leitores, 1993, pág. 161; Idem, A nobreza medieval Portuguesa, Lisboa, Editorial Estampa, 1990, pág. 55 e seguintes; Ruy D’Abreu Torres, “Pedro, Conde de Barcelos, D.”, Dicionário de História de Portugal, dir. de Joel Serrão, vol. V, Lisboa, Iniciativas Editoriais, 1979, pp. 27-28. 4 Deste matrimónio existiu um filho de nome Pedro Afonso, que faleceu ainda de menor idade. Cf. Anselmo Braamcamp Freire, Brasões da Sala de Sintra, Imprensa Nacional – Casa da Moeda, Lisboa, 1973, pp. 241-243. 5 Deste segundo casamento existiu uma filha de nome Maria Ximenes, que também faleceu de menor idade. Anselmo Braamcamp, op. cit. pág. 243. 6 ANTT – Chancelaria de D. Fernando, fol. 33. Também transcrito por J. C. de Miranda, op. cit., pp. 174-175. Sublinhado.

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O segundo documento, datado de 22 de Setembro de 1369, confirma a junção de outros lugares que formarão mais tarde o almoxarifado de Eixo que andavam dispersos e assim se reuniam novamente na posse do mesmo proprietário, tal como sucedera em tempos mais recuados. Por esta segunda carta de doação, D. Fernando concede ao dito conde de Barcelos,

“pera ssy e pêra todos seus herdeiros e successores de toda a nossa parte e direito e quinham que nos avemos na aldeã doões da ribeyra, e na aldeã do requeyxo Riba Vouga com todas suas herdades e cazaes e rendas e direitos e pertenças e com todallas outras couzas que pertencem ao celeyro do dito logo doões e com suas novidades e com todas suas entradas e saídas e resios montes e fontes rios e ribeyros e pescarias. E com toda jurdiçaõ cível e crime mero e misto império e sebjeçom assy nas pessoas como nos beens, qual ou quaes o dito conde há em eixo e em os outros logares de que elle he senhor e tem em seu poder com todas rendas e tributos e couzas e censos foros e pensoões e com todolos outros direitos reaaes corporaães temporaães ou sacraães ou spirituaães assy e taõ compridamente como as nos avemos e aver devemos”.7

D. Fernando concedeu desta forma todas as propriedades que constituirão o futuro almoxarifado de Eixo (exceptuando o lugar de Vilarinho do Bairro), ao conde de Barcelos de juro e herdade podendo a partir de então ser transmitidas hereditariamente, embora sujeitas sempre à confirmação régia. Falecido 4º conde de Barcelos em Dezembro de 1381, sucedeu-lhe no título e na posse dos bens seu filho primogénito D. Afonso Telo de Meneses, 5º conde de Barcelos. Todavia este novo conde pouco tempo mais sobreviveu ao pai, nem tão pouco deixou descendência. O seu sucessor será outro João Afonso Telo de Meneses, sobrinho do 4º conde de Barcelos, primo direito do 5º conde, irmão da rainha Leonor Teles e por consequência cunhado do rei D. Fernando. Não terá sido certamente estranha a intervenção de Leonor Teles

ANTT – Chancelaria de D. Fernando, fol. 46. Também transcrito por J. C. de Miranda, op. cit., pp. 175-177. Sublinhado. 7

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a favor do irmão junto do rei para a sua nomeação à sucessão do condado de Barcelos, uma vez que ainda existia um outro filho do 4º conde de Barcelos que poderia ou deveria suceder ao irmão – D. João Afonso Telo de Meneses, que fora anteriormente nomeado por D. Fernando como 1º conde de Viana do Alentejo. Presumivelmente, o 6º conde de Barcelos, João Afonso Telo de Meneses, terá tomado posse das terras de Eixo, mas pouco tempo terá ficado com elas. Após a morte de D. Fernando, e nos acontecimentos que se seguiram durante o período do interregno, a sua tomada de posição a favor das pretensões da sobrinha D. Beatriz e consequentemente do seu marido o rei de Castela D. João I, fizeram-no cair em desgraça aos olhos do Mestre de Avis. Este confiscou-lhe todos os bens. Morreu este João Afonso Telo de Meneses na batalha de Aljubarrota a 14 de Agosto de 1385, não tendo deixado sucessor, apesar de casado com D. Beatriz Afonso de Albuquerque, filha de João Afonso de Albuquerque, 6º senhor de Albuquerque, e D. Maria Rodrigues Barba. O conde de Viana do Alentejo, que tomara voz por D. João de Castela, também não sobreviveu ao vendaval da crise de 1383-85, tendo sido morto em Penela, terra que igualmente lhe pertencia e da qual era alcaide8. No meio de tanta instabilidade e confusão como a que foi vivida nesse conturbado período, com confiscos e doações sucessivas de títulos e bens, seria natural que as terras de Eixo, Requeixo, Paus e Óis da Ribeira, alvo de confisco e agora novamente na posse do poder vigente, fossem parar às mãos de alguém. Aliás, esta era uma forma habilidosa do Mestre de Avis para garantir apoios, recompensando a lealdade dos que com ele ficaram com os bens confiscados aqueles que dele se apartavam.

Fernão Lopes, Crónica del Rei D. João I da boa memoria, Imprensa Nacional – Casa da Moeda, Lisboa, 1977, vol. II, cap. XXII, pág. 46: “e teendo-(a) assy por elle, sayu fora do logar por tomar mantijmentos contra vontade de seus donos, como os seus auyam em custume: e leuando comssygo huuns quarenta de cauallo, sem outros peoões nem beesteiro(s), juntarom-sse contra elle os das aldeãs e comarcas derredor pêra lhos defeender, todos pee terra. E emuorilhando-sse com elles, remessarom-lhe o cauallo, e cayu com elle em terra; e foy huum vyllaão rijamente, que chamauom dalcunha Cazpirre, e cortou-lhe a cabeça, e assy morreo.” Este acontecimento narrado pelo cronista terá ocorrido entre finais de Junho e princípios de Julho de 1385. 8

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Esse alguém acabou por ser D. Pedro de Castro9 genro do conde velho D. João Afonso Telo de Meneses, 4º conde de Barcelos, visto ser casado com Leonor Telo de Meneses, filha deste conde. A posse desses bens (e não do título de 7º conde de Barcelos que ficou para o Condestável D. Nuno Álvares Pereira) tocou a D. Pedro de Castro em resultado de uma conjugação de condições excepcionalmente favoráveis e únicas: não existiam mais herdeiros do conde velho e os principais candidatos tinham tomado voz por Castela. Com o falecimento do seu pai, D. Álvaro de Castro em plena crise de 1383-85, engrandeceu ainda mais o seu património; a razão maior é que seu irmão e primogénito, de nome também Álvaro de Castro aderira à facção de D. João de Castela, e por tal ficara automaticamente excluído da herança paterna. Mas, a aliança de D. Pedro de Castro com o Mestre de Avis era apenas estratégica. D. Pedro era primo do Infante D. João, filho do rei D. Pedro e da tia D. Inês de Castro. A sua fidelidade era no mínimo instável. Apesar de cumulado de honrarias foi por duas vezes acusado de traição. A primeira durante o cerco de Lisboa em 1384, quando foi acusado de ter vendido a cidade ao rei de Castela, facilitando a entrada das tropas deste entre as portas de S. André e de S. Agostinho que tinha à sua guarda. Preso, segundo Fernão Lopes,10 e com os bens confiscados, seria no entanto perdoado poucos dias depois. Dois meses mais tarde, em Alenquer, “ho Mestre lhe comfirmou e fez doaçom pêra sempre de todallas villas e logares e castellos que os Reis aviam dadas ao Comde dõ Álvaro Perez seu padre; assi per comdado

D. Pedro de Castro era filho de D. Álvaro Peres de Castro, conde de Arraiolos e conde de Viana da Foz do Lima, e de D. Maria Ponce de Léon. D. Álvaro viera para Portugal no tempo do reinado de D. Afonso IV, juntamente com sua irmã, D. Inês de Castro e o seu meio-irmão e chefe da linhagem dos Castros da Galiza, senhor de Lemos e Conde de Trastamara. Esta família tinha caído em desgraça em terras de Castela e foi forçada a emigrar após o assassinato de Pedro, o Cruel, a quem se mantiveram sempre fiéis. D. Fernando concedeu várias honrarias a D. Álvaro de Castro, entre as quais o título de conde de Arraiolos e o de conde de Viana da Foz do Lima. Estes títulos foram criados por D. Fernando que instituiu ainda o cargo de Condestável de Portugal, tendo-o também atribuído ao referido D. Álvaro de Castro. Durante a crise de 1383-85, D. Álvaro manteve-se fiel a D. João Mestre de Avis até à sua morte ocorrida por volta de 11 de Junho de 1384 (Fernão Lopes, op. cit., vol. I, cap. CXVI, pág. 199). 10 Fernão Lopes, op. cit., vol. I, cap. CXXXVIII, pp. 239-241. 9

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come per doaçom, e per outra quallquer guisa que fosse, salvo dos beẽs de Diego Lopez Pacheco, que elRei dom Fernãdo dera ao dito Comde seu padre; mas de todollos outros lhe fez doaçom per escriptura tam firme, como a dom Pedro quis mandar fazer;”11

Em princípios do ano de 1385 o conde D. Pedro de Castro encontra-se novamente envolvido numa conjura para matar o Mestre de Avis em Torres Vedras. Descoberta esta e presos alguns dos responsáveis que confirmaram o envolvimento do conde D. Pedro de Castro, não lhe restou outra alternativa senão a fuga. Mais uma vez por crime de traição e lesamajestade foram os bens do conde D. Pedro de Castro confiscados. Não apenas os dele mas os de toda a família mais próxima, conforme refere Fernão Lopes na crónica de D. João I: “Estomçe deu o Meestre a Vaasco Martĩiz de Melloo todollos beẽs mooviis e rraiz que a Comdessa molher que fora do Comde dom Alvoro Perez, e dom Pedro de Castro seu filho, e o Comde dom Pedro seu gẽrro aviam em quaaes quer logares do rreino (ca este Comde dom Pedro Pedro era casado com dona Isabell de Castro, filha do Comde dom Alvoro Perez e desta Condessa dona Maria), assi de terras castelladas come chãas, resalvando as terras e logares do Comde de Viana, e as que dadas eram por comdado ao dito Comde dom Alvoro Perez; e mandou que posessem na carta da merçee estas seguimtes rrazoões: Por quamto o dito Comde dom Pedro nos tragia basteçida morte e treiçom, e a dita Comdessa era em ello comssemtidor.”12

Exilado em Castela, D. Pedro de Castro recebeu S. Martinho e Salvaterra na Galiza do rei castelhano. Pouco tempo porém durou o exílio uma vez que, em Janeiro de 1388, se encontra ao lado de D. João agora já rei, no cerco de Melgaço. Pouco se sabe do seu regresso que é referido por Fernão Lopes, dizendo que D. Pedro oferecera ao rei português as posses-

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Idem, vol. I, cap. CLXXVI, pág. 330. Fernão Lopes, op. cit., vol. I, cap. CLXXVIII, pág. 336.

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sões que tinha na Galiza a troco de o receber novamente ao seu serviço, e portanto os seus actos perdoados13. D. João I acedeu e deu-lhe em troca “o lugar do Cadaval com todas as aldeias do termo na mesma forma que o conde João Afonso, conde de Ourém, seu sogro, tivera e o reguengo de Campores, para o compensar da troca, doação que, em 1398, é alargada pelas jurisdições todas e mero e misto império.”14

A posse das terras que viriam a constituir o almoxarifado de Eixo, perde-se neste ponto da História. E são três as hipóteses que neste momento se colocam: estariam na posse da coroa e não teriam sido ainda entregues; teriam passado a D. Nuno Álvares Pereira, que recebera de D. João todos os condado de Ourém (que pertencera a João Fernandes Andeiro) e os do condado de Barcelos, para além do título de Condestável; a terceira possibilidade era de os bens terem ficado com D. Pedro de Castro por via da sucessão de sua mulher Leonor de Meneses filha do conde velho. Esta última suposição parece muito remota, pois como se viu todos os bens de D. Pedro de Castro foram confiscados aquando da sua segunda tentativa de assassinato do Mestre de Avis, e aquando do segundo perdão do rei, apenas foi concedido a D. Pedro o senhorio do Cadaval. A primeira hipótese também se coloca de forma bastante frágil. É sabida a necessidade constante de D. João em garantir a fidelidade daqueles que o acompanhavam na sua empresa. Daí não ser também de estranhar que tivessem sido doados. Mas tal não aconteceu por exemplo aos bens do conde de Neiva, D. Gonçalo Telo de Meneses, irmão da rainha Leonor Teles. Estes conservou-os D. João na sua posse e transmitiu-os ao filho ilegítimo D. Afonso que viria a ser o 1º duque de Bragança. A segunda possibilidade parece de facto ser a mais viável, uma vez que D. João efectua várias doações a D. Nuno Álvares Pereira ao longo de 1385, e em particular o condado de

Fernão Lopes, op. cit. vol. II, cap. CXXX, pp. 268-169. Mafalda Soares da Cunha, Linhagem, parentesco e poder – a Casa de Bragança (13841483), Fundação da Casa de Bragança, 1990, pág. 37. O documento que refere esta doação é o ms. 2, fol. 35v-36v e encontra-se no Arquivo da Casa de Bragança. 13 14

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Barcelos no mês de Outubro desse ano15. Ora, nesse mesmo ano já se encontrava exilado em Castela D. Pedro de Castro e seus bens haviam sido confiscados. Nem seria pois de prever que, aquando o segundo perdão concedido a D. Pedro de Castro, D. João I retirasse bens a Nuno Álvares para os entregar a D. Pedro. Aquando do casamento16 de D. Afonso17, filho ilegítimo de D. João e de Inês Pires, com Beatriz Pereira de Alvim filha do condestável D. Nuno, quer D. João I quer o condestável fizeram amplas doações aos noivos; entre elas figurava o condado de Barcelos. Deste casamento resultaram 3 filhos: D. Afonso, D. Fernando e D. Isabel. O primeiro, D. Afonso, nunca terá casado, falecendo solteiro, como pretende António Caetano de Sousa18. No entanto terá tido um filho ilegítimo, D. Afonso de Portugal, de D. Brites de Sousa filha de Martim Afonso de Sousa e Violante Lopes de Távora. D. Isabel casou com o seu tio, o infante D. João19 filho de D. João I e D. Filipa de Lencastre, casamento do qual resultaram vários filhos. Sobre o secundogénito D. Fernando recaiu a representação da Casa e Ducado de Bragança, após o falecimento do seu irmão Afonso, 1º duque de Bragança. Antes da sua morte, D. Nuno Álvares distribuiu sob a forma testamentária, por estes seus três netos, todos os bens que possuísse aquando da sua morte, com a cláusula de morrendo o primogénito D. Afonso sem descendentes legítimos, os seus bens passariam para o seu irmão D. Fernando, como aliás se veio a verificar20. Ficou pois este com os títulos de

Monarchia Lusytana, part. 8ª, liv.23, cap. 34, pág. 781. Celebrado a 8 de Novembro de 1401. 17 D. Afonso voltou a casar após o falecimento de D. Beatriz. A sua segunda mulher foi Constança de Noronha, filha do conde D. Afonso de Noronha e Gijon e sua mulher D. Isabel de Portugal, casamento do qual não resultou qualquer descendência. No entanto foi uma forma de D. Afonso continuar a aumentar o seu património por via de mais doações feitas pelo pai na ocasião deste segundo matrimónio. 18 António Caetano de Sousa, op. cit., Tomo X, pp. 315-316. 19 O infante D. João foi 3º Condestável de Portugal e Mestre da Ordem de Santiago. Deste casamento resultaram 4 filhos: D. Diogo, Mestre da Ordem de Santiago, D. Isabel de Portugal que casou com o rei de Castela D. João II, D. Beatriz que casou com o infante D. Fernando, 2º duque de Viseu e D. Filipa que ficou solteira e não deixou sucessão. 20 Cf. António Caetano de Sousa, História Genealógica da Casa Real Portuguesa, Atlântida-Livraria Editora, 2ª ed., Coimbra, 1946, Tomo X, pág. 567 e seguintes. 15 16

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conde de Arraiolos, Marquês de Vila Viçosa e posteriormente duque de Bragança. Casou com D. Joana de Castro a 28 de Dezembro de 1429. Quem era então esta D. Joana de Castro que se apresentou como senhora de Paus, Óis da Ribeira, Vilarinho do Bairro e presumivelmente, Eixo, entre outras propriedades em 1420 quando casou com D. Fernando I, 2º duque de Bragança? Como chegaram à sua mão as propriedades que iriam formar o almoxarifado de Eixo? D. Joana de Castro era filha de D. João de Castro, senhor do Cadaval e de D. Leonor da Cunha21. Filha única e herdeira de todos os bens de seu pai. Neta pelo lado paterno de D. Pedro de Castro e D. Leonor de Meneses, e pela parte materna de Martim Vasques da Cunha, primeiro conde de Valência de Campos, e de D. Teresa Tellez-Giron. Este casamento uniria de forma inequívoca as casas dos Castros e Meneses com a de Bragança. O dote de D. Joana era efectivamente avultado. Consistia o dote da futura condessa de Arraiolos entre outros bens metade da quinta das Ilhas no termo de Mafra, os morgados de S. Mateus e Santo Eutrópico, uns casais, herdades e moinhos no termo de Lisboa, Peral, Cadaval e Torres Vedras, Cadaval, o reguengo de Campores, assim como a herança de seu bisavô o conde D. João Afonso Telo de Meneses que compreendia Paus com as aldeias do seu termo, Calvães, Beduído, Fontes, Óis da Ribeira e Requeixo com todas as suas jurisdições para além de uma avultada soma em dinheiro22. Na parte que interessa aos territórios daquilo que viria a ser o almoxarifado de Eixo, verifica-se de forma inequívoca que D. Joana os possuía de forma cabal em 1429, data do seu casamento com D. Fernando. Mas já anteriormente essa posse era efectiva e seria proveniente de seu avô D. Pedro de Castro ou mesmo de seu pai D. João de Castro. Em carta de confirmação de D. Duarte de 9 de Dezembro de 143323, é feita referência a uma série de cartas testemunháveis de D. João I: a primeira a favor de D. Pedro de Castro datada de 1398; as duas seguintes sem indicarem quem efectuou o pedido, mas datadas de 1404; a última pe-

D. Leonor da Cunha fora casada primeira vez com o Dr. João das Regras, de cujo casamento houve uma filha de nome Branca da Cunha. 22 Mafalda Soares da Cunha, op. cit., pág. 37. ANTT, Chancelaria de D. Duarte, Liv.º 1, fol. 27v.º 23 J. C. de Miranda, op. cit., pp. 177-178. Livro do Místicos, nº 3 fol. 195. 21

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dida por D. Leonor da Cunha mulher ou já viúva a este tempo de D. Pedro e datada de 1412. Nas cartas de 1404 se referem às doações dos bens de Paus, Óis e Requeixo entre outros feitas por D. Fernando, “com todos seus termos e jurdiçoões como as o dito comde avia em eixo.”24 Outra carta testemunhável passada por D. João I a favor de D. Pedro de Castro surge a 6 de Maio de 1403 para confirmar a herança da condessa D. Guiomar.25 Não é totalmente clara a situação de Eixo neste contexto. Também é certo que Eixo acompanhou de muito perto as mudanças de mão das restantes terras que comporiam o futuro almoxarifado do mesmo nome. O que se pode afirmar com certeza, é que se tratava de um bem da coroa, que a ela tinha chegado por sucessivos confiscos, que sucessivamente fora doada, e se transmitia de “juro e herdade”, mas necessitava da competente confirmação régia. Do casamento com D. Fernando nasceram nove filhos26. De todos, o que mais interesse tem para as terras do futuro almoxarifado é o terceiro na ordem de nascimento: D. Afonso. Este D. Afonso, que seria o 1º conde de Faro27, casou em 1465 com D. Maria de Noronha, filha de D. Sancho de Noronha, 1º conde de Odemira28e D. Mécia de Sousa. Era ainda neta pela parte paterna de D. Afonso de Noronha e Gijon e D. Isabel de Portugal, e pela parte materna era neta de Gonçalo Anes de Sousa, 3º senhor de Mortágua e D. Filipa de Ataíde.

Idem. J. C. de Miranda, op. cit., pp. 134-135. António Caetano de Sousa, Provas genealógicas…., liv. 3º, t. 3º, prova nº 14, pág. 468 e seg. 26 Foram filhos do segundo duque de Bragança e D. Joana de Castro os seguintes: 1º - D. Fernando II, conde de Guimarães e posteriormente 3º duque de Bragança; 2º - D. João, marquês de Montemor-o-Novo e condestável de Portugal; 3º - D. Afonso, 1º conde de Faro e também conde de Odemira. Será mais detalhadamente tratado; 4º - D. Álvaro, senhor de Tentúgal, Póvoa, Buarcos e Cadaval; 5º - D. António de Portugal, falecido de menor idade; 6º - D. Isabel de Portugal, falecida de menor idade; 7º - D. Brites de Bragança, que casou com D. Pedro de Meneses, 1º marquês de Vila Real; 8º - D. Guiomar de Bragança, que casou com D. Henrique de Meneses, 1º conde de Loulé; 9º - D. Catarina de Portugal, que faleceu solteira. 27 O título de conde de Faro foi criado por D. Afonso V por carta de 22 de Maio de 1469. 28 O título de conde de Odemira foi criado por D. Afonso V por carta de 9 de Outubro de 1446. 24 25

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Pelo lado paterno era simultaneamente bisneta de Henrique II de Castela e de D. Fernando de Portugal. D. Maria de Noronha era a única filha legítima do conde de Odemira e assim herdeira universal dos bens dos Noronhas. Com ela, e por dote de casamento, transitaram as vilas de Odemira, Aveiro, Vimieiro, castelo e reguengo de Elvas, Mortágua e o castelo de Estremoz29. Em 10 de Junho de 1465 por carta de doação30 de D. Fernando e D. Joana de Castro, duques de Bragança, com o consentimento do primogénito D. Fernando, conde de Guimarães e herdeiro da dita casa de Bragança, recebeu D. Afonso a alcaidaria mor, cadeia e rendas de Estremoz, assim como as terras de riba Vouga: os julgados de Eixo, Óis da Ribeira, Paus e Vilarinho, com todos os seus termos, rendas, direitos, foros, tributos, jurisdição cível e crime, mero e misto império, padroados de Igrejas, etc. No entanto esta doação impunha algumas condições que viriam a revelar-se importantes num futuro algo distante: 1º - Nenhuma destas terras podia ser alienada, dividida ou empenhada; o destino das terras do almoxarifado ficou no fundo definitivamente traçado; 2º - No caso de D. Afonso falecer sem descendência, as propriedades regressariam à posse do conde de Guimarães (D. Fernando II), ou seja o herdeiro da casa de Bragança, ou caso tivesse falecido regressaria à posse do duque de Bragança; 3º - Na situação de não haver descendência legítima na casa de Odemira, e no caso de terem já falecido o conde de Guimarães D. Fernando e o duque de Bragança D. Fernando, as propriedades regressariam inteiras àquele que tivesse a sucessão no ducado de Bragança; 4º - Se por qualquer acaso aquele que tivesse a sucessão no ducado a perdesse por qualquer motivo, os bens transitariam para o herdeiro imediato na ordem de sucessão. Por todo este clausulado ficavam garantidas e definidas a indivisibilidade e inalienabilidade das propriedades transferidas, assim como as regras precisas para a transmissão dos bens.

António Caetano de Sousa, op. cit., tomo IX, liv. VIII, part. IIIª, cap. Iº. pág. 185. António Caetano de Sousa, op. cit., tomo IX, liv. VIII, part. IIIª, cap. Iº, pág. 181 e seg. Também em ANTT, Místicos, Livro 3º, fol. 42. Referenciado ainda por J. C. de Miranda, op. cit., pp. 181-183. 29 30

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Mas o documento pode ajudar de alguma forma a perscrutar a situação da vila de Eixo em momentos mais recuados. Assim, a insistência do articulado da doação na indivisibilidade dos bens, nomeadamente os situados em Eixo, Paus, Óis da Ribeira e Vilarinho do Bairro; juntamente com o pormenor de a carta de doação ter sido assinada pela então duquesa de Bragança, D. Joana de Castro; o facto de pelo menos uma parte dos bens doados envolverem propriedades que D. Joana levou consigo como dote de casamento, indiciam a probabilidade de a vila de Eixo ter chegado à casa de Bragança por via de D. Joana de Castro através do seu casamento com D. Afonso. Entraram assim na casa de Odemira as propriedades do futuro almoxarifado de Eixo, com sede nesta vila e que compreendia mais as vilas de Paus, Óis da Ribeira e Vilarinho do Bairro. Durante quase duzentos anos mantiveram-se na posse dos condes de Odemira. Do casamento de D. Afonso e D. Maria de Noronha houve oito filhos que garantiram a sucessão da casa de Odemira. O varão que sucedeu a seu pai foi D. Sancho de Noronha, nascido por volta de 1470.31 Não foi fácil a vida de D. Afonso, em particular após a morte de D. Afonso V em 1481. O mesmo se poderá dizer a respeito da restante casa de Bragança. D. João II no intuito de recuperar o poder perdido pelo pai D. Afonso V a favor da nobreza, procurou recentralizar o poder, pondo em prática um conjunto de reformas que visavam cercear o pode da nobreza, fortemente engrandecido com as generosas doações de D. Afonso V. Muito naturalmente a nobreza sentiu-se tocada e procurou reagir, enfrentando juridicamente o rei. À cabeça desse descontentamento encontrava-se o Duque de Bragança, D. Fernando II, como representante da casa nobre mais poderosa. Acompanhavam-no entre muitos outros nobres os seus irmãos D. João marquês de Montemor e D. Afonso conde de Odemira e Faro. D. Fernando é preso, os bens da casa de Bragança confiscados e executado

Os outros filhos foram os seguintes: 1º - D. Guiomar de Portugal que casou com Henrique de Aragão, duque de Segorbe; 2º - D. Mécia Manuel que casou com D. João de Lacerda, duque de Medina Celi; 3º - D. Francisco de Faro que casou com D. Leonor Manuel de Vilhena; 4º - D. Fradique de Faro, arcebispo de Saragoça; 5º - D. Fernando de Faro, 3º senhor de Vimieiro, que casou com D. Isabel de Melo; 6º - D. António de Noronha, clérigo; 7º - D. Catarina Henriques, religiosa de Cister no mosteiro de Odivelas. 31

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a 20 de Junho de 1483 em Évora, tendo os outros dois irmãos conseguido fugir para Castela. Também seguem para Castela os filhos de do malogrado duque de Bragança e D. Sancho, primogénito de D. Afonso conde de Faro e Odemira. Todavia isso não impediu que fossem processados e vissem os respectivos bens confiscados.32 Acabaram por falecer quer D. João, quer D. Afonso em Castela, ainda durante o reinado de D. João II, assim como D. Filipe, primogénito de D. Fernando II, duque de Bragança. Mais uma vez os bens do almoxarifado mudavam de mãos. Por carta de 19 de Agosto de 1485 passada no mosteiro de Alcobaça, D. João doou a sua irmã a Infanta D. Joana uma parte importante das terras que foram do Conde de Odemira; entre elas figuravam, Eixo, Paus, Requeixo, Óis da Ribeira e Vilarinho do Bairro.33 Desta doação “em sua vida”, a Infanta D. Joana recusou a jurisdição.34 Por morte da Infanta D. Joana em 12 de Maio de 1490, e na ausência de descendência, as terras regressaram novamente à posse da Coroa. E por alguns anos lá ficaram. Todavia, em 1494 D. João II volta a doar as terras do almoxarifado de Eixo, desta vez a Diogo Lopes de Sousa, por carta dada em Setúbal a 15 de Julho de 1494, confirmada por D. Manuel em 1500. Diogo Lopes de Sousa35 era filho de Álvaro de Sousa, senhor de Miranda e alcaidemor de Arronches, e D. Maria de Castro. Era neto pelo lado paterno de outro Diogo Lopes de Sousa, 18º senhor da casa de Sousa e D. Catarina de Ataíde. Era neto materno de D. Fernando de Castro e D. Isabel de Ataíde. A linhagem pelo lado paterno conduz a sua ascendência a Afonso Dinis, filho ilegítimo de D. Afonso III. Pelo lado materno era bisneto de D. Pedro de Castro e D. Leonor de Meneses, o que faz de Diogo Lopes de Sousa primo em segundo grau do anterior conde de Faro e de Odemira, D. Afonso e do malogrado duque de Bragança D. Fernando II.

O marquês de Montemor foi condenado à morte e executado em estátua, por estar exilado em Castela, em 12 de Setembro de 1482. 33 António da Rocha Madahíl, Colectânea…, op. cit., pág. 235-236. Cf. Também em ANTT, Místicos, liv. 2, fol. 120v. 34 J. C. de Miranda, op. cit., pág. 141; vd. também António Caetano de Sousa, História Genealógica…., liv. IV, cap. IIº, pág. 97, t. IIIº. 35 Diogo Lopes de Sousa foi Mordomo da Casa Real, do Conselho de D. Afonso V, D. João II e D. Manuel I, senhor da casa de Sousa e alcaide-mor de Arronches. 32

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Casou por duas vezes, e de ambas teve descendência. O primeiro casamento foi com D. Isabel de Noronha, filha de Pedro Vaz de Melo e Maria de Noronha. Era bisneta por este lado de D. Afonso conde de Noronha e Gijon. Deste casamento resultaram quatro filhos, mas nenhum deles sucedeu ao pai na posse das terras do almoxarifado de Eixo.36 O segundo casamento foi com D. Maria da Silva, filha de João da Silva, 4º senhor de Vagos, e D. Branca Coutinho. Deste segundo casamento nasceram três filhos, dos quais Álvaro de Sousa, que herdou o senhorio das terras de Eixo, Requeixo, Paus e Óis da Ribeira, tendo recebido o título de senhor de Requeixo, título do qual foi o primeiro senhor37. Em 1516, a 2 de Junho, D. Manuel concede carta de foral a Eixo e Requeixo. Por um auto de correição ocorrido a 7 de Agosto de 1522, para verificação do cumprimento do foral recentemente outorgado, constata-se o reconhecimento de Álvaro de Sousa como senhor das terras de Eixo e Requeixo38. Este Álvaro de Sousa casou por duas vezes. A primeira com D. Filipa de Ataíde, e segunda vez com D. Genebra Ribeiro. Apenas do primeiro casamento surgiram filhos. Ao todo seis39, dos quais o primogénito, Diogo Lopes de Sousa herdou a casa paterna. Este herdeiro viveu no entanto pouco tempo. Mesmo casando duas vezes, tanto da primeira mulher, Catarina filha de Francisco Correia, senhor de Belas e mãe desconhecida,

Foram os seguintes os filhos deste casamento: 1º - André de Sousa, que foi o 21.º senhor da Casa de Sousa, senhor de Miranda do Corvo e alcaide de Arronches; 2º - Henrique de Sousa, senhor de Oliveira do Bairro; 3º - Catarina de Sousa, casada com Gonçalo Tavares, senhor de Mira; 4º - Joana de Sousa, casada com Garcia de Melo, alcaide-mor de Serpa. 37 Os outros filhos para além de Álvaro de Sousa foram: 1º - Gaspar da Silva que partiu para a Índia; 2º - Cristóvão de Sousa, que seguiu a carreira das armas, sendo capitão em Chaul. Casou com D. Guiomar de Castro. 38 J. C. de Miranda, op. cit., pág. 185, documento 21; encontra-se também inserido na transcrição do foral a pág. 161, documento 1 da mesma obra. 39 Foi a seguinte a descendência de Álvaro de Sousa e Filipa de Ataíde: 1º - Diogo Lopes de Sousa, que sucedeu ao pai; 2º - Vicente de Sousa, que casou com Isabel Henriques; 3º - Lourenço de Sousa, que casou, desconhecendo-se com quem; 4º - Manuel de Sousa; 5º - Violante de Sousa; 6º - Catarina de Ataíde, que casou com Rui Pereira de Miranda, senhor de Carvalhais e Requeixo. Não tiveram descendência. 36

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como da segunda, D. Madalena de Castro, filha de Martinho Soares de Alarcão, alcaide-mor de Torres Vedras e D. Violante Henriques, não resultou qualquer descendência. O risco de perda dos bens era por demais evidente. Tendo falecido quer Álvaro de Sousa, quer o seu filho Diogo (este por volta de 1560), procuraram os potenciais herdeiros evitá-la transmitindo os bens a Vicente de Sousa, secundogénito de Álvaro de Sousa. A tentativa, no entanto, acabou por não surtir o efeito desejado. Que aconteceu entretanto com os representantes da casa de Odemira? Com a subida ao trono de D. Manuel I, os exilados em Castela ligados à casa de Bragança regressaram. Mas D. Manuel não restituiu de uma só vez os bens que lhes tinham sido confiscados por D. João II, até porque alguns deles já tinham sido objecto de novas doações. Preferiu antes restituir pouco a pouco, por novas doações, os bens e os privilégios correspondentes ao estatuto dos visados, na pessoa de D. Jaime, que se tornará o 4º duque da casa de Bragança. Em relação à casa de Odemira, a recuperação dos bens que tinham sido confiscados por D. João II, que pertenciam à casa de Bragança, a situação afigurava-se mais complexa. D. João II, já tinha restituído à condessa D. Maria de Noronha os bens que provinham da casa de Odemira, mas não os que lhe chegaram da casa de Bragança, estando neste caso entre outros as terras do almoxarifado de Eixo. Além do mais, estas terras tinham sido já doadas por D. João II a Diogo Lopes de Sousa, e confirmada a doação por D. Manuel I, assim como este mesmo rei autorizara a transmissão das propriedades para Álvaro de Sousa. Como forma de resolver o problema criado com a chegada de D. Sancho de Noronha a Portugal, D. Manuel o “fez logo conde de Odemira, dando-lhe com a grandeza e prerogativa de parente com o tractamento de sobrinho, como se vê entre outros documentos originaes na carta de confirmação da villa de Vimieiro, feita pelo mesmo Rei em Évora a 16 de Junho de 1509.40” No entanto, na prática esta medida não teve efeitos imediatos, pois de acordo com o disposto na carta de casamento de D. Maria de Noronha com D. Afonso, seria ela a adminis-

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António Caetano de Sousa, op. cit., liv. VIII, parte IIIª, cap. V, t. IX, pág. 453

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tradora dos bens da casa enquanto viva. Embora usasse o título de Conde de Odemira e senhor de Eixo, Paus, Óis e Vilarinho, por lhe pertencer de direito ou por terem tais títulos e propriedades pertencido a seu pai, o certo é que apenas após a morte de sua mãe ocorrida não muito depois de 20 de Maio de 1523. Apenas a partir de então se pode intitular de 3º conde de Odemira. D. Sancho de Noronha casou por duas vezes. Dos dois casamentos resultaram oito filhos41, mas nenhum deles sucedeu ao pai no condado de Odemira. A sucessão transitou para um neto de nome também Sancho. O primeiro casamento de D. Sancho de Noronha foi com D. Francisca da Silva, filha de Diogo Gil Moniz e D. Leonor da Silva, fidalguia de origem um pouco obscura pelo lado paterno, sendo que pelo materno entroncava nos senhores da Chamusca. Deste casamento vieram três filhos. O segundo casamento foi com D. Ângela Fabra e Centelles, filha de Gaspar Fabra, senhor de Parte Barigadu, e Isabel de Centelles, fidalguia de origem castelhana e ao qual não terá sido alheia a presença durante uma dúzia de anos em Castela. Deste segundo casamento nasceram 5 filhos. O sucessor de D. Sancho de Noronha seria naturalmente o seu filho primogénito, do primeiro casamento, D. Afonso de Noronha. No entanto, este faleceu um pouco prematu-

Filhos do primeiro casamento de D. Sancho com D. Francisca da Silva: 1º - D. Afonso de Noronha que casou com D. Maria de Ataíde, senhora de Penacova; 2º - D. Rodrigo de Noronha que seguiu a carreira religiosa; 3º - D. Maria de Noronha que casou com o conde de Trassois, ignorando-se quem era e todo o resto. Do segundo casamento, com D. Ângela Fabra y Centelles: 1º - D. João de Faro que casou com Isabel Freire de Andrade; 2º - D. Fradique de Portugal que teve três casamentos, pela seguinte ordem: D. Maria de Centelles, D. Maria Madalena Zuñiga e D. Margarida de Borja. Destes casamentos apenas do terceiro resultou alguma descendência. 3º - D. António de Noronha que faleceu novo e sem sucessão. 4º - D. Joana Manuel de Noronha que casou com D. Juan de Lacerda, 4º duque de Medina Celi; 5º - D. Guiomar de Castro que casou com D. Juan de Massa de Licana, barão de Luchen. 41

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ramente. Deixou do seu casamento com D. Maria de Ataíde42 um filho, D. Sancho de Noronha, nascido em 1515. Este D. Sancho de Noronha que viria a ser o 4º conde de Odemira, vai contrair matrimónio com sua prima em 4º grau, D. Margarida de Vilhena, filha de D. João da Silva, 2º conde de Portalegre, e D. Maria de Meneses. D. Maria de Meneses era filha de D. Álvaro, senhor de Tentúgal, Póvoa, Buarcos e Cadaval, e D. Filipa de Melo. D. Álvaro, por sua vez, era filho de D. Fernando I, 2º duque de Bragança, e daí o parentesco com D. Sancho de Noronha, que era trineto do mesmo D. Fernando. Do casamento resultou o nascimento de oito filhos dos quais o primogénito, D. Afonso de Noronha, sucederia ao pai como 5º conde de Odemira43. D. Sancho de Noronha, 4º conde de Odemira, vai intentar um processo judicial contra D. Álvaro de Sousa, Diogo Lopes de Sousa e o procurador da Coroa, no intuito de reaver a posse efectiva e plena das terras do almoxarifado de Eixo, das quais apenas possuía o título de Senhor. A questão ir-se-á arrastar no tempo e apenas ficaria resolvida em 1560, a favor do conde de Odemira. Para tal contribuiu de forma decisiva a ausência de descendentes em linha directa de Diogo Lopes de Sousa, uma vez que esta era a única forma de dar cumprimento à carta de doação de D. João II, e simultaneamente respeitar a Lei Mental. É que Vicente de Sousa44, como transversal na descendência do último donatário, não poderia de forma alguma suceder-lhe, uma vez que contrariava a determinação da Lei Mental.

Filha de D. Nuno Fernandes de Ataíde, senhor de Penacova e D. Joana de Faria. Filhos de D. Sancho de Noronha e D. Margarida de Vilhena: 1º - D. Afonso de Noronha que herdou o título do pai de 5º conde de Odemira; 2º - D. Manuel de Noronha, falecido na batalha de Alcácer-Quibir a 4 de Agosto de 1578; 3º - D. Nuno de Noronha, bispo de Viseu e da Guarda; 4º - D. Diogo de Noronha, frade dominicano; 5º - D. António de Noronha que faleceu na batalha de Alcácer-Quibir a 4 de Agosto de 1578; 6º - D. Luís de Noronha que morreu de menor idade; 7º - D. Antónia de Vilhena, freira no convento de Jesus em Setúbal; 8º - D. Maria de Noronha que casou com D. Luís de Ataíde, 3º conde de Atouguia. 44 No entanto para o compensar da perda, D. Sebastião fez-lhe mercê de uma tença, a 22 de Novembro de 1563 , enquanto não entrasse numa comenda, o que veio a acontecer. Cf. J. C. de Miranda, op. cit., pág. 148. 42 43

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Estava assim reconstituída mais uma parte importante do património dos condes de Odemira. No entanto, nem o 4º conde, D. Sancho de Noronha, nem seu filho, D. Afonso de Noronha, 5º conde, usufruíram por muito tempo da aplicação da sentença. D. Sancho falece 1573, e D. Afonso fina-se na batalha de Alcácer-Quibir em 4 de Agosto de 1578, juntamente com mais dois dos seus irmãos: D. Manuel e D. António de Noronha, tendo a casa de Odemira sofrido com este trágico acontecimento um duro golpe. Não se pode dizer que a sorte tivesse bafejado grandemente a casa de Odemira. Ao desastre em Alcácer-Quibir, há que adicionar os três casamentos quase infrutíferos de D. Afonso de Noronha. O primeiro com D. Joana de Vilhena, filha de Manuel Teles de Meneses, 6º senhor de Unhão, e D. Margarida de Vilhena, não deu qualquer descendência; o segundo com D. Joana de Gusmão, filha de D. Pedro de Meneses e D. Constança de Gusmão, teve o mesmo destino; o terceiro, com D. Violante de Castro45, filha de D. Álvaro de Castro, 1º senhor de Fonte Arcada, e D. Ana de Castro, resultou apenas um descendente, D. Sancho de Noronha, filho póstumo. O cardeal-rei D. Henrique, após o funesto sucesso de Alcácer-Quibir, nomeou tutora e administradora da casa de Odemira a condessa viúva D. Violante de Castro, enquanto durasse a menoridade do seu filho D. Sancho de Noronha, legítimo sucessor do pai. Filipe I por carta de confirmação atestou a posse do condado a D. Sancho em 8 de Março de 159646. Casou D. Sancho de Noronha com D. Juliana de Lara, filha de D. Manuel de Meneses, 5º marquês de Vila Real, e D. Maria da Silva. Deste casamento resultou apenas uma descendente, D. Madalena de Meneses e Noronha, que faleceu de menor idade. Em face do que ficara disposto na doação dos duques de Bragança, D. Fernando I e D. Joana de Castro, na doação que fizeram ao filho D. Afonso por alturas do casamento com D. Maria de Noronha, a ausência de descendência lídima directa implicava o imediato retorno dos bens do almoxarifado de Eixo para a casa de Bragança. Quando D. João IV, fez a doação do condado de Odemira a D. Francisco de Faro, excluiu de imediato as terras do almoxarifado de Eixo que regressaram à casa de Bragança.

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Era também neta de D. João de Castro, 5º vice-rei da Índia. António Caetano de Sousa, op. cit., Provas…, tomo V, documento 22.

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Em forma de epílogo pelo condado de Odemira, pode dizer-se que pouco tempo mais sobreviveria. D. Francisco de Faro faleceu em 1648 e deixou como herdeira na ausência de filho varão, sua filha D. Maria de Faro. Casada em segundas núpcias com D. Nuno Álvares Pereira de Melo, 1º duque do Cadaval, apenas deixou uma descendente, D. Joana de Faro, que faleceria ainda de menor idade em 1669. D. Maria de Faro deixou a vida terrena em 3 de Fevereiro de 1664. Ironicamente, mesmo os bens dos condes de Faro, acabaram por ingressar no património da coroa por ausência de sucessão legítima directa. Aquando do falecimento do último Noronha do condado de Odemira, alguns presumíveis candidatos à sua sucessão, como foi o caso de D. Luisa de Faro, D. Nuno Álvares Pereira de Melo, D. Francisco de Faro, D. Sancho de Faro, João Gomes da Silva, e seus sucessores, tentaram judicialmente travar a passagem dos bens da casa de Odemira para a casa de Bragança e para a coroa alegando, resumidamente, que a Lei Mental não se aplicava a esses bens. O contencioso arrastou-se até ser proferida a sentença final em 7 de Agosto de 1692, negando aos autores a sua pretensão. A partir de 1641 entraram os territórios do almoxarifado de Eixo na posse da Casa de Bragança, e os seus possuidores foram sempre os duques de Bragança. Em 1651 ordenou esta Casa a feitura de um tombo novo de todas as propriedades que substituísse e actualizasse aquele que fora feito em 1615 pelo 6º conde de Odemira, D. Sancho de Noronha. Destes dois tombos perdeu-se o rasto e deles há conhecimento a partir do primeiro tombo realizado no século XVIII pela Casa de Bragança (1727): neste há constantes remissões quer para um quer para outro tombo na descrição das propriedades. Na década final do século XVIII a Casa de Bragança manda realizar um novo tombo como forma de actualizar a informação contida no anterior.

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